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INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA FLUMINENSE

CAMPUS CABO FRIO


COORDENAÇÃO DE LICENCIATURA EM QUÍMICA
LICENCIATURA EM QUÍMICA

TITO MORENNO PONTES E SOUZA

EDUCAÇÃO INTEGRAL NOS CIEPS: LIMITES, DESAFIOS E POSSIBILIDADES

CABO FRIO, RJ
2022
TITO MORENNO PONTES E SOUZA

EDUCAÇÃO INTEGRAL NOS CIEPS: LIMITES, DESAFIOS E POSSIBILIDADES

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à


Coordenação de Licenciatura em Química do
Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia Fluminense Campus Cabo Frio, como
requisito parcial para obtenção do grau de
Licenciado em Química, do curso Licenciatura em
Química.

Orientador (a): Prof.(ª) Ma. Mônica Machado


Neves Ramos

CABO FRIO, RJ
2022
FICHA CATALOGRÁFICA
CIP – Catalogação na fonte – Preparada pela Biblioteca do IFF campus Cabo Frio
S729e Souza, Tito Morenno Pontes e.
Educação integral no cieps : limites, desafios e possibilidades / Tito
Morenno Pontes e Souza. – Cabo Frio, RJ, 2022.
47 f. : il.

Referências: p. 40-43

Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em Química). Instituto


Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense campus Cabo Frio,
Coordenação de Licenciatura em Química, 2022.

Orientador: Mônica Machado Neves Ramos

1. Educação integral. 2. Educação - Finalidades e objetivos. 3. Prática


de ensino. 4. CIEP. 5. Educação popular. I. Ramos, Mônica Machado
Neves, orient. II. Título. III. Instituto Federal Fluminense.

CDD- 370.115
TITO MORENNO PONTES E SOUZA

EDUCAÇÃO INTEGRAL NOS CIEPS: LIMITES, DESAFIOS E POSSIBILIDADES

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado publicamente


perante a Banca Avaliadora, como parte dos requisitos para a
conclusão do Curso de Licenciatura em Química, da
Coordenação de Licenciatura em Química, do Instituto Federal
de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense campus Cabo
Frio.

Aprovado em:___/___/___

Banca Avaliadora:

________________________________________
Prof.ª Mônica Machado Neves Ramos (Orientadora)
Mestra em Educação - PUC Rio
Instituto Federal Fluminense campus Cabo Frio

________________________________________
Prof.ª Cátia Cristina de Oliveira Ramos
Mestra em Educação – Universidade Católica de Petrópolis - UCP
Instituto Federal Fluminense campus Cabo Frio

_________________________________________
Prof. Vinícius Teixeira Santos
Doutor em Educação – Universidade Católica de Petrópolis - UCP
Instituto Federal Fluminense campus Cabo Frio
AGRADECIMENTOS

Agradeço ao apoio da minha família que acreditou e permitiu que eu me dedicasse


exclusivamente a mim e aos meus estudos, sem exigir nada em troca.
Agradeço também à orientadora Mônica Machado Neves Ramos por ter se
empenhado muito junto ao trabalho e ter mudado a direção dele diversas vezes para onde
fosse possível e também pelo auxílio em tantos outros durante o curso de Licenciatura em
Química.
Agradeço às pessoas que disponibilizaram seu tempo contribuindo com seus relatos
de experiências profissionais em CIEPs, que ilustraram e enriqueceram muito a pesquisa.
Também agradeço à equipe do IFF Campus Cabo Frio por serem ótimos
profissionais, comprometidos com a educação, que fazem com que a escola tenha uma
filosofia diferenciada no sentido do que os CIEPs eram e devam voltar a ser.
“E querem q'eu seja educado, q'eu ande arrumado q'eu saiba falar

Aquilo que o mundo me pede não é mundo que me dá”

Gabriel o Pensador
RESUMO

Este trabalho tem por objetivo analisar uma proposta de política pública de educação
integral da década de 1980, os CIEPs, identificando seus limites, desafios e possibilidades
de implementação na época. A metodologia utilizada foi uma revisão bibliográfica junto ao
registro de relatos de profissionais que trabalhavam ou ainda trabalham nos CIEPs,
verificando a concordância entre as duas fontes de informação. Foi investigada também a
temática da educação integral e educação em tempo integral inerente a essa política
pública, utilizando a base teórica de Bourdieu para compreender a sua eficácia positiva em
uma sociedade de classes, assim como a história da educação integral no Brasil, dos CIEPs
e de seu idealizador, Darcy Ribeiro, para identificar seus limites, desafios e possibilidades
de realização no passado e a motivação, tanto de parte da sociedade, para inicialmente
terem aderido a ela no país, quanto de Darcy, para que tenha se esforçado para colocá-la
em prática mais tarde nos CIEPs, facilitando a compreensão desses aspectos também em
uma possível tentativa futura de realização no contexto atual. Foi concluído que o principal
fator que limitou a realização mais aprofundada dos CIEPs no país foi a falta de motivação
política e social, que provavelmente é o mesmo fator que pode estar limitando a realização
pelo Estado, ainda hoje, de qualquer projeto similar.

Palavras-chave: Educação integral. Educação em tempo integral. CIEP. Capital Cultural.


ABSTRACT

This work has the goal to analyze a public policy proposal of integral education of the 1980
decade, the CIEPs, identifying implementation limits, challenges and possibilities at the time.
The methodology applied was a bibliographic review together with report records of
professionals who worked or yet work on CIEPs, verifying the concordance between the two
sources of information. The theme of integral education and full-time education inherent to
this public policy was also investigated, utilizing the Bourdieus’s theoretical basis to
comprehend its positive effectiveness in a class society, as well as the history of the integral
education in Brazil, of the CIEPs and of their idealizer, Darcy Ribeiro, to identify their
realization limits, challenges and possibilities in the past and the motivation, both of part of
the society, to have initially adhered to it in the country, as well as of Darcy, so that he had
strived to put it in practice later in the CIEPs, also facilitating the comprehension of these
aspects in a future possible realization attempt in the current scenário. It was concluded that
the main issue that had limited the further deepened realization of the CIEPs in the country
was the lack of political and social motivation, which probably is the same issue that may be
limiting the realization by the State, yet today, of any similar project.

Keywords: Integral education. Full-time education. CIEP. Cultural Capital


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Distribuição dos 7 conjuntos inicialmente previstos para o mun. de Salvador 21


Figura 2 – Arquitetura padrão dos CIEPs 33
Figura 3 –Térreo do prédio principal 34
Figura 4 – 1º andar do prédio principal 34
Figura 5 – 2º andar do prédio principal 34-35
LISTA DE ABREVIATURAS

ABE - Associação Brasileira de Educação


CECR - Centro Educacional Carneiro Ribeiro
CENPEC - Centro de Estudos em Educação
CIEP - Centro Integrado de Educação Pública
ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente
FUNDEB - Fundo Nacional de Educação Básica
LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEC - Ministério da Educação e Cultura
PEE - Programa Especial de Educação
PME - Programa Mais Educação
PNE - Plano Nacional de Educação
PNME - Programa Novo Mais Educação
SPI - Serviço de Proteção ao Índio
UERJ - Universidade Estadual do Rio de Janeiro
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 10
2 OBJETIVOS 12
2.1 Objetivo geral 12
2.2 Objetivos específicos 12
3 METODOLOGIA 13
4 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO EM TEMPO INTEGRAL 14
4.1 Educação Integral 14
4.2 Educação em Tempo Integral 14
5 A TEORIA DE BOURDIEU COMO SUSTENTAÇÃO DA IDEIA DA EDUCAÇÃO
INTEGRAL 16
6 HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO INTEGRAL NO BRASIL: ALGUMAS EXPERIÊNCIAS E
INCENTIVOS 19
7 ANÁLISE DE UMA EXPERIÊNCIA NO CONTEXTO ATUAL 24
8 A HISTÓRIA DO IDEALIZADOR DOS CIEPS: DARCY RIBEIRO 25
9 O CENTRO INTEGRADO DE EDUCAÇÃO PÚBLICA: UMA EXPERIÊNCIA DE
EDUCAÇÃO INTEGRAL NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 27
9.1 História, motivação e objetivo da proposta 27
9.2 A proposta pedagógica dos CIEPs 30
9.3 Estrutura física e serviços 33
10 CONSIDERAÇÕES FINAIS 39
REFERÊNCIAS 40
APÊNDICES
ANEXOS
10

1 INTRODUÇÃO

Devido a ordem social e econômica atual, o nosso sistema educacional adere às


competências cognitivas nas suas práticas com o objetivo de formar pessoas produtivas e
com bom desempenho, que são aspectos valorizados nessa ordem cultural, econômica e
social. Nela, “[...] o homem é uma peça na engrenagem e a vida é submetida à tortura de
uma lógica que não lhe permite desenvolver suas potencialidades de forma livre e criativa”
(RAMALDES; ERAS; LAGES, 2017, p. 26 ).
Desde a revolução industrial no século XVIII, a escola pública passou a direcionar a
sua educação para as classes mais pobres, para que pudessem ter a instrução mínima
necessária para servir de mão de obra nas indústrias (COIMBRA, 1989). A partir de então, a
escola e o seu modelo classificatório, com provas e exames que excluem as pessoas que
não se adequam ao processo, passam a ter o objetivo de reproduzir o modelo social de
exploração burguesa, disciplinando os alunos de modo rígido e autoritário, autoritarismo que
é necessário para a manutenção do sistema (BOLOGINI, 2014).
Para pensar na possibilidade de minimizar esse problema de segregação, é
possível que a educação integral seja um bom caminho. A educação integral, fazendo uma
breve antecipação da explicação do conceito adiante no texto, é definida como um modelo
de educação que desenvolve, para além da dimensão cognitiva, todos os aspectos do ser
humano de forma integral: “[...] aspectos afetivo, cognitivo, físico, social e outros [...]
(MAURICIO, 2009a, p. 54-55 apud PESTANA, 2014, p.25).
Algumas experiências de propostas de educação integral já ocorreram ou estão
ocorrendo no Brasil, e algumas foram ou estão sendo bem sucedidas (GADOTTI, 2009).
Além disso, algumas leis, que incentivam essa forma de educação, foram criadas
(HAYASHI; KERBAUY, 2016). Apesar disso, essa forma de educação tem sido
implementada apenas pontualmente (ZANARDI, 2016). Vale ressaltar que a Meta 6 do
Plano Nacional de Educação (PNE) trata da oferta da educação de tempo integral para a
educação básica, em que no mínimo 50% das escolas públicas devem ampliar a carga
horária de forma a atender a pelo menos 25% dos alunos
Uma ocorrência de uma implementação desse tipo de formação é o projeto do
Centro Integrado de Educação Pública (CIEP), desenvolvido no Estado do Rio de Janeiro,
implementado na década de 80 no governo de Leonel Brizola, que tinha Darcy Ribeiro como
Secretário de Educação, que consiste em um conjunto de escolas integrais de tempo
integral construídas em locais de vulnerabilidade social. Este trabalho trata dessas escolas e
dos limites e possibilidades de suas revitalizações para que voltem a ter a educação de
qualidade que tiveram na época em que iniciaram.
11

Desta forma, este trabalho está dividido nas seguintes blocos de seções:
caracterização e definição do conceito de educação integral e educação em tempo integral;
a educação integral na perspectiva de Bourdieu; a história da educação integral no Brasil;
Centro Integrado de Educação Pública como uma experiência de educação integral no
estado do Rio de Janeiro.
12

2 OBJETIVOS

Tomando a Educação Integral como objeto de pesquisa, este trabalho tem os


seguintes objetivos:

2.1 Objetivos geral:

● Investigar a implementação dos CIEPs no Brasil, realizada na década de 1980,


analisando seus limites, possibilidades e desafios, buscando estabelecer relações
das ações propostas com a formação para o exercício da cidadania.

