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UNIDADE BÁSICA DAS BIOCIÊNCIAS

CURSO DE MEDICINA TURMA 5


TUTORIA UNIDADE III

SITUAÇÃO PROBLEMA 2: “BEM QUE O DOUTOR AVISOU”

Amanda Yumi Nishimura


Anna Mariah Ribeiro Oliveira
Daniela Neves Rezende
Fernanda Maria Alves da Silva
Gabriel Azambuja Silva Macedo
João Paulo Marcuzzo Moraes
Maria Virgínia Silva Santos
Maria Luiza Miranda Matos
Milena Trento Bonifácio
Rayelly Almeida Ventura

Tutor: Dra. Léa Cristina Gouveia


Relatora: Maria Luiza Miranda Matos

MINEIROS-GO
2020
OBJETIVO GERAL
Compreender os tipos de abdome agudo.

OJETIVOS ESPECÍFICOS:
01. Conceituar abdome agudo, correlacionando o diagnóstico com a propedêutica clínica do
abdome.
02. Diferenciar os aspectos clínicos e fisiopatológicos dos tipos de abdome agudo.
03. Caracterizar e exemplificar os tipos de abdome agudo não-traumatico (inflamatório,
obstrutivo, perfurativo, hemorrágico e vascular).
04. Identificar as principais causas de abdome agudo obstrutivo, caracterizando mecanismo
e as manifestações da obstipação intestinal.
05. Descrever os principais recursos diagnósticos disponíveis para diagnostico diferencial
dos tipos de abdome agudo com outros quadros abdominais.
06. Identificar as principais complicações de cada tipo de abdome agudo.
07. Diferenciar as condutas terapêuticas clínicas e cirúrgicas para os diversos tipos de
abdome agudo.
08. Descrever a epidemiologia, a formação e os fatores predisponentes ao desenvolvimento
dos cálculos biliares.
01. Conceituar abdome agudo, correlacionando o diagnóstico com a propedêutica
clínica do abdome.

Abdome agudo é definido como toda condição dolorosa de início súbito ou de


evolução progressiva, localizada no abdome, que requer decisão terapêutica rápida,
preferencialmente após definição diagnóstica. A cavidade abdominal comporta vários órgãos
de diferentes sistemas e a sintomatologia do abdome agudo pode decorrer de alguma doença
em qualquer uma de suas vísceras. Tamanha diversidade transforma o abdome em uma
autêntica “caixa de surpresas” (PORTO, 2014).

O médico, ao avaliar o paciente com abdome agudo, deve fazê-lo com interesse e
perspicácia. Frequentemente, o paciente está assustado e temeroso e, não raro, resiste às
tentativas iniciais de comunicação, uma vez que o seu interesse está centrado no rápido alívio
de seus sintomas. A anamnese é fundamental e o médico deve insistir, com calma, em uma
história minutada. O paciente deve ser examinado como um todo, e não apenas como um
abdome portador de uma afecção dolorosa. Ao avaliar o paciente, o médico precisa ter em
mente duas perguntas às quais deve tentar responder: “Qual é o diagnóstico etiológico?” “O
tratamento será clínico ou cirúrgico?” Uma atitude que pode facilitar o diagnóstico é tentar
enquadrar o paciente em uma das cinco síndromes abdominais agudas: perfurativa,
inflamatória, obstrutiva, vascular e hemorrágica. O avanço científico e tecnológico para
diagnóstico e terapêutica médica é assombroso; porém, o exame clínico meticuloso é de suma
importância e jamais será substituído pelos exames complementares, muito especialmente no
abdome agudo (PORTO, 2014).

A avaliação clínica do paciente com abdome agudo é de fundamental importância na


obtenção de dados que orientarão as medidas de suporte adequadas, o diagnóstico precoce e a
terapêutica eficaz. É desejável que o paciente seja avaliado pelo mesmo médico durante a
evolução inicial de sua afecção, visto que uma das principais causas de erro diagnóstico é o
rodízio de médicos nos serviços de urgência. Ao se conduzir a anamnese, deve-se ter o
cuidado de não induzir as respostas (primeiro ouvir, depois perguntar). Na abordagem inicial,
o médico deve dispensar algum tempo na identificação do paciente, pois essa conduta pode
encaminhar o raciocínio para determinadas doenças. Elementos como idade, sexo, raça,
profissão, naturalidade, procedência e condição social podem nos dar muitas informações. A
neoplasia do cólon e a doença diverticular, por exemplo, aumentam de frequência com a
idade, já a apendicite predomina na adolescência e no adulto jovem, sendo mais comum em
brancos que em negros. Gestação tubária e doença inflamatória pélvica (DIP) são específicas
do sexo feminino e a úlcera perfurada é bem mais frequente no sexo masculino. A cólica
saturnina é característica do profissional que trabalha com chumbo, e algumas doenças têm
distribuição geográfica própria como a doença de Chagas e a hidatidose. Condições precárias
de vida são responsáveis por altos índices de parasitoses, promiscuidade sexual e
criminalidade, fatores diretamente responsáveis pelos mais variados tipos de abdome agudo.
A avaliação da atitude e da fácies do paciente pode oferecer importantes informações: o
indivíduo com cólica encontra-se agitado, impaciente, contorcendo-se no leito; por outro
lado, os portadores de irritação peritoneal apresentam-se imóveis, assumindo posições
antálgicas, procurando proteger o abdome. Palidez cutânea e sudorese se relacionam com
hemorragia aguda, e rubor facial pode estar presente em indivíduos com síndrome
inflamatória (PORTO, 2014).

Dor abdominal

A dor representa o melhor elemento para caracterizar ou mesmo para tentar definir o
abdome agudo, fato que justifica o aforismo: não existe abdome agudo sem dor. Não
devemos nos esquecer, entretanto, de que a dor é uma sensação subjetiva, que depende da
consciência para sua interpretação e que é modulada por fatores educacionais, afetivos,
culturais, e até religiosos, bem como pelo próprio estado psíquico de cada indivíduo
(ansiedade, depressão). Para facilitar a avaliação da dor, Cope aconselha pensar
anatomicamente sempre que o conhecimento das relações estruturais dos órgãos representar
vantagem. Porém, não é suficiente conhecer somente a anatomia macroscópica abdominal,
precisamos compreender a inervação das estruturas e as vias de transmissão dos impulsos
dolorosos. Os nociceptores são terminações nervosas livres que têm a função de receber os
estímulos dolorosos que serão conduzidos pelas fibras nervosas até o cérebro, dando uma
informação de dano ou lesão com a finalidade de proteção e manutenção da integridade do
organismo (PORTO, 2014).

O peritônio visceral e os órgãos abdominais revestidos por ele são inervados por
fibras tipo C, não mielinizadas, que caminham pelo sistema nervoso autônomo a uma
velocidade de 0,5 a 2,0 m/s. Essas fibras são sensíveis a distensão, isquemia, tração,
compressão e torção e conduzem uma dor difusa, de início lento e duração longa, com um
componente emocional marcante e capaz de produzir manifestações sistêmicas, tais como
náuseas, sudorese, diminuição da pressão arterial e da frequência cardíaca. Esta dor é
percebida na projeção da linha mediana e recebe o nome de dor visceral. O peritônio parietal
e a raiz do mesentério apresentam maior quantidade de nociceptores e são inervados por
fibras tipo A delta, mielinizadas, que conduzem o estímulo doloroso a uma velocidade de 12
a 30 m/s (via da dor rápida-aguda). Essas terminações nervosas são estimuladas por diversos
agentes irritantes (conteúdo gastrintestinal, urina, bile, suco pancreático, sangue, pus) e por
substâncias (bradicinina, serotonina, histamina, prostaglandina e enzimas proteolíticas) e
conduzem a uma dor aguda, bem localizada, de curta duração e com componente emocional
fraco. Essa dor piora com movimento de tosse e pode acarretar contratura muscular, que é
reflexa à inervação comum do peritônio parietal e da musculatura abdominal. Essa dor recebe
o nome de dor somática; seu exemplo clássico é a evolução da apendicite aguda, que se inicia
com uma dor difusa pelo abdome e evolui para uma dor localizada no ponto de McBurney,
isso quando o processo inflamatório atinge o peritônio parietal (PORTO, 2014).

