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Sumário
1. Introdução. 2. Evolução histórica. 3. Con-
ceito e características. 4. Soberania e o titular
do seu exercício. 5. Soberania e poder constitu-
inte originário. 5.1. Poder Constituinte – con-
ceito e natureza. 5.2 Atributos do Poder Cons-
tituinte.
1. Introdução
A proposta deste trabalho é analisar os
limites da soberania, ou melhor, perquirir
se há limites a serem impostos ao fenôme-
no. Pautados nesse propósito, inúmeros ins-
titutos deverão ser desvendados, propician-
do que se trilhe uma base sólida sob a qual
poder-se-ão desenvolver as idéias que
(des)constituirão o cerne da questão.
Fica consignado que nosso compromisso
não reflete uma análise perfunctória dos te-
mas adjacentes que circundam a soberania,
sob pena de, em vez de subsidiarmos a evolu-
ção do trabalho, inviabilizá-la por completo.
Tendo como foco as elucidações traça-
das, daremos início ao trabalho analisando
a evolução histórica do instituto, salientan-
do as diferentes feições que o mesmo incor-
pora, dependendo das necessidades apre-
sentadas pelo momento histórico. Observa-
remos que a soberania é tingida com a forte
coloração dos interesses, é dizer, seu con-
teúdo e sua força gravitam de acordo com as
Ronaldo Guimarães Gallo é Procurador Fe- contingências de um determinado período.
deral (SP) e especialista em direito constitucio- Da evolução histórica, adentraremos ao
nal. estudo do conceito da soberania, bem como
Brasília a. 43 n. 169 jan./mar. 2006 31
apresentaremos suas principais caracterís- 2. Evolução histórica
ticas e atributos, tópicos intransponíveis
para a compreensão do tema. De forma com- Para o pretendido neste trabalho, enten-
plementar, porém não menos importante, demos ser essencial, ab initio, a análise do
avaliaremos quem é o titular do seu exercí- desenvolvimento histórico da soberania.
cio, ponderando acerca das teorias que in- Com base nesse procedimento, poderemos
tentam desvendar o questionamento. delinear a gênese do fenômeno jurídico, fa-
Feito isso, observaremos que existe uma tos que culminaram por agregar determina-
interessante ligação entre o instituto da so- das características ao mesmo, ou então fin-
berania e o Poder Constituinte, sendo certo daram por enrijecer crenças que não mais
que referido liame em muito nos interessa se coadunam com o momento político-his-
para os propósitos deste trabalho. Portanto, tórico atual.
faremos uma breve incursão na matéria Po- Diferente do que normalmente ocorre
der Constituinte, com o fito de apresentar um com outros temas, quando então a relevân-
esboço consistente do fenômeno. cia do desenvolvimento histórico é adjacen-
Essa análise implicará alinhavarmos um te, com o fenômeno da soberania tal não se
dá. A síntese histórica lança informações
mínimo de informação para o entendimen-
importantes, que voltarão a ser lembradas
to do Poder Constituinte, logo, de forma im-
quando do avançar do tema, emergindo, por
preterível, deveremos analisar seu conceito,
vezes, como fundamento para intrigantes
principais características e atributos.
confrontos.
Quando estivermos desvendando as pre-
De se ver, portanto, a atenção que merece
missas básicas do fenômeno constituinte, cons-
o presente tópico, cujo início já se faz tarde.
tataremos que elas não são suficientes para
Na Antiguidade, a nota fundamental que
a elaboração de um resultado convincente caracteriza o Estado, apartando-o das de-
que importe num fechamento adequado ao mais comunidades humanas, é o que Aris-
presente estudo. Denotaremos que suas ba- tóteles denomina autarquia. Esta, por sua
ses desembocam num terreno por demais vez, implica a auto-suficiência do Estado
nebuloso, cuja dubiedade é a marca mais que, mediante os esforços da comunidade
significativa. que o compõe, finda por suprir todas as suas
Nesse ponto nos deteremos, o que não necessidades, não dependendo de qualquer
implica o esgotamento do tema, nem a con- auxílio externo.
clusão do nosso intento. Ao contrário, apre- Não obstante a autarquia ser, na Antigui-
sentaremos numa segunda parte do traba- dade, adjetivo essencial do Estado, não tem
lho, a ser publicada na próxima edição, a qualquer ligação com o moderno conceito
evolução do Poder Constituinte e sua inte- de soberania, aliás, muito mais se asseme-
ressante relação com o instituto do jus co- lha ao que se entende por autodetermina-
gens, que, por sua vez, merecerá toda nossa ção. A somar com o entendimento esposa-
atenção e análise; análise essa que imbrica- do, tem-se o fato de que a autarquia não per-
rá num embate entre os institutos da sobe- faz uma categoria jurídica, mas sim ética,
rania e do jus cogens, propiciando novos en- ao primar pela realização da “vida perfei-
tendimentos acerca dos temas e, finalmen- ta” como condição fundamental a ser alcan-
te, a nossa conclusão acerca da limitação, çada pelo Estado.
ou não, da soberania. Em consonância, ressalta Jellinek (1970,
É este o estudo que nos propusemos de- p. 328) que “la antigua polis posee la posibi-
senvolver e que passamos a apresentar, por lidad moral de aislarse del resto del mundo,
ora, com ênfase na soberania e no poder cons- porque lo tiene todo em sí misma, no sólo lo
tituinte. que puede ser necesario a la vida, sino tam-