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Lições sobre a filosofia da religião

G.W.F. Hegel

Tradução Arthur Grupillo


Prefácio (segundo a lição de 1827)1

A. A relação da filosofia da religião com a filosofia em geral

A primeira coisa que precisamos levar em consideração é a relação da filosofia da


religião com a filosofia em geral e, em segundo lugar, a relação da ciência da religião com as
necessidades do nosso tempo.

O objeto é a religião, e este é o mais alto objeto de que se podem ocupar os seres
humanos; é o objeto absoluto. É a região da verdade eterna, da virtude eterna – a região onde
todos os enigmas do pensamento, todas as contradições e todas as dores da alma deveriam se
apresentar como resolvidos, e a região do eterno sossego, pela qual o ser humano é
verdadeiramente humano. Todos os emaranhados infindáveis da atividade e dos prazeres
humanos nascem da determinação do ser humano como espírito em si. E tudo que tem valor e
atenção para as pessoas, tudo sobre o que elas pensam edificar sua fama e seu orgulho, tudo
isso encontra o seu foco último na religião, no pensamento ou consciência de Deus e no
sentimento de Deus. Deus é o começo e o fim de tudo. Deus é o centro sagrado que vivifica e
anima todas as coisas. A religião possui o seu objeto dentro de si mesma – e esse objeto é Deus;
ela é a relação da consciência humana a Deus. O objeto da religião é absolutamente mediante
si mesmo e para si mesmo; é o fim último absoluto em si e para si, o ser absolutamente livre. A
consideração do fim último não pode ter outro fim último senão este objeto mesmo. Todos os
outros fins experimentam seu cumprimento apenas através dele. Ao ocupar-se deste fim último,
o espírito liberta a si mesmo de toda finitude; essa ocupação é a verdadeira libertação do ser
humano e é a própria liberdade, a veraz consciência da verdade2. Todas as outras coisas ficam
no passado; a vida finita parece agora como um deserto; a religião é a consciência da liberdade
e da verdade. Se nosso ocupar-se dela está em um sentimento, então é uma felicidade, e se é
uma atividade, então tem de manifestar a glória e a majestade de Deus. Este conceito de religião
é universal. A religião possui este lugar em todos os povos e para todas as pessoas. Em toda
parte esta ocupação é considerada como o domingo da vida. Em verdade, nesta região do
espírito, fluem as águas do esquecimento das quais a alma bebe3. Todas as dores deste banco
de areia da vida4 desvanecem neste éter, seja no sentimento da devoção ou da esperança; todas
essas coisas caem no passado. Na religião, toda preocupação se esvai, pois nela o homem se
encontra feliz. Toda dureza do destino desaparece em um sonho; tudo que é terrestre se
dissolve em luz e amor – não em uma coisa remota, mas em uma vivacidade, certeza e deleite
presentes. Mesmo que a religião esteja adiada para o futuro, ela ainda irradia na efetividade da
vida presente, na qual esta imagem é substância efetiva. Tal é o conteúdo universal da religião
entre os seres humanos; e nossa intenção é considerar este conteúdo.

[1. Comparação entre filosofia e religião com respeito ao seu objeto5]

1
Aqui tem uma nota do Hodgson
2
Aqui tem uma nota do Jaeschke, traduzida pelo Hodgson [similaridades de versão]
3
Aqui tem uma nota do Hodgson
4
Shakespeare, Macbeth, Ato I, Cena 7.
5
Aqui tem uma nota do Hodgson
6
Mas deve ser notado imediatamente que a expressão “considerar” envolve uma
relação que já é algo distorcida. Pois, quando falamos de “consideração” e “objeto”, estamos
distinguindo os dois lados como autônomos, mutuamente independentes, lados fixos que são
mutuamente opostos. Por exemplo, o espaço é o objeto da geometria; mas as figuras espaciais
que ela considera são distintas do espírito que considera; elas são apenas o seu objeto. Assim,
se dizemos agora que a filosofia deve considerar a religião, então ambas são, da mesma maneira,
colocadas numa relação de distinção, na qual elas permanecem em oposição uma à outra. Mas,
pelo contrário, é preciso dizer que o conteúdo da filosofia, sua necessidade e interesse, é
completamente em comum com aquele da religião. O objeto da religião, como aquele da
filosofia, é a verdade eterna, Deus e nada além de Deus e a explicação de Deus. A filosofia apenas
se explica, quando explica a religião, e quando ela explica a si mesma está explicando a religião.
Pois o espírito pensante é aquele que penetra o seu objeto, a verdade; é aquele que, nesta
ocupação, desfruta da verdade e purifica a consciência subjetiva. Assim, filosofia e religião
coincidem em uma coisa só. De fato, a filosofia é ela mesma culto a Deus, como é a religião.
Porém, ambas, a religião assim como a filosofia, são culto a Deus de uma maneira peculiar, sobre
o que falaremos mais adiante. Elas se diferenciam no caráter peculiar de como se ocupam de
Deus, e aqui residem as dificuldades que a filosofia pode ter de entender a religião, e
frequentemente parece impossível que as duas sejam unidas. Daí a atitude apreensiva da
religião para com a filosofia, a posição hostil de cada uma em relação à outra. Parece, como os
teólogos frequentemente pretendem dizer, que a filosofia tem o efeito de estragar o conteúdo
da religião, destruindo-o e profanando-o. Esta velha oposição ergue-se diante de nossos olhos
como algo aceito e reconhecido, mais reconhecido do que aquela unidade entre elas. Parece ter
chegado o tempo, contudo, em que a filosofia pode lidar com a religião de modo mais imparcial,
de um lado, e mais frutífero e auspicioso, de outro.

