Você está na página 1de 19

POLÍTICAS PÚBLICAS DE ENFRENTAMENTO AO FEMINICIDIO

Marina Costa dos Santos1


Bruno Denis Vale Castro2

RESUMO
ABSTRACT

1 INTRODUÇÃO

A temática de violência exercida contra a mulher possui grande relevância, haja vista
que os índices de casos registrados são assustadores, sem a percepção da importância do papel
da mulher na sociedade. A violência contra mulher corresponde a um fenômeno social grave,
pois apresenta várias consequências de natureza física social e psicológica para a padecente.
O feminicídio, alvo deste estudo, corresponde a um problema jurídico-social que teve
um crescimento expressivo durante e após pandemia. Segundo o Fórum Brasileiro de
Segurança Pública (2023), o Brasil teve um aumento de 5% nos casos de feminicídio em 2022
quando comparado aos dados de 2021, em que uma média de 1,4 mil mulheres são mortas
simplesmente pelo fato de serem mulheres, sendo tal quantitativo, o maior registrado no país
desde da vigência da lei de feminicídio.
A violência que acomete meninas e mulheres tem como etiologia os variados valores
atribuídos de forma cultural a mulheres e homens que determinam expectativas sobre seus
comportamentos. Nota-se então que a desigualdadede gênero nas relações estabelecidas entre
homens e mulheres, é o principal elemento que fomenta as relações violentas oriundas de
comportamentos que persuademas mulheres a submissão.
A violência em detrimento da mulher representa uma violação grave dos direitos das
mulheres e constitui em um problema social grave, multifacetado, que apresenta indícios
desde dos primórdios da história sociocultural que norteava as relações hierárquicas de poder
e no desequilíbrio típico entre os gêneros. À Lei n. 11.340/2006, denominada de Lei Maria da
Penha, é considerada tanto pelo segmento jurídico como pela sociedade, como um grande
avanço no que tange à consolidação dos direitos da mulher em face da tutela de sua proteção
contra qualquer modalidade de violência, sendo robustecida pela Lei nº 3.104/2015

1
2
que torna a prática de feminicidio, como um homicídio qualificado, sendo encarado como
crime hediondo.
As vítimas de feminicidio, por sua vez, sofrem por serem reféns de situações
indesejáveis e torturantes. Vale destacar que apenas na última década, esse delito começou a
ser encarado como um problema público que demanda políticas públicas efetivas para o seu
enfrentamento.Nessa linha de raciocínio, as políticas públicas podem ser compreendidas pelo
seu sentido político ou administrativo.
Diante da complexidade do problema, a ONU chama atenção para a necessidade de
assegurar às mulheres vítimas de violência ou feminicidio, o pleno acesso a um conjunto de
serviços basilares a serem prestados por diferentes setores, tais como: saúde, jurídico e
serviços sociais, em que tem o intuito de diminuir os índices da violência e mitigar as
consequências sobre o bem-estar, auxiliando na recuperação da vítima.
Desse modo, a violência contra mulher tornou-se uma problemática social grave,
principalmente devido ao aumento dos índices de violência em diversas formas e lugares,
infringindo assim os direitos sociais e humanos.
Assim, a relevância deste trabalho justifica-se pela preocupação contínua com o
aumento alarmante dos números de casos de violência contra mulher, em especial, o
feminicidio, mesmo com a vigência de leis criadas para coibir tal cenário. Busca-se então
realizar uma reflexão sistemática acerca das medidas que buscam intimidar tal prática, das
políticas públicas de enfrentamento, com elaboração de propostas consistentes, pautadas em
uma vasta pesquisa bibliográfica, que tem o intuito de minimizar os quadros da violência
contra mulher, com apoio familiar e da sociedade em geral.
Embora existam leis e projetos de leis que ainda estão por sancionar, percebe-se que
não é o suficiente, pois o índice de violência contra a mulher vem aumentando ao decorrer dos
anos. É notório a preocupação do Governo em adotar medidas mais severas ao agressor, como
o caso da lei do feminicídio que hoje é considerado crime hediondo, bem como, políticas
públicas de enfrentamento dos quadros de violência.
Assim, foi realizado o seguinte questionamento: Quais as estratégias e políticas
públicas para enfrentamento do feminicidio? O objetivo geral foi investigar sobre o aumento
dos quadros da violência contra a mulher e feminicidio no Brasil, com demonstração em
gráficos a realidade do aumento de violência, mesmo com a vigência de inúmeras leis. Os
objetivos específicos foram: compreender as estratégias de acolhimento à vítima denunciante;
entender o limite de atuação do agente público e do sistema jurídico posterior à
denúncia; analisar a efetividade ou não das políticas públicas da proteção das mulheres no
enfrentamento do feminicidio.
A metodologia trata-se de um estudo de revisão bibliográfica sistemática do tipo
qualitativo, quantitativo, exploratório, descritivo. Na oportunidade, será reunido as principais
contribuições teóricas, as leis, as estatísticas, com base na discussão de livros, artigos, teses,
pesquisas em doutrinas e jurisprudências e dados do sistema de segurança nacional e estadual,
no lapso temporal de 2015 a 2023.

