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1 de Dezembro de 2022

A responsabilidade civil dos arquitetos e engenheiros

Um breve resumo de como os profissionais citados poderiam ser


responsabilizados na hipótese de falha de seus serviços.

Publicado por Rodrigo Bedê há 6 anos  39,9K visualizações

Para a construção de todo imóvel a figura desses dois


profissionais é de grande importância para um resultado
satisfatório ao fim do serviço, principalmente no que concerne à
segurança de seus futuros frequentadores. Infelizmente,
diversos erros podem ser causados por falhas na elaboração ou
efetivação do projeto, o que poderá acarretar danos de extrema
gravidade. Como ficaria a responsabilização destes
profissionais?
A relação consumerista entre
engenheiro/arquiteto – cliente
Primeiramente, importante denotar que a relação tratada há de
ser regida, em sua grande parte, pelo Código Consumerista,
simplesmente pelo fato de estarmos diante de um consumidor
(cliente) e um fornecedor de serviços (arquiteto/engenheiro),
nos termos estabelecidos do art. 2º e 3º:

Art. 2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que


adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário
final.

Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica,


pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como
os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade
de produção, montagem, criação, construção,
transformação, importação, exportação, distribuição
ou comercialização de produtos ou prestação de
serviços.

Assim, importante observamos os dizeres do art. 14 § 4º do


CDC, que em seu caput trata acerca da conhecida
responsabilidade objetiva (sem necessidade da verificação de
culpa), quando este vem tratar acerca da responsabilidade dos
profissionais liberais:
Art. 14. O fornecedor de serviços responde,
independentemente da existência de culpa, pela
reparação dos danos causados aos consumidores por
defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como
por informações insuficientes ou inadequadas sobre
sua fruição e riscos.

§ 4º A responsabilidade pessoal dos profissionais


liberais será apurada mediante a verificação de
culpa. [...]

Ao redigir o presente artigo, o legislador pretendeu tratar os


profissionais de uma maneira diferente, constituindo uma
exceção. O engenheiro e o arquiteto, por se tratarem de
prestadores de serviços e profissionais liberais, somente
responderão se comprovada sua culpa, ou seja, a imprudência,
negligência ou imperícia na execução/elaboração do projeto,
pois sua responsabilidade é pessoal e subjetiva.

Mas afinal, o que seria a


responsabilidade subjetiva?
Diferentemente da responsabilidade objetiva, onde, pelo
próprio risco exercido pela atividade, não há que se provar
absolutamente nenhum evento culposo, mas apenas a conduta;
o dano; e o nexo causal, a responsabilidade subjetiva requer,
para restar caracterizado o ato ilícito e o dever de indenizar, a
necessidade de comprovação do cometimento de culpa do
profissional, como imprudência, negligência ou imperícia,
segundo explica Daniele Oliveira:

“Na responsabilidade civil a culpa se caracteriza quando o


causador do dano não tinha intenção de provocá-lo, mas por
imprudência, negligência, imperícia causa dano e deve repará-
lo. A imprudência ocorre por precipitação, quando por falta de
previdência, de atenção no cumprimento de determinado ato o
agente causa dano ou lesão. Na imprudência, estão ausentes
prática ou conhecimentos necessários para realização de ato.
A imperícia ocorre quando aquele que acredita estar apto e
possuir conhecimentos suficientes pratica ato para o qual não
está preparado por falta de conhecimento aptidão capacidade
e competência. A negligência se dá quando o agente não toma
os devidos cuidados, não acompanha a realização do ato com a
devida atenção e diligência, agindo com desmazelo.”[1]

O engenheiro e o arquiteto são ambos responsáveis por


quaisquer danos resultantes de erros na elaboração do projeto,
como cálculos e concepções pré-estabelecidas, conforme
explicado abaixo:

“[...] se o profissional se incumbir de elaborar o projeto


e fiscalizar a construção, estará se responsabilizando
pelo eventual evento danoso que a obra gerar, pois
será seu dever orientar e acompanhar a execução do
projeto, desde os serviços preliminares, de preparação
do solo, até o acabamento, bem como examinar os
materiais empregados, tais como tijolos, canos e
vergalhões, e recusá-los se inadequados ou defeituosos,
ficando, deste modo, responsável pela solidez e
segurança do trabalho.” [2]

Deixemos claro que, se estes profissionais estão de alguma


maneira vinculados à construtora, incorporadora etc, estas
também serão responsabilizadas solidariamente de forma
objetiva, conforme estabelecido pelo Código de Defesa do
Consumidor.
E no caso de projetos encomendados
via empreiteiras/construtoras, como
ficaria a responsabilidade?
Nestes casos, como o vínculo criado fora apenas no que
concerne a elaboração do projeto, ficará a responsabilidade
restrita a essa parte da obra, não podendo o profissional ser
responsabilizado no caso da execução do projeto erroneamente
por parte da construtora, mas simplesmente à criação do
projeto, como erros de cálculo, dimensionamento, etc.