Esta conexão entre elas não é nada nova; já se encontra entre os mais eminentes pais
da igreja7, que se dedicaram a fundo especialmente à filosofia neopitagórica, neoplatônica e
neo-aristotélica. Em parte, eles mesmos chegaram ao cristianismo a partir daí, e em parte
aplicaram essa profundidade do espírito aos ensinamentos do cristianismo. A igreja deve os
primeiros começos da doutrina cristã à formação filosófica deles, o desenvolvimento de uma
dogmática. – Embora frequentemente se diga que é uma pena que o cristianismo tenha obtido
um conteúdo determinado e uma dogmática. Adiante, ainda teremos mais a dizer sobre a
relação disso com a sensibilidade religiosa, isto é, com o elemento puramente intensivo da
devoção –. A mesma conexão entre teologia e filosofia também vemos na Idade Média. A
filosofia escolástica é uma só e a mesma com teologia; esta é filosofia, e filosofia é teologia. Eles
estavam tão longe de acreditar que o pensar, o saber conceitual, poderia ser desvantajoso à
teologia, que antes o tomavam por necessário, como essencial à teologia mesma. Esses grandes
homens, Anselmo, Abelardo, construíram teologia a partir da filosofia; assim disse Anselmo: cum
ad fidem perveneris, negligentiae mihi esse videtur non intellegere quod credis8. 9

6
Aqui tem uma nota do Jaschke que o Hodgson traduz [similaridades de versão]
7
Aqui tem uma nota do Hodgson
8
Aqui tem uma nota do Hodgson, da qual peguei o essencial: “Quando você vem para a fé, parece-me
negligência não entender o que você acredita”. Cf. Anselmo, Cur Deus Homo, cap. 2.
9
Aqui tem uma nota do Jaschke que o Hodgson traduz [acrescimento de texto]
B. A relação da ciência da religião com as necessidades do nosso tempo

[2. A relação da ciência da religião às necessidades do nosso tempo]10

Que o tempo de agora pareça de novo ser mais propício à conexão entre filosofia e
teologia, depois de um período em que aquela oposição se tornou mais uma vez uma
preconcepção11, isso se deve a duas circunstâncias que precisam ser destacadas. A primeira diz
respeito ao conteúdo, a segunda, à forma12. Em relação ao conteúdo, foi comumente feita
contra a filosofia a censura de que, através dela, o conteúdo da doutrina da religião revelada,
positiva, é suprimido, de que através dela o cristianismo é destruído. Apenas foram concedidas
à filosofia uma assim chamada religião natural13 e uma teologia natural, isto é, um conteúdo que
a luz natural da razão poderia fornecer sobre Deus; mas isso foi sempre considerado como
estando em oposição ao cristianismo. No presente, essa censura de que a filosofia é destruidora
de dogmas foi removida, e essa remoção aconteceu por causa da teologia do nosso tempo, dos
últimos trinta a cinquenta anos.

Na teologia mais recente, muito pouco sobrou dos dogmas do sistema anterior de
confissão eclesial ou, pelo menos, da importância previamente atribuída a eles, e outros não
foram colocados no seu lugar. Se poderia concluir facilmente que na religiosidade geral do
público penetrou uma indiferença amplamente difundida, quase universal, para com as
doutrinas da fé, anteriormente consideradas essenciais. Embora Cristo como reconciliador e
salvador ainda seja feito o centro da fé, contudo o que antes era chamado, na dogmática
ortodoxa, de obra salvífica assumiu um significado tão fortemente psicológico e tão prosaico,
que da antiga doutrina da igreja apenas permanece a aparência. No lugar dos antigos dogmas,
se vê em Cristo meramente “uma grande energia de caráter, firmeza de convicção, pela qual
Cristo deu a própria vida”14, e este é agora o objeto universal da fé. Assim, Cristo é rebaixado ao
nível dos negócios humanos, e não apenas ao nível da vida comum, mas até mesmo àquele nível
dos humanos que é a esfera do tipo de ação do qual também foram capazes pagãos como
Sócrates. E assim, embora Cristo tenha permanecido o centro da fé para muitos religiosos e para
homens mais profundos, deve parecer ainda que as doutrinas mais importantes perderam muito
do seu interesse, por exemplo, a fé na Trindade ou nos milagres do Antigo e do Novo
Testamento, etc15.

Se uma grande parte do público educado, incluindo muitos teólogos, tivessem de


declarar com a mão no coração se eles consideravam essas doutrinas da fé indispensavelmente
necessárias à felicidade eterna, ou se não acreditar nelas teria como consequência a danação
eterna, certamente não haveria dúvida de qual seria a resposta16. “Danação eterna” e
“felicidade eterna” são elas mesmas palavras que não podem ser usadas na assim chamada boa

10
Aqui tem uma nota do Hodgson
11
Aqui tem uma nota do Hodgson
12
Aqui tem uma nota do Jaschke que o Hodgson traduz [acrescimento de texto] verificar
13
Aqui tem uma nota do Hodgson
14
Aqui tem uma nota do Hodgson
15
Aqui tem uma nota do Jaschke que o Hodgson traduz e acrescenta alguma coisa [acrescimento de
texto] verificar
16
Aqui tem uma nota do Hodgson
sociedade; tais expressões valem como ἄρρητα17. Mesmo que alguém não as negue, ainda seria
constrangedor se explicar a respeito delas18. E se alguém tivesse lido os livros de dogmática, ou
livros edificantes e de sermões de nosso tempo, nos quais as doutrinas básicas do cristianismo
deviam ser estabelecidas ou tomadas como fundamentais, e fosse obrigado a julgar se na maior
parte da literatura teológica aquelas doutrinas são expressas em sentido ortodoxo e sem
ambiguidade ou portas de trás, então, de novo, não há dúvida de qual seria a resposta. Se agora
a teologia não mais coloca tanta importância nas doutrinas positivas do cristianismo, ou se
através da explicação essas doutrinas são envolvidas numa tal névoa, então cai com isso o único
impedimento para a concepção filosófica dos dogmas, que de resto surgiu porque a filosofia era
considerada uma oponente das doutrinas da igreja. Se aquelas doutrinas afundaram tanto no
interesse que tinham, então a filosofia pode se sentir à vontade em relação a elas19.

O maior sinal de que esses dogmas positivos perderam muito de sua importância é o
fato de serem tratados historicamente de maneira excelente20. Na medida em que esse
tratamento histórico é considerado, no entanto, ele lida com pensamentos e representações
que foram assumidos, levantados e disputados por outros, com convicções que outros
possuíam, com histórias que não procedem do nosso espírito, que não levam em consideração
as necessidades do nosso espírito. Nesse tratamento, o que interessa é como essas coisas foram
feitas, no caso dos outros, isto é, como elas por acaso surgiram21. O modo absoluto como
surgiram a partir das profundezas do espírito, e assim a necessidade e verdade dessas doutrinas,
é esquecido, e a questão da convicção própria que cada um possui sobre isso é tomada com
espanto. O tratamento histórico se ocupa bastante com essas doutrinas, embora não com o seu
conteúdo, mas sim com a exterioridade das controvérsias sobre elas, com as paixões que se
uniam a elas, etc. Desse modo22, a filosofia não precisa mais enfrentar a censura de que ela
menospreza os dogmas; pelo contrário, ela sofre a censura de conter nela mesma em excesso
os ensinamentos da igreja, mais do que a teologia em geral predominante no nosso tempo.

