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JULHO DE 2002
Saúde, Medicina e Sociedade: Considerações Sobre a Construção Social do Corpo e das Formas de ‘Embodiment’
“Uma das igrejas de Tlön sustenta, platonicamente, que tal dor, que tal matiz verdoso
do amarelo, que tal temperatura, que tal som, são a única realidade. Todos os homens
no vertiginoso instante do coito, são o mesmo homem. Todos os homens que repetem
uma linha de Shakespeare são William Shakespeare”.
“Um pensador (…) suscitou uma hipótese muito audaz. Essa conjectura feliz
afirmava que há um só sujeito, que esse sujeito indivisível é cada um dos seres do
universo e que estes são os órgãos e máscaras da divindade. (...) Nos hábitos literários
é também todo-poderosa a ideia de um sujeito único. É raro que os livros estejam
assinados. Não existe o conceito de plágio: estabeleceu-se que todas as obras são obra
de um só autor, que é intemporal e é anónimo”.
[Jorge Luís Borges, Ficções]
2
Saúde, Medicina e Sociedade: Considerações Sobre a Construção Social do Corpo e das Formas de ‘Embodiment’
ÍNDICE
INTRODUÇÃO – p. 04
Corpo Moderno – p. 38
Corpo Pós-moderno – p. 40
CONCLUSÃO – p. 57
BIBLIOGRAFIA – p. 58
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Saúde, Medicina e Sociedade: Considerações Sobre a Construção Social do Corpo e das Formas de ‘Embodiment’
INTRODUÇÃO
É objectivo deste texto levar a cabo uma reflexão teórica sobre o impacto que as
sucessivas cosmologias sobre o corpo têm vindo a ter na vivência e na experiência do
corpo. Pretende-se com este trabalho discutir um objecto de estudo complexo, o corpo,
tentando discutir as suas construções, inscrições, funções e as suas várias dimensões.
A medicina, informada por uma nova biologia empírica, tem sido desafiada
pelas ciências humanas que ameaçam a sua posição quase monopolista enquanto
disciplina legítima para o estudar o corpo humano. A emergência da psicologia, da
antropologia e sociologia oferece diferentes maneiras de descrever o corpo e as suas
funções. E tal como é possível conduzir uma genealogia dos discursos médicos sobre o
corpo, segundo Fox, o mesmo pode ser feito para os discursos das ciências humanas. O
corpo tem assim emergido como um palco onde são investidos vários discursos e
contra-discursos que de certo modo fabricam o corpo. Parece ser cada vez mais evidente
que o corpo humano ultrapassa em muito o plano biológico, sendo social e político,
embora não seja claro até onde é que o corpo é socialmente determinado. Os discursos
inscritos no corpo não são neutros pois tem em vista o exercício do poder. Neste
sentido, a gestão do corpo aparece no processo civilizacional como um meio essencial
de produzir ordem social.
Foucault fundou toda uma linha de pensamento extremamente relevante para o
estudo do corpo que, todavia, precisa de ser criticamente avaliada. Daí que se dedique
parte do trabalho à discussão e crítica das teses de Foucault em articulação com outros
autores. Importante realçar é que o corpo surge em Foucault não como um subcampo do
social mas como o local de inscrição do social e de exercício do poder. Assim sendo, o
corpo assume um lugar central na crítica geral da modernidade e na teoria social de
Foucault. Ora, Foucault inspirou assim uma discussão sobre a importância do corpo no
sistema social, daí que seja pertinente discutir o lugar do corpo na teoria sociológica.
Este texto não foi alheio aos recentes desenvolvimentos tecnológicos, em
especial no âmbito da medicina. Uma reflexão sobre a vivência do corpo e as formas de
‘embodiment’ na sociedade contemporânea tem de levar em conta não apenas o
contexto socio-cultural, mas também o contexto tecnológico 1. Aliás, pode-se
1
Numa postura próxima do determinismo social poderíamos colocar o actual desenvolvimento
tecnológico como consequência do contexto socio-cultural. Contudo, assume-se aqui uma postura que
considera existir uma relação dialéctica entre tecnologia e sociedade.
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os vários ramos da medicina moderna. Isto é, a doença era localizada dentro do contexto
do ‘sistema total do corpo’ em vez de apontada dentro de um determinado orgão ou
tecido particular.
Jewson assinala que na era da ‘bedside medicine’ eram os próprios doentes que
determinavam o curso do conhecimento médico. O poder político e económico dos
patronos assegurava que estes retivessem o derradeiro controlo sobre os investigadores
médicos e sobre o processo de produção do conhecimento médico. Vejamos esta
descrição do séc. XVIII: “His pulse is natural, is appetite is unimpaired, and his belly
loose. His urine is sometimes pale and limpid, at other times of a high colour. Twelve
weeks ago, in coming from the harvest in England, he was attacked with a pain in the
abdomen, attended with vomiting and purging. To these succeeded the pains of which
he has ever since complained and by which he is now rendered very weak. He imputes
his complaints to fatigue incoming home. He has taken many medicines without
relief”2.
Nos diferentes contextos socio-culturais, que se poderão observar ao longo do
tempo, ou em diferentes espaços geográficos, o corpo aparece de diferentes formas.
Para o homem primitivo a representação humana era exclusivamente subjectiva. Na arte
rupestre de Lescaux o corpo humano estava simbolizado entre o pássaro e o bisonte
como que suspenso num espaço representado como prolongamento de um corpo ainda
só primariamente construído. Para a cultura hindu, o corpo é composto de sete
elementos sangue, músculo, gordura, osso, nervos, medula e esperma - nutridos por
humores que através de múltiplos canais fornecem o equilíbrio necessário à vida. Esses
sete elementos associam-se para constituírem, simbolicamente, três humores primários
correspondentes ao ar ou vento, ao fogo e à água, sendo que é o equilíbrio entre estes
humores que condiciona melhor ou pior os desempenhos vitais do corpo. As filosofias
orientais entendem o corpo como corpo humural, metafórico, construído num contexto
de equilíbrio na globalidade do ser. A medicina chinesa fundamenta-se numa
representação das funções englobantes de todas as dimensões do ser: o modelo do corpo
humano seria assim não o de uma máquina onde a falta ou defeito de uma qualquer peça
se exprime por doença, mas tal como o define Fiadeiro, “o de um jardim onde podemos
juntar ou retirar calor, frio, humidade, alimento, para que a planta seja aquilo que é,
cumpra o seu projecto vital pela harmonia das forças que a constituem” 3. O corpo
2
Citado em http://www.shu.ac.uk/schools/cs/teaching/mw/hob/hobwk2.htm
3
FIADEIRO, I. «Lumana e Rakotak” in ALMEIDA, Miguel Vale de, Corpo Presente. Treze reflexões
antropológicas sobre o corpo, Oeiras, Celta, 1994
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exprime-se e fala através das emoções, dos afectos, das relações e serão estes os
mediadores significativos do corpo construído porque entendido, porque sentido.