Outro caso extremamente comum é quando o profissional


contratado responsável pela obra for dispensado por seu cliente
antes da conclusão do serviço. Obviamente que sua
responsabilidade não poderá alcançar problemas
supervenientes à sua saída, salvo quando manterem algum nexo
de causalidade.

O próprio CREA-SP cita alguns casos em que o engenheiro ou


arquiteto poderá ser responsabilizado, confira:
“1 - Responsabilidade contratual: pelo contrato
firmado entre as partes para a execução de um
determinado trabalho, sendo fixados os direitos e
obrigações de cada uma.

2 - Responsabilidade pela solidez e segurança da


construção: pelo Código Civil Brasileiro, o profissional
responde pela solidez e segurança da obra durante
cinco anos; é importante pois, que a data do término
da obra seja documentada de forma oficial. Se,
entretanto, a obra apresentar problemas de solidez e
segurança e, através de perícias, ficar constatado erro
do profissional, este será responsabilizado,
independente do prazo transcorrido, conforme
jurisprudência existente.

3 - Responsabilidade pelos materiais: a escolha dos


materiais a serem empregados na obra ou serviço é da
competência exclusiva do profissional. Logo, por
medida de precaução, tornou-se habitual fazer a
especificação desses materiais através do "Memorial
Descritivo", determinando tipo, marca e peculiaridade
outras, dentro dos critérios exigíveis de segurança.
Quando o material não estiver de acordo, com a
especificação, ou dentro dos critérios de segurança, o
profissional deve rejeitá-lo, sob pena de responder por
qualquer dano futuro.

4 - Responsabilidade por danos a terceiros: é muito


comum na construção civil a constatação de danos a
vizinhos, em virtude da vibração de estaqueamentos,
fundações, quedas de materiais e outros. Os danos
resultantes desses incidentes devem ser reparados, pois
cabe ao profissional tomar todas as providências
necessárias para que seja preservada a segurança, a
saúde e o sossego de terceiros. Cumpre destacar que os
prejuízos causados são de responsabilidade do
profissional e do proprietário, solidariamente, podendo
o lesado acionar tanto um como o outro. A
responsabilidade estende-se, também, solidariamente,
ao sub-empreiteiro, naquilo em que for autor ou co-
autor da lesão.” [3]

O caso do Edifício Palace II


Trazendo um exemplo bastante conhecido na realidade
brasileira, o caso do Edifício Palace II, no Rio de Janeiro, que
desabou na madrugada de 22 de fevereiro de 1998, um domingo
de carnaval, destruindo 44 apartamentos.

Construído pela Sersan, de propriedade do então Deputado


Federal Sérgio Naya (PPB-MG), o prédio tinha graves
problemas de estrutura e, por isso, havia sido interditado pela
Defesa Civil. Ocorre que, no momento que 30 moradores
buscavam seus pertences o desabamento ocorreu. Oito pessoas
morreram soterradas.

Das 176 famílias vítimas da tragédia, 120 entraram na Justiça


contra Sérgio Naya e os engenheiros responsáveis. No entanto,
15 anos depois, apenas 40% das indenizações devidas haviam
sido pagas. Até 2013, foram realizados sete leilões de imóveis da
construtora Sersan. O último aconteceu em 2009, pouco após a
morte do ex-deputado federal que devia cerca de 70 milhões de
reais em processos judiciais. A situação evidencia uma
problemática já existente há décadas no Brasil, a saber, sua
morosidade judiciária, principal causadora da
sensação de impunidade. [4]

Portanto, cabe ao profissional ficar extremamente atento na


elaboração de seus trabalhos, principalmente em relação a
edifícios de grande porte, que necessitam de uma grande
responsabilidade pelo engenheiro e arquiteto da obra, sob pena
de evitar quaisquer danos à estrutura, como o desabamento
ocorrido no caso citado, que, infelizmente, não é um caso
isolado. Anualmente, temos diversos casos no país em que
falhas nos serviços prestados pelas construtoras são a causa dos
desabamentos, ceifando diversas vidas inocentes. A atividade de
arquitetura e engenharia exige uma grande cautela na execução
dos serviços, que, se feito de maneira errônea, poderá inclusive
causar danos irreparáveis.

[1] OLIVEIRA, Daniele Ulgim. A responsabilidade civil por


erro médico. Ambito-Jurídico. Disponível em: Acesso em: 04
abr 2017.

[2] Disponível em:


http://www.forumjuridico.org/threads/responsabilidade-civil-
do-engenheiroedo-arquiteto.12115/. Acesso em: 04 de maio de
2017.

[3] Responsabilidade Civil. CREA-SP. Disponível em


http://www.creasp.org.br/profissionais/responsabilidades-
profissionais/responsabilidade-civil. Acesso em: 4 de maio de
2017.

[4] Desabamento do Palace II. Memória Globo. Disponível


em:
http://memoriaglobo.globo.com/programas/jornalismo/cobert
uras/desabamento-do-palace-ii/equipeeestr... Acesso em: 04 de
maio de 2017.

Disponível em: https://rodrigobede.jusbrasil.com.br/artigos/454546832/a-responsabilidade-civil-


dos-arquitetos-e-engenheiros

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