A outra circunstância que parece favorecer novamente o vínculo entre teologia e


filosofia diz respeito à forma; e aqui, de fato, se trata da convicção da época de que Deus é
revelado imediatamente à consciência dos seres humanos, de que a religião consiste apenas em
que o ser humano sabe de Deus imediatamente. Este saber imediato é chamado de religião, mas
também é chamado de razão e fé; fé, contudo, num sentido diferente do eclesial. Toda
convicção de que Deus é e sobre o que Deus é reside, por assim dizer, neste imediato ser-
revelado no ser humano, isto é, sobre esta fé23. Esta representação geral é agora uma
preconcepção24. Ela implica que o conteúdo mais elevado ou religioso se transmite ao ser
humano no espírito mesmo, que o espírito se manifesta em espírito, neste meu espírito; que a
fé tem sua raiz no mais íntimo, no que me é mais profundamente próprio, e que meu íntimo é
inseparável disso. Este é o princípio geral segundo o qual a fé religiosa é determinada nos
tempos mais recentes, como intuir imediato, como saber em mim, que absolutamente não vem
de fora. Com isso, toda autoridade externa é totalmente removida, isto é, toda certificação
estranha. O que deve valer para mim precisa ter sua certificação no meu próprio espírito. O

17
Do grego: inexpressível, indizível. [Tem uma pequena adição de Hodgson]
18
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz
19
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
20
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
21
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
22
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
23
Aqui tem uma nota do Hodgson
24
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
ímpeto bem pode vir de fora, mas o começo exterior é indiferente. Que eu tenha fé, isso se deve
ao testemunho do meu próprio espírito.

Que aquele conteúdo esteja disponível e manifesto é na verdade o simples princípio do


próprio conhecimento filosófico: a saber, que nossa consciência sabe de Deus imediatamente,
que o saber do ser de Deus é absolutamente certo para o ser humano. A filosofia não só não
rejeita esta proposição, como faz dela uma determinação fundamental sua. Deste modo, é em
geral um ganho, a ser visto como um tipo de sorte, que princípios fundamentais da própria
filosofia vivifiquem na representação popular como preconcepções gerais, de modo que o
princípio filosófico pode mais facilmente adquirir o assentimento de pessoas educadas em
geral25.

Em relação a esse saber imediato, a primeira coisa a destacar é que este princípio não
fica inerte nesta simples determinação, neste conteúdo ingênuo. Ele não se expressa apenas
afirmativamente, mas, ao contrário, o saber ingênuo incide polemicamente contra o
conhecimento e é especialmente dirigido contra o conhecimento ou compreensão conceitual
de Deus. O que ele afirma não é apenas que alguém deve ter fé, isto é, deve saber
imediatamente; não apenas que a consciência de Deus está vinculada à autoconsciência, mas,
antes, que a relação a Deus é apenas e exclusivamente uma relação imediata. A imediatidade
da conexão é tomada como excluindo a outra determinação, colocada pela mediação, e a
filosofia, porque ela é um saber mediado, é de novo considerada apenas um saber finito do
finito.

Mais precisamente, a imediatidade desse saber, acima de tudo, deve estacionar aí, no
fato de que se sabe que Deus é, não o que Deus é; a expansão, o conteúdo, o preenchimento da
representação de Deus é, desta forma, negado. Mas o que nós chamamos de conhecimento não
é apenas que se saiba, de um objeto, que ele é, mas também o que ele é; e não apenas que se
saiba o que ele é num sentido geral, ou que se tenha alguma familiaridade, alguma qualquer
certeza disso, mas sim o saber de suas determinações, o conteúdo que possui, de modo que
este saber seja preenchido e verificado, no qual se sabe da conexão necessária dessas
determinações.

É afirmado que Deus não pode ser conhecido de modo nenhum, mas que apenas
sabemos que ele é: isto nós encontraríamos em nossa consciência26. Na medida em que nós,
antes de tudo, deixamos de lado a orientação polêmica dessa afirmação e consideramos mais
uma vez o que repousa na afirmação do saber imediato, então ela significa isto: que, de um lado,
é o nosso espírito mesmo que dá testemunho desse conteúdo, que esse conteúdo não vem de
fora, apenas através da instrução. Pelo contrário, a convicção sobre ele se baseia no
assentimento de nosso próprio espírito, da própria consciência, de que o espírito encontra este
conteúdo em si mesmo27. Por outro lado, a consciência também está relacionada a este
conteúdo, de modo que essa consciência e esse conteúdo, Deus, são inseparáveis. Esta relação
em geral, esse saber de Deus e esta inseparabilidade entre a consciência e este conteúdo, é
exatamente o que nós chamamos de religião em geral. Mas, ao mesmo tempo, na afirmação do
saber imediato repousa o fato de que, na consideração da religião como tal, nós deveríamos
logo estacionar, mais precisamente, na consideração desta relação a Deus. Não se deveria
progredir até o conhecimento de Deus, até o conteúdo divino e como este conteúdo estaria

25
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
26
Aqui tem uma nota do Hodgson
27
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
divinamente e essencialmente em Deus mesmo. Neste sentido, se diz depois disso que nós
podemos saber apenas nossa relação a Deus, não o que Deus mesmo é. “Apenas nossa relação”
significa aqui o que se denomina religião em geral28. É por isso que nós ouvimos, nos dias de
hoje, falar da religião, mas não encontramos nenhuma investigação sobre a natureza de Deus
ou o que Deus seria em si mesmo, isto é, como a sua natureza precisa ser definida. Deus como
tal não é feito objeto ele mesmo; ele não está diante de nós como objeto do conhecimento, e o
conhecimento no interior deste objeto não se amplia. Apenas nossa relação a Deus, ou religião
como tal, é objeto para nós. Trata-se da religião como tal, não de Deus, pelo menos não muito.
Exposições sobre a natureza de Deus são cada vez mais raras; apenas se diz que os seres
humanos devem ter religião. Que tipo de relação a religião tem com a filosofia e com o estado,
disso se fala, mas não de Deus29.

Mas, se nós retiramos as consequências que residem na proposição do saber imediato,


do que nela é imediatamente dito, então Deus mesmo é expresso em relação à consciência, de
modo que esta relação é um Inseparável, ou que precisamos considerar ambos conjuntamente,
e este é o objeto essencial de nossa consideração30. Isto é a própria ideia filosófica, e ela não se
opõe ao conceito filosófico31. Segundo o conceito filosófico, Deus é espírito, concreto; e se nós
perguntamos mais precisamente o que é espírito, então o conceito fundamental de espírito é
aquele cujo desenvolvimento constitui a inteira doutrina da religião. Se nós perguntamos
provisoriamente à nossa consciência o que o espírito é, a resposta será que o espírito é aquilo
que se auto-manifesta, um ser que é para o espírito. O espírito é para o espírito, e isso
certamente não de um modo apenas exterior ou por acaso. Pelo contrário, ele é espírito apenas
na medida em que é para o espírito; e isso é o que constitui o próprio conceito de espírito. Ou,
para falar de maneira mais teológica, o espírito de Deus é essencialmente em sua comunidade;
Deus é espírito apenas na medida em que está em sua comunidade32.

