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Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB

CCH – Colegiado do Curso de História

DH – Departamento de História

Curso: Licenciatura em História – 2021.1 – Noturno

Disciplina: Tópicos da Historiografia IV

Docente: Prof.º Dr. Marcos Ribeiro Profeta

Discente: João Victor Santos Dias - 202011224

Avaliação da I Unidade

Questão: Leiam atentamente o relato de Miguel Pereira da Costa. Analisem o


documento tendo por base os conceitos de caminho e fronteira, desenvolvidos por
Sérgio Buarque de Holanda em sua obra clássica discutida em sala de aula

Em muito debates historiográficos, alguns historiadores trabalham com a


conceptualização e a construção de termos em determinados momentos históricos e os
aplicam em determinados temas. Amparado por esse método historiográfico, neste
trabalho iremos analisar o relatório de reconhecimento territorial produzido por Miguel
Pereira da Costa, em 1720, ao Vice-Rei Vasco Fernandes Cezar, analisando e
relacionando-o, principalmente, ao conceito “Caminhos e Fronteiras”, desenvolvido
pelo historiador Sérgio Buarque de Holanda, em sua obra homônima e também em
outras obras.

Para fins de contextualização, o relatório produzido por Miguel Pereira da Costa, em


1720, para o Vice-Rei Vasco Fernandes Cezar, o qual ele expõe toda sua expedição, um
serviço para a Coroa, de reconhecimento territorial da rota entre o município de
Cachoeira e as minas de Rio de Contas. É exposto no documento, além das descrições
pormenorizadas dos espaços geográficos, as tensões internas – como a fome, a sede – e
as tensões externas – as barreiras criadas pela questão geográfica.

Em primeiro plano, Miguel Pereira Costa deixa claro que chegar aos sertões é uma
tarefa difícil e que exige um fator indispensável aos aventureiros: a resistência física.
Um dos principais elementos desse empecilho é a questão da carência de suprir as
necessidades fisiológicas básicas como a fome e a sede, devido à própria questão da
localidade; além disso, as doenças durante o percurso é também um fator relevante e
intrínseco. “Exposta a jornada (ou viagem, como lhe chamam os sertanejos) da villa da
Cachoeira até as minas do Rio das Contas; difficuldades que vencem com muito
trabalhos que seguem este caminho; as fomes e sedes, doenças e mortos que padecem;
(...)”

Em segundo plano, outro fator que também dificulta a travessia é a questão geográfica.
A falta de água (como supracitado), as enchentes dos rios, os penhascos, morros e matas
são elemento que, sinteticamente, nos ajudam a entender todo a questão da dificuldade
que chegar, de fato, ao sertão.

No entanto, toda dificuldade exposta, diante das discussões historiográficas e


antropológicas, era direcionada aos grupos principiantes à aquela jornada em busca,
principalmente, da mineração e da criação de gado como fonte de renda, ou seja,
majoritariamente os homens brancos e suas comitivas. A mesma “burocracia”
geográfica não atendia aos indígenas, conhecidos como gentios e/ou bárbaros.

Diante desse fato, a população indígena foi passível de uma adaptação ao meio natural
determinado, ou seja, a adaptação entre a comunidade indígena diante o meio imposto.
Vale ressaltar que muitas dessas populações não eram oriundas daquela localidade, pois,
estavam fugindo de bandeirantes. Logo, não estamos falando apenas de uma adaptação
intriseca do indígena ao meio natural, mas também de uma adaptação obtida através da
experiência e da observação. No próprio relato, é possível encontrar uma observação de
Costa que ilustra bem esse contexto:

(...). Pela extensão da costa, afastada do mar aquellas poucas léguas, corre
uma mancha de mato virgem, e é mato em que nunca houve córte, onde ha
quantidade de gentio, que para o sertão o mais que se estendem é pelo Rio
Pardo: este, perseguido dos Paulistas, quando em outro tempo cuidavam mais
na sua extincção, e andavam á caça d’elle espalhados por estes sertões, se foi
retirando para aquella parte, onde acantonados se têm conservado até o
presente momento sem experimentarem a menor invasão, tendo produzido
inumeravelmente pelas suas aldêas: e como se póde vencer esta difficuldade
por Europeos novamente transportados áquellas costa tendo contra si, além
das mais difficuldades, a de guerreas com inimigos (...)? (p.53)
Ademais, diante do contexto exposto, é válido trabalhar como o emprego do conceito
“Caminhos e Fronteiras”, na situação entre o homem (quais homens?) e o meio (qual
meio?). No dicionário cartográfico, nos deparamos com as seguintes definições para
caminho: “Faixa de terreno, destinada ao trânsito de um para outro ponto; trilho,
picada, atalho.”(OLIVEIRA, 1993, p. 70) , e respectivamente para a palavra fronteira:
“Linha de demarcação entre unidades políticas ou geográficas contíguas. (IDEM, 1993,
p.230).

No entanto, quando o historiador Sérgio Buarque de Holanda chama atenção esses


termos ele se atém para “Caminhos” enfatizando o seu emprego aos indivíduos que
estão na participação desse processo de expansão e a adentramento dos sertões;
perceptivelmente, um substantivo tendo um emprego de um verbo no modo imperativo.

Além disso, o conceito de “Fronteiras”, indissociável como “Caminhos”, fica claro que
ele não está apenas discutindo a questão da fronteira espacial, mas, de todo um
conjunto, incluindo as fronteiras de hábitos, as fronteiras econômicas e as fronteiras
culturais. Essas fronteiras, principalmente as fronteiras culturais, irão se dispersando
quando o indígena ser visualizado como um instrumento de colaboração,
principalmente, no processo das bandeiras.

(...). Sabemos como era manifesta nesses conquistadores a marca do chamado


selvagem, da roça conquistada. Em todo seu caso ele não representa uma
herança desprezível e que deva ser dissipada ou oculta, não é um traço
negativo e que cumpre superar; constitui, (...), um elemento fecundo e
positivo, capaz de estabelecer vínculos entre o invasor e a nova terra.
(HOLANDA, 1994, p.21)

Logo, “o índio tornava-se, assim, o senhor de um admirável instrumento para triunfar


sobre as condições mais penosas e hostis.” (IDEM, 1994, p.22 )

Por fim, vai ser evidenciado uma matização um processo de sintetização da questão
cultural, que, consequentemente, uma simbiose cultural será gestacionada, a qual terá
como essência a capacidade de adaptação e o potencial de inventabilidade.1

1
Assuntos e termos expostos pelo professor Marcos Ribeiro Profeta na aula da disciplina de Tópicos da
Historiografia IV em 09 de março de 2022.
Referências

COSTA, Miguel Pereira da. Relatório apresentado ao Vice-Rei Vasco Fernandes Cezar
pelo mestre de campo Miguel Pereira da Costa. In: Revista Trimestral de História e
Geografia ou Jornal do Instituto Histórico Geográfico Brasileiro. Tomo V. Rio de
Janeiro: Typographia Universal de laemmert & C. 1885. p. 37 a 59

OLIVEIRA, Cêurio de. Dicionário cartográfico. IBGE, 1993.

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