Você está na página 1de 74

Variação Semântica do Português falado pelos Comerciantes dos mercados de

Maquinino e da Praia Nova, na Cidade da Beira

Autora: Nídia Adélia Chamussora

Beira, Fevereiro de 2020


UNIVERSIDADE ZAMBEZE

Faculdade de Ciências Sociais e Humanidades

Mestrado em Língua e Literatura Portuguesa

Variação Semântica do Português falado pelos Comerciantes dos mercados de


Maquinino e da Praia Nova, na Cidade da Beira

Autora: Nídia Adélia Chamussora

Beira, Fevereiro de 2020


UNIVERSIDADE ZAMBEZE

Faculdade de Ciências Sociais e Humanidades

Mestrado em Língua e Literatura Portuguesa

Variação Semântica do Português falado pelos Comerciantes dos mercados de


Maquinino e da Praia Nova, na Cidade da Beira

Dissertação submetida à Faculdade


de Ciências Sociais e Humanidades
para a obtenção do grau de Mestre
em Língua e Literatura Portuguesa

Autora: Nídia Adélia Chamussora

Beira, Fevereiro de 2020


IV

Declaração

Eu Nídia Adélia Chamussora declaro que esta dissertação é resultado do meu próprio trabalho e

das orientações do meu supervisor. Está a ser submetida para a obtenção do grau de Mestre em

Língua e Literatura Portuguesa, na Universidade Zambeze, Beira. Ela não foi submetida antes

para obtenção de nenhum grau ou para avaliação em nenhuma outra universidade.

Beira, aos 24 de Fevereiro de 2020

O Supervisor Autora

(Nídia Adélia Chamussora)


V

Dedicatória

Aos meus filhos (Shirley, Dionísio, Abigail e Amariah) pela paciência de terem uma mãe
que, em certos momentos, se tornou ausente para se dedicar aos estudos, mas sem deixar de amá-
los, respeitá-los e cuidá-los.

Termino a minha dedicação especial a ti meu amor, meu esposo, amigo, companheiro e
colega do curso (Zelino Taiada Suandique). Palavras me faltam para expressar a tamanha
importância na minha vida. Só Deus!
VI

Agradecimentos

Agradeço ao meu supervisor, o Prof. Doutor Aniceto Fernando Mapfala, pelo seu

acompanhamento e conselhos dados durante a realização do presente trabalho.

Agradeço também aos professores e colegas do curso de Mestrado em Língua e

Literatura Portuguesa, de modo particular ao colega do grupo de estudo, Samora Octávio de

Sousa, pela partilha de conhecimento, durante a realização de trabalhos e, também ao colega de

trabalho, Cardoso Augusto Nhambirre, pela troca de impressões.

Tenho a agradecer também à Universidade Licungo, Extensão da Beira, pelos apoios

financeiros concedidos, que tornaram possível o projecto de continuação dos meus estudos.

O meu agradecimento é extensivo a minha família, sobretudo a minha mãe, Maria Sarita;

aos meus filhos: Shirley, Dionísio, Abigail e Amariah; a minha cunhada Julieta Suandique que

puderam suportar as minhas ausências, com paciência e carinho. Aproveito ainda exprimir a

minha gratidão ao meu esposo, quem esteve sempre pronto para me apoiar em todas as

circunstâncias.

Enfim, agradeço a todos aqueles que de uma maneira directa ou indirecta contribuíram

positivamente para o sucesso desta etapa académica, de modo particular aos meus pais

espirituais, pastores Ikechukwu Onwa Amós e Christian Anazodo.


VII

Lista de Siglas e Abreviaturas

AC - Análise Contrastiva

Adv. Q - Advérbio de Quantiddade

CCL - Complemento Circunstancial de Lugar

IMQH - Informante Maquinino Homem

IMQM – Informante Maquinino Mulher

IPNH – Informante Praia Nova Homem

IPNM - Informante Praia Nova Mulher

LB - Língua (s) Bantu

LM - Língua Materna

Neg V - Negação Verbo

LO - Língua Oficial

PB - Português Brasileiro

PBe - Português da Beira

PE - Português Europeu

PM - Português Moçambicano
VIII

PPOM – Panorama do Português Oral de Maputo

S.d - Sem data

SN - Sintagma Nominal

SV - Sintagma Verbal
Sumário

Declaração .............................................................................................. Erro! Marcador não definido.

Dedicatória ............................................................................................................................................ V

Agradecimentos ................................................................................................................................... VI

Lista de Siglas e Abreviaturas............................................................................................................. VII

Resumo ......................................................................................................................................................... X

Abstract ........................................................................................................................................................ XI

CAPÍTULO 0: INTRODUÇÃO E ASPECTOS GERAIS DA CONCEPÇÃO DO TRABALHO ............ 12

0.1 Problematização ...................................................................................................................... 16

0.2 OBJECTIVOS............................................................................................................................. 17

0.2.1 Geral: ......................................................................................................................................... 17

0.2.2 Específicos: ................................................................................................................................ 18

0.3 Motivação ............................................................................................................................... 18

0.4 Justificativa ............................................................................................................................. 19

CAPÍTULO I: VARIAÇÃO (MUDANÇA OU ALTERNÂNCIA) LINGUÍSTICA: RECURSO PARA A


EMERGÊNCIA DO PORTUGUÊS MOÇAMBICANO ........................................................................... 22

1.1 Variação Linguística ............................................................................................................... 23

1.2 Variação Semântica ................................................................................................................ 25

CAPÍTULO II. QUADRO METODÓLOGICO ......................................................................................... 29

2.1 A Entrevista .................................................................................................................................. 29

2.2 Análise de Conteúdo ..................................................................................................................... 33

2.3 Análise Contrastiva ....................................................................................................................... 35

2.4 CONTEXTO HISTÓRICO DA CIDADE DA BEIRA ....................................................................... 36

2.4.1 Descrição dos Mercados de Maquinino e da Praia Nova .......................................................... 37


2.4.2 Características do Português falado na Cidade Beira ................................................................ 40

CAPÍTULO III: DESCRIÇÃO E INTERPRETAÇÃO DOS CORPORA .................................................. 43

3.1. DESCRIÇÃO DOS CORPORA DOS MERCADOS URBANOS DE MAQUININO E DA PRAIA


NOVA 43

3.1.1. Uso de expressões que marcam duração de uma acção ............................................................ 44

3.1.2 Indicação da Proveniência ......................................................................................................... 48

3.1.3 Expressão de Negação ............................................................................................................... 51

3.1.4 Outras variações linguísticas...................................................................................................... 54

CAPÍTULO IV: CONCLUSÕES ............................................................................................................... 58

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................................ 60

APÊNDICE ................................................................................................................................................. 65

1.Unidades significativas de Análise dos Informantes do Mercado de Maquinino ............................ 65

2. Unidades significativas de análise dos Informantes do Mercado da Praia Nova ............................ 69


X

Resumo
O presente estudo debruça-se em torno do tema: «Variação Semântica do Português falado pelos
Comerciantes dos mercados de Maquinino e da Praia Nova, na Cidade da Beira». Com esta pesquisa,
pretende-se perceber a manifestação da variação semântica que ocorre na comunidade de fala de
comerciantes dos mercados urbanos de Maquinino e da Praia Nova, na Cidade da Beira, quando eles
exprimem a duração de uma acção, local de proveniência da mercadoria e negação. Através da entrevista
semi-dirigida, coadjuvada com análise de conteúdo e análise contrastiva, percebeu-se que, nos mercados
em questão, ocorre variação semântica quando os falantes falam de locais de proveniência de mercadoria,
devido de um lado, à interacção da rede social e à relação mental entre as representações imagéticas entre
o significante e o significado, de outro, devido às línguas maternas mais faladas na Cidade da Beira
(cisena e cindau, respectivamente) e o nível de escolaridade dos informantes.

Palavras-Chave: Variação Semântica, Duração, Negação e Locativo.


XI

Abstract
This study focuses on the theme: «Semantic Variation of Portuguese spoken by Traders in the markets of
Maquinino and Praia Nova, in Beira City». The research aims to understand the manifestation of semantic
variation that occurs in the speech community of traders of the urban markets of Maquinino and Praia
Nova, in Beira city, when they express the duration of an action, place of origin of the goods and denial.
Through semi-directed interviews, along with content analysis and contrastive analysis, it was noticed
that, in the afore-mentioned markets, semantic variation occurs when speakers talk about places of origin
of goods due, on the one hand, to the interaction of the social network and the mental relation between the
image representations between the signifier and the meaning, on the other, to the most widely spoken
mother tongues in Beira city (cisena and cindau, respectively) and the level of education of the
informants.

KEYSWORDS: Semantic Variation, Duration, Negation and Locative.


12

CAPÍTULO 0: INTRODUÇÃO E ASPECTOS GERAIS DA CONCEPÇÃO


DO TRABALHO

Com a presente pesquisa, intitulada: Variação Semântica do Português falado pelos

Comerciantes dos Mercados de Maquinino e da Praia Nova, na Cidade da Beira, que pertence à

área de Sociolinguística, pretende-se fazer um estudo sociolinguístico ligado à ocorrência do

português falado na Cidade da Beira, quando eles exprimem a duração de uma acção, local de

proveniência da mercadoria e negação.

Não deixa de ser verdade que a Cidade da Beira, pela sua localização geográfica (Centro

de Moçambique), acomoda indivíduos provenientes de várias partes do mundo, em geral e do

país, em particular, com o objectivo de realizarem actividades profissionais, turísticas e

comerciais. Cada um deles, sendo membro de uma comunidade linguística diferente, necessita de

usar a língua portuguesa, que é oficial em Moçambique, para realizar interacções verbais entre si.

É interesse nesse estudo, perceber como é que a Língua Portuguesa, sendo de Unidade

Nacional e Oficial, é realizada nos vários contextos comunicativos na Beira, especificamente nos

Mercados de Maquinino e da Praia Nova, pois, de acordo com MOURIN (1997, p.71), cada

língua corresponde a uma reorganização de dados de experiências que lhe é sempre particular.

Portanto, a primeira articulação de cada língua constitui, precisamente, a maneira como se

analisa, se ordena, e se classifica a experiência comum a todos os membros de uma determinada

comunidade linguística, fazendo com que esta seja um prisma do qual os seus utentes estão

condenados a ver o mundo determinado pela língua que fala. Por exemplo, o citadino que apenas
13

conhece a árvore não vê o mundo através das mesmas formas do que o camponês que reconhece

e distingue o carvalho, a carpa, entre outros.

Ademais, para se compreender o estudo da variação linguística é importante fazer-se

menção a dois exponentes e extremos que estudaram a língua: Ferdinand de Saussure e William

Labov. Saussure deu um grande contributo no estudo da língua ao elaborar uma teoria linguística

que se baseia em duas dicotomias, nomeadamente: língua e fala; Diacronia e Sincronia. Na

perspectiva desse autor, a língua é um facto social homogéneo, tomada em si mesma, cuja

vitalidade é separada dos factores externos, porque ela é uma estrutura autónoma que se vale das

relações essencialmente linguísticas estabelecidas entre os seus elementos.

Saussure explica ainda que «os fenómenos variáveis não são visíveis na língua, mas na

fala, a sua evolução ou mudança pode verificar-se apenas em alguns elementos, que, no entanto,

seria suficiente para que ela se reflicta em todo o sistema, embora o falante não tenha

consciência dos estados sincrónicos» (COELHO e ALL, 2010, p.13). Em suma, Saussure

pretendia defender a teoria da invariabilidade da língua, alegando que esta possuía uma estrutura

fixa e imutável.

COELHO (2010) salienta o trabalho de William Labov. Para este autor, Labov é o

criador do modelo teórico metodológico que é a Sociolinguística, também conhecida por Teoria

de Variação de Labov, cujo propósito é estudar as variações linguísticas, suas estruturas e

evolução no contexto social de determinada comunidade; inspirado nos estudos de Antoine

Meillet que descrevia a língua como facto social que podia sofrer variações devido a factores

externos. Para Labov, a língua é um sistema heterogéneo, pois os indivíduos de uma comunidade
14

linguística entendem-se e comunicam-se, apesar da diversidade linguística. Todavia, ele sublinha

que a língua deve ser orientada pelas regras categóricas, obrigatórias e invariáveis e pelas regras

variáveis (aquelas que permitem que em certo momento, certos contextos linguísticos se fale de

uma maneira e em outros, de outra forma).

Ainda no contexto da variação, BAKHTIN citado por COELHO (2010) destaca a língua

como sendo fruto da interacção verbal historicamente contextualizada (contexto imediato ou

social mais amplo). Assim, a mudança linguística pode ser motivada por diferentes contextos de

uso da língua que acabam, conferindo diferentes sentidos a mesma palavra. Logo, o contexto real

do uso da língua e os grupos sociais determinam a variação e a mudança de um signo linguístico.