A dor referida é percebida em local diferente do estímulo que a gerou. Dessa forma,
um estímulo gerado em um nociceptor da serosa abdominal pode provocar contratura reflexa
da musculatura do dermátomo correspondente, que apresenta inervação comum, ou uma
mesma origem embrionária. Um exemplo clássico é a dor referida no ombro resultante de
processos patológicos que afetam o diafragma ou a vesícula (PORTO, 2014).

Náuseas e vômito

São sintomas equivalentes e muito comuns no abdome agudo de várias etiologias. As


náuseas geralmente precedem o vômito, e é o seu equivalente. As principais causas para o
aparecimento desses sintomas são: obstrução dos órgãos de musculatura lisa, irritação intensa
dos nervos do peritônio e a toxemia. Durante a anamnese, é importante verificar a frequência
dos vômitos, sua relação com o início da dor e o aspecto do material vomitado. Na apendicite
e na colecistite agudas típicas, o vômito surge após o início da dor. Na pancreatite aguda, o
vômito é frequente, intenso e persistente, surgindo com o início da dor. Na obstrução aguda
do ureter e do colédoco, o vômito surge simultaneamente à dor e também é frequente. Na
obstrução intestinal, ele está presente e será tão mais tardio quanto mais distal for o local da
obstrução (PORTO, 2014).

Febre

Uma temperatura axilar superior a 37,5°C pode estar presente em quase todos os
quadros abdominais agudos; porém, a ausência de febre não descarta o diagnóstico de
abdome agudo, principalmente em idosos e imunocomprometidos. O relato de calafrio pode
significar bacteriemia, achado comum nos quadros de colangite e de peritonite. A elevação da
temperatura retal não é específica de nenhuma doença, podendo ocorrer em qualquer
processo inflamatório localizado na pelve (PORTO, 2014).

Anorexia

O relato de anorexia precedendo o início da dor é comum em quadros de abdome

agudo inflamatório. Todavia, anorexia precedendo o início do quadro em dias ou


meses sugere doença maligna (PORTO,2014)

Função intestinal

Durante a anamnese, é importante interrogar sobre a presença de constipação


intestinal, diarréia, melena e enterorragia. Um longo período de constipação intestinal é
achado frequente na obstrução por fecaloma ou vólvulo do sigmoide. A constipação intestinal
com parada completa da eliminação de gases e fezes associada à dor abdominal em cólica e
vômito caracteriza a tríade da obstrução intestinal. No entanto, não podemos esquecer que
mesmo o paciente com obstrução total poderá eliminar o conteúdo fecal distal à oclusão e, até
mesmo, apresentar diarréia, como em alguns casos de pinçamento intestinal. A diarréia e
frequente em vários tipos de abdome agudo inflamatório, como: apendicite (principalmente
em crianças), abscessos paracecais e DIP. Eliminação de sangue, misturado ou não nas fezes,
pode estar presente e em quadros de invaginação intestinal (crianças) e na neoplasia de cólon
(PORTO, 2014).

Ciclo menstrual

Nas mulheres em fase reprodutiva, especialmente naquelas com vida sexual ativa, a
dor abdominal deve ser correlacionada com o ciclo menstrual. Devemos interrogar sobre
irregularidades nos três últimos ciclos, data da última menstruação, presença de dispareunia,
características do corrimento vaginal, contato sexual e sangramentos, diferenciando se o
sangue é coagulável, ou não. Várias doenças, como gravidez ectópica, ovulação dolorosa,
endometriose e as anexites agudas, frequentemente são causa de abdome agudo. A peri-
hepatite gonocócica (síndrome de Fitz-Hugh-Curtis) pode confundir o raciocínio médico,
mimetizando um quadro de colecistite aguda (PORTO, 2014).

Micção

Durante a anamnese, é importante investigar a presença de transtorno da micção,


como algúria, disúria, polaciúria e retenção urinária, bem como alteração no aspecto da urina.
Várias afecções primitivas dos órgãos urogenitais, entre elas, cólica nefrética, pielonefrite
aguda, cistite e retenção urinária aguda, podem ser causa de abdome agudo. Não podemos
nos esquecer de que esses mesmos sintomas podem, também, estar presentes em outras
doenças inflamatórias que acometem a pelve, por exemplo: apendicite aguda, diverticulite
sigmoideana e as anexites (PORTO, 2014).

