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RESUMO
Neste trabalho buscamos compreender de que forma o momento de parir pode afetar física e
psicologicamente a mãe e o bebê e comparar o parto humanizado com os modelos de parto
tradicionais. Tentamos elucidar novas alternativas e conhecimentos sobre o nascimento: os
riscos reais e potenciais de um parto realizado com intervenções, possíveis benefícios de um
parto de forma mais humana, que tem como pilar a assistência respeitosa, acolhedora e o
protagonismo da mulher. Acreditamos que seja necessário repensar sobre o parto, uma vez
que é a nossa primeira experiência com o mundo e uma das experiências mais marcantes para
a maioria das mulheres, seja de forma positiva ou não, e entender como um procedimento
mais acolhedor e menos hospitalizado pode ser importante para o desenvolvimento humano.
Utilizamos para esta pesquisa um questionário estruturado online e realizamos entrevista com
duas mães que tiveram seus filhos por vias diferentes.
1
Mestre em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense na linha de pesquisa Clínica e Subjetividade.
2
Graduanda em psicologia pela Universidade Estácio de Sá.
2
ABSTRACT
The present text intends to understand how the moment of giving birth can affects physically
and psychologically mother and baby, and to compare humanized birth with traditional birth
models. We try to elucidate new alternatives and knowledge about birth: the real and potential
risks of a birth performed with interventions and possiblebenefits of a humanized birth, which
is based on respect, welcoming care and women's protagonism. We believe that's necessary to
rethink childbirth as our first experience on world and one of the most remarkable experiences
for most women, positive or not. We seek tounderstand how a welcoming and less
hospitalized procedure can be important for human development. We had applyed a structured
online questionnaire and conducted an interview with two mothers who had given birth to
their children by different ways.
1. Introdução
"Virei de frente pra ver minha filha chegar ao mundo e me surpreendi quando vi que
ela estava de rosto pra cima, olhos abertos. Os bebês costumam nascer de rosto pra baixo.
Samanta nascia me olhando, piscando devagar, vinda no tempo dela, dentro de sua casinha,
que a protegeu e guardou por toda a gestação!" (Márcia)* 3
A maioria das mulheres passa pelo processo de parir. Tal experiência é marcante e
seus momentos podem ser lembrados e sentidos em detalhes ao longo dos anos. De relevância
psicológica inegável, tem potencial para ocasionar traumas se mal realizado. É um processo
que mobiliza muitos afetos: medos, ansiedade, expectativas. É quando a mulher deixa seu
papel de filha e adota, também, o papel de mãe e se depara com um produto seu, gerado em
seu ventre (LOPES; et al, 2005).
O vínculo mãe e bebê existe desde a concepção. Situações emocionais, intenções e
pensamentos vividos pela mãe a todo momento influenciam o feto, que carregará esse
material intrauterino do seu nascimento até a vida adulta. Portanto, uma gravidez saudável,
desejada e sem estresses tende a proporcionar um parto tranquilo e um bom desenvolvimento
emocional do bebê (LUZES, 2007).
Até o fim do século XIX, no Brasil, os partos eram realizados por parteiras: mulheres
que possuíam conhecimentos empíricos e assistiam as demais durante a gravidez, parturição,
puerpério e nos cuidados do recém-nascido. Eram de inteira confiança das mulheres da
sociedade e auxiliavam também em vários outros assuntos, como aborto, doenças transmitidas
pelo ato sexual e até mesmo infanticídio (morte do recém-nascido).Em 1808, na Bahia e no
Rio de Janeiro, são inauguradas escolas de medicina e cirurgia, e com isso a prática das
parteiras foi incorporada ao método médico, denominando os formados por ela de médico-
parteiro. A partir de então, a medicina introduz a experimentação clínica, a figura do homem
no conhecimento e na prática do nascer e o discurso patológico (BRENES, 1991).
Buscamos compreender e apresentar de que forma o partejar pode afetar física e
psicologicamente a mãe e o bebê e comparar o parto humanizado com os partos tradicionais
— sendo estes alvos de críticas pelos procedimentos interventivos e a violência com que as
mulheres são tratadas. Tentamos elucidar novas alternativas e conhecimentos sobre o
nascimento: osriscosreais e potenciais de um parto realizado com intervenções (muitas vezes
3
Relato de uma das mães. Nomes fictícios.