2.2 Objetivos específicos:

● Compreender o conceito de educação integral analisando sua relação com a


formação cidadã, identificando a perspectiva da ampliação do tempo escolar como
uma forma de alcançar uma formação completa e humanizada.
● Apresentar a história do CIEP, identificando-o como um projeto de escolarização de
tempo integral, voltado para o desenvolvimento da educação integral de crianças das
classes populares.
● Identificar alguns limites e desafios encontrados para o desenvolvimento da
educação integral, partindo da experiência já desenvolvida no Estado do Rio de
Janeiro.
13

3 METODOLOGIA

Foi utilizada uma metodologia qualitativa neste trabalho com a leitura e análises de
um considerável número de publicações a respeito do tema educação integral.
Para a construção do arcabouço teórico foram pesquisados artigos que tratam sobre
o tema, o que contribuiu para a compreensão e para a organização dos caminhos da
pesquisa. Com a investigação, chegou-se a uma notícia de que a prefeitura do Rio de
Janeiro lançou um projeto de revitalização dos CIEPs, que contempla 101 unidades que
compõem a rede municipal de educação. Esta notícia gerou novo movimento de
investigação, levando-a agora para o local que foi idealizado e construído para a oferta de
educação (em tempo) integral: o CIEP.
Foram feitas novas leituras e embasamento teórico, buscando informações a
respeito da história do CIEP, ampliando o referencial bibliográfico.
Partindo da primeira notícia da revitalização dos CIEPs, tem-se que duas unidades
da região foram contempladas no projeto de modernização tecnológica do Governo do
Estado, o projeto E-Tec, sendo uma localizada no Bairro Jacaré, na cidade de Cabo Frio, o
CIEP 193 WILSON MENDES, e a outra unidade localizada em São Pedro da Aldeia, no
bairro Porto do Carro, o CIEP 262, o que motivou ainda mais a investigação sobre o tema.
Para ampliar as informações e análises foram registrados no capítulo 9, relatos de
experiências de nove profissionais que atuaram no CIEP entre o fim dos anos 80 até os dias
atuais, que muito contribuíram para a pesquisa. Os registros escritos e os relatos recebidos
por áudio foram transcritos. Vale ressaltar que a transcrição dos áudios apresenta o registro
exato das falas, com as formas características de expressão de cada profissional, que, em
certa medida, revelam os sentimentos e emoções ao relatar as experiências nas escolas. Os
participantes foram orientados a relatar livremente as suas experiências, a partir do que
consideravam mais importante e relevantes para si.
14

4 EDUCAÇÃO INTEGRAL E EDUCAÇÃO EM TEMPO INTEGRAL

Nesta seção são apresentados dois conceitos básicos relacionados a este trabalho
em duas subseções: educação integral e educação em tempo integral.

4.1 Educação Integral

A educação integral pode ser definida como a que, “[...] considera o sujeito em sua
condição multidimensional, não apenas na sua dimensão cognitiva, como também na
compreensão de um sujeito que é sujeito corpóreo, tem afetos e está inserido num contexto
de relações” (GONÇALVES, 2006, p. 130).
Esse autor acrescenta também que o sujeito multidimensional, além das
necessidades básicas, possui vontades e aspirações, buscando a satisfação de realizar
seus objetivos. Por isso, um aspecto inerente à educação integral é a consideração desses
interesses na prática pedagógica, e esse aspecto torna a prática mais eficiente do que
aquelas que não o possuem.
Gonçalves (2006) diz também que a aprendizagem dos educandos ocorre em vários
espaços, como na família e entre os pares na escola, nos espaços formais e informais.
Sendo assim, para a educação considerar o educando integralmente, ela deve considerar a
aprendizagem nas suas vivências em vários espaços.
Outro aspecto inerente à educação integral é o desenvolvimento da capacidade
reflexiva e crítica dos educandos. Ramaldes, Eras e Lages (2017, p. 27) afirmam que
Ela deve desenvolver a nossa capacidade crítica, mediante a qual
poderemos repensar o legado recebido desde as circunstâncias concretas
de nossa experiência. Dessa forma, ela deve ser colada à vida e àquilo que
pode ser significativo em nosso itinerário histórico. Não devemos apenas
receber, mas recriar o que herdamos.

Essa capacidade reflexiva e crítica não é encontrada nos outros animais, eles são
presos em seu mundo fechado e só conhecem a ordem inflexível do mundo natural (Ibid.).
Para oferecer educação integral em escola pública para pessoas com condições
financeiras e de vida precárias, é necessário que a educação seja também de tempo integral
(PARO et al., 1988).

4.2 Educação em tempo integral

A educação em tempo integral é definida, no artigo 4o do decreto nª 6.253/2007 do


Fundo da Manutenção do Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB), como “[...] a
jornada escolar com duração igual ou superior a sete horas diárias, durante todo o período
15

letivo, compreendendo o tempo total que um mesmo aluno permanece na escola ou em


atividades escolares.” (BRASIL, 2007).
Parte das crianças brasileiras possuem condições financeiras e com dificuldades de
acesso aos bens econômico-sociais produzidos pela coletividade, de modo que não têm
condições mínimas de alimentação, saúde, transporte e higiene para que possam ter uma
jornada escolar sem precisar trabalhar para sobreviver, além também de não ter acesso a
bens culturais, como atividades esportivas mas estruturadas e com equipamentos mais
adequados, cursos feitos fora da escola e outras atividades culturais, importantes para a sua
formação mais unitária (integral), mais substantiva e, inclusive, abrindo mais possibilidades
de mobilidade social. Então, para realizar uma educação integral democrática e
democratizante, a escola deve oferecer educação em tempo integral, articulada com
políticas sociais que oportunizem de forma efetiva atividades culturais e oferecendo todas as
condições necessárias para garantir o máximo possível, aprendizagem dos alunos. (PARO
et. al., 1988).
Algumas propostas de jornada escolar em tempo integral são apresentadas como
educação integral, mas o simples aumento da carga horária escolar não é suficiente para a
implementação da educação integral porque esta diz respeito “a uma certa concepção de
formação social do humano e a uma concepção da inter-relação dos saberes da vida em
sociedade” (SEMINÁRIO NACIONAL TECENDO REDES PARA EDUCAÇÃO INTEGRAL,
2006, p. 15). Entretanto, se as questões elencadas acima não estiverem concatenadas ao
alongamento da jornada formativa, a consequência é apenas extensão da precarização da
formação dos alunos.
Apesar de a extensão do tempo contribuir positivamente para a educação integral
quando bem aproveitado, esta pode ocorrer também em tempo parcial no caso de os alunos
não precisarem de mais tempo na escola para se alimentar e ter vivências culturais,já que
eles não precisam de tempo integral para tal, como afirma Gadotti (2009, p. 32),
A escola privada das classes médias e ricas já é de tempo integral. Pode-se
dizer que o aluno da escola privada dispõe de tempo integral dedicado a
sua educação. Geralmente ele dispõe de um ‘contraturno’, com aulas
complementares de esporte, lazer, reforço em línguas estrangeiras, balé,
judô etc.
16

5 A TEORIA DE BOURDIEU COMO SUSTENTAÇÃO DA IDEIA DA EDUCAÇÃO


INTEGRAL

Para evidenciar que a educação integral pode contribuir para uma melhor resolução
dos problemas educacionais atuais, os aportes teóricos de Pierre Bourdieu são bastante
férteis. Segundo esse autor, a desigualdade social é mantida por meio da diferença de
acessibilidade, entre as classes sociais (classe dominante, pequena burguesia e classes
populares), ao que ele chamou de capital cultural (MONTEIRO, 2018)
Capital cultural é o termo utilizado por Bourdieu para se referir a cultura, como
gostos, estilos, valores e bens culturais materiais possuídos, que são valorizados
socialmente, e que, metaforicamente, é uma moeda na sociedade assim como o capital
financeiro, que as pessoas podem acumular para ascender socialmente ou serem excluídas
desse processo de ascensão caso não o possuam (OLINTO, 1995)
O capital cultural possui algumas subclassificações, dentre as quais o capital cultural
incorporado e o capital cultural institucionalizado (SETTON, 2005).
O capital cultural incorporado se refere ao que fica inscrito no corpo da pessoa que o
adquire e pode ser dividido, também, em duas subclassificações: capital cultural incorporado
como habitus e como conhecimento cultural. A primeira subclassificação é a sobreposição
de parte do conceito de habitus com o de capital cultural e pode ser compreendido por meio
daquele conceito (OLINTO, 1995).
O habitus é um conjunto de aspectos da pessoa, como gostos, estilos, estruturas
psicológicas, maneiras, visões de mundo, formas de linguagem, valores, juízos, afetos,
percepções, comportamentos e condutas (Ibid.), que são construídos ao longo da vida de
acordo com as experiências que vivencia, principalmente na família (COSTA, 2016).
Definindo de uma forma mais ilustrativa, é um conceito teórico que faz a mediação entre a
pessoa e as estruturas a sua volta, como uma camada invisível em volta do corpo da
pessoa, por onde passa qualquer informação do ambiente antes de ser percebida por seus
sentidos, determinando, por exemplo, se a pessoa vai gostar ou não do que viu ou ouviu,
como uma música ou uma obra de arte, ou julgar algo como certo ou errado, influenciando
também a sua forma de se comportar (SETTON, 2002).
A parte do conceito de habitus que pode ser entendida como capital cultural
incorporado é a que pode ser, metaforicamente, uma moeda de valor para ascensão social
como, por exemplo, os comportamentos e gostos que podem facilitar uma pessoa a
ascender socialmente.
A segunda subclassificação do capital cultural incorporado, o conhecimento cultural,
é o conhecimento e as informações sobre determinada cultura, que é adquirido de acordo
17