2 FEMINICÍDIO

A violência contra mulher corresponde a um fenômeno social grave, pois apresenta


várias consequências de natureza física social e psicológica para a padecente. Percebe-se
ainda que, tal violência é habitual e de longa duração, em que, na maioria dos casos,
infelizmente por influência desastrosa da cultura da conservação do casamento e
patriarcalismo, muitas mulheres demoram dar uma resolutiva eficiente ao caso (BARROS;
SILVA, 2019).
Ao tipificar os crimes de violência contra as mulheres como crimes de
femicídio/feminicídio, faz-se uso da nomenclatura “nova” para uma forma de violência e de
barbárie bem remota que se evidencia em todos os percursos históricos das mulheres. Trata-
se de um fenômeno em escala global, que tem sido instigantemente denunciado desde de
1980 pelos movimentos feministas.
No que tange o femicídio e feminicídio trata-se de casos de assassinato de uma
mulher pela simples condição de ser mulher, pela sua condição feminina ou identificação
com o sexo feminino. O referido crime tem ganhado destaque nas últimas décadas, em face
de trata-se de uma manifestação de violência extrema que tem como consequência final, o
óbito de uma ou várias mulheres sendo um quadro de violação aos seus direitos humanos
(CAICEDO-ROA; BANDEIRA; CORDEIRO, 2022).
Os feminicídios são derivados de múltiplas, crescentes e contínuas manifestações de
violência, que estão percebidas no cerne cultural e histórico das relações desiguais de poder
estabelecidas entre homens e mulheres, em que pese avultar, alimenta a discriminação
sistêmica do gênero feminino, alicerçado em valores sociais, religiosos, econômicos e
culturais (CALDAS, 2022).
Um crime de feminicídio não trata-se de um evento isolado ou inesperado, e sim,
corresponde a um processo massacrante e diário de violências, em que o ápice do ciclo de
violência extrema seria a morte da vítima, todavia, durante as etapas é observado abusos
verbais, físicos, psicológicos e sexuais, além de inúmeras formas de mutilação e barbárie.
A violência de genêro está visceralmente ligada a cultura patriarcalista, em que o
emprego da palavra femicídio ocorreu pela primeira vez em 1801, na obra literária do
escritor inglês John Corry, a fim de designar o assassinato de uma mulher. Já no século XX,
o termo foi empregado pela primeira vez pela norte-americana Carol Orlock, no ano de
1974, sendo retomada a expressão no discurso da feminista Diana Russel, no ano de 1976,
durante depoimento junto ao Tribunal Internacional de Crimes contra as Mulheres, que
ocorreu em Bruxelas (BANDEIRA; MAGALHÃES, 2019).
A discussão existente no meio jurídico quanto ao confronto do “feminícidio” com o
princípio constitucional da igualdade de gêneros, proposto pela Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988. Dessa maneira, a discussão atual no cenário legislativo
brasileiro, versa sobre a aprovação da Lei nº 13.102, de 9 de março de 2015, que introduziu o
instituto do feminícidio no Código Penal Brasileiro (CAICEDO-ROA; BANDEIRA;
CORDEIRO, 2022).
A violência vem sendo a causa de intensa preocupação perante o contexto
contemporâneo brasileiro. A violência contra a mulher, em uma visão global, tem como
motivador principal a própria diferença biológica entre os sexos, em que se constrói no
segmento social um sistema de dominação masculina, em especial ao que trata da divisão
social do trabalho, que endossa uma função ideal para cada gênero (CALDAS, 2022).
Essa modalidade de violência ocorre em diversos níveis da vida e se evidencia sob
formas e circunstâncias distintas. Nesta conjectura, dentre as várias situações de violência que
vitimam as mulheres, evidencia às ocorridas no ambiente determinado socialmente para as
mulheres: o espaço privado, a família e o domicílio.
O ordenamento jurídico brasileiro está pautado na Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988 e seus princípios, que trazem as normas basilares do Estado,
destinando-se, conforme determinado em seu preâmbulo, à “[...] assegurar o exercício dos
direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a
igualdade e a justiça [...]” (BRASIL, 1988).
De tal modo, Alvares e Medeiros (2019) descreve alguns fatores que contribuem para
a prática da violência contra a mulher, sendo estes: a falta de punição dos agressores, o
silêncio das mulheres agredidas, a inferioridade das mulheres e a transformação das vítimas
em culpadas. Portanto, a violência contra a mulher representa um verdadeiro desrespeito aos
direitos e garantias fundamentais da mulher, colocando-se como um obstáculo para a
efetivação de uma série de princípios constitucionais, tais como a dignidade da pessoa
humana, da igualdade, da liberdade, dentre outros.
Assim sendo, a Lei Maria da Penha – Lei nº 11.340/06, surge como um marco na
proteção aos direitos das mulheres, pois, de forma genérica teve como escopo a concepção
essencial de coibir e prevenir todas as modalidades de violência seja de origem doméstica
e/ou familiar, nos termos do artigo 226 da Constituição Federal de 1988, da Convenção sobre
a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra as Mulheres e da Convenção
Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher, ratificado pelo
Brasil.
Com a tipificação do crime de feminícidio é possível legitimar o sistema penal como
instrumento de mudança social, sob uma lógica de punição do agressor e proteção da mulher
enquanto detentora de direito. Por outra vertente, é notório que existe uma incompatibilidade
da Lei que concede a qualificadora do crime de feminícidio com o princípio da igualdade de
gênero, haja vista que acarretará uma execução da tutela penal direcionada à proteção do sexo
feminino, e em desfavor do sexo masculino que também possui vítimas de homicídio em
razão do gênero (ANGELIN; MARTINS, 2019).
Insta salientar que, as vítimas do crime de Feminicídio, obedecerão às mesmas regras
impostas às vítimas da Lei Maria da Penha, ou seja, para ser caracterizado crime de
feminicídio, a vítima deverá ter sido morta por razões de gênero e por agressor onde possua
ou tenha possuído vínculo afetivo, como veremos mais adiante.
São cinco as formas de violência de gênero determinadas no art. 7º da legislação em
comento, sendo elas a violência física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. Elas são
autoexplicativas, pois na própria lei há a descrição de cada uma delas (ALFERES; ALFERES;
GIMENES, 2016).
O rol de violência doméstica em desfavor da mulher não é taxativo, sendo o caput do
art. 7º o termo “entre outras” é usada, assim, há que se dizer em outras modalidades de
violência não determinadas na lei.
O reconhecimento do feminícidio como crime hediondo enquanto alternativa para
coibir a violência de gênero, objetiva assegurar às mulheres os seus direitos e garantias
fundamentais, uma vez que sua tipificação, por intermédio da Lei nº 13.104/2015, expressão
início de uma mudança jurídica e social na consciência coletiva e um instrumento protetivo da
violência contra as mulheres (FONSECA et al., 2018).
As medidas do Estado brasileiro para a promoção e proteção das mulheres são
semelhantes a de outros países na América Latina, onde, nos dias modernos, uma faixa de
quatorze países possuem no seu ordenamento jurídico, artigos ou leis que validam o
feminícidio como crime, além do Brasil. Todavia, cabe ressaltar que apesar desta lei
representar um marco na luta pelos direitos das mulheres, de todas as conquistas, nos dias
atuais ainda se permite ouvir alguns questionamentos, no que se refere a sua efetividade com
relação ao enfrentamento à violência contra a mulher.