Admitindo que a variação e a mudança são características intrínsecas à língua, o

português está susceptível à mudança e à variação pois é falado em contextos e por redes sociais

diferentes e diversificados. Por exemplo, em Moçambique, por causa do contacto do português

com as línguas bantu e pelo facto de ser falado por pessoas de estrato social, nível de

escolaridade e profissões diversificados, está emergindo uma variedade de português (PM) que

se distancia do outro que é falado em outros países, como prenunciava (GONÇALVES, 1996,

p.48) citado por (STROUD ET GONÇALVES, 1997, p.48): « [...] os desvios à norma europeia,

que ocorrem no discurso, não podem ser analisados como «erros» [...] mas sim como evidências

sobre as características da futura variedade do português, ainda em fase de formação.»

Como se vê, a variedade do Português Moçambicano (PM) era um sonho para

GONÇALVES (1996), mas para TIMBANE (s.d), «o PM é uma realidade presente e cabe a cada

linguista contribuir para a sua descrição, bem como na criação de gramáticas e de dicionários que
15

reflectem esta realidade moçambicana.» É na senda de TIMBANE (s.d) que vários estudos foram

realizados e concluíram que o português falado em Moçambique apresenta mudanças que

afectam mais os níveis fonético-fonológico, sintáctico e semântico que o nível morfológico,

GONÇALVES (2000), DIAS (2009) e MACHUNGO (s.d), devido a factores como contactos

com as línguas bantu, empréstimos, neologismos, níveis de escolarização, estrato social, etc.

A Sociolinguística, revela que toda a língua falada, apresenta variações decorrentes da

heterogeneidade presente nos fenómenos linguísticos, as quais são identificadas e analisadas por

meio de pesquisas de campo. Deste modo, o sociolinguista, ao realizar o seu estudo deve

registar, descrever e analisar sistematicamente essas variações, relacionando-as com os factores

sociais, numa tentativa de identificar qual factor ou grupo de factores é o responsável por

determinada variação. Ainda, ele deve interessar-se em perceber de que maneira a língua

portuguesa é operacionalizada ao nível de fala pelos seus usuários e que factores sociais

concorrem para esta ocorrência.

Como se vê, com o presente trabalho, pretende-se verificar as ocorrências de variação

semântica do português que é falado pelos comerciantes da Cidade da Beira, concretamente, nos

mercados de Maquinino e da Praia Nova e de seguida fazer um estudo comparativo dessas

ocorrências, tendo em conta os aspectos convergentes e divergentes.

Interessa a escolha dos 2 (dois) mercados, primeiro por serem locais onde há fluxo

populacional constituído por indivíduos pertencentes à diferentes comunidades linguísticas,

podendo ser nativos da Cidade da Beira, provenientes de outras províncias de Moçambique ou

estrangeiros, que contribuem para o fortalecimento comunicativo da língua. Segundo, por


16

concentrarem, diariamente, vendedores de diferentes faixas etárias (jovens e adultos), com níveis

de escolarização e línguas maternas diferentes, no entanto com o intuito de veicular informações

entre si ou com seus clientes, tendo como recurso a língua portuguesa e também pelo facto de

serem mercados de grande movimentação de pessoas e produtos localizados na parte central da

cidade.

0.1 Problematização

A língua portuguesa foi herdada pelos moçambicanos no acto da colonização portuguesa.

Mas, naquele momento, eram poucos os moçambicanos nativos que podiam falar esta língua,

visto que o número de analfabetos era elevado. Depois da independência, o Estado

Moçambicano adopta-a como língua oficial e incrementa-se o número de falantes porque o

número de pessoas a frequentar a escola também sobe, por exemplo, de acordo com os dados

estatísticos do Censo Populacional Moçambicano de 2017, a taxa de analfabetismo baixou de

50.4% em 2007 para 39% (INE, 2019). Outrossim, o fluxo populacional do campo para a cidade

e vice-versa, faz com que a língua portuguesa seja a única a ser usada para as transacções

comerciais, profissionais, religiosas, políticas e culturais. Veja-se também que nem todos esses

falantes, utilizavam o português corrente, por não serem escolarizados.

Portanto, consciente de que em interacções verbais em língua portuguesa, entre vários

grupos sociais de comunidades linguísticas diferentes, como por exemplo, na conversa entre

amigos na rua, vizinhos no bairro, colegas de escola, grupos de whatsap, colegas de trabalho,

pescadores, vendedores dos mercados, entre outros, há desvio da norma da língua portuguesa,

realizou-se um estudo em grupo e individualmente, durante a prossecução do módulo língua e


17

sociedade, em alguns mercados da Cidade da Beira, para aferir o nível de influência das línguas

bantu no português falado nesses mercados. Foi a partir deste estudo, que se ficou persuadida da

necessidade de se realizar uma pesquisa mais complexa nesses mercados, porque se constatou

existir uma particularidade do português falado naqueles mercados, na área de semântica,

sobretudo no uso das expressões que indiquem o lugar da proveniência da mercadoria; uso de

expressões que marquem o tempo da sua permanência na actividade comercial e o uso de

expressões que determinem a frequência de clientes para compra da sua mercadoria. Face a esta

constatação, nasce a seguinte preocupação:

• Como é que a variação Semântica do português ocorre nos mercados do Maquinino e da Praia

Nova?

Como se vê, é esta a questão que vai nortear a presente pesquisa. Para tal, propõem-se as

seguintes metas.

0.2 OBJECTIVOS

Para a prossecução da questão colocada precedentemente, avançam-se os seguintes propósitos

ou objectivos:

0.2.1 Geral:
Perceber a ocorrência da variação semântica, do português falado pelos comerciantes da

Cidade da Beira, especialmente dos mercados de Maquinino e da Praia Nova. Portanto, para o

cumprimento desta meta é importante concretizarem-se os seguintes objectivos específicos:


18

0.2.2 Específicos:

• identificar as variações linguísticas do domínio de semântica, atinente ao uso de expressões que

marquem a duração de uma acção; indicação de proveniência e expressão de negação;

• descrever as variações semânticas predominantes que ocorrem nos dois (2) mercados em estudo

e;

• comparar as variações semânticas que ocorrem nos 2 (dois) mercados em estudo com a norma

europeia.

0.3 Motivação

Durante muito tempo, a pesquisadora deparou-se com situações em que as pessoas, no

acto da sua comunicação, falavam de diferentes formas, em contextos variados, sobretudo em

contexto informal, embora não afectasse o entendimento das mensagens veiculadas em tais

discursos. Mesmo assim, não deixava de ser um ruído linguístico para quem é falante fluente do

português padrão.

Quando a pesquisadora ingressa na Universidade Pedagógica, em 2006, para frequentar o

curso de Ensino de Português, a visão sobre o purismo e o variacionismo da língua ficou mais

clara, graças aos trabalhos académicos realizados ao longo da formação nas áreas de língua

portuguesa, sociolinguística e literatura. Ademais, estes trabalhos suscitaram curiosidade da

pesquisadora no que toca à emergência do Português Moçambicano (PM), fruto de interferência

linguística das línguas bantu no português moçambicano e vice-versa.


19

Foi por isso, que em 2010, a estudiosa desenvolve, no âmbito da sua Monografia

Científica para culminação do curso, um estudo na área da Sociolinguística, intitulado: A

Criatividade Linguístico-literária na obra Terra Sonâmbula, de Mia Couto, por ela ter notado

que a obra transpunha um alargamento das marcas do português falado em Moçambique, que

mereciam muita atenção no panorama da evolução do português na África-Lusófona.

Em 2017, quando a pesquisadora ingressa para a Universidade Zambeze e cursa o

Mestrado em Língua e Literatura Portuguesa, retoma o desejo de voltar a falar do assunto, tendo

tido marcas principais em trabalhos realizados em Língua e Sociedade, Diversidades Culturais e

Morfossintaxe Comparada do Português e, a “veia” de querer continuar a realizar o estudo ligado

à variação linguística, retoma, pois nos locais por onde foram colhidos dados para o

desenvolvimento das pesquisas para os módulos acima referidos, houve sempre essa propensão

de ocorrência de falares específicos para um certo espaço, como é caso de vendedores dos

mercados destacados para o presente estudo. Estes factos passam a ser a força motriz que

impulsionou a realização desta pesquisa.

0.4 Justificativa

Estudar uma língua pressupõe estudar a maneira como ela é usada nos vários contextos

comunicativos. É deveras pertinente estudar a variação semântica do Português falado pelos

vendedores dos mercados de Maquinino e da Praia Nova porque, os mercados são espaços onde

ocorrem contactos linguísticos entre pessoas de idades, sexos, culturas, línguas e níveis sociais

diferentes, que podem propiciar a emergência de variações linguísticas no domínio da semântica,


20

que mereça um estudo para a sua descrição e explicação e que podem, igualmente, garantir a

existência de um português moçambicano particular.

Portanto, com este estudo, pode-se, de um lado, permitir a valorização das diferenças e

semelhanças variacionais à língua portuguesa falada nesses mercados, como elemento de

equilíbrio e unidade social entre os falantes, de outro pode permitir o começo de um estudo

sociolinguístico na região Centro de Moçambique e o mapeamento das variações ocorridas,

atendendo a que vários estudos têm sido feitos no âmbito das outras regiões do país, com

destaque para a zona Sul.

Outro aspecto não menos importante revela-se no facto de que, com o presente estudo,

pode-se, de certa forma, desconstruir as atitudes e comportamentos discriminatórios decorrentes

da linguagem, isto é, através dos resultados deste estudo o erro deixará de ser atribuído um valor

discriminatório para os puristas da língua e passa ser considerado um passo importante para o

reconhecimento de falantes de diferentes variedades linguísticas e de emergência de um

português falado por vendedores dos mercados (comerciantes). Deste modo, os utilizadores

dessas variantes do português têm maior participação na vida pública e política do país e criam

maior aproximação dos interlocutores em determinadas situações de interacção comunicacional.

Para a realização do presente trabalho tomou-se como recurso a análise de conteúdo

baseada nos estudos de LAVILLE ET DIONE (1999); análise contrastiva orientada pelos estudos

de MAGRO (s.d) e entrevista, norteada pelos trabalhos de MANZINI (s.d), (SANTOS, 2009),

COELHO et all (2010), GONÇALVES (1997) e STROUD ET GONÇALVES (1997).


21

Este trabalho está organizado da seguinte maneira: a primeira parte apresenta os aspectos

teóricos, marcados pela revisão bibliográfica em torno da variação linguística, da noção de

semântica, a questão da mudança linguística e registo ou alternância linguística; em seguida,

descreve-se a situação do português em Moçambique. Na terceira parte, destaca-se a questão do

português falado nos mercados urbanos da Cidade da Beira. Nesta parte, dá-se enfoque ao

instrumento de colecta e de tratamento de dados; a amostragem e a análise dos resultados. No

fim, apontam-se as conclusões, as referências bibliográficas e os apêndices.


22

CAPÍTULO I: VARIAÇÃO (MUDANÇA OU ALTERNÂNCIA)


LINGUÍSTICA: RECURSO PARA A EMERGÊNCIA DO PORTUGUÊS
MOÇAMBICANO

Moçambique, sendo um país multilingue, de acordo com os dados do Instituto Nacional

de Estatística, publicados pelo Ministério da Educação (2010), avançado por TIMBANE (2012,

p.2); conta com vinte e uma Línguas Bantu (LB) e uma língua europeia - o Português, que é

oficial, segundo a Constituição da República do país e falado por 10.7% dos moçambicanos.

Todavia, não se pretendem excluir os espaços ocupados pelo inglês e francês em Moçambique,

fruto das políticas linguísticas adoptadas pelos governos moçambicanos, depois da

independência.

De acordo com o mesmo autor, a língua portuguesa não é falada pela maioria da

população, pois maior parte dela (cerca de 85.2%) fala as LB. Uma vez que uma língua nunca é

estática, o português encontra-se, neste caso em constante desenvolvimento. Logo, neste

percurso evolutivo da língua portuguesa, entram em jogo factores de vária ordem: uns inerentes a

própria língua, os chamados factores internos e outros factores inerentes às comunidades de fala,

que provêm do seu contacto com as outras línguas. Deste modo, de acordo com a localização,

género, a língua materna, nível de escolaridade, profissão, faixa etária, a língua portuguesa sofre

ora mudança, variação ora alternância linguística.

Enfim, antes de se avançar o estudo, passa-se em revista, algumas pesquisas feitas em

torno da variação linguística (mudança ou alternância linguística) e de variação semântica, pois é

aquela que se elegeu para o presente estudo.


23

1.1 Variação Linguística

É verdade que a língua é um fenómeno social, isto é, ela é criação do homem enquanto um

ser social, que necessita de comunicar com outro que lhe é semelhante. Embora os signos

linguísticos e as estruturas linguísticas de base das línguas criadas por uma determinada

comunidade de língua sejam comuns, nem todos os membros das famílias falam da mesma

maneira. Para elucidar mais o que se disse anteriormente, COELHO (2010, p. 27), seguindo a

visão de LABOV, escreve:

não existe uma comunidade de fala homogénea, nem um falante-ouvinte ideal. Pelo
contrário, a existência de variação e de estruturas heterogéneas nas comunidades de fala é
um fato comprovado. Existe variação inerente à comunidade de fala – não há dois
falantes que se expressam do mesmo modo, nem mesmo um falante que se expresse da
mesma maneira em diferentes situações de comunicação. Podendo desta feita a variação
ocorrer nos seguintes níveis linguísticos: lexical, fonológico, morfo-fonológico, morfo-
sintáctico, variação sintáctica, variação e discurso.

