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ANA C.

FERREIRA
GABRIEL ANTONIO
LOUISE HOYLER
LUCCA GARCIA
NICOLE W. C. SARTORELLI
SOPHIA L. POLO

O QUE FAZ O PSICÓLOGO NA SAÚDE?


Visita Técnica e Entrevista

Projeto da Unidade Curricular “Atenção


psicossocial em saúde”, ministrada pelas
professoras Camila Avarca e Silvana Flora para o
curso de Psicologia da Universidade Anhembi
Morumbi. Unidade Vila Olímpia, Noturno, 2023.

UAM-SP
2023
INTRODUÇÃO

Um psicólogo na área da saúde é peça importante para o tratamento integral dos pacientes
(Vieira & Waischunng, 2018). Os médicos e enfermeiros não deveriam ser os únicos a cuidarem
das questões psicológicas dos pacientes. Por exemplo, muitas vezes o médico é quem precisa
informar e lidar com as questões emocionais vindas de um diagnóstico grave. Entretanto, no
curso de Medicina, não se costuma ter um enfoque nesse aspecto do paciente.
Segundo o professor de emergências clínicas Marco Antônio de Carvalho Filho, da
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), há de fato essa defasagem nos estudantes de
Medicina e, portanto, desenvolveu um projeto de pesquisa para desenvolver a empatia dos
futuros doutores, a fim de melhorar a relação médico/paciente (Conte, 2021).
Esse movimento ainda está nos estágios iniciais. Então, por não haver um treinamento
específico, o médico acaba aprendendo como lidar com esse tipo de questão psicológica e
emocional através puramente da experiência, da tentativa e erro e experiências anedóticas — sem
uma fundamentação teórica como há na Psicologia.
De qualquer maneira, mesmo que haja um treinamento mais específico para essa área, a
equipe médica já possui demandas clínicas em excesso, logo requerer que ela também cuide dos
aspectos psicoemocionais fará com que os profissionais fiquem ainda mais sobrecarregados.
Portanto, um psicólogo, que é um profissional especialista em entender processos
mentais, comportamentos e emoções do ser humano (Apa, 2023), pode cuidar das dimensões
emocionais e psicológicas envolvidas no acometimento de uma doença.

Local visitado
O local visitado foi o Hospital das Clínicas, especificamente o Instituto da Criança (ICr),
na parte de UTI neonatal. Devido a isso, há especificidades próprias, por exemplo, o psicólogo
trata majoritariamente não o paciente em si (afinal são recém-nascidos); mas sim os cuidadores
(mãe, pai, parentes, etc).
Por ser um hospital, a questão da territorialidade não tem a mesma relevância do que teria
se fosse um serviço como a UBS, já que lá há pacientes vindos de diversos estados diferentes. A
principal característica para se fazer a triagem não é se a pessoa reside nos arredores da região,
mas sim se são ou não casos de alta complexidade.

Configuração da UTI

Segundo a entrevistada, a organização da UTI neonatal do Hospital das Clínicas


constitui-se de:

● 48 leitos
● Equipe 2 psicólogas (ambas com base teórica psicanalista)
● Serviço social
● Pediatria: UTI/Ambulatorial, enfermagem cirúrgica
● Equipe multidisciplinar: enfermeiras, nutricionistas, terapeuta ocupacional,
psicólogos e fisioterapeuta.

A UTI é dividida em três seções diferentes: UCINCO (unidades de cuidados


intermediários convencionais), que é de médio risco, mas de longa permanência. Outra de baixo
risco, onde a maioria dos bebês já estão em vias de ter alta. E, por fim, a de alto risco UTIN
(unidade de terapia intensiva), onde a maioria dos bebês nasceram de forma prematura, muitos
dos quais pesam menos de 800g, estão em entubados e em incubadoras. Além disso, também
podem necessitar de traqueostomia, gastrostomia e tanques de oxigênio.
Na UBS, são fornecidos os curativos e equipamentos necessários para os cuidados.