com o estilo de vida que a pessoa possui. Ele pode ser entendido como capital cultural
porque pode ser um instrumento de ascensão social (OLINTO, 1995) ao oferecer, por
exemplo, vantagens nas escolas ou em provas de vestibular. Se uma pessoa, por exemplo,
tem capacidade financeira para ter a cultura de viajar e conhecer o mundo, ela pode adquirir
mais facilmente informações sobre geografia, história e línguas estrangeiras.
Saindo da subclassificação capital cultural incorporado e definindo o capital cultural
institucionalizado, este é a materialização daquele por meio de certificações, diplomas e
qualquer documento que simbolize a aprovação por alguma instituição educacional
(SCARLATTO; SILVA, 2011) e que represente a sua competência e o seu valor como
recurso humano. Bourdieu diz que o capital cultural institucional é como uma “certidão de
competência cultural” (BOURDIEU, 1998, p.74-79 apud Ibid., p. 460).
O conceito de habitus e de capital cultural podem se parecer muito pela forma como
são definidos, mas esses dois conceitos apenas se sobrepõem em parte, como explica
Olinto (1995, p. 25):
Embora o habitus seja aqui apresentado como um aspecto do capital
cultural, um conceito não parece estar totalmente contido no outro. Na
minha interpretação há apenas uma zona de interseção entre os dois
conceitos. Certos aspectos do habitus de classe que não afetam o acesso a
recursos não teriam a conotação econômica atribuída aos "'capitais". Da
mesma forma, o capital cultural não se restringe ao habitus pois as
credenciais educacionais e a utilização estratégica da informação parecem
escapar ao conceito de habitus.

Considerando esses conceitos, a mecânica a partir da qual a cultura é um


instrumento de ascensão social ou de exclusão desse processo de ascensão envolve o
conceito de capital cultural e se baseia principalmente em uma relação entre as famílias das
pessoas e a escola (COSTA, 2016): a família é responsável pela transmissão do capital
cultural incorporado para os filhos, como afirma a autora:
No interior da família, ocorre a transmissão tácita e profundamente afetiva
de determinadas maneiras, visões de mundo, conhecimentos, formas de
linguagem, relação com a língua, valores e juízos, numa palavra, a
transmissão de todo um patrimônio que adquire a forma de um capital
cultural (Ibid.).

Enquanto a escola funciona como uma instituição de certificação do capital cultural


de cada educando, emitindo títulos e diplomas, ou seja, capital cultural institucionalizado,
para os alunos que são bem sucedidos no processo, ignorando a trajetória social da pessoa
como se o resultado representado pelo documento fosse fruto exclusivamente de seu
mérito, quando na verdade o capital cultural incorporado recebido pelas famílias é o principal
critério para ser bem sucedido nessa instituição, mesmo sendo um critério implícito.
Bourdieu diz que os sistemas escolares desconsideram as diferenças de aculturação
anteriores ao processo escolar, transformando assim, como uma alquimia social, as
desigualdades sociais em mérito individual por meio da atribuição de títulos (Ibid.) Miranda e
18

Villardi (2020), autoras do Projeto Horizontes de pesquisa, que auxiliou estudantes de uma
escola pública da comunidade da Maré, concordam com Costa (2016) e tornam mais claro
como o capital cultural incorporado é relevante na escola, dizendo que
A dificuldade de aprendizado, de articular conhecimentos, recuperar
informações não explícitas, fazer inferências, estabelecer relações entre
textos, fenômenos e circunstâncias, está relacionada à baixa acumulação
de capital cultural das classes menos favorecidas, o que acaba gerando um
círculo vicioso de não superação e certo “determinismo” social, pela
impossibilidade de a escola pública enxergar seu papel basilar e se adaptar
à realidade dos alunos. [...] Sem o capital incorporado pela família, [...] os
estudantes das comunidades pobres não conseguem “entender” as
questões trazidas pela escola, momento em que “fracassam”. O Projeto
Horizontes buscou fazer o que a escola não conseguia: levar os estudantes
para fora da comunidade para que conhecessem não apenas as artes das
exposições, mas também os espaços, os prédios, as “geometrias” das
construções.(MIRANDA; VILLARDI, 2020, p. 18)

Nesse contexto, a educação integral, com tempo integral para oferecer vivências
culturais para as classes populares, pode ter a função de impedir que a segregação social
ocorra nas escolas, como afirma Moll (2009, p. 14 apud MOREIRA, 2013 p. 152)
[…] não se trata de reduzir o debate da educação integral ao campo da
assistência social, e sim de facilitar o acesso a um capital cultural que faça
diferença nos processos de inserção social, na perspectiva da superação da
‘sociedade de castas’ que separa as classes populares das classes médias
e altas do país.
19

6 HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO INTEGRAL NO BRASIL: ALGUMAS EXPERIÊNCIAS E


INCENTIVOS

A ideia da educação integral ganhou força no Brasil por influência de John Dewey

(1859-1952) principalmente sobre três educadores brasileiros: Anísio Teixeira, Lourenço

Filho e Fernando de Azevedo (CARVALHO, 2011). Além da influência de John Dewey no

país, houve também a influência do pedagogo francês Paul Robin (1837-1912), que, no
século XIX, estruturou essa ideia como parte de um movimento operário na França, que
lutava para que o Estado fornecesse um sistema educacional que oferecesse mais
oportunidades e condições de educação para eles e seus filhos. Quando imigrantes
europeus vieram para o Brasil incentivados pelo governo para trabalhar na produção de café
no final do século XIX, eles trouxeram as ideias de educação integral de países que, já
nessa época, tinham a educação como uma forma de ascensão social, se tornando assim
uma força política no país a favor dessa ideia (FERREIRA, 2007).
Na década de 1920 do século XX, a sociedade brasileira estava em uma transição
de oligárquico-tradicional para urbano-industrial, e o sistema econômico estava transitando
de agrário exportador para um de substituição de importações (FERREIRA, 2007). Segundo
Ghiraldelli Jr. (2009), a primeira guerra mundial fez com que os países pudessem verificar o
nível de desenvolvimento industrial de cada um, evidenciando o atraso que o Brasil tinha e
fomentando o seu desenvolvimento.
Os educadores apoiadores da ideia de John Dewey, mencionados acima, defendiam
que a educação tem uma função social e que seus propósitos devem ser definidos em
função das mudanças econômicas e sociais, e por isso deveria ser orientada para o
progresso de uma civilização técnica e industrial, rompendo com sua velha estrutura
tradicional e aderindo a uma nova forma, chamada de Escola Nova, voltada para o
desenvolvimento científico-tecnológico (CARDOSO; OLIVEIRA, 2019).
Com a revolução de 30, Getúlio Vargas se torna presidente. As suas ideias
nacionalistas e de desenvolvimento industrial tiveram uma sinergia com a ideia da Escola
Nova. Entre os dias 13 e 20 de dezembro de 1931, a Associação Brasileira de Educação
(ABE), fundada por Fernando de Azevedo em 1924, realizou a quarta Conferência Nacional
de Educação no Rio de Janeiro. Getúlio Vargas e Francisco Campos, que havia assumido,
neste mesmo ano, o cargo do recém criado Ministério da Educação e Cultura, estavam
presentes nessa conferência (CARVALHO, 2011).
O ministro e o presidente pediram aos participantes da conferência para examinar o
“[...]problema da educação brasileira e de seus rumos na política educacional” (CUNHA,
20

1986, p. 65 apud Ibid., p. 65), e estes formularam uma declaração de princípios e um


programa de política educacional, o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, que foi
redigido por Fernando de Azevedo. Esse documento foi assinado por vários intelectuais
influentes naquela época, de diversas áreas do conhecimento (Ibid.). Com isso, a política do
país se orientou para o sistema econômico de substituição de importações e as forças
políticas tomaram consciência da importância da educação para a transformação estrutural
que o país precisava (FERREIRA, 2007).
No contexto da década de 1930, Anísio Teixeira pretendia construir 74 escolas
integrais e a Universidade do Distrito Federal, mas a Intentona Comunista de 1935 levou o
movimento escolanovista a ser rotulado como comunista junto aos revoltosos daquele
movimento, ideologia que para os políticos simpatizantes com as ideias do Estado Novo era
inaceitável. Com isso, o ministro da educação Gustavo Capanema vetou o projeto de Anísio
(FERNANDES, 2022).
Além disso, durante o regime Estado Novo, as Reformas de Capanema contribuíram
para a desigualdade social e a elitização do país quanto ao desenvolvimento do ensino
público (GHIRALDELLI JR, 2009). Apenas recentemente, segundo Cardoso e Oliveira
(2019), a partir da constituição democrática de 1988, a educação integral começou a ser
fomentada legalmente, apesar de não aparecer literalmente o termo na constituição.
Mesmo sem o apoio da legislação, antes da constituição democrática de 1988,
algumas experiências de educação integral foram implementadas no país, sendo Anísio
Teixeira o pioneiro com a criação do Centro Educacional Carneiro Ribeiro (CECR) em 1950
(CARDOSO; OLIVEIRA, 2019), na Bahia. Com a finalidade de democratizar o ensino para
formar cidadãos profissionais qualificados para o progresso do país, o CECR, segundo
Nascimento (2009, p. 20),
era um exemplo de experiência de educação integral, ou seja, do processo
educativo que considera o educando como um ser individual,
desenvolvendo-lhe todos os aspectos da personalidade, valores de
liberdade com responsabilidade, pensamento crítico, senso crítico, senso
artístico, disposição de convivência solidária, novas idéias e capacidade de
trabalhar produtivamente, reunindo o ensino da sala de aula com a auto-
educação, resultante de atividades diversas em que os alunos participam
com plena responsabilidade.

