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Estava descendo para o campo de futebol do colégio com minhas amigas do time
quando Brenda, nossa goleira, vem até nós com uma cara nada boa.
-Que cara é essa? – Dinah pergunta.
-Cortaram nosso time.
-O que? – Pergunto franzindo o cenho. – Como assim cortaram o nosso time?
-A escola não quer mais gastar com a equipe e foram poucas garotas inscritas. – Ela
bufa me entregando a folha de aviso e eu leio sentindo a raiva me consumir.
-Tudo bem, calma. – Respiro fundo pensando em uma solução. – Vamos falar com o
treinador Chapman, talvez ele possa ajudar.
Continuamos descendo até o onde o treinador estava. Era treino do time masculino e
vi Alex fazendo umas flexões do outro lado do campo. Paro ao lado do treinador
Chapman e ele nem se dá ao trabalho de virar o rosto na minha direção.
-Oi, meninas. Já estou sabendo da novidade.
-Sabe que isso não é justo, tem que nos ajudar. – Falo em nome das minhas amigas de
time.
-Infelizmente eu não posso fazer nada garotas.
-Pode sim! – Sorrio pensando na ideia que tive agora. – Queremos jogar no time
masculino.
Ele gargalha e finalmente me olha, mas quando vê minha expressão séria ele para de
rir.
-Não está falando sério, não é?
-Qual é, treinador. Sabe que a gente sabe jogar, só queremos uma chance. – Ouço
minhas colegas concordarem e ele vira para mim com uma cara entediada.
-Olha, eu não sei se eu sei isso que você disse. – Fala irônico e eu fecho a expressão.
Filho da pu..
-Oi, gata. O que tá acontecendo aqui? – Alex pergunta se aproximando um pouco
ofegante com alguns amigos do time dele atrás.
-As garotas querem jogar no time masculino. – O treinador responde debochado.
-Espera, é sério isso? – Alex fala rindo e eu sorrio para ele.
-Por que tá todo mundo tão chocado?
-Não podem jogar no time masculino. – Diz o treinador babaca.
-E por que não? – Dinah pergunta se colocando ao meu lado.
-É simples, moças não são rápidas como rapazes, nem tão atléticas. – Ele cruza os
braços numa pose imponente. – É biologia, moças não superam rapazes!
-Alex, você é o capitão. – Me viro para o meu namorado. – O que me diz?
Ele olha para os amigos que esperavam a resposta dele e depois vira para mim.
-Acho que o treinador tem razão.
-O que? Como assim? Ontem você disse que eu era melhor que metade dos caras do
seu time. – Falo indignada e seus amigos começam um coro de zoação.
Alex ri em escarnio e cruza os braços tentando parecer um macho alfa, patético.
-Camila, eu nunca disse isso, tá legal? – Diz em tom de deboche. – E chega desse papo!
Seus amigos riem dando pequenos tapinhas em seus ombros e eu nego com a cabeça.
-Você é um idiota! – Me aproximo dele, olhando com raiva. – Acabou!
Seu sorriso debochado morre na hora e seus amigos começam a zoar de novo com ele.
Saio rápido do campo chamando minhas amigas e Alex corre até mim.
-Gata, perai. – Ele me puxa pelo pulso e eu solto puxando com força. – Eu só não quero
que se machuque...
-Vai se ferrar! - Empurro ele e saio sem sequer olhar para trás.
Que se dane ele e esse time de imbecis, e que se dane esse treinador filho da puta.
Quero que todo mundo vá se foder.
Volto para casa me sentindo derrotada e quando abro a porta dou de cara com a
minha mãe que estava na sala com um monte de vestidos em cima do sofá.
-Que cara é essa? – Pergunta vendo a minha expressão de derrotada.
-Você venceu mãe, cortaram o time de futebol. – Suspiro me sentindo péssima e ela
abre um sorriso enorme como se não estivesse nem aí para os meus sentimentos.
-Sem futebol? – Ela pega um dos vestidos em cima do sofá e estende mostrando para
mim. – Quer dizer que agora você tem tempo para se dedicar a outra coisa?
-Não.
Subo as escadas correndo, vou direto para o meu quarto e entro batendo a porta com
força. Deito na cama e começo a olhar os meus pequenos troféus de futebol que
ganhava quando era criança, todos em cima de uma prateleira com algumas fotos
minhas com as minhas companheiras de time.
Por que tinha que ser tão difícil? Por que eu não poderia mostrar meu talento para o
mundo e jogar o esporte que eu amava? Tinha que ser tão difícil assim só por eu ser
mulher? Mesmo se eu conseguisse uma chance, eu nunca seria tão valorizada quanto
os jogadores masculinos.
Seria tudo mais fácil se eu fosse homem...
De repente meus olhos se voltam para a foto minha e do meu irmão que estava
pregada no espelho do meu quarto. Me levanto para pegar a foto e começo a analisar
a mesma.
“Achei que fosse o seu irmão.”
“Você anda por aí parecendo o seu irmão.”
As vozes de Monique e da minha mãe veem na minha cabeça e eu arregalo os olhos.
Era isso!
Era isso que eu precisava fazer!
Eu tinha que me tornar um homem e assim mostraria para todos aqueles babacas que
estavam errados.
Sorrio triunfante e pego minhas malas colocando todas as minhas roupas dentro. Pego
minha bola de futebol e o boné de Cameron. Desço as escadas, tão rápido quanto subi.
-Opa, mocinha! – Minha mãe me interrompe quando chego perto da porta. – Onde
você pensa que vai?
-Mãe, já disse. Vou ficar duas semanas na casa do papai. – Respondo sem me virar.
-Não disse não, e você não vai!
Mordisco o lábio pensando numa desculpa e tiro toda força do mundo para falar o que
me vem na cabeça.
-Sabe, mãe...- Me viro para ela e faço uma carinha inocente. – Eu pensei sobre o que
você disse, de todo esse lance de debutante e acho que você tem razão.
Ela abre um sorriso e corre até mim me segurando pelos ombros.
-Sério?
-Sim...a Monique vai ficar o tempo todo com o Cameron e eu achei que ela poderia me
ajudar sabe, a aprender tudo sobre o assunto. – Sorrio mostrando os dentes e ela me
abraça.
-Minhas preces foram ouvidas! – Ela me enche de beijos e eu me afasto limpando a
baba que ficou no meu rosto. – Você e a Monique vão se divertir muito.
-Também acho. Preciso ir.
Saio antes que ela fale alguma coisa a mais.
(...)
-Não, de jeito nenhum! – Meu amigo Troye falava enquanto passava chapinha no
cabelo de uma cliente. Estávamos no salão de beleza dele, implorando para que ele
nos ajudasse.
-Por favor, Troye. – Eu, Dinah e Brenda fazendo biquinhos pidões.
Ele se vira e nos olha como se fossemos malucas.
-Você tem noção que está pedindo para que eu transforme você no seu irmão? –
Arqueia as sobrancelhas.
-Olha, Troye. Eu só quero jogar futebol. Posso mostrar que sou melhor que todos
aqueles idiotas do time do Alex. – Suspiro. – Eu só preciso de uma chance. Por favor,
Troye.
-É, por favor, Troye. – A cliente que se tratava de uma idosa pede e ele abre um
sorrisinho negando com a cabeça.
-Tá bom, tá bom. – Ergue as mãos em rendição e nós pulamos animadas abraçando
ele. – Mas se der errado, eu nunca tive nada a ver com isso.
-Fechado!
-Vamos a transformação! – Ele fala e eu respiro fundo.
Meu futuro estava prestes a tomar rumo.
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