02. Diferenciar os aspectos clínicos e fisiopatológicos dos tipos de abdome agudo.


Várias são as afecções que podem em determinado momento, manifestar-se como
abdome agudo, porém essa síndrome exibe um quadro clínico característico apesar das
diferentes etiologias. De um modo geral, os sintomas permitem o diagnóstico da síndrome de
abdome agudo e também fator causal (RASSLAN; SAAD JR, 2006).
Em função da sua etiopatologia, classifica-se o abdome agudo em cinco grupos:
inflamatório, perfurativo, obstrutivo, circulatório ou vascular e hemorrágico, cada um deles
com suas particularidades clínicas e terapêuticas (RASSLAN; SAAD JR, 2006).
A dor, náuseas e/ou vômitos, parada de eliminação de gases e fezes são referidos em
diferentes situações. É possível, pela análise dos principais sintomas, caracterizar o
diagnóstico sindrômico na grande maioria dos casos. Algumas dificuldades surgem quando as
doenças se apresentam de forma atípica ou nas situações em que o tempo de evolução é
longo. Em doentes idosos, desnutridos, imunodeprimidos, transplantados, na vigência de
antibioticoterapia, quimioterapia ou corticoterapia, as manifestações clínicas nem sempre são
clássicas, exigindo argúcia e experiência para o diagnóstico correto (RASSLAN; SAAD JR,
2006).
Quanto ao exame físico, apenas em relação à inspecção alguns achados podem
contribuir para o diagnóstico. O aumento do volume do abdome pode ser secundário à
distensão de alças intestinais ou líquido intracavitário. Abaulamentos localizados sugerem
coleções ou abcessos. A presença de cicatriz operatória pode ser relacionada com obstrução
intestinal por bridas ou aderências. Da mesma forma, equimoses ou sufusões hemorrágicas
periumbilicais ou em regiões da parede abdominal lembram a possibilidade de sangramento
intracavitário (RASSLAN; SAAD JR, 2006).
De todos os quadros abdominais agudos, o inflamatório ou infeccioso é o mais
comum. Os quadros infecciosos podem ser primários ou secundários, manifestando-se de
forma localizada ou generalizada. As infecções primárias são aquelas cuja fonte de infecção
nem sempre é perfeitamente identificada, não havendo evidência de sua origem no abdome,
estando geralmente associada à infecção das vias aéreas superiores ou do pulmão.
Representam menos que 1% das peritonites, acometendo principalmente as crianças. A
infecção ocorre, provavelmente, por via hematogênica, sendo a flora quase sempre
monomicrobiana geralmente pneumococos e estreptococos hemolíticos, e ocorrem
ocasionalmente em adultos, particularmente com infecção pulmonar e em hepatopatias que se
apresentam com abdome agudo por ascite infectada. Além dos cirróticos, os nefróticos e
portadores de colagenoses constituem grupos de doentes também suscetíveis a esse tipo de
infecção (RASSLAN; SAAD JR, 2006).
As peritonites secundárias são decorrentes de lesões do trato genital, urinário e,
principalmente, do tubo digestivo, devidas à necrose, à infecção, a trauma ou à perfuração de
vísceras, podendo ser classificadas em sépticas ou assépticas (peritonite química). Na
asséptica, a irritação peritoneal na fase inicial é de natureza química, provocada pelas
enzimas digestivas. O sangue, que pode ocasional uma peritonite química, não é tão irritante
como a bile e o suco gástrico, o que é facilmente comprovado pelas diferenças clínicas na
palpação do abdome. A peritonite química com o passar das horas, apresenta contaminação
secundária, transformando-se em peritonite bacteriana (RASSLAN; SAAD JR, 2006).
A dor é o sintoma-guia, e sua caracterização - início, localização, irradiação,
disseminação e evolução - faz-se necessária. O agravamento da dor, com a movimentação e
as incursões respiratórias, é quase constante na peritonite. Nos processos localizados está
intimamente relacionada com a topografia do órgão comprometido (RASSLAN; SAAD JR,
2006).
A febre é outro dado importante. Nos abscessos evolui em picos elevados diários,
caracterizando a chamada febre tipo supurativa. No entanto, pode ser contínua, baixa e até
inexistente nos doentes desnutridos, em condições gerais precárias ou na vigência da
antibioticoterapia. Náuseas, vômitos e soluços com frequência acompanham o quadro
infeccioso e são reflexos ou secundários ao processo irritativo da víscera inflamada
(RASSLAN; SAAD JR, 2006).
O exame físico fornece elementos para o diagnóstico de infecção intraperitoneal. O
estado geral do doente varia em função de uma série de fatores e, basicamente, depende da
gravidade da infecção. Assim, podemos encontrar doentes em condições regulares e até nas
mais críticas situações. A febre, taquicardia e taquipneia evidenciam a infecção (RASSLAN;
SAAD JR, 2006).
A palpação do abdômen sugere infecção pela presença dos sinais de irritação
peritoneal, traduzidos por defesa localizada ou generalizada e pela dor à descompressão. A
maior reação peritoneal é geralmente observada na topografia do órgão originalmente
afetado. Na peritonite generalizada, a dor é difusa, e o abdômen pode apresentar-se com
defesa ou contratura, sensível à palpação superficial e profunda. Com a evolução do processo
e pelo íleo funcional, a distensão intestinal determina certo relaxamento da parede abdominal,
persistindo, no entanto, dor difusa à palpação (RASSLAN; SAAD JR, 2006).
O abdômen agudo perfurativo é secundário à perfuração por processos de natureza
traumática, inflamatória ou neoplásica do trato gastrointestinal ou, então decorrente da
ingestão de corpos estranhos. As manifestações estão na dependência do local e do tempo de
evolução da perfuração. Algumas vezes a sintomatologia não é tão exuberante, ou é então
mascarada por sintomas decorrentes de afecções associadas, levando a um retardo
diagnóstico, fato particularmente observado em doentes idosos. As perfurações podem
apresentar-se de forma bloqueada, com a dor e os sinais peritoneais localizados,
correspondentes à topografia da víscera comprometida. A dor é de início súbito, com difusão
precoce para todo o abdômen, piorando com a movimentação e incursões respiratórias. A dor
geralmente é em facada, lancinante, persistente, de forte intensidade, obrigando o doente a
procurar atendimento imediato. Com frequência, existe referência de dor no ombro,
traduzindo irritação do nervo frênico pela presença de gás na cavidade (RASSLAN; SAAD
JR, 2006).
O exame físico revela doente com fácies de sofre· dor, sudorese fria e respiração tipo
costal. Na perfuração sem bloqueio a palpação abdominal revela contratura generalizada,
caracterizando o abdome em tábua. A ausência de maciez à percussão é sugestiva de
pneumoperitônio (RASSLAN; SAAD JR, 2006).
Dados Clínicos no Abdômen Agudo Perfurativo
1. O intervalo de tempo entre o início dos sintomas e a procura de
atendimento é geralmente curto.
2. Dor de início súbito de forte intensidade, com difusão precoce para