Há também um banco de doação de leite materno para as mães que não estão produzindo
a quantidade ideal. Já as mães que produzem em excesso doam o excedente. Caso não haja, é
também possível fazer a alimentação por fórmulas (menos usado, a prioridade é o leite humano)
ou através do leite materno pasteurizado (que pode durar até 6 meses).

Há também o GAIPN (Grupo de Apoio Interdisciplinar Neonatal), que é um apoio para


gestantes com 50% de chance de aborto espontâneo ou natimorto (bebês com características
incompatíveis com a vida). Lá, há conferências com a família, conversas em dupla e roda de
apoio.

Como se pode perceber, a UTI é completa. Não é à toa que recebe os casos mais
complexos do Brasil. Apesar de nem todos os equipamentos serem os mais modernos em
comparação com as UTIs de hospitais particulares, ainda sim é completa.

OBJETIVOS

● Conhecer a realidade e os desafios de um psicólogo que trabalhe na área de saúde.


● Identificar a importância de um psicólogo em uma UTI neonatal.
DESENVOLVIMENTO

Visita Técnica

Fizemos a entrevista no dia 10/4/2023. Iniciamos pela visita técnica. À priori, não
sabíamos qual a área específica do hospital que a psicóloga Isabela atuava. Quando ela nos disse
que era na área de perinatal, ficamos interessados pois é uma área que quase todos do grupo se
identificam.

Nunca havíamos visitado uma UTI, muito menos uma de recém-nascidos. Isabela nos
explicou sobre a configuração do local, dizendo que havia três seções diferentes e sugeriu que
começássemos pela de menor complexidade. Um dos integrantes do nosso grupo ficou um certo
receio, pois é mais sensível emocionalmente para esse tipo de assunto..

Ao entrarmos na primeira seção, havia cerca de 15 bebês, os quais a maioria não estava
entubado. De fato, eram os casos mais simples. Havia muitas enfermeiras cuidando dos bebês.

Após isso fomos para a de longa permanência. Lá, havia muitas mães cuidando dos
bebês. Foi possível perceber que havia uma amizade entre elas, o que contribui para diminuir a
angústia de ter seu filho recém-nascido internado.

Um aspecto bem marcante que notamos do começo ao fim da nossa visita foi que a
psicóloga era constantemente acionada, seja por uma mãe que precisava de alguma informação,
ou da assistente social, etc. É um trabalho muito dinâmico, cada dia diferente.

Por fim, fomos à seção de alta complexidade, tivemos uma experiência bem impactante.
A maioria dos bebês estavam entubados ou em incubadoras. Um dos bebês apresentava
deformação craniana, outro era extremamente pequeno, tentamos descobrir qual era o peso dele,
mas não conseguimos. Segundo a psicóloga, ele deveria ter aproximadamente 700 g.

Nos berços, havia adesivos sobre as conquistas temporais de cada bebê. Por exemplo,
minha primeira páscoa, meu quinto mês-versário, etc

Após finalizarmos a visita, ficamos bem reflexivos. Conversamos entre nós sobre o fato
de que um bebê recém-nascido já é, por natureza, frágil e dependente dos outros. Já os que
havíamos acabado de ver eram casos extremos disso.

Além disso, aqueles bebês mal recebiam estimulação cognitiva, social e física. O seu foco
era somente em sobreviver.

Finalizada a visita, fomos para uma sala privada, que é compartilhada entre as psicólogas
e assistentes sociais, para fazer entrevista.

Entrevista

Desafios emocionais dessa área

Iniciamos perguntando sobre os desafios emocionais envolvidos em trabalhar nessa área.


A entrevistada relata sobre como a morte se torna algo muito presente.

“Principalmente em uma UTI, a situação de morte fica muito agravada. No dia a dia, é
uma coisa que estamos sempre desviando. A gente não vive se ficarmos pensando o tempo todo
que pode morrer. Precisamos construir um imaginário de que tudo vai ficar bem, planejar os
nossos desejos. É antinatural pensar na morte e na angústia o tempo todo.”