Como se vê, para a língua garantir a sua sobrevivência, recorre ao fenómeno variação nas

diversas áreas que a compõe, como por exemplo, léxico, fonologia, morfo-fonologia,

morfossintáctica, semântica, entre outras áreas. A visão variacionista da língua, de Labov é uma

crítica à linguística pura de Saussure, que não admite a influência dos factores externos da língua

para a sua evolução.

Para Labov, o estudo de uma língua não pode cingir-se apenas aos aspectos internos

inerentes a própria língua, mas também à análise dos factores externos que influenciam a

ocorrência de variação linguística que concorrem para a emergência de uma variante de língua.

Todavia, admite-se que as características particulares que marcam esta variante devem apresentar

uma estabilidade ao longo de um período razoável de tempo e sustentada pela comunidade de

fala ou linguística. De acordo com a citação em análise, os factores que podem determinar a

diferenciação de variantes linguísticas são os de ordem geográfica e social. Entretanto,


24

TARALLO e LABOV citados por BORSTEL (2014, p. 4), admitem também que a variação e/ou

mudança linguística ocorre por factores propriamente linguísticos.

É por esse motivo que COELHO (2010, p.25) diz que “a variação é algo ligado à língua,

por isso não compromete o seu sistema linguístico nem a possibilidade de comunicação entre os

falantes, mas sim constitui uma riqueza em termos de significado social, e têm o poder de

comunicar a nossos interlocutores mais do que o significado representacional pelo qual

disputam”. Assim, apesar de diversidades na forma de uso de certa língua, este factor não ditará

que esta seja melhor ou pior que a outra, mas sim, continuará exercendo seu papel na sociedade.

O português, no caso específico de Moçambique, não está alheio às situações descritas

nos parágrafos acima. Ele está também sujeito a variações que, de acordo com TIMBANE (s.d),

p.3), «é sempre potencialmente um impulsionador de mudança. Como a mudança é gradual, é

necessário passar primeiro por um período de transição em que há variação, para em seguida

ocorrer a mudança». Segundo o mesmo autor, a mudança e a variação estão estreitamente

relacionadas, por isso, é muito difícil estudar uma sem estudar a outra.

De acordo com a pretensão do presente estudo, interessa, pois destacar as definições de

BORSTEL (2014, p.5), segundo as quais, variações linguísticas são «maneiras de dizer as coisas,

mas de forma diferente» e a de TIMBANE (S/A, p.3), que descreve a variação linguística «como

a forma que uma determinada comunidade linguística se diferencia de outra, sistemática e

coerentemente, tendo em conta os contextos sociais».

Concluindo, atinente à variação linguística, é preciso sublinhar o seguinte:

em primeiro lugar, a ideia de que um conjunto de características lexicais ou


gramáticas adquire o estatuto de variante linguística pelo simples facto de
subsistir numa comunidade linguística, como é caso de (moçambicanos). Em
segundo lugar, que todas as variantes têm idêntico interesse e dignidade
enquanto objecto de estudo, uma vez que todas elas são sistemas organizados
25

por uma gramática. Assim, tanto é uma variante do português com interesse
científico, por exemplo, aquela que sistematicamente se flexiona às formas da
segunda pessoa do singular do pretérito perfeito simples por analogia do
presente do indicativo; ou aquela variante, tão frequente em muitas regiões do
país e grupos populacionais (PERES & MÓIA, 1995, p. 35).

1.2 Variação Semântica

O objecto do presente estudo é a variação linguística, no nível semântico. Sendo assim, acha-

se importante que se lance, antes de tudo, um olhar superficial em torno da noção de Semântica,

como uma estratégia de busca de fundamentos que possam explicar, de um lado, a visão teórica a

se ter em conta para a descrição dos fenómenos variáveis que se propõem estudar e de outro,

encontrar as bases que justifiquem o comportamento linguístico dos falantes entrevistados.

CANÇADO (2008), BASSO et all (2009) e SILVA (2010) definem a semântica como uma

área da linguística que se preocupa com significado ou sentido linguístico (aquele que é

veiculado pelas palavras ou frases que pertençam a uma língua natural). Pois, os significados não

linguísticos (significados atribuídos à símbolos) não são analisados na Semântica.

Os mesmos autores estabelecem uma distância entre a Semântica e a Pragmática, baseada na

finalidade. Para se compreender essa distinção, toma-se o exemplo seguinte: (1) Assim, vindo de

onde, mano? Diante desta frase, de acordo com os autores, a Semântica preocupar-se-ia com o

significado da frase (o que a frase quer dizer?) e a Pragmática com o significado do falante (o

que o falante quer dizer com a frase?). Porém, quer para a interpretação Semântica quer para a

Pragmática de uma palavra ou frase, requer-se que os interlocutores tenham o conhecimento do

mundo e da relação entre a linguagem e o mundo. Mas esse conhecimento é, muitas vezes,

implícito, porque segundo BASSO et all (2009, p.32) «os possíveis nexos semânticos são fruto

de um conhecimento semântico implícito.»


26

Voltando ao exemplo (1), para que um sujeito possa identificar o significado dessa frase

usaria seis (6) perspectivas (teorias) subjacentes, CANÇADO (2008,p.34):

a) Formal - que permite encontrar o significado a partir do conhecimento das condições da verdade

e da composição ou da decomposição da frase, quer dizer, o falante tem um conhecimento

implícito de encontrar o significado de uma palavra ou frase a partir do significado das partes

mínimas que a compõe, tais como assim, vindo, de, onde, mano. Logo, na visão formal, a

(de)composicionalidade explica a criatividade e a capacidade de se estar a «todo instante

construindo e interpretando palavras ou frases que nunca ouvimos antes» (BASSO & ALL,

2009, p. 31);

b) Cognitivista - que permite perceber que a língua tem uma relação com a representação mental.

A partir dessa perspectiva, o significado é construído na base de protótipos, metáforas,

metonímia e esquemas imagéticos ou conceptuais, orientados por um mapa da semântica lexical

assente na Semasiologia e na onomasiologia. O falante se apoia em semasiologia (significação)

quando parte da palavra ou expressão para encontrar os diferentes sentidos a ele associados,

apoiando-se da descrição dos vários sentidos (polissemia) da palavra ou expressão. E quando ele

toma o conceito como ponto de partida para encontrar as diferentes palavras ou outras

explicações que o designam, recorre-se à onomasiologia (nomeação). (CANÇADO, 2008, p.34).

Repare-se a frase (1), tendo em conta o que se destaca no parágrafo precedente, o falante

tem a possibilidade de construir sentidos diferentes, tais como, procurar saber da nacionalidade;

lugar de proveniência de alguém; lugar de chegada; naturalidade; língua falada, etc e


27

identificar outras construções que remetam a mesma significação, como as seguintes: (1.a.) De

onde é que o senhor vem? (1.b) Irmão, chegas de onde? (1.c) Qual é sua nacionalidade?

c) Representativa - é uma perspectiva que acredita que a mente pode representar uma realidade

porque apresenta as formas das representações mentais internas que constituem a estrutura

conceitual inata que experimenta relações formais com os outros níveis de representações

(sintáctico, fonológico, etc.). Em outras palavras, a mente humana é um depositário de referentes

que encontram substância quando se associam a uma estrutura sintáctica. No contexto da frase

(1), cada uma das palavras apresenta um conceito, mas que ganha uma função quando inserida

na estrutura frásica.(CANÇADO, 2008, p.35).

d) Argumentativa - para esta perspectiva, a verdade e as condições da verdade de uma frase não

têm maior importância porque a frase é pronunciada como parte de um discurso em que o falante

tenta convencer o interlocutor de hipóteses. Admitindo esse pressuposto, não seria nenhum

problema que uma palavra ou frase tivesse vários significados, dependendo do seu uso. Assim, é

evidente que não há limite entre a Semântica e a Pragmática. Esta visão Semântica é assente na

ideia de que há interesse em contar com categorias descritivas que dizem respeito mais ao

possível uso dos falantes/ouvintes do que a Sintaxe ou ao conteúdo objectivo da frase

(CANÇADO, 2008, p.35).

Uma das noções envolvidas na análise desta visão é a escala, que tem uma implicação em

fenómenos linguísticos, como uso de até, da negação, conjunções coordenativas (mas, pois, já

que) e subordinadas e escolha de perspectiva (Eu trabalho com João/João trabalha comigo) e

nas expressões de polaridade negativa.


28

e) Acto de fala - esta teoria de CANÇADO (2008, p.36) advoga que o sentido de uma frase tem

uma função social porque os significados das palavras ou das frases encerram em si

especificidades culturais de uma sociedade, mesmo aquelas que aparentam ser universais. Aqui,

chama-se atenção também ao papel dos estereótipos, das normas semânticas, dos significados

sociais da variação da língua e a importância das frases não declarativas, como por exemplo,

como fazer uma pergunta, dar ordens, agradecer, etc. Analisam-se igualmente as implicações

conversacionais, a questão da felicidade da frase e os actos locutórios, ilocutórios e

perlocutórios.

f) Lexical - a semântica lexical estuda a estrutura argumental e a ligação entre uma estrutura

sintáctica e uma estrutura semântica. Exploram-se as noções do papel temático, hierarquia

temática, assumindo a existência de um módulo sintáctico. Outrossim, o léxico deve ser

estruturado de forma organizado e composicional de forma a gerar novas estruturas e as palavras

podem relacionar-se entre si, construindo os sinónimos, antónimos e homónimos (CANÇADO,

2008, p.36).

Enfim, não querendo perder-se no mundo complexo da Semântica, acredita-se que já estão

lançados os pressupostos teóricos que poderão, de um certo modo, explicar o posicionamento da

autora do texto face à análise das frases que apresentem características variacionais.
29

CAPÍTULO II. QUADRO METODÓLOGICO

No contexto da metodologia usada, recorreu-se à entrevista semi-estruturada para a

colecta de dados, uma vez que, segundo ETTO e CARLOS (2017, p.726), «a metodologia de

uma pesquisa sociolinguística exige que os dados sejam colectados por meio de entrevistas

estruturadas, previamente elaboradas pelo pesquisador». E, para o seu tratamento, foram optadas

as Análises de Conteúdo e Contrastiva.

2.1 A Entrevista

Para a realização do presente estudo, utilizou-se o método de observação directa da

língua falada em situações naturais de interacção social face à face. Para a sistematização dos

dados observados, foi usada a entrevista sociolinguística ou individual semi-estruturada,

focalizada no processo de interacção, feita por meio de um roteiro de perguntas, procurando

responder aos objectivos do presente estudo.

As entrevistas foram gravadas em áudio através do gravador avançado baixado da

internet e realizadas em 2 (dois) dias, para a maximização de tempo para as outras etapas do

trabalho. Segundo MANZINI (S.d, p.3), para a operacionalização da presente pesquisa, foram

seguidos os seguintes momentos:

Em primeiro lugar, identificação da amostra, cuja definição baseou-se em três células

sociais (faixa etária -jovens e adultos; nível de escolarização - escolarizado e não escolarizado e

língua materna), por se achar que elas contribuem para a ocorrência das variações semânticas do

português europeu no seio dos comerciantes dos mercados em estudo.


30

Portanto, são no total trinta (30) informantes, dos quais quinze (15) mulheres e quinze

(15) homens, escolhidos aleatoriamente. Esta proposta, estratifica a amostra, dividindo a

população em “células” compostas cada uma, de indivíduos com as mesmas características

sociais, como advoga OLIVEIRA E SILVA (2003, p.120) citados por SANTOS (2009, p.69)

subsidiados por COELHO et all (2010), ao referir que, no contexto de uma pesquisa

sociolinguística todos os comerciantes dos mercados em estudo têm a mesma chance de serem

escolhidos por apresentarem as mesmas características, tendo em cada célula social para cada

mercado um total de cinco (5) informantes. Como ilustra a tabela a seguir:

Escolarizado Língua Materna

Faixa etária Escolarizado Não escolarizado

Jovens 5 5 5

Adultos 5 5 5

Total 10 10 10

Amostra = 30

Fonte: Autora

Foram escolhidos, primeiramente, os jovens e adultos, como amostra, por se entender, de

acordo com GONÇALVES (1997, p. 23), que é nestas faixas etárias que se usa um leque mais

amplo de variantes em geral.

Em segundo lugar, definiu-se o guião de entrevista com três perguntas esclarecidas pelos

respectivos objectivos. As perguntas estão orientadas para a identificação de variação no

domínio semântico, como se tem referenciado ao longo do trabalho, sobretudo quando os

falantes pretendem dizer o tempo em que desenvolvem a actividade; indicar a proveniência das
31

suas mercadorias e apontar o tipo de advérbio de negação que usam para dizerem que não têm

tido clientes, que se avançam na tabela que se segue:

1. Expressão de 2. Indicação de 3. Expressão de Outras1

duração tempo proveniência Negação

Há quanto tempo De onde é que vêm os Têm vindo muitos

trabalha aqui? produtos que estão a clientes à procura dos

vender? seus produtos?