2.1 Geografia do Feminicídio

Diferentes estudos já demonstraram que o término do relacionamento e a tentativa de


separação são fatores de risco para o feminicídio íntimo. Assim, no Brasil, no que concerne o
local de violência mais grave que a mulher foi submetida, o espaço menos seguro para as
mulheres continua sendo dentro de casa, em que foi registrado a ocorrência de quadros de
feminicidios nas residências, alcançando um percentual de 65,6%. Já em relação ao perfil da
vítima acometida pelo quadro de femíncidio, um percentual de 61% das vítimas são negras,
80% dos casos o autor foi o companheiro ou ex-companheiro, enquanto que 72% das vítimas
tinhas no máximo ensino fundamental.
Segundo o IPEA (2020) no ano de 2019 houve um aumento de de 1.330 casos de
feminicidio, alcançando um a totalidade de 3.966. Verificou-se no ano de 2022, que o Brasil
teve o maior registro de feminicidio em que teve-se 1,4 mil mortes motivadas pelo gênero,
correspondendo a um percentual de crescimento de 5%, alcançando uma margem de uma
mulher morta a cada seis horas. Observa-se que a alta ocorreu em contramão ao quantitativo
de assassinatos sem o recorte de gênero, como ilustra o gráfico 1 (FBSP, 2023).

Gráfico 1 – Feminicídios x homícidios de mulheres no Brasil no intervalo de 2017 a 2022.


Fonte: FBSP, (2023)
Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, (2023), o estado brasileiro com
maior registro de feminicidio foi o Mato Grosso do Sul e o de menor registro de casos de
feminicidio foi o do Ceará.
De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (2023), infelizmente, observa-se em
todo o território brasileiro, que existe uma relação íntima entre feminicidio, negativa de
medida protetiva ou ineficácia de medida protetiva.
No ano de 2019, segundo o IPEA (2020), no Maranhão teve 114 casos de agressões e
tentativas de feminicidio. Já segundo dados a Polícia Militar do Maranhão (2023), destaca-se
que houve um registro de 72 casos de agressões e tentativas de feminicidio somente no ano de
2022. Mesmo com uma pequena redução dos registros de casos de feminicidio, de acordo
com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, (2023), o Maranhão ainda é considerado o
segundo estado do Nordeste com maior registro de agressões e tentativas de feminicidio,
perdendo apenas para o estado da Bahia. Dentre as motivações do crime, seriam brigas,
preconceito de gênero, términos de relacionamento ou crimes de ódio.
A Polícia Militar do Maranhão (2023) em nota, afirma que tem investido em
campanhas de conscientização, em medidas protetivas e em um trabalho operacional para
enfrentamento dos quadros de violência ou feminicidio contra a mulher, com aumento da rede
de denúncia e de acolhimento das vítimas, através do aplicativo Salve Maria Maranhão,
Delegacia online, Central de atendimento à mulher, Disque-denúncia, Casa da Mulher
Brasileira, Patrulha Maria da Penha, dentre outras medidas.
De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (2023), o Maranhão apresentou uma
redução de 13,8% de casos de feminicidio e um indeferimento de 1,87% de medida protetiva,
em que evidencia a importância de promover a eficácia de tais medidas em detrimento do
aumento de casos de feminicidio.

3 POLÍTICAS PÚBLICAS DE ENFRENTAMENTO E ESTRATÉGIAS DE


ACOLHIMENTO

Segundo Santos e Sotero (2020), asseveram que à violência contra a mulher em


virtude de gênero, era sentenciada como qualquer outro delito na justiça comum e a pena
determinada na legislação era de seis meses a um ano, com inexistência da probabilidade de
prisão preventiva, pois ainda não tinha sido elaborada lei específica para o caso.
Contudo, após a promulgação da Lei Maria da Penha, houve uma modificação do
Código Penal Brasileiro, o que permite que os agressores sejam presos em flagrante ou sejam
agraciados com a decretação da sua prisão preventiva; elevou o tempo máximo de prisão,
além de determinar algumas medidas protetivas como abrigo a ofendida, a retirada do
agressor do domicilio e vedação de aproximação, com a criação das Delegacias de Defesa a
Mulher (REIS; GONÇALVES, 2015).
Logo, cabe avultar que as medidas protetivas buscam garantir que a mulher venha a
atuar de maneira independente ou com suporte e proteção estatal, com atuação jurisdicional
em desfavor do agressor. É imprescindível que para a permissão de tais medidas, seja
constatada a prática de ato ilícito por parte do agressor, ou seja, seja confirmado a conduta da
prática de violência contra a mulher, concebida no contexto das relações domésticas ou
familiares das figuras do conflito (SANTOS; SOTERO, 2020).
Destarte, para a eficácia dessa modalidade de medida protetiva, far-se-á necessário que
seja elaborado Programas de Proteção e Atendimento e que os mesmos tenham
funcionamento adequado. Sobreleva ainda que, tais programas não carecem, necessariamente,
que seja voltado exclusivamente para as vítimas de violência doméstica, em que poderá ser
concebido por meio de atividades de grupos de apoio à mulher, entidades não
governamentais, e Estado (GARCIA et al., 2015).
Concomitantemente, é notório que os programas de proteção e atendimento deve gozar
de uma boa e segura estrutura para a promoção de um atendimento multidisciplinar, além de
dispor de segurança, visto que as vítimas estão mergulhadas em condições de risco, com
probabilidade de ferir, ao ceifar, o maior bem jurídico, que é a vida (BRAVO, 2019).
Nessa órbita, em algumas capitais do Brasil, foi construída uma organização
denominada de Casa da Mulher Brasileira, que se trata de instituições que desempenham
atendimento e acolhimento de mulheres vítimas de violência, com oferta de serviços
especializados, tais como o atendimento psicossocial, jurídico, dentre outros (SANTOS;
SOTERO, 2020).
Nos dias contemporâneos, a Instituição em associação ao Ministério do Trabalho,
favorece que as mulheres almejam o seu encaminhamento a vagas de emprego, além de
demais recursos para múnus de capacitação para o mercado de trabalho, em que pese
reconhecer a deficiência de qualificação, além de que uma grande maioria, está afastada do
mercado de trabalho durante muito tempo, devendo assim realizar uma reciclagem de
conhecimento, além de garantir a sua independência financeira, e logo, ruptura do ciclo de
violência (ANGELIN; MARTINS, 2019).
Outrossim, a Casa da Mulher Brasileira possui uma atividade em parceria com a
Delegacia da Mulher, agindo de maneira centralizada, a fim de promover o pleno atendimento
em um lugar ímpar, que permite impedir o desgaste da reprodução do relato do episódio, além
de ser submetido a algum atendimento constrangedor (SANTOS, 2018).

