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Dr.

John Henrik Clarke

PAN-AFRICANISMO
E O FUTURO DA
FAMÍLIA AFRICANA1

A
o abordar este assunto, a primeira coisa que você precisa
saber é que há milhares de anos antes da existência
daquilo que hoje conhecemos como Europa, o que
conhecemos como África foi o mundo.2 Nossa maior contribuição
ao mundo foi a própria civilização e o conceito de Estrutura
Familiar. Não falamos o suficiente sobre a nossa vida como povo
antes do contato europeu e o impacto negativo da presença
europeia.

(1) Eu caí em profunda tristeza à medida que este período


foi chegando ao fim... Penso que se tivéssemos conversado um
pouco mais antes – e a um ótimo diálogo, iniciado entre nós, ter-
se-ia dado continuidade – e às catástrofes do nosso passado não se
teria dado sequer partida. Antes de lidar com o Pan-Africanismo e
com o futuro da Família Africana – vamos lidar com tal prefácio.
Para tanto – lidar com a estrutura e o design da Família Africana

1 Tradução* de Abibiman Shaka Touré; Povo Preto, Pan-Africanismo e Poder Preto.


Este artigo está anexado à obra, escrita em colaboração mútua entre os irmãos – os
Drs. Clarke e Yosef ben-Jochannan, New Dimensions in African History (1991). O
discurso foi dividido em partes, visando torná-lo mais didático. Além disso,
destacamos determinados trechos, grifamos outros em itálico, visando dar ênfase
àqueles trechos que julgamos importantes. [*notas do tradutor]
2 Em ‘África: A Passagem das Idades de Ouro’, John Henrik Clarke vai falar que

“Pode-se dizer com um forte grau de certeza que a África teve três Idades de Ouro. As duas
primeiras atingiram o seu clímax e estavam em declínio antes que a Europa como uma
entidade em funcionamento na sociedade humana tivesse nascido.” Traduzimos mais este
ensaio, o qual você pode ter acesso, bastando que clique aqui.
na cultura antes [do contato] era a necessidade do Pan-
Africanismo.
Primeiro vamos lidar com o mundo “pan”, pois que há uma
compreensão equivocada sobre esta palavra. “Pan” significa tudo.
Pan-Africano significa – todo o Povo Africano. Refere-se à
unicidade de todas as pessoas de ascendência Africana e infere a
Unidade do Mundo Africano. Na última noite, a irmã criou a
diferença entre o Congresso Pan-Africanista [Pan-Africanist
Congress]3 e o Congresso Nacional Africano [African National
Congress]4 e enfatizou a natureza integracionista de um e a
natureza nacionalista do outro. Ela estava falando sobre a família
e a interferência da Europa em nossas disputas familiares. Os
europeus pensam que devem interferir em nossas disputas
familiares e, no entanto, não se atrevem a nos deixar interferir na
deles. Vamos conversar sobre esse erro – e isso agora lhes coloca
um problema. Houve um momento em que os europeus tiveram
mais dificuldade em se unir, em Família, do que os Africanos têm
agora. Houve um tempo em que, se os Africanos quisessem
conquistar toda a Europa, tudo o que tinham que fazer era mexer
algumas varas e alguma areia – os europeus eram tão fracos!
Nunca nos aproveitamos deles em seu menor refluxo, mas eles
sempre se aproveitaram de nós no nosso. Quando tivemos uma
disputa familiar – eles aproveitaram a disputa familiar para

3 Não confundir com os Congressos puxados por Du Bois; trata-se aqui do


Congresso Pan-Africanista concernente à Azania. República Pan-Africanista de Azania,
a despeito de África do Sul, foi o nome pelo qual chamaram aquelas terras os
Nacionalistas Africanos, muitos deles, membros do “PAC” – como Robert Sobukwe
(1924-78) e Jafta Masemola, “O Tigre de Azania” (1929-90) – como da AZAPO –
Mthuli ka Shezi (1947-72), Mapetla Mohapi (1947-76) e Onkgopotse Tiro (1947-74) –
“A principal fonte de renda para o preto é a Terra, precisamos restaurar a Terra para os
oprimidos”: estas palavras, de Tiro, era meio que o slogan do partido; como a SASO,
de Steve Bantu Biko (1946-77) – todos assassinados pela supremacia branca.
4 ANC (sigla para Congresso Nacional Africano), a despeito do PAC e AZAPO,

pode ser visto como algodão entre vidros no jogo político entre Nacionalistas Pretos
e liberais, se caracterizando como um partido reformista, quiçá de coalizão, é tudo
que precisamos saber – para ilustrar, leiamos esse trecho de um dos textos de Biko,
que não deixa dúvidas sobre sua posição: “Os pretos não mais procuram reformar o
sistema, porque isso implica aceitar os pontos principais sobre os quais o sistema foi
construído.” Recentemente, a decisão em expropriar as terras dos brancos (reforma
agrária), sem concessões, foi uma das medidas tomadas por Cyril Ramaphosa (uma
de suas promessas de campanha), após a renúncia de Jacob Zuma em meio a uma
turbulência causada por denúncias de corrupção no partido (ANC). Ramaphosa
parece ter cedido à pressão do partido de oposição, EFF: “Devemos garantir a
restauração da dignidade de nosso povo sem compensar os criminosos que roubaram nossas
terras” foi uma das declarações de Julius Malema, dissidente do ANC e líder do EFF.
O sonho de Winnie Mandela é o pesadelo dos brancos – clique aqui e entenda.
espalhar a desunião. É a divulgação desta desunião deliberada que
criou a necessidade do Pan-Africanismo. A guerra contra um povo
é, antes de tudo, uma guerra contra a unidade mais delicada e mais
importante da existência de um povo – a Família. Isso exige que
você reestruture a Família toda de novo. Por conta dos 3.000 anos
ou mais que estivemos sob cerco, tentamos juntar a Família
novamente. Uma vez que reorganizamos essa Família de volta, e
ela se manter com sucesso – iremos caminhar no palco do poder
mundial e ser o que uma vez fomos, e nunca mais ser dependentes
de qualquer povo.

(2) Vamos lidar com o primeiro assalto à estrutura da


Família Africana. Dr. Ben já fez isso, mas vamos ver se podemos
avaliar o significado político do que ele disse. Ele mostrou a
estrutura da sociedade antes da primeira invasão de África, a
consequência dessa invasão e a história de como a África
sobreviveu e se desenvolveu apesar da invasão. Quando olhamos a
Família Africana e a vida Africana antes das invasões, a unidade
mais importante – é a Família. A Estrutura Familiar, a estrutura da
aldeia e, posteriormente, a estrutura da unidade maior, a cidade.
Nós não lembramos isso até 1680 aec5. Não havia ninguém mais
na África senão o Povo Africano. Os Africanos tinham o controle
total sobre si mesmos. Pode ser difícil pra você imaginar isso,
devido ao bombardeamento feito em sua mente de livros de textos
ocidentais somado ao estudo constante da civilização ocidental – a
única que almeja ser chamada de civilização. Pode ser difícil para
você imaginar que você existia e tinha sociedades em pleno
funcionamento 3.000 anos antes do primeiro europeu ter um
sapato para vestir ou morar em uma casa com janela. Foi
dificultado o processamento e o condicionamento da sua mente
para se ater a tal fato. Qual o tipo de estrutura você possuía e por
que você estava tão seguro – e o que causou tamanha perda?

5 Neste ano ocorreu uma explosão de proporções “homéricas” derivada de um


vulcão ativo próximo ao Mar Mediterrâneo (Tera, atual Santorini) que teria dado
origem a uma série de interpretações, por parte dos povos afetados – minoicos e
hititas, por exemplo, tiveram suas terras varridas pelas ondas gigantescas. Algumas
dessas interpretações parecem ter se tornado alicerce para a instituição de novos
cultos, como o culto ao fogo indo-europeu; a adoração de Javé para judeus; Zeus na
Grécia – divindades sempre ligadas ao fogo, aos raios, aos vulcões. A data também é
bem próxima ao ‘êxodo’ dos ‘judeus’ – quando, segundo essa tradição, Moisés teria
libertado o povo hebreu da escravidão em Kemet – fato este que não encontra
evidência válida até o momento, a não ser nos “livros sagrados”; nem prova alguma
de que tenham eles participado na construção de alguma nossa Mer Khut (pirâmide).
Escravos judeus no Egito? Embuste! Conta outra! – ou forjemos nossa agência!
Quando você perdeu pela primeira vez – quando a Estrutura
Familiar foi destruída pela primeira vez –, os europeus só não te
destruíram porque a Europa não estava funcionando naquela
época – não havia a Europa. A Europa é uma criação, não um
continente. Ao olhar para o mapa, é o norte da Ásia. Algumas
pessoas vindas de uma geladeira descongelada recentemente
chegaram à sua terra – levaram você e transformaram sua mente,
de forma a te fazer pensar que ele [o invasor] sempre foi civilizado
– e você sempre esteve esperando por ele para trazer a luz. O que
aconteceu quando descobriu que ele não tinha luz? No trabalho de
R. R. Palmer, Uma História do Mundo Moderno [A History of
One Modern World], ele escreve sobre 3.000 a 5.000 anos de
civilização que ocorreu sem que alguém soubesse que algo como
os europeus existiam. É difícil para você imaginar que houve um
tempo em que não só os europeus não existiam – houve um
momento em que a própria palavra [europeu] não existia.

(3) Vejamos agora o que deu errado com nosso fluxo de


informações. Como chegamos tão longe? Todo menino
escandinavo, ou qualquer europeu, ou qualquer pessoa branca
razoavelmente pensante pode reivindicar sua herança grega como
uma herança intelectual – embora essas nações não existissem
durante a existência dessa Grécia [da “Idade de Ouro”, do “Século
de Péricles”]. No auge da existência da Grécia, não havia um
único estado-nação no resto daquilo que você agora chama
Europa, logo – como a Grécia poderia ser sua herança? A Europa,
em geral, não teve nada a ver com o desenvolvimento da Grécia.
Se você olhar para o mapa, veja que a Grécia era uma das nações
que estava mais próxima da África. Essa proximidade os põe em
contato com a corrente intelectual do Mediterrâneo. Quando o
milagre intelectual do Egito floresce (milhares de anos antes que
alguém soubesse da existência de uma Europa), é nutrido com
base nas contestações dos povos da extremidade inferior do rio
Nilo com a extremidade superior do Nilo, depois que o Saara
secou – e havia grandes cidades nesta área. As pessoas da
extremidade superior do Nilo gravitavam em direção ao extremo
inferior do Nilo e o que se tornou o Egito, tornou-se o recíproco
do maior corpo de poder já reunido na história do mundo.6

6UNIFICAÇÃO – geralmente se simplifica a Unificação de Kemet como sendo um


processo onde o “Baixo Egito” – aqui pra nós, e de agora em diante, Baixo-KMT –
uniu-se ao Alto-KMT, e só... Desde então, e graças a alguns “egiptólogos” (brancos)
mal-intencionados (boa parte deles), entendimento este que vem sendo reproduzido
e que dá sustentação, inclusive, para a tese da influência – quando não, formação
[África] Já havia criado a maior e mais duradoura civilização da
história do mundo antes que alguém a invadisse. Os primeiros
invasores vieram da Ásia Ocidental, agora chamada Oriente
Médio. Eu acho que você está no melhor lugar para usar a palavra
“Oriente Médio”, na medida em que essa palavra foi inventada
aqui na Inglaterra.
Por que essas pessoas invadiram, em primeiro lugar? O que
eles estavam procurando e o que fizeram? Em primeiro lugar, eles
poderiam ser classificados como bandidos daquele dia em diante –
poderiam ser chamados bandidos até este dia. Eles não sabiam
nada sobre a cultura e, no entanto, tinham filtrado para a África
daquele dia. Eles estavam no vale do Nilo por cem anos antes da
invasão e tivemos que lidar com outro tipo de invasão que é
embaraçosa – a invasão do sexo. Quando chegaram, cem anos
antes, eles se casaram/infiltraram com/nas Famílias Africanas e
criaram gerações de bastardos confusos, com sentimentos mistos
de lealdade. Estes bastardos confusos geralmente os mostraram
como entrar e como conquistar seu país adotado, por séculos. A
desunião, portanto, começou com a destruição e a ruptura da
Estrutura Familiar Africana. Exceto por essa ocorrência, você não
precisará dessa palestra sobre o Pan-Africanismo.