4
2. Tipos de parto
O parto normal é aquele em que o bebê nasce de forma não-cirúrgica, saindo pela
vagina da mãe, popularmente conhecido como parto vaginal. Sendo este fisiológico,
respeitando os processos naturais da mãe e do bebê — o trabalho de parturição só se inicia
quando o bebê estiver pronto para nascer (CALVETTE, 2015).
Ainda de acordo com a autora acima, apesar da OMS ter recomendações para o parto
normal saudável, a mulher e seu bebê estão sujeitos às rotinas da maternidade e dos
profissionais. Algumas dessas rotinas e intervenções comuns são: lavagem intestinal, não ter
liberdade de movimento, não poder ingerir líquidos ou comer, fazer o uso de soro venal para
acelerar contrações, toques vaginais para verificar dilatação, enfermeiros e até mesmo
médicos fazendo força em cima da barriga, corte no períneo, corte prematuro do cordão
umbilical, entre outros procedimentos muitas vezes agressivos.
Como características do parto humanizado, nele a mulher opta por não ter
intervenções médicas desnecessárias, tem total liberdade para se movimentar, se alimentar e
escolher a melhor posição para parir. Logo após o bebê nascer, ele vai direto para o colo da
5
mãe e o corte no cordão umbilical é realizado só depois que este para de pulsar (CALVETTE,
2015).
O parto normal, apesar de ser o mais recomendado pela OMS, ainda é visto com
preconceito por parte das mulheres, devido à intensidade da dor e pela forma com que são
tratadas nos hospitais. As intervenções médicas que são realizadas contribuem para uma
experiência negativa, como por exemplo no caso da anestesia local, administração de
oxitocina(substância que acelera as contrações) e a episiotomia (incisão realizado para
ampliar o canal vaginal), entre outros métodos abusivos (BARBOZA; MOTA, 2016).O
protagonismo da mulher não é respeitado, se tornando um parto medicalizado, demorado e
doloroso(VELHO; et al,2012).
A cesariana, ou popularmente como é chamada "parto cesárea", é feito através de
uma cirurgia programada antes ou depois do início do trabalho de parto, sob efeito de
anestesia (habitualmente peridural ou raquidiana). Este é o tipo de parto mais utilizado e
recomendado por médicos no Brasil, apesar do parto normal ser considerado pela OMS e
diversas outras entidades médicas a melhor forma do bebê nascer. Segundo recomendações da
OMS, somente cerca de 15% das parturições apresentam indicação real para a cesárea
(CARNIEL; ZANOLLI; MORCILLO, 2006), devendo os 85% restantes serem efetuados pela
via vaginal. A popularização exagerada da cesárea nas últimas décadas provocou na
população uma falsa impressão de que este tipo de parto é mais seguro e acarreta menos
complicações para o bebê. Entretanto, o que ocorre é exatamente o oposto (PINHEIRO,
2019).
A anestesia raquidiana também conhecida como raquianestesia, é feita da seguinte
forma: uma agulha de pequeno calibre é inserida nas costas, dentro da coluna espinhal em um
espaço subaracnóideo. Em seguida, um anestésico é injetado dentro do líquido espinhal,
produzindo dormência temporária e relaxamento muscular. A presença do anestésico dentro
da coluna espinhal bloqueia os nervos que passam pela coluna lombar, fazendo com que
estímulos dolorosos vindos dos membros inferiores e do abdômen não consigam chegar ao
cérebro Na anestesia peridural, embora muito semelhante a anestesia raquidiana, há algumas
diferenças: Na anestesia peridural o anestésico é injetado na região peridural, que fica ao
redor do canal espinhal, e não propriamente dentro. O anestésico é injetado por um cateter,
que é implantado no espaço peridural, ou seja, enquanto na raquianestesia o anestésico é
administrado por uma agulha uma única vez, na anestesia peridural o anestésico fica sendo
administrado constantemente através deste cateter. A anestesia peridural é comumente usada
6
parto, oferece suporte necessário à mulher e seus familiares. A mulher é protagonista de todos
os atos, inclusive a escolha das posições em que se sente mais confortável.O cordão umbilical
só é cortado após parar de pulsar e o bebê é colocado ao peito da mãe para ser amamentado,
promovendo o vínculo da díade mãe-bebê (LUZES, 2007).
"Minha filha veio ao mundo de forma respeitosa, calma e desejada, com a parceria de
profissionais e amigos que foram imprescindíveis pra mim!"