4 MEDIDAS PROTETIVAS E SUA POSSÍVEL INEFICÁCIA

Nessa órbita, é relevante asseverar que a Lei nº 11.340/2006 modernizou ao


estabelecer que a admissão de medidas protetivas a vítima, visto que outrora inexistia
qualquer protótipo de imposição legal que fosse competente para garantir a proteção das
mesmas, em período que antecede o término do inquérito ou processo, que associado a
deficiência de celeridade do poder judiciário, que desemboca no agravamento do dano
(FERNANDES, 2015).
Sobreleva ainda que a referida lei assegura também algumas providências que deverão
ser tomadas pela jurisdição policial que acolhe a queixa crime, sendo que tanto o Ministério
Público como o Poder Judiciário deverão exercer suas funções nesse segmento, por meio de
parceria, com o intuito de garantir a segurança da vítima e logo, a justa, adequada e eficiente
punição do agressor (SANTOS, 2018).
Por pressuposição, os pilares defendidos pelas medidas protetivas versam acerca da
detenção do agressor, salvaguardar a integridade física, emocional e patrimonial da vítima,
portanto percebe-se a viabilidade da tutela de urgência, com o objetivo basilar de que
sobrevenha, no primeiro momento, uma atuação rápida e premente do poder público, na
figura do sistema público judiciário e de segurança (FERNANDES, 2015).
Salienta-se também que, o artigo 10 da referida lei dispõe que a autoridade policial
admita uma seriação de deliberações em situações de relato da ameaça ou mesmo prática da
violência doméstica, com a oferta de um atendimento integral à vítima, que vai desde da
oferta dos primeiros socorros, até o encaminhamento ao hospital ou Instituto Médico Legal, a
fim de permitir que seja avaliada por profissional habilitado, além de oferecer, a depender do
caso concreto, um novo abrigo a vítima e prole em face da promoção da segurança dessas
figuras (SANTOS; SOTERO, 2020).
Ademais, as providências a serem acolhidas pelas autoridades competentes, está
presumido no capítulo II o rol de medidas protetivas que são divididas em “Das Medidas que
Obrigam o Agressor” e “Das Medidas Protetivas à Ofendida” (FERNANDES, 2015).
Logo, cabe avultar que as medidas protetivas buscam garantir que a mulher venha a
atuar de maneira independente ou com suporte e proteção estatal, com atuação jurisdicional
em desfavor do agressor. É imprescindível que para a permissão de tais medidas, seja
constatada a prática de ato ilícito por parte do agressor, ou seja, seja confirmado a conduta da
prática de violência contra a mulher, concebida no contexto das relações domésticas ou
familiares das figuras do conflito (SANTOS; SOTERO, 2020).
A lei 11.340/2006 determinou medidas que requerem obrigações ao agressor,
denunciado por violência doméstica familiar, em que pese destacar que as atitudes conferidas
por este, são propícias para dificultar alguma reação ou conduta da vítima no que tange a
promoção de denúncia, e por conseguinte, visa atrapalhar, ou criar obstáculos para a resolução
do problema (SANTOS; SOTERO, 2020).
Desse modo, far-se-á necessário que tais medidas sejam adotadas durante o trâmite
processual movido pela vítima, a fim de que evite a reincidência do delito, como disciplina o
artigo 22 da referida lei. Vale ressaltar que tais medidas são aplicadas com caráter de
urgência, em face da avaliação do caso concreto, e mediante a verificação por meio do
depoimento da vítima, a extrema necessidade da consolidação de tais deliberações, que
poderá ser em conjunto com demais providências (SANTOS, 2018).
A lei foi definida para promover a proteção à vítima de violência doméstica e de
posterior quadro de feminicidio, com presteza foi relevante concretizar medidas de urgência a
fim de assegurar proteção à ofendida, como discorre os artigos 23 e 24, com o propósito de
que a mulher, mormente, ou alguma vítima de violência doméstica venha obter seus direitos e
resguardar-se da violência, ainda que sustentar a iniciativa represente alguma ação discrepante
(SANTOS, 2018).
No inciso I do artigo 23 denota o direcionamento “da ofendida e dos seus dependentes
a programa oficial de proteção e acolhimento”. Neste ínterim, a vítima é conduzida a um
espaço tutelado, quando o lugar da agressão representa alta vulnerabilidade, sendo capaz de
ser autorizada pela figura do juiz ou da autoridade policial, com a alternativa de realizar um
direcionamento, a triagem do Ministério Público por meio de uma decisão administrativa
(REIS; GONÇALVES, 2015).
Destarte, para a eficácia dessa modalidade de medida protetiva, far-se-á necessário que
seja elaborado Programas de Proteção e Atendimento e que os mesmos tenham
funcionamento adequado. Sobreleva ainda que, tais programas não carecem, necessariamente,
que seja voltado exclusivamente para as vítimas de violência doméstica, em que poderá ser
concebido por meio de atividades de grupos de apoio à mulher, entidades não
governamentais, e Estado (BRAVO, 2019).
Concomitantemente, é notório que os programas de proteção e atendimento deve gozar
de uma boa e segura estrutura para a promoção de um atendimento multidisciplinar, além de
dispor de segurança, visto que as vítimas estão mergulhadas em condições de risco, com
probabilidade de ferir, ao ceifar, o maior bem jurídico, que é a vida.
Nessa órbita, em algumas capitais do Brasil, foi construída uma organização
denominada de Casa da Mulher Brasileira, que se trata de instituições que desempenham
atendimento e acolhimento de mulheres vítimas de violência, com oferta de serviços
especializados, tais como o atendimento psicossocial, jurídico, dentre outros (SANTOS;
SOTERO, 2020).
A incorporação das medidas protetivas de urgência estabelece um dos pilares mais
significativos da Lei Maria da Penha, dado que penhora a elevação das estratégias de proteção
das mulheres ofendidas por violência doméstica e familiar. Entretanto se perfaz lobrigar que
nem sempre tais providências são cumpridas em conformidade com decisão judicial ou
meramente não são cumpridas (CARVALHO, 2017).
Nessa órbita, pode-se inferir que, mesmo sendo um mecanismo de extrema
importância, a Lei Maria da Penha, particularmente as vertentes que direcionam às medidas
protetivas, não vem concebendo o impacto prenunciado, em virtude da morosidade do rito
legal que versa acerca da implantação das medidas.
De maneira congruente, percebe-se a deficiência de aparato e o arranjo ineficiente do
Estado colaboram claramente para que as medidas protetivas sejam transgredidas ou mesmo
recôndita pelos agressores que, mergulhados na sensação de impunidade, puramente não
denotam preocupação com as prováveis sequelas de suas ações.
Tencionando para a magnitude da imprescindibilidade da aplicabilidade de medidas
protetivas de urgência, far-se-á necessário o devido cumprimento legal das medidas, dado que
não serão efetivas, em situações que infringir tal pensamento, e por conseguinte, acarretará
prejuízos não somente no que tange a garantia dos diretos da vítima, como também ao seu
bem estar (BALZ, 2015).
Por esse ângulo, a morosidade do poder judiciário no que concerne à análise e outorga
das medidas protetivas de urgência está rigorosamente conectada a sua decorrente ineficácia,
desencadeada pela carência de pessoal, que origina o empilhamento de processos e, em muitas
situações, a resposta não é apresentada com a eficiência necessária
Assim, complementa Lopes (2020, p. 13),