(4) Agora estou prestes a iniciar minha palestra. Nos anos


finais do século XIX, quando pessoas Africanas em todo o mundo
haviam lutado contra a escravidão e suas consequências, e quando
as pessoas do Caribe entenderam que sua emancipação era falsa, e
quando os Africano-americanos entendiam isso de uma forma
ainda mais nítida, porque a sua própria era a maior farsa – os
escravos não tinham para onde ir. Eles acabaram trabalhando nas
mesmas plantations7 por uma merreca, tendo que cuidar de suas

mesmo – de Kemet por povos vindos da chamada “Ásia Ocidental”, agora “Oriente
Médio” (outrora “Próximo”...). Todavia, desde Cheikh Anta Diop tal tese caiu por
terra, e hoje se sabe que as origens de Kemet remetem à Kush – segundo Chancellor
Williams, “a filha mais velha da Etiópia” – e a outras regiões continente a dentro.
7 Optamos por manter a grafia ‘plantation’, pontuando que não se deve confundir

com sua tradução vulgar (plantação), pura e simples; uma vez que todo um modelo
de exploração foi viabilizado a partir da utilização de tal sistema, mediante a
utilização de latifúndios e mão de obra escrava – empregada tanto nas “grandes
lavouras” como pelos pequenos fazendeiros – o sistema de plantation constitui a
coluna vertebral de uma economia agrícola baseada na monocultura para
exportação: campos de algodão e de tabaco (mais ao norte), engenhos de açúcar e
fazendas de café (ao sul) – para a importação de uma mercadoria produzida à custo
do perecimento de 10 milhões de Indígenas e 20 milhões de Africanos trazidos
compulsivamente para as chamadas américas, vítimas do escravismo e colonialismo
europeu. Uma pequena parcela se comparado com 300 milhões de nós, Abibiman –
próprias Famílias em seus próprios barracos, e o europeu obteve o
melhor desta situação. Os escravos não tinham lugar para vender
seu trabalho, exceto o mesmo lugar do qual eles eram “libertos”.
E, sistematicamente, por razões econômicas, uma forma de re-
escravização começou. No final do século XIX, os ex-escravos
começaram a entender o que lhes aconteceu e, do Caribe, nasceu o
conceito de Pan-Africanismo. Ele pegou facilmente entre os
Africano-americanos.
Na África, havia Africanos Pan-Africanistas,
principalmente em Gana e na Nigéria. Na Nigéria, havia Mojola
Agbebi, o grande ministro Nacionalista Pan-Africano. Em Gana,
Casely-Hayford8, pai da política ganesa moderna, muito antes do
nascimento de Nkrumah. Eu suponho que, em uma audiência de
pessoas Africanas, todos conhecem Joseph B. Danquah. Ele era,
literalmente, o pai intelectual do Gana moderno e o professor de
Kwame Nkrumah. O manto da liderança política deveria ter sido
passado para Danquah. Foi arrancado dele e feriu-o terrivelmente.
Suponho também que você conheça as grandes mentes que
surgiram da Nigéria no final do século XIX. Havia muitos grandes
advogados que vieram à tona então. Em Gana, Casely-Hayford
havia feito uma comunicação com Africano-americanos
[Africanos nascidos na américa] e com os Africano-caribenhos,
criando assim uma ponte intelectual – e esse era o início do Pan-
Africanismo.

(5) Enquanto o Pan-Africanismo ainda é peça de conversa,


vejamos outros movimentos “pan” do mundo que não tinham nada
a ver com o Africano. Esses movimentos foram bem-sucedidos,
independentemente de como você olha para eles. Por mais cruel
que seja, o movimento de Adolf Hitler foi um movimento “pan” –
foi um movimento pan-germânico. O que você chama de

Povos Africanos e Pretos – dobrados desde o início desse embate civilizacional entre
pretos e não-pretos – é um verdadeiro milagre a permanência ainda da melanina...
A saber, 20 milhões, segundo John Henrik Clarke, é um número conservador.
8 Escrevendo sob o pseudônimo de Ekra-Agiman, Joseph Ephrain Casely-Hayford

(1886-1930), publicou um livro poderoso, “Etiópia Unbound”: Estudos de Emancipação


de Raça em 1911. Numa introdução feita por Molefi Asante: "Pode-se abordar o livro
como um romance, um tratado filosófico, um diálogo de racionalismo, um romance
eduardiano ou como uma meditação sobre amor próprio, família e comunidade. É tudo isso e
mais porque está permeado de referência aos mitos gregos e é um tratado político sólido sobre
os esforços contemporâneos dos turcos e russos, bem como a vida colonial britânica. Hayford
está convicto de que, ao final, haveria vitória sobre a opressão colonial na Costa do Ouro e
que seu povo, o Fanti, poderia desfrutar de suas próprias liberdades e independência como
cidadãos iguais, em condição, a qualquer outro no mundo.”
holocausto foi uma disputa familiar entre europeus e europeus. O
racismo europeu se dividiu fora da Europa. Agora, o racismo que
destruíra o resto do mundo recorreu a si mesmo e destruiu o
próprio povo. Foi assim que se tratava a essência do chamado
holocausto. Não estou dizendo nada demais sobre isso e não estou
discutindo contra os seis milhões de pessoas que perderam a vida.
Estava errado. Mas era europeu contra o europeu, e eles ainda não
fizeram os europeus pagar por isso. Alguém fora da Europa
pagará por isso porque os crimes cometidos contra os europeus
são quase sempre pagos por não-europeus. O gênio dos europeus é
que eles têm um talento para drenar doenças. Eles sempre
drenaram suas feridas políticas nas terras de outras pessoas. Eles
têm o talento para recuperar suas perdas internas por extração
externa de pessoas que não tiveram nada a ver com os crimes
cometidos contra eles. Esta é a base da desunião e da destruição
da Unidade Familiar Africana na África. Eles fizeram, até certo
ponto, o mesmo na Ásia.
Os bandidos da Ásia Ocidental, com sua ideia original de
estrutura familiar destruída, com sua sociedade em desunião, sem
conhecimento da Estrutura Familiar Africana, começaram a
planejar um assalto à Estrutura Familiar Africana. Eles não
entenderam a base cultural dos Africanos, eles não entenderam
sua religião, e eles vieram como a maioria dos invasores vieram
para a África, rindo de seus deuses. Quando um povo ri dos seus
próprios deuses, eles têm você de outra maneira. Eu disse,
repetidamente, que não só a África precisa de uma revolução
cultural, mas nunca haverá uma verdadeira revolução cultural até
que um chefe de Estado Africano reze a um deus Africano em
público, sem se desculpar por isso. Eu era e ainda sou um grande
admirador de Julius Nyerere, mas depois que ele começou a beijar
o anel do papa, comecei a questionar como alguém que condena
os brancos pela manhã pode adorá-los à noite, sem ver isso como
uma contradição com o que ele apoia.
Quando a Segunda Guerra Mundial terminou, um grupo de
pessoas Africanas, na sua maioria Africano-americanos, se viam
disponíveis para a África, e eles poderiam ter sido apanhados por
muito pouco se a África fosse organizada para fazê-lo9. A África

9Tendo em mente aquilo que o próprio Dr. Clarke afirma, ao fim deste ensaio, sobre
a doutrina de Garvey – no que diz respeito a esta ter estabelecido um braço militar –
faz todo sentido o apelo do movimento de Garvey “de volta à África”. “A África
poderia ter tido um exército fino e moderno” – e Garvey, visionário, percebera isso.
Por citar um artigo de Clarke intitulado ‘O Impacto de Marcus Garvey’ (traduzido
por e para nós): “Após o bombardeio de Pearl Harbor, em 7 de dezembro de 1941, os
teria tido um exército fino e moderno. Nosso inimigo nos havia
treinado para protegê-lo, e eles nos ensinaram a técnica dessa
proteção. Ele nos ensinou como matá-los quando ele queria que
outros europeus fossem mortos, e nós o fizemos bem. Se
tivéssemos de voar em aviões, nós voávamos bem. Recebemos
armas, e nós as disparamos bem. Como resultado, depois de saber
sobre a guerra operacional e técnica moderna, ainda eram
Africano-americanos, e eles não tinham nenhum emprego que se
adequasse a esses talentos. Das suas habilidades corroídas e as
outras, surgiu uma nova raça de Africano-americanos, cujas
mentes estavam tão desviadas que matariam no comando, mesmo
que fosse sua própria mãe, por conta da lavagem cerebral. Quando
falo sobre o exército que a África poderia ter tido, estou falando
sobre o Pan-Africanismo. No entanto, a coisa mais Pan-Africana
que se poderia ter feito era organizar essas pessoas com seu
treinamento técnico para proteger a África. Por exemplo, quando a
invasão chegou a Entebbe, na África, não houve protesto em
massa. Como Povo Africano verdadeiramente Pan-Africano,
temos que ter uma força militar que proteja os Africanos, em
qualquer lugar do mundo. Para fazer isso, temos que parar de
dividir-nos com base em ilhas e com base na graduação de cores
ou no quão perto estamos de nossos pais brancos.