O Renascimento entre os fins do século XV e o início do século XVI, foi
marcado pelo estudo do corpo humano, através da dissecção, onde se encontra como
primeira figura Leonardo da Vinci, o criador da Anatomia artística. Desejava publicar
um atlas do corpo humano com notas explicativas, julgando ser mais compreensível um
bom desenho, do que longas e pormenorizadas explicações. Os médicos leram e
admiraram os manuais de Anatomia dos clássicos, considerando-os mais correctos que
os da Idade Média e descobrem neles muitos erros, sobretudo quando passaram a
interpretá-los, de acordo com os conhecimentos que iam obtendo na mesa de
dissecações. O interesse pelo estudo do corpo humano, traduzido na análise da sua
anatomia de superfície e na configuração e projecção dos órgãos internos, foi uma das
principais características do movimento Renascentista, que se inspira num acentuado
naturalismo, realismo, numa atenção à figura humana. Pretendia-se aprofundar e
aperfeiçoar os conhecimentos e meios técnicos e uma realização muito mais
comprometida nos aspectos das dimensões e conceptual da anatomia humana. A
dissecção de cadáveres autorizada pela Igreja, o estudo dos modelos vivos em
movimento e ainda a associação de artistas com cientistas, são factos que contribuíram
para a obra do renascimento.
O renascimento foi o período em que os artistas, não só dissecaram, mas
também estudaram os seus modelos vivos em movimento. Miguel Ângelo, no início do
século XVI estudava a fisiognomia do corpo humano. Em 1532, André Vesálio
publicou e divulgou a sua obra De Humani Corporis Fabrica, onde tentou revelar os
mecanismos do corpo humano e dignificar o trabalho de dissecção e o acto cirúrgico,
considerados na altura como impróprios dos médicos.
Mais tarde, em plena era da ‘medicina hospitalar’, que já correlacionava
sintomas externos com lesões internas em vez de distúrbios gerais no sistema corporal
como um todo, o doente tornou-se uma colecção de órgãos sincronizados entre si, cada
um com uma função especializada. Tal é evidente na seguinte descrição: ‘His
appearance was florid, his complexion clear. He complained of a slight headache and
sore throat. His pulse was full and rather frequent, the tongue white, the tonsils slightly
inflamed, the parotid glands were very much enlarged, the bowels were confined, and
there was a little oppression about the chest’4. Foucault aponta que a morte, que era
4
Citado em http://www.shu.ac.uk/schools/cs/teaching/mw/hob/hobwk2.htm
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Idem
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torno da aplicação de uma série de testes químicos das substâncias corporais designados
para identificar processos fisiológicos patológicos.
Ao quebrar o corpo em órgãos e funções, a ciência médica tinha já começado o
processo de dissecção analítica, a partir do qual o paradigma da genética molecular é
uma extensão lógica, apesar de o ser a um nível muito maior de abstracção e de
simulação. Em 1905, Bateson introduz e define o termo “genética” como a ciência da
hereditariedade e da variação. Os trabalhos de Watson e Crick determinaram em 1953 a
estrutura em hélice dupla das moléculas do ADN, explicando assim a autoreprodução
do material hereditário. O conjunto de material hereditário que caracteriza uma dada
espécie é designado de “genoma”. No ano 2000, o projecto do Genoma Humano
determinou a localização cromossómica e decifrou partes do ADN. Hoje procura-se
definir a vida pelo nosso ADN e pelas características genéticas que uma medicina
molecular quer conhecer no infinitamente pequeno, e a partir daí, compreender a nossa
existência. Esta é a nova cosmologia que tenta afirmar a realidade do nosso corpo e até
transfere para impressões genéticas a procura da identidade ontológica.
O código genético é uma abstracção pura do corpo, tal como as fórmulas
matemáticas das ciências naturais são abstracções puras da natureza. Galileu apontou
que a natureza era como um livro e que a linguagem para ler esse livro era a
matemática. Hoje também foi construído um código genético, o ‘livro da vida’,
constituído por um alfabeto de apenas quatro letras (A, T, G, C), a partir do qual se
pretende conhecer os genes e, portanto, os seres. A vida biológica, o corpo, o indivíduo
com o seu genoma estão aí para ser lidos e reduz-se assim o corpo à condição de
informação.
O paradigma funcional e mecanicista tratava cada órgão do corpo como uma
prótese parcial e diferenciada. Na cosmologia genética, cada célula do corpo é
potencialmente uma prótese embrionária do corpo. A fórmula genética inscrita em cada
núcleo celular torna-se a prótese moderna para todos os corpos. Ora, isto terá sem
dúvida consequências ao nível das cosmologias do corpo, contribuirá para a construção
de um corpo informacional, de um corpo que poderá ser replicado, e portanto dá-se uma
machadada final no corpo enquanto globalidade, uno e indivisível como um ponto
perfeitamente distinguível no espaço e no tempo.
Passa-se assim de uma ordem transcendental, corpo espelho da vontade divina,
para um corpo mecanismo, conjunto de órgãos com a progressiva autonomia do
humano, depois para um corpo povoado de células comunicantes entre si através de leis
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afastadas, cabelos abundantes, barba rala, seios frontais e maxilares enormes; queixo
quadrado e saliente, maças do rosto saliente, gestos frequentes, em suma um tipo
lembrando o mongol e por vezes o negro. Nos Atlas comparavam-se fotografias de
criminosos com as de gente honesta, apontando-se as provas de degenerescência, que
fazia alguns homens regredir até ao estado selvagem e mesmo animal”8.
No paradigma genético emergente é de assinalar, a tentação de tudo explicar
acerca do homem, a sua saúde, os seus comportamentos, através do retrato do genoma.