Fonte: Autora

O terceiro passo correspondeu à colecta de dados. Antes, foram testados o instrumento de

pesquisa, as estratégias e o guião de entrevista para a avaliação da sua eficiência. No acto da

realização das entrevistas, para a facilitação do contacto com os entrevistados e desinibi-los,

assumiu-se a identidade de estudante da Unizambeze em busca de experiência na área de

negócio. Utilizou-se, por vezes, a língua e o nível de língua dos entrevistados e foram comprados

certos produtos. Foram igualmente, durante esta etapa, experimentadas situações em que as

informações eram passadas por via de interacção verbal e não-verbal (dados de natureza

observacional, como por exemplo, barulho, vozes de outras pessoas que, de algum modo,

puderam afectar a transcrição das entrevistas) expressões faciais, mensagens corporais e

quinésicas.

1
Questões que ocorreram como estratégia de fazer com que os informantes se expressassem mais.
32

O quarto momento refere-se a pré-análise ou transcrição que foi precedido pela

codificação dos informantes. QUEIRÓS (1983) citado por MANZINI (s.d., p.4) diz que a

transcrição é a reprodução de um documento (gravação) num segundo exemplar (material

escrito) e que deve exibir total conformidade e identidade com o primeiro. Cada informante foi

codificado de acordo com as letras iniciais dos nomes dos mercados em estudo, enumerados a

partir de 1 em diante e descriminados por sexo (masculino/feminino), como forma de criar mais

clareza, no momento da interpretação dos dados. Por exemplo: IMQH1/M1 (Informante do

Maquinino Homem ou Mulher) e IPNH1/M1 (Informante da Praia Nova Homem/Mulher).

A transcrição foi feita manualmente, orientada pelas questões e pelos fenómenos

variáveis. Cada ficha de entrevista corresponde a apenas um informante e as variações em estudo

(semânticas) foram categorizadas de acordo com as áreas variacionais (expressão de duração de

uma acção, indicação de proveniência, expressão de negação e outros - que congregam todas

aquelas variações resultantes da interacção do falante com o entrevistador), indicados com

recurso ao alfabeto português. (Vide os apêndices).

Reconhecendo a inexperiência da investigadora, por esta actividade ser fastidiosa e por o

material gravado apresentar muitos ruídos, acabou-se seguindo os pressupostos de

MARCUSCHI (1986) e de QUEIRÓS (1983) apud MANZINI (s.d) para a prossecução desta

tarefa. Estes autores advogam que não há melhor transcrição, porque ela é uma questão

complexa. E sublinham que mesmo que ela seja fiel e consiga apresentar uma boa produção do

material gravado, ela não conseguiria captar todas as informações apresentadas nas entrevistas,

porque o transcritor poderá recorrer-se a mutilações. Mas para o efeito, acorreu-se aos catorze

sinais propostos por MARCUSCHI (1986) apud MANZINI (s.d).


33

À semelhança das transcrições do corpus de PPOM, foram registados todos os elementos

que pudessem contribuir para uma correcta interpretação das estruturas semânticas ocorridas no

discurso dos entrevistados (STROUD ET GONÇALVES, 1997, pp.101-123). Ademais, os

vocábulos foram transcritos usando a ortografia portuguesa. No caso de ocorrência de palavras

estrangeiras (inglês, cindau e cisena), pronunciadas como na língua de origem, estas foram

escritas de acordo com a ortografia da língua em questão.

2.2 Análise de Conteúdo

Segundo LAVILLE ET DIONE (1999, pp. 214-215), o método de Análise de Conteúdo

serve para estudar minuciosamente o conteúdo contido num texto, em frases e palavras que o

compõem, procurando captar o seu sentido com a intenção de comparar, avaliar, reconhecer o

essencial e seleccioná-lo em termos de ideias principais. Ele é, muitas vezes, usado para

examinar ideologias políticas implícitas nas notícias dos jornais ou assuntos relacionados com

preconceitos de raças e géneros subjacentes aos textos escolares ou outros. Também é utilizado

para demonstrar a estrutura e os elementos desses conteúdos com o intuito de esclarecer suas

diferenças e extrair delas sua significação.

Enfim, o método proposto por LAVILLE ET DIONE é usado para estudar atitudes,

valores, representações, mentalidades, ideologias e esclarecer fenómenos sociais, em matéria de

comunicação, como por exemplo, os estereótipos veiculados pelas publicidades. Ele

compreendeu as seguintes etapas:

1ª - Recorte de conteúdos (elementos de classificação ou de registo): feita em função da

sua significação e a intenção da pesquisa. Assim, as expressões recortadas justificam o tema em


34

estudo e a aproximação da pesquisadora ao sentido do conteúdo, pois ela viu-se obrigada a

construir as suas unidades de análise a partir da compreensão que tem do corpus e das perguntas

orientadoras da presente pesquisa;

2ª - Definição das categorias analíticas: rubricas sob as quais são organizadas as unidades

analíticas, baseadas nas intenções da autora/pesquisadora, nos objectivos da pesquisa e no

conhecimento que a mesma tem acerca da área de estudo;

3ª - Agrupamento das unidades analíticas em categorias: as palavras /frases e unidades

temáticas/analíticas são enumeradas para permitir um tratamento estatístico ou ainda organizadas

em temas. E para dar mais importância a cada tema, faz a descrição, as vezes, além da frequência

da sua ocorrência, para dar uma medida mais precisa do seu lugar no conjunto de conteúdos.

4ª - Pré-exploração dos corpora das entrevistas em unidades de análise: nesta fase, foram

seleccionadas as unidades significativas ou estruturas sintácticas de análise, indicando as

categorias variacionais, tendo em conta os objectivos da pesquisa e do entendimento que a

pesquisadora tem acerca do tema, do conteúdo da entrevista e do enquadramento teórico.

5ª - Descrição e interpretação de dados: tratando-se de uma pesquisa qualitativa, a

descrição é geralmente de outra ordem: para cada uma das categorias produz-se um texto síntese

em que se expressa o conjunto de significados presentes nas diversas unidades de análise

incluídas em cada uma delas. Faz-se o uso intensivo de “citações directas” dos dados originais

para elucidar a argumentação. Com o apoio da Filosofia da Linguagem assente nas teorias

avançadas pelos autores destacados para o estudo, procura-se ir além, atingindo uma

compreensão mais aprofundada do conteúdo das mensagens através da interpretação.


35

2.3 Análise Contrastiva

A Análise Contrastiva de acordo com Magro (S/d, p.124) constitui um dos métodos

usados no aprimoramento do ensino de Línguas Estrangeiras. Assente no ramo da Linguística

Aplicada, oferece excelentes subsídios em aspectos teóricos do processo de aquisição da

linguagem e do conhecimento linguístico em geral.

Para Magro (S.d, p.125), este método centra-se essencialmente na interferência que uma

língua pode trazer noutra, por exemplo, a autora cita o facto apresentado por MACKEY (1965,

80):

o método contrastivo é uma base extremamente valiosa para o Ensino de


Línguas Estrangeiras, pois muitas das dificuldades na aprendizagem de uma
segunda língua se devem ao facto de que esta difere da língua materna do
aprendiz. Assim, subtraindo-se as características da primeira das da segunda, o
que sobrar é provavelmente uma lista das dificuldades do aluno. Onde os
sistemas contrastados apresentam semelhanças, o aprendizado da segunda língua
será mais fácil e onde forem detectadas diferenças ocorrerão erros, pois se
tratando de áreas de difícil manipulação, os alunos tenderão a usar formas da
LM para suprir a insuficiência de suas habilidades até que consigam dominá-las
por completo. Este afeito decorrente do sistema da LM que agindo sobre o da
LE se chama de interferência e sobre ela é fundada a Análise Contrastiva.

A análise contrastiva concentra-se pois, nos aspectos linguísticos da interferência da LM

e é em função de sua predição e explicação que ela existe. Portanto, WARDHAUGH (1970),

citado por Magro (S.d) apresenta duas abordagens possíveis em AC:

• Versão fraca, que de acordo com o nosso estudo, consiste em colectar as possíveis variações e

então explicá-las com base na Análise Contrastiva dos sistemas envolvidos na aprendizagem;

• Versão forte, que e procede através de uma comparação sistemática entre dois ou mais sistemas

linguísticos, destacando-se seus pontos semelhantes e diferentes.


36

Com este método, pretendemos fazer o levantamento das variações semânticas que

possam ocorrer nos mercados de Maquinino e da Praia Nova, ilustrando as suas diferenças e

semelhanças em relação ao Português Padrão e, ao mesmo tempo fazer o levantamento de um

banco de dados atinentes ao tipo de variação predominante.

2.4 CONTEXTO HISTÓRICO DA CIDADE DA BEIRA

O presente estudo foi realizado em dois (2) mercados da Cidade da Beira, por isso, antes

de descrever o português nela falado, é mister desenhar uma radiografia da urbe. Decide-se fazer

essa abordagem porque se pensa que os traços a serem ressaltados nesta parte do estudo podem

determinar o fenómeno da variação linguística.

Até 1888 na Beira funcionava uma escola com alunos do sexo masculino, cuja frequência

era de 22 alunos. Poucos eram os que falavam ou tinham conhecimento da Língua Portuguesa.

Os muzungos2 que sabiam falar a língua só a empregavam nas suas relações com europeus e nas

repartições que não podiam deixar de a falar.

Actualmente, a Cidade da Beira dispõe de uma grande rede escolar (Ensino Primário,

Secundário e Universitário). E a maior parte da população sobrevive do comércio de produtos

agrícolas, pesqueiros e pecuários devido a sua característica e localização. De acordo com o

censo populacional de 2017, citado pelo Instituto Nacional de Estatística, a cidade possuía uma

população de 592.090 habitantes, dos quais 295.362 mulheres e 296.728 homens. Na maioria

2
Brancos em cindau
37

deles pertenciam ao grupo Bangwe entre os machangas, matewes e podzos provenientes do Vale

do Zambeze.

Portanto, a diversidade linguística de Moçambique, é uma das principais características

culturais, existindo uma diversidade de idiomas. Apesar da língua portuguesa ser a LO (Língua

Oficial) do país, para a maioria da população, estes idiomas nacionais constituem a sua língua

materna e a mais utilizada na comunicação diária.

Embora sejam de proveniência diversificada, segundo NGUNGA & BAVO (2011) os

beirenses (habitantes da Beira) têm competência linguística em cindau, cicena e português, quer

dizer, não só falam a sua língua como também falam pelo menos duas (2) línguas. No contexto

linguístico inter- geracional e atitude linguística, o cindau e cisena são aprendidos nas ruas

(informalmente) e é a preferência linguística dos adultos. Na Cidade da Beira, o português é

falado por cerca de 36% da população, seguido das línguas maternas, o cisena e o cindau com

24% e 23%, respectivamente.

2.4.1 Descrição dos Mercados de Maquinino e da Praia Nova

O mercado de Maquinino, localizado na zona central da Cidade da Beira (Chaimite), sempre

existiu desde o período colonial, com apenas um pavilhão. Segundo fonte oral advinda do

funcionário do Conselho Municipal da Beira3, antes da independência, os portugueses

reservaram a parte da reserva do Chiveve, para a edificação de lojinhas para a venda de produtos,

o caso da venda de galinhas.

3
Steni Martinho, Técnico dos Serviços Municipais de Indústria, Comércio, Mercados e Feiras do Conselho
Municipal da Beira
38

Com a ida dos portugueses, um dos trabalhadores de um português que tinha lojinhas deu

continuidade ao negócio que o seu patrão português fazia, tornando-se o primeiro negro a erguer

o seu negócio de venda de galinhas. Com a sua falência, depois de 1975, apareceu um

comerciante muçulmano designado de Bai (monhém), nos anos 1983-1990, que comprou os

estabelecimentos e passou a usá-los para a venda de produtos diversos. Em forma de incentivo da

compra, dava rebuçados aos seus clientes que chamavam de “quinino”. Devido a influência da

língua materna cindau, os clientes passaram a dizer (vamos ao Maquinino) que traduzido do

cindau é (Tendeni kumaquinino) daí que o mercado passou a designar-se de Maquinino, até aos

dias de hoje.

Por volta dos anos 2000-2004, o mercado foi se alastrando cada vez mais, tendo mais

vendedores, daí que o Conselho Executivo, na altura sob governação de Chivavice Muchangage,

ergueu-o como Património Municipal, passando a ser um mercado formal, albergando um total

de 896 vendedores, fora dos informais. Actualmente, alberga indivíduos de diversas partes da

Província de Sofala (Búzi, Machanga, alguns nativos) e também estrangeiros, segundo dados

obtidos até ao último dia da ocorrência do ciclone Idai4.