Da importância de ter empatia, mas ao mesmo tempo conseguir se distanciar daquela


situação depois.

“Eu preciso me aproximar para entender o que aquela mãe está passando, mas me
distanciar na mesma medida, para não voltar e levar isso para casa e não ficar pensando no que
está acontecendo aqui o tempo todo. Preciso seguir minha vida.”

Na primeira entrevista, ela sempre faz perguntas direcionadas: se o bebê foi planejado, se
o pai é presente, se tem pessoas para ajudar, etc. Isso serve para situar o caso.

Respeito à singularidade do sujeito

Um outro ponto importante da entrevista foi a ênfase que a psicóloga deu em respeitar a
singularidade de cada caso. Um dos exemplos que ela deu foi ter uma mãe que é muito tímida e
não consegue, por exemplo, dizer para as enfermeiras que quer pegar o bebê no colo — pois
pensa que está incomodando. Nesse caso, a psicóloga conversa com as enfermeiras para que elas
sejam mais proativas em oferecer para essa mãe tais coisas.

Um outro exemplo é quando um bebê necessita de gastrostomia. Para algumas mães, isso
é um assunto muito sensível. Portanto, é necessário ter um cuidado de como falar com essa mãe
sobre isso.

Foi relatado que há bastante autonomia para trabalhar. As outras equipes do hospital não
interferem no trabalho das psicólogas. Uma vez por semana é feita uma reunião multidisciplinar
sobre cada caso. Há também reunião de pais e mães uma vez por semana, que é feita junto com a
equipe. É uma oportunidade para tirar dúvidas, dar sugestões, etc.

Casos mais desafiadores

Segundo I., os casos mais desafiadores são os de cuidados paliativos, que é uma
abordagem que melhora a qualidade de vida dos pacientes e suas famílias que enfrentam
problemas associados a doenças que ameaçam a vida (OMS, 2020). Ela disse que há uma
carência de profissionais de psicologia especializados nessa área. Há um foco para evitar fazer
processos cirúrgicos e invasivos, já que fazer isso terá um alto custo para pouco retorno. Muitas
vezes, esse excesso de cirurgias reflete uma frustração de não aceitar que não se pode fazer muito
para a situação melhorar.

“A gente tem todo o cuidado, sabendo que o bebe não vai viver por muito tempo.
Sabendo que não tem cura, que condições vamos dar para o bebe aqui? Fazemos então um
combinado com a família, se houver piora, não vamos fazer mais intervenções cirúrgicas. Para
não prolongar o sofrimento do bebê e respeitar o tempo do bebê.”

Bebê imaginário x bebê real

Isabella também nos comentou sobre a questão do bebê imaginário x bebê real. Durante a
gravidez, a mãe e o pai criam em suas mentes um bebê imaginário, sendo ele saudável e
atingindo todos os desejos dos pais. Entretanto, ao nascer, os bebês que estão nessa UTI quebram
as expectativas devido à presença de patologias.

As famílias podem saber da doença antecipadamente, durante a gestação ou no


nascimento. Segundo a entrevistada, é preferível que haja o conhecimento prévio, pois assim é
possível o preparo mental para os desafios que estarão por vir. Por outro lado, descobrir no
nascimento pode aumentar as chances de rejeição do recém-nascido, devido a disparidade de
expectativas

Perda autonomia familiar

Ao passar muito tempo na incubadora, muitos momentos importantes para o


desenvolvimento cognitivo, emocional e social do recém-nascido são perdidos. Alguns exemplos
incluem: Carregar no colo, trocar a roupa e amamentar no peito — que ajudam na geração do
vínculo entre mãe-e-filho, o que é algo importante para o desenvolvimento do bebê (Cancillier &
Wronski, 2020). No lugar que visitamos, os pais são postos mais no papel de espectadores.