Pelo fato de a unidade inseparável da consciência com Deus ser expressa naquilo que o
saber imediato contém, assim, naquela inseparabilidade está contido o que reside no conceito
de espírito, a saber, que o espírito é para o próprio espírito, que o tratamento da questão não
pode ser unilateral, apenas uma consideração do sujeito segundo a sua finitude e sua vida
contingente, mas sim na medida em que tem por objeto o conteúdo absoluto infinito. Caso o
sujeito seja considerado por si, como o indivíduo subjetivo como tal, então ele é considerado
em seu saber finito, isto é, em seu saber do finito. Da mesma forma, também se afirma que, por
outro lado, não se deve considerar Deus apenas por si mesmo, pois isso não seria possível; de
Deus só se sabe em relação à consciência33.

O que foi dito são determinações fundamentais que nós podemos enxergar como
representações e convicções imediatas da época expressamente no tocante à religião, ao saber
de Deus34. Portanto, só os elementos básicos ou conceitos fundamentais da filosofia da religião
podem ser vinculados àqueles fundamentos. A vantagem exterior adicional é que assim não
precisamos, a fim de pavimentar o caminho para nossa ciência, assumir nenhuma polêmica
contra aquela visão que supostamente se coloca como obstáculo da filosofia. Certamente

28
Aqui tem uma nota do Hodgson
29
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
30
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
31
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
32
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
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Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
34
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
aquelas afirmações se opõem elas mesmas ao conhecimento filosófico35, pois a falta de
consciência sobre o que realmente se opõe à filosofia não tem limites. Precisamente aquelas
afirmações que partem daí para dizer o contrário e questionar a filosofia, e que pretendem se
opor a ela ainda mais fortemente – se olharmos para o seu conteúdo, a visão determinada que
elas expressam, então vamos ver que elas exibem em si mesmas uma concordância com aquilo
que combatem.

O resultado do estudo da filosofia é que aqueles muros de divisão, que devem separar
de maneira absoluta, se tornam transparentes; que, quando se vai até o fundamento, se
encontra absoluto acordo ali onde se pretendia haver a maior oposição36.

Mais especificamente, essas representações da época polemizam contra a expansão do


conteúdo em si. Deve-se crer em Deus, mas em geral não se deve saber o que ele é, nem ter
dele qualquer saber determinado. Possuir um saber determinado é o que chamamos de
conhecimento. Por esta razão, a teologia como tal foi reduzida a um mínimo de dogmas. Seu
conteúdo ficou extremamente magro, mesmo que haja muito falatório, pesquisa especializada
e disputa de argumentos. A direção se volta, principalmente, contra aquela expansão a que se
chama Dogmática. Essa mudança de atitude pode ser comparada com o que foi feito por ocasião
da Reforma. Pois, combateu-se a expansão do sistema de hierarquia e colocou-se como meta
decisiva a volta do cristianismo à simplicidade da primeira época cristã. Assim, é uma
determinação fundamental do período moderno que as doutrinas da igreja protestante sejam
reduzidas a um mínimo. Mas se por acaso também a teologia reduz o seu saber a um mínimo,
ela ainda precisa saber muitas e variadas coisas, por exemplo, a respeito da vida ética e das
relações humanas. Ela ainda tem uma larga extensão de assuntos e matérias para lidar; a
erudição das questões históricas é muito detalhada37. Com isso, o sujeito não se ocupa o com
seu próprio conhecimento, mas com o conhecimento das representações de outras pessoas.
Pode-se comparar essa movimentação da teologia com o cargo do contador ou do operador de
caixa registradora, porque sua movimentação tem a ver com verdades alienadas que pertencem
a outras pessoas38. Nós, pelo contrário, vemos no próprio tratamento da ciência da religião que
o interesse específico da razão é instruir-se num âmbito intelectual que tudo abarca. E o
principal, nesta instrução, é que ela ocorra racionalmente, segundo a necessidade da coisa, do
conteúdo mesmo, e não segundo o arbítrio e o acaso.

Pelo fato de a teologia ter assim se reduzido apenas ao saber de que Deus é, ela acabou
ampliando o âmbito das discussões sobre a vida ética e a moralidade, e pelo fato de que essa
ampliação ela mesma não deve ocorrer por meio do conhecimento, então ela ocorre não
segundo a necessidade, mas de maneira arbitrária39. As disputas argumentativas fazem uma
qualquer pressuposição e procedem segundo as relações do entendimento reflexivo, que nós
desenvolvemos em nós mesmos através da educação, sem qualquer atitude crítica sobre essas
relações. Isso é o que se tem alegado nesta ciência. Ao contrário, o desenvolvimento mediante
o conceito não admite nenhuma aleatoriedade; exatamente por isso é que se tem tanto ciúme
dele, porque ele nos coloca as algemas de ter de proceder segundo a necessidade da coisa, não
segundo invencionices e opiniões.

35
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
36
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
37
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
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Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
39
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
Aquelas disputas argumentativas fazem pressuposições que podem ser elas mesmas
questionadas. Mas a teologia argumentativa da igreja cristã finge possuir uma base firme. “Para
nós o firme suporte é a Bíblia, são as palavras da Bíblia”, eles dizem. Mas, ao mesmo tempo,
poder-se-ia citar essencialmente aquela passagem: “a letra mata”40, etc. Não se tomam as
palavras da Bíblia simplesmente como estão, uma vez que por palavra bíblica se entende não as
palavras ou letras como tais, mas o espírito com o qual elas são compreendidas. Pois nós
sabemos historicamente que dogmas bastante opostos foram derivados dessas palavras, que os
mais diferentes pontos de vista foram extraídos da letra do texto, porque não era o espírito que
o compreendia; nestes casos, apelou-se para a letra, mas o verdadeiro fundamento é o espírito.

As palavras da Bíblia são um relato que não é sistemático; elas são o cristianismo como
ele apareceu no começo, mas é o espírito que compreende o conteúdo, que o explica41. Como
isso é feito, depende de como o espírito é adquirido, isto é, se aquele que compreende é o
espírito verdadeiro e correto. Este só pode ser aquele que procede em si mesmo segundo a
necessidade, não segundo pressupostos. Esse espírito que interpreta precisa se legitimar por si
mesmo, e sua própria legitimação é a Coisa mesma, o conteúdo, aquilo a que o conceito confere
substância.