Esta ideia, ainda é sustentada por vários investigadores, que procuram reduzir os
problemas sociais à sua dimensão biológica, transmitindo deste modo a ideia de que é
possível criar topologias sociais e dar azo a ‘bio-políticas’.
As tipologias sociais, já não são, na era digital, efectuadas a partir de
características do corpo, mas a partir dos testes genéticos, do estudo das disposições
moleculares. A genética não só pode dar azo a um novo ‘olhar clínico’, mas enquanto
‘bio-política’, poderá transformar a medicina cada vez mais num sistema de controlo e
gestão da população, de normalização face a um padrão genético9.
Os progressos na área da genética irão, permitir, em breve, ler a nossa ‘saúde’ e
a dos nossos filhos. Os utensílios de predição da saúde dos indivíduos durante a sua
vida, ou das crianças antes do nascimento terão tendência para se generalizar muito
rapidamente. Um indivíduo poderá ficar a saber que aos 32 anos poderá ter um cancro
ou um infarto aos 50. Assim vai se gerando toda uma nova lógica e um consenso social
em torno da denúncia dos ‘maus’ genes. Em torno deste consenso social estará
eventualmente uma discussão em torno dos binómios
«responsabilidade/irresponsabilidade», «saber/não saber», e em torno da genética
poderão estar a formar-se novas dinâmicas de construção da identidade, novas
representações e relações com mundo devido ao carácter tipológico e preditivo da
genética.
A ontologia de Foucault é ambígua daí que sejam possíveis diferentes leituras de
Foucault que se traduzem em diferentes desenvolvimentos teóricos. Fox localiza
Foucault como um autor pós-moderno. Já Turner aponta que o ‘clinical gaze’ é uma
força racionalizadora dos corpos, colocando Foucault próximo da perspectiva
weberiana.
8
SÉREN, Maria do Carmo, “Do Arquivo dos Preventivos à Tipologia dos Criminosos” in ALVES, M.
Valente, BARBOSA, António, O Corpo na Era Digital, Lisboa, Faculdade de Medicina de Lisboa, 2000,
p. 211
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Terá assim a cultura humana, de que a genética faz parte, acabado com a selecção natural darwiniana?
Toda esta temática sugere a discussão entre a relação natureza/artifício.
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MARCUSE, Herbert; 1982: p. 37
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Habermas refere a contribuição de Arnold Gehlen: “a evolução técnica ajusta-se ao modelo
interpretativo, segundo o qual o género humano teria projectado uma a uma, ao nível dos meios técnicos,
as componentes elementares do círculo funcional da acção racional teleológica, que inicialmente radica
no organismo humano, e assim ele seria dispensado das funções correspondentes [do aparelho
locomotor, dos sentidos, da produção de energia, e do cérebro]” (HABERMAS, 1994: p. 52)
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O poder não é dado a grupos particulares (por vitude das suas capacidades técnicas, status, etc.), é antes
constantemente recreado e vulnerável à mudança. Fox, na sua etnografia da cirurgia, avança com um
exemplo disto mesmo. Segundo Fox, na sala de operações, estão em confrontação os poderes do
anestesista e do cirurgião. Os desejos de poder aparecem no investimento de definições sobre os
contextos, neste caso, o contexto da sala de operações. O anestesista está interessado na integridade física
do doente na sua totalidade, enquanto que o cirurgião está mais concentrado na remoção da patologia. O
problema do anestesista é que que a acção do cirurgião pode ela própria por em causa a integridade física
do doente. Daqui importa reter que a posição dominante do cirurgião é constituída através de uma luta
com o discurso alternativo do anestesista.
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Também Baudrillard, na sua fase pré pós-moderna, aponta uma base material - a
economia, a sociedade de consumo - e um locus de poder - a classe capitalista - que
determina a maneira como nos relacionamos e olhamos o nosso corpo e, tal como a
economia política da saúde, assinala a comodificação do corpo na sociedade capitalista.
Em A Sociedade de Consumo, Baudrillard assinala que as velhas cosmologias religiosas
postulavam que apenas a ‘alma’ interessava, que o corpo realmente não existia. O corpo
e a relação com o corpo, enquanto factos culturais, reflectem as relações sociais e a
relação com a ordem material. Na sociedade capitalista, o estatuto da propriedade
privada aplica-se também ao corpo e à maneira como operamos socialmente com ele e
influencia a representação mental que temos dele. Na ordem tradicional, em especial
para o camponês, não havia um investimento narcisista no corpo ou uma percepção
espectacular do corpo, mas antes uma visão instrumental e mágica. As estruturas
contemporâneas de produção e consumo induzem nos sujeitos uma representação dual
do seu corpo enquanto capital e enquanto objecto de consumo. O corpo tanto emerge
como algo que pode ser usado para vender mercadorias e bens como transforma-se ele
próprio num objecto consumível. Para que seja usado como um objecto na venda de
mercadorias, o corpo tem de ser redescoberto pelo seu ‘proprietário’, e visto numa
lógica narcisista, e não numa lógica meramente funcional. Uma vez libertado enquanto
objecto, o corpo ocupa o seu lugar no sistema dos objectos e só assim poderá ser
explorado. Esta é aliás uma lógica marxista, em Marx a comodificação da força de
trabalho conduzia à sua exploração, Baudrillard apenas substitui a força de trabalho pelo
corpo. Os capitalistas estão assim livres de produzir e comercializar bens e serviços
direccionados para o corpo. Aliás, segundo o autor francês, o corpo tornou-se mesmo o
objecto de consumo mais exemplar. As pessoas investem psicologicamente no seu
corpo, gastando nele cada vez mais atenção e dinheiro. Tornamo-nos consumidores dos
nossos próprios corpos e, assim sendo, consumimos uma panóplia de bens e serviços de
modo a tentar melhorar-lhes o aspecto. A proliferação de produção orientada para o
lazer ajudou a promover um ‘eu’ actuante que trata o corpo como uma máquina e um
símbolo a regular, a cuidar e melhorar – ora isto é acrescido pelo status do corpo como
um símbolo ubíquo na cultura publicitária. Featherstone, por seu lado, aponta que, na
sociedade de consumo, o corpo deixa de ser um antro de pecado e apresenta-se hoje em
dia como um objecto que se mostra dentro e fora do espaço privado – situação esta
rejeitada pelos postulados do Cristianismo. O cuidado intensivo com o corpo demonstra
uma nova cultura, denota uma fé maior em médicos e noutros profissionais ligados à
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Bourdieu a relação de um agente com o seu corpo e com outros corpos é social, são
modos de operação desenvolvidos que são específicos para dadas culturas, para uma
dada posição social (ou para um dado indivíduo). Assim, se percebe que, por exemplo,
exista diferenças na disposição corporal de diferentes classes, temos a pose curvada do
proletariado e a pose direita e distinta das classes burguesas. Elias demonstra que a
demosntração e expressão corporal de emoções é maleável, e numa dada cultura é
necessário saber as condições apropriadas para a demonstração e expressão de certos
comportamentos e emoções. A vida social depende da apresentação, monitorização e
interpretação bem sucedidas do corpo. A ideia de prática em Bourdieu tem com o
objectivo a transcendência do dualismo entre estruturas mentais e o mundo dos
objectos. O corpo tem um papel crucial em Bourdieu nas suas ideias do capital,
nomeadamente o capital cultural. O corpo é uma consequência de práticas de classe pois
as práticas de classe são inscritas no corpo, sendo este um produto social de uma
determinada classe. A gestão do corpo revela as mais fundas disposições do habitus.