Há uma pobreza de estímulos. Enquanto que em um ambiente normal, o indivíduo teria


uma enorme gama de estímulos visuais, auditivos, táteis, etc. Quando se está em uma UTI, há
uma limitação muito grande.

Além disso, muitos responsáveis são de outros estados. Dessa forma, mesmo que seja
fornecido um programa para moradia durante o tempo necessário de tratamento no hospital,
ainda não conseguem ficar longos períodos de tempo em São Paulo.

Nessa situação, o bebê precisa de atenção especial. A psicóloga que entrevistamos


carrega o recém-nascido no colo utilizando a técnica canguru, conversa e interage com ele. Ou
seja, forma um vínculo nesse momento crucial. Portanto, ela não cuida só da família, mas
também do bebê em si.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Fazer a visita e a entrevista foi uma experiência muito enriquecedora e inesquecível. Foi
impressionante ver a fragilidade daqueles recém-nascidos, especialmente os que estavam na
sessão de alta complexidade. Foi emocionante ver toda uma equipe multidisciplinar focada
exclusivamente em ajudar aqueles pequenos seres, que mal haviam chegado ao mundo mas que
tinham condições muito desafiadoras, a sobreviver.

Durante entrevista com a psicóloga, ela salientou como a morte é um tema que se torna
muito presente. Para ajudar essas famílias, ela salientou a importância de encontrar o equilíbrio
entre ter empatia, mas ao mesmo tempo conseguir se distanciar da situação (apesar de ser algo
desafiador).

Ao mesmo tempo que a morte está muito presente, histórias de recuperação e cura
também. Após os bebês voltarem para casa, muitas mães retornam como ele saudável para
visitar e agradecer a equipe. Isso deve ser altamente recompensador para toda a equipe.

Nunca havíamos imaginado o cenário de um psicólogo trabalhando em uma UTI


neonatal. Afinal, um pensamento que poderia ocorrer: “Mas pra que um psicólogo, se um
recém-nascido mal se comunica?” Obviamente, o trabalho do psicólogo nesse caso é mais focado
nos cuidadores. Porém, como foi discutido anteriormente, a psicóloga entrevistada pode ajudar
até mesmo o bebê.

Quando se pensa em psicólogos, a imagem que se vem à cabeça é principalmente da


clínica, entretanto, há uma grande gama de possibilidades, tais como psicologia hospitalar,
forense, etc. e é importante conhecer todas essas opções para que cada um de nós, futuros
psicólogos, possamos decidir qual se alinha mais com o nosso perfil. E não há forma melhor para
isso do que sair do ambiente de sala de aula e conhecer essas diferentes áreas na prática.

Em resumo, a experiência da visita e a entrevista com a psicóloga nos proporcionaram


um panorama dos desafios e da importância de um psicólogo em uma UTI perinatal.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

RODRIGUES, Avelino L. Psicologia da saúde – hospitalar: abordagem psicossomática. São


Paulo: Editora Manole, 2019. E-book. ISBN 9788520463536. Disponível em:
https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788520463536/. Acesso em: 23 mar. 2023.

CANCILLIER, Danielle Rosa Vieira; WRONSKI, Andrea Volpato. A função do vínculo afetivo
no desenvolvimento psicossocial da primeira infância: orientações aos profissionais dos serviços
de acolhimento institucional. 2020. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/pe/v20n1/1413-389X-pe-20-01-00003.pdf>. Acesso em: 1 maio 2023.

http://www.redeneonatal.fiocruz.br/index.php/uspsp-hc

https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/palliative-care

CONTE, Juliana. "De onde vem a frieza dos médicos?". 2021. Portal Drauzio Varella. Disponível em:
<https://drauziovarella.uol.com.br/saude-publica/de-onde-vem-a-frieza-dos-medicos/>. Acesso em: 1
maio 2023.

APA, 2023 https://www.apa.org/topics/psychotherapy/about-psychologists

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