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CREYDT, Oscar Adalberto Federico (Paraguaio, 1906, Itajurú – 1987, Buenos

Aires, Argentina

1- Vida e Práxis Política


Oscar Creydt nasceu em 6 de novembro de 1907 em Itajurú, cidade do distrito de
San Miguel, departamento de Misiones. Neto de um imigrante alemão de Hannover que
veio para o Rio da Prata, onde teve três filhos e uma filha. Há dois aspectos do início da
vida de Oscar Creydt que, sem dúvida, o marcaram e tiveram um forte impacto em seu
desenvolvimento pessoal.
Em primeiro lugar, sua mãe morreu dois anos depois de seu nascimento. Órfão
de mãe, ele passou seus primeiros anos com seu pai e duas irmãs. Em segundo lugar, em
1916, com apenas nove anos de idade, junto com suas duas irmãs mais velhas, viajou
para a Alemanha para estudar, acompanhado de sua tia Juana Matilde, que cuidava de
seus três sobrinhos. Eles chegaram no meio da Primeira Guerra Mundial, apesar disso
Oscar frequentou os três primeiros anos de seus estudos secundários no Royal
Gymnasium em Hamburgo. Três anos depois retornam ao Paraguai, onde se
estabeleceram em Assunção em uma casa na Independência Nacional entre Azara e
Cerro Corá.
Destaca-se no início da vida de Creydt uma experiência pessoal quase única no
Paraguai das primeiras décadas do século. Embora naquela época vários jovens de
famílias abastadas tenham ido para a Europa – e principalmente para a França – a
grande maioria deles deixou o país depois de terminar o ensino médio com o objetivo de
seguir estudos universitários no velho continente. O caso de Oscar foi o contrário,
passou os primeiros anos dos estudos secundários na Europa, regressa ao Paraguai em
1919, com apenas doze anos, e logo ingressa para prosseguir os estudos superiores na
Universidade Nacional. Seria difícil subestimar o impacto que a presença de alguém
com sua formação pessoal teria no cenário universitário de Assunção naquele momento.
A chegada de Creydt, com sólida formação de segundo grau e vivência na
Europa, teria sido um “sopro de ar fresco” em um ambiente universitário caracterizado
por sufocante catolicismo e pequena margem para discussão de questões locais. Mas o
que temos de informações é que ele não voltou da Europa como um socialista convicto,
apesar da grande efervescência socialista na Alemanha naqueles anos, no limiar da
Revolução Russa. Sua carreira universitária foi impressionante. Ao retornar em 1919,
depois de estudar por três anos no Colégio Nacional da Capital, ingressou na Faculdade
de Direito da Universidade Nacional de Assunção em 1923, onde começou a participar
da política estudantil. Logo foi eleito presidente da Federação de Estudantes do
Paraguai em 1926, com a idade de dezenove anos.
Foi um dos promotores da reforma universitária, inspirado no movimento de
reforma universitária de Córdoba em 1918. Como membro da comissão diretiva do
Centro da Faculdade de Direito, elaborou em 1927 o plano de modificações ao “Projeto
de Reforma Universitária”, aprovado após discussões parlamentares em 21 de junho de
1929. Sua incipiente produção intelectual já é evidente com a publicação de artigos em
várias revistas estudantis, como a Revista do Centro Estudantil do Colégio Nacional, a
Revista do Centro Estudantil de Direito, além da Revista da Faculdade de Direito e dos
Anais da Universidade. Nesse período sua publicação versa na tentativa de adaptação de
princípios do Direito para realidade paraguaia.
Em 1928 Creydt se formou como novo doutor pela Faculdade de Direito da
Universidade Nacional com apenas 21 anos de idade, com a apresentação de uma tese
intitulada “O Estado de Sítio” e recebeu os elogios de Cecílio Báez que o considerou "o
primeiro constitucionalista do Paraguai". Imediatamente se insere nas lutas populares
contra a grande injustiça social vigente na época.