Por sua vez, o Mercado da Praia Nova, localizado na orla do Oceano Índico, muito próximo

do porto de pesca. É um mercado fundado pelos pescadores que maioritariamente eram

provenientes da etnia ndau. Os anos 60 e 70 foram os que marcaram a existência deste mercado,

pois com a dragagem da areia do mar para o continente, pela empresa EMODRAGA, foi

surgindo um espaço, que parecia antes uma ilha, mas que passou a fazer parte do continente e

que era designado de Aruângua e, tal como aconteceu com o mercado de Maquinino, os

4
15 de Março de 2019
39

trabalhadores dos portugueses, praticavam a venda de peixe que era vendido não só em Nova

Sofala, mas também na zona do Aruângua, que para tais vendedores era uma praia nova em

relação à Nova Sofala.

Com a comercialização do peixe, a Beira passou a ser um potencial mercado, passando a

fixar-se residências provisórias, isto por volta dos anos 1880-1890. E, os primeiros “nativos” da

Praia Nova eram indivíduos advindos de Nova Sofala, Búzi, Machanga, Devinhe e Buene (parte

da Província de Sofala).

Devido à guerra dos 16 anos, os barcos desapareceram e todos os pescadores fugiram dos

distritos para a cidade, acabando por fixar residências e começaram a criar pequenas bancas com

material precário. Por volta dos anos 1981-1982 o mercado foi-se alastrando informalmente.

Depois da guerra, foi-se ampliando cada vez mais o negócio do peixe e também de outros

produtos como o coco. E, com a abundância do peixe fresco e seco tornou-se um mercado

conhecido, havendo a necessidade, pelo Conselho Municipal da Beira, de se remodelar as

bancas, para se fazer a conservação do pescado e municipalizar o mercado, facto que aconteceu

em 2012, durante o mandato liderado pelo actual edil, Daviz Mbepo Simango. Foi nessa altura

que o Conselho Municipal, com o financiamento da Comunidade Europeia e em coordenação

com a Direcção Provincial de Pescas de Sofala edificou um mercado formal, passando a

designar-se «Mercado 20 de Agosto», que actualmente tem aproximadamente 668 vendedores,

sendo na sua maioria jovens e também adultos.

Ademais, preferimos trabalhar com vendedores dos mercados, que na sua maioria são

jovens e adultos, primeiro devido a falta de emprego, muitos deles tem envergado pela via do
40

empreendedorismo, como o recurso mais próximo para a aquisição de dinheiro, de modo a usar

no seu auto- sustento, segundo, porque se realizam assim, uma série de interacções

comunicativas entre comunidades linguísticas distintas que permitiram à emergência de variação

da língua portuguesa, na Beira, em geral e nos mercados em estudo, em particular.

2.4.2 Características do Português falado na Cidade Beira

Através de uma inferência assente no estudo de REITE (2013), em 1980, uma minoria da

população da Beira tinha o português como língua materna, sendo o cisena e o cindau as duas

línguas maternas mais importantes, porque representam as línguas maternas de mais de 90% da

população de Sofala. Este estatuto do cisena e cindau prevalece, mesmo no Censo de 2017,

embora as percentagens tivessem diminuído ligeiramente. A população que tinha o português

como língua materna também aumentou consideravelmente, devido ao aumento da rede escolar e

as migrações ou chegada de pessoas provenientes de outras províncias, que encontram no

português como o meio privilegiado para garantirem a sua comunicação.

É evidente que, com mais anos de convivência com os falantes do cindau e do cisena, os

habitantes provenientes de outras províncias e falantes de línguas, como echuabo, cinyngwe ou

citewe, acabam aprendendo o cindau e o cisena. E esse contacto interlinguístico acaba jogando

um papel importante para o surgimento de variações linguísticas em vários domínios.

No domínio fonético- fonológico acontecem fenómenos, por exemplo, de troca de posições

entre o som vibrante alveolar (l) da primeira sílaba e o som lateral alveolar (r) da segunda sílaba,

fruto da interferência do cindau na língua, no português, NGUNGA (2012):

(1) PM plobrema [plobrema] PE ‘problema’


41

Segundo MACHAMBISSE (2017), no contexto lexical, ocorrem dois (2) fenómenos: o

primeiro é o empréstimo de palavras provenientes das línguas em contacto e o segundo, é o

neologismo que, usando-se a base cindau ou cisena e processos usados para formar palavras

portuguesas, cunham-se outros termos:

(2). a. Empréstimos

Cisena: Sagwate PE «gratificação» Echuabo: Moya PE «de Zambézia»

b. Neologismo

Cisena : Kugodama «ajoelhar-se» PM godamar PE «ajoelhar-se»

Cindau : Kucenguera «mastigar» PM cenguererar PE «mastigar»

No âmbito semântico, os falantes da Beira, usam palavras ou expressões de cisena,

cindau e até do Português Europeu que no PM experimentam significação diferente da que

transportam dessas línguas.

(3). a. Por aproximação de campos lexicais

PM: Os jovens da Beira gostam de copo e de saias.

PE: Os jovens da Beira gostam de «álcool»e de «mulheres».

b. Transposição do cisena para o PM

PM: A mamã convida toda a mbumba para a sua festa de casamento.

PE: A mamã convida a toda «gente» para a sua festa de casamento.


42

Atinente à variação do nível sintáctico, por falta de estudo e por as construções serem

semelhantes com as que ocorrem no português falado em outras regiões do país, não se avança

nenhuns exemplos.

Decerto, pensa-se que o português falado na Cidade da Beira, apresenta marcas peculiares

fruto do contexto em que é falado. No ponto que se segue, apresenta-se o estudo feito nos

mercados de Maquinino e da Praia Nova.


43

CAPÍTULO III: DESCRIÇÃO E INTERPRETAÇÃO DOS CORPORA

Nas linhas que se seguem, apresenta-se o panorama do PM falado na Cidade da Beira, através de

apontamentos de situações e de dados de entrevistas realizadas em dois (2) mercados que

permitem sonhar com um projecto de um português da Beira.

3.1. DESCRIÇÃO DOS CORPORA DOS MERCADOS URBANOS DE MAQUININO E


DA PRAIA NOVA

Tratando-se de uma pesquisa qualitativa, a descrição será da seguinte maneira: para cada uma

das categorias representativas patentes nos apêndices, produz-se um texto síntese em que se

expressa o conjunto de significados presentes nas diversas unidades de análise incluídas em cada

uma delas. Faz-se uso intensivo de “citações directas” dos dados originais para elucidar a

argumentação. Com o apoio das teorias de variação semântica de TIMBANE (S.d), CANÇADO

(2008), GULI (2014) e GONÇALVES (2012), procurar-se-á ir além, para atingir uma

compreensão mais aprofundada do conteúdo obtido nos Mercados de Maquinino e da Praia

Nova.

Como se disse na metodologia utilizada, tomou-se como referência neste estudo, três

perguntas orientadoras, que conduziram a pesquisa para o alcance dos objectivos previstos. É

nesta linha de pensamento, que se faz uma abordagem científico-analítica, de cada área

variacional apresentada pelos vendedores dos dois mercados escolhidos, tendo como pontos de

referência variações comuns, na base de: uso de expressões que marcam duração de uma acção;

indicação de proveniência e expressão de negação. Portanto, o foco é tentar descrever como é

que os vendedores destes mercados se exprimem nas situações de comunicação indicadas acima.
44

3.1.1. Uso de expressões que marcam duração de uma acção

Para os vendedores exprimirem a duração da acção, foi-lhes inquerido para que eles indicassem

o tempo que estavam a exercer a actividade de comércio naqueles mercados. Face a esta

solicitação, ocorreram respostas que se vislumbram nas situações que se seguem:

(1) Mercado do Maquinino (1) Mercado da Praia Nova

a. Há três anos. (IMQH1) ap. Eu to (+) dois anos nesse negócio. (IPNH1)
ad. Tó há três anos. (IMQM1) ah. Estou quase há três anos. (IMNM1)

A. Mais ao menos oito anos. (IMQH2) AP. Eu estou há sete, oito anos. (IPNH2)
AD. Desde dois mil e catorze. (IMQM2) AP1 Estou aqui há oito anos. (IPNH2)
ax. Dois anos. (IMQH3) H. Estou desde /.../ noventa e quatro. (IPNM2)

au. Um mês só. (IMQM3) AH1. /.../ estou aqui há muito tempo. (IPNM2)
AX. Tó aqui há três meses. (IMQH4) ai. Desde quando eu tinha trinta anos (+) desde que
perdi meu pai. (IPNM3)
AU. Há três anos. (IMQM4) AI. Estou aqui desde /.../ noventa e quatro.
(IPNM4)
ab. Estou quase há um ano. (IMQH5) Ea. Há uns seis anos. (IPNH4)
AB. Tem dez anos estou aqui. (IMQH6) EA. Tenho seis anos aqui nesse mercado. (IPNH4)
AB1 Dez anos. (IMQH6) e. Tem três anos. (IPNH5)

E. Desde dois mil. (IPNM6)


Fonte: autora

Sabe-se que em português padrão, um falante tem a possibilidade de exprimir a duração

de uma acção, recorrendo-se à expressões como: por+quantidade de tempo, desde+momento de

início da acção, haver+quantidade de tempo, fazer+quantidade de tempo. Observando os dados


45

acima, extraídos das grelhas representativas dos apêndices, nota-se que na sua maioria, os

informantes optam pela estrutura haver+quantidade (mesmo nas situações em que o verbo haver

é elíptico), os casos das proposições (1a,1ad, 1A,1ax,1AX, 1ab,1AB1,1au e 1AU), do Mercado

de Maquinino e (1ap, 1AP,1AP1,1ah,1AH1 e 1Ea) no Mercado da Praia Nova, embora tenha

ocorrido o caso de quatro (4) deles, sendo uma proposição no Mercado de Maquinino (1AD) e

três proposições no Mercado da Praia Nova (1H, 1ai e 1E), terem usado a estrutura

desde+quando.../ desde que e desde+ano de início da acção.

Notam-se igualmente, duas situações também especiais que ocorreram nos dois

mercados, que mereceram algum estudo, marcadas pelo uso da estrutura ter+quantidade de

tempo, como são os casos das proposições (1EA e 1e), do mercado da Praia Nova e (1AB), do

mercado de Maquinino. Sendo assim, pensa-se que os vendedores recorrem ao verbo ‘’ter’’, que

pode remeter para o tempo de vida dos indivíduos (idade) e não ao tempo de permanência num

determinado espaço ou actividade, talvez pela influência das línguas maternas dos informantes

(cisena e cindau) porque segundo MARTINS (2012) e PRIETRO (2015) o verbo ter ora pode ser

atribuído o valor dos verbos estar ou haver, cujo infinitivo pode indicar uma acção a se realizar

presentemente.

Note-se que, numa perspectiva de variação formal ou sintáctica, os exemplos apontados

ilustram uma ocorrência de variação, mesmo, por exemplo, nas proposições (1A,1au,1AB1 e

1ap), em que o verbo haver está omisso. Entretanto, no nível semântico, cuja preocupação seria

de verificar o significado das frases (o que a frase quer dizer), observa-se que todas as frases

indicam o mesmo significado. Admitindo-se o caso de se ter uma variável categórica, a frase

(1.1) Eu estou há oito anos, nove, cinco... neste negócio e, variáveis secundárias, as proposições,
46

por exemplo: (1ap) Eu to (+) dois anos nesse negócio, (1A) Mais ao menos oito anos, (1au) Um

mês só, (1AB1) Dez anos; chega-se a conclusão que tanto as sentenças (1.1) e (1ap,1A,1au e

1AB1) são verdadeiras, visto que todas elas enceram o mesmo significado – duração do tempo de

uma acção. Desta feita, entende-se que não há ocorrência de variação semântica, mas sim de

mudança linguística, uma vez que, os falantes deixaram de usar o cisena,cindau, cinyungue,

echuabo e emakwa (que são suas LM) para usar o português e, recorrem-se a mesma maneira de

dizer a duração da acção.

Além disso, as variações de forma que ocorrem nas frases antes referidas são fruto da

manifestação do registo de língua ou mesmo alternância linguística. Mesmo que os informantes

tenham um nível de escolarização que parte de analfabeto até 12ª classe, Línguas Maternas

Bantu (cisena, cindau, cinyungue, echuabo e emakwa) e estejam na faixa etária dos 21 anos a

50+, seleccionaram maioritariamente a estrutura [SN] estar+haver+quantidade de tempo, cujo

predicado é constituído pelo verbo Estar, no presente do indicativo. Logo, os factores sociais

(faixa etária, nível de escolarização, língua materna) não têm influência na variação semântica

para os informantes quando exprimem a duração temporal de uma acção.