Bourdieu frisa a relação entre posições sociais e a regulação, as disposições e os modos
de viver o corpo. O corpo funciona como meio activo onde estão inscritos códigos
culturais. Esta teoria geral da prática pretende resolver os dualismos clássicos
subjectivo/objectivo, agência/estrutura, no entanto, parece haver em Bourdieu pouco
espaço para uma vivência efectiva do corpo, isto é, pouco espaço para a acção, a
intenção e a agência das práticas.
Também Goffman mostrou uma preocupação com o corpo, em especial, uma
preocupação com os vocabulários partilhados do idioma do corpo que apontam para os
limites da estrutura da interacção para aqueles que pretendem manter um ‘self’ social.
Todavia, para Turner, o corpo tem estado, em larga medida, secundarizado na
teoria social. Shilling aponta que é o dualismo mente/corpo que fez com que a teoria
social se esquecesse do corpo. A demissão do corpo é uma herança de Descartes e da
sua premissa Cognito ergo sum, que envolve uma descrença e uma demissão dos
sentidos na relação com o mundo. A obra de António Damásio veio dar um contributo
importante para a refutação biológica da premissa de Descartes, relançando a
importância da corporialidade na relação com o mundo. No entendimento de Turner, a
secundarização do corpo implica e coloca problemas significativos à formulação de uma
perspectiva sociológica dos agentes humanos, da agência em si e da experiência humana
(mediada pelo corpo). Se adoptarmos uma ideia de Sociologia como o estudo científico
da acção, então é necessária uma teoria social do corpo, pois a agência e a interacção
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Populações corpos
Reprodução Retraimento
Tempo Patriarquia Ascetismo Interno
Regulação Representação
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Panoptismo
Esta questão será reavivada mais adiante Mercadorização
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Espaço Externo
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corpo é uma potencialidade que é elaborada pela cultura e desenvolvida nas relações
sociais. E isto implica não colocar uma dicotomia absoluta entre comportamento inato e
adquirido, entre cultura e natureza, sendo isto visível, por exemplo, no desenvolvimento
de um certo modo de andar.
O corpo é simultaneamente o resultado e o meio das práticas, nomeadamente das
técnicas do corpo. Os corpos existem entre discursos e instituições, onde discursos
significam o mapeamento das suas possibilidades e limitações. Estes mapeamentos são
a base do paradigma normativo no qual o corpo pode entender-se a si próprio. Por outro
lado, as instituições são os locais ou contextos nos quais essas práticas ocorrem. O
corpo é constituído pela intersecção de pontos com o mesmo peso que são as
instituições, os discursos e a realidade corporal. Se é prudente dizer que o corpo é
multidimensional, não deixa contudo de ser legítimo colocar problemas de hierarquia e
de fronteiras entre as dimensões do corpo sendo as mais apontas as seguintes: corpo
como organismo; corpo como potencialidade; corpo como um sistema de
representações; corpo como experiência vivida. Esta discussão poderá ser bastante útil
pois a partir daqui se poderá relançar, através do estudo do corpo, a questão elementar
da sociologia, a saber, o que é o social?
Apesar de todo o criticismo Annandale sustenta que o construtivismo social e o
pós-modernismo têm uma contribuição a dar direcionando a atenção para os diferentes
discursos e para as novas formações sociais que constroém o indivíduo de maneiras
particulares. A polaridade entre o interior e o exterior do corpo é posta em causa, pois
vários discursos sustentam que o cuidado com interior do corpo transparece na
aparência, e o cuidado com o exterior do corpo pode ajudar à saúde interior. É claro que
nem sempre é assim, como, por exemplo, no caso das raparigas anoréxicas ou no caso
de muitos ‘body builders’, mas mesmo nestes casos a interdependência interior/exterior
está perfeitamente patente, seja através do que se deixa de comer, seja através do
consumo de esteroídes. As práticas relacionadas com a saúde podem elas próprias servir
para desconstruir os dualismos ontológicos contemporâneos. Neste contexto, surgem
teorias sociais que se insurgem contra a ideia modernista da história universal e da
experiência unitária, postulando a ética da diferença, do pluralismo, do jogo.
Ao estabelecer relações complexas entre mudança cultural, estrutura social,
identidade pessoal e transformação do corpo a teoria social poderá proporcionar uma
teoria integrativa que relacione os aspectos comuns de uma grande variedade de
problemas humanos relacionados com a experiência e vivência do corpo.
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Como Annandale e Turner indicam, a atenção dada ao corpo humano pela teoria
social é essencial pois representa uma contraposição central ao modelo da medicina e ao
reducionismo da sociobiologia. A sociologia do corpo põe em causa o dualismo entre
mente14 e corpo e está empenhada em demostrar a relação dialéctica entre o corpo físico
e a subjectividade humana que pode ser expressa através do conceito de ‘corpo vivido’
(‘lived body’). Os actores sociais que povoam as teorias sociológicas têm corpos que
são uma parte integral da existência humana e portanto é postulado que o corpo deverá
ser objecto de uma consideração central. Os nossos corpos estão intimamente ligados às
nossas acções e eles simultaneamanete moldam e são moldados por relações sociais.
Deste modo os sociólogos reclamam o corpo humano e desenvolvem um
enquadramento teórico mais sofisticado, onde o corpo é entendido como um fenómeno
material, que simultaneamente afecta e é afectado pelo conhecimento e pela sociedade.