Anísio Teixeira (1967, p. 246-253) diz que os alunos tinham oportunidade de


participar
de um conjunto rico e diversificado de experiências, em que se sentiria, o
estudante na escola-classe, o trabalhador, nas oficinas de atividades
industriais, o cidadão, nas atividades sociais, o esportista, no ginásio, o
artista no teatro e nas demais atividades de arte, pois tôdas essas
atividades podiam e deviam ser desenvolvidas partindo experiência atual
das crianças.
21

Pode-se inferir, observando a natureza de cada uma dessas atividades, que elas
desenvolvem uma diversidade de aspectos da criança, fundamentadas no ideário da Escola
Nova.
Foi planejada, na época da inauguração, a construção de sete centros educacionais
compostos por três Escolas-Classe e uma Escola-Parque conforme mostra o mapa, mas
apenas um centro foi inaugurado (NASCIMENTO, 2009, p. 20):

Figura 1 - Distribuição dos 7 conjuntos inicialmente previstos para o município de Salvador

Fonte: BASTOS, 2000 apud NASCIMENTO, 2009, p. 20

Nas Escolas-Classe ocorriam as aulas formais em sala de aula. Lá, os alunos


recebiam material didático, uniforme, merenda e medicamentos necessários. Os alunos
tinham também assistência do Setor Médico-Dentário, com profissionais designados pela
Secretaria de Saúde do Estado, e do Setor do Currículo e Supervisão, encarregado da
orientação pedagógica (Ibid.).
Nascimento (2009) também diz que as aulas eram realizadas com a divisão dos
alunos em unidades de trabalho. Cada aluno participava de uma unidade de trabalho com o
22

tema que lhe interessava. Nessas unidades ocorriam atividades em grupo e pesquisas
relacionadas a esses temas, que davam oportunidade aos alunos de terem contato com os
conteúdos do currículo de forma significativa.
Já a Escola-Parque, era um espaço reservado à educação para a vida, aprender
fazendo e aprender a viver em cooperação por meio de atividades divididas em setores: de
trabalho (artes aplicadas, industriais e plásticas), artístico (teatro, música e dança),
recreativo (ou de educação física), de extensão cultural, biblioteca (leitura, estudo livre ou
dirigido, pesquisa, hora do conto, teatro da sombra e fantoches) e setor socializante (grêmio,
jornal, rádio-escola, banco e loja).
Em um trecho do Manifesto dos Pioneiros da Educação é explicado o modo como
essas atividades contribuem para a aprendizagem:
O que distingue da escola tradicional a escola nova não é, de fato, a
predominância dos trabalhos de base manual e corporal, mas a presença,
em todas suas atividades, do fator psicobiológico do interesse, que é a
primeira condição de uma atividade espontânea e o estímulo constante ao
educando (criança, adolescente ou jovem) a buscar todos os recursos ao
seu alcance, “graças à força de atração das necessidades profundamente
sentidas”. É certo que, deslocando-se, por esta forma, para a criança e para
seus interesses, móveis e transitórios, a fonte de inspiração das atividades
escolares, quebra-se a ordem que apresentavam os programas tradicionais
do ponto de vista da lógica formal dos adultos, para os pôr de acordo com a
“lógica psicológica”, isto é, com a lógica que se baseia na natureza e no
funcionamento do espírito infantil (AZEVEDO et. al., 2009, p. 49).

Posteriormente à constituição de 1988, essa postura no contexto legal foi reforçada


com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 1990, LDB/1996 e o primeiro Plano
Nacional de Educação (PNE I). A partir do século XXI, mais escolas de educação integral
foram surgindo. Em 2007, o Ministério da Educação (MEC) lançou o Plano de
Desenvolvimento da Educação, sobre o qual Saviani (2009, p. 16 apud CARDOSO;
OLIVEIRA, 2019, p.68) diz que “enuncia-se uma visão sistêmica de educação que permitiria
superar a visão fragmentária”. Nesse plano, o Programa Mais Educação (PME) foi o que
mais contribuiu para o incentivo da educação integral. Este programa tinha o objetivo de
promover a educação integral por meio da ampliação dos espaços e tempos educativos com
atividades socioeducativas no contraturno. Além disso, em 2014 foi sancionado o PNE II,
que colocou a meta de oferecer educação em tempo integral, no mínimo, em 50% das
escolas públicas e para 25% dos estudantes de educação básica no Brasil (HAYASHI;
KERBAUY, 2016).
Já em 2016, o governo Temer causou muitos retrocessos nesse tema, substituindo o
Programa Mais Educação (PME) pelo Programa Novo Mais Educação (PNME), com o
discurso de que aquele plano não havia atingido os objetivos propostos de alcançar as
metas estabelecidas pelo Índice de Desenvolvimento de Educação Básica (IDEB). Sendo
que a métrica utilizada para chegar a tal conclusão foram os dados quantitativos da
23

pesquisa feita pela Fundação Itaú Social em parceria com o Banco Mundial (CARDOSO;
OLIVEIRA, 2019), que não levam em consideração que as escolas atendidas pelo programa
tinham péssimas condições físicas e pedagógicas. Um dos retrocessos do PNME é a sua
principal estratégia, que é aumentar a jornada escolar para melhorar a aprendizagem de
língua portuguesa e matemática em vez de proporcionar uma educação integral
(SAQUELLI, 2018).
24

7 ANÁLISE DE UMA EXPERIÊNCIA NO CONTEXTO ATUAL

Dentro desse contexto de retrocesso no crescimento da educação integral no país


iniciado no governo Temer, Resende, Hilário e Nascimento (2020) fizeram uma pesquisa
com o objetivo de descobrir quais são os desafios das escolas do estado do Rio de Janeiro
que tiveram que aderir a modalidade de educação integral e como os profissionais dessas
escolas se colocam quanto a responsabilidade de organizar o sistema para que o tempo
estendido realmente se converta em ensino integral.
Eles pesquisaram três escolas, entrevistando dois gestores de educação em tempo
integral na cidade do Rio de Janeiro e dois gestores da cidade de Barra Mansa, além de 9
professores de cada uma dessas unidades. Com os relatos, eles constataram que a falta de
infraestrutura adequada, devido a má gestão dos governantes, é um dos problemas para
que as escolas consigam aderir ao modelo de tempo integral adequadamente, não
proporcionando uma educação integral como diz a Diretrizes Curriculares Nacionais para o
Ensino Fundamental de Nove Anos:
A proposta educacional da escola de tempo integral promoverá a ampliação
de tempos, espaços e oportunidades educativas e o compartilhamento da
tarefa de educar e cuidar entre os profissionais da escola e de outras áreas,
as famílias e outros atores sociais, sob a coordenação da escola e de seus
professores, visando alcançar a melhoria da qualidade da aprendizagem e
da convivência social e diminuir as diferenças de acesso ao conhecimento e
aos bens culturais, em especial entre as populações socialmente mais
vulneráveis. (BRASIL, 2010, Art. 37 apud RESENDE; HILÁRIO;
NASCIMENTO, 2020, p. 12)

Outro problema que eles constataram é a não participação dos professores nas
discussões das políticas públicas implementadas, fazendo com que 78% dos professores
entrevistados, conforme seus relatos, não conheçam a proposta de tempo integral. Foi
percebido também que os professores enfrentam instabilidade dos projetos devido a
descontinuidade quando são iniciados por gestões públicas anteriores.
Outra situação relatada foi o desvio da política pública de tempo integral mais para a
proteção social que para proteção integral dos alunos, ou seja, a escola não dá atenção
suficiente para o ensino, focando os investimentos em alimentação e em formas de afastar
as crianças das drogas.
25

8 A HISTÓRIA DO IDEALIZADOR DOS CIEPS: DARCY RIBEIRO

Darcy Ribeiro nasceu em Montes Claros, MG, em 1922, filho de Josefina Augusta da
Silveira, professora primária, apelidada de Dona Fininha, e de Reginaldo Ribeiro dos
Santos, farmacêutico. Foi criado pelo pai até os três anos de idade, quando este faleceu. A
partir de então teve o seu tio como tutor, um fazendeiro. (GOMES, 2010)
Completou a educação primária e secundária na cidade natal. Enquanto isso,
curioso, estudou por conta própria na biblioteca do seu tio na fazenda. Depois foi fazer
faculdade de Medicina em Belo Horizonte para atender o sonho da mãe, enquanto seu tio
queria que ele herdasse a sua fazenda e desse continuidade ao seu trabalho como
fazendeiro (Ibid.).
Darcy não se encontrou no curso de Medicina e foi mau aluno, não realizando assim
o sonho da mãe, mas enquanto cursava, frequentava outros cursos na Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras. Ele também não se satisfazia com o comodismo oferecido pelo
seu tio de obter posição social e segurança para o seu sustento, sem sair do meio onde
vivia, não realizando também o sonho do seu tio, que por isso, aborrecido, o deserdou
(Ibid.).
Ele se transferiu então para São Paulo, uma cidade mais cosmopolita que satisfazia
melhor as suas inquietudes e aspirações do que a menor Belo Horizonte. Lá ele ingressou
com uma bolsa de estudos na Escola Livre de Sociologia e Política a convite do diretor, o
Sociólogo Donald Pierson. Cursou ciências sociais com especialização em Antropologia, se
graduando em bacharel em 1945 e terminando o mestrado em 1947 (Ibid.).
Diferentemente de quando estava na faculdade de Medicina, ele foi excelente aluno
nessa escola porque ele havia se encontrado. Saiu da escola com uma bolsa de estudos
para doutoramento em ciências sociais na Universidade de Chicago. Mas ele recusou a
excelente formação de doutorado no exterior, que muitos gostariam de ter acesso e que
daria a ele amplas oportunidades no Brasil com poucos doutores na época, para fazer o
caminho inverso: como antropólogo, foi para o interior do Brasil estudar a cultura indígena
(Ibid.).
Darcy entrou nesse caminho indigenista ao ser admitido em 1947 pelo Marechal
Cândido Mariano da Silva Rondon na Seção de Estudos do Serviço de Proteção ao Índio
(SPI). Nessa instituição não havia classificação ocupacional de etnólogo ou antropólogo e
por isso ele foi classificado como “naturalista”. Nesse caminho ele concebe um Brasil
aniquilado e desconhecido pela civilização (Ibid.). Sobre a situação das áreas culturais
indígenas, ele conclui em uma de suas pesquisas que
[...] é como uma formação capitalista de caráter neocolonial que a
sociedade brasileira mais afeta os grupos indígenas, pela apropriação de
suas terras para a exploração extrativista ou para formar novas fazendas
26

agrícolas e pastoris e pelo seu aliciamento como mão de obra barata para
ser desgastada na produção de mercadorias (RIBEIRO, 1979, p.445 apud
Ibid., p. 29).