todo o abdome.
3. Pode apresentar sinais de infecção.
4. Hipotensão pode estar presente.
5. Palpação abdominal com sinais evidentes de peritonite. Abdome em
tábua.
6. Percussão com ausência de macicez hepática.
7. Radiografia de abdome com pneumoperitônio.
No abdômen agudo obstrutivo, vários aspectos são fundamentais na avaliação
clínica. O primeiro deles é se a obstrução é mecânica ou paralítica. Na mecânica existe uma
causa orgânica levando à obliteração total ou parcial da luz, e na paralítica, o distúrbio é de
ordem funcional, estando na dependência de fatores locais ou sistêmicos. No presente
capítulo a discussão fica limitada à obstrução de causa mecânica, que pode ser dividida, do
ponto de vista clínico, em alta ou baixa. Na obstrução alta, o processo está localizado ao nível
do intestino proximal (jejuno), enquanto a baixa compromete as porções mais inferiores do
tubo digestivo (íleo terminal, cólon e reto) (RASSLAN; SAAD JR, 2006).
Os sintomas são representados por dor abdominal, geralmente em cólica, com parada
de eliminação de gases e fezes, náuseas e vômitos, associados à distensão intestinal. Na
obstrução alta não é observada distensão e os vômitos são precoces e frequentes, enquanto, na
oclusão baixa, não ocorrem ou são mais tardios, podendo, no entanto, por causa reflexa,
surgir na fase inicial da doença (RASSLAN; SAAD JR, 2006).
Com a evolução, as cólicas vão se intensificando, diminuindo os períodos de acalmia
surgindo distensão abdominal mais acentuada e vômitos com característica fecalóide. No
exame físico, os elementos mais importantes para o diagnóstico são a presença de distensão
abdominal, percussão com timpanismo acentuado e ausculta com ruídos hidroaéreos
aumentados. Em certas ocasiões, é possível a visualização de movimentos peristálticos,
traduzindo a luta intestinal na tentativa de vencer o obstáculo (RASSLAN; SAAD JR, 2006).
É fundamental caracterizar a existência de comprometimento vascular do intestino
obstruído. A presença de febre, taquicardia, sinais de irritação peritoneal e leucocitose indica
sofrimento intestinal (RASSLAN; SAAD JR, 2006).
Dados clínicos no Abdômen Agudo Obstrutivo
1. O intervalo entre o início dos sintomas e a procura de atendimento é
variável.
2. Dores em cólica.
3. Náuseas/vômitos.
4. Parada de eliminação de gases e fezes.
5. Distensão abdominal.
6. Eventualmente peristaltismo visível.
7. Palpação flácida, mas dolorosa difusamente.
8. Sinais de peritonite = sofrimento de alça.
9. Ruídos hidroaéreos aumentados.
10. Radiografia com aspectos característicos.
O abdômen agudo vascular é uma das mais dramáticas situações que o cirurgião
enfrenta na urgência, traduzindo uma verdadeira catástrofe abdominal, com evolução rápida e
frequentemente fulminante. A dor inicial é súbita, secundária ao espasmo intestinal, com
características de cólica, difusa por todo o abdômen, tomando-se posteriormente contínua,
sendo a manifestação principal e presente na totalidade dos casos. O exame do abdômen após
o início da dor não mostra os sinais evidentes de irritação peritoneal. Mas a observação do
doente já mostra o comprometimento do seu estado geral com fácies de sofredor, sudorese,
palidez cutânea, e constatamos, frequentemente, hipotensão ou choque (RASSLAN; SAAD
JR, 2006).
À medida que o sofrimento intestinal vai-se acentuando, surge a distensão
acompanhada de sequestração de líquidos na área esplâncnica, na luz das alças dilatadas,
seguindo-se hipovolemia e hemoconcentração. O colapso circulatório logo se instala,
superajuntando a sepse pela necrose intestinal extensa. O exame clínico revela agora um
doente em precárias condições gerais e a peritonite já instalada. Anemia aguda pode ser
verificada quando ocorre necrose total com sangramento para a luz intestinal e cavidade
peritoneal. Embora esse cortejo sintomático ocorra em poucas horas, muitas vezes pode ser
mais prolongado o intervalo entre o início da dor e a chegada a essa condição (RASSLAN;
SAAD JR, 2006).
Em função do fator etiopatogênico do infarto intestinal, decorrem as manifestações
clínicas. Enquanto na embolia de artéria mesentérica superior a dor é súbita, na trombose
pode ter um início não tão "violento". Quando o infarto é secundário à doença vascular não-
oclusiva, os sintomas dolorosos abdominais podem durar alguns dias. Um outro aspecto a ser
realçado é a diferença entre as tromboses arterial e venosa. Enquanto naquela os sintomas são
mais exuberantes, na trombose venosa o quadro é, de início, lento, insidioso, progressivo,
evoluindo como suboclusão até deflagrar a necrose intestinal. Podem surgir ainda vômitos e
diarreia acompanhando o episódio agudo (RASSLAN; SAAD JR, 2006).
Dados clínicos do Abdômen Agudo Vascular
1. Intervalo de tempo entre o início dos sintomas e a procura de
atendimento é geralmente curto.
2. Dor de início súbito com aumento progressivo de intensidade.
3. Tendência à hipotensão ou choque.
4. Sinais de irritação peritoneal.
5. Ausência de ruídos hidroaéreos.
A dor é de início súbito, sendo muito curto o intervalo de tempo decorrido entre o
começo dos sintomas e a chegada do doente ao serviço de emergência. Por vezes, quando a
hemorragia é de pequeno volume, as manifestações podem não ser intensas, fazendo o doente
procurar atendimento mais tardiamente (RASSLAN; SAAD JR, 2006).
No abdome agudo hemorrágico predominam os sintomas da hipovolemia,
traduzidos por hipotensão postural (lipotimia) e sudorese fria. No exame físico o doente
apresenta-se com palidez cutaneomucosa, extremidades frias, taquicardíaco, pulso fino,
hipotensão ou em choque. No exame físico, o abdome apresenta-se flácido, mais doloroso
difusamente à palpação com sinais de irritação peritoneal com dor à descompressão subida
(sinal de Blumberg), mas sem defesa ou contratura. A dor piora com a mobilização ou
mudança de decúbito. Nos casos de grande sangramento existe aumento de volume do
abdome com sinais de líquido intracavitário (macicez móvel). Nos de evolução mais longa,
ocorre distensão abdominal por íleo paralítico (RASSLAN; SAAD JR, 2006).
Pode haver também referência de dor no ombro por irritação do nervo frênico pela
presença do sangue. Embora raros e tardios são descritos alguns sinais como equimoses ou
sufusões hemorrágicas periumbilicais que sugerem sangramento intracavitário. Na mulher, o
exame ginecológico é intensamente doloroso, revelando abaulamento do fundo-de-saco
posterior, pelo acúmulo de sangue. Quando a hemorragia intraperitoneal não é tão intensa
(sangramento pequeno progressivo), o doente pode apresentar-se com alguns dias de
evolução, queixando-se apenas de dor abdominal de graça intensidade e tonturas ou lipotimia.
Não existem alterações circulatórias acentuadas, mas as queixas associadas à anemia e
taquicardia orientam o diagnóstico de hemoperitônio (RASSLAN; SAAD JR, 2006).