Inexiste a necessidade de juntada de prova robusta, sendo apenas o boletim de


ocorrência prova cabal, haja vista que apresenta a narrativa sucinta do fato delituoso,
o pedido da vítima em relação as medidas protetivas, uma rápida explanação da
justificativa dos motivos e o depoimento de duas testemunhas que tenham
conhecimento da prática do fato delituoso. Apesar de a lei não exigir a juntada de
depoimentos testemunhais nesta fase inicial, por medida de cautela, deverá a
autoridade policial juntá-los ao pedido de aplicação de medida protetiva de urgência,
possibilitando, assim, que o juiz competente decida com mais segurança.

Assim, pode-se asseverar que flexibilizar o sistema de análise e permissão da medida


protetiva, desde que manifestada no tocante a necessidade, com produção de uma solução
rápida e eficaz à ofendida que, por vezes, está exposta a situações de real estado de perigo
(ALVES, 2017).
Ademais, a autoridade policial, por inúmeros motivos, não é qualificado de
acompanhar a execução das medidas e satisfazer a os protestos que se avolumam em todo o
país, desde a publicação da Lei Maria da Penha.
Verifica-se a inexistência de cooperação entre os inúmeros órgãos estatais arrolados
desde a permissão das medidas protetivas, quer seja através do não compartilhamento de
elucidações necessárias, ou mesmo quer seja pela delonga em acolher solicitações realizadas
ou mesmo por não usufruir de equipamentos e tecnologia que permita o pleno andamento dos
pedidos de concessão e deferimento das medidas. É relevante destacar que, é presente outro
entrave em relação ao poder judiciário no que tange o atendimento das reclamações realizadas
no que toca a desobediência das medidas.
Todavia, revela-se que são inúmeros os elementos que colaboram para transfigurar a
aplicabilidade das medidas protetivas de urgência incompetentes que exigem uma melhoria
dos mecanismos e instituições, com o intuito de garantir que não desposse tal instrumento,
que possui papel imprescindível na promoção da proteção da vida das mulheres ofendidas por
violência doméstica e familiar (ALVES, 2017).
Balz (2015), desponta em seu estudo que, considerando que o agressor é, por via de
regra, convive com a ofendida, e assim, frequenta o mesmo grupo social e familiar desta, o
legislador foi obrigado a elaborar estratégias para buscar romper esses “laços” em face de
preservar a integridade da mulher. Não obstante, é sabido que existe um alto índice de
transgressão das medidas protetivas, que na práxis, nota-se que as decisões legais de
distanciamento da vítima, não foi suficiente para assegurar a proteção necessária no caso
concreto.
As medidas protetivas de urgência , por outro lado, foram sancionadas com o objetivo
de promover uma satisfação imediata aos anseios da sociedade no que tange à violência
doméstica, visto que é condenável ato algo tão lesivo, que desencadeia incorrências físicas e
psicológicas à ofendida, provocando, em muitos casos, sequelas irreversíveis, e logo não
poderá ser acolhido a proposta de ser considerado como um delito de menor potencial
ofensivo como avaliado no passado (SANTOS, 2018).
Em virtude da dimensão desta lei, bem como da influência midiática, fomenta novas
denúncias diárias, sendo verificado que por mais que exista a norma jurídica, ainda sim, a
cada ano as estatísticas só aumentam.
Segundo Lopes (2020), embora a lei seja um fenômeno elogiado por todas as esferas
da sociedade, ainda é reconhecido falhas no processo de execução do processo. O Estado não
validou a ocorrência de uma fiscalização efetiva, pois abalroa no entrave do orçamento
público, pois é reconhecido que as cidades brasileiras, em especial, as do interior dos Estados,
possuem uma estrutura deficiente para acolher a vítima, que em situação de vulnerabilidade
depara-se com obstáculos, que vai desde o simples registro da ocorrência nas delegacias, que
não é via de regra, a disposição de um suporte policial efetivo a fim de que seja tomada as
devidas providências elementares logo em seguida do registro da ocorrência, e vai até a não
aplicabilidade coerente e sólida das medidas protetivas.
A debilidade das delegacias, em especial, no fornecimento dos primeiros
atendimentos, deteriora significativamente, todo o andamento do inquérito policial, e para
culminar, implica na carência da produção de provas para fundamentar uma ação penal
subsequente, para subsidiar o pedido de prisão do agressor (CARVALHO, 2017).
Nota então que existe uma grande anomalia do poder público, ao ser complacente com
a inexistência de sustentáculo a uma delegacia, que por sua vez não foi habilitado para
solucionar episódios de agressão ocorrida no âmbito das casas jurídicas. Com presteza,
indaga-se a efetividade desta autoridade policial em averiguar atos de transgressão de uma
medida protetiva.
Outrossim, a sobrecarga de processos judiciais derivado da elevado número de
denúncias, provoca uma morosidade para a concessão de medidas protetivas, bem como o
efetivo acatamento da decisão judicial é diretamente perturbado em face dos ensaios de
intimar o agressor que nesse intervalo poderá criar embaraços para identificar a sua
localização com o intuito de justificar o seu não cumprimento (LOPES, 2020).
Entretanto, as medidas protetivas no primeiro passo, não resultam na prisão imediata
do agressor, apenas determina-se o distanciamento da ofendida, mas não o impossibilita de
realizar novas agressões. Em virtude do convívio familiar e do grupo social estabelecido entre
agressor e ofendida, oportunizam a conduta assídua de violência (CARVALHO, 2017).
A incongruência com o fim de uma relação afetiva e amorosa, é assinalada como o
estopim para amparar determinada atitude, como foi o caso da vítima Tauane Morais dos
Santos, morta em 2018, dentro de seu domicílio, pelo ex-cônjuge quando já se existia uma
medida protetiva em desfavor do mesmo, como demonstra a notícia divulgada pelo Correio
Brasiliense:

O agressor foi preso em flagrante pelos crimes de feminicídio e por desobediência


da decisão judicial que versa acerca das medidas protetivas de urgência. No último
domingo, o homem já tinha sido preso em flagrante por injúria, ameaça, dano
qualificado e vias de fato no contexto da Lei Maria da Penha. Depois de a mulher
afirmar que desejada a dissolução do relacionamento, o agressor ameaçou a vítima e
destruiu diversos itens da casa. Os vizinhos chamaram a polícia e todos foram
conduzidos à delegacia para execução do flagrante. O caso está sendo acompanhado
e investigado pela 26ª Delegacia de Polícia.

Nota então que, mesmo a desobediência da decisão judicial sendo interpretado como
crime, derivando na eventualidade prisão do agressor, depara-se novamente com o quesito
estrutural do sistema jurídico e policial. É sabido que o sistema carcerário brasileiro já não
compreende uma quantidade tão vultosa de indivíduos, visto que não possui estrutura física
apropriada para fomentar a ressocialização dos delinquentes (CARVALHO, 2017).
O judiciário, por outro lado, faz uso de penas alternativas ou mesmo das denominadas
penas restritivas de direito para substituí-la com uso de tornozeleiras eletrônicas, que se
encontra ainda inúmeras falhas no que tange o monitoramento integral e a segurança do
instrumento. Todos esses fatores, atrelado, em muitos casos, com o abandono do processo
pela ofendida, sob a justificativa da reconciliação do casal, retoma-se o ciclo de violência.
Observa-se que além dos elementos apontados, existem outros fatores que colaboram
para a ineficácia das medidas protetivas. Sobreleva que ao buscar reconhecer os fatores, deve-
se analisar o cenário social e econômico em que a ofendida convive, visto que mesmo com o
avanço que o século XXI vislumbrou, ainda depara-se como justificativa para tal fenômeno, o
quesito econômico, pautada em uma dependência financeira para a ofendida submeter-se à
quadros de violência (BRAVO, 2019).
Outro ponto que merece destaque, é que, infelizmente, ainda é enraizado na nossa
cultura, o personagem do homem como provedor da subsistência familiar, em que a ofendida
acredita possuir com agressor uma eterna dívida de gratidão, devido ele manter seu sustento,
ofertar moradia, alimento e educação da prole (CARVALHO, 2017).
Segundo Bravo (2019), sabendo dessa fragilidade, o agressor faz uso dessa fragilidade
e desse discurso para dominar sua ofendida, pois reconhece a sua vulnerabilidade e influência
na esfera psicológica e física da vítima. Isto posto, a dificuldade da mulher, especial, quando
se tem a presença de filhos, envolta pela preocupação com a conquista de sustento e
restabelecimento no mercado de trabalho, são entraves que colaboram para atravancar o
processo de desligamento daquela relação.
Contudo, quando inexiste a dependência econômica, porém é presente a dependência
afetiva, o agressor desencadeia a concepção de inferioridade à ofendida, expressando em
desfavor dela uma bateria de humilhações, que destroça sua autoestima (BALZ, 2015).
Em geral, o agressor faz uso de técnicas de negação de sua culpa, colocando em
indagação inclusive a sapiência da ofendida, ao promover deformação dos fatos, com
ocasionado uma indagação de si mesma, volvendo em seu proveito, com o ingresso da culpa
somente na mulher, sendo a única responsável pela construção de uma relação infeliz, esta,
que por outro lado, possui aflição da solidão, se sujeita a viver em um relacionamento
abusivo, sendo tal comportamento denominado de gaslighting (CARRETERO, 2017).
Isto posto, nota-se que o agressor, apresenta grande menosprezo pelos sentimentos,
pela integridade física e até pela vida da ofendida, com pleno domínio sobre ela, destacando
sempre a sua inferioridade. Nesse cenário, um dos casos que provocou grande repercussão
pública foi da advogada Tatiane Spitzner, no ano de 2018, na cidade de Guarapuava,
provocado supostamente pelo cônjuge, que teria a arremessado do sétimo andar de um prédio
residencial que moravam (CARVALHO, 2017).
No que concerne os registros das câmeras de segurança do local, o crime demonstra
uma bateria e sequencia de agressões, físicas e morais, que se sucederam no período anterior
da morte de Tatiane, e foram largamente propagadas no sistema jornalístico nacional, ficando
evidente que inexistiu tempo hábil que a vítima viesse se defender (BALZ, 2015).
Nesse cenário, é notório a vulnerabilidade da vítima perante o seu agressor, em que
pese a inexistência de qualquer possibilidade de defesa, em que pode-se observar algumas
condutas possivelmente cometidas pelo agressor que desencadeou o resultado trágico dessa
história, como discorre a investigação do Ministério Público, e noticiado no Tribuna do
Paraná.

