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Revolução
Ruy Mauro Marini
...todo nosso esforço está destinado ao convite de pensar e a abordar o marxismo com a
seriedade que esta gigantesca doutrina merece.
Ernesto Che Guevara.
Fuente: Ruy Mauro Marini, Subdesarrollo y revolución, Siglo XXI
Editores, México, (quinta edición) 1974, pp. 1-25. Páginas
iniciales [PDF].
Capítulo I. SUBDESENVOLVIMENTO E REVOLUÇÃO
A vinculação ao mercado mundial
A integração imperialista dos sistemas de produção
A luta pelo desenvolvimento capitalista autônomo
O fracasso da burguesia
O desenvolvimento capitalista integrado
O futuro da revolução latino americana
A história do subdesenvolvimento latino americano é a história do
desenvolvimento do sistema capitalista mundial. Seu estudo é indispensável
para quem quer compreender a situação que se enfrenta atualmente este
sistema e as perspectivas que se abrem. Inversamente, apensa a compreensão
precisa da evolução e os mecanismos que caracterizam a economia capitalista
mundial proporciona o marco adequado para localizar e analisar a problemática
da América latina.
As simplificações que, por sua natural limitação, incorrem neste trabalho não
devem fazer esquecer o leitor essa premissa fundamental.
O fracasso da burguesia
A causa fundamenta deste fracasso se deve, em ultima instância, a
impossibilidade da indústria de se impor contra o condicionamento em que se
impôs o setor externo, desde seus primeiros passos. Atendendo a demanda
criada pelas classes ricas e utilizando uma tecnologia importada dos países
centrais, cuja característica principal é economizar mão de obra, a indústria
latino americana se encontrou com um mercado reduzido, que tratava de
compensar abusivamente a relação preço-salários. Isto era possível justamente
por que, empregando uma tecnologia que economiza mão de obra, a indústria
enfrentou uma oferta cada vez maior de empregos, o que lhe permitiu travar
salários em seu nível mais baixo. Em contrapartida, o crescimento do mercado
era exatamente lento e não se podia compensar senão mediante a alta de
preços, quer dizer, a inflação.
Quando se instala o problema da criação de uma indústria pesada, a
burguesia industrial se inclina incialmente, como vimos, fazia a reformulação
deste esquema. Nesse sentido, busca mobilizar instrumentos capazes de
ampliar a escala de mercado, bem como acelerar o repasse ao setor industrial
do excedente gerado pelas exportações. Porém, na ânsia de aumentar sua mais-
valia relativa - aproveitando a oferta mundial de equipamentos e maquinários
que aumenta no pós-guerra - acaba voltando-se para medidas mais imediatas,
tendendo a flexibilizar a capacidade de importação no curto prazo.
Contudo, vimos que desde os anos 1920 a capacidade para importar se
deteriorava constantemente. Para aumentar, então, o montante de divisas
disponíveis para a importação de equipamentos e bens intermediários, não
cabe à burguesia industrial, mas comprometer-se com o setor agropecuário
exportador e até mesmo dar-lhe as facilidades e incentivos de que necessita.
expandir suas atividades. Para que o fizesse, sem limitar a acumulação de capital
necessário para enfrentar a segunda etapa da industrialização, tem que
descarregar sobre as massas trabalhadoras da cidade e do campo o esforço da
capitalização, com o que afirma mais uma vez o princípio fundamental do
sistema subdesenvolvimento, quer dizer, a super exploração da força de
trabalho.
Este fenômeno, claramente manifesto na aceleração da inflação e depois
nas políticas de “estabilização”, assim como na renúncia a realizar uma reforma
agrária efetiva, tem como consequência a ruptura da base em que se apoiava a
política bonapartista. Ao se comprometer com as velhas classes dominantes, a
burguesia industrial teve que abandonar sua fraseologia revolucionária, a
questão das reformas estruturais, as políticas de redistribuição de renda. Com
este divórcio das aspirações das grandes massas caindo por terra a
possibilidade de manter com elas uma aliança tática.
Este processo se completou com a renuncia da burguesia de levar a cabo
uma política de desenvolvimento autonomo. Com efeito, o assédio dos capitais
estrangeiros, que se intendifica nos anos1950 coincidem com a dificuldade das
economias latino-americanas para alcançar uma flexibilização da sua
capacidade de importar, mediante a expansão de exportações tradicionais
(dificuldades sobretudo sensiveis com o termino da guerra da Corea). Agora,
como vimos, as empresas estrangeiras possuíam máquinas e equipamentos
obsoletos e não amortizados nas metrópoles, o que representou um avanço
efetivo em relação ao nível tecnológico vigente nos países latino-americanos. A
entrada destes capitais, em forma de investimento direto e cada vez mais, em
associação com empresas locais, constituía uma solução conveniente para
ambas partes: para o investidor estrangeiro, seu equipamento obsoleto
produziria ali utilidades similares que poderiam um equipamento mais moderno
em seu país de origem, em virtude do preço mais da mão de obra local; para a
empesa local, se abria a possibilidade de alcançar com isto uma mais-valia
extraordinária.
Assim, a burguesia industrial latino-americana deriva da ideia de um
desenvolvimento autônomo através de uma integração efetiva com os capitais
imperialistas e dá lugar a um novo tipo de dependência, muito mais radical que
o que regia anteriormente. O mecanismo da associação de capitais é a forma
que consagra esta integração, na qual não só desnacionaliza definitivamente a
burguesia local, mas também, ao passo que vai à acentuação da poupança de
mão de obra que caracteriza o setor secundário latino-americano, consolida a
prática abusiva de preços (que se fixam segundo o custo de produção das
empresas tecnologicamente mais atrasadas) como meio de compensar a
redução concomitante do mercado. O desenvolvimento capitalista integrado
acrescenta, porém, o divórcio entre a burguesia e as massas populares,
intensificando a superexploração a que estão submetidas e negando o que
representa sua reivindicação mais elementar: o direito ao trabalho.
A coincidência dessas duas tendências – o abandono da política
bonapartista e das aspirações do desenvolvimento capitalista autônomo – leva
ao fim dos regimes liberal/democráticos que haviam intentado se firmar no pós
guerra e conduz a implantação de ditaduras tecnocráticas-militares. Somando a
acentuação do papel executivo do Estado e o incremento considerável dos
gastos militares, que se constituem em escala crescente em demanda de uma
oferta industrial que não pode basear-se na expansão do consumo popular.
Com as deformações de escala naturais, o imperialismo reproduz assim nas
economias periféricas da América Latina as mesmas características
fundamentais que afirmaram nas economias centrais, em seu trânsito até a
integração dos sistemas de produção.
Notas
[1] Os principais traços destas modalidades ou tipos foram definidos por Celso
Furtado e Aníbal Pinto, em diferentes trabalhos, e sistematizados por Cardoso e
Faletto em Faletto en Dependencia y desarrollo en América Latina, Siglo XXI,
México, 1973.
[6] Ver Ernest Mandel, Traité d'économie marxiste, París, 1962. Hay edición
española, Era, México, 1969.