03. Caracterizar e exemplificar os tipos de abdome agudo não-traumatico


(inflamatório, obstrutivo, perfurativo, hemorrágico e vascular).
A expressão abdome agudo refere-se a sinais e sintomas de dor e sensibilidade
abdominal, uma manifestação clínica que, em geral, requer terapia cirúrgica de emergência.
Esse cenário clínico desafiador requer uma avaliação completa e rápida para determinar se há
necessidade de intervenção cirúrgica e para dar início à terapia adequada. Muitas doenças,
algumas das quais não são cirúrgicas ou mesmo intra-abdominais, podem produzir dor
abdominal aguda. Portanto, todo esforço deve ser feito para ter o diagnóstico correto a fim de
que a terapia escolhida, em geral por laparoscopia ou laparotomia, seja apropriada
(BRUNETTI, 2007).
ABDOME AGUDO INFLAMATÓRIO
Definição:
O abdome agudo inflamatório pode ser definido como quadro de dor abdominal
súbito e inesperado, originado de um processo inflamatório e/ou infeccioso localizado na
cavidade abdominal. Em algumas situações, o quadro apresenta-se com peritonite,
sendomandatório o manejo cirúrgico nesses casos (BRUNETTI, 2007).
Epidemiologia:
Dor abdominal é uma apresentação comum no departamento de emergência,
representando 6,5% de todas as idas à emergência (BRUNETTI, 2007).
A apendicite aguda é a causa mais comum de abdome agudo inflamatório cirúrgico e
pode cursar com peritonite secundária, representando uma incidência de 48,1/100 mil
habitantes → seu pico de incidência ocorre em pacientes entre 10 e 20 anos de idade, sendo
mais incidente no sexo masculino (BRUNETTI, 2007).
A colecistite aguda acomete preferencialmente no sexo feminino, adultos jovens e
idosos, sendo comumente manifestação inicial da colelitíase, que é a causa subjacente em
90% dos casos (BRUNETTI, 2007).
A pancreatite aguda, em 80% dos casos, correlaciona-se com colelitíase e uso de
álcool, sendo a primeira a causa mais prevalente seguida da segunda. Comumente, quando
relacionada ao álcool, reflete uma agudização de uma pancreatite crônica (BRUNETTI,
2007).
A diverticulite aguda é comumente encontrada em 4% dos indivíduos portadores de
doença diverticular dos cólons, sendo mais comum naqueles maiores de 50 anos. 85% dos
casos trata-se de quadros não complicados por abscesso, obstrução intestinal etc
(BRUNETTI, 2007).
Clínica:
- A dor abdominal é o sintoma preponderante no AAI, podendo ser decorrente de um
processo recente, como na apendicite aguda, ou crônico agudizado tal qual nos casos de
colecistite aguda por litíase biliar ou diverticulite por doença diverticular do cólon
(BRUNETTI, 2007).
- A dor costuma ser progressiva nos casos de apendicite, colecistite aguda, pancreatite
aguda e diverticulite (BRUNETTI, 2007).
- Quando a dor evolui com piora progressiva uma conduta cirúrgica é necessária na
maioria das vezes (BRUNETTI, 2007).
- A dor exacerbada com a movimentação é comumente vista no AAI, e habitualmente
indica peritonite (BRUNETTI, 2007).
- Náuseas e vômitos podem ocorrer na evolução do AAI, podendo ser resultado do
quadro álgico intenso ou até mesmo de estase intestinal secundária à irritação do peritônio
visceral (BRUNETTI, 2007).
- A febre é um sintoma comumente observado, podendo surgir já nas fases iniciais do
processo, com temperaturas mais brandas, piorando com a evolução do quadro, sobretudo
quando há processo supurativo instalado (BRUNETTI, 2007).
- Obstipação comumente ocorre no AAI secundária à paralisia das alças intestinais.
Entretanto, diarreia pode estar presente, sobretudo em casos de abscessos pélvicos
(BRUNETTI, 2007).
- Disúria pode ocorrer nos casos de apendicite (BRUNETTI, 2007).
Principais causas: Apendicite, colecistite aguda, pancreatite aguda, diverticulite,
doença inflamatória pélvica, abscessos intra-abdominais, divertículo de Meckel, abscesso
hepático, abscesso diverticular, abscesso do psoas (BRUNETTI, 2007).
ABDOME AGUDO PERFURATIVO
Definição:
Síndrome clínica caracterizada por dor abdominal, não traumática, de início súbito,
devido aperfuração de víscera oca (BRUNETTI, 2007).
Clínica:
Depende do local e tempo de perfuração, tipo de secreção extravasada e condições
clínicas prévias. De um modo geral, temos:
✓ Intervalo curto entre o início da dor e a chegada a emergência.
✓ Dor súbita, de forte intensidade, com difusão rápida para todo o abdome
✓ Dor indolente pode ocorrer nos casos de abcesso e fístula.
✓ Sinais de sepse, hipotensão ou choque são comuns.
✓ Desconforto respiratório: o acumulo de gás pode comprometer a musculatura
diafragmática (BRUNETTI, 2007).
A dor pode ser lombar, nos casos de perfurações retroperitoneais, ou irradiarem para
os ombros nos casos de perfuração em abdome superior que irritam o diafragma.No exame
físico averiguamos:
✓ Sinais de peritonite
✓ Pode ser focal nos casos de perfuração contida
✓ “Abdome em tábua”: devido contractura involuntária generalizada da parede
abdominal por peritonite difusa
✓ Distensão abdominal
✓ Ausência de macicez hepática: Sinal de Jobert
✓ Ausência de ruídos hidroaéreos (BRUNETTI, 2007).
Principais causas: Úlcera gastrointestinal perfurada, câncer gastrointestinal perfurado,
Síndrome de Boerhaave, divertículo perfurado (BRUNETTI, 2007).
ABDOME AGUDO OBSTRUTIVO
Definição:
É uma situação de emergência, na qual se encontra um fator obstrutivo responsável
pelo exuberante quadro clínico. Apresenta gravidade variável e caráter evolutivo
necessitando de rápida intervenção, em sua maioria, cirúrgica. As causas de AAO podem ser
divididas em mecânicas e funcionais, originadas no intestino delgado ou grosso:
- Mecânicas: Aderências, bridas, hérnias, volvo, intussuscepções.
- Funcionais: Íleo paralítico (BRUNETTI, 2007).
Clínica:
O quadro clínico é variável e depende de alguns fatores: Sítio e tempo da obstrução;
Presença ou não de complicações (sofrimento vascular, perfuração); Grau de contaminação;
Status clínico do paciente (BRUNETTI, 2007).
Habitualmente os pacientes com AAO apresentam dor abdominal de início súbito,
evoluindo com náuseas, vômitos e parada de eliminação de gazes e fezes. De forma didática,
podem-se dividir os sinais e sintomas de acordo com o sítio da obstrução:
Obstrução intestinal alta (Intestino delgado):
– Dor abdominal em cólica, habitualmente de localização periumbilical, sugerindo
origem proximal.
– Vômitos precoces sugerem obstrução proximal do intestino delgado → Obstruções
mais distais podem cursar com vômitos mais tardiamente.
– Distensão abdominal ocorre mais frequentemente nos segmentos distais → No
intestino delgado proximal ocorre pouca ou nenhuma dilatação.
– A parada de eliminação de fezes e gases é um sinal que ocorre tardiamente durante a
evolução da obstrução, uma vez que o conteúdo colônico é esvaziado normalmente nas fases
iniciais.
– Os ruídos hidroaéreos (RHA) podem estar aumentados inicialmente na tentativa de
vencer o fator obstrutivo (“peristalse de luta”) → Apresentam aumento do timbre (“som
metálico”) e gradualmente podem desaparecer devido à fadiga da musculatura lisa.
– Dor constante, de início súbito e com aumento da intensidade pode sugerir
comprometimento vascular.
– Íleo paralítico, em contraste com obstrução mecânica, é uma condição indolor.
Obstrução intestinal baixa (transição ileocecal e intestino grosso):
– Na obstrução do cólon, normalmente há parada de eliminação de fezes e flatos
precocemente associada à distensão abdominal importante.
– Náuseas e vômitos são sintomas tardios na obstrução intestinal baixa. Quando
presentes costumam apresentar aspecto “fecaloide”.
– A dor não é sintoma predominante → Habitualmente localiza-se no abdome inferior
quando presente.
– A dilatação severa dos segmentos intestinais pode levar a comprometimento
vascular com isquemia, necrose e perfuração.
Ao exame físico, além dos sinais e sintomas descritos anteriormente, o paciente pode
apresentar sinais de desidratação ou choque hipovolêmico.
✓ A distensão abdominal comumente encontra-se disposta centralmente na
obstrução do intestino delgado, e em flancos ou em abdome superior nas
obstruções baixas (“em moldura”).
✓ A presença de sensibilidade/reatividade à palpação abdominal pode sugerir
peritonite secundária ao estrangulamento de alças.
✓ A presença de massas abdominais sugere processo inflamatório ou neoplásico
(BRUNETTI, 2007).
ABDOME AGUDO ISQUÊMICO
Definição:
Síndrome clínica caracterizada por dor abdominal, não traumática, de início súbito ou
intermitente, de intensidade variável, representado pela isquemia mesentérica ou intestinal
resultante de um fornecimento inadequado de oxigênio para o intestino, que necessita de
intervenção médica imediata por ser potencialmente fatal (BRUNETTI, 2007).
Patologia mais comum em idosos, associado a aterosclerose. A isquemia mesentérica
crônica é mais comum em mulheres. A rapidez do diagnóstico está intrinsecamente ligada ao
sucesso do tratamento e prognóstico. A taxa de mortalidade é elevada, com cerca de 30% nos
casos de trombose e 75-80% nos casos de obstrução arterial atribuído ao diagnóstico tardio
(BRUNETTI, 2007).
Clínica:
As formas de apresentação e gravidade dependem do leito acometido (arterial ou
venoso), grau de obstrução, duração, presença de colaterais e a extensão de vísceras
acometidas. Pode variar desde um quadro súbito (infartos) a quadros de angina abdominal
crônica. Náuseas, vômitos, diarreia e constipação são sintomas variáveis. Sangramentos
podem ocorrem na isquemia mesentérica crônica e na isquemia colônica. Principal
característica: dor abdominal referida é desproporcional ao exame físico (BRUNETTI, 2007).
A tríade da isquemia mesentérica crônica consiste em: Dor abdominal pós-prandial,
aversão a comida e perda de peso (BRUNETTI, 2007).
A dor abdominal é bastante variável:
• Início: súbito, indicativo de êmbolos ou trombos em território arterial, ou insidioso
nos casos de trombose da VMS.
• Intensidade: branda, indicativo de isquemia mesentérica não oclusiva, ou intensa,
indicativo de êmbolos ou trombos.
• Localização: localizada ou difusa.
Exame físico:
• Inicialmente o abdome pode estar normal, com dor leve a moderada.
• Peristalse normal ou aumentada inicialmente - a primeira reação à hipóxia é o
peristaltismo.
• Com a progressão da isquemia, temos: distensão abdominal, timpanismo aumentado
e diminuição dos ruídos hidroaéreos
• Fezes sanguinolentas se necrose
• Sinais de choque e peritonite generalizada são achados tardios e indicam mau
prognóstico (BRUNETTI, 2007).
ABDOME AGUDO HEMORRÁGICO
Definição:
A hemorragia intra-abdominal espontânea é rara. Está presente em aproximadamente
2% dos pacientes adultos que procuram os serviços de emergência com dor abdominal.
Apesar de rara, pode ser fatal, com taxas de mortalidade que chegam a 40% nos pacientes
não-operados e de 100% nos operados sem identificação do foco hemorrágico (BRUNETTI,
2007).
Clínica:
O quadro hemodinâmico do AAHE reflete a perda aguda de sangue. Em sua forma
mais exuberante, traduz-se pelo choque hemorrágico, definido pela perfusão tecidual
deficiente. Entretanto, os sinais e sintomas variam conforme o volume perdido e a velocidade
da perda sanguínea e as condições físicas do paciente (BRUNETTI, 2007).
Quando o sangramento persiste, as manifestações clínicas ficam progressivamente
mais evidentes. Hipotensão arterial, intensa taquicardia, redução da amplitude do pulso
periférico, palidez, taquipnéia, redução do débito urinário e agitação são achados
característicos dessa condição (BRUNETTI, 2007).
Na hemorragia intra-abdominal, súbita, maciça e contínua, o paciente apresenta-se
letárgico ou comatoso, com pele pálida e lívida, de aspecto céreo. O pulso é rápido, fino, às
vezes só perceptível ao nível das artérias femorais ou carótidas. A respiração se apresenta
superficial, irregular, às vezes mesmo entrecortada, indicando grave deterioração do estado
neurológico. A pressão arterial é inaudível (BRUNETTI, 2007).
Principais causas: Trauma de órgãos sólidos, vazamento ou ruptura de aneurisma
arterial gravidez ectópica rompida, divertículo gastrointestinal com sangramento,
malformação arteriovenosa do trato gastrointestinal, ulceração intestinal, fístula
aortoduodenal após o enxerto vascular aórtico, pancreatite hemorrágica, Síndrome de
Mallory-Weiss e ruptura espontânea do baço (BRUNETTI, 2007).