Ademais dos relatos da violência no dia que ocorreu a fatalidade, como mostram os
vídeos, os promotores aludem que Manvailer teria executado todo tipo de violência
em desfavor da vítima. Desde do uso de palavras depreciativas, além de ser tratada
como escrava sexual e escrava doméstica, sendo que não podia usufruir do próprio
dinheiro, chegando ao ponto de ter suas roupas e pertencer pessoais deteriorados,
sendo ameaçada verbalmente em inúmeras situações.

Com base na realização de uma análise do caso concreto, constata-se que a violência
doméstica não é recorrente de um caso isolado ou súbito, mas sim em um conjunto de ações
sucessivas. O agressor busca conviver com uma ofendida com alguma fragilidade em relação
a ele, e o mesmo é mergulhado em uma personalidade dominante, com forte persuasão. A
violência psicológica, é a mais difícil de ser legitimada pela autoridade policial, visto que a
ofendida não impreterivelmente sofre um ataque físico, não sendo de logo constatado por
familiares e indivíduos próximos, e com isso, há uma delonga na tomada de providências
(BALZ, 2015).
Em 04 de abril de 2018, teve uma modificação no Código Penal Brasileiro que por
meio da lei 13.641/2018, apresentou a seção IV ao Capítulo II, Título IV da Lei Maria da
Penha, sendo elaborado o artigo 24-A, que caracterizou como delito o desrespeito das
medidas protetivas.
Desta forma, foi incorporado à Seção IV o seguinte texto:

Seção IV - Do Crime de Descumprimento de Medidas Protetivas de Urgência


Descumprimento de Medidas Protetivas de Urgência Art. 24-A. Descumprir decisão
judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei: Pena –
detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos. § 1º A configuração do crime independe
da competência civil ou criminal do juiz que deferiu as medidas. § 2º Na hipótese de
prisão em flagrante, apenas a autoridade judicial poderá conceder fiança. § 3º O
disposto neste artigo não exclui a aplicação de outras sanções cabíveis”.

Tal deliberação, realizada pelo Poder Legislativo, foi uma solução a tantos casos de
desrespeito das medidas protetivas, visto que o art. 313, III do Código de Processo Penal
dispõe acerca da exigência de prisão preventiva nessas situações. Sobreleva que tal decisão,
entretanto, não esquiva que outras metodologias sejam empregadas à custa da listagem
exemplificativa das medidas protetivas (CARVALHO, 2017).
Ao vasculhar o dispositivo legal, apura-se que a modificação é imprescindível ao que
defende o parágrafo primeiro, no qual descreve que a aspecto do delito acontece de maneira
independente do juízo que outorgou a medida, sendo da seara civil ou criminal (LOPES,
2020).
Outrossim, também verifica-se que “somente a autoridade judicial poderá consentir
fiança”, nas situações de prisão em flagrante, fato que anterior a respectiva mudança era
apanágio do delegado de polícia, exceto, no que concerne a deliberação de fiança para os
demais delitos, em que a pena apresenta-se inferior a quatro anos (SANTOS, 2018).
Antes da Lei 13.641/2018, indagava-se a probabilidade de desobediência das medidas
protetivas serem emolduradas por transgressão de desobediência, todavia o STJ interpretou
que tal medida é uma ação atípica em face das sanções já prognosticada na Lei Maria da
Penha, como exemplo abaixo:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ART. 330 DO CP.