Portanto, a autoridade da fé estatutária da igreja em parte afundou, e em parte foi


removida. O próprio symbolum, a regula fidei, não vale mais como algo obrigatório per se, mas
sim como algo que tem de ser interpretado e explicado a partir da Bíblia. Mas a interpretação
depende do espírito que explica; o suporte absoluto é apenas o conceito. Ao contrário, por meio
da exegese tais doutrinas fundamentais do cristianismo são parcialmente deixadas de lado, e
parcialmente explicadas de uma maneira bastante morna; dogmas tais como aquele da Trindade
e dos milagres são colocados nas sombras pela própria teologia42. Sua justificação e verdadeira
afirmação apenas podem ocorrer por meio do espírito que conhece, e assim se preserva muito
mais da dogmática na filosofia do que na dogmática ou na teologia como tal.
43
Deve-se destacar, em segundo lugar, o que implica a exigência que se faz à filosofia,
especialmente à filosofia da religião, de que se deveria, antes de ir ao conhecimento, investigar
a natureza da faculdade cognitiva ela mesma; de que apenas aquela investigação do
instrumento demonstraria com certeza se nós podemos com direito tentar conhecer Deus. Nós
queremos, na verdade, ir à Coisa mesma, sem nos voltar a questões preliminares adicionais. Mas
esta Coisa reside tão próximo, que ela precisa ser abordada. Parece ser uma exigência justa que
alguém tenha de testar as próprias forças e examinar seu instrumento antes de partir para o
trabalho44. Mas, por mais plausível que ela possa parecer, tanto mais essa exigência se mostra
inadmissível e nula. Ocorre com tais analogias frequentemente que as figuras que se ajustam a
um contexto não se ajustam a outro. Como deve a razão ser investigada? Sem dúvida
racionalmente; por isso essa investigação é ela mesma saber racional. Não há outro jeito
possível de investigar o conhecimento senão o do próprio conhecimento. Nós devemos,
portanto, conhecer a razão, e o que nós queremos fazer deve ser ainda um conhecer racional.
Desta forma, portanto, fazemos uma exigência que suprassume a si mesma. Essa exigência é a

40
Aqui tem uma nota do Hodgson
41
Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto]
42
Aqui tem uma nota do Hodgson
43
Aqui tem uma nota do Hodgson
44
Aqui tem uma nota do Hodgson
mesma que aquela de uma conhecida anedota na qual um escolástico diz que ele não iria entrar
na água até ter aprendido a nadar45.

De qualquer forma, na filosofia da religião temos como nosso objeto Deus mesmo, a
razão absoluta46. Na medida em que sabemos de Deus, que é razão absoluta, e investigamos
esta razão, nós a conhecemos, isto é, nos comportamos cognitivamente. O espírito absoluto é
saber, saber racional determinado do seu próprio si mesmo [seiner selbst]; portanto, na medida
em que nos ocupamos com este objeto, segue-se imediatamente que nós estamos lidando com
o conhecimento racional e o investigando, e este conhecimento é ele mesmo investigação e
saber conceitual, racional. Assim, aquela exigência mostra-se absolutamente nula. Nosso
conhecimento científico é ele mesmo essa investigação do conhecer que foi exigida.

A segunda circunstância que aqui ainda precisa ser discutida é a seguinte observação.
Devemos recordar aqui o que nós dissemos à guisa de introdução, que a religião em geral é a
mais elevada e última esfera da consciência humana, seja como sentimento, vontade,
representação, saber e conhecimento – o resultado absoluto, aquela região na qual o ser
humano penetra como sendo a região da verdade absoluta. A fim de querer encontrar essa
determinação universal, precisa já ter ocorrido de a consciência ter elevado a si mesma a esta
esfera que transcende o finito em geral, que transcende a existência, as condições, fins e
interesses finitos, e que transcende especialmente todos os pensamentos finitos e relações
finitas de todo tipo. Para estar na religião, é preciso ter descartado essas coisas, esquecê-las.
Contra essas determinações fundamentais, contudo, acontece muito frequentemente, quando
se fala contra a filosofia em geral e especialmente contra o filosofar sobre Deus, que, para efeito
desse discurso, se trazem pensamentos finitos, relações de limitação, e categorias e formas do
finito como um todo. Pretende-se com tais formas fazer oposição à filosofia em geral e
especialmente ao seu gênero mais elevado, a filosofia da religião. Pertence a tais formas finitas
a imediatidade do saber, o fato da consciência; tais categorias são, por exemplo, a oposição
entre finito e infinito, sujeito e objeto – formas abstratas que já não têm mais lugar nesse
conteúdo absolutamente rico que é a religião47. Contudo, elas precisam aparecer na nossa
ciência, pois elas são momentos da relação essencial que reside no fundamento da religião; mas
a coisa principal é que sua natureza deve ter sido investigada e conhecida muito antes. Esse
conhecimento lógico preliminar deve formar o pano de fundo, se estamos lidando com a religião
cientificamente, isto é, a questão dessas categorias há muito deve ter sido já resolvida48. Mas a
prática usual é partir delas para se opor ao conceito, à Ideia, ao conhecimento racional.
Empregam-se essas categorias sem qualquer crítica, de maneira completamente ingênua, como
se a Crítica da Razão Pura de Kant não existisse, um livro que as submeteu a exame e, ao seu
modo, chegou ao resultado de que elas podem servir apenas para o conhecimento dos
fenômenos, e não da verdade49. Mas na religião não se está lidando com fenômenos, mas com
o conteúdo absoluto50. É completamente inadequado, na verdade cafona, o modo como
categorias desse tipo são colocadas contra a filosofia, como se se estivesse dizendo alguma coisa
nova à filosofia ou a qualquer pessoa educada, como se qualquer pessoa que não tenha
negligenciado completamente sua educação não soubesse que o finito não é o infinito, que o
sujeito é diferente do objeto, que a imediatidade é diferente da mediação. E mesmo assim não

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se percebe como é ridículo apresentar de modo triunfante aquela sagacidade, como se fosse
uma grande descoberta.