(6) A libertação é difícil. Você tem que ficar um pouco


áspero para libertar um povo. Nosso erro, que rompeu a grande
unidade que tivemos, é quando permitimos que estranhos
entrassem em nossa casa – que não tivessem lealdade em nossa
casa. Todas as pessoas lhe perguntam quando você entra em sua
casa – “Qual é a sua lealdade, qual o seu compromisso com esta
casa?”. Se você não tem compromisso com a proteção desta casa,
então você tem que sair desta casa. Quando permitimos que outras
pessoas vivam entre nós, e vivam entre nós por centenas de anos
sem lealdade, para nós, estamos esquecendo de praticar o que eu
chamo de “egoísmo essencial para sobrevivência”, ao não
verificar a lealdade do estranho. Quando você encontra a coisa

Estados Unidos entrariam, de maneira formal, no que até então era estritamente um conflito
europeu. A profecia de Marcus Garvey sobre a disputa européia para manter o domínio sobre
o mundo inteiro era agora uma realidade. Os povos da África e da Ásia aderiram a este
conflito, mas com diferentes esperanças, diferentes sonhos e muitas dúvidas. Os Africanos em
todo o mundo colonial estavam montando campanhas contra esse sistema que lhes roubara
sua nacionalidade e sua humanidade básica. A descoberta e a reconsideração dos
ensinamentos do honorável Marcus Mosiah Garvey estavam sendo redescobertas e
reconsideradas por um grande número de Africanos, à medida que esse conflito mundial se
aprofundava”.
mais forte sobre um povo, e identifica o que é mais forte sobre
essas pessoas, olhe mais de perto, porque o que é mais fraco sobre
um povo vai se revelar; é o outro lado da moeda. Uma das coisas
mais fortes sobre os Povos Africanos é a sua humanidade,
manifestada na sua capacidade de aceitar outras pessoas
[xenofilia, segundo Diop]. Uma das coisas mais fracas sobre os
Povos Africanos é não saber como fazer uso político de sua
humanidade para sua própria proteção. Essa fraqueza permitiu a
primeira invasão da África, e essas invasões constantes sobre a
cultura Africana foram uma guerra à cultura e a vida em Família,
que resultou em uma ruptura dessa Estrutura Familiar.
As invasões consistentes, que não foram devidamente
tratadas, trouxeram uma confusão sobre a definição, sobre quem
éramos e com quem devemos nos relacionar. Se tivéssemos lidado
com esses primeiros invasores, não teríamos os problemas que
estamos tendo agora. Precisamos estudar o tratamento de outras
pessoas com os invasores. Estude os invasores da Rússia e os
invasores da China. O invasor raramente vai para casa. Um terço
do exército japonês que invadiu a China nunca foi para casa. Eles
simplesmente se mudaram para a China até se cansarem. Não
desenvolvemos uma técnica para lidar com invasores, e esses
invasores alteraram a estrutura de nossas Famílias, que foram bem
projetadas e funcionaram bem por milhares de anos. Este fracasso
tornou necessário o Pan-Africanismo, mas quando concebemos o
Pan-Africanismo, o erigimos sem qualquer tipo de proteção.

(7) As revoltas de escravos maciças nas Índias Ocidentais e


as revoltas na África foram eficazes, mas no início do século XIX
produzimos uma nação de falantes que pensavam poder apelar
para a consciência cristã do europeu. Isso foi outro erro. A
liberdade é algo que você toma com suas próprias mãos. Foi como
uma ilusão para nós pensar que seria entregue a nós. Não é algo
que é deixado em um testamento e uma geração pode deixá-lo
para outra geração. Cada geração, quando conseguir, deve garantir
sua liberdade novamente, com as próprias mãos. Como um Povo,
é aí que falhamos: assegurar a nave da liberdade que temos. Nós
temos que garantir isso para aqueles que agora vivem para não
dependerem desse passado.
Outro erro em retrospectiva: em 1919, W.E.B. Du Bois
chamou uma conferência em Paris e em Bruxelas. Isso é um erro
para nós como Africanos. Estamos sempre convocando
conferências para falar sobre a libertação no solo de outra pessoa e
usando o idioma de outra pessoa para fazê-lo. Quando você olha
para a Revolução Haitiana, a maior dificuldade que tiveram após a
libertação foi que Toussaint queria fazer as pazes com a França
para negociar com Napoleão – e foi preso, porque ele estava
sozinho. Quando Henri Christophe foi confrontar LeClerc, ele não
ficou sem proteção: ele tinha a sabedoria das ruas. Ele levou 3.000
homens, cercou o castelo e enfrentou LeClerc com um flanco de
50 homens. Ele não foi enviado para as masmorras porque ele
tinha proteção ao redor dele. Ele deu uma ordem ao servo de
LeClerc. Ele deu essa ordem a um servo da família LeClerc que
foi colocado lá como espião, e ele deu essa ordem em uma língua
Africana. Ele teve sucesso, os franceses voltaram para as colinas
onde os Africanos os aguardavam; e tudo o que eles precisaram
foram de bastões e pedras. Este era um aspecto militar do Pan-
Africanismo que nós não usávamos, mas, em última instância,
precisamos usar. Teremos que nos dirigir a uma situação como na
África do Sul e teremos que entender que isso é um problema e
uma luta para todos os Africanos que caminham pela terra. Isso é
algo que não podemos deixar aos Africanos que vivem na África
do Sul para lidar sozinhos.
Uma vez que entendamos a natureza do Pan-Africanismo,
devemos começar a unir essas forças para uma luta arranjada para
os Povos Africanos em todo o mundo. Vamos juntar a melhor
unidade, a unidade mais essencial da nossa cultura, ou seja, a
Unidade Familiar Africana. Vamos restaurar o Homem Africano
como o símbolo da autoridade com essa unidade familiar. Quando
você lê A Unidade Cultural da África Negra [L'unité culturelle de
l'Afrique noire], Diop chama a atenção para o fato de que a
Mulher Africana desfrutou de libertação muito antes da mulher
europeia. Que o respeito pela feminilidade foi incorporado à
cultura e as pessoas aderiram às regras que regem esse respeito. A
Mulher Africana não teve que lutar pela libertação, ao contrário da
mulher europeia que era basicamente subalterna, tinha que ser. O
Homem Africano não entrou em guerra prendendo sua mulher em
cintos de castidade.

(8) Nas Ilhas do Caribe, particularmente em Trinidad, uma


ilha que não tinha sido muito ativa na ponte intelectual de três
vias, surgiu um homem chamado Sylvester Williams. Ele fundou
um grupo chamado Liga Pan-Africana e começou a pregar o
conceito de juntar todo o Mundo Africano. Aqui, em Londres, ele
chamou o primeiro Congresso Pan-Africano10, em 1900.11 Du
Bois foi convidado, mas os Africanos, vivendo no continente mais
rico do mundo, não foram convidados porque eram muito pobres e
não podiam pedir delegações da África. Este congresso foi o
começo de um conceito estrutural, ideológico de Pan-
Africanismo. Nesse congresso não pediram liberdade. Eles
pediram um meio de preparar pessoas Africanas para entrar no
mundo moderno. Eles pediram, principalmente, uma melhoria no
sistema educacional, uma melhoria na qualidade da educação que
prepararia os Africanos para viver no mundo moderno:
literalmente, para funcionar de acordo com as regras estabelecidas
pelos colonialistas.12 Os colonialistas, até certo ponto, eram um
pouco simpáticos e pouco desconfiados.
Após o primeiro Congresso Pan-Africano, até 1906, muitos
dos gigantescos intelectuais do Mundo Africano ainda estavam
vivos – Casely-Hayford, John Mensah-Sarbah, o grande advogado
ganês e Herbert McCaulay, o nigeriano, ainda bastante jovem.
Nos Estados Unidos, W.E.B. Du Bois e Booker T. Washington
ainda estavam vivos, e esses homens começaram a se comunicar
uns com os outros. As figuras do Caribe vêm para os Estados
Unidos, desde os anos 1700, e desempenharam um papel
importante na estruturação dos primeiros movimentos de
liberdade Africano-americanos e do movimento abolicionista
Africano-americano. Ninguém se chamava “índios ocidentais” ou
“negros” naqueles dias. Todos eram Povos Africanos,
funcionando juntos. Muito antes de usar a palavra Pan-
Africanismo, eles estavam praticando isso entre eles.

(9) O que estou falando é um caso negligenciado em nossa


história, um período em que as pessoas do Caribe participaram da

10 Dr. Clarke chama de ‘Congresso’ o que foi na verdade foi uma ‘Conferência’ – a
‘Conferência dos Povos de Cor’, pensada por Sylvester Williams em 1890, que só
pode acontecer dez anos depois, em 1900. Talvez pelo fato de a primeira palavra
dizer respeito mais a uma ‘reunião’ do que a um ‘evento’: enquanto na primeira se
dão encontros entre chefes de estado, diplomatas etc. – enquanto os assuntos
tratados são, em geral, de primeira importância – podemos aí demarcar a limitação
de uma conferência.
11 Isso que entendemos por Pan-Africanismo dos Congressos (clique aqui e saiba mais).

12 Sobre o início do Pan-Africanismo em sua forma política organizada, Kwame Ture

reserva a seguinte nota: “Era fraco! Quando surgiram, não disseram a rainha: "iremos
coloca-la pra fora do país!" Disseram: "precisamos tratar bem os nativos, precisamos
educa-los." – "Devemos prepara-los para autogestão". Ações bem fracas. Mas era anti-
colônia em essência. Não devemos olhar a forma. E ficamos mais fortes, a medida que o
colonialismo mostrava suas garras.”
luta Africano-americana como parte da luta Mundial dos Povos
Africanos. Esse conceito e a prática do Pan-Africanismo e a
Unificação da Família começaram cinquenta anos antes do
surgimento da palavra “Pan-Africanismo”; ainda assim, algo
começou a dar errado com o Pan-Africanismo, uma vez que
anexamos uma palavra para ele. Após 1900, as condições no
Caribe tornaram viável que os caribenhos continuassem com o
conceito. No começo do século, o conceito de União começou a
dar lugar a alguns serviços de alimentação para brancos que mais
tarde nos prejudicariam. Pensávamos que faríamos algumas
concessões aqui e ali, mas essas concessões ainda ficam
penduradas em tijolos ao redor de nossos pescoços.
No Mundo Africano, o século XIX foi um século de
confronto físico, assaltos a nossas mulheres, assaltos à Estrutura
Familiar e assaltos aos homens de ascendência Africana. Espero
que você faça o trabalho de reunir nossa gente novamente. O
conceito Pan-Africano foi uma peça conversacional até o final da
Primeira Guerra Mundial. Após a Primeira Guerra Mundial, um
sonhador arrogante veio aos Estados Unidos depois de ter passado
algum tempo aqui em Londres. Ele tinha aprendido muito em
Londres, mas o principal assunto da notável carreira de Marcus
Garvey é que ele nunca tirou suas ideias de um segundo avaliador.
Ele leu as ideias de pessoas de primeira classe. Ele leu os
trabalhos do Congresso realizado aqui em 1911. Ele leu esses
procedimentos e seu conceito de raça foi fundamentado. Ele
investigou as conversas de outras pessoas. Ele era o pai do Pan-
Africanismo do século XX.