Os contextos sociais constroem os corpos, o que se repercurte no comportamento social,
comportamento este que, por sua vez, pode impulsionar uma transformação do corpo
ainda maior. Um exemplo é a anorexia. A anorexia pode ser entendida, por um lado,
como o dualismo contemporâneo mente/corpo, isto é, como a luta da mente sobre o
corpo. Mas a anorexia faz também parte de um processo que incorporou certos valores,
que impulsionam a necessidade de criar um corpo que irá falar pelo ‘eu’ de uma forma
que tenha significado.
Existe, portanto, uma relação dialéctica entre o corpo físico e o contexto social.
Mais ainda, as teorias do pós-modernismo e a noção de ‘tecnologias do eu (self)’, apesar
das críticas, têm o mérito de apontar que nós podemos controlar o corpo de maneiras
que eram impensáveis no passado e de, ao mesmo tempo, indicar que esse mesmo
controlo nos lança na dúvida sobre o que o corpo realmente é e sobre os limites do
corpo, onde um corpo acaba e outro começa.
O estudo do corpo é complexo ainda para mais encruzilhado nas recentes
mudanças sociais, culturais e tecnológicas, sendo que as fronteiras convencionais entre
o natural e o social são constantemente desgastadas e mudadas. O estudo do corpo é
igualmente complexo pois o número de tradições que competem entre si parecem ser
infinitas. Numa posição pós-moderna, que eu diria ser apenas prudente, é apenas
possível predizer que somos incapazes de prever como a teoria social irá articular-se no
futuro com o corpo, com a saúde e a doença. Segundo Fox, o acaso, a descontinuidade,
a emergência de novos discursos e de desafios aos discursos já existentes, significa que
14
Conceito este que por sua vez está dualizado entre razão e sentimento ou emoção.
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Corpo Moderno
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ambiente social, no qual a percepção do risco está cada vez mais presente na
consciência pública, dando aso à emergência de novas formas políticas. Os modos de
vivência na sociedade de risco estão significativamente ligados à ‘sub-política tecno-
económica’ das industrias e instituições ligadas à saúde. Neste contexto, a medicina está
implicada numa estratégia de mercado que lucra com o risco. Argumenta Beck que “in
more and more fields of action a reality defined and throughly structured by medicine is
becoming the prerequisite of thought and action (...) an insatiable appetite for medicine
is produced, a permanently expanding market for the services of the medical profession
whose ramifications echo into the distant depths” 15. Os riscos para a saúde e os perigos
que assombram os nossos corpos tornam-se factores económicos, pois novos mercados
são gerados. E é a própria ciência que tenta definir e gerir os riscos que ela própria
produz. Um exemplo é a cirurgia estética, os riscos para saúde deste tipo de cirurgia
podem ser enormes, no entanto a decisão de a levar por diante faz parte da emergência
da identidade pessoal (‘self’) enquanto projecto reflexivo.
Giddens sugere um incremento da individualização do corpo, e uma colonização
do corpo pela modernidade, tendo sido arrastado para a organização reflexiva da ordem
social, de tal modo que somos responsáveis pelo design dos nossos corpos. Na
modernidade avançada o corpo é mobilizado reflexivamente, tornado-se num alvo de
escolas e opções. Assim sendo, o corpo não é passivo, mas uma parte visível do ‘self’,
que necessita de ser monitorizado pelos indivíduos, que consideram oportunidade e
riscos e que são virtualmente forçados a moldar os seus próprios corpos sob
considerável incerteza. A anorexia é paradigmática da incerteza fabricada no quotidiano
e decidir o que comer é decidir como nos apresentar corporalmente.
A auto-monitorização implica um projecto no qual há uma avaliação contínua da
informação e das práticas sobre o nosso corpo. Giddens refere-se a esta actividade como
reflexiva, sendo esta uma característica central da modernidade. “O self é hoje para
todos um projecto reflexivo – uma interrogação mais ou menos contínua sobre o
passado, o presente e o futuro. É um projecto levado a cabo no interior de uma
profusão de recursos reflexivos: terapia e manuais de auto-ajuda de todos os tipos,
programas de televisão e artigos de revista.”16. Com a multiplicidade de fontes de
informação as decisões dos indivíduos tornam-se mais complexas, ainda para mais num
15
BECK, Ulrich, Risk Society: Towards a New Modernity, Londres, Sage, 1992, p. 211
16
GIDDENS, Anthony, Transformações da Intimidade, Oeiras, Celta, 1995, p. 22
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Corpo Pós-moderno
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pelas suas múltiplas figurações, pela perda da sua familiar evidência, pela profusão das
suas novas possibilidades, isto é, pela perda do que julgávamos ser o seu conjunto
estável de atributos. A ideia de um corpo ‘sem género’ ou até ‘sem órgãos’, são
metáforas para as libertações do corpo tornadas possíveis com as actuais tecnologias,
libertações de um corpo próprio, de um corpo, por exemplo, propriamente feminino ou
propriamente masculino, ou mesmo de um corpo propriamente biológico, orgânico e
humano. Observações como a do artista Sterlac, “o corpo está obsoleto”, apontam que a
noção de ‘corpo’ está em crise.
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corpo revela hoje não ser menos incorporal do que a alma, ela própria objecto de
desfigurações e reconfigurações fundamentais nas narrativas do humano. A surpresa é
hoje que a noção de corpo seja afinal tão pouco evidente quanto a alma e que isso abra
espaço, não apenas ao problema da ligação entre corpo e alma, mas também ao
problema da ligação entre corpo e carne, mostrando que estas conexões são, em cada
um dos casos, frágeis e instáveis.
O ‘fim do corpo’ é o fim de uma ‘corporiedade’ dada (ou naturalizada) e a
entrada na era de uma invenção ou experimentação do corpo, que alguns designam
como ‘corpo pósmoderno’. Por entre as diversas figuras emergentes deste ‘corpo pós-
moderno’, o cyborg (cybernetic organism) aparece com uma particular dominância.
Assim é pelo facto de o corpo cyborg incluir ele mesmo uma enorme variedade de
figuras e representar por isso, exemplarmente, a instabilidade e a plasticidade que são
conotadas ao corpo contemporânea.