Portanto, entende-se que, tal facto teria sucedido porque os entrevistados têm um

conhecimento prévio e extralinguístico compartilhado por eles (como falantes e ouvintes) no acto

de interacção do seu dia-a-dia. Outrossim, o facto de seleccionarem a estrutura [SN]

estar+haver+quantidade de tempo pode dever-se à simplicidade da estrutura dado que ela não

selecciona uma predicação complexa, como poderia acontecer com desde..., faz...
47

Ainda, o estudo permite destacar as proposições de expressão de duração da acção

introduzia pela expressão desde+…, que se passam indicar a seguir:

(1) Mercado de Maquinino (1) Mercado da Praia Nova

AD. Desde dois mil e catorze (IMQM2) H. Estou desde /.../noventa e quatro (IPNM2)

Ai. Desde quando eu tinha trinta anos (+)


desde que perdi meu pai (IPNM3)

E. Desde dois mil. (IPNM6)

Decerto que, a semântica formal assume que o sentido destas asserções construir-se-ia da

(de) composicionalidade, isto é, da decomposição da frase em unidades que a constituem e da

composição (capacidade que os falantes têm de produzir frases diferentes através de uma já

existente). Face a isto, nas unidades de sentido da frase (1ai) Desde quando eu tinha trinta anos

(+) desde que perdi meu pai, parece haver, igualmente, uma nova maneira de dizer a duração da

acção que pode ser característica dos falantes do português da Cidade da Beira. Nesta ordem de

ideias, está-se diante de variação linguística, visto que há ocorrência da gramaticalização e a

discursivização, processos que determinam uma mudança constante da língua.

Observe-se que nos exemplos extraídos da frase (1ai) não só a quantidade de tempo (dois

mil e catorze, noventa e quatro e trinta anos) podem completar a proposição indicadora de

duração da acção, como também o sucedido (morte do pai). Pensa-se que este fenómeno

acontece porque, muitas vezes, em Moçambique, caso da Cidade da Beira, por incerteza de

determinação do período ou data de realização de um acontecimento, os falantes recorrem-se à

acontecimentos não só marcantes das suas vidas, mas também à acontecimentos históricos ou
48

que marcam o contexto em que se encontram. Para o caso em apresso, a situação de duração não

é explícita nem verificada (não planificada) porque ela deriva de um facto que aconteceu. Se se

tiver em conta que este fenómeno acontece no seio da comunidade falante africana, ou mesmo

moçambicana, a proposição (1ai) poderá ser incorporada no grupo de variações linguísticas.

3.1.2 Indicação da Proveniência

O tópico em destaque visa essencialmente responder ao questionamento efectuado na

frase: (2) De onde é que vem os produtos que estão a vender? Para o efeito, os entrevistados

deviam recorrer-se à palavras variáveis que relacionam dois termos de uma oração, de modo que

o sentido da antecedente fosse completado pela consequente, chamadas preposições, MÓIA

(2000). Nesse contexto, o recurso à preposição de é o mais recomendável porque, de acordo com

CUNHA E CINTRA (1984, p.551) apud CARDOSO (S.d, p.36), pode indicar movimento de

afastamento ou de procedência. Nesse sentido, a relação que ela estabelece na frase é necessária,

pois o termo principal ou antecedente exige um consequente que lhe seja sintacticamente

necessário.

Para CARDOSO (S.d), dependendo do verbo de movimento ou posição absoluta, a

preposição de pode indicar posição inicial a partir da qual se opera um movimento ou início de

uma contagem de ciclo temporal. Assim, o estudo realizado nos mercados de Maquinino e da

Praia Nova, acerca do uso de expressões que exprimem a proveniência da mercadoria, observa os

seguintes resultados:
49

(2) Mercado de Maquinino (2) Mercado da Praia Nova

b. Compro aqui nas lojas. (IMQH1) bp. É de mar, da água. (IPNH1)


B. Vem de diversos sítios. Praticamente a BP. Eu sou do sul. (IPNH2)
preocupação das pessoas. (IMQH2)
Bx. Aqui da zona urbana. (IMQH3) BP1. Sai de lá na praia, na descida, sai daí. (IPNH2)
BX. Nas lojas também dos bangladezes. (IMQH4) Fa. Vem da praia. (IPNH3)
bb. Directamente proporcionada às lojas. FA. Vem de praia. Comprámos lá na canoa. (IPNH4)
(IMQH5)
BB. Eu trago na Gorongosa, Nhamatanda. Bh. Vem de praia. (IPNM1)
(IMQH6)
BB1. Procura no mato. (IMQH6) bh1. Comprámos aí. (IPNM1)
bd. Vem de Chimoio. (IMQM1) BH. Eu sou da Zambézia. (IPNM1)
BD. Lá no nosso distrito da Garongosa. (IMQM2) BH1. Tomate vem do Maputo, Angónia. (IPNM2)
BD1 Costuma ir no mato. (IMQM2) bi. Daqui da Beira. (IPNM3)
bu. Aqui na baixa. (IMQM3) BH1. Tomate vem do Maputo, Angónia. (IPNM2)
BU. Comprámos aqui na Beira. (IMQM4) Bi. Daqui da Beira. (IPNM3)
bi1. A gente compra no Maquinino. (IPNM3)
BI. Esses produtos comprámos no Maquinino.
(IPNM4)

f. Compro no armazém. (IPNM5)


F. Compra no Maquinino. (IPNM6)
Fonte: autora

Relativamente à indicação da proveniência da mercadoria, nota-se que as frases em (2)

apontam a ocorrência de variação linguística de domínio da semântica, porquanto se está em

presença de várias expressões que enunciam o mesmo significado. À luz do preceituado por

Silva (2010), em torno da análise semântica, pode-se dizer que se está diante da Onomasiologia,
50

partindo do conceito de: indicar a proveniência, foram enunciados vários tipos de frases ou

expressões que designam a mesma intenção.

Veja-se, se a frase (2.1) PE: O peixe que vendo vem do mar, for a variável principal,

então as proposições (2) bp e BP1, não seriam verdadeiras, porque não indicam a proveniência do

produto, mas sim especificam ou determinam o tipo de peixe. Portanto, o de da frase (2.1) indica

a procedência e o das frases (2) bp e BP1 especificam o peixe. Por outras palavras, dizer que o

peixe é do mar (peixe marinho) não é o mesmo que dizer que o peixe é extraído do mar. O

mesmo acontece com as frases (2b, 2bx, 2BX, 2bb, 2bu, 2BU, 2bh1, 2bi, 2bi1, 2BI, 2f e 2F), pois

declarar que o produto foi comprado (nas lojas, na baixa, na Beira, aí, no Maquinino, no

armazém), não é o mesmo que afirmar que o produto vem (das lojas, da Beira, dalí, do

Maquinino, do armazém).

Efectivamente ocorre variação semântica, visto que os contextos conversacionais, tais

como especificidades culturais, o papel dos estereótipos e das normas semânticas, atribuem às

frases (2) bp e BP1 e (2b, 2bx, 2BX, 2bb, 2bu, 2BU, 2bh1, 2bi, 2bi1, 2BI, 2f e 2F) à

semanticidade de proveniência. Entretanto, esta análise não se enquadra às frases (2) do PBe5: B.

Vem de diversos sítios (IMQH2); bd. Vem de Chimoio (IMQM1); Fa. Vem da praia (IPNH3);

FA. Vem de praia (IPNH4) porque, são todas elas verdadeiras, isto é, não são contraditórias à

frase ( 2.1) , PE: O peixe que vendo vem do mar, logo dizem a mesma coisa.

Contrariamente ao que se disse acima, os entrevistados igualmente produzem frases como

(2) BP. Eu sou do sul (IPNH2) e BH. Eu sou da Zambézia (IPNM1) para responderem ao mesmo

5
Português da Beira
51

questionamento, relativamente à proveniência do produto. Entende-se que IPNH2 e IPNM1

fazem uma confusão com a sua origem ou proveniência. Neste caso, não há variação porque os

enunciados produzidos por esses falantes demonstram problema de má compreensão da questão

orientadora do diálogo desenvolvido entre a pesquisadora e os informantes em questão.

Nessa ordem de ideia, pode-se pensar que os factores escolarização, língua materna,

actividade motivada pelo tipo de mercadoria que vendem e pela relação interaccional entre os

membros da rede social (interacção verbal) teriam influenciado na ocorrência dessas variações.

Ainda, repare-se que para indicar a proveniência, normalmente a preposição de rege os verbos de

movimento como ir, vir, sair, mas os informantes, talvez, pelo baixo nível de escolarização e

influenciados pela prática conversacional usada na transacção comercial de produtos que não

tenham sido extraídos do mar, a título de exemplo, legumes, medicamentos tradicionais e pela

língua materna, acabaram seleccionando verbos como estar (de estado), trazer, procurar e o

locativo lá para indicar a proveniência, facto vislumbrado, por exemplo, nas frases (3) BB. e

BB1.

3.1.3 Expressão de Negação

No português europeu, a negação é expressa por advérbios de negação não, nada,

nenhum, ninguém, antepostos ou pospostos ao verbo. Neste estudo, os dados mostram que os

informantes exprimem a negação usando os dois primeiros (não e nada) quando solicitados para

dizer se vinham muitos clientes para comprar os seus produtos. Em alguns casos, ocorrendo de

maneira isolada, noutros simultaneamente, como se pode ver nos exemplos:


52

(3) Mercado de Maquinino (3) Mercado da Praia Nova

c. Por enquanto negócio está um pouco cp. Aqui nesse mercado ...nada (IPNM1)
mal (IMQH1)
Cx Voltei p´ra casa nem cem meticais cp1. Não, não sai muito nada (IPNH1)
(IMQH3)
C. Não. Agora já tá sendo muito difícil em CP2. Nada (+) assim pouco (IPNH2)
relação aos três...quatro anos atrás
(IMQH2)
CX. Pouco aos poucos. (IMQH4) ci. Pouco-pouco, movimento é fraco (IPNH3)
CX1 Os clientes não me aparecem mesmo ch. Não é comprado, não nada (IPNM1)
(IMQH4)
cd. Como hoje não tem movimento ch1. Não temos clientes (IPNM1)
(IMQM1)
Fonte: Autora

No domínio sintáctico (estrutura da frase negativa), nota-se a existência de variação

linguística derivada da violação da formação da frase negativa, que normalmente deve ser: [SN

Neg V], [Neg V], [SN Neg V Neg]. Por exemplo, Sobre a negação com o advérbio nada, PINTO

(2010) diz que quando a partícula nada for apresentada isoladamente numa posição pós-verbal

(depois do verbo transitivo directo) exprime um valor argumental e quando aparece

acompanhado com não pode marcar ora o valor de um quantificador ou a negação propriamente

dita. Mas, neste último caso, a partícula de negação quando é anteposta ao verbo, reforça a

negação, atribuindo-lhe o sentido de negação total. Portanto, analisando as variações das frases

(3) indicadas abaixo, notam-se estruturas que apresentam as partículas de negação indicadas

precedentemente:

(1) C. Não. Agora tá sendo muito difícil em relação aos três...quatro anos atrás (IMQH2);
53

cp. Aqui nesse mercado...nada (IPNM1);

cp1. Não, não sai muito nada (IPNH1);

CP2. Nada (+) assim pouco (IPNH2);

ch. Não é comprado, não nada (IPNM1);

ci. Pouco-pouco, movimento é fraco (IPNH3);

No domínio sintáctico, é notória a existência de variação linguística derivada da violação

da formação da frase negativa, que normalmente deve ser: [SN Neg V], [Neg V], [SN Neg V

Neg]. Outrossim, uma outra análise em torno das frases em (3) notam-se estruturas inusitadas,

nomeadamente: C. [Neg V], cp. [CCL CCL Neg], cp1. [Neg Neg V Adv.Q], cp2. [Neg Adv.Q],

ch. [Neg V Neg Adv.Q], ci. [Adv.Q]. Deste modo, elas constituem maneiras diferentes de

exprimir a negação, mesmo que esteja a reforçar ou não. Observa-se por exemplo, a frase (3) cp.

O nada confere a frase o significado de que naquele mercado não tem aparecido muitos clientes,

quando se tomar como base o contexto conversacional em que o discurso foi enunciado. Ele

desempenha a função de não porque afecta toda a frase, KHOLLER (1988). Porém, o nada do

enunciado cp1, embora apareça depois da dupla negação, exprime igualmente uma negação total.

O mesmo acontece com as restantes frases. Portanto, é evidente que a expressão de

negação permitiu que os entrevistados produzissem mais estruturas diferentes de negação, porém

que não concorre para a ocorrência de variação semântica. Assim, quando os falantes exprimem

a negação ocorre mais a variação formal e não semântica, pois a negação está imanente no

espírito linguístico de cada informante.