Marcus Garvey foi um fracasso na Jamaica. Quando ele


veio para os Estados Unidos, ele empurrou W.E.B. Du Bois do
centro da liderança. Quando ele veio aos Estados Unidos pregando
um novo conceito de Pan-Africanismo e unidade do Mundo
Africano, precisávamos dele mais do que as pessoas de sua
Jamaica natal e mais do que qualquer Povo Africano na face da
terra – porque ele despertou em nós certos sonhos de unidade num
momento em que a promessa americana não tinha sido mantida.
Quando a América nos informou que o sonho americano não era
um sonho para nós, ele disse:

De muitas maneiras,
Por inúmeras vezes,
Eu os guiarei para uma nova terra
Um novo sonho,
E uma nova promessa.

É por isso que o Pan-Africanismo desse homem teve mais


efeito do que o Pan-Africanismo de qualquer outro. Ele aderiu ao
seu conceito de Pan-Africanismo a possibilidade de estabelecer
um braço comercial, um braço militar e um braço cultural para
alcançar a libertação e manter a libertação dos Povos Africanos
onde quer que estejam na face da Terra.
QUESTÕES E RESPOSTAS

Pelo que entendo, o British Museum é um dos

Q maiores depósitos de tesouros Africanos do mundo e,


como estamos aqui, o que devemos procurar? O que
você aconselharia a conferir no museu?

Dr. Clarke: Bem, confira tudo. Confira os tesouros que foram


roubados do Egito. Confira a interpretação desses tesouros desse
ponto de vista, porque você vai reinterpretá-los do ponto de vista
Africano. Eu acho que as famosas estátuas são as Ptolomias13 e
estão no British Museum. Gasto dias lá sem ver tudo. Os museus
do mundo estão cheios de propriedades roubadas, principalmente
roubadas da África.

Dr. ben-Jochannan: Penso que existem dois museus,


particularmente na Inglaterra, entre muitos outros que você
precisa observar. Não só o Museum of Natural History, mas você
precisa olhar pro Egyptian Museum, localizado a poucas quadras
um do outro. Agora, há argumentos entre Inglaterra e Egito sobre
“a barba de Quéfren” de uma estátua que os gregos chamavam de
Esfinge de Gizé.14 Aliás, não há “esfinge” em qualquer parte do

13 As estátuas da Dinastia Ptolomaica por si só derrubam a hipótese de uma raça


“branca” ter governado o Egito em seu declínio. Tanto é verdade que existem duas
estátuas de Ptolomeu Sóter, uma em granito preto e outra, já do período romano,
com aquelas feições atribuídas por Hollywood aos romanos, o que reforça o mito.
14 A qual, inclusive, existe uma discussão que deve ser enfrentada com todo rigor:

alguns afirmam que o nariz desta obra magnânima foi destruído quando da viagem
de Napoleão Bonaparte ao Egito. Esse argumento é plausível, e pode ser aplicado
em alguns casos. Porém, tem um estudioso Afrocêntrico (pra você ver que o
Afrocentrismo trabalha com “rigor científico”, senso crítico!), o Dr. Runoko Rashidi.
Ele não descarta que, em alguns casos, a deformação do nariz tenha sido o resultado
de erosão – visto que os Africanos levaram esse tipo de construção para todo canto
do globo, vide os estudos de Ivan Sertima – ou que, em outros, padres europeus
Egito. Os gregos tinham uma pequena estátua feminina que eles
chamavam de A Esfinge [The Sphinx]; a esfinge representa um
nome feminino. A estátua em Gizé é do Faraó Quéfren [Khafre]
(que construiu a segunda maior pirâmide do Egito; seu pai, o faraó
Queóps [Khufu], construiu a maior) que você mesmo viu. É sua a
cabeça e o corpo de leão. Mas os britânicos se recusaram a
devolver a barba, tentando abalar o Egito em troca de outra coisa
que eles desejassem em troca.
Você precisa olhar para tudo. Não o que é exibido em
separado, mas nos porões. Você também deve olhar para o
segundo porão, para a estátua de Sócrates, e olhar uma segunda
vez para ver o que parece. Havia um, uma vez em 1938 no último
andar, e desapareceu, até o sub-porão. Quando você ver, você verá
por que razão. O Livro da Genealogia ajudará. Você deve olhar
para os Portões [do Não-retorno] do Benin, onde os britânicos
vieram e derrubaram os mestres nigerianos. Em Nova York, na
Eighty-First Street e Eight Avenue, no American Museum of
Natural History, veja o tipo de trabalho em metal da alta cultura
das pessoas da África Ocidental.
E então, quando outras pessoas lhe dizem que “seu povo
não é civilizado”, você precisa olhar ao redor, porque foi no
British Museum que um homem com o nome de Sr. Ernest A.
Wallis Budge traduziu o livro que ele chamou de O Livro dos
Mortos e o Papiro de Ani [The Egyptian Book of Dead and
Papyrus of Ani], e veja como este pré-datou a Bíblia King James
em mais de quatro mil anos. Você também verá que os Dez
Mandamentos saíram de uma seção chamada Drama Osiriano
[Osirian Drama]. Você precisará olhar para o Livro dos Portões
[Book of Gates], também traduzido aqui em Londres. Veja aqui
mesmo, no porão ou no piso acima para exibição. Então você
precisa olhar para um museu para ver a civilização. Assim como o
Dr. Clarke disse: “Você terá que fazer o mesmo na Áustria,
Moscou, Nova York, Washington, Itália, Grécia, ao acaso, para
encontrar a África”. Não é estranho? Você precisa olhar para todo
o “Ocidente” para encontrar a África, porque o “povo ocidental”

tenham sido responsáveis pelo dano, de fato – assim como, também, deformações
do tipo pudessem ser resultantes de práticas antigas Keméticas. Tem um artigo que
fala sobre isso (clique aqui e acesse). Por outro lado, desde Chancellor Williams,
passando por Cheikh Anta Diop, Malcolm X, Josef ben-Jochannan (clique aqui), até
Khonsu Nok, existe esta afirmação, categórica, de que a “deformação” nos narizes
foram provocadas pela inveja do europeu racista – um autor europeu, Volney, relata
a surpresa e perturbação dos franceses frente às nossas Mer Khut (à despeito de
“pirâmide”) e Heru-em-Akhet (e não “esfinge” – ou mesmo “Abou al-Hole”, que
sabemos, graças a Malcolm X, significar algo tipo “O Pai de Tudo”).
não veio nos trazer nada. Eles vieram para levar tudo, incluindo
nós.

Quero saber onde podemos encontrar mais e libertar

Q nossos tesouros Africanos, não só na Grã-Bretanha,


mas também na Europa. E quando falo da Europa,
também falo dos Estados Unidos da América. Eu
tenho aqui na minha mão um documento que afirma que os
governos egípcio e sudanês geralmente permitem divisões dos
achados feitos em escavações, não só para as sociedades
exploratórias egípcias aqui na Europa, mas também em outros
países europeus. Gostaria que, como meus dois irmãos, eles
pensem se isso é certo, e como podemos ter com os governos
egípcio e sudanês para pôr fim a esta pilhagem de nossas
grandiosas obras de arte?

Dr. Clarke: Como egiptólogos, estamos lutando por vários anos,


mas vamos dar uma resposta sobre o porquê. Os governos do
Egito e do Sudão não são administrados por Africanos. E quando
os governos do Egito e do Sudão eram dirigidos por pessoas cujas
mães eram Africanas, ou seja, Nasser no Egito – cuja mãe era
sudanesa, ou de outra forma chamada nubiana, e a mesma coisa
para Sadat – seus pais eram árabes e no islamismo seu pai
substitui sua mãe em sua linha sucessão. Os árabes não se
importam com os tesouros no Egito ou no Sudão, pois, em
primeiro lugar, eles também consentem quando os cristãos
chamam de “pagão”, “idólatra” e assim por diante. A única razão
pela qual eles mantêm essas riquezas é: trazer dinheiro ao tesouro
via turismo. Então, quando lutamos contra eles, nesse ponto, eles
cedem. Você veio de Oshkosh e você encontra dois objetos
qualquer, de forma que você fique com um. Este é o seu
pagamento – como se eles já não tivessem tomado o suficiente. E
isso foi apenas quando o Egito obteve “independência” – sob
controle árabe. Portanto, os dois governos não têm interesse. Eles
não se veem como Africanos. Consideram-se como parte do
mundo árabe. Apenas um chefe de estado no norte da África se
considerava Africano, e era Ben Bella, que se juntou a Nkrumah, e
lembraram a eles (i.e., Árabes) que eles estavam na África há
1300 anos e ainda estavam agindo como europeus.
Você vê, quer lidamos com a realidade e enfrentamos as
questões ou não. E muitos irmãos assumiram o islã emocionados,
para tentar defender a causa árabe. Não me importo se você
assumir o islã. Você pode assumir qualquer religião que você
deseja. Mas não misture islã e Arábia – ou um árabe com o islã.
Você deve lidar com a posição árabe, como ele ou ela se coloca.
E, assim, minha irmã não tem interesse pela Liga Árabe, que eles
ainda se autodenominam – a OUA15 está subordinada a eles. E é
somente quando uma questão é motivo de preocupação para a
Liga Árabe, que eles então pedem a OUA para apoiar sua posição.
Mas quando a questão se torna francamente Africana, eles não
fazem nada sobre isso. E eu digo a você e aos irmãos – vá e veja
por si mesmos. Vá para o sul do Egito, agora chamado Núbia
Egípcia – veja o que eles fizeram em quarenta e nove aldeias
nubianas, por causa da nova barragem e do lago Nasser.16 Olhe
para o chefe de Estado do Sudão hoje. Basta olhar a foto e ver por
si mesmo. No entanto, ele não pode ver o Sudão, porque ele deve
ver o islã antes que ele possa ver o Sudão, e essa é a tristeza.
Vemos o cristianismo antes de ver a África. Nós vemos o
judaísmo antes de ver a África. Vemos todas essas coisas
estrangeiras, que basearam todos os seus alicerces na África,
voltando para a África – e esquecemos a história.
Penso que antes que você possa reivindicar qualquer coisa,
você deve primeiro questionar a mentalidade que criou esse temor.
Uma vez que você reivindica a mentalidade que criou a
admiração, você pode tirá-la daqueles que a roubaram.

1251 a.e.c. parece ser o ano da quebra efetiva do

Q poder do domínio Africana-árabe na Espanha. Você


pode nos dizer a motivação para o início real do
tráfico de escravos na África Ocidental? Você pode
nos dizer se essa resposta à presença Africana-árabe em Espanha
e em Portugal foi uma resposta aos termos de uma vingança ou foi
motivada por fatores de comércio ou fome, conforme apontou?

Dr. Clarke: Você respondeu à questão do topo. Vamos tomar a


questão de fundo, que é, os Africanos são puritanos com todas as

15Organization of African Unity, OAU. Ou Organização da Unidade Africana, OUA.


16Que, como se não bastasse, afogou sítios arqueológicos milenares, de mais de seis
mil anos, o que comprovaria nossa anterioridade – como cada descoberta tem feito –
no caso em questão, na arquitetura, visto que o primeiro castelo jamais construído –
o Castelo Buhen – ali se situava antes da construção da represa pelos árabe-egípcios
e colonialistas britânicos. Saiba que Buhen serviu de modelo pros castelos erguidos
pelos Mouros na Europa, assim como para os castelos medievais e árabe-islâmicos.
“Como todas as fortalezas núbias, não pode ser movida e ficará submersa pelas águas” –
dizia um documento da UNESCO de 1960. Em outro ponto, “Afrescos devem ser
retirados; os baixos-relevos devem ser cortados; pequenos templos devem ser desmontados
pedra por pedra e reconstruído em um lugar mais seguro”. Tire suas próprias conclusões.
religiões que assumem. Eles deixaram o Papa, Abraão e Maomé.
Os argumentos reais que enfraqueceram o domínio Africano-árabe
na Espanha são argumentos entre os Africanos e a interpretação
árabe de sua fé. E isso começou com a segunda invasão árabe. A
primeira invasão árabe foi um fervor religioso. Os árabes estavam
varrendo o norte da África. Alguns deles entraram na Espanha
com o argumento inicial sobre o que agora pode ser considerado
por algumas pessoas como uma questão menor sobre o tratamento
das mulheres. Os homens se casavam com mais do que as quatro
costumeiras e as mulheres estavam hospedadas na Igreja Católica.
O Africano, sendo um puritano, ressentiu-se disso. Outra era que o
árabe sofreu um problema de identidade, e quando a Europa lhe
ofereceu uma oferta, ele fez os Africanos ficarem a favor do
europeu. Os Africanos, especialmente no norte da África,
começaram a se mexer em direção ao ocidente, com Mansur [al-
Mansur] e a destruição do Sudão. O Sudão Ocidental – Songai –
obteve assistência do Ocidente, e eu tenho uma carta entre Mansur
e a Rainha Elizabeth da Inglaterra dizendo que “se você me ajudar
a destronar a Antonio da Espanha, eu lhe darei munições para
destruir os negros no Sudão Ocidental”.

Dr. ben-Jochannan: A primeira parte do que você declarou foi


novamente a carta de Bartolomeu de las Casas ao Papa Júlio II. O
primeiro grupo de Africanos a ir a uma ilha do Caribe, Hispaniola,
agora chamado de “Haiti e Santo Domingo”, não veio direto da
África. Eles vieram da Espanha. Foi quando eles começaram a se
livrar dos Africanos na Espanha, depois que os Mouros perderam
o poder, que os primeiros 4.000 foram enviados para o Caribe
como escravos. Os espanhóis começaram a atacar a costa da
África do norte e noroeste. Então, sim, a Igreja Católica Romana
ainda estava participando dos Cavaleiros de Malta e dos
Cavaleiros de Gênova – que o Papa colocou a cargo da eliminação
dos Africanos da Espanha. É por isso que você vê poucos
Africanos remanescentes por lá hoje. Os espanhóis os levaram
primeiro como vingança por 774 anos de dominação
mourisca/Africana da Espanha e do resto da Península Ibérica.

Dr. Clarke: Agora, o que você tem que entender em um sentido


amplo é que nós fomos um povo que, através da história – nossos
amigos nunca foram recíprocos para com nossa amizade, quando
houve amizade – durante a história, só firmamos alianças por
conveniência – da parte deles. Foi conveniente aos árabes nos
desviar e, literalmente, nos vender – e nós éramos a força militar
que os manteve na Espanha – e eles se viraram para nós. Agora
havia um outro júbilo na Espanha, que não só era protegido pelos
Africanos e os árabes quando os Africanos perderam o poder. Eles
eram os Grandess [título de nobreza? cambistas!], os gerentes do
dinheiro da Espanha – e eles não tiveram dificuldade em se tornar
os gerentes de dinheiro da escravidão. Eu deixarei para você
adivinhar quem eles eram.17

Você poderia dizer algo sobre os judeus que

Q financia(ra)m o tráfico de escravos?

Dr. ben-Jochannan: Existem judeus cochim [nome da cidade


onde historicamente residem, Cochim] da Índia, judeus iemenitas
do Iêmen, judeus porto-riquenhos de Porto Rico, judeus etíopes da
Etiópia [falashas de Beta Israel, antiga Axum], e nós, todos nós,
parecemos diferentes. E os da Espanha, eu não fiz a ligação, eram
todos europeus. Então, sim, a razão pela qual você tem os nomes
de Abraham, Solaire, DeSola e outros nomes semelhantes nas
Ilhas do Caribe, e pessoas como eu [a partícula ben significa filho,
portanto, filho de Jochannan], obviamente, vieram dos detentores
de escravos judeus. Ninguém quer lidar com o fato de que os
judeus eram igualmente portadores de escravos, bem como
cristãos e árabes muçulmanos. Mesmo na Bíblia, “os judeus são
titulares de escravos”. E quando perguntei a minha mãe essa
pergunta, ela diz: “Isso é algo sobre o qual não falamos muito”.
Mas no Livro do Êxodo, uma das Ordenanças diz que quando
você compra um escravo hebreu, este recebia um furinho quase
invisível na orelha, o que representava um rito simbólico de
pertencimento ao senhor – já quando você compra um não
hebraico, ou seja, um estranho, não precisava. O mesmo
ministério de sacerdotes e rabinos que lhe diz quem possuiu
escravos não lhe diz que “os judeus possuíam escravos” também!

Dr. Clarke: Quando Mussolini estava exterminando judeus


Africanos (etíopes ou “Pretos”) de 3 de outubro a essa manhã de 5
de outubro de 1935; naquela manhã, quando ele deixou cair a
bomba sobre nós no Wal-Wal District, nenhum dos “judeus
ocidentais” respondeu. O professor Tammarat Emmanual, da
Comunidade Hebraica da Etiópia, chegou aos Estados Unidos

17 Judeus.
para implorar ajuda dos judeus na América. Eles lhe deram apenas
$400, colocaram-no num barco que teve que atravessar o Canal de
Suez, no Mediterrâneo – que depois atravessou o Oceano
Atlântico. Quatrocentos dólares, mas eles não sabiam que 1938
e.c. estava chegando. Agora era 1938, e então os judeus europeus
começaram a chorar. Mussolini já havia exterminado 4,5 milhões
de judeus na Etiópia. Erámos 5 milhões, então ele veio; nos
deixou com 500 mil, e o mundo não disse nada sobre isso. Então
sim, não me impede de lidar com o fato de que os judeus europeus
em Espanha participaram plenamente como Grandess (agencias de
câmbio, cambistas) e como comerciantes. Eles trocaram as joias
de Isabella e coisas assim para obter algum dinheiro porque a
coroa espanhola estava quebrada – e eles precisavam do dinheiro
para o tráfico de escravos!
Isso é história. Você não precisa do Ministro Farrakhan dos
“Muçulmanos Pretos” para inventar isso, nem do Reverendo Jesse
Jackson. Você não pode negar que os judeus europeus eram, e são,
parte do colonialismo europeu e do imperialismo. Onde
cometemos o erro – foi em separar os dois! Os judeus europeus
são europeus. Quando os europeus se deslocam porque nos
mudamos pro bairro, sejamos nós ateus ou cristãos e budistas – os
judeus também se mudam. Eles não se movem porque são judeus,
eles se movem porque são brancos. Eles são europeus, e isso é
algo que devemos entender; eles jogaram um bom jogo.

Esta questão é em duas partes e é dirigida a ambos.

Q Em primeiro lugar, você concordaria com a visão do


[Partido] Panteras Pretas de que um povo está sempre
sujeito à escravidão. Em segundo lugar, depois
de nos libertarmos mentalmente, depois de nos reeducarmos em
nossas terras históricas e assim por diante, por que ainda devemos
encontrar os obstáculos que nos impedem de obter esse desejo de
emancipação, igualdade e justiça da forma como realmente vemos
aqui na Terra? Você concordaria com essa luta de forma violenta
– e você diria que é necessário usar isso para alcançar o que
desejamos?

Dr. Clarke: Você respondeu sua própria pergunta porque


nenhuma pessoa se libertou, nenhuma pessoa privada da
nacionalidade recuperou essa nacionalidade sem violência. A não-
violência foi uma estratégia que Martin Luther King usou e é uma
estratégia que, [só] então, começou a ser usada. A não-violência
não era um modo de vida, mas era uma alternativa à espera, nos
bastidores. Os hebreus usaram violência, historicamente e no
presente. Agora, quanto aos Panteras, a declaração no veredicto
dos Panteras foi dada a eles por liberais brancos equivocados que
ficaram de canto. Eles não fizeram nada quando os Panteras foram
mortos por colegas brancos, e isso diz novamente sobre o conceito
de alianças. As alianças só nos usam, e se afastam de nós quando
realmente precisamos delas.

Dr. ben-Jochannan: Tendo ouvido meu ancião falar, eu estava


em duas guerras, uma em que o presidente dos Estados Unidos da
América me enviou uma carta. Eu estava na época em Porto Rico.
Ele disse: “Seu país precisa de você” – eu não sabia até aquele
momento que eu tinha um país. Isso, e o tratamento que eu estava
recebendo! Eu estava na universidade então; subi com duas barras
no meu ombro, sendo um capitão Preto; Eu não poderia falar a um
branco – privado de me cumprimentar. Isso mudou radicalmente,
mas ainda assim? Da segunda vez – eu ofereci-me! Este foi o caso
em que o Partido Afro-Shirazi estava lutando contra os árabes pela
independência no Zanzibar. A guerra não é o melhor meio, é a
hora em que você poderá ter que matar sua própria mãe, a
depender do lado que ela siga. Acho que se tivesse que me
perguntar: “Você mataria sua mãe na guerra?”, eu diria, com
relutância, “dependendo da posição dela”. Se uma mãe toma uma
posição contra seus filhos, para a nossa morte – ela pode ter que
morrer; e não há ninguém que eu goste mais do que a minha mãe.
Então eu digo: “um percevejo não gosta de ser esmagado até a
morte; vai lutar de volta”. Não estou aqui para lhe dizer quando e
onde, ou como, em público; eu não vou. Dr. Clarke lhes disse que
apoiamos a luta, mas não vamos dizer contra quem, quando ou o
quê, porque o momento mais calmo da sua vida é quando você
está dormindo. É quando um grupo de pessoas decide atacar,
porque ninguém fala, e é por isso que sei que a guerra na África
do Sul não começou. Os jovens estão lutando, mas a guerra na
África do Sul não começou. A guerra começará quando a mulher
Africana se cansar de ouvir que seu pequeno adolescente ou
menina foi para a escola e voltou para casa em um cartão ou
caixão. Ela fará o que fez antes. Sim, estou alertando Botha.
Lembro-me quando uma mulher Africana colocaria veneno em
leite, obteria uma doença especial para o inimigo – ou, ao invés de
tocá-los, cometeria suicídio. Ele virá. Por isso que eu nunca
organizo mulheres Pretas. O que eu vou fazer é conseguir um
filho, organizá-lo e levá-lo com uma caixa de dinamite nas mãos –
e levá-lo à luta. Se você quiser ver um tanque, avião e submarino,
todos em um apenas, diga a ela [a mulher Africana] quem fez isso.