Atualmente, o Rio de Janeiro conta com a Casa de Parto David Capistrano Filho, em
Realengo. A equipe possui enfermeiros obstetras, assistentes sociais, nutricionistas, técnicos e
auxiliares de enfermagem. Lá são atendidas, orientadas e acompanhadas gestantes de baixo
risco.* 4
4
Disponível em:<http://smsdc-casadeparto.blogspot.com/p/quem-somos.html>. Acesso em: 24 mar 2019.
9
"Após o parto, quando a 'ficha' caiu, fiquei muito feliz por estar com meu filho bem e
saudável, mas muito triste. Não me considerava uma mulher de verdade pois não fui capaz de
parir meu filho. Chorei dias com uma tristeza sem fim, pois sentia dores física e um vazio,
uma tristeza..." (Sônia)
A melancolia da maternidade, conhecida também como baby blues, trata-se de uma
depressão leve e passageira, devido às mudanças neurofisiológicas do puerpério, e acomete
boa parte das mulheres (MANENTE, RODRIGUES, ROLIM, 2016).
Este períodoé acompanhado de melancolia, tristeza, fortes alterações de humor, choros e
falta de confiança em cuidar do bebê. Estes sentimentos correspondem a um processo de
distinção entre a mãe e o bebê, de forma que ela e a criança se reconheçam como indivíduos
separados(ALT, BENETTI, 2008).
É comum que as próprias mães não consigam captar direito o que está acontecendo em
suas vidas, principalmente em um momento em que parecem ter realizado um sonho de ter
seu filho em seus braços.
A gravidez é um dos períodos críticos de transição do desenvolvimento feminino, bem
como a puberdade e o climatério (transição entre a fase reprodutiva e a menopausa),
caracterizada por intensas mudanças hormonais, sociais e de identidade. É o momento em que
a mulher deve adaptar-se (interna e externamente) a uma nova rotina e deixar seu papel de
filha para assumir o de mãe, podendo resultar em crises e mudanças com relação à própria
identidade. Uma gravidez indesejada e a submissão a uma cesariana quando o desejo era de
que fosse um parto natural, podem ser frustrantes e também acarretar em sofrimento psíquico
(MALDONADO, 2013).
”[a equipe da casa de parto] me ajudou muito a superar toda frustração de um parto que
não foi como eu havia sonhado, planejado" (Sônia). É muito importante ter apoio emocional
da família e ajuda psicológica especializada neste período marcado por tantas transições, para
que assim não evolua para uma depressão pós-parto.
10
Embora seja de ordem multifatorial, existe uma associação entre depressão pós-parto e
problemas posteriores no desenvolvimento da criança. Os sintomas da depressão materna
podem interferir em todas as relações interpessoais, inclusive na interação mãe-bebê(KLAUS,
KENNELL, KLAUS, 2000).
A depressão pós-parto é uma condição de tristeza profunda, desespero e falta de
esperança que acontece logo após a mulher ter dado à luz. A DPP, traz inúmeras
complicações ao vínculo da mãe com o bebê, sobretudo no que se refere ao aspecto afetivo,
desenvolvimento social e cognitivo da criança, além de sequelas prolongadas na infância e
adolescência.* 5
Ainda de acordo com o Ministério da Saúde, não existe uma única causa para a
depressão pós-parto. Ela pode estar associada a inúmeros fatores, como físicos, emocionais,
qualidade de vida, além de ter ligação também com histórico de outros problemas e
transtornos mentais anteriores. No entanto, no puerpério, a principal causa da depressão é o
enorme desequilíbrio de hormônios ao término da gravidez. Alguns outros fatores podem
causar ou ajudar a provocar a depressão neste período de pós-parto, alguns deles são: privação
de sono, isolamento, alimentação inadequada, sedentarismo, falta de apoio do parceiro ou
família, caso anterior de depressão, ansiedade, estresse, adicção em drogas, transtornos
mentais, histórico de DPP anterior, falta de planejamento da gravidez e violência doméstica.
Os custos emocionais ligados a esse transtorno fazem com que a mãe tenha menos
interesse em interagir com seu bebê, sintomas de irritabilidade e desinteresse sexual. Para ser
considerada depressão pós-parto, os sintomas devem surgir em até quatro semanas após o
nascimento do bebê (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2019).