Haraway ao olhar para a realidade social e científica das sociedades ocidentais
contemporâneas, entende que uma parte significativa (e em crescendo) dos sujeitos
sociais são cyborgs. De um modo abrangente, o cyborg existe desde que dois tipos de
fronteiras sejam simultaneamente quebradas: em primeiro lugar, o cyborg é uma figura
híbrida que origina do interface entre autómato e autónomo, natureza e cultura,
masculino e feminino, ‘self’ e outro, etc.; em segundo lugar, torna estas divisões
indeterminadas oferecendo-nos assim o potencial de escapar aos limites impostos pelas
oposições. De um modo mais restrito, um cyborg é uma entidade híbrida entre
mecanismos cibernéticos e organismos biológicos. O cyborg surge assim como um
nome para uma nova ontologia, a da vida penetrada pela técnica.
Haraway e Gray apontam que há cyborgs por todo o lado desde a dos pilotos dos
caças da força aérea até à avozinha com um pacemaker. O corpo se vai tornando
biónico devido aos pacemakers cardíacos, às válvulas, às bacias de titânio, às veias
sintetizadas, aos olhos electrónicos aos implantes no ouvido, etc. O cyborg é talvez
melhor conceptualizado num contínuo entre dois tipos puros: o organismo humano,
num lado, e as máquinas autómatas ou a inteligência artificial, no outro.
Neste processo, a ciência biomédica tem tido um papel central, desde a cirurgia
estética, passando pela engenharia genética, até aos avanços no campo da
nanotecnologia. As gerações contemporâneas poderão tornar-se nas últimas gerações de
humanos ‘puros’. Segundo Gray, da cabeça aos pés, existem uma grande variedade de
maneiras pelas quais a medicina pode transformar os humanos em cyborgs. A figura
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(pós-moderna) do cyborg, essa forma nublosa entre o artificial e o corpo, pode vir trazer
um desafio e uma áurea problemática às antigas formas de viver e entender o corpo.
Um exemplo da penetração dos preceitos pós-modernistas na arte é Orlan, uma
artista que utiliza o próprio corpo como forma de arte, isto é, transforma as suas
sucessivas operações plásticas num processo reflexivo, transformando o seu corpo numa
peça a ser exibida em várias galerias de arte, dai que afirme que “This is my body... This
is my Software...” Orlan rege-se pelo dito de Eugenie Lemoine-Luccioni: "The skin is
deceptive... in life one only has one's skin...there is an error in human relations because
one is never what one has... I have an angel's skin, but I am a jackal... a crocodile's skin
but I am a puppy, a black skin but I am white, a woman's skin but I am a man; I never
have the skin of what I am. There is no exception to the rule because I am never what I
have..."
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Mas também poderão dar causar uma ferida no ‘self’ dos indivíduos, do seu amor-
próprio e poderá alargar as possibilidades de aplicação de políticas eugénicas que
colocam um alto valor em certas vidas e um baixo valor noutras e que interferem no
processo na ‘naturalidade’ da reprodução. Os agentes poderão ter de assumir o risco se
serem reduzidos aos seus códigos genéticos (defeituosos), podendo a subjectividade
humana ser transformada num ‘objecto’ que poderá fornecer vários tipos de informação
detectável e utilizável. Dois dos discursos concorrentes na medicina parecem ser, por
um lado, os discursos sobre os códigos da vida, e, por outro lado, os discursos sobre o
‘combate’ às doenças.
As tecnologias da reprodução tem merecido uma atenta reflexão por parte dos
círculos feministas. Estas tecnologias são vistas nestes círculos como um passo final no
desejo dos homens de controlar e apropriar o poder reprodutivo. As mães biológicas
poderão eventualmente ser transformadas em ‘mães-máquinas’, degradando-se assim
cada vez mais a privacidade corporal e metafísica da mulher. Um facto é que
fisiologicamente o corpo da mulher tem sido cada vez mais aberto ao escrutínio e à
manipulação de partes corporais que são extraídas e depois reintroduzidas no corpo. A
medicina ao alterar e remover partes corporais da mulher revela uma tendência cada vez
maior de objectivar as partes da mulher e de construir discursos sobre essas partes fora
do contexto corporal, quase como se essas partes não pertencessem a um determinado
corpo.
Com as tecnologias reprodutivas assiste-se, portanto, à emergência dos ‘cyborgs
fetais’ e às ‘tecno-mães’. Entidades biológicas tornam-se entidades tecnológicas no
processo de colonização do mundo da vida pela tecnologia. Ora isto verifica-se nas
tecnologias de visualização e de diagnóstico do fecto, nas tecnologias que possibilitam
um fecto viver no corpo de uma mulher clinicamente morta, nas tecnologias que
transformam fetos abortados em ‘material’ tecnológico para a investigação científica e
para a investigação de novas formas de terapia biomédica, nas tecnologias que
produzem conhecimento fisiológico sobre os fetos e em todo o leque de terapias.
Com ‘tecnificação’ do útero e do material reprodutivo, as mulheres podem ser
alienadas, despersonalizadas e quase arredadas do processo reprodutivo. No entanto, é
claro que não são só apenas as tecnologias em si que são problemáticas, mas todo o
contexto em que elas são desenvolvidas e aplicadas. É na análise dos contextos onde as
tecnologias se desenvolvem que surgem questões sobre o acesso e a aplicação dessas
tecnologias, questão como: quem será permitida a conceber?
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como consumidor começaria a ser entendido como um decisor e senhor do seu corpo
numa nova cultura médica. Contudo, como aponta Foucault, o poder repressivo da
medicina não está circunscrito pelas paredes do hospital, embora possa ter uma maior
eficácia num contexto particular.
Fox acredita que a tecnologia tem constituído um discurso alternativo ao
discursos prévio dos profissionais médicos. A tecnologia pode até obscurecer o carácter
social dos julgamentos que são feitos como consequência de resultados de testes e
diagnósticos. As reavaliações tradicionais dos profissionais médicos poderão estar a ser
suplantadas pela dependência nas tecnologias e pela aparente racionalização que a
tecnologia traz ao difícil processo de diagnosticação.
As tecnologias informativas e ‘preventivas’ tais como os testes, os diagnóticos,
as despistagens criam um novo status, os indivíduos ‘em risco’. As despistagens e os
testes médicos penetram nos recantos mais escondidos e inimagináveis do nosso corpo,
criando doenças em potência. Cria-se assim uma nova áurea na noção de doença. A
doença fica assim envolta em mistério, invadindo silenciosamente o corpo à espera de, a
qualquer momento, começar a causar os seus efeitos. O sentimento de que se está
saudável é dissociado da condição de estar saudável. A integridade do corpo de uma
pessoa que espera um determinado diagnóstico é assim posta em causa.
