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UMA ANÁLISE CRÍTICA DO USO DO ORGANIZATIONAL CULTURE

ASSESSMENT INSTRUMENT (OCAI)

ANDREIA CARDOSO
UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

RESUMO

A cultura organizacional produz efeito no desempenho e na efetividade de longo prazo das


organizações, e, por esse motivo, é objeto de pesquisa na literatura acadêmica nacional e
internacional. Uma ferramenta para diagnóstico de cultura organizacional foi desenvolvida
por Cameron e Quinn (2005), o Organizational Culture Assessment Instrument (OCAI),
baseada no modelo teórico sobre indicadores de efetividade organizacional chamado
Competing Values Framework. Segundo Cameron e Quinn (2005), O OCAI é provavelmente
o instrumento quantitativo mais utilizado no mundo para o diagnóstico de cultura
organizacional. Por meio de uma revisão bibliográfica sistemática na literatura nacional, o
objetivo desta pesquisa é entender como os estudos nacionais utilizaram o OCAI: com qual
finalidade, quais as justificativas para a escolha deste instrumento, e quais as categorias de
análise que foram utilizadas. Os resultados demonstram que o OCAI é empregado para
realizar o diagnóstico de cultura organizacional, mas também para relacioná-lo com outros
constructos. Foi possível observar que esse instrumento possui um potencial que pode ainda
ser explorado por pesquisadores do tema.

Palavras chave: competing values framework, cultura organizacional, organizational culture


assessment instrument
1. INTRODUÇÃO

Segundo Cameron e Quinn (2005), a maioria dos autores concorda que o conceito de
cultura se refere aos valores assumidos (taken for granted), pressupostos básicos (SCHEIN,
2009), expectativas e definições que caracterizam as organizações e seus membros. Para tais
autores, a quantidade de fracassos da maioria das mudanças organizacionais planejadas está
relacionada à negligência com a cultura organizacional, que tem um poderoso efeito no
desempenho e na efetividade de longo prazo das organizações. Considerando a importância
do entendimento da cultura das organizações para o seu sucesso, Cameron e Quinn (2005)
elaboraram um instrumento para diagnosticar tipos de cultura organizacional, o
Organizational Culture Assessment Instrument (OCAI), com base em um modelo teórico
denominado Competing Values Framework (CVF), que resultou de uma pesquisa realizada
com os principais indicadores de efetividade organizacional. Para Cameron e Quinn (2005), o
OCAI é provavelmente o instrumento quantitativo mais utilizado no mundo para o
diagnóstico de cultura organizacional.
No entanto, os numerosos estudos que utilizaram o OCAI o empregaram com que
finalidade? Quais as justificativas para a escolha desse instrumento? Em quais categorias de
análise o OCAI foi utilizado? Foi usado como instrumento de diagnóstico organizacional?
Um levantamento da literatura nacional e internacional, sem filtro de período, nas bases
de dados da CAPES, SPELL, SciELO, EBSCO e ProQuest, utilizando as palavras
Organizational+Culture+Assessment+Instrument e Competing+Values+Framework nos
títulos e resumos dos artigos, não encontrou estudos que analisassem aspectos como
finalidade, objetivos e justificativas da utilização do OCAI, nas pesquisas acadêmicas
internacionais e nacionais.
Assim, tendo em vista os questionamentos abertos a respostas, este artigo tem por
objetivo analisar criticamente o uso do OCAI, como e por que ele é utilizado na produção
acadêmica nacional. Os objetivos específicos deste estudo são: entender quais os objetivos,
resultados e justificativas para a escolha do OCAI; analisar se ele é utilizado para o
diagnóstico da cultura organizacional, como variável dependente e independente, ou para
estabelecer relação com outros constructos; e verificar o tipo de escala utilizado na aplicação
do instrumento (ipsative ou normativa).
A contribuição deste trabalho para a literatura é esclarecer como e por que o modelo
Competing Values Framework é utilizado, revelando a abrangência e as possibilidades desse
instrumento para a pesquisa de cultura organizacional.
O estudo inicia com esta introdução, seguida por uma revisão da literatura sobre cultura
organizacional e a fundamentação do modelo teórico do Organizational Culture Assessment
Instrument (OCAI). Na sequência é descrito o procedimento metodológico que orientou a
revisão sistemática. Em seguida são apresentadas a análise e discussão dos resultados, e, na
última parte, articulam-se as considerações finais, as contribuições e limitações do estudo,
além de uma agenda para futuras pesquisas.
2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 CULTURA ORGANIZACIONAL

Segundo Martin (2002), quando as organizações são examinadas do ponto de vista


cultural, atenção é dada aos aspectos da vida organizacional que têm sido ignorados ou pouco
estudados, tais como as histórias que as pessoas contam para os recém-chegados para explicar
“como as coisas são feitas por aqui”, as formas como os escritórios estão dispostos, se itens
pessoais são ou não exibidos, as brincadeiras que as pessoas fazem, o ambiente de trabalho
(silencioso e luxuoso, ou sujo e barulhento), as relações entre as pessoas (afetuosas, tensas ou
talvez competitivas). A autora informa que a sua definição cultural é mais generalista do que
especialista, incluindo uma ampla variedade de manifestações ideacionais e materiais de
cultura, enfatizando a profundidade de interpretação, mas permitindo significados
compartilhados, conflitos e ambiguidade.
Martin (2002) afirma que a cultura organizacional possui três perspectivas: as da
integração, da diferenciação e da fragmentação. Na perspectiva da integração, a cultura é vista
como manifestações culturais que geram o consenso em torno de um conjunto de valores
compartilhados. Na perspectiva da diferenciação, o foco está nas manifestações culturais que
apresentam inconsistência na interpretação. Nesta perspectiva, o consenso existe, mas
somente nos níveis inferiores de análise, chamados de subculturas. Na perspectiva da
fragmentação as relações entