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CAPTAÇÃO CLANDESTINA DE SINAL DE TV: Furto, estelionato ou fato atípico?

Atualmente, existe uma crescente demanda por aquisição de aparelhos que transmitem o
sinal fechado de TV, seja via cabo, satélite ou internet. Com isso, cresce também a
captação clandestina desse sinal.
Acerca do tema, reflete-se que tal comportamento atinge diretamente a moral, a ética e os
bons costumes, já que essa prática clandestina é amplamente difundida e utilizada em
diversas classes sociais do país.
Cabe aqui uma maior reflexão se essa atitude pode ser considerada crime ou não.
No dia 4 de fevereiro de 2015, foi apresentado na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei
nº 188/2015, de autoria do Deputado Cleber Verde (PRB-MA), que altera o artigo 155,
do Decreto-Lei nº 2.848/1940 (Código Penal), incluindo no § 3º sinais de TV a cabo.
Muito embora haja a possibilidade de tal conduta ser considerada crime, já que o projeto
se encontra sujeito à apreciação do Plenário, vejamos o que diz o próprio artigo 155 do
Código Penal:
“Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
§ 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado
durante o repouso noturno.
§ 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa
furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção,
diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de
multa.
§ 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer
outra que tenha valor econômico.”
Assim, com a inserção dessa conduta a ser tipificada como ilícita, cabe aqui uma análise
dessa tipificação e se realmente poderia ser considerada furto.
Apesar de o enquadramento desse projeto, com a inclusão no art. 155 do CP, parecer
viável, tem-se que a jurisprudência vem divergindo no assunto.
Ocorre que tal discussão se dá em três sentidos, qual seja: a) deve ser considerada furto –
visão amplamente adotada pelo STJ; b) deve ser considerada estelionato – visão adotada
em algumas doutrinas; c) deve ser considerada conduta atípica – visão adotada
recentemente no STF.
Deste modo, mesmo tendo a jurisprudência adotado por analogia que tal conduta pode
ser tipificada como furto e até mesmo estelionato, note que não há cominação legal para
descrever como ilícito penal, não podendo ser enquadrada como crime.
Por outro lado, note que a Lei nº 8.977/1995, que dispõe sobre o serviço de TV a cabo,
em seu art. 35, considera:
“Constitui ilícito penal a interceptação ou a recepção não
autorizada dos sinais de TV a cabo.”
Mesmo considerando ato ilícito, tal instrução não vem sendo adotada, uma vez que não
há previsão na legislação penal, podendo levar ao entendimento de que o fato é atípico,
ou seja, mesmo sendo um fato reprovável, consiste na ausência de correspondência, na
falta do ajustamento, da adequação entre o fato natural e o modelo de conduta proibida:
o tipo legal de crime.
Assim, por completa ausência de tipificação dessa conduta, destaca-se o embate
hermenêutico estendido ao longo do tempo até que o projeto em análise seja concluído.
Sendo a decisão do STJ considerada a mais compreensível e ajustável à ciência jurídica
penal, denota-se que, assim como a transmissão via cabo se dá através de energia, a
transmissão e propagação do sinal via internet ou satélite através de ondas também seja
considerada energia.

Breve resumo curricular


Dr. Guilherme Suriano Ourives
Advogado; Pós-graduado em Direito Civil e Processo Civil; Pós-Graduando em Direito
Penal e Processo Penal; membro da Comissão dos Advogados Criminalistas e da
Comissão de Defesa da República, da Democracia e Reforma Política da OAB/MS; Sócio
do escritório Pegolo & Ourives Advogados Associados.

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