Em abril de 1928, sendo Presidente da Federação Estudantil do Paraguai,
participou da criação da Universidade Popular (UP), iniciativa de extensão trabalhador-
estudante proposta pela Reforma Universitária de Córdoba. Lançou o documento
intitulado “Bases da Universidade Popular”. A UP foi fundada nas instalações da
Sociedade Tipográfica em abril de 1928 e inaugurada no teatro Granados em maio do
mesmo ano, Com a presença de delegados do Centro Regional Operário do Paraguai
(CORP), da União Operária do Paraguai (UOP) e da Federação Regional de Professores
do Paraguai, Creydt fez o discurso inaugural.
Meses depois, foi um dos organizadores da greve dos Moinhos de Farinha de
Villarrica e foi preso junto com Obdulio Barthe e outros dez intelectuais e líderes
trabalhistas. Em 1º de agosto, junto com seus companheiros de prisão, publicou o
manifesto da prisão, no qual reivindicava "a fábrica para os trabalhadores, a terra para
os camponeses". Precursor das ideias da Nova Ideologia Nacional, Creydt propôs
estabelecer o "federalismo comunal livre" como sistema político, argumentando que a
democracia havia morrido no Paraguai. Lodo após ser libertado da prisão, fez um
discurso inflamado em um comício popular em 17 de agosto de 1928, convocado pelo
CORP e pela “Federação dos Trabalhadores de Calçados da Plazoleta del Puerto de
Assunção”, protestando contra a repressão à greve dos guairas.
Junto com Carlos Irala e Leopoldo Ruiz, viajou a Montevidéu como delegado do
CORP ao Congresso Antiguerra em fevereiro de 1929. Este congresso contra a iminente
Guerra do Chaco foi patrocinado pelo Comitê da Confederação Sindical Sul-Americana;
entidade sindical da III Internacional, pró-soviética para a América Latina.
De volta ao país, em 14 de maio de 1929, aniversário da independência nacional,
Creydt assinou, junto com Barthe, Codas, Ruiz Díaz e oito organizações estudantis, o
manifesto “Nosso Nacionalismo”. Nele saudavam as “duas revoluções” do Paraguai, o
movimento de independência de 1811 e a Constituição de 1870. Mas consideravam o
liberalismo esgotado e exigiam uma terceira revolução emancipatória e nacionalista.
Alguns dias depois, como membro do Conselho de Trabalhadores e Estudantes,
organizou um comício na Praça Independência para o dia 17 de maio, proibido pela
polícia. Creydt, Barthe, Sánchez Palacios, Cañete e outros líderes foram presos
novamente. O desacato do Chefe de Polícia, ao habeas corpus emitido pelo Superior
Tribunal de Justiça, suscitou vários protestos operários e estudantis e um manifesto
incendiário da UOP em 20 de maio de 1929. O avanço da ditadura rendeu o último
suporte da liberdade.
Entre 1933 e 1934 Creydt foi preso em Buenos Aires por onze meses pelo
governo argentino de Agustín P. Justo a pedido da embaixada paraguaia, que o impediu
de participar do Congresso de Villalobos, neste ano (1933) teria se filiado ao PCP. Mas
em dezembro de 1934 ele estava no Congresso de Córdoba, que fundou o Partido
Revolucionário dos Trabalhadores Bolivianos, retornando ao Paraguai após a Guerra do
Chaco, participou da organização da Confederação Nacional dos Trabalhadores (CNT)
e das inúmeras greves e conflitos que prepararam o terreno para o golpe cívico-militar
de fevereiro de 1936.
A irrupção do movimento militar que deu origem à mal chamada "Revolução de
Fevereiro” em 17 de fevereiro de 1936 refletiu o crescente descontentamento social
após a Guerra do Chaco e representou um alento para os diversos movimentos políticos
que buscavam preencher o vácuo causado por um liberalismo em declínio. Na ocasião,
o Partido Comunista Paraguaio (PCP) aproveitou para aumentar sua influência nos
círculos sindicais que apoiavam o movimento de ex-combatentes sob a liderança do
Coronel Rafael Franco. Após o golpe de Franco e junto com outros líderes comunistas,
Creydt retornou ao país depois de quase sete anos de exílio. Em 23 de fevereiro, ele fez
uma apresentação na Rádio Prieto, pedindo a formação de uma “Frente de Libertação
Nacional” e oferecendo apoio comunista ao governo recém-formado, o que Franco
rejeitou. As expectativas de mudança foram abreviadas um mês após o golpe, quando o
governo franquista assinou o Decreto nº 152 de 10 de março, que baniu o PCP e
suprimiu a vida sindical. Perseguido, foi deportado para a Argentina, onde fez uma
greve de fome de sete dias em Corrientes para garantir sua libertação. Voltou
clandestinamente ao Paraguai naquele mesmo ano em um apartamento do frigorífico
inglês em Zeballos Cué, mas foi novamente preso e confinado à prisão militar da ilha de
Peña Hermosa, perto de Concepción.