Situação essa que ocorre ainda hoje no país de forma mais complexa devido à
globalização e à mundialização. Nas suas anotações das pesquisas percebe-se que ele
tinha uma relação muito afetiva com os índios, considerados por ele não como objetos de
pesquisa, mas como sujeitos pesquisando-pesquisadores (Ibid.).
Esses trabalhos como indigenista serviram como inspiração para que Darcy
escrevesse diversos romances na literatura. Nesses romances os índios eram retratados em
sua forma real, como o autor tinha observado em suas pesquisas (Ibid.). Um índio “[...] em
aculturação, marginalizado, ‘protegido’ (quer dizer, domesticado), dotado de cultura
riquíssima, porém sofredor do avanço das fronteiras econômicas e das doenças físicas e
morais do homem branco.” (Ibid, p. 30)
Essa forma de representação do índio difere das obras literárias tradicionais da
época, que contribuem para identidade nacional, que mostravam um índio com modos e
atitudes da cultura européia (Ibid.).
Sua fase “naturalista” durou 10 anos, terminando em 1957, devido a conflitos
com o SPI, porque havia um excesso de burocracia nas suas ações, e devido a conflitos
com antropólogos. E então inicia-se a sua fase como educador, ao ser convidado por Anísio
Teixeira para trabalhar como diretor da Divisão de Estudos e Pesquisas Sociais do Centro
Brasileiro de Pesquisas Educacionais e colocar os seus conhecimentos de ciências sociais a
serviço da educação (Ibid.).
Nesse cargo, ele organizou um curso de pós-graduação para formar pesquisadores
sociais e de educação. Posteriormente ocupou outros cargos na área de educação e na
política, lutando junto a Anísio pela escola pública, construindo a Universidade de Brasília
(UNB) e implementando a primeira LDB. No exílio durante a ditadura militar, contribuiu para
a construção de diversas universidades fora do país. Ao voltar do exílio, ele continuou a
trabalhar pela educação brasileira ocupando diversos cargos políticos, construindo os
Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs), a Universidade Federal do Norte
Fluminense e lutando, como senador federal, pela a implementação da Segunda LDB (Ibid.).
A cronologia da vida de Darcy, incluindo partes das fases como educador e político que não
estão incluídas nesta seção, encontra-se no anexo deste trabalho.
27

9 O CENTRO INTEGRADO DE EDUCAÇÃO PÚBLICA: UMA EXPERIÊNCIA DE


EDUCAÇÃO INTEGRAL NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Nessa seção serão mostrados alguns aspectos importantes dos CIEPs, que foram
escolas que surgiram na década de 80 como a primeira política pública de educação integral
no Brasil, no contexto de redemocratização, para alunos e professores, lidando com as
desigualdades sociais herdadas da segregação social na época colonial e ampliada durante
a ditadura civil-militar também os pensamentos e as instituições que perpetuavam a pobreza
(VELLOSO, 2018).
Alguns trechos de registros dos relatos recebidos neste trabalho que se relacionam
com as informações encontradas na literatura foram adicionados ao texto.

9.1 História, motivação e objetivo da proposta

Leonel Brizola foi eleito governador com Darcy Ribeiro como vice-governador, no
meio do processo de redemocratização do país nas eleições diretas de 1982, depois de 18
anos sem eleições diretas para o cargo. Os CIEPs foram fruto de uma forte política
educacional nesse governo (GOMES, 2010).
Ao ser eleito, Brizola nomeou a Comissão Coordenadora de Educação e Cultura,
colocando Darcy como presidente. A Comissão era composta também pela secretária de
educação do estado e do município, Iara Vargas e Maria Yedda Linhares, respectivamente,
e o reitor da UERJ (VELLOSO, 2018).
Ao ser constatado os dados de reprovação, evasão e desigualdade social dos alunos
de camadas populares, que contrastavam cada vez mais com os alunos das classes mais
abastadas, a Comissão propôs um debate com professores da rede estadual,
administradores educacionais e líderes sindicais para identificar os problemas que estavam
ocorrendo na educação e as possibilidades de mudança, o Encontro de Mendes, que
ocorreu entre os dias 25 e 26 de novembro de 1983 (Ibid.).
O Encontro foi organizado pela professora Rosiska Darcy de Oliveira e por Darcy
Ribeiro. Sobre a organização do encontro, Velloso diz que
Os 52 mil professores do então 1º Grau da Rede Pública de Ensino
debateram em suas escolas a realidade da educação no Brasil, no Estado e
em seus Municípios, apontando os problemas e soluções. A partir disto,
foram sendo escolhidos proporcionalmente, 1000 delegados regionais,
posteriormente, esses delegados escolheram 100 de seu total e que
pudessem representar todas as regiões do Estado e assim, somar
juntamente com os administradores educacionais e líderes sindicais, o
Encontro de Mendes. Além disso, 30 mil cartas de professores foram
encaminhadas para leitura neste encontro educacional (Ibid., p.43).
28

A autora também mostra que os problemas identificados nesse encontro foram que
as escolas públicas eram antipopulares e tiveram o crescimento desconsiderando a
realidade dos locais, que tinham altos índices de reprovação e evasão já nas duas séries
iniciais e que culpavam os alunos, professores e familiares pelo fracasso escolar.
Quanto a essa culpabilização inapropriada dos alunos, Darcy concorda com ideia de
alquimia social apresentada por Costa (2016), descrita no capítulo 5, dizendo que a escola
“Tenta provar ao aluno pobre que ele é pobre porque é burro, quando, na verdade, ela é que
não lhe dá as condições de superar suas dificuldades. Nossa escola atribui o fracasso das
crianças pobres à deficiência que elas trazem de casa.” (RIBEIRO, 1986, p.32 apud Ibid., p.
43).
Ele também diz que
A ilusão principal de nossa escola é a ideia de que ela seleciona e promove
os melhores alunos, através de procedimentos pedagógicos objetivos. De
fato, ela apenas peneira e separa o que recebe da sociedade já
devidamente diferenciado. Ao tratar da mesma maneira crianças
socialmente desiguais, a escola privilegia o aluno já privilegiado e discrimina
crianças que renderiam muito mais se fossem tratadas a partir das suas
próprias características.(RIBEIRO, 1986, p.34 apud Ibid., p. 43).

Para lidar com os problemas identificados no Encontro de Mendes, foi proposto o


Programa Especial de Educação (PEE), sendo uma Secretaria Especial de Educação. A
diretriz básica do programa foi
a recuperação da Escola Pública, melhorando-a e colocando-a efetivamente
ao alcance de todas as crianças e jovens do Estado. O grande objetivo, a
ser cumprido dentro do quadriênio do mandato governamental, é consolidar
um ensino público moderno, bem aparelhado e democrático, capaz de
ensinar as crianças a ler, escrever e contar, no tempo devido – e com a
correção desejável. (RIBEIRO, 1986, p.35 apud Ibid., p. 44)

No relato da Profissional 8, ela conta mais sobre a Secretaria Extraordinária:


[...]a secretaria de educação tinha a secretaria das escolas regulares e tinha
uma secretaria extraordinária que acompanhava, orientava e dava suporte
só pros CIEPs, tamanha a peculiaridade da proposta. E a ideia era trabalhar
com o aluno como protagonista, o aluno aprendendo a pensar, o aluno…
é… vivenciando o máximo que podia dos conceitos pra aprender a partir da
vivência, a partir do experimento, a partir da vivência o tempo inteiro. Então
não era memorizar por memorizar, copiar por copiar… Então os materiais
que chegavam pra gente eram materiais muito ricos. Então, por exemplo,
quem trabalhava com primeiro ano, a cartilha tradicional, as cartilhas que a
gente encontrava na época, nem entravam no CIEP. É… foram produzidos
materiais específicos e que não traziam já a definição das palavras que iam
ensinar… Não. Traziam roteiros de histórias, músicas, poemas… Então
muitas historinhas, poemas é… poemas cantados e tal, que a gente usava,
já vinha de material da secretaria extraordinária. Então vinha a… a caixinha
já vinha a história com a música com o vídeo… e aí a gente ia
desenvolvendo todo o trabalho com base naquele material (PROFISSIONAL
8).
29

O PEE foi dirigido pela Comissão Coordenadora de Educação e Cultura e teve,


dentre outras metas importantes, a construção de 500 CIEPs em áreas de vulnerabilidade
social até 1987. Darcy, coordenador da primeira fase do Programa Especial de Educação
(PEE), construindo os CIEPs, teve a oportunidade de continuar o trabalho de Anísio Teixeira
(GOMES, 2010), que foi interrompido pelo ministro Gustavo Capanema na década de 1930
(FERNANDES, 2022), como mostrado anteriormente no capítulo 6.
Para atingir as metas, era necessário que houvesse continuação do Programa no
mandato do próximo governador. Como na época não havia possibilidade de reeleição,
Darcy Ribeiro precisava ser eleito como governador em 1986, depois do primeiro mandato
do Brizola, para dar continuidade ao programa, o que não aconteceu. Darcy ficou em
segundo lugar, com Moreira Franco sendo eleito.
Durante o mandato de Moreira Franco, houve uma paralisação do PEE e os CIEPs
pararam de ser construídos. Além disso, os que já estavam em funcionamento começaram a
ser abandonados com base no discurso de “igualdade de escolas”, reduzindo a
disponibilidade de professores e o investimento em alimentação.
Em 1991, Brizola foi eleito novamente como governador e Darcy foi eleito como
senador federal, podendo assim o Programa ser continuado. A meta de construção de 500
CIEPs foi então alcançada em 1994. Nesse ano foi eleito Marcello Alencar, que tinha
conflitos políticos com Brizola e Darcy. Então ele começou a abandonar o projeto dos CIEPs
até acabar com as propostas originais e se tornarem descaracterizados como hoje, cortando
recursos na tentativa de apagar essa ideia da lembrança dos profissionais da educação,
estudantes e das pessoas em geral.
Alguns trechos abaixo de relatos registrados confirmam a ocorrência desse
abandono político dos CIEPs.
Trecho do texto da Profissional 1, que trabalha em CIEP desde 1994:
Os CIEPs sofreram através do tempo muitas mudanças. Antes assegurava
a permanência das crianças no turno integral, com várias atividades
(atividades esportivas e recreativas, acesso à leitura de livros, vídeos e
participação em eventos culturais).
Agora está tudo diferente. Os alunos parecem que vem[sic] para a escola
obrigados. quando é dia do profº de educação física o CIEP fica cheio,
quando não chegam de cara emburrada, isso quando vem[sic].