Que essas formas51 são diferentes todo mundo sabe; mas que essas determinações são
ao mesmo tempo inseparáveis, isso já é outro assunto. Há relutância em atribuir este poder ao
conceito, e que se pode encontrar até mesmo nos fenômenos físicos. É sabido que no
magnetismo o polo sul é muito diferente do polo norte e, no entanto, eles são inseparáveis. Da
mesma maneira se fala também de duas coisas, por exemplo, que elas são tão diferentes quanto
o céu e a terra. E está correto; ambos são completamente diferentes, mas são inseparáveis. Não
se pode mostrar a terra sem o céu e vice-versa. O saber imediato e o mediado são diferentes
um do outro e, contudo, basta uma investigação muito modesta para ver que eles são
inseparáveis. Portanto, antes que se queira partir para a filosofia da religião, é preciso que tais
formas unilaterais já sejam assunto resolvido. É fácil ver, a partir dessas considerações, o quão
difícil é para um filósofo envolver-se com aqueles que se opõem à filosofia da religião desta
maneira; pois, eles demonstram uma ignorância demasiado grande e uma falta de familiaridade
completa com as formas e categorias que usam para atacar e condenar a filosofia. Sem conhecer
o espírito interior dos conceitos, eles saem falando com franqueza que a imediatidade é algo
diferente da mediação. Eles falam trivialidades deste tipo como se fossem algo novo, mas com
isso eles não fazem mais do que garantir que o saber imediato existe sozinho por si mesmo,
inteiramente à vontade, sem terem refletido sobre esses objetos ou sem ter observado, seja a
natureza externa ou seu espírito interno, para ver como essas determinações estão presentes
aí52. Tal oposição à filosofia causa-nos o tédio de ter que retornar ao próprio alfabeto da filosofia,
a fim de mostrar às pessoas que suas afirmações se contradizem. Mas o espírito pensante
precisa ir além de tais formas de reflexão; ele precisa conhecer sua natureza, a verdadeira
relação que nelas acontece, a relação infinita, isto é, aquela na qual a sua finitude é
suprassumida.

Não é preciso muita experiência para ver que onde há saber imediato há também saber
mediado e vice-versa. O saber imediato, assim como o saber mediado, é por si mesmo
completamente unilateral; a verdade é a sua unidade, um saber imediato que também medeia,
um saber mediado que é também simples em si, relação imediata consigo mesmo. Aquela
unilateralidade torna essas determinações finitas; na medida em que ela é suprassumida
mediante tal conexão, trata-se então de uma relação da infinitude. O mesmo se passa com
objeto e sujeito. Em um sujeito que é em si objetivo a unilateralidade desaparece; mas a
diferença certamente não desaparece, pois ela pertence ao pulso de sua vitalidade, ao ímpeto,
movimento e inquietação do espiritual, bem como da vida natural. Aí está uma unificação na
qual a diferença não é extinta, mas é da mesma forma suprassumida53.

3. Amostra do tratamento de nosso tema54

Depois dessas observações, se nós queremos nos aproximar de nosso objeto mesmo,
resta-nos apenas indicar agora, a título de introdução, um esboço de seus contornos, uma

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amostra, um quadro geral e uma divisão geral de nossa ciência em si mesma, a fim de obter um
conhecimento histórico de nosso objeto55.

Só pode haver um método em toda ciência, em todo saber. Método é o conceito que
explica a si mesmo, e não outro, e só existe um. Também aqui, como sempre, em primeiro lugar
vem o conceito. Em segundo lugar, a determinidade do conceito, o conceito em suas formas
determinadas. Estas se conectam de maneira necessária com o conceito mesmo. No modo de
tratamento filosófico não é o caso que o universal, o conceito, seja estabelecido antes de todas
as outras coisas apenas, por assim dizer, de maneira honorífica. Conceitos daquele tipo, como
natureza, direito56 e outros semelhantes, pelo modo como são prefixados nas ciências
particulares, são determinações universais que se colocam no começo, embora isso seja
constrangedor, pois nada realmente depende deles, mas sim do conteúdo propriamente dito
presente em cada capítulo. Aquele conceito, assim denominado, não tem nenhuma influência
posterior sobre o conteúdo subsequente; ele indica aproximadamente o chão no qual alguém
se encontra e no qual se encontram as matérias tratadas, isto é, ele indica que não se deve
importar inadvertidamente conteúdo de um outro território. Mas o conteúdo, por exemplo,
magnetismo ou eletricidade, é o que vale para a coisa, enquanto o conceito prefixado tem
apenas um valor formal57.

No tratamento filosófico o conceito também constitui o começo; mas ele é a substância


da coisa, como a semente a partir da qual a árvore toda se desdobra. Na semente estão contidas
todas as determinações, a inteira natureza da árvore, o tipo de sua seiva, sua ramificação, etc.,
mas não pré-formada de maneira que se alguém tomar um microscópio veja os galhos e folhas
em miniatura, mas antes como que em um invólucro, espiritualmente. Assim também o conceito
contém a inteira natureza do objeto, e o conhecimento não é nada mais que o desenvolvimento
do conceito – daquilo que está contido no conceito, mas ainda não trazido à existência,
explicado e interpretado.

Portanto, em primeiro lugar está o conceito da religião ou a religião em geral e, em


segundo lugar, que nós consideremos a religião determinada. Portanto, nós não derivamos a
determinidade a partir de fora, mas é o livre conceito que impele a si mesmo para sua
determinidade. Aqui não corre como quando se trata empiricamente, por exemplo, do direito.
As determinidades da história do direito não se seguem do conceito, mas elas são tomadas de
outro lugar. Neste caso, primeiro se determina em geral o que significa ‘direito’; mas os sistemas
jurídicos determinados, como o romano e o alemão, têm de ser tomados à experiência. Aqui,
pelo contrário, a determinidade tem de resultar do conceito mesmo. O conceito determinado
da religião, então, é a religião em sua finitude, a religião finita, uma coisa unilateral constituída
em oposição a outras religiões como um particular contra outro particular.

Por isso, em terceiro lugar, consideraremos o conceito tal como ele vem a si mesmo a
partir de sua determinidade, a partir de sua finitude, isto é, como ele restabelece a si mesmo a
partir de sua finitude e estreiteza. E este conceito restabelecido é o conceito infinito e
verdadeiro, a ideia absoluta ou a verdadeira religião. Estas são, portanto, expressas de uma
maneira abstrata, aquelas três divisões em geral.

A religião em seu conceito ainda não é a verdadeira religião, se bem que o conceito é
em si mesmo verdadeiro; mas à sua verdade diz respeito também o fato de que ele tenha se

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realizado, assim como diz respeito à alma o fato de que ela tenha se corporificado. Esta
realização é antes de tudo uma determinação do conceito; mas a realização absoluta é que essa
determinação seja adequada ao conceito. Essa adequada determinação conceitual é a ideia
absoluta, o verdadeiro conceito. Esta progressão é o desenvolvimento do conceito, e só esse
desenvolvimento é que é a experiência, o conhecimento e o saber do que é a religião58.