A depressão pós-parto também está associada a uma atenção obstétrica desrespeitosa e
outros eventos relacionados ao parto, como sentimento de desamparo,submissão a uma
cesariana sem o desejo da parturiente e uma má assistência da equipe médica.Estes e outros
impactos negativos,provenientes de transtornos psiquiátricos no período pós-parto, são
nocivos ao vínculo mãe-bebê (SOUZA, 2014).
5
Ministério da Saúde: Depressão pós-parto. Disponível em: <http://www.saude.gov.br/saude-de-a-z/saude-
mental/depressao-pos-parto>. Acesso em 10 set 2019.
11
A história do parto é revelada pela tradição dos discursos orais. Até o século XIX,
tratava-se de um evento do universo feminino, realizados apenas pelas parteiras. Por um longo
período, o partejar foi uma tradição exclusiva de mulheres, uma arte milenar constituída por
um saber fazer, advindos de conhecimentos populares e orientado tanto pela intuição, quanto
pela tradição. Nesse sentido, havia mulheres reconhecidas enquanto curandeiras, parteiras,
benzedeiras, tal referência se dava pois eram detentoras dos conhecimentos e mistérios da
natureza, de onde extraiam os elementos para o preparo de medicinas curativas e recursos
fitoterápicos. O ato de partejar tinha um caráter ritualístico, de vínculos afetivos e
cumplicidade entre as mulheres. A historiadora Mary Del Priore diz que “através da cultura
feminina sobre o parto, as mulheres resgatavam sua individualidade e exercitavam suas
alianças de gênero” (DEL PRIORE, 1993).
No Brasil, desde o início da colonização, do século XVI até o século XIX, a
assistência ao parto era também desenvolvida exclusivamente por parteiras, conhecidas
igualmente como aparadeiras ou comadres. As mulheres que detinham o conhecimento e o
domínio da arte de partejar eram negras, portuguesas ou caboclas designadas como ‘curiosas’,
cujos valores poderiam transgredir a moral religiosa católica (ROCHA, 2002).
O processo de medicalização da sociedade brasileira, segundo o autor citado acima,
tem uma trajetória histórica que passa pela ordem médica de regulação do corpo, a qual se
inicia com o processo de industrialização da sociedade durante a implementação do modo
capitalista de produção, constituindo-se como o processo de extensão do cuidado médico
individual na vida da sociedade.
Michel Foucault, durante o século XX, cunhou os termos "biopoder" e "biopolítica"
para denominar um mecanismo de poder que sutilmente exerce controle sobre os corpos,
através da moral e da disciplina. Tal controle teria a finalidade de gerir o ser humano, de
forma a obter o máximo de produtividade possível. Entre os séculos XVIII e XIX, este tipo de
poder ganha força, passando de um poder que podia matar para um que "faz" viver e "deixa"
morrer (FOUCAULT, 2012).
Surgem, então, as censuras e as diferenciações entre seres humanos. Passa-se a
determinar os tipos de pessoas que podem viver e as que podem deixar morrer, com base em
suas características biológicas e de acordo com sistemas estruturais e culturais (como o
racismo e o sexismo). Este raciocínio não subjugou apenas os sujeitos negros e homoafetivos,
mas também as mulheres, reduzindo-as a seu próprio gênero, cuja função seria a de procriar.
13
6
G 1: Ministério diz que termo "violência obstétrica é inadequado" e deixará de ser usado pelo governo .
Disponível em: < http://tiny.cc/u3qicz>, Acesso em: 20 jun 2019.
14
Esta recomendação também destaca que o alto índice de cesáreas sem indicação no pré-natal
também é configurado como violência obstétrica, pois coloca a gestante em risco de morte durante o
procedimento. Os conselheiros nacionais de saúde pedem também ao Ministério da Saúde que “possa
trabalhar com maior intensidade e firmeza no combate a tais práticas e maus tratos nas maternidades,
conforme recomenda a OMS” (Conselho Nacional de Saúde, 20 mai2019).
Em junho, após as recomendações, por fim o Ministério da Saúde reconhece a
legitimidade do termo e o direito das mulheres de usá-lo para representar suas vivências e
experiências que configurem qualquer tipo de maus tratos durante o parto. O Ministério
daSaúde também diz que estão adotando medidas para reduzir a quantidade de atendimentos
inadequados.* 7
"Segundo o Ministério da Saúde, os abusos e maus tratos durante o parto em instituições
de saúde afetam os direitos das mulheres ao cuidado respeitoso, além de ameaçar o direito à
vida, à saúde, à integridade física e à não discriminação" (Ministério Público Federal, 2019).