E o facto de se saber um certo resultado de um teste médico pode constituir um
benefício pessoal para uns, mas para outros poderá aprofundar um sentimento de
desesperança ou até mesmo de culpa. Para além disso, as intervenções cirúrgicas, no
âmbito de uma medicina preventiva poderão dirigir-se a corpos em risco e não a corpos
doentes propriamente ditos. Aliás, com estas práticas médicas é o próprio conceito de
doença ou de corpo doente que se torna mais incerto.
A colonização técnica do corpo também expande-se através de representações
do corpo nos ecrãs e monitores. Para Paul Virilio, a telepresença, ao introduzir-nos o
outro imaterialmente (através da imagem), estabelece um curto-circuito relacional,
pondo em causa o sentido do nosso próprio corpo. As ligações instantâneas em tempo
real, através da Internet e das auto-estradas electrónicas da cidade global (dividida e
subdividida, multicêntrica, multicultural) assimilam virtualmente o espaço real,
desestruturando-o.
E quando se afirma que no futuro computadores miniaturizados serão capazes de
assistir a memória do indivíduo, já não se está na perspectiva da terapia. Das tecnologias
de apoio à vida passamos às tecnologias concorrente, entrando-se na esfera do homem-
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prótese. Desde os braços mio-eléctricos, passando pelas próteses da anca e da mama, até
aos implantes cocleares e do pénis, praticamente todos os órgãos do homem são
passíveis de serem substituídos por mecanismos. A miniaturização dos objectos, que se
designa por nanotecnologias, é a possibilidade de realizar micromáquinas susceptíveis
de se integrarem nas nossas vísceras, alterando assim o conceito de organismo. Esta
tecnologia vai miniaturizar, não o corpo humano, mas as suas propriedades. Perante este
cenário não é de admirar que vários autores apontem a colonização do corpo vivo por
biotecnologias.
Segundo Virilio, cerca de 80% da produção microelectrónica é composta por
captadores, sensores ou teledetectores. Eles poderão permitir tele-ouvir, tele-ver e até
tele-tocar, coisa que é permitida pela luva de telecontacto com retorno de esforço que
permite tocar e sentir a pressão à distância, a milhares de quilómetros, da mão do outro
ou através de um datasuit – um fato de informações ou de dados – que permite sentir o
corpo do outro contra si. O mais recente captador é o captador olfativo que permite
cheirar à distância, pelo que, assiste-se a uma maneira de tirar do corpo as suas
sensações.
Mas será que com as novas tecnologias da medicina os indivíduos irão encarar
os mecanismos, o artificial da mesma maneira que antigamente? Poderá estar a ocorrer
todo um processo de naturalização das novas tecnologias, das novas próteses. Máquinas,
tecidos sintetizados, mecanismos, vai se imbricando por baixo da nossa pele, ou são a
nossa própria pele. Como escreve Baudrillard: “Am I a man or a machine? There is no
ambiguity in the traditional relationship between man and machine: the worker is
always, in a way, a stranger to the machine he operates, and alienated by it. But at least
he retains the precious status of alienated man. The new technologies, with their new
machines, new images and interactive screens, do not alienate me. Rather, they form an
integrated circuit with me. Video screens, televisions, computers and Minitels resemble
nothing so much as contact lenses in that they are so many transparent prostheses,
integrated into the body to the point of being almost part of its genetic make-up: they
are like pacemakers”17.
Para Baudrilard, a prótese mais invisível e transparente é a manipulação
genética. Uma prótese é um artefacto que substitui um órgão defeituoso, ou uma
extensão instrumental do corpo. A molécula de DNA, contudo, que contém toda a
17
BAUDRILLARD, Jean, The Transparency of Evil, Essays on Extreme Phenomena, Londres, Verso,
1993, p. 58
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informação relativa a um corpo, é a prótese mais exemplar por permite o corpo replicar
e substituir a ele próprio infinitamente, pelo menos teoricamente. Todas as nossas
células são próteses potenciais e abstractas, ou uma matrizes, desse mesmo corpo, na
sua totalidade. A prótese cibernética constituída a partir da engenharia genética é de
longe mais subtil do que uma prótese mecânica. Qualquer parte abstraída do todo e
tornada autónoma converte-se em prótese artificial que altera o todo, pois substitui esse
todo. Assim sendo, o código genético, que contém toda a informação de uma dada
pessoa é, com efeito, uma condensação da globalidade vital dessa pessoa.
Sabemos já hoje que a cosmologia cibernética e informática da replicação
genética, tem na clonagem o estado último da história da modelização do corpo. A
molécula do ADN, como informação que permite replicar infinitamente esse corpo,
representaria a precedência absoluta do modelo genético sobre todos os corpos
possíveis. Isto traz consigo a possibilidade de um mundo sem reprodução sexuada, que
poderá trazer consigo novas narrativas, substituindo a criação ou a reprodução pela
replicação, que responderia ao hibridismo com o estado da técnica. A reprodução sexual
seria assim uma estratégia de reprodução entre outras, uma ideologia específica que
poderá no futuro chocar com a racionalidade dominante das sociedades do capitalismo
eficiente, que poderá suscitar estratégias de optimização genética.
Tal como Walter Benjamim escreveu sobre a arte na era da reprodução
mecânica, também podemos dizer que com a cosmologia genética e informacional o
corpo perde a ‘aura’, a sua qualidade única do aqui e agora, perde a sua originalidade,
sendo que a autenticidade do original apenas pode ser constituída pela história. O corpo
é portanto reduzido à condição de signo, de mensagem, o corpo torna-se molecular,
silencioso, privado do Outro, da contextualização, da sensação, da memória individual.
Segundo, Haraway, as fronteiras essenciais para as próprias ciências da natureza
com as que separam organismo/máquina, animal/humano, corpo/mente estariam a ser
‘digeridas’ pelo desenvolvimento tecnológico. O holismo que caracteriza a nossa noção
de organismo daria lugar a uma noção polimórfica. Contudo mais do que um
determinismo tecnológico, que se substituiria aqui a um determinismo biológico, trata-
se aqui de um design tecnológico do organismo, que põe então em causa a existência de
uma separação ontológica entre máquina e organismo, entre técnico e orgânico.