04. Identificar as principais causas de abdome agudo obstrutivo, caracterizando


mecanismo e as manifestações da obstipação intestinal.
De acordo com Dani (2018), a principal causa de obstrução intestinal no adulto são as
bridas e aderências, sendo também a principal causa de obstrução mecânica do delgado (75%
dos casos), e a laparotomia constitui a maior causa de formação das aderências peritoneais.
As hérnias parietais vêm em seguida como causadoras de obstrução intestinal. O tratamento
da hérnia é sempre cirúrgico, assim como nos casos de obstrução completa por bridas e nas
obstruções parciais recorrentes, tomando-se os devidos cuidados para evitar formação de
novas aderências, o que, muitas vezes, não será conseguido.
O câncer colorretal é a causa mais comum de obstrução colônica no adulto, seguida de
diverticulite complicada e vólvulo. Nos casos de vólvulo, o tratamento pode ser clínico, com
descompressão por meio de colonoscopia. As operações colorretais têm mais probabilidade
de desenvolver aderências múltiplas, que apresentam abordagem cirúrgica mais complicada,
e maior recorrência da obstrução intestinal (DANI, 2018).
Nos pacientes com passado de cirurgia oncológica abdominal, mesmo naqueles sem
evidências claras de metástases à época da cirurgia, deve-se pensar na possibilidade de
recidiva tumoral ou de carcinomatose peritoneal, como causa da obstrução. Naqueles
pacientes submetidos a radioterapia, considerar a presença de aderências e estenoses por
fibrose de origem actínica causando o quadro obstrutivo (DANI, 2018).
Nos pacientes com doença inflamatória intestinal, especialmente na doença de Crohn,
deve-se diferenciar o quadro obstrutivo por componente inflamatório, reversível na maioria
das vezes com a medicação específica, daquele quadro obstrutivo que exige tratamento
cirúrgico mais precoce, com impacto na morbidade e sobrevida (DANI, 2018).
Foram descritos alguns casos de impactação de cápsula endoscópica, provocando
obstrução intestinal, especialmente em áreas de suboclusões não conhecidas previamente à
realização do exame, mas os fabricantes da cápsula já desenvolveram uma tecnologia que
permite a desintegração dela após 100 h de impactação (DANI, 2018).
O íleo funcional ocorre no pós-operatório de cirurgias abdominais e extra-abdominais,
assim como em associação com diversas doenças e uso de drogas. O tratamento é clínico,
baseado na correção dos distúrbios hidreletrolíticos e metabólicos. A síndrome de Olgivie
(pseudo-obstrução isolada do cólon) é comum nos pacientes idosos cronicamente doentes e
pode, nos casos iniciais, ser tratada com colonoscopia descompressiva. Nos casos
recidivantes, indica-se a cecostomia (DANI, 2018).
Dani (2018), descreve as principais manifestações sendo que, o sintoma cardinal do
abdome agudo obstrutivo é a cólica intestinal, demonstrando o esforço das alças para vencer
o obstáculo que está impedindo o trânsito normal. A dor é visceral, localizada em região
periumbilical, nas obstruções de delgado, e hipogástrica, nas obstruções de cólon, intercalada
com períodos livres de dor no início da evolução. Os episódios de vômito surgem após a crise
de dor, inicialmente reflexos, e são progressivos, na tentativa de aliviar a distensão das alças
obstruídas. O peristaltismo está aumentado, exacerbado, e é chamado de peristaltismo de luta.
Este é mais bem caracterizado quando se ausculta o abdome no momento da crise dolorosa e
se manifesta por uma cascata de ruídos.
Um ponto importante citado por Dani (2018), é que quanto mais alta a obstrução,
mais precoces, frequentes e intensos serão os vômitos, menor a distensão abdominal e mais
tardia a parada de eliminação de gases e fezes. Quanto mais baixa a obstrução, maior
distensão abdominal, mais precoce a parada de eliminação de flatos e fezes, e, devido ao
supercrescimento bacteriano no segmento obstruído, os vômitos, que são tardios, adquirem
aspecto fecaloide. Febre normalmente não está presente. A desidratação é acentuada pelas
perdas provocadas pelo vômito, sendo pior nas obstruções mais altas.
Com o progredir da doença, ocorre o comprometimento da vascularização do
segmento obstruído, surgindo irritação do peritônio parietal, manifesta por dor somática,
contínua, e contratura da parede abdominal, o que geralmente indica sofrimento de alça. A
presença de necrose triplica a mortalidade operatória e aumenta em 10 vezes o risco de
complicações. Não existem, entretanto, sinais radiológicos, clínicos ou laboratoriais capazes
de predizer com certeza a presença de sofrimento de alça no pré-operatório, apesar de dor
contínua, mudança da característica da dor, febre, leucocitose, irritação peritoneal e acidose
metabólica serem consideradas sugestivas (DANI, 2018).

05. Descrever os principais recursos diagnósticos disponíveis para diagnostico


diferencial dos tipos de abdome agudo com outros quadros abdominais.

A dor é o item principal na avaliação de um paciente com suspeita de abdômen agudo.


A anamnese deve caracterizar a dor de maneira precisa. A duração da dor, sua localização,
como se iniciou e outras características como tipo de dor e evolução podem ajudar no
diagnóstico diferencial (FERES, 2008 e ROCHA, 1993).

A dor visceral causada por distensão, inflamação ou isquemia é difusamente


localizada na região mesogástrica. Doenças renais ou ureterais causam dor nos flancos.
Sangue ou pus subdiafragmático à esquerda podem gerar dor no ombro esquerdo, doença
biliar pode causar dor referida no ombro direito ou dorso. Doenças supradiafragmáticas,
como uma pneumonia basal, podem causar dor referida no pescoço ou ombro. Dor abdominal
no andar superior do abdômen sugere úlcera péptica, colecistite aguda ou pancreatite. Por
outro lado, cisto de ovário, diverticulite e abscessos tubo ovarianos causam dor na porção
inferior do abdômen. Geralmente, a obstrução do intestino delgado causa dor no mesogástrio,
que, às vezes, é referida no dorso (FERES, 2008).
A dor que se move do epigástrio para a região peri-umbilical, até chegar na fossa
ilíaca direita, sugere o diagnóstico de apendicite aguda. Outro exemplo de dor migratória é a
da úlcera duodenal perfurada. O extravasamento do conteúdo duodenal causa dor epigástrica
intensa e localizada. No entanto, se o conteúdo extravasado gravitar pelo corredor
parietocólico direito, o paciente pode referir dor na fossa ilíaca direita. Embora a localização
da dor possa ser útil principalmente nas fases precoces da evolução de uma doença, pode não
ser típica em todos os pacientes e, em fases avançadas, pode se tornar generalizada em
virtude de uma peritonite difusa. O sangramento para o peritônio livre também causa dor
difusa e quadro de peritonismo (ROCHA, 1993).
A investigação laboratorial geralmente inclui hemograma. A inflamação
intraabdominal causa leucocitose, porém esse é um dado inespecífico. A dosagem de amilase
e lipase auxilia no diagnóstico de pancreatite aguda. No entanto, outras doenças, tais como
úlcera duodenal perfurada e infarto de delgado podem gerar aumento da amilase sérica. O
exame de urina pode auxiliar no diagnóstico de infecção urinária e litíase renal. Mulheres em
idade gestacional devem ter a dosagem de gonadotrofina coriônica sérica realizada (FERES,
2008).
A história e exame físico são passos principais na avaliação dos pacientes com dor
abdominal. Os exames de imagem melhoram a eficácia diagnóstica e o tratamento global dos
pacientes que se apresentam com dor abdominal aguda. Uma radiografia de abdômen com
incidência no diafragma (ortostática) pode detectar pneumoperitônio de até 1ml. Se o
paciente não puder ficar sentado, a radiografia pode ser realizada em decúbito lateral
esquerdo, e o pneumoperitônio será visível se houver de 5 a 10ml na cavidade peritoneal.
Setenta e cinco porcento das úlceras duodenais perfuradas causam pneumoperitônio e as
perfurações de estômago e cólon, geralmente, provocam grandes pneumoperitônios
(ROCHA, 1993).
Dez por cento das colelitíases e 90% dos cálculos renais são radiopacos e
demonstráveis pelo exame radiológico não contrastado de abdômen. Calcificações
pancreáticas e vasculares, sugerindo pancreatite crônica e doenças vasculares,
respectivamente, são achados radiológicos que auxiliam no diagnóstico. O íleo paralítico
pode provocar distensão intestinal com múltiplos níveis hidroaéreos (ROCHA, 1993).
A ultrassonografia é de baixo custo, rápida e segura, podendo ser utilizada em
mulheres grávidas. É bastante sensível e específica para doenças da vesícula biliar, e também
pode ser utilizada para avaliação do baço, rins e sistema coletor, apêndice, útero e anexos. A
tomografia de abdômen é capaz de ajudar na avaliação de abscessos intra-abdominais,
pâncreas, rins e demais estruturas intra e retro-peritoneais (FERES, 2008).