DESOBEDIÊNCIA. DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA
PREVISTA NA LEI MARIA DA PENHA. CONDUTA ATÍPICA. EXISTÊNCIA
DE SANÇÕES ESPECÍFICAS NA NORMA DE REGÊNCIA. INSURGÊNCIA
DESPROVIDA. Decisão: Trata-se de recurso extraordinário interposto em face de
acórdão do Superior Tribunal de Justiça, assim ementado (eDOC 06, p. 71): PENAL
E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. CRIME DE DESOBEDIÊNCIA. DESCUMPRIMENTO
DE MEDIDAS PROTETIVAS IMPOSTAS. LEI 11.340/2006. ATIPICIDADE DA
CONDUTA. ABSOLVIÇÃO. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA NESTA
CORTE. ANÁLISE DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL. INVIABILIDADE.
AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. O descumprimento de medida
protetiva prevista na Lei Maria da Penha não se amolda ao crime de desobediência
(art. 330 do Código Penal - CP), considerando-se a existência de medidas próprias
da Lei n. 11.340/2006, além da cominação específica insertas no art. 313, inc. III, do
Código de Processo Penal - CPP. Jurisprudência consolidada. 2. Incabível o
enfrentamento de matéria constitucional, por esta Corte, mesmo para fins de
prequestionamento, sob pena de usurpação da competência do Supremo Tribunal
Federal – STF. Precedentes. 3. Agravo regimental desprovido. No recurso
extraordinário, interposto com base no art. 102, III, “a”, do permissivo
constitucional, aponta-se violação aos arts. 5º, XXXV, XXXIX, LIV e XLVI, e 226,
§ 8º, ambos da CF. Busca-se, em suma, reforma do acórdão para restabelecer o
acórdão condenatório do TJDFT, ao argumento de que a previsão de medidas civis e
processuais não exclui a tipicidade do crime de desobediência (art. 330, CP) para o
caso de descumprimento de medida protetiva de urgência imposta em favor de
vítima de violência doméstica. É o relatório. Decido. O STJ, à luz dos Códigos Penal
e Processual Penal, bem como da Lei 11.340/2006, absolveu o recorrido da prática
do crime de desobediência, por entender que a conduta praticada é atípica (eDOC
06, p. 47/48): “Por fim, melhor sorte socorre o recorrente em relação à tese relativa
ao crime de desobediência. Colhe-se dos autos que ele fora condenado à pena de 1
mês de detenção e 10 dias-multa por ter ido até a residência da vítima mesmo após
ter sido intimado da medida protetiva imposta que o proibia de se aproximar de
Elizabeth (proibição de contato pessoal). Tal entendimento encontra-se, no entanto,
em dissonância com a jurisprudência desta Corte, consolidada no sentido de que o
descumprimento de medida protetiva prevista na Lei Maria da Penha não se amolda
ao crime de desobediência previsto no Código Penal, considerando-se a existência
de medidas próprias da Lei n. 11.340/2006, além da cominação específica insertas
no art. 313, inc. III, do Código de Processo Penal. Trago à colação os seguintes
julgados: "PENAL.
HABEAS CORPUS. CRIME DE DESOBEDIÊNCIA. DESCUMPRIMENTO DE
MEDIDA PROTETIVA DE URGÊNCIA. ATIPICIDADE. DESCUMPRIMENTO
QUE ENSEJA OUTRAS MEDIDAS ESPECÍFICAS OU DECRETAÇÃO DE
PRISÃO PREVENTIVA. PRECEDENTES. RECURSO ORDINÁRIO EM
HABEAS CORPUS PROVIDO. Na linha da pacificada jurisprudência desta Corte,
não configura crime de desobediência o descumprimento de medida protetiva de
urgência, haja vista a previsão de imposição de outras medidas civis e
administrativas, bem como a possibilidade de decretação de prisão preventiva,
conforme o disposto no art. 313, inciso III, do Código de Processo Penal
(precedentes). Recurso ordinário em habeas corpus provido, para trancar a ação
penal instaurada contra o ora recorrente pelo crime de desobediência." (RHC
63.535/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, DJe 08/04/2016)
"PENAL. LEI MARIA DA PENHA. DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA
PROTETIVA DE URGÊNCIA. CRIME DE DESOBEDIÊNCIA. NÃO
CARACTERIZAÇÃO. PREVISÃO DE SANÇÕES ESPECÍFICAS NA LEI DE
REGÊNCIA. 1. Conforme entendimento pacificado nesta Corte de Justiça, o
descumprimento de medidas protetivas impostas com fulcro na Lei n. 11.340/2006
não caracteriza crime de desobediência, pois a Lei Maria da Penha prevê
consequências jurídicas específicas para o caso, ex vi dos seus arts. 20 e 22, §§ 3º e
4º, tais como a prisão preventiva, a imposição de multa, a requisição de força
policial, entre outras, sendo certo que não há ressalva expressa quanto à
possibilidade de cumulação das sanções de natureza civil/administrativa com as de
natureza penal. 2. Agravo regimental não provido."

Com base no entendimento pacificado descrito acima, verificou-se a necessidade de


tipificar o crime de descumprimento de medidas protetivas previstas na Lei 11.640/2006,
relacionada a incidência criminal. Contudo, nota-se que a pena para quem desobedecer uma
medida protetiva versa acerca da prisão em um período de três meses a dois anos, que,
considerando a natureza da pena será classificada com menor potencial ofensivo, em que o
agressor não poderá ser recluso em estabelecimento prisional, fato que dará precedentes para
a recorrência do crime (CARVALHO, 2017).
Outro ponto relevante, versa acerca da autoridade policial, ao verificar tal infração
deve garantir-se de que o transgressor, foi corretamente notificado sobre a decisão judicial
que dispõe da consolidação de medida protetiva em face da proteção da ofendida, caso revés,
não poderá ser representado como dolo (LOPES, 2020).
Logo, tem-se outro obstáculo que é a eficiência dos órgãos cooperantes da justiça, que
exige uma melhoria de organização material, para que o agressor não use de artifícios, como
por exemplo, a inexistência de conhecimento da decisão judicial, para postergar o seu
implemento (SANTOS, 2018).
Assim, mesmo reconhecendo que as medidas protetivas de urgência descritas pela lei
Maria da Penha representam um progresso das leis brasileiras ao salvaguardar e sustentar a
ofendida de violência doméstica, dentro de uma conjuntura histórica social em que a mulher,
não possuía condições ou suporte de onde recorrer por ser exposta a uma transgressão
(CARVALHO, 2017).
A lei pressagia, sem embargo, a retratação da ofendida, que em muitos casos,
relacionado a sua subordinação financeira e emocional do agressor, ou até mesmo por
intermédio de ameaças do opressor, busca pela autoridade policial para remover sua queixa.
Por outro lado, existem as vítimas que estendem suas denúncias, e conquistam o direito de
gozar das medidas de distanciamento do agressor, contudo o opressor a descumpre, com
retorno ao domicílio, laços familiares e sociais que o casal tem em comum, e fica fácil de
praticar novas violências, e em muitos casos, resulta na morte da ofendida (SANTOS, 2018).
Por outro lado, perante os casos de violência, que em sua maioria, acontecem no
âmbito do domicilio da vítima, o entrave para a produção de provas e a reunião de
testemunhas, que obscurece a decisão judicial. Sobressai que é notório um maior obstáculo
que se trata da violência moral ou psicológica (CARVALHO, 2017).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Você também pode gostar