Dado o momento recente, achamos importante trazer o assunto, pois o termo "violência
obstétrica" sendo abolido não diminuirá a negligência, desrespeito e os abusos sofridos pelas
parturientes, apenas vetará o direito que elas têmde uma assistência respeitosa e digna. É
fundamental uma mudança de olhar da medicina para com os usuários de saúde, que leve em
consideração o sofrimento físico e psíquico dos indivíduos como um todo.
5. Apresentação do campo
7
Ministério da Saúde. Disponível em: <http://www.mpf.mp.br/sp/sala-de-imprensa/docs/oficio-ms>, Acesso em:
20 jun 2019.
15
instrumento privilegiado para a análise dos dados, uma vez que permitiu a cada uma relatar
sua experiência de maneira subjetiva. Foi apresentado o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido às participantes, documento que foi elaborado em duas vias, das quais uma ficou
em posse das participantes e a outra dos pesquisadores. Preservamos o anonimato, de forma
que qualquer nome que possa aparecer nos relatos seja fictício.
O objetivo da pesquisa era identificar se a humanização do parto pode ser benéfica
física e psicologicamente para a mãe e para o bebê, comparando este tipo de assistênciaao
modelo tradicional dos hospitais, tentando elucidar novas alternativas e conhecimento sobre o
nascimento.
Foram questionados os aspectos gerais de como foi realizado o parto e o impacto
(positivo ou não) que causou em suas vidas.
O questionário online consistia em 25 questões objetivas e em algumas poderiamser
marcadas mais de uma resposta. As sete primeiras perguntas eram sobre informações gerais:
idade, escolaridade, número de filhos, se algum dos partos foi feito desconsiderando a forma
como gostaria de dar à luz e se acreditavam que havia benefícios na humanização do parto em
relação ao modelo hospitalocêntrico, onde 97,7% afirmou que acreditam que haja benefícios
para a mãe e bebê no modelo humanizado (Figura 1).As demais questões foram sobre o parto
em si: de que forma foi realizado (humanizado, normal ou cesariana), se sofreu violência
obstétrica e de que tipo, como foi o comportamento do bebê durante os primeiros dias de seu
nascimento, o tempo que levou para ter contato com ele após parir, se amamentou, se
considerou como um evento estressante para o bebê e/outraumático para ela,e se sentiu que
houve dificuldade para se vincular ao filho. Solicitamos a quem tivesse mais de um filhoque
respondesse novamente as questões específicas (sendo estas do nº 17 ao 25), caso os partos
fossem realizados por vias diferentes (não obrigatório).
Deixamos espaço para que as puérperas descrevessem e retratassem suas
experiências, sentimentos, escolhas e as formas de violência da qual muitas foram vítimas,
caracterizadas por palavras e atitudes dos profissionais de saúde que as assistiram.
Na análise do questionário online, identificamos 335 respostas de mulheres que
estavam na faixa etária compreendida entre os 18 e 46 anos.Destas,111 mulheres afirmaram
que sofreram violência obstétrica em seu parto, sendo 59 casos no vaginal, 44 casos no
cesárea, e 8 no parto humanizado. Os demais detalhes dos resultados serão descritos na
próxima seção.
Para apurar o percentual das questões, foi analisado formulário por formulário, a fim
de que houvesse um resultado mais fidedigno.
16
Participaram 265 mulheres entre 18 e 46 anos, sendo 70 delas multíparas, o que resultou
em 335 respostas sobre suas gravidezes. Quanto à escolaridade, 61,5% das mulheres possuíam
o ensino superior completo, enquanto o restante se divide em 20,8% ensino superior
incompleto,16,6% o ensino médio e apenas 1,1% cursaram somente o ensino fundamental.
Sobre o número de filhos, 67,2% das participantes possuíam um único filho, sendo os demais
25,3% dois filhos e 7,5% 3 filhos ou mais.
Quanto aos modelos de parto apresentados pelo obstetra, 65,7% das participantes
responderam vaginal (normal), 56,6% cesárea e, com um percentual bem mais abaixo do que
os demais vem o humanizado, com 30,2%, de modo a indicar que o modelo humanizadoé
menos difundidopelos obstetras.
36,2% das participantes afirmam que pelo menos um de seus partos não foi realizado da
forma como gostariam (Figura 2). 97% das entrevistadas conhecem o parto humanizado e
97,7% consideram que há benefícios para a mãe e/ou para o bebê neste tipo assistência.