O conceito que temos aqui diante de nós já é agora o espírito mesmo; é o espírito
mesmo que é esse desenvolvimento e que é ativo desta maneira. O espírito, caso seja pensado
imediatamente, simplesmente e em repouso, não é espírito; pelo contrário, o espírito é
essencialmente este ser ativo em geral. Ele é antes de tudo a atividade de se manifestar. O
espírito que não manifesta nem se revela é um morto. Manifestar significa tornar-se para um
outro. Como tornar-se para um outro, ele entra em oposição, entra na diferença em geral, e
assim é uma finitização do espírito. Algo que é para um outro, nesta determinação abstrata, é
apenas um finito; ele tem um outro em oposição a si mesmo, tem neste outro o seu fim e a sua
restrição. Assim, o espírito que manifesta e se determina entra na existência, dá finitude a si
mesmo, e este é o segundo momento. Mas o terceiro é o fato de que ele se manifesta segundo
seu conceito, e toma de voltar em si mesmo aquela sua primeira manifestação, supera-a,
retorna a si, torna-se para si como que ele é em si mesmo. 59Este é o ritmo, a pura vida eterna
do espírito mesmo; se não fosse este movimento, então ele seria uma coisa morta. O espírito é
o ter a si mesmo como objeto. Nisto consiste a sua manifestação, em ele ser relação de
objetividade, relação com o finito.60 O terceiro momento consiste em ele ser objeto para si,
reconciliado consigo mesmo no objeto, e ter chegado à liberdade; pois liberdade é estar junto a
si mesmo61. 62A divisão, tal como a postulamos, e cujas distintas partes e conteúdo nós
queremos agora especificar de modo mais determinado, é63 apenas histórica; mas ela é aceita
apenas por ser também necessária segundo o conceito.

I. O conceito de religião64

Como já dito, na primeira parte iremos considerar o conceito da religião. No simples


conceito da religião o que aparece como conteúdo, ou como a determinação do conteúdo, é
apenas o universal. A determinidade, a particularidade como tal, ainda não está disponível. Por
isso, a determinação fundamental, o caráter desta primeira parte da filosofia da religião, é a
determinação da universalidade.

Em seu conceito, a religião é a relação do sujeito, da consciência subjetiva, a Deus, que


é espírito; ou, se tomamos seu conceito especulativamente, então ela é o espírito consciente de
sua essência e de si próprio. O espírito é consciente, e aquilo de que ele é consciente é o espírito
verdadeiro e essencial; esta é a sua essência, não a essência de um outro. Desde modo, a religião
é instantaneamente ideia para si, e o conceito da religião é o conceito desta ideia. A ideia é a

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Aqui tem uma nota do Jaeschke que Hodgson traduz [acréscimos no texto] Com algo do Hodgson
também.
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verdade, a realidade do conceito, de modo que essa realidade é idêntica ao conceito,
absolutamente determinada apenas mediante o conceito. Se nós denominamos o conceito de
‘espírito’, então a realidade do conceito é consciência. O espírito como conceito, o espírito
universal, realiza a si mesmo na consciência, que é ela mesma espiritual; o espírito só pode ser
para a consciência.

A religião, é, portanto, espírito que se realiza na consciência. Porém, toda realização é


uma relação na qual dois lados precisam ser considerados: a elevação do ser humano a Deus, a
consciência que é ela mesma consciente de Deus, do espírito, e o espírito que se realiza na
consciência. Esses dois lados estão em relação um com o outro. O primeiro momento na ideia é
esta sua relação, aquela na qual os dois lados são idênticos; mas isso não significa uma mera
coisa em comum, a universalidade superficial, pela qual nós comparamos muitas coisas umas
com as outras, mas antes a unidade interna de ambos. Portanto, este primeiro momento da
ideia é a unidade substancial, o universal em si e para si, o puramente espiritual sem
determinação posterior. A universalidade é o fundamento. Apenas na religião determinada é
que nós temos um conteúdo determinado.

O segundo momento, posterior a este primeiro momento universal, é o que se


denomina propriamente a relação, o separar-se desta unidade. Aí temos a consciência subjetiva,
para a qual este universal é – e com a qual se relaciona – em si e para si mesmo; esse universal
pode ser chamado de elevação do ser humano a Deus, porque o ser humano e Deus estão em
relação como coisas distintas. Aqui aparece pela primeira vez o que propriamente significa
religião. Temos de considerar essa relação segundo suas determinações particulares. Estas são,
em primeiro lugar, o sentimento; é a ele que se tem de atribuir a certeza em geral, a fé. A
segunda determinação é a representação; e a terceira é o pensamento, a forma do pensamento.
Portanto, nós teremos de investigar mais de perto, neste ponto, em que medida a religião é uma
coisa do sentimento. A próxima a ser considerada depois disso é a forma da representação, e a
terceira é a forma do pensamento. Nós temos de falar da religião principalmente nesta
determinação.

Na medida em que filosofamos em geral sobre a religião, pensamos a religião. Temos


que diferenciar isto daquele outro pensamento religioso com o qual temos de lidar aqui como
uma determinação do conceito abstrato da religião, e que é um pensamento do entendimento65.
Esse pensamento do entendimento se mostrará como aquilo que normalmente é chamado de
provas da existência de Deus. O sentido desta prova será considerado aqui. As provas entraram
em decadência hoje em dia, desprezadas; estamos para além disso, é o que se pensa. Mas, só
por terem gozado de autoridade por mais de um milênio66, elas merecem ser consideradas mais
de perto. Se, por um lado, nós descobrimos que elas têm falhas, por outro lado, nós veremos o
que é verdadeiro no percurso que elas expressam, a saber, que elas de fato mostram o percurso
da elevação do ser humano a Deus; ocorre apenas que esse percurso é obscurecido pela forma
do entendimento. Nós mostraremos o que falta nelas para ser a forma da razão. Assim, temos
de considerar a forma da razão em oposição à forma do entendimento, e ver o que lhe falta para
expressar o que acontece em cada espírito humano. Quando alguém pensa em Deus, o seu
espírito contém exatamente os momentos que são expressos neste percurso.

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A religião é para todos; ela não67 é a filosofia, que não é para todos. A religião é o modo
ou a maneira pela qual todos os seres humanos se tornam conscientes da verdade. Aqui, nós
precisamos considerar os modos de consciência por excelência: sentimento, representação e
também o pensamento do entendimento. O conceito da religião tem de ser considerado neste
modo universal, no qual a verdade vem aos seres humanos; e, portanto, o segundo momento
nesta consideração é a relação do sujeito como sujeito que sente, representa e pensa.