Em dezembro de 1936 conseguiu deixar o país em um navio de bandeira
britânica que o libertou na ilha de Trinidad, no Caribe, de onde tomou outra passagem
para o Panamá e depois para o México. Creydt viveu de 1937 a 1940 na capital
mexicana. Por um ano, ele ministrou aulas de Ciências Econômicas na Universidade
Nacional Autônoma do México (UNAM). Ele também viajou pelo Peru e Chile para
participar de reuniões com a Internacional Comunista, uma associação mundial de
partidos comunistas sob o rígido controle stalinista da União Soviética.
Com a ascensão do governo do general José Félix Estigarribia em 1939, foram
criadas melhores condições para a esquerda e Estigarribia passou a dialogar com os
dirigentes sindicais. Em 1939, o PCP apoiou o seu governo até proclamar por decreto a
Constituição autoritária de 1940. A partir de então, e principalmente com a ascensão do
O general Higinio Morínigo ao poder (1940-1948), os comunistas voltaram a se
esconder, continuando seu trabalho organizativo apesar da repressão. Em junho de
1941, realizou-se em Assunção o Primeiro Congresso do PCP, no qual se decidiu a
criação do jornal Adelante. Creydt estava fora do país desde o início do governo
Morínigo. Um pronunciamento dos jovens oficiais do exército em 9 de junho de 1946,
exigiu que o governo iniciasse as medidas para a democratização do país, o que levou a
um período conhecido como "A primavera democrática”.
O apogeu da vida política de Creydt tenha sido em 10 de agosto de 1946, quando
mais de trinta mil trabalhadores, estudantes e militantes do PCP se reuniram na praça do
porto de Assunção e na rua Colón para recebê-lo e aos demais membros. O Comitê
Central do PCP. Na ocasião fez um longo discurso de várias horas, "Pela Assembleia
Nacional Constituinte: rumo a um Novo Paraguai", no qual defendia uma nova
constituição para substituir a anterior constituição autoritária de 1940. Ao mesmo
tempo, alertou para o perigo do Partido Colorado ser tomado pelo movimento
extremista dentro do Partido Colorado "Guión Rojo", formado em 1941, o que
realmente aconteceu alguns meses depois, em janeiro de 1947, com o pacto entre
Morínigo e os roteiristas, pondo fim ao governo de coalizão.
Nesse breve período de cinco meses – agosto de 1946 a 13 de janeiro de 1947 –,
quando ocorreu o golpe dos roteiristas, o PCP realizou uma intensa campanha de
filiação. Em junho de 1946, no início da Primavera Democrática, o número de filiados
do PCP não ultrapassava os 300, e mesmo que o número de 10.000 novos filiados
mencionados na história oficial do PCP por apenas seis meses até dezembro fosse
exagerado, há sem dúvida que o apoio ao comunismo aumentou consideravelmente
durante este breve período. Foi um período de intensa atividade política por parte de
Creydt, que assumiu um papel de liderança do partido. Fez vários discursos nos vários
comícios em que tratou o General Morínigo do “Hitler Paraguaio". Não há dúvida de
que sua erudição e oratória agressiva o tornaram temível nas discussões e debates
doutrinários.
A Primavera Democrática foi muito breve. O processo foi interrompido com o
autogolpe de Morínigo, que em 13 de janeiro de 1947 dissolveu o gabinete pluralista e
se aliou à facção extremista dos "Guiones Rojos" dentro do Partido Colorado. No dia 7
de março, jovens febreristas tomaram conta do Quartel da Polícia, e no dia seguinte
jovens militares institucionalistas se levantaram em Concepción, exigindo a realização
de uma Assembleia Nacional Constituinte, há muitos anos esperada.