Trecho do áudio da Profissional 3, desde 1990:


[...]pelas minhas leituras, o projeto do CIEP, né, o original, ele é excelente,
né, ele tinha todo… Primeiro que o espaço é maravilhoso, né: tem uma
quadra, ele tem uma sala de leitura externa, é… muito bonito, atrativo, né, a
parte física dele. E o projeto também previa uma série de… é… rede de
apoio, que tinha… dentista, tinha psicólogo, então tinha uma rede de apoio
que ajudava, né, na… na formação daquele aluno, o que hoje a gente num
vê, né. Com o passar do tempo, né, houve um… é… foi deteriorando, né,
esses recursos… num digo deteriorar, né. Foram, né, sendo excluídos
mesmo, não foram… não teve a manutenção, né…[...]r. Então, é… ficou…
30

é… pouco usado, né. Alguns até nem tem mais… é… não usam a sala de
leitura que era original, né, fora do prédio,[...] a gente foi vendo que com o
tempo, é… foi perdendo-se isso. E aí o projeto original… foi por água a
baixo, não se manteve por muito tempo. As questões políticas, né, que a
gente já conhece não… cada vez menos investimento na área da educação,
né, e… quando eu falo menos investimento na área da educação, se refere
(sic) também aos investimentos que dão suporte à educação, né. É um…
como eu falei, é… o psicólogo, é o assistente social, todo uma rede de
apoio que tem que tá trabalhando junto, né, setorial, pra fazer com que esse
aluno aprenda, que essa educação, essa formação seja completa, né,
efetiva

Trecho do áudio da Profissional 8, começou a trabalhar no CIEP em 1985:


O problema é que, como virou uma proposta de governo, é… quando
mudou o governo, a primeira coisa que o governo novo fez foi tentar
desmontar essa escola como um todo. Como é… politicamente seria muito
ruim pro governador desmontar, acabar com a escola, ele simplesmente
deixava de enviar recursos financeiros. Então sem recursos financeiros, não
tinha comida. Sem comida, a gente não podia ficar com a criança no dia
inteiro. Sem a criança o dia inteiro, o projeto já tava detonado. Então ao
invés(sic) de acabar com o CIEP, ele foi acabando com a estrutura por
baixo pra que a própria comunidade, tanto acadêmica, né, quanto a do
entorno, começasse a desacreditar dessa escola. Então quando
começavam… primeiro, é… achavam que era muito gasto pra esse público.
Classe média, né, brasileira começou a se ressentir daquela escola ser tão
cara, tão rica prum público tão pobre, tão miserável, como se esse público
num tivesse direito à coisa boa, né? A uma educação de qualidade. E
depois, começou a ser implantado, paulatinamente, a ideia de que aquela
escola era escola pra marginal, que se você… ama seu filho, você não
coloca seu filho nessa escola… e… e com a falta de recursos, a escola
virou um depósito de crianças ao longo dos anos. [...]Moreira Franco entrou
fazendo exatamente isso que eu to te falando: minando, sucateando a
escola, deixando de mandar verba… é… as pessoas pediam transferência,
eles deixavam os professores pedirem transferência… e aí faltava
professor… Sem professor, sem uma equipe, como é que você mantém um
aluno o dia inteiro com aquela estrutura que você tinha antes? Então você
passa a não ter mais aquela estrutura… é… enfim, vai minando. Quando
acabam os quatro anos de Moreira Franco, o Leonel Brizola se candidata de
novo, e vence, e volta. Só que, quando volta, já encontra tudo destruído,
descaracterizado… [...]E aí, o Leonel Brizola não conseguiu reerguer, ele
tentou… Alguns ele conseguiu, os mais centrais, mas a gente tinha CIEP
em cada buraco do Rio de Janeiro, a gente encontrava, no meio do mato.
Em muitos, o CIEP acabou ficando mal visto, descaracterizado e… não
retomou aquilo que era na sua origem, lamentavelmente. Muitos materiais,
né, nesse período, entre uma gestão e outra do PDT, né, do Leonel Brizola,
é… muitos materiais sumiram, foram roubados, vários diretores foram…
responderam inquérito por… desvio de merenda, desvio de… é… televisão,
desvio de… é… recursos mesmo porque… é… é… era um absurdo, tinha
tudo, tudo o que o professor precisava ele tinha, inclusive projetos que a
gente criava junto com o profissional que a gente é… tinha o nome de
animador cultural.

O assunto do profissional animador cultural, mencionado pela Profissional 8., será


tratado, dentre outros, na próxima subseção.

9.2 A proposta pedagógica dos CIEPs


31

Para lidar com o problema constatado no Encontro de Mendes, do alto índice de


reprovação que as escolas públicas tinham nas séries iniciais do ensino fundamental, as
crianças eram ensinadas a ler, escrever e a realizar operações numéricas sem
desconsiderar as suas realidades, começando pelas suas vivências, os conhecimentos que
já possuíam para sobreviver, para então chegar na formalidade do ensino e ao domínio do
código padrão da língua (VELLOSO, 2018).
Além disso, as avaliações eram contínuas e de diversas formas, como atividades
lúdicas, físicas, cognitivas e práticas artísticas, valorizando as potencialidades dos alunos
para além da habilidade de se expressar por meio da norma padrão da língua em uma
avaliação escrita durante um horário de aula definido, como ocorrem nas escolas
tradicionais. Dessa maneira, o estudante enxergava seus potenciais e a possibilidade de
sucesso na escola, tendo sua autoestima estimulada, evitando a reprovação e também,
consequentemente, a evasão (Ibid.).
O projeto dos CIEPs foram inspirados em experiências como a do CECR de Anísio
Teixeira, descrita no capítulo 6, mas houve uma diferença: no CECR, as atividades culturais
das Escolas-Parque eram realizadas no contraturno, desvinculadas do ensino formal das
Escolas-Classe, como se aquela apenas complementasse esta. Nos CIEPs, todas as
atividades necessárias para a formação integral ocorriam no mesmo espaço do ensino
formal, realizando uma transdisciplinaridade não só entre as disciplinas tradicionais, mas
entre todo o currículo da escola, incluindo as atividades cotidianas de assistência social,
como as de alimentação e higiene. Com isso, ocorriam, na prática escolar, momentos
interdisciplinares com atividades recreativas, esportivas e artísticas dentro e fora da escola
(Ibid.). O trecho abaixo, do relato da Profissional 8, mostra como o refeitório era também
integrado ao ensino.
E o mais interessante do… do CIEP é que tudo era pedagogicamente
pensado, então, por exemplo, até no refeitório tinha o espaço pra criança
fazer lá o espaço na filinha da turma pra receber a bandeja, era uma
bandeja de alumínio com as divisões, né, e que é… pra receber todo o
alimento que era absolutamente balanceado, um pouquinho de cada, é…
tipo, né, de alimento, sempre muito equilibrado que tinha uma nutricionista
que fazia isso, a nutricionista não era nutricionista de… da rede toda, mas
era nutricionista que fica responsável pelo CIEP. Então ela ficava
responsável somente pelo CIEP, pela unidade… ela era vinculada àquela
unidade escolar, então ela podia se dedicar a planejar, procurar melhor local
pra comprar, ajudava na licitação, então era tudo muito bem planejado. E a
criança era orientada o tempo todo a avaliar o que ia comer pra evitar
desperdício… né, o tempo todo. E aí ela pegava a… merendeira, colocava
nos espaços certinhos a… a refeição e depois tinha o espaço pra criança
jogar o residuozinho, que tivesse, numa lixeira e encaixar numa… num vão
que dava pra parte específica de lavagem das louças, né. Então era tudo
construído pensando pra que a criança, depois de um tempo, tivesse
autonomia pra circular nesses espaços sabendo quais seriam as regras,
como é que teria que ser, quais dificuldades teria que ter… o tempo todo as
crianças eram orientadas a utilizar esses espaços da forma mais didática,
né, mais pedagógica possível. Isso eu achava muito interessante.
32

Porém já no segundo mandato do Brizola, depois do abandono de Moreira Franco,


as atividades lúdicas e acadêmicas passaram a ser intercaladas como no CECR (GOMES,
2010)
Para realizar essa prática pedagógica com todas essas atividades de forma
integrada, havia um profissional muito importante nos CIEPs, o animador cultural. Esse
profissional era responsável por fazer o elo entre a realidade, a cultura dos alunos, com a
escola, além de “[...] integrar as áreas do conhecimento, propor o lúdico, entender a
realidade e propor linguagens diferentes para estes estudantes, se baseando de noções do
corpo, do espaço, das artes, dentre outros aspectos” (Ibid., p. 55).
A Profissional 8 assim relata a experiência que teve com os projetos junto ao
animador cultural:
era um profissional da comunidade, que trabalhava pra fazer esse elo, né,
da… da cultura local com os professores que chegavam, né, com a própria
cultura escolar. E… É… A gente criava projetos… eles pediam assim, tipo,
15 dias de planejamento… planejava 15 dias depois o material inteiro tava
dentro da escola. Então não tinha como a pessoa dizer que não ia trabalhar,
não ia realizar. E a gente viu muitas vidas sendo mudadas a partir desse
projeto, sabe? É… quem ficou mais tempo dentro do CIEP acompanhando
os alunos, as turmas é… conseguiu observar isso.