54

3.1.4 Outras variações linguísticas

A presente pesquisa é orientada por três questões com as quais se procura testar as variáveis já

estudadas. Mas, como a entrevista era conversacional, identificou-se a ocorrência de variação

semânticas do campo lexical que afectou, por exemplo, o uso dos verbos guardar, apagar, girar,

estragar, estar; substantivos sítio, bebidas, saias, movimento, raça e valor e a contracção da

preposição numa que se apresentam a seguir:

(4)a. PM: Costuma guardar (+) sim, tem frigorífico (IPNH1)

PE: Costumo conservar no frigorífico.

b. PM: é um mercado apagado, não entra movimento (IPNH2)

PE: É um mercado morto, não há clientes.

c. PM: /.../ nu é um sítio aberto (IPNH2)

PE: Não é um lugar aberto.

d. PM: é privinir bebidas, nas saias estraga (IPNH2)

PE: É preciso evitar o álcool e as mulheres porque prejudicam a saúde.

e. PM: Estamos a ser girados ai na praia numa de que vão vender no mercado/.../ no mercado

dele não entra movimento (IPNM1)

PE: Estamos a ser expulsos da praia para o mercado, onde não há clientes.

f. PM: Como hoje não tem movimento. (IMQM1)


55

PE: Por exemplo, hoje não há clientes.

g. PM: minha raça não consigo falar. Só consigo falar mandau e macena (IPNM2)

PE: Não falo a minha língua, mas falo cindau e cicena.

h. PM: eu estou nas Palmeira um (IPNM3)

PE: Eu moro nas Palmeiras um.

i. PM : /.../mensalmente tem valor (IMQH3)

PE: Tem um dinheiro mensal

Quando se analisava a noção de semântica, sublinhou-se que não havia nenhum problema

em uma palavra ou frase invocar vários significados. Esta proposição encontra a sua realização

nos exemplos (4) apontados precedentemente. Comece-se com a frase (4).a, onde o verbo

guardar passa a ter o significado de conservar. Pensa-se que isto aconteceu porque quer em

cicena quer em cindau, o verbo conservar é traduzido pelos verbos Kuviga e Kukoya (guardar em

cindau e cisena, simultaneamente).

Outro exemplo, não menos importante que o primeiro, é a frase (4) d., onde ocorrem os

substantivos bebidas e saias. Em relação ao substantivo bebidas, verifica-se uma generalização

do informante pois, para ele, fazem parte das bebidas somente o álcool, portanto os sumos, os

refrigerantes não são bebidas. Pensa-se, talvez, que este comportamento linguístico poderá ter

ocorrido porque nas línguas cisena e cindau não haja um substantivo comum que se refira as

bebidas como acontece com o português europeu, porque os substantivos chacumwa/pyacumwa

(cisena) e cokumwa (cindau) significam apenas bebidas alcoólicas e as outras bebidas são
56

indicadas pelo nome. No tocante ao substantivo saias, o informante IPNH2, apoiando-se do facto

das mulheres usarem saias e, talvez, querendo suavizar ou evitar ofender a entrevistadora, o

entrevistado em questão recorre-se a palavra saia para designar mulher. Neste caso, a

metonímica é uma estratégia inconsciente que este informante se recorre para fazer valer o

fenómeno variacional em estudo.

Para o caso do substantivo raça utilizado pela informante IPNM2, no enunciado (4) g. ,

nota-se que há uma associação mental entre a raça e a língua. É provável que esta informante

pense que ndau e sena são raças e não uma etnia. Neste caso, é a língua que determina a raça e

não a cor da pele. Este pensamento poderá ter sido construído pela informante por causa do seu

baixo nível escolaridade (3ª classe) ou da rede social onde ela faz parte.

Atinente ao uso do adjectivo apagado, na frase (4).b, está associado ao argumento a não

entrada de clientes. Neste caso, a não entrada ou não aparecimento de clientes para a comprar as

suas mercadorias tornava o mercado sem luz, sem vida. Ademais, em relação ao uso do

substantivo movimento nos enunciados (4) e. e f explicar-se-ia pelo facto do número elevado ou

não de cliente indicar igualmente movimentação ou não movimentação ou agitação de pessoas

no mercado. Por isso, os informantes IPNM1 e IMQM1 associam a existência de clientela com o

substantivo movimento.

Como se vê, os fenómenos que se acabam de analisar ocorrem porque o significado de

uma palavra ou frase não é só fruto dos factores sociais, mas também da relação que se constrói

entre representações mentais. Quer dizer que o significado de uma palavra ou frase é construído

na base de protótipos, metáforas, sinónimos, hiperónimos, metonímia e esquemas imagéticos ou


57

conceptuais, orientado por um mapa da semântica lexical assente na Semasiologia e na

onomasiologia, como se referia aquando a descrição da semântica cognitiva. Portanto, é provável

que esta seja a razão que explica o aparecimento das restantes variações linguísticas apontados

nos exemplos (4).


58

CAPÍTULO IV: CONCLUSÕES

O estudo permitiu perceber que a semântica é uma área da linguística complexa cujo

estudo exige um conhecimento profundo da filosofia de linguagem, sobretudo na matéria da

lógica. Aprendeu-se ainda que ela se ocupa dos significados das palavras e das frases, que são

resultantes do conhecimento que o falante possui dos vários contextos ou mundos e da sua

relação com representação mental.

O estudo esclarece que no PM há marcas do português falado na Cidade da Beira fruto

das variações que ocorrem nos domínios da fonética/fonologia e semântica. Todavia, deixa claro

que não ocorre variação semântica quando os vendedores dos Mercados de Maquinino e da Praia

Nova exprimem a duração de uma acção nem a negação, porquanto as diferentes frases

variáveis exprimiam ora duração ora negação de acordo com o caso.

Todavia, não se pode dizer o mesmo em relação as variáveis linguísticas indicação de

proveniência e uso de verbos guardar, apagar, girar, estragar estar; substantivos sitio, bebidas,

saias, movimento, raça e valor e a contracção da preposição numa.

Em relação à variável indicação de proveniência, o nível de escolaridade, idade e a língua

materna (cindau, cisena) não influenciam para o aparecimento dessas variações. Mas sim, o

contexto conversacional dos vendedores, determinado pelo local onde se situa o mercado e o tipo

de mercadoria que vendem.

Em torno do uso de verbos guardar, apagar, girar, estragar, estar; substantivos sitio,

bebidas, saias, movimento, raça e valor e a contracção da preposição numa, contribuíram para
59

ocorrência dessas variações, a língua materna, para o caso da frase (4). a e a relação mental

imagética construída através da semasiologia (significação) e onomasiologia (nomeação).

Em suma, os corpora e os dados que o estudo fornece permitem realizar estudos em

outras áreas da linguística, tais como, morfossintaxe, fonética/fonologia e garantem o

cumprimento do sonho de MACEDO (1983, p. 55) citado por CAPUCHO (S.d, p.257) quando

disse que a língua tem de criar constantemente novos substantivos, categorias, formas de

expressão, de perceber e definir novas relações. Tem que ser capaz de integrar novas funções e

necessidades culturais, sociais críticas. São essas adaptações que constituem não só a histórias de

uma língua como a prova da sua vitalidade.


60

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AAVV. Dicionário Terminológico da Língua Portuguesa. S.l. s.ed., 2009.

Basso, R. et all. Semântica (4°Período). Florianópolis: UFSC, 2009.

Borstel, N. Sociolinguística: Teoria, Métodos e objecto em Pesquisa in loco, s.l., s.ed edição

especial, 2014.

Cançado, M. Manual de Semântica: Noções básicas e exercícios. Belo Horizonte, editora

UFMG, 2008.

Capucho, M. Língua, expressões linguísticas e Diversidade Cultural. s.l, s.ed, (s.d).

Cardoso, S. O genitivo em Português: contributos para uma sintaxe e semântica da preposição

‘’de’’. s.l: s.ed, s.d

Coelho, I. Et all. Sociolinguística (6° Período). Florianópolis: Universidade Federal, 2010

Dias, H. A norma padrão e as suas mudanças linguísticas na Língua Portuguesa nos meios de

comunicação de massas em Moçambique. Português Moçambicano:Estudos e reflexões.

Maputo: Imprensa Universitária/UEM, 2009.

Do Amaral, I. Beira, Cidade e Porto Indico. Revista Portuguesa de Geografia, v.7,Lisboa: s.ed,

1969.

Dos Santos, Nobre Roque, Estruturadores do Discurso na aula de Português em Moçambique,

1ª ed. Maputo: Alcance Editores, 2016.


61

Etto, Rodrigo Mazer e Carlos, Valeska Gracioso. Sociolinguística: o Papel do Social na Língua,

São Paulo: Instituto de Biociência, Letras e Ciências Exactas-UNESP, 2017.

Firmino, G. Desvios a norma do Português falado em Moçambique. Actas do 4° encontro de

Associação Portuguesa de linguística, Lisboa: Fundação Calouste Gulberkian, pp.97-106, 1988.

Freitag, K. Dissecando a entrevista sociolinguística: estilo, sequência discursiva e tópico,

Universidade Federal do Sergipe (UFS), 2014.

Freitag, K.. Amostras Sociolinguísticas: probabilísticas ou por conveniência, Belo Horizonte:

Revista de Estudos da Linguagem, 2017

Fulgêncio, Lúcia, A Otimização de Estratégias Didácticas através da Análise Contrastiva, s.l.:

s.ed., Revista de Italianística XXVI, 2013.

Gonçalves, P. (Dados para a) História da Língua Portuguesa em Moçambique, s.l: s. ed, s.d.

Guli, A. Vocabulário Português de Origem Moçambicana (bantuísmo na língua Portuguesa).

Dissertação de mestrado. Aveiro: Universidade de Aveiro, 2014.

Instituto Nacional de Estatistíca (INE), Resultados do Censo 2017: IV Recenseamento Geral da

População, Maputo, 2019.

Koller, E. NICHT- ‘’Não’’: uma equivalência problemática. Winter : Würzburg, Universidade

de Würzburg, pp. 68-117 , 1988.

Laville, C. et Dionne, J. A construção do saber: Manual de metodologia da pesquisa em

ciências humanas. São Paulo: UFMG, 1999.


62

Machambisse, O. Exercício de Morfossintaxe Comparada: Beira, Unizambeze, 2017.

Machungo, I. Estratégias de criação lexical no Português de Moçambique: aspectos da

derivação sufixal, Maputo: UEM, s.d.

Magro, Maria Cristina. Análise Contrastiva e Análise de erros – um estudo comparativo, sl:s.ed.,

s.d.

Malta, da Silva J. Um olhar Sociolinguístico por Volta Redonda, Macapá, v.4, nº2, Rio de

Janeiro: Secretaria do Estado da Educação do Rio de Janeiro, 2014.

Manzini, E. Entrevista semi-estruturada: análise de objectivo e de Roteiro. São Paulo, Unesp

Marília, S.d.

Martins, M. Elementos da LínguaNdau: Literatura oral, Gramática e Dicionário. Maputo:

Ciedima, 2012.

Matos S. e Rosa V. Teoria da mudança linguística e a sua relação com a(s) história (s) da (s)

língua(s), Revista de estudos linguísticosda Universidade do Porto, vol.3, Porto, Universidade do

Porto, 2008.

Mendonça, M. e R., de Fátima M. Beira, a cidade da Esperança: Crónica da Fundação, Lisboa:

Academia Portuguesa da História, Lusitânia, 2018.

Moia, T. Sobre a expressão de duração em Português Europeu e Português Brasileiro: o uso do

sintagma com a preposição por. Boletim da Abralim, v.26, n° Especial, Lisboa, Universidade de

Lisboa, 2001.
63

Mourin, G. Introdução à Linguística, Lisboa, Livros Horizontes, LDA, pp.71-72, 1997.

Ngunga, A. et Bavo, N. Práticas Linguísticas em Moçambique : Avaliação da vitalidade

linguística em seis distritos, Maputo, CEA-UEM, 2011.

Ngunga, A. Interferência de línguas moçambicanas em português falado em Moçambique.

Revista C. Da UEM, serie: Letras e ciências sociais, v., n°0, pp. 7-20, 2012.

Peres, J.& Móia, T. Áreas Criticas da Língua Portuguesa. 2ª edição, Lisboa: Caminho, 1995.

Pereira, A. et al, Análise de Conteúdo de uma entrevista semi-estruturada, 2011;

Pinto, C. Negação metalinguística e estruturas com ‘’nada’’ no Português Europeu. Dissertação

de mestrado. Oslo, Universitete I Oslo, 2010.

Prietro, F. Elementos da Língua Chisena e da Cultura do Povo de Sena. Balaka(Malawi):

Montfort, 2015.

Reite, T. A descoberta de Particularidade no Português de Moçambique: exploração

quantitativa e comparativa. Dissertação de mestrado. Oslo: Universitete I Oslo, 2013.

Ribeiro, O. e Lacerda, da Cunha A. Variação, mudança e não mudança linguística:

ressignificando o conservadorismo linguístico no Português do Brasil. Revista

Linguística/Revista do Programa de Pós-graduação em Linguística da Universidade Federal do

Rio de Janeiro, vol.9,nº2: Rio de Janeiro, UFRJ, 2013.

Rocha, D. e DAHER, Del M. A Entrevista em situação de Pesquisa Acadêmica: Reflexões

numa perspectiva discursiva, Rio de Janeiro: UFRJ, s.d.


64

Santana, Jessé et al, As Variações linguísticas e suas implicações na prática docente, MIllenium,

2015;

Santos, de A. A metodologia da pesquisa em Sociolinguística Variacionista, Revista Espaço

Académico, nº97, Alagoas: Universidade Federal de Alagoas, 2009.