Como alguém preocupado com os jovens Pretos deste

Q país, gostaria de pedir sua opinião. Depois de ver o


que o sistema educacional neste país tem feito para os
pretos e as coisas trágicas que têm acontecido com
esse sistema que não os ensina sobre si mesmos, sobre nós e sobre
nossas vidas passadas, o que você sugere neste momento a fim de
corrigir alguns dos danos que lhes foram feitos nos últimos dois
anos? E para evitar eles de pararem na prisão, e para poder saber
onde eles estão indo em suas próprias vidas, gostaríamos de saber
– como enfrentar essa situação?

Dr. bem-Jochannan: Dizem que um homem que dá conselhos


deve ser capaz de lidar com isso. Eu ataco isso na minha casa.
Ensino minhas meninas e meninos; e, a propósito, não apenas faço
palestras. Eu tenho doze crianças biológicas, nove meninas e três
meninos com três mulheres Africanas. Dois morreram e eu tive o
terceiro por trinta e oito anos. Mas falar com um garotinho como
você, leva para uma menininha... bem! Você vê, o que acontece é
que as mães não estão falando com seus filhos e ensinando o
respeito de seus filhos pela sua mulher. Você vê, se eu respeito
minha Mama, vou respeitar as mulheres Pretas, e essa é a razão
pela qual eu sou como estou na prova do espelho. Eu literalmente
dou a eles, quando atingem a idade de consentimento – eu dou um
espelho, um pedaço de papel e um lápis. Eu digo, escreva o que
você vê no espelho. Então eu digo, olhe para sua mãe, veja seu pai
– e escreva o que você vê. Desenhe uma foto de nós, todos nós;
você, sua mãe e eu. Então eu faço uma crítica da imagem, ou
qualquer outra coisa que seja escrita. Primeiro, a apreciação do eu
e da família e do grupo racial; então faço ao meu filho um exame
para cada semana. Quando ele (ou se) tem um exame escolar todas
as semanas – ele também terá o exame extra no sábado: vinte
perguntas – e ele não comeria até que termine a lição. Nunca me
preocupo com minha filha, quando tem quinze ou dezesseis anos,
não me preocupo. Ela é treinada, o cérebro lavado – programada
mesmo. Então, quando eu vou dormir com sua mãe, não me
preocupo, porque a preparei para tudo, incluindo namorados. Ela
sabe como lidar com namorados. Eu preparo meus filhos e minhas
filhas, e eu acho que o primeiro passo é que os irmãos devem
apreciar irmãs. Um homem disse: “Diga-me como você trata sua
mulher e eu vou poder lhe dizer a condição de sua raça”.
Dr. Clarke: Eu acho que há uma coisa que você sempre deve se
lembrar em qualquer sistema educacional, e é que pessoas
poderosas nunca treinam você para tirá-las do poder, e que seu
opressor não pode se dar ao luxo de educá-lo e pedir-lhe para se
tornar um opressor. Você se tornará seu mestre se você fosse
educado corretamente. Se tudo o que foi roubado de nós fosse
devolvido a nós, não seriamos pessoas implorando e implorando –
choramingando. Seremos um povo insistente e exigente e
entraremos nas câmaras do mundo, teremos nossas demandas, e
seremos ouvidos, porque a arte do Poder é a capacidade de reter e
retirar, e, enquanto você puder, faça esse tipo de decisões, você
tem o poder, e a principal decisão que temos de tomar é se
continuaremos a ser a retaguarda para o outro povo, e lembrarmos
que eles jamais formaram uma sociedade para ninguém além
deles. Se você quer uma sociedade onde você estará sempre
confortável, você terá que fazê-la você mesmo.

Dr. ben-Jochannan: Eu acho que foi Frederick Douglass – em


1856 ou 1858 – que foi questionado sobre por que ele se recusou a
falar em 4 de julho (dia da independência dos EUA). “O que um
Negro tem que comemorar no dia 4 de julho?” Ele disse: “Há
aqueles que amam a liberdade depreciando a agitação – eles
querem o oceano sem o estranho rugido de suas águas” etc. Outro
homem da Jamaica, Índias Ocidentais, Claude McKay, enquanto
nos EUA durante 1919, respondeu Douglass dizendo:

SE NÓS HAVEMOS DE MORRER18

Se nós havemos de morrer, que não seja igual aos porcos


Caçados e encurralados num lugar inglório
Enquanto ao nosso redor ladram os cães raivosos e famintos
Fazendo seu arremedo à nossa maldita sorte.

Se nós havemos de morrer, Ó que morramos nobremente


Para que nosso sangue precioso não seja derramado
Em vão; assim até mesmo os monstros que desafiamos
Serão constrangidos a nos honrar embora mortos!

18Esta versão da poesia de Claude McKay – em sendo um de seus romances, Banjo, a


story without a plot, segundo o próprio Aimé Césaire, bojo do movimento Négritude –
foi retirada do livro Sitiado em Lagos, de Abdias Nascimento.
Ó patrícios! devemos encarar o inimigo comum!
Apeas de sermos menos vamos nos manter bravos
E para mil golpes seus desferir um golpe mortal!
Que importa que se abra a tumba diante de nós
Como homens enfrentaremos a matilha assassina, covarde
Encostados à parede, morrendo, porém revidando os golpes!

Fomos lembrados uma vez mais da nossa tarefa,

Q digamos, para a reeducação e para informar o nosso


povo – reeducá-los de volta ao caminho da soberania.
Você tem feito maravilhosamente pela população
adulta, para aqueles que gostariam de aceitar, e não rejeitaram a
verdade. Minha pergunta para você é, e as nossas crianças pretas –
de quem dependemos para continuar na estrada para a vitória?
Agora, muitos de nós temos a informação que você tem. Eu
adoraria vê-lo simplificando, de alguma forma, para nossos jovens
pretos. A última coisa que o Dr. Ben disse foi construir algo para
adolescentes, mas temos uma estipulação, como sabemos, para
instruí-los enquanto eles são jovens, digamos, aos sete. Nós temos
uma situação agora no Reino Unido, encarando os rostos de tantas
crianças pretas que negam a cor da pele. O que você está fazendo
para passar essas informações?

Dr. ben-Jochannan: Eu respondo isso, porque, como eu disse, eu


estou acostumado com essa condição. Tenho quarenta e sete netos
e sete netas, então você sabe que eu tenho essa condição. Há uma
coisa na América chamada programas Head Start. As crianças de
três a cinco anos frequentam o programa antes de ir aos jardins de
infância regulares. Eu vou para um desses todos os meses. Eu me
sento ao chão – não com este terno de camuflagem de três peças.
Sento no chão com crianças pequenas, de três a cinco anos,
falando com eles sobre a história, o passado, sobre seus pais. O
professor Clarke atuou em uma coisa chamada Haryou-Act. Não
eliminou nenhum grupo etário de pessoas Africanas.
Existem outras pessoas nos Estados Unidos que traduzem o
trabalho, como o nosso, para o idioma do jovem das escolas
primária e pré-elementar. Há muitos outros escritores que estão
fazendo isso, como a Dra. Barbara Jackson e Beryl Banfield. Há
uma série de outros livros infantis nos Estados Unidos que
mostram heróis Africanos, heróis do Caribe e assim por diante, e,
junto com estes, existem várias escolas Africanas independentes,
algumas das quais estão morrendo por falta de fundos. Alguns de
nós não querem que ninguém saiba que estamos numa luta
ininterrupta.
As escolas livres Africanas não são coisa de hoje, elas
sempre estiveram lá, exceto que aqueles de nós, com nossos
grandes empregos, se recusaram a enviar nossos filhos para as
escolas livres Africanas. A igreja Africana, infelizmente, é o
veículo que costumava educar nossos filhos – não programar,
educar! Elas [as igrejas pretas] já não fazem isso. Se tornaram
confortáveis casas de meretrizes; mas há algumas que ainda
continuam – então não desista, mantenha a esperança, irmã. O que
precisamos é um rejuvenescimento. Precisamos dizer ao ministro
em nossa comunidade, se ele não pregar sobre a vida, ao invés da
morte – ele vai correr uma milha de cross-country para nunca
mais voltar. É isso. A igreja é onde a maioria de nós estamos,
enfrentemos – ou a sinagoga, ou a mesquita. Diga ao irmão, ao
ministro ou ao rabino, para programar, e você tem que ter certeza
de que ele o faz; caso não o faça, quem está por trás disso?
Elimine-o. Ele tem cafetinado o suficiente sobre você; se ele
quiser dez por cento dos seus salários – mande-o trabalhar por
isso. Ele deve dizer-lhe para se preparar para a vida, e não para a
morte. Apenas um tolo está preparado para a morte. Um homem
que recebe um novo Jaguar não está preparado para a morte, ele
está se preparando para dirigir aquele Jaguar. Se ele não viver com
o que ele diz – é por isso que nada acontece! Você não
responsabilizou ninguém pelo que eles estão falando.

Gostaria de agradecer aos dois irmãos por ter vindo

Q aqui para nos dar o benefício de seus conhecimentos.


Gostaria de fazer uma pergunta sobre isso hoje, em
direção a nossa história, porque é muito importante
que a nossa história seja conhecida, porque não podemos avançar
até que saibamos de onde viemos.
Há pessoas hoje – pessoas Africanas – que sentem que
nosso futuro consiste em ter um pedaço do bolo, um pedaço da
torta e, na verdade, um irmão muito estimado veio aqui e nos disse
que devemos nos envolver na força policial. Que temos de chegar
ao Parlamento. Eu vejo como a estrada pela qual deveríamos estar
andando agora. Muitas pessoas que sabem muito sobre a história
também estão indo naquela direção, e estão dizendo a todos que é
para lá que deveríamos ir. Eu sinto que isso seria destrutivo para
nós, para nossos netos, para nossos bisnetos. Gostaria de saber de
vocês, irmãos, se você concordaria conosco – com algum pedaço
dessa torta que nos foi roubada, ou se, como eu acredito, temos
que destruir, desmantelar a estrutura que eles criaram – ou
continuar ainda comendo a torta e começando tudo de novo, e ver
se podemos fazer outra torta.

Dr. Clarke: A estrutura vai se destruir. A estrutura está


caminhando para isso. Seu trabalho é criar a atmosfera para uma
nova sociedade humana, principalmente para o nosso povo. Se
nossa gente se beneficiar com isso, está tudo bem. Não acredito
que exista uma solução capitalista para o seu problema. Eu
também não acredito que exista uma solução comunista ou
socialista, a menos que seja uma forma que você defina para
atender às suas necessidades. Eu não acredito que alguma pessoa
vai encontrar uma solução para você, senão você mesmo, e eu não
acho que seja a intenção, ou programa, ou agenda de alguém
encontrar uma solução para você ou para o seu irmão ao lado. Não
importa o tipo de “ismo” que escolhemos, lembre-se de que nunca
veio nada da mente europeia que não tenha uma intenção cristã – a
viabilização dos europeus para o controle sobre o mundo. E uma
vez que você está ciente disso, você saberá o que você tem a fazer.
Pegue tudo o que você acha que pode usar – cristianismo,
islamismo, judaísmo, qualquer coisa. Mas dê forma a suas
necessidades, e não peça desculpas depois de fazê-lo.