Os profissionais dos CIEPs planejavam a sua prática continuamente em conjunto


para que ela conseguisse oferecer o que propôs, incluindo o corpo técnico, indo da limpeza,
gestão escolar e até os do atendimento médico odontológico, e tinham dedicação exclusiva
para um CIEP. Eles participavam também de formação continuada, recebiam uma melhor
valorização e dedicavam metade do tempo com planejamento das atividades, avaliação e
contato com a comunidade (VELLOSO, 2018), como também relata a Profissional 8:
[...]toda semana, a gente tinha um horário que era no final da tarde, duas
horas, né, um é… um dia da semana, duas horas no turno da tarde pra que
os professores das cinco áreas se reunissem pra estudar, plenejar… na
verdade era assim: dois dias eram pra planejamento, e aí separava
primeiro, segundo terceiro ano fazia o planejamento em grupo. Terceiro e
é… quarto e quinto fazia outro planejamento, de vez em quando a gente se
reunia. E um outro dia, também, duas horas do final da tarde a gente se
reunia pra estudar. Então se eu tivesse com alfabetização, eu estudava
sobre teorias voltadas pra alfabetização. É… teorias da aprendizagem…
Isso, assim, direto, direto. A gente é… tinha os livros, recebia os livros e…
estudava, fazia rodas de estudo. Então isso fortalecia muito tanto a unidade
do trabalho… então nesse momento que a gente tava fazendo esses
estudos, os alunos estavam encaixados nessas outras atividades, sabe?
É… e tudo articulado, então o professor que tivesse lá não taria no
planejamento, mas taria marcado com ele o planejamento num outro
segmento… Era sempre muito… bem planejado pra que todo o mundo
tivesse acesso e participasse… não só acesso, mas pudesse participar do
ato do planejamento. Então a gente via as coisas acontecer numa escola
enorme, um- uma… criançada danada, mas as coisas aconteciam. [...]
Então, assim, tudo tinha uma… uma justificativa uma fundamentação teórica
muito forte. Por isso que era importante a gente participar… era importante
não, a gente nem cogitava a hipótese de a gente não participar dos
33

encontros de… de… de formação, né, ou a gente chama de formação, é…


lá eles falavam grupos de estudo, grupo de trabalho, grupo de estudo. Então
o estudo era fundamental até pra que a gente pudesse, não aprender a
aplicar, a ideia não era essa, mas é entender os princípios que norteavam
aquela escola, né, aquela escola que tava sendo, ali, implantada. E pra que
desse certo a gente tinha muita conversa e muito estudo.

9.3 Estrutura física e serviços

Para que a proposta dessas escolas fosse realizada, a estrutura física e os recursos
humanos foram um aspecto importante planejado para esse fim.
Os CIEPs, tal como projetados por Darcy Ribeiro, são unidades escolares
onde os alunos permanecem das 8 da manhã às 5 da tarde. Cada CIEP
possui três blocos. No bloco principal ficam as salas de aula, centro médico,
cozinha, refeitório e um grande pátio coberto. No segundo bloco fica o
ginásio com vestiário e quadra polivalente (pode ser utilizada também para
apresentações teatrais, shows, etc.). No terceiro bloco fica a biblioteca e
sobre ela as moradias para alunos residentes. Ainda segundo o projeto
original, os CIEPs contariam com professores de educação física, artes,
estudo dirigido, teleducação e animadores culturais. (CAVALIÉRI, 2000, p.
05 apud VELLOSO, 2018, p. 57).

A figura 2 abaixo ilustra a arquitetura padronizada para todos os CIEPs, exceto para
aqueles construídos em locais com espaço insuficiente, para onde era proposto uma versão
mais compacta (RIBEIRO, 1986).

Figura 2: Arquitetura padrão dos CIEPs

Fonte: (Ibid., p. 104)


34

Nela o bloco principal possui 3 andares. No térreo, há o refeitório com capacidade


para 200 pessoas e uma cozinha projetada para preparar o desjejum, almoço e lanche para
até 1000 crianças. Ainda no térreo, no canto oposto ao do refeitório, fica o centro médico.
Entre o refeitório e o centro médico fica uma ampla área de recreação coberta. Nos dois
andares superiores ficam as salas de aula, salas especiais (para Estudo Dirigido e outras
atividades), auditório, e instalações administrativas como ilustram as figuras 3, 4 e 5. No
terraço ficam uma área de lazer e dois reservatórios de água (Ibid.).

Figura 3 - Térreo do prédio principal

Fonte: (Ibid., p. 106)

Figura 4 - 1º andar do prédio principal

Fonte: (Ibid., p. 106)

Figura 5 - 2º andar do prédio principal


35

Fonte: (Ibid., p. 106)

Os CIEPs tinham em sua filosofia a intenção de educar e capacitar os alunos a


conviver em sociedade. Essa intencionalidade se manifestava também na arquitetura
(MOREIRA; GÓIS; SOARES, 2019). Os autores também citam que
O espaço físico dos CIEPs/CAICs e as atividades aí desenvolvidas
requerem que os alunos percebam que o comportamento de cada um
determina o do conjunto. É dever da equipe de Direção capitanear esse
processo, exigindo que os professores se responsabilizem pela educação
dos seus alunos no que diz respeito à conservação de todo o material
escolar, bem como no que se refere aos hábitos e às atitudes sem os quais
não se vive em sociedade. É fundamental que o professor crie nos seus
alunos o hábito de falar baixo, hábito de andar sem correrias pelos
corredores, de participar, na sua vez, das diversas atividades, de cuidar do
material que é comum a todos (Arquivo Fundar DR, 1994.00.00, gbII, Pasta
III apud MOREIRA; GÓIS; SOARES, 2019, p.14).

Uma característica da arquitetura nesse sentido é que a escola era cercada por
grades vazadas para se comunicar com o entorno da escola e, para além dos três blocos, a
grande maioria dos CIEPs possuíam um amplo espaço externo (LOBACK, V.; VALENTIM,
2022). Monteiro (2009, p.37), professora que participou da gestão do projeto dos CIEPs no
segundo governo Brizola, diz sobre o espaço amplo que “Tantas atividades exigem um
espaço amplo e aberto – onde se possa vivenciar a liberdade e aprender que as regras são
necessárias para a convivência respeitosa e solidária.”
Outro aspecto da arquitetura nesse mesmo sentido é que as paredes nas salas de
aula eram baixas, não chegando até o teto, mantendo um vão que contribuia para uma boa
ventilação no ambiente e também servia, de certa maneira, como um limitador das vozes
das pessoas no prédio, fazendo com que elas falassem de forma cordial para não atrapalhar
a comunicação nas outras salas ( MOREIRA; GÓIS; SOARES, 2019). Darcy Ribeiro diz que
“as divisórias baixas da sala de aula são recomendadas exatamente porque, ao contrário do
que foi dito, forçam as professoras a não gritar. Se o fizessem seriam ouvidas em toda
escola. A tranquilidade é um ingrediente importante na escola” (Arquivo Fundar DR,
1989.00.00, gbII, Pasta III apud Ibid. p. 14) O trecho abaixo, da fala da Profissional 8 8
registrada neste trabalho, ilustra este aspecto.
36

Então, é… eu era muito jovem, né, 18, 19 anos, mas fiquei absolutamente
encantada com toda estrutura, tanto estrutura física, né, do prédio, tamanho
das salas, salas muito amplas, muito arejadas porque tinha janelas muito
amplas, né, e que, como as paredes do corredor eram vazadas, eram
baixas, não iam até o teto, então quando abria todas as janelas circulava um
ar natural fantástico. [...]a… parede até metade tinha um objetivo, tinha uma
finalidade, né. Era de respeitar, das pessoas falarem baixo, falarem de
forma cordial, professores, alunos, alunos com alunos, pra que um não
atrapalhasse o outro. Então a gente tinha que ficar se policiando e se
reeducando pra não berrar, como a gente costuma ver dentro das escolas,
sobretudo as escolas de primeiro, cês tendem a gritar, falar uma frase
simples, mas com tom de grito. E aí, lá, não cabia, se não ninguém
conseguia dar aula. Então era uma forma de reeducar as pessoas pra se
respeitarem naquele espaço.

A Profissional 8 menciona também o que ocorreu quanto a essa característica da


arquitetura depois da descaracterização dos CIEPs durante o governo de Moreira Franco,
mostrada na subseção 9.1:
E aí, quando eu fui… voltei pra São Gonçalo, os CIEPs já estavam com
parede até o teto e com necessidade de ar-condicionado, né, porque se
você fecha, fecha a circulação também de é… é… se descola da ideia
original e ainda agrega um problema aí ambiental, que é o ar-condicionado,
desnecessariamente[...]

Mas a arquitetura por si só não era o suficiente para educar professores e alunos
como usar os espaços de uma forma mais eficiente e adequada. Eles traziam em sua
bagagem outras experiências escolares. Como Darcy mencionou, alguns profissionais e
alunos não se adaptaram a essa ideia e se incomodavam com os ruídos que vinham de
outras salas (Ibid.). Os trechos abaixo, do relato da Profissional 3 e do Profissional 7
registrados neste trabalho, corroboram com essa informação.
É… e outra coisa que eu também senti foi um choque cultural, né, de
valores, de comportamento… e lá tinha uma dificuldade também, hoje em
dia não… é… as paredes do CIEP, elas não fechavam, né, elas iam até um
certo ponto. Então o barulho da sala ao lado invadia. Era muito barulhento.
Agora… é… E tinha uma outra questão. Que eles… é… não sei explicar
por quê, eles tinha uma hora que eles não queriam ficar mais dentro de
sala. Então eles colocavam a carteira perto da parede e pulavam pro
corredor. Então isso era uma coisa que me chocava muito, né, no início, né.
O estágio que eu vivenciei não tinha uma relação assim de professor e
aluno, nesse comportamento, então foi uma coisa que me chocou
(PROFISSIONAL 3).
Desde o começo, eu percebia uma certa dificuldade do corpo docente em
adaptar-se à proposta de Darcy. Tinha… tinha que ter sido feita um… uma
consistente reciclagem pra que as professoras pudessem se acostumar a
essa nova proposta. Interessante também, na concepção de Niemeyer, as
paredes de cada sala não iam até o teto, terminavam pela metade. [...] E a
intenção era que as professoras dos CIEPs, elas hã… não gritassem tanto,
não falassem tão alto, a fim de não interferir na sala que estivesse ao lado,
mas é… isso aí… acabou não vingando, pelo menos aqui em Arraial, não
sei se em outros lugares continua sendo assim, mas em Arraial não. Hoje as
paredes vão até o teto porque infelizmente as pessoas não conseguem, né,
parar de gritar (PROFISSIONAL 7).
37

