Você está na página 1de 3

1

7º ano BNCC (EF08HI16) Identificar, comparar e analisar a diversidade


política, social e regional nas rebeliões e nos movimentos contestatórios ao
poder centralizado.

Repercussões da rebelião escrava de 1835 na cidade do Rio de


Janeiro

Logo após o levante baiano, o governo


regencial deu prioridade ao controle dos
escravos e de quantos outros grupos
pudessem coadjuvá-los na revolta. A lei mais
abrangente nesse sentido, e que teve
vigência em âmbito nacional, foi promulgada
em 10 de junho de 1835, depois de ficar
durante dois anos de molho na Assembleia
Geral Legislativa sem ser votada. Ela
estabelecia a pena de morte para os escravos
que assassinassem, ou mesmo ferissem
gravemente, senhores, feitores,
administradores ou membros de suas famílias
que com eles morassem. A sentença, rezava
a lei, seria executada "sem recurso algum".
Muitos foram os escravos punidos por essa
legislação, inclusive escravos baianos
importados pelas prósperas regiões cafeeiras
do Sul do pais após 1835.

Além dessa lei mais geral, nas várias províncias foram adotadas
medidas repressivas imediatas, visando evitar o contágio da revolta entre a
população escrava. No Rio de Janeiro o levante produziu temores. Segundo o
representante inglês ali sediado, H. S. Fox, o "conhecimento desta revolta
excitou mais inquietação no Rio de Janeiro do que qualquer outro distúrbio
público que tivesse acontecido por muitos anos". Dois dias depois informou a
seu governo que o ministro da justiça lhe assegurara que na Corte precauções
mais do que usuais foram adotadas [...] para vigiar a população de cor".
Atenção para o detalhe: está escrito "população de cor", não apenas africanos,
2

mas também negros e mestiços nascidos no Brasil, livres, libertos ou escravos.


Enquanto isso, a Assembleia Legislativa Provincial do Rio de Janeiro votaria
uma lei de exceção para facilitar a revista de casas e tolhia a liberdade de
palavra, visando esta última medida, aparentemente, impedir a divulgação de
boatos sobre levantes escravos. Além disso, autorizava o presidente da
província a deportar africanos forros, como se estava fazendo na Bahia, e
proibia o funcionamento, garantido pela Constituição, de associações secretas
como lojas maçônicas, que contassem entre seus membros "estrangeiros de
cor". Não se tratava neste caso dos mesmos africanos forros, mas de agentes
de uma espécie de internacional negra que se acreditava espalhado pelo
Atlântico a pregar o "haitianismo".

Em meados de março, o governo montou uma operação pente-fino entre


os "pretos Minas" , que incluíam os nagôs, ordenando aos juízes de paz que
dessem buscas em suas casas e inquirissem se organizavam reuniões ou se
comportavam de modo suspeito. O objetivo era "tranquilizar os ânimos dos
habitantes, desta Capital que porventura possam estar receosos da
possibilidade de reproduzirem nela as cenas de horror que tiveram lugar na
Bahia pela insurreição dos africanos". O preço da tranquilidade dos cariocas
seria a maior vigilância dos africanos. Logo chegariam resultados ao gabinete
do chefe de polícia, Eusébio de Queirós. Na rua do Valongo, onde se
localizavam os armazéns que recebiam escravos importados da África antes da
proibição do tráfico, haveria um preto a quem outros tratavam respeitosamente
e com ele se iniciavam "em princípios religiosos". Não é claro se se tratava de
mestre muçulmano ou de sacerdote de alguma outra tradição religiosa africana.

Denúncias vagas foram também feitas de "reuniões secretas de homens


de cor". Com isso a vigilância devia estender-se a negros e mestiços em geral,
e não apenas aos nascidos na África, sugerindo que as tensões raciais entre
brasileiros, se haviam recuado do debate político após o levante baiano,
ganhariam maior força na agenda policial. Fazia-se na Corte, contra brasileiros,
o que as autoridades baianas só ousaram fazer contra africanos, O controle
envolveria a organização de um mapa completo, distrito a distrito, dos "homens
de cor", constando nome, endereço, condição (escravo, liberto ou livre), estado
civil, ocupação, naturalidade e cor da pele. Dever-se-ia também recolher
3

informações sobre as irmandades católicas a que pertenciam, dias e horas em


que se reuniam e –“se constava que elas tinham alguma tendência sediciosa”.

O juiz de paz do 3º Distrito da freguesia de Sacramento investigou três


irmandades negras - Santo Elesbão, Santa Ifigênia e São Domingos - , mas
nada encontraria nelas de anormal. Ao contrário da Bahia, no Rio de Janeiro,
além dos "homens de cor* brasileiros, as confrarias católicas negras não
escapariam da devassa policial. Estávamos no centro do poder imperial, onde
todo cuidado era necessário, até porque aqui se concentrava uma enorme
população negra, que incluía os 46 mil escravos que faziam do Rio de Janeiro
a maior cidade escravista do Ocidente.

REIS, José João. Rebelião Escrava no Brasil. São Paulo, Companhia das Letras. 2003. p.511-512.

Você também pode gostar