Silva, A. Palavras Significados e Conceitos: o significado Lexical na mente e na sociedade.

Dossiê: Letras e Cognição, n°41, pp.27-53, s/l.: UFF, 2010.

Stroud, C. et Gonçalves, P. Panorama do Português Oral de Maputo: objectivos e métodos.

Maputo: INDE, 1997.

Timbane, A. A variação linguística e o ensino do português em Moçambique. São Paulo:

Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, s.d.

Vereação de Gestão Urbana e Equipamentos. Plano de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos da

Cidade da Beira (2019), Beira: Conselho Municipal da Beira, 2019.

Universidade de Aveiro. Citar e referenciar: estilo bibliográfico APA 6th. Aveiro: sbidm, 2015.

Universidade Zambeze. Normas para a apresentação de trabalhos científicos: projecto de

pesquisa, dissertação e Tese: Beira, UZ DP DC, 2012.


65

APÊNDICE
1.Unidades significativas de Análise dos Informantes do Mercado de Maquinino

Área variacional Variações Variações

1º Informante do Mercado de 2º Informante do Mercado do


Maquinino Homem (IMQH1) Maquinino Homem (IMQH2)

(1) Uso de expressão de a.”- Há três anos.” A. “- Mais ao menos oito anos.”
duração de uma acção

(2) Indicação de b. “- Compro aqui nas lojas e B. “-Transporta mercadorias que vem de
proveniência vendemos aqui no mercado.” diversos sítios. Praticamente a
preocupação das pessoas. Quase
tudo...falecimento, produtos das lojas,
menos passageiros.”

(3) Expressão de c. “- Por enquanto negócio está um C. “- Não. Agora já tá sendo muito difícil
negação pouco mal...como é uma coisa de em relação aos três...quatro anos atrás.”
habituar... ”

(4) Outras variáveis d. “- Na altura meus pais não tinham D. “- Faço conta própria.”
linguísticas possibilidade para comprar lugar.
D1. “- ...podemos cruzar com jovens que
Consigo mandar estudar meus
nem matabicho sabe, mas tem uma garrafa
filhos...habituaram comer o quê?...”
de tentação.”
d1. “- ...está totalmente mal. A gente
D2. “- Mas como esse indivíduo pode-se
quando andamos vemos muita
conservar...!”
coisa...talvez há qualquer coisa não
acaba.”

Grelha 1: unidades de análise dos informantes (IMQH1 e IMQH2)


66

Área variacional Variações Variações

3º Informante do Mercado de 4º Informante do Mercado do


Maquinino Homem (IMQH3) Maquinino Homem (IMQH4)

(1) Uso de expressão de ax. “- Hiii! Venho quando tenho AX. “- Aqui sou novo...tó aqui há três
duração de uma acção tempo...dois anos” meses”

(2) Indicação de bx. “...aqui da zona urbana.” BX. “- ...nas lojas também dos
proveniência bangladezes”

BX1. “- ... não sei onde saem.”

(3) Expressão de cx. “- Hiii! Por exemplo ontem saí de CX. “-...pouco aos pouco.”
negação mãos a abanar...voltei p´ra casa nem
CX1. “- /.../os clientes não me aparecem
cem meticais.”
memo!”

(4) Outras variáveis dx. “- Ah!!!...todo jovem que entra DX. “Existem dias de aflições”
linguísticas para o serviço onde passa dinheiro,
DX1. “-Há dias de movimento.”
não leva três anos.”
DX2. “- Há dias ficamos isolados.”
dx1. “- querem enriquecer rapidamente
sem gatinhar.” DX3. “- Falta de condições/.../pensei uma
ideia de que entrar no bolso de alguém.”
dx2. “- Eu acabei sola...este carro...
trilhei. Admiro jovens que não querem DX4. “- Pensei numa boa vida de que me
gastar sola.” possa compreender.”

Grelha 2: unidades de análise dos informantes (IMQH3 e IMQH4)


67

Área variacional Variações Variações

5º Informante do Mercado de 6º Informante do Mercado do


Maquinino Homem (IMQH5) Maquinino Homem (IMQH6)

(1) Uso de expressão de ab. “- /.../ estou quase há um ano.” AB. “- /.../ tenho/.../ tem dez anos estou
duração de uma acção aqui.”

AB1. “- Dez anos.”

(2) Indicação de bb. “- Directamente proporcionadas as BB. “- Eu trago na Gorongosa/.../


proveniência lojas.” Nhamatanda”

BB1. “/.../ procura no mato.”

(3) Expressão de cc. ᴓ CC. “/.../ Não tem conservação de corpo.”


negação
CC1. “/.../ andam toda hora que não
conservam corpo...”

(4) Outras variáveis dd. “- /.../ o meu irmão que me DD. “/.../ vendo aqui gonozololo pr´a
linguísticas bastecia naquele momento acabei de homem dar força do sexo.”
perdendo.”
DD1. “/.../ para ter movimento quando ter
dd1. “/.../ Como não bastasse, eu era banca.”
miúdo...até acabei tendo uma
DD2. “/.../quando andar nas
regaída.”
sarvejas...andar aonde...corpo acaba.”
dd2 “./.../ há dias com maior
DD3. “/.../ você com quinze anos já vai
movimentos.”
embora.”
dd3. “/.../ está num sítio mesmo ser
guardo /.../”

d4. “/.../ mensalmente tem valor”


68

d5. “eu também já me encaixei.”

Grelha 3: unidades de análise dos informantes ( IMQH5 e IMQH6)

Área variacional Variações Variações

1º Informante do Mercado de 2º Informante do Mercado do


Maquinino Mulher (IMQM1) Maquinino Mulher (IMQM2)

(1) Uso de expressão de ad. “Tó há três anos.” AD. “/.../ desde dois mil e catorze”
duração de uma acção

(2) Indicação de bd. “Vem de Chimoio.” BD. “/.../ lá no nosso distrito...Garongosa”


proveniência
bd1. “Pirpiri vem de Savane.” BD1. “costuma ir no mato”

(3) Expressão de cd. “como hoje não tem movimento...” CD. ᴓ


negação

(4) Outras variáveis dc. “ Tem dia tem movimento.” DC. “/.../não pode esperar o bolso do
linguísticas marido”
dc1. “/.../ tem saída memo.”
DC1. “Se você ser casada em casa...”

Grelha 4: unidades de análise dos informantes (IMQM1 e IMQM2)


69

Área variacional Variações Variações

3º Informante do Mercado de 4º Informante do Mercado do


Maquinino Mulher (IMQM3) Maquinino Mulher (IMQM4)

(1) Uso de expressão de au. “/.../ um mês só.” AU. “Há três anos”
duração de uma acção

(2) Indicação de bu. “/.../ aqui na baixa.” BU. “Compramos aqui na Beira”
proveniência

(3) Expressão de cu. ᴓ CU. ᴓ


negação

(4) Outras variáveis du. ᴓ DU. “/.../ não pode desistir quando já não
linguísticas tem fundo”

Grelha 5: unidades de análise dos informantes

2. Unidades significativas de análise dos Informantes do Mercado da Praia Nova


Área variacional Variações Variações

1º Informante do Mercado Praia 2º Informante do Mercado Praia-Nova


Nova Homem (IPNH1) Homem (IPNH2)

(1) Uso de expressão de ap. Eu tou (+) dois anos nesse negocio AP. Eu estou há sete, oito anos.
duração de uma acção
AP1. Estou aqui há oito anos.

(2) Indicação de bp. É de mar, da água (+) é de mar BP. Eu sou do sul
proveniência
BP1. Sai de la /.../ na praia, na descida, sai
daí
70

(3) Expressão de cp./.../aqui nesse mercado, nesse CP. As veze entra movimento
negação mercado, nada
CP1. Sexta e domingo entra movimento
cp1./.../ não, não sai muito nada
CP2. Nada (+) assim pouco
cp2. /.../ não vem pessoa que está aqui
dentro

(4) Outras variáveis dp. Costuma guardar (+) sim, tem DP./.../ é um mercado apagado, não entra
linguísticas frigorífico movimento

dp1. O peixe vem, não como hoje DP1./.../ nu é num sitio aberto
também está muito baixo.
DP2. Tudo corre para na praia, onde sai
dp2. Quando sai muito. Sim, quando peixe.
sai muito peixe.
DP3. É privinir bebida, nas saias estraga
dp3. Faço isso para ter peixe que eu
DP4. Não há outra maneira/.../ maneira é
comprei com ele e ter pão também.
esse.

Grelha 1: unidades de análise dos informantes (IPNH1 e IPNH2)

Área variacional Variações Variações

1º Informante do Mercado Praia 2º Informante do Mercado Praia-Nova


Nova Homem (IPNH3) Homem (IPNH4)

(1) Uso de expressão de Ea. “/.../ há uns seis anos” EA./.../“tenho seis anos aqui nesse
duração de uma acção mercado”

(2) Indicação de Fa. “/.../ Vem da praia.” FA. “/.../ vem de praia...compramos na
proveniência canoa”

(3) Expressão de Ga. ᴓ GA. “/.../ pouco-pouco...não muito”


71

negação

(4) Outras variáveis Ha. “/.../ antes vendi, depois cai e HA. “/.../ é ter alguém que traz de canoa e
linguísticas continuei de novo.” nós compra e vendemos a molho”

Grelha 2: unidades de análise dos informantes (IPNH3 e IPNH4)

Área variacional Variações Variações

1º Informante do Mercado Praia- 2º Informante do Mercado Praia-


Nova Mulher (IPNM1) Nova Mulher (IPNM2)

(1) Uso de expressão de ah. Estou quase há trê anos AH../.../estou desde/.../ noventa e quatro
duração de uma acção
ah1. Vim aqui em 1977 AH1. /.../estou aqui há muito tempo

(2) Indicação de bh. Vem de praia BH. Eu sou da Zambézia


proveniência
bh1. Compramos aí BH1. Tomate vem do Maputo/.../
Angónia. Só que Angónia ja acabou

BH2/.../do momento estamos a trabalhar


com Maputo e Nhamatanda

(3) Expressão de ch./.../ não é comprado, não é nada CH. Nada xiii, só cheguei ate só 5ª
negação classe
ch1./.../ não temos clientes
CH1. Não é fácil

CH2. familiar do marido não apoia nada.


/.../ no apoia nada

0(4) Outras variáveis dh. Estamos a ser girados ai na praia DH. Minha raça não consigo falar. Só
linguísticas numa de que vão vender no mercado/.../ consigo falar mandau e macena
só que mercado dele não entra
72

movimento DH1. /.../eu pagar onde ponho a minha


cabeça
dh1. Vale mais sacrificar assim, ser
girado, você continuar a fazer a mesma
coisa/.../

dh2.Vale mais procurar outra maneira de


fazer sacrifício

Grelha 3 : unidades de análise dos informantes IPNM1 e IPNM2

Área variacional Variações Variações

3º Informante do Mercado Praia-nova 4º Informante do Mercado do


Mulher (IPNM3) Maquinino Mulher (IPNM4)

(1) Uso de expressão de ai. Desde quando eu tinha trinta (+) AI. “/.../ estou aqui desde /.../ noventa e
duração de uma acção comecei a fazer negocio quando perdi quatro”
(+) desde que perdi meu pai

(2) Indicação de bi. Daqui da Beira BI. “/.../Esses produtos compramos no


proveniência bi1. A gente compra no Maquinino. Maquinino”

(3) Expressão de ci./.../ pouco-pouco, movimento é fraco CI. “/.../movimento dele vem, mas está
negação ser muito fraco”
ci1./.../dizem que não há dinheiro
CI1. “/.../ movimento é pouco...pouco”
ci2./.../quando não tem mercadoria

(4) Outras variaveis di./.../dzarasca de outra maneira, tinqui DI. “segredo para ficar jovem /.../
linguística dzarascar outra coisa para vender depende de massa...corpo”

di1. Eu estou nas palmeira um DI1. “/.../ entrar no xtique com os


outros...quando eu cair ai amanhã
73

di2./.../ pero meno de chapa eu de pão alguma coisa que vai me pegar braço e
apanha eu lavantar, é o xtique, nossa união”

di3/.../minha casa/.../ mandei alugar, fui


procurar uma dependência nas palmeira

Grelha 4 : unidades de análise dos informantes (IPNM3 e IPNM4)

Área variacional Variações Variações

3º Informante do Mercado da Praia 4º Informante do Mercado da Praia


Nova Mulher (IPNM5) Nova Mulher (IPNM6)

(1) Uso de expressão de e. “tem três anos.” E. “desde dois mil”


duração de uma acção

(2) Indicação de f. “compro no armazém.” F. “compra no Maquinino”


proveniência

(3) Expressão de g. /.../ “ pouco...pouco.” G. ᴓ


negação

(4) Outras variaveis h. “comecei a vender... sofrimento” H. “quando vender tem que saber comer
linguística dinheiro. Quando não sabe comer cai.
Depois amanhã não tem maneira”

Grelha 5 : unidades de análise dos informantes (IPNM5 e IPNM6)

Você também pode gostar