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viveu a tragédia
humana até o fim
José Miguel Wisnik
Professor sênior de literatura brasileira na USP, ensaísta e compositor, é autor, entre
outros, dos livros “Maquinação do Mundo” (2018) e “Veneno Remédio” (2008)
[RESUMO] A morte do dramaturgo e diretor do Teatro Oficina, que
completa um mês, se soma às recentes catástrofes do fogo que trazem a
sensação de aniquilamento civilizatório ao país, mas não é deprimente, por
simbolizar uma explosão de energia que carrega o testemunho vital de quem
viveu, pela arte, a dimensão redentora da tragédia humana até o fim.
À primeira vista, a morte de José Celso Martinez Corrêa, que faz um mês
neste domingo (6), decorreu de um acidente caseiro, casual e atroz, que o
atingiu em um momento em que ele se preparava, aos 86 anos, para o projeto
teatral que vinha considerando o mais desafiador de sua vida: a encenação de
"A Queda do Céu", testemunho xamânico e cosmopolítico do líder yanomami
Davi Kopenawa.
Para nós que o admiramos e o amamos, para quem conhece a importância
incomensurável da sua presença, um incêndio acidental no quarto de quem
dorme, provocado, ao que tudo indica, por um aquecedor doméstico, parece
doloroso demais e fortuito demais para selar uma vida portentosa. Soa ao
mesmo tempo terrivelmente evitável e terrivelmente fatal.