06. Identificar as principais complicações de cada tipo de abdome agudo.


ABDOME AGUDO INFLAMATÓRIO - As principais complicações são oriundas
de suas causas mais frequentes relacionadas a seguir (LOPES; REIBSCHEID; SZEJNFELD,
2006).
As complicações da apendicite aguda são: perfuração (pneumoperitônio); obstrução
do intestino delgado; linfadenopatia localizada; peritonite; e trombose venosa mesentérica.
Com a progressão da doença e a perfuração, o apêndice apresenta-se fragmentado, destruído
e substituído por flegmão ou abscesso (LOPES; REIBSCHEID; SZEJNFELD, 2006).
As complicações decorrentes da colecistite aguda são (LOPES; REIBSCHEID;
SZEJNFELD, 2006):
 Colecistite enfisematosa. Frequente em pacientes diabéticos, resulta da colonização
da vesícula biliar por microrganismos produtores de gás, que se coleta na luz e na
parede da vesícula. Cálculos são encontrados em apenas 50% dos casos; a sua
patogenia é relacionada à doença de pequenos vasos.
 Colecistite hemorrágica. É caracterizada por hemorragia intraluminal, que se
apresenta como múltiplas imagens ecogênicas na luz da vesícula, que não produzem
sombra acústica posterior.
 Colecistite gangrenosa ou necrotizante. Forma grave e avançada de colecistite aguda.
A vesícula apresenta à US membranas intraluminais (descamação da parede), e à TC,
gás na luz ou parede, irregularidade ou ausência de parede, e ausência de realce
parietal.
 Abscesso perivesicular. Resulta da perfuração da parede da vesícula e é visto como
uma coleção líquida com ecos no seu interior, próxima ao fundo da vesícula.
Abscessos hepáticos também podem ocorrer.
Na diverticulite por doença diverticular dos colos as complicações decorrem dos
abcessos. Enquanto a complicação de pancreatite é a necrose pancreática (LOPES;
REIBSCHEID; SZEJNFELD, 2006).
ABDOME AGUDO PERFURATIVO – Suas principais complicações são
pneumoperitôneo, a sepse, principalmente quando as manifestações são localizadas e há
presença de bloqueio e/ou abscessos, com evolução para o choque séptico (LOPES;
REIBSCHEID; SZEJNFELD, 2006).
ABDOME AGUDO VASCULAR – Dentre as principais complicações destacam-se a
insuficiência renal, hemorragia e dissecção arterial. Ademais, o colo é o segmento mais
comum de isquemia intestinal. Tal complicação é geralmente secundária a estados de
hipoperfusão e choque ou a procedimentos na aorta infra-renal como aneurismectomia e
endoprótese percutânea, que obstruem o fluxo na artéria mesentérica inferior (AMI). Ocorre
em cerca de 2% dos casos (6% nos casos de correção na urgência) e a maioria apresentasse
como necrose de todas as camadas da alça e consequente perfuração, geralmente do
sigmoide. Tem alta mortalidade, cerca de 50% dos casos (LOPES; REIBSCHEID;
SZEJNFELD, 2006).
ABDOME AGUDO OBSTRUTIVO – A febre aparece quando temos uma complicação
do quadro peritonite bacteriana. Outra complicação é irritação peritoneal. A perfuração
colônica é uma possível complicação da obstrução do intestino grosso, ocorrendo em cerca de
7% dos casos, e mantém relação com o grau de dilatação. Pode ocorrer no local da obstrução
ou proximamente no local mais dilatado (geralmente o ceco), devido a alterações isquêmicas
na parede da alça (LOPES; REIBSCHEID; SZEJNFELD, 2006).

07. Diferenciar as condutas terapêuticas clínicas e cirúrgicas para os diversos tipos de


abdome agudo.
O tratamento do abdome agudo inflamatório visa ao controle da infecção e da fonte de
contaminação, com exérese do órgão ou da víscera comprometida, drenagens amplas e
suturas. A indicação de antibioticoterapia de amplo espectro deve ser ponderada caso a caso,
dependendo da situação clínica do paciente, o que interferirá em seu prognóstico e evolução.
A morbidade e mortalidade não são desprezíveis se o diagnóstico e o tratamento clínico ou
cirúrgico não forem instituídos em tempo hábil, de modo que, nos dias atuais, ainda ocorrem
óbitos decorrentes de apendicite aguda, colecistite, colangite, pancreatite, diverticulite e
abscessos intra-abdominais (ZATERKA, 2016).
O tratamento e a conduta no abdome agudo perfurativo dependerão de alguns fatores,
a saber: etiologia e local da perfuração, tempo de evolução, grau de contaminação da
cavidade peritoneal e condições clínicas e gerais do paciente. Na maioria dos casos, o
tratamento operatório consiste em sutura simples da perfuração, lavagem exaustiva da
cavidade peritoneal e drenagem adequada. É o caso da úlcera duodenal perfurada, cuja
conduta atual é a simples sutura. Em determinadas situações, está indicada a ressecção do
segmento com perfuração; por exemplo, quando se tem perfuração de intestino delgado e não
há condição local para uma simples sutura, é imperativa a exérese de um segmento do
intestino ou, ainda, pode ser realizada a ostomia do segmento perfurado, por exemplo, em
caso de diverticulite de sigmoide perfurada, com grande contaminação da cavidade peritoneal
(ZATERKA, 2016).
Nesse caso, poderão ser indicadas colostomia em alça ou ressecção da área da
perfuração e colostomia à Hartmann (colostomia terminal na boca aferente e fechamento total
da eferente, após retirada do segmento colônico). Portanto, resumindo, diante de
contaminação acentuada da cavidade peritoneal e condições pouco satisfatórias do paciente,
devem-se evitar anastomoses primárias ou suturas, tornando aconselhável optar pela
realização de ostomias (ileostomia, colostomia) (ZATERKA, 2016).
O tratamento do abdome agudo vascular ou isquêmico depende basicamente da
extensão da área acometida. Como se trata de diagnóstico difícil, em um grande número de
casos, quando a intervenção cirúrgica é indicada, a necrose de vários segmentos intestinais,
do estômago e de outras vísceras é total ou quase total, o que caracteriza que nada mais há
para fazer e o paciente está em fase irreversível de evolução. Ocorrendo isquemia intestinal
segmentar, a conduta será ressecção do segmento ou área isquêmica e anastomose primária
para reconstrução do trânsito intestinal. Havendo dúvida quanto à viabilidade de alças e
vísceras, é aconselhável deixar o paciente com peritoneostomia, praticar relaparotomia
programada em 24 ou 48 horas (second-look) ou realizar uma ostomia. Nos casos de suspeita
de obstrução da artéria mesentérica superior, está indicada a exploração do vaso com o
auxílio de cateteres balão. Se a desobstrução não for possível, outra tentativa é a
revascularização (FERES. O, 2008).
O tratamento do abdome agudo hemorrágico é imediato ao diagnóstico, pois, em um
grande número de casos, o paciente estará com instabilidade hemodinâmica e em choque. A
conduta dependerá da víscera lesada, consistindo em sutura e hemostasia das estruturas e
vísceras lesadas, exérese parcial ou total do órgão lesado e, eventualmente, também
realização de ostomias. Há de se salientar o tratamento clínico conservador de fígado e baço
traumatizados e com hemoperitônio, desde que a lesão não seja demasiadamente extensa, o
paciente não apresente dor abdominal significativa e esteja hemodinamicamente estável e
com anemia sob controle (FERES. O, 2008).
O tratamento e a observação rigorosa devem ser feitos em ambiente hospitalar,
mantendo-se o doente internado o tempo que for necessário e seguro, tendo à disposição
equipe cirúrgica capacitada e com experiência. O sucesso do tratamento do abdome agudo
depende do diagnóstico correto e precoce, da intervenção cirúrgica nos momentos e ocasiões
oportunas e de o doente estar na melhor condição clínica possível para tal. Como se trata de
operação de urgência/ emergência, além da correta conduta operatória, há necessidade de
cuidados pós-operatórios (locais e gerais), respiratórios, metabólicos, hidroeletrolíticos,
nutricionais e de adequada antibioticoterapia, que são mais bem administrados se houver o
envolvimento de equipe multidisciplinar (FERES. O, 2008).
Na fase inicial do tratamento do abdome agudo obstrutivo de maneira geral, a
abordagem clínica se aplica a todos os doentes. Uma vez firmado o diagnóstico, deve ser
tomada a decisão de operar imediatamente ou continuar sob tratamento clínico. Em alguns
doentes, portadores de obstrução mecânica parcial, o tratamento clínico apresenta alto índice
de sucesso e não possui morbidade significativa. O tratamento clínico inicia-se com a
descompressão gástrica, pela passagem de sonda nasogástrica, hidratação parenteral, correção
de distúrbios eletrolíticos, eventualmente presentes, e analgesia. A nutrição parenteral pode
ser iniciada, caso se acredite que o doente não possa receber dieta enteral ou oral pelo menos
nos cinco dias seguintes. Assim, em princípio, não havendo melhora, ou havendo piora nas
12 horas iniciais de tratamento clínico, deve-se considerar a conveniência de indicar o
tratamento cirúrgico (ZATERKA, 2016).
O tratamento cirúrgico inicialmente consiste em laparotomia exploradora. Após a
revisão da cavidade, com a finalidade de diminuir a distensão abdominal, os líquidos
acumulados na luz das alças devem ser ordenhados para o estômago e aspirados através da
sonda nasogástrica. Essa manobra tem o intuito de facilitar a abordagem da causa da
obstrução e de evitar as lesões acidentais das alças que se apresentam, muitas vezes, bastante
dilatadas. Dependendo da lesão, podem ser realizadas enterotomias e colostomias proximais à
obstrução (ZATERKA S, 2016).