Figura 1: Crêem que o parto humanizado possui benefícios. Figura 2: Realizados desconsiderando a vontade da mulher
Das 335 respostas sobre o modelo de parto adotado, 42% deles foi humanizado, seguido
de 31% de cesarianas e 27% de via vaginal (F. 3).
17
27% Normal
42%
Cesárea
Humanizado
31%
Figura 3.
Normal Normal
39,7%
40% 53% Cesárea Cesárea
Humanizado 59%
Humanizado
Figura 4. Figura 5.
18
Mulheres que amamentaram correspondem a 77,6% (F.6), contra 24% das que não
amamentaram seus bebês, cujos percentuais se dividem em 12,7% para cesárea, 8,7% para os
Amamentaram após o
nascimento
18,5% Normal
38,8% Cesárea
20,3% Humanizado
Figura 6.
vaginais e 2,6% para os humanizados.17% respondeu que sentiu dificuldade para se vincular à
criança, dos quais 50,8% aparecem no cesariana, 40,3% no vaginal e 8,7% no
humanizado(F.7).
Dificuldade para se
vincular
8,7%
Normal
40,3%
Cesárea
50,8%
Humanizado
Figura 7.
De acordo com a figura 8, podemos ver que 28,6%das parturientes responderam acreditar que o
momento do parto e/ou pós-parto foi estressante de algum modo para o bebê.
Normal
46,8%
Cesárea
44,8%
Humanizado
Figura 8.
19
60% das mães, num geral, tiveram contato com seu bebê imediatamente. 36% delas
tiveram após a equipe realizar procedimentos de rotina da instituição em que ela deu à luz. Os
casos em que levaram de 12 horas a dias foram de maior complexidade (F. 9).
Algumas horas
36% depois
60% Mais de 12 h
depois
Dias depois
Figura 9.
Com base nos dados, podemos ver que há uma maior associação entre violência
obstétrica, traumas, dificuldade de vínculo e estresse para o bebê em partos cesarianas e
vaginais do que nos partos humanizados. No entanto, dificuldade de se vincular pode estar
ligada à gravidez indesejada e outros fatores. A via de parto não interfere na amamentação,
porém pode fazer com que o tempo entre nascimento e contato com seio seja um pouco maior
do que nos humanizados, onde o contato é imediato e o bebê não passa por nenhum tipo de
procedimento hospitalar. Outro dado relevante é que violência obstétrica não é sinônimo de
trauma, pois a alegria de parir um filho pode superar os maus tratos recebidos.
7. Considerações finais
proporcionar grande alegria, o parto humanizado pode tornar o puerpério menos difícil e
doloroso, pois cria condições facilitadoras, respeitando os limites e as necessidades da
parturiente, bem como aproximando os familiares deste evento. Isto proporciona alívio e
conforto, de forma que o nascimento do bebê seja um momento agradável e especial.
Exploramos como o papel social e político das mulheres mudou ao longo da história
e, nesta perspectiva, salientamos a importância dos movimentos de luta das mulheres por
direitos, tanto no campo da política como no da saúde.
É possível realizar a humanização da saúde e das práticas profissionais sem
humanizar as relações humanas? Michel Odent dizia que "para mudar o mundo, era preciso
mudar a forma de nascer". A assistência humanizada promove um parto natural respeitoso,
aleitamento materno (preferencialmente nos primeiros momentos de vida do bebê), a redução
das intervenções desnecessárias e possivelmente uma redução do índice de depressão pós-
parto. É um momento único e muito subjetivo, e quando bem realizado, com respeito e apoio,
pode facilitar o vínculo mãe-bebê.
21
8. Referências:
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http://dx.doi.org/10.1590/S1413-73722008000200022.
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9. ANEXO
Relatou também não ter sofrido nenhum tipo de violência obstétrica e que viu seu
bebê após o limparem.Desde esse momento ficou o tempo todo com ele e que o amamentou
logo após o parto.
Por ter tido complicações de pressão e retenção de líquido,a entrevistada diz ter
permanecido ainda por alguns dias internada e com algumas medicações, e que acha ter
refletido isso no comportamento do seu bebê, pois ele ficou muito irritado. Todo o processo
de pré-natal, trabalho de parto e puerpério foi acompanhado pelo seu companheiro e, por fim,
relata não considerar seu parto como um evento traumático, mas sim triste e frustrante por não
ter saído como planejado.
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