Quanto aos alunos residentes na escola, que ficavam nas moradias acima da
biblioteca, eles estavam sob os cuidados de dois funcionários públicos, os chamados “pais
sociais”, um casal selecionado entre os funcionários do Corpo de Bombeiros e da Polícia
Militar, que em troca da moradia na escola com seus filhos, ofereciam aos alunos um
convívio familiar e acompanhamento pedagógico (SANT’ANNA, 2010). Eram crianças em
situação de vulnerabilidade física e social, que teriam sua formação prejudicada se
voltassem para a casa depois da escola (VELLOSO, 2018).
Também com o objetivo de realizar o acompanhamento pedagógico, havia o serviço
de Estudo Dirigido nas salas especiais do prédio principal, que atendiam todos os alunos
para além dos que residiam na escola com os “pais sociais”. Como muitos alunos não
tinham pais disponíveis ou com escolaridade suficiente para ajudá-los em casa, essa
proposta cumpria essa função, evitando a reprovação e a evasão (FERREIRA; MOTA;
SIRINO, 2017). Sobre a proposta, Darcy Ribeiro diz que
O Estudo Dirigido visa possibilitar ao aluno da escola pública um
acompanhamento mais individualizado e mais sistemático de seu processo
de aprendizagem, através da realização de exercícios de aplicação e/ou
fixação do conteúdo ensinado em sala de aula. O estudo dirigido pode
consistir também em jogos pedagógicos que propiciem o desenvolvimento
de habilidades ou de estruturas lógicas, favorecendo a aprendizagem como
um todo. O Estudo Dirigido é realizado com toda a turma (25 a 30 alunos),
estimulando o aproveitamento individual e o coletivo, mediante o incentivo à
cooperação, socialização e solidariedade entre os alunos. O professor, por
sua vez, orienta os trabalhos levando em conta a experiência de vida e a
cultura de origem de cada aluno (1986, p. 127)

Ele diz ainda que todas as turmas participam dessas atividades nas salas especiais
por meio de um sistema de rodízio e que
[...] a definição das atividades fica a critério do professor que estiver
acompanhando a turma no momento, o qual deverá tomar conhecimento,
via coordenação da equipe técnico-pedagógica, das necessidades da turma
e/ou de cada aluno em particular, a fim de planejar as atividades (Ibid., p.
128)

Além de servir e educar os alunos, os CIEPs serviam e educavam a comunidade fora


da escola também. Eram como pólos de ação do Estado em locais de vulnerabilidade social
que antes eram abandonados por ele.
Vale ressaltar que os CIEPs se localizavam em áreas que historicamente
foram segregadas e excluídas pelas políticas públicas, bem como, os
atendimentos como odontológicos e médicos, eram também abertos à
comunidade, como todo o espaço escolar que tinha como perspectiva a
formação integral, levando a escola para a comunidade e a comunidade
para a escola, e fazendo parte do processo formativo da cidadania, tanto
dos estudantes professores, quanto da comunidade (VELLOSO, 2018, p.
53).

Para ilustrar como a presença dos CIEPs pode ser positiva, pode-se pensar em que,
atualmente, nesses locais abandonados, as igrejas neopentecostais preenchem parte das
38

lacunas das políticas públicas que o Estado não oferece (NUNES, 2022), influenciando as
pessoas com uma ideologia ultra liberal que prega o abandono de políticas ambientais,
sociais, inclusivas, além de pregar a meritocracia e o individualismo, colocando a culpa nas
pessoas pela posição de vulnerabilidade social em que se encontram (PINEL, RESES,
2021). Então a proposta dos CIEPs pode ter sido uma política pública que, ao alcançar
esses espaços, atuou evitando essa influência ideológica no local em sua época.
39

10 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo do trabalho foi cumprido, investigando o significado da educação integral e


a sua relação com o tempo integral nas escolas, assim como identificando as possibilidades
e limitações de sua implementação na experiência dos CIEPs.
A importância desta forma de educação chega a ser óbvia porque se baseia na ideia
muito simples de que a capacidade cognitiva dos educandos não é o único aspecto que
determina o sucesso de sua aprendizagem, já que a pessoa não é apenas uma máquina de
aprender e armazenar informações. A aprendizagem depende também da sua condição
emocional, do seu interesse pelo objeto de conhecimento a ser aprendido, que depende da
relação deste com as aspirações e objetivo que a pessoa possui na vida, e depende
também da relação que o educador faz entre o objeto de conhecimento e o aprendizado que
o educando tem em outros espaços além da escola ao vivenciar a sua cultura.
As formas de educação que não são integrais, que não consideram as vivências
culturais dos educandos em todos os espaços e as suas aspirações, fazem com que muitos
alunos das classes populares sejam excluídos do processo escolar por não se identificarem
com os que a escola propõe para se aprender, já que ela orienta o seu ensino considerando
os padrões culturais da classe média, cujos educandos possuem aspirações e vivências
culturais muito diferentes.
Apesar da sua importância, verificou-se na pesquisa que a principal limitação para
que a educação integral seja implementada foi a falta de motivação política. Dessa maneira,
considerando que essa é uma forma de educação imprescindível, ela deveria ser uma
política de Estado, independente dos agentes políticos que estão no poder. Mas,
infelizmente, para ser realizada ela precisa da boa vontade dos atores políticos do momento,
sendo então uma política de governo e podendo ser descontinuada ao mudar o governante,
como aconteceu com a política pública do CIEP.
Esse assunto ainda precisa de mais estudos e uma investigação mais aprofundada
dos limites, desafios e possibilidades de implementação da educação integral em tempo
integral atualmente em nosso país, para verificar se a falta de motivação política é o
principal fator que limita a sua realização assim como foi para os CIEPs.
40

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44

ANEXO - Cronologia da trajetória de vida de Darcy Ribeiro (GOMES, 2010)

1922 - Nasce em Montes Claros, Minas Gerais, em 26 de outubro. Filho de Reginaldo


Ribeiro dos Santos, farmacêutico, e de Josefina Augusta da Silveira, professora, cujo
apelido era Dona Fininha. O pai faleceu quando Darcy tinha três anos de idade.

1929 - Conclui os estudos primários e secundários em Montes Claros, no Grupo Escolar


Gonçalves Chaves e no Ginásio Episcopal de Montes Claros.

1946 - Forma-se em Antropologia pela Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo.
Nota: observe-se que a vida profissional, a seguir, embora às vezes coincidindo e se
superpondo, corresponde às “peles” referidas pelo próprio biografado.

1947-1956 - Trabalha com índios do Pantanal, do Brasil Central e da Amazônia, com


Rondon, no Serviço de Proteção ao Índio.

1950 - Publica o livro Religião e mitologia kadiwéu

1953 - Participa da fundação do Museu do Índio, Rio de Janeiro

1955-1956 - Atua como professor de etnologia da Faculdade Nacional de Filosofia da


Universidade do Brasil, Rio de Janeiro

1957 - Publica os livros Arte plumária dos índios kaapor e Uirá sai à procura de Deus (obra
de ficção baseada na vida indígena)

1957-1961- É nomeado por Anísio Teixeira diretor da Divisão de Estudos Sociais do Centro
Brasileiro de Pesquisas Educacionais, órgão do Inep; depois subdiretor do Inep (1959).

1959 - É encarregado pelo presidente Juscelino Kubitschek de planejar a Universidade de


Brasília

1961 - Exerce o cargo de primeiro reitor da Universidade de Brasília.

1962 - Publica, em forma de livro, o Plano Diretor da Universidade de Brasília


45

1962-1963 - Atua como ministro da Educação do Gabinete parlamentarista presidido por


Hermes Lima (presidente da República: João Goulart)

1963-1964 - Atua como Chefe do Gabinete Civil da Presidência da República, com João
Goulart.

1964 - É exilado no Uruguai (em Montevidéu, atua como professor da Universidad de la


Republica); participa da reforma e da fundação de várias universidades.

1967 - Publica o livro La universidad necesaria

1968 - Regressa ao Brasil. Publica os livros O processo civilizatório e La Universidad


Latinoamericana

1969 - Publica o livro As américas e a civilização. É preso e absolvido. Apesar disso, deve
deixar o país. Novo exílio. Publica o livro Os brasileiros: 1. Teoria do Brasil

1970 - Publica o livro Configurações histórico-culturais dos povos americanos

1971 - Exilado no Chile, atua como professor da Universidad de Chile. Assessora o


presidente Salvador Allende. Publica o livro Os dilemas da América Latina

1972 - Exilado no Peru, assessora o presidente Velasco Alvarado. Publica, sob a forma de
livro, Université des sciences humaines d’Alger

1974 - Constata em Paris um câncer de pulmão. Obtém licença do governo militar para vir
ao Brasil, a fim de fazer a cirurgia. Publica o livro La universidad peruana

1976 - Publica o livro Maíra (ficção baseada na pesquisa antropológica, em convívio com os
índios). Retorna do exílio. Fixa residência no Rio de Janeiro

1978 - Publica o livro UnB: invenção e descaminho

1979 - Anistiado, torna-se professor titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro, no


Instituto de Filosofia e Ciências Sociais

1981 - Publica o livro O mulo


46

1982 - Publica o livro Utopia selvagem (também obra de ficção baseada na pesquisa
antropológica). Candidata-se a vice-governador do Estado do Rio de Janeiro, tendo como
cabeça de chapa Leonel Brizola

1983-1986 - Atua como vice-governador, secretário de Cultura e coordenador do Projeto


Especial de Educação (que abrangia os Cieps).

1984 - Publica o livro Nossa escola é uma calamidade

1986 - Publica O livro dos Cieps. É reintegrado como pesquisador sênior do CNPq,
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

1990 - Participa da campanha eleitoral no Estado do Rio de Janeiro

1991 - Assume como senador e fica na função até 1997. Leonel Brizola é novamente
governador

1991-1992 - Secretário Extraordinário de Projetos Especiais do Estado do Rio de Janeiro:


novamente os Cieps

1991-1996 - Publica regularmente a Revista Carta: falas, reflexões, memórias, periódico de


cultura do seu gabinete

1992 - Envolve-se com o Projeto de Lei de Diretrizes e Bases - LDB (nº 67/92). É eleito para
a Cadeira nº 11 da Academia Brasileira de Letras, que tem como Patrono Fagundes Varela.
Predecessor: Deolindo Couto.

1993 - É recebido na Academia Brasileira de Letras por Candido Mendes de Almeida, em 15


de abril. Publica, sob a forma de livro, o Plano orientador da Universidade Estadual do Norte
Fluminense

1994 - Funda da Universidade Estadual do Norte Fluminense

1995 - Relata no Senado o Projeto da LDB. Publica o livro O povo brasileiro


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1996 - Envolve-se com os projetos da Universidade Aberta do Brasil e da Escola Normal


Superior e com a organização da Fundação Darcy Ribeiro. Publica o livro Diários índios: os
Urubus-Kaapor, uma narração da sua convivência com os indígenas dedicada à sua
primeira esposa, também antropóloga, Berta Ribeiro

1997 - Morre em Brasília, no dia 17 de fevereiro. Seu corpo foi sepultado no Mausoléu da
Academia Brasileira de Letras, no cemitério de São João Batista, no Rio de Janeiro

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