2- Contribuições ao Marxismo
A formação intelectual de Oscar Creydt, fruto da tradição marxista na América
Latina, possibilitou sua análise crítica da organização social da sociedade Paraguai. Sua
crítica ao atraso e insignificante projeto nacional que pudesse amenizar a situação de
precariedade que boa parcela de seus irmãos paraguaios. Na segunda metade da década
de 1920, houve um período de crescentes protestos sociais e questionamentos ao
liberalismo. Essa efervescência, acompanhada de uma produção intelectual, levou a
chamada Nova Ideologia Nacional, manifesto direcionado aos trabalhadores e jovens de
todos os partidos que foi escrito principalmente por Creydt e assinado por cerca de vinte
jovens com idades entre 18 anos e 22 anos (estudantes, trabalhadores anarco-
sindicalistas e nacionalistas de esquerda). A extensa escrita pedia uma insurreição
popular para implementar uma revolução social no Paraguai. Ele observou uma rejeição
total dos dois partidos políticos existentes (Colorado e Liberal) e do sistema
parlamentar, que serviu apenas aos interesses de uma pequena elite, abaixo:
A Nova Ideologia Nacional também condenou os regimes autoritários do
período nacionalista. No manifesto havia a proposta de sociedade altamente
descentralizada, baseada em uma combinação de sindicatos e conselhos populares.
Curiosamente, Creydt argumentou que tal revolução social no Paraguai também
significaria conflito étnico entre as massas rurais de língua guarani e uma elite
majoritariamente eurocêntrica, uma ideia que ressurgiria depois de cerca de sessenta
anos.
As ideias dos associados à Nova Ideologia Nacional foram divulgadas pelo
semanário La Palabra, que publicou quinze números em Assunção entre outubro de
1930 e janeiro de 1931. A velocidade de sua repercussão entre estudantes e sindicalistas
refletiu tanto o vácuo ideológico criado pelo declínio do liberalismo quanto a crise
internacional do capitalismo na época. Uma revolta apressada em fevereiro de 1931,
incluindo um ataque a Encarnación, liderada por Barthe, foi abortada quando uma greve
geral liderada por trabalhadores da construção em Assunção entrou em colapso após a
prisão e deportação de seus líderes.
A Nova Ideologia Nacional e sua grande adversária, a Liga Nacional
Independente (LNI), representavam as duas principais correntes de opinião ideológica
no final do período liberal. Ambas as correntes intelectuais optaram posteriormente por
movimentos políticos muito conflitantes. A LNI foi a precursora do movimento
nacionalista autoritário, Guión Rojo, identificado com Natalicio González, teve tanta
influência no governo de Morínigo quanto mais tarde, no regime de Stroessner. Por
outro lado, o utopismo da Nova Ideologia Nacional foi aos poucos sendo deixado de
lado à medida que seus seguidores foram confrontados com a realidade política e muitos
tornaram-se comunistas durante a década de 1930. Os exemplos mais emblemáticos
foram os dois primeiros signatários do NIN – ninguém menos que Oscar Creydt e
Obdulio Barthe – que muito em breve a rejeitariam e adeririam ao comunismo.
Como líder intelectual da Nova Ideologia Nacional, não surpreende que tenha
sido um dos primeiros a ser preso e exilado em Clorinda na Argentina no início da
década de 1930 pelo governo liberal da época. É sem dúvida nesse, seu primeiro
período de exílio, que Creydt se interessou seriamente pelo marxismo. Ele viaja para
Buenos Aires, onde conhece Rodolfo Ghioldi, do Partido Comunista Argentino. Entre
1931-1932 publicou artigos na revista Buenos Aires Claridad, fazendo autocríticas de
seu passado anarco-sindicalista e de sua militância no NIN. Da capital argentina, foi
para Montevidéu, onde se uniu a Luís Carlos Prestes, conhecido marxista e ex-
guerrilheiro brasileiro. Mais tarde, viajou para o Brasil, onde se hospeda na casa de
poeta ligado ao comunismo brasileiro em São Paulo. Lá ele passa meses lendo pela
primeira vez as obras clássicas de Marx, Engels e Lenin. Do exílio, manteve laços
estreitos com o movimento operário local e o NIN, e financiou o órgão anarquista, A
Palabra.

3- Comentário Sobre a Obra

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