Dr. ben-Jochannan: Eu acho que o irmão precisa afiar sua visão.


Nunca vou candidatar-me a um escritório em nenhum país, mas
pessoalmente, quem quiser correr, que corra, desde que o
indivíduo tenha feito, com dedicação, ações ao meu povo, e seu
objetivo seja a destruição da opressão. Você vê, não se trata de
entrar no sistema. É o propósito de entrar no sistema. Eu ensino
em uma escola branca, a Universidade de Cornell, eu fiquei lá por
quinze anos. É a primeira escola, de quarenta e sete escolas, da
qual não fui demitido. E a razão pela qual não fui demitido é
porque o diretor é um Africano-americano, não que eles não
tenham tentado. Mas você vê, irmãos e irmãs, para obter o
programa que eu ensino, os alunos tomaram armas e queimaram
muitos dos edifícios no campus. Lá ensino sob uma orientação
Africana. O sistema é um sistema branco. Meu cheque de
pagamento é assinado por um homem branco, e recebo esse
cheque a cada duas semanas. Mas parte desse cheque é para o
Comitê dos Treze que ajuda o PAC [Congresso Pan Africano].
Você vê, eu não ajudo pessoalmente o ANC [Congresso Nacional
Africano]. Eles têm ajuda liberal suficiente. Ajudo os irmãos e
irmãs que carregam com eles pequenos panfletos sobre Marcus
Mosiah Garvey nos bolsos, o PAC. Esses são os irmãos e irmãs
que dizem: “Não estou compartilhando minha terra com
ninguém”.
Então, se o irmão ou a irmã de quem você está falando é
obrigado à comunidade Africana, e você sabe o que ele está
fazendo; você sabe que tipo de medidas ele vai apresentar. Então
você vai e reza para Jah. Rezo, e se você me ver orando, e você
me fez algo errado, você deve começar a correr, porque nunca
pedi nada a Deus. Eu vou para a Deusa. Você vê as pessoas que
rezo para serem mulheres, porque os homens não se apressam
para mudar as coisas. Cheguei à irmã e disse: “Mãe” – você sabe
que minha mãe morreu há alguns anos atrás, então eu digo: “Mãe,
Deusa, eles estão mexendo com seu filho novamente”. E minha
mãe sempre me dá a resposta correta. Minha mãe nunca me pediu
para rezar. Se alguém me atingisse, ela dizia: “Mate o bastardo e
volte e reza para mim, garoto!”. E então eu rezo, e digo:
“...obrigado por me programar”.

Perguntei-me se um ou ambos os discursadores me

Q ajudariam com a minha própria história. Minha


pergunta foi realmente provocada por algo que o
professor Clarke disse quando falou sobre a luta que
ocorreu na fronteira da Guiana-Suriname, onde ainda existem
números inteiros de pessoas que são Africanas em todos os
sentidos da palavra. Eu acredito em 1957, antes ou depois de Gana
ter sua independência – um ganês chamado Ezie Agyare visitou a
Guiana e muitas pessoas a partir daí falaram em uma linguagem
comum a eles e ao seu rei. Estou correto ao dizer que havia um rei
chamado Ezie Agyare e, em caso afirmativo, você pode me contar
mais sobre ele e sobre a luta?

Dr. Clarke: Eu tenho que magoar seu coração, mas o conheci


pessoalmente, e ele foi falso. Ele era um estudante nigeriano com
um jogo de vigarista. Ele era um nigeriano muito interessante, e
quando eu fui para a Nigéria procurando por ele, eu nunca
consegui encontrá-lo, porque ele sempre saiu da cidade no dia
anterior à minha chegada. Houve muitos reis verdadeiros, mas ele
não foi um deles. Eu o conheço a tempos, conheci o livro que ele
escreveu depois que ele voltou da Guiana e sabia que era um bom
show game, mas não real.

Dr. ben-Jochannan: Ao mesmo tempo, isso não diz que você


está falando sobre o “Djuka”, que também se chama “Mingre”. O
povo Mingre lutou contra os holandeses, ganhou sua
independência e subiu nas terras altas. Eles ainda estão planejando
construir uma estrada central que vai impor à cultura do povo
[Mingre]. E têm medo disso; e sim, eles estão no mato, mas
lembre-se, houve um estudo de dois médicos da Universidade de
Harvard que descobriram que essas pessoas, quando eles
quebravam ossos, não operam. Eles têm tratamento de arbustos
para que, em vinte e quatro horas, você possa andar; e a Howard
University Medical Association concordou que isso aconteceu.
Eles foram ver, mas ainda chamam os praticantes de médicos.
Entre os Mingre, uma porcentagem da população possui
doutorado nas melhores escolas em todo o mundo. Eles retornam
às fazendas, se desligam do diploma. Eles só professam defender-
se contra slicksters como resultado desse falso rei. Nós temos um
novo na América, que diz que é o filho de Selassie. E há muitos na
América que acreditam nisso. Fui para Nova Jersey para conhecer
este irmão, porque ouvi dizer que ele veio do noroeste; então
pensei que, se ele fosse do noroeste da Etiópia, ele entenderia meu
idioma19, mas ele não o fez. Então nós temos alguns desses, mas
os Mingres são nosso povo; estabeleceram sua própria república e
eram uma parte independente da Guiana colonial da Holanda, que
se tornou a República da Guiana.20

Eles dizem que a história é o melhor professor. Se

Q assim o for, o que devemos aprender com as nossas


experiências como cativos dos europeus?

Dr. ben-Jochannan: Já fizemos muito. Uma das poucas coisas


que podemos fazer é lidar com a mente. Você sabe, isso me
incomoda, ir para Antígua no Nelson’s Wharf [cais fundado pelos
britânicos na ilha referida]. Lord Nelson assassinou mais pessoas
do que você pode imaginar! Temos que parar e pensar sobre como
as pessoas nos vêm; e que não somos menos do que ninguém. Se
um inglês pudesse odiar o que um alemão fez com ele, por que o
inglês quer que eu ame o que ele fez comigo? Se ele ou ela não
entende, isso é seu problema. Eu entendo! Precisamos mudar a
mente do nosso povo. Em Trinidad, alguns meses atrás, eu estava
lá dando algumas palestras, e eles tiveram um grande argumento

19Yosef ben-Jochannan nasceu na Etiópia.


20 Os Djuka são uma das seis tribos de Maroons descendentes de Africanos
escravizados alijados no Suriname como trabalhadores de plantation no final do
século 17.
sobre mudar [o nome de] uma rua [Princess Anne Boulevard],
uma avenida em Trinidad, para [honrar] o primeiro líder
sindicalista trinidadiano, um dos homens unionistas mais fortes
em todo o Caribe – ao invés de uma [homenagem à] Princess
Anne. Por que eles têm esse argumento no Parlamento? A menos
que tenhamos aceitado que somos menos do que qualquer outro
ser humano, não podemos ver nenhuma outra maneira além dessa
maneira negativa em lidar com pessoas Africanas. Não podemos
aceitar nossa inferioridade, nomeando nossas crianças com nomes
europeus como Margaret, Mary, Elizabeth e John. Muito pelo
contrário – você pode encontrar alguns nomes Africanos cheios de
significado.

Antes de fazer a minha pergunta, gostaria de felicitar


o
Q o Professor Ben porque o admiro muito ao referir
questões diretas aos seus anciãos. Eu gostaria que ele
me referisse também. A questão é que viver na
América sendo um excelente estudioso, alcançar o objetivo mais
alto – você pode fazer isso para aliviar os medos, como falar
pessoalmente com seus próprios filhos? George Washington
deixou um memorial para todos nós, para oferecer uma
oportunidade para crianças infelizes, feias e despidas.

Dr. ben-Jochannan: Eu nunca desobedeci aos idosos, então vou


lhe dar algumas das coisas que eu acho que fiz, o que pode ser
aceitável para você. Em 1938, publiquei meu primeiro livro sobre
a África. Desde 1938, publiquei trinta e dois livros sobre a África,
e escrevo-os de tal maneira que possa ser lido até por aluno do
sétimo ano. Eu também tenho catorze outros manuscritos e uma
enciclopédia de sete volumes. Eu estabeleci minha própria editora.
Enviamos para prisões, hospitais e certos lugares, livros gratuitos
para prisioneiros Africano-americanos, Africanos [nascidos no
Continente] e Africano-caribenhos. Eu ensino agora mesmo em
uma escola chamada Malcolm-King College e nos últimos dezoito
anos consecutivos, de forma voluntária, todas as noites de quinta-
feira eu ensino na comunidade do Harlem. Participo dos
programas de Head Start em oito escolas públicas, sem nenhum
custo, para dar aulas à irmãs e irmãos bem jovens. Eu frequento
um lugar chamado Pan-Pan Restaurant, perto da esquina da West
135th Street, onde moro. Nunca um membro da comunidade
Africana veio até mim e disse: “Estou com fome”, para eu não
dizer “Pegue o que quiser no menu”. Eu tenho que dizer o que
faço com meus filhos, porque nunca deixei uma criança que
chegue até mim precisar de comida, roupas e abrigo.
Senhor, se você me perguntar pessoalmente, eu era
engenheiro civil. Trabalhei para muitos projetos e para muitas
pessoas sem custo algum; e como advogado tomei vários casos
quando eu era um profissional legal, de graça. Eu treinei meus
filhos de modo que uma das minhas filhas trabalhe como médica
em uma clínica apenas dois dias por semana para seu próprio
bolso, e depois quatro dias para as pessoas em Porto Rico, com
um dia livre. O marido também faz o mesmo. Eu treinei meus
filhos, primeiro, para cumprirem seu dever para com o povo. Eu
me ofereci e fui a Zanzibar, lutei fisicamente pelo meu povo. Faço
o melhor que posso nessa minha curta vida, senhor.

Dr. Clarke: Há uma necessidade de criar uma literatura simples


que explique sobre o que aconteceu com nós e o que ainda deve
acontecer – saibamos que alguns de nós, não o suficiente, estão
tentando criar e promover a base dessa literatura. Entre outras
coisas, sou um especialista em currículos e conselheiro dos
sistemas escolares, e não aqueles da cidade de Nova York; é
impossível, porque este é um sistema escolar capitalista
controlado por um grupo étnico que continuará a controlá-los.
Quando Eric Huntley, que vive aqui e é um dos editores do Bogle-
L'Ouverture, estava em Nova York, ele me visitou – foi à minha
casa e conversamos sobre a possibilidade de fazer livros infantis.
Mais particularmente, livros infantis direcionados para a
comunidade caribenha na Inglaterra. Ele afirmou que alguns de
vocês podem ter até três países. O Caribe é seu por direito –
porque sua mãe e seu pai vieram da África naturalmente, pela
história que pertence a você – e você é afortunado, porque você
tem duas escolhas de patrimônio, ambos Africanos.
E acho que o que devemos fazer, entre outras coisas, é
carregar nossos escritores para explicar cada vez mais nosso papel
na história, falando em um idioma que as pessoas comuns possam
entender. Uma das principais razões pelas quais Malcolm X teve
muito conhecimento e foi ouvido era que ele falava em uma
linguagem que comunicava ao público em massa, se comunicava
para com pessoas comuns. Eu acho que precisamos tirar a situação
do alto de sua linguagem acadêmica e traduzi-la para um idioma
que todas as pessoas possam entender. Nem todas as pessoas
podem ser historiadoras – mas podem ser leitores; todas as
pessoas podem ser líderes – cada indivíduo deve finalmente ser
um líder para si mesmo, e o que você precisa decidir é que
precisamos – e devemos ter uma revolução, uma revolução
cultural, uma revolução da mente. E quando você procura um
líder, você não pode olhar em nenhum lugar exceto em um
espelho e olhar para a pessoa que está olhando para você e dizer:
“Minha revolução começa comigo – minha revolução começa
agora”.