O terceiro momento nesta primeira parte é68 o suprassumir desta oposição entre o
subjetivo e Deus, o suprassumir desta separação, esta distância do sujeito em relação a Deus –
o efeito disso é que o ser humano sente e sabe Deus em si, na sua própria subjetividade, que
ele, como este sujeito, eleva a si mesmo a Deus, dá a si mesmo a certeza, o deleite e a alegria
de ter Deus no seu coração, de estar unido com Deus, ser recebido por Deus na graça, como se
diz na linguagem teológica. Isto é o culto69. A simples forma do culto, o culto interior, é a devoção
em geral. Porém, o místico, a unio mystica, é o aspecto mais conhecido da devoção70.

II. Segunda Parte ou a Religião Determinada71

É preciso proceder à determinidade a partir do conceito. O conceito como tal é o que


está ainda em um invólucro, onde estão contidas as determinações ou momentos, mas ainda
não interpretados72. Deus, o conceito, julga, isto é, ele determina; só no interior desta categoria
da determinação é que temos a religião existente, que é ao mesmo tempo a religião que existe
de maneira determinada.

Já foi destacado antes que o espírito não é de modo nenhum imediato, ele não se dá no
modo da imediatidade; vivo, ativo, ele é o que ele faz de si mesmo; e o vivente é esta atividade.
A pedra ou o metal são imediatos, estão prontos; permanecem tal como são. Porém, o vivente
já é esta atividade de mediação consigo mesmo; a planta ainda não está terminada
simplesmente pelo fato de o germe já existir, na verdade sua primeira existência abstrata está
nesta fraqueza do germe; ela precisa se desenvolver, precisa primeiro trazer à luz a si mesma.
Por último, a planta recapitula a si mesma em seu desdobramento nas sementes; este seu
começo é também seu produto final73. Na planta, há dois tipos de indivíduo: o grão da semente,
que é o começo, é diferente daquele que é a conclusão de sua vida, na qual este desdobramento
amadurece. O mesmo ocorre nas coisas viventes em geral; a fruta é algo distinto da semente
inicial. Mas o espírito é precisamente isto simplesmente porque vive, para ser inicialmente
apenas em si ou em seu conceito, para depois vir à existência, desdobrar-se, produzir-se, tornar-
se maduro, isto é, para trazer à luz o conceito de si mesmo, do que ele é em si, de modo que o
que ele é em si, seu conceito, possa agora ser para si. A criança ainda não é um ser humano
racional, ela tem apenas disposições, é apenas inicialmente razão ou espírito em si; só mediante

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sua formação e desenvolvimento ela é espírito. Porém, o espírito só é verdadeiro espírito no
último momento74.

Portanto, o conceito em geral é apenas o primeiro momento; o segundo é sua atividade


de autodeterminar-se, de vir à existência, de ser para outro, de trazer seus momentos à
distinção e de interpretar a si mesmo. Essas distinções não são outras se não aquelas
determinações que o conceito contém em si mesmo. No tocante ao conceito da religião e à
atividade do espírito religioso, isto resulta nas religiões determinadas ou étnicas75. De um lado,
as diferentes formas e determinações da religião, como momentos do conceito, são momentos
da religião em geral ou da religião consumada – elas são estados ou determinações do conteúdo
na sensação e a consciência dessas determinações. Mas, por outro lado, elas possuem figura, o
fato de se desenvolverem por si mesmas no tempo, historicamente. A religião, na medida em
que é religião determinada e ainda não percorreu o círculo de suas determinações, de tal modo
que é religião finita e existe como finita, é religião histórica e uma figura particular da religião.
Uma vez que irei mostrar, ao longo de etapas, os momentos principais no desenvolvimento da
religião, e como essas etapas existem também historicamente, isso resultará em uma sequência
de figuras, isto é, em uma histórica da religião.

III. A religião absoluta76

Aqui, o espírito77, que é em si e para si, não mais possui formas singulares ou
determinações suas diante de si no seu desdobramento, e não mais sabe de si mesmo como
espírito finito, como espírito em algum tipo de determinidade ou restrição, mas superou aquelas
restrições e agora é para si o que ele é em si. Este saber de si do espírito tal como ele é em si é
o ser-em-si-e-para-si do espírito, a religião consumada e absoluta, na qual se manifesta o que o
espírito é, o que Deus é, e esta religião é a religião cristã. Que na religião o espírito, como em
tudo o mais, tenha, portanto, de percorrer seu caminho, isto é necessário no conceito do
espírito; ele é espírito apenas na medida em que ele é para si como a negação de todas as formas
finitas, como esta idealidade absoluta.

Eu tenho representações e intuições, que são um certo conteúdo: esta casa, etc. Elas
são minhas intuições, representadas diante de mim. Mas eu não as poderia representar para
mim, se já não tivesse compreendido esse conteúdo em mim; esse conteúdo inteiro precisa
estar posto em mim de um modo simples e ideal. Idealidade significa que este ser exterior
(espacialidade, temporalidade, materialidade e exterioridade mútua) é suprassumido; na
medida em que eu sei esse conteúdo, o que é representado não são entes exteriores uns aos
outros, mas entes que estão em mim de uma maneira simples. Uma árvore tem muitas partes,
e, mesmo assim, em minha representação dela, ela é simples. O espírito é saber; para que ele
seja o saber, o conteúdo daquilo que ele sabe precisa ter atingido esta forma ideal e, deste
modo, ter sido negado. O que o espírito é, isso precisa, deste modo, ter se tornado algo seu; ele
precisa ter sido educado, precisa ter percorrido este círculo. Estas formas, distinções,
determinações e finitudes precisam ser de tal modo que o espírito as torne suas, que ele as

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negue, que o que ele é em si tenha emergido objetivamente a partir dele, mas ao mesmo tempo
seja algo seu.

Este é o caminho e a meta, a saber, que o espírito tenha alcançado seu próprio conceito,
o conceito dele mesmo, e tenha chegado ao que ele é em si; e ele só chega a isto desta forma,
a forma que foi indicada em seus momentos abstratos78. A religião cristã apareceu quando
chegou a hora79. Este não é um tempo do acaso, um capricho ou incidente, mas antes está
fundado em um decreto essencial e eterno de Deus, ou seja, é um tempo determinado na eterna
razão e sabedoria de Deus, e não por acaso, mas determinado pelo conceito da coisa, o conceito
divino, o conceito do próprio Deus.

Esta é a especificação preliminar do plano do conteúdo que nós queremos considerar.

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