Tal condição é então confirmada pela biologia moderna, ao entrar na era da
tradução do mundo em codificação e, portanto, na era da inscrição, da montagem e
desmontagem, da sintetização, do design, da engenharia. Na engenharia genética a
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hibridação tem a ver com uma maquinação do organismo, de que resultam novas
morfologias ou organismos, organismos de design com patentes, fabricados em
laboratórios.
O corpo está a transformar-se num suporte variável, espaço de uma identidade
escolhida e sempre revogável, que decide em cada momento a orientação para a sua
existência. Daí que o conceito de corpo tenha vindo a complexificar-se, exacerbado pelo
controlo tecnológico e numa altura em que este conceito se dissemina praticamente por
todas as áreas da experiência e do saber, tornando-se cada vez mais efémero, indefinido
e indeterminado.
Os avanços tecnológicos parecem ser tanto instrumentais como sintomáticos da
crise da corporialidade nas sociedades ocidentais. Apesar das interpretações pós-
modernas, a medicina e a engenharia do corpo parece ser ainda um empreendimento das
dinâmicas e das ideologias da modernidade, imbricadas na tradição científica na qual a
‘verdade’, a ‘ordem’ e o ‘progresso’ ainda são entendidas como virtudes a atingir. Pode-
se argumentar quer os desenvolvimentos em curso representam uma extensão dos
imperativos modernistas centrados no controlo racional e na dominação da ‘natureza’. É
o próprio processo de ‘racionalização’ e de ´modernização’ que, através de uma ordem
social reflexiva, cria as seus próprios riscos e incertezas e que desafia os seus próprios
propósitos. “Tudo o que é sólido derrete no ar”, este é o mote da modernização, um
carrossel contínuo de renovação, de desinstitucionalização e de institucionalização.
Neste sentido, os médicos M. Valente Alves e António Barbosa escrevem:
“Entre a jubilação da descoberta (prometeica) da biologia molecular e o medo da
monstruosidade (frankensteiniana) do pós-humano, o fantasma do aperfeiçoamento da
condição humana parece afastar-se do terreno do religioso, do jurídico e do político,
instalando-se com uma vitalidade surpreendente no campo da genética e
simultaneamente no da bioética. Se a abolição do mal não parece socialmente possível,
se não se pode melhorar o social enquanto tal, então aja-se sobre as microestruturas do
indivíduo, procurando modelar um ser susceptível de conter todas as qualidades –
saúde, aparência, existência”.
A tecnologia médica tem sem dúvida um controlo sem precedentes sobre o
corpo, contudo, paradoxalmente, este desenvolvimento pode conduzir a uma crise de
identidade cada vez maior, deixando os agentes sociais confusos e apreensivos sobre
quais serão as fronteiras do corpo e sobre que formas o corpo poderá tomar no futuro.
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referem-se ao que queremos para viver, mas não ao como queríamos viver, se
relativamente ao potencial alcançável, descobríssemos como poderíamos viver”18.
Nesta linha, da articulação entre técnica e sistema político resulta um claro défice
democrático pois “a direcção do progresso técnico é hoje determinada ainda em
grande parte pelos interesses sociais que provêm espontaneamente da coacção à
reprodução da vida social sem que sobre eles, enquanto tais, se reflicta e sem que
sejam confrontados com a autocompreensão política esclarecida dos grupos sociais”19.
Habermas argumenta que “a questão não é se esgotamos um potencial disponível ou
ainda a desenvolver, mas se escolhemos aquele que podemos querer em vista da paz e
da satisfação da existência”20. A resposta a esta questão só se poderá obter através de
uma racionalização ao nível do marco institucional, articulando-se técnica e democracia.
Tendo em vista esse fim, Habermas postula uma acção comunicativa, que poderia,
acrescentamos nós, questionar as normas e as cosmologias vigentes no modo como
vivemos e entendemos o corpo. Em geral, Habermas conceptualiza uma acção que tenda
a redefinir todos os domínios do social, que promova uma integração que reconheça o
verdadeiro sentido histórico da sua acção e que recuse uma integração social
compulsiva, sem reflexão e distanciamento, como forma de normalização do
comportamento potencialmente perigoso à estabilização dos sistemas. É necessária uma
agenda sobre política da vida, presente na esfera pública, que questiona e negoceia os
modos de vivência do mundo e a ‘natureza humana’. A identidade dos indivíduos tem
de surgir de uma forma que seja aceite, partilhada e justificável aos olhos de todos, não
sendo nem imutável ou dogmática nem estanque a críticas, reinterpretações ou revisões,
e ilustrando simultaneamente uma individualidade máxima e uma máxima
universalidade.
Os imperativos tecnológicos e racionais da medicina na modernidade avançada
precisam de ser temperados por uma perspectiva mais humanista dos cuidados de saúde,
uma perspectiva que coloque os sentimentos e as emoções dos pacientes num plano
central no processo de tratamento médico. E porque não ir buscar inspiração à ética pós-
moderna de desconstrução das categorias, de modo a levar a cabo um tratamento
baseado na confiança e no compromisso espontâneo com o ‘outro’ e evitar formas
(modernas) possessivas, repetitivas e negativas de dependência que disciplinam e
envolvem o indivíduo.
18
HABERMAS, Jürgen; Técnica e Ciência Como «Ideologia», Lisboa, Edições 70, 1994, p. 89
19
Idem, Ibidem, p. 119
20
Idem, Ibidem, p. 89
57
Saúde, Medicina e Sociedade: Considerações Sobre a Construção Social do Corpo e das Formas de ‘Embodiment’
CONCLUSÃO
58
Saúde, Medicina e Sociedade: Considerações Sobre a Construção Social do Corpo e das Formas de ‘Embodiment’
toda uma agenda de questões que se abriu e que se revelou profícua e que inspirou tanto
a corrente da modernidade avançada como a corrente pós-moderna. E um estudo
depurado das teses de Foucault integrado com os recentes avanços teóricos poderá ser a
base de um corpo teórico mais unificado para o estudo do corpo, integrando as várias
formas de ‘embodiment’, as várias formas de sentir e viver o corpo ou as suas próteses
tecnológicas, as várias formas de viver a velhice, a juventude, de viver a doença, a dor,
etc
BIBLIOGRAFIA
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