Aproveito a oportunidade para dizer algo, porque eu

Q sou sul-africano, e muito foi dito sobre os sul-


africanos, e fiquei satisfeito ao ouvir o que eu escutei
dos dois professores sobre o Nacionalismo Preto. Mas
nós somos confrontados com uma África do Sul que tem o CNA
como vanguarda. O CNA foi um movimento muito positivo em
1912, quando começou, porque os Africanos ainda lidavam em
tribos, e trouxeram as tribos consigo. Porém, desde então, até a
década de 1950, o CNA tornou-se deveras elitista. Se você não
sabe falar inglês no CNA você não é ninguém – de modo que se
elimina uma boa parcela de Africanos.
Venho aqui para dizer que o PAC não é tão poderoso
quanto gostaria. Os jovens de 1976 assumiram a mensagem do
PAC sem sequer relevar os anciãos do PAC, e ultimamente temos
a AZAPO [Organização do Povo Azaniano]. Eles são os jovens
que estão fazendo a revolução em casa, e não o CNA. Eu ainda
estou aqui para dizer que as pessoas que estão lutando contra o
exército dentro do CNA são Africanas, todas elas. Não há um
asiático, não há um colorido, não há um branco. A estrutura do
CNA – as pessoas que estão comandando o CNA – são todos
brancos e asiáticos, contando com alguns negros privilegiados
como Tambo, que estão preparados para ser aparadores de janela
da CNA e dar-lhes respeitabilidade. O que eu quero dizer ao
público hoje é que, quando você vai às reuniões do CNA, e não
falo para não comparecermos – mas assista as nossas para tanto.
As pessoas que estão no comando são, ou asiáticos ou brancos,
com alguns Africanos privilegiados que não se atreverão a falar
com um Africano em qualquer língua Africana, porque será
considerado tribal. A outra coisa que eles não vão fazer – você vai
lá dentro, e eles estão falando sobre heróis Africanos, e a próxima
coisa sobre a qual você fala é [sobre] alguém que foi comunista, e
em uma noite Africana você será alimentado com comida indiana.
Esse é o nosso CNA. Agora, todos vocês têm uma escolha sobre
quem você quer apoiar. Eu não estou dizendo que você deve
apoiar esta parte ou a outra parte, mas esteja ciente do fato de que,
se você está apoiando o CNA – são algumas das coisas que você
está dizendo –, que você está lutando por esta noite, esses são o
tipo de coisas que você estará apoiando nesse partido.

Dr. Clarke: A irmã abriu outra série de palestras; é um pouco


extensa para a noite. Estudei a história da África do Sul antes do
CNA e escrevi um livro sobre as personalidades e as várias
guerras, toda a linhagem Zulu, até a última guerra zulu, em 1906,
a fundação do CNA, a fundação do movimento sindical de
Kamaka Dele e como os movimentos de Kamaka Dele foram
sistematicamente destruídos por esquerdistas enviados para ajudar
– na destruição. Este é o exemplo perfeito da tragédia da
integração. Quando alguém está integrado na sua organização,
eles devem receber ordens de você – ou se retirar. Esta é a última
coisa que me parece que não aprendemos. Na cidade de Nova
York, eu consegui falar para o CNA e o PAC, e quando chegou a
ordem de que o PAC e o CNA nunca se sentassem na mesma
plataforma que eu – eu soube que não era gente Preta. Se ambos
estão trabalhando para a mesma causa e para a libertação da
África, então eles deviam ser capazes de se sentar na mesma
mesa. Esta é a infiltração branca para facilitar o controle branco.

Dr. ben-Jochannan: Minha irmã, você não poderia falar de


maneira melhor, e na tradição Africana, a juventude traz consigo
os anciãos. Eu voltei atrás quando um dos fundadores do CNA
veio aos Estados Unidos, e eu o apoiei pessoalmente – tirando do
meu bolso. Também troquei. Você vê, quando encontro um
homem do CNA e ele me chama de “camarada”, eu digo: “Eu
prefiro irmão”. E ele diz que não pode responder “irmão”, porque
todos no CNA não são necessariamente irmãos no tom de pele;
então eu digo – “você me perdeu”. Lembro-me da UNDENAMO
e FRELIMO [movimentos de libertação em Moçambique]. Eu
apoiei o UNDENAMO contra a FRELIMO porque o
UNDENAMO disse: “Este é o meu país, não estou lutando pela
integração. Alguém veio e tomou meu país. Não estou lutando
para compartilhá-lo com o cara que me roubou”. A Inglaterra não
compartilha seu país com você. A França não compartilha seu país
com você; então por que eu deveria compartilhar meu país? A
Inglaterra compartilhou seu país com os nazistas? Por que me
pedir para compartilhar meu país com as pessoas que o
invadiram? De jeito nenhum! Olhe, quando acabar, e espero ter
mais alguns anos para viver isso – eles me devem uma libra de
carne; e eu tenho direito a minha libra, porque estou pelo menos
1506 ec/AD que devo lidar. Meus antepassados, no outro mundo,
não se contentarão se eu voltar e disser: “Eu estava lá quando
aconteceu!” E quando eles perguntarem: “Você se vingou?” –
“Não, eu dei a outra face!” – Que idiota eu seria!

Gostaria de trazer um ponto sobre religião, mas antes


que eu o faça – ouvi algumas pessoas pedirem ao
Q ancião aqui para se desculpar pelo ponto que ele
levantou. Mas é importante que saibamos que se ele
não tivesse levantado tais e quais pontos não teríamos sido
capazes de ouvir as boas palavras dos irmãos. O que eu quero
dizer sobre a religião é isso, se nos vemos como pessoas
Africanas, temos que ter crenças na religião Africana ou na forma
Africana de acreditar no universo e entender a criação
[cosmovisão e cosmogonia]. E devemos estar conscientes de que
essas crenças Africanas, de certa forma, têm sido a base para as
principais religiões ocidentais, como o islã e o cristianismo que
existem hoje, e que essas religiões nos exploram, nos oprimem,
nos fazem uma lavagem cerebral. Acredito que a prática da
religião nos dará a personalidade e a mentalidade Africanas que
precisamos como base para a união política, social e cultural.
Agora, eu também acho que devemos procurar livrar-nos do islã,
do cristianismo e de outras religiões, porque nos confundem e
privam. Gostaria de ouvir os comentários do irmão.

Dr. ben-Jochannan: Eu responderei dessa maneira. Religiões


Afrcanas servem Africanos – e não devem ser os Africanos a
servi-las. Quando você servir uma religião, essa religião deve
ajudá-lo, pois deve atendê-lo [espiritualmente]. Isso me serviu na
medida em que, quando entrei no templo da deusa Het-Heru (ou
Hathor) em Dendera e olhei para o teto eu sabia onde Deus estava.
Eu não estava procurando por Deus; encontrei Deus! No templo,
eles mostram a deusa Nut, uma mulher Africana que dá à luz o sol
da vagina. É uma imagem. Na maioria dos templos, eles
representaram o Deus da Fertilidade, Min, com seu pênis ligado
ao cordão umbilical de seu umbigo como uma extensão da vida.
No Túmulo do Faraó Ramsés VI, no Vale dos Reis, eles mostram
as quarenta e duas “Admoestações da Deusa Maat”, que também
são chamadas de “Confissões Negativas”, de onde Moisés obteve
os “Dez Mandamentos”.
Não posso deixar de concordar com você. Há aqueles de
nós que seguimos outras religiões e não conhecemos a base dessa
religião – que é nosso fundamento, isto é, os Dez Mandamentos; a
história de Caim e Abel que saiu da história de Deus Seth, que
matou seu irmão Deus Osíris; é representado em muitos templos.
O lugar mais dramático da cidade de Edfu – o Templo do deus
Heru. Eu acho que se nossa gente conhecesse a história e o
desenvolvimento da religião, eles podem ter diferentes pontos de
vista.
Se todas as pessoas conhecessem o cristianismo e sua
origem, de onde veio (como a história de Maria, que se passa 4100
anos após a história semelhante da Deusa Aset [Auset ou Isis] e o
nascimento de seu filho, Deus Heru, e que existem dezesseis
versões dessa história, a história de Maria-Jesus sendo a última
das dezesseis), então suas ações para com os Povos Africanos
(suas religiões e crenças religiosas) seriam diferentes. Se todas as
pessoas no islã soubessem que mesmo o Alcorão islâmico, e
outros livros ligados a ele, falam sobre o fato de que Agar, que
deu à luz a Ismael, era uma mulher Africana. Que Abraão, o
primeiro dos judeus, adorou a Deusa Hathor (ou Het-Hetu) que a
Bíblia chamava de “bezerro dourado”. Só depois que os judeus
tiveram a Cabala. Você vai e olha os ensinamentos do faraó
Akhnaten e vê o primeiro conceito monoteísta de Deus. Se o
judaísmo é baseado em uma religião Africana, se o cristianismo se
baseia em uma religião Africana, e se o islã se baseia em uma
religião Africana, então, por que o Africano está procurando fora
da África sua religião? Ou você está me dizendo que eu sou
melhor do que a minha mãe? Uma fruta não pode ser melhor do
que a árvore de onde veio. E o Islã, o Cristianismo e o Judaísmo
não podem negar o seu passado Africano.

Dr. Clarke: Eu só quero acrescentar que temos uma grande


desvantagem em relação à religião, na medida em que primeiro
levamos em conta a interpretação de nossa religião vinda dos
outros, tomamos cópias de carbono em vez de nossa original, e
nunca fazemos uso político da religião. Todas as outras pessoas
fazem uso político de sua religião. Todas as outras pessoas fazem
usos políticos e culturais da religião, exceto nós, e isso pode ser o
maior fracasso, em relação à religião – contribuímos tanto para
aproveitarmos tão pouco desse saber...21

21 Como bem disse Jomo Kenyatta, “Quando os missionários chegaram, os Africanos


tinham a Terra e os missionários tinham a Bíblia. Eles ensinaram como orar de olhos
fechados. Quando os abrimos, eles tinham a Terra e nós tínhamos a Bíblia.”

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