08. Descrever a epidemiologia, a formação e os fatores predisponentes ao


desenvolvimento dos cálculos biliares.
Epidemiologia

A colelitíase é uma das doenças mais comuns em gastroenterologia. A presença de


cálculos biliares é relativamente comum em adultos; estudos epidemiológicos e de
investigação clínica demonstram uma incidência de litíase biliar em cerca de 20 a 30% da
população, sendo que a grande maioria dos pacientes são assintomáticos. A litíase biliar é
rara em crianças e apresenta marcado acréscimo na incidência após a 3ª década de vida.
Cerca de 70% dos cálculos biliares são formados por colesterol e cálcio e aqueles de
colesterol puro respondendo por uma pequena porção (<10%) (GRACIANO, 2019).
A taxa de colelitíase no Brasil cresceu 24% entre os anos 2008 e 2017 na população
geral. No ano de 2008, a prevalência era de 101/100 mil habitantes e em 2017 de 125/100 mil
hab. No sexo masculino, a taxa de crescimento foi de 31% sendo a prevalência nos anos 2008
e 2017 (por 100 mil habitantes) equivalente a 45 e 59. Já no sexo feminino a taxa de
prevalência aumentou em uma proporção relativamente menor (22%) quando comparada ao
sexo masculino. A taxa de prevalência nessa população nos anos 2008 e 2017 (por 100 mil
habitantes) equivalente a 156 e 190, respectivamente. A prevalência no sexo feminino foi
69% a 71% maior que no sexo masculino. A taxa de mortalidade específica por colecistite
aguda foi de 0,72 por 100 mil hab. em 2008 e 0,88 em 2016, com crescimento de 18% da
taxa de mortalidade nesse período (GRACIANO, 2019).
A relação homem-mulher da colelitíase ajustada para idade é de 2,9 no intervalo de 30
a 39 anos, 1,2 no intervalo de 50 a 59 anos (LEMOS, 2019).
Fatores
Muitos fatores podem alterar a composição da bile e acionar o gatilho de formação de
pedra na vesícula. Alguns fatores que aumentam o risco são:
 Idade avançada
 Hormônios sexuais femininos
 Gênero feminino
 Anticoncepcionais orais
 Gravidez
 Obesidade e resistência à insulina
 Rápida perda de peso
 Estase da vesícula biliar
 Doenças congênitas do metabolismo de sais biliares
 Síndromes de dislipidemia (ROBBINS, 2013).

Além do sexo feminino, a gravidez também é um fator de risco para colelitíase em


mulheres jovens, aumentando de 1,3% em nulíparas, para 13% em multíparas. O avançar da
idade e a etnia caucasiana e asiática também são fatores de predisposição à litíase biliar
(GRACIANO, 2019).
Algumas associações temporais para a incidência de cálculos biliares foram
estabelecidas na literatura, entre elas o sexo feminino, IMC aumentado, colesterol não-HDL e
resistência insulínica. Novos determinantes incluem a testosterona e aumento de globulina
ligadora de hormônios sexuais (SHBG) em homens que tiveram associações direta e inversa
com doença de cálculo biliar incidente, respectivamente (GRACIANO, 2019).
Formação
A formação da bile é a única via importante para eliminação do excesso de colesterol
do corpo, tanto como colesterol livre quanto como sais biliares. O colesterol torna-se solúvel
em água pela agregação aos sais biliares e às lecitinas. Quando as concentrações de colesterol
excedem a capacidade de solubilização da bile (supersaturação), o colesterol não pode mais
ficar disperso e é nucleado em cristais sólidos de monoidrato de colesterol. A formação de
cálculos de colesterol é acentuada pela hipomotilidade da vesícula biliar (estase), que
promove a nucleação e a hipersecreção de muco, que consequentemente aprisionam os
cristais, permitindo sua agregação em cálculos. A formação de cálculos de pigmentos
acontece mais frequentemente na presença de bilirrubina não conjugada na árvore biliar,
como ocorre nas anemias hemolíticas e infecções biliares. Os precipitados são primeiramente
sais de cálcio de bilirrubina insolúveis (ROBBINS, 2013).
Os cálculos de colesterol se originam exclusivamente na vesícula biliar e consistem
em 50-100% de colesterol. Os cálculos de colesterol puro são amarelo-claros, com
proporções crescentes de carbonato de cálcio, fosfatos e bilirrubina contribuindo para a
alteração da cor de branco-acinzentados a negros (Fig. 15-35). Eles têm forma ovoide e são
firmes; podem ocorrer isoladamente, mas com mais frequência múltiplos cálculos estão
presentes, com superfícies facetadas devido à aposição apertada. A maioria dos cálculos de
colesterol é radio transparente; suficiente carbonato de cálcio é encontrado, no máximo, em
20% dos cálculos para torná-los radiopacos. Os cálculos de pigmento podem se originar em
qualquer local da árvore biliar e são classificados como cálculos negros e castanhos. Em
geral, os cálculos negros são encontrados em bile vesicular estéril, enquanto os cálculos
castanhos são encontrados em ductos intra ou extra-hepáticos infectados. Os cálculos contêm
sais de cálcio de bilirrubina não conjugada e, em quantidades menores, outros sais de cálcio,
glicoproteína de mucina e colesterol. Os cálculos negros são geralmente de tamanho menor,
frágeis ao toque e numerosos (ROBBINS, 2013).
Os cálculos castanhos tendem a ser únicos ou em pequeno número, ter consistência
mole, semelhante a sabão, que resulta da presença de sais de ácidos graxos retidos pela ação
das fosfolipases bacterianas nas lecitinas biliares. Em virtude dos carbonatos e fosfatos de
cálcio, aproximadamente 50-75% dos cálculos negros são radiopacos. Os cálculos castanhos
que contêm sabões de cálcio são radio transparentes (ROBBINS, 2013).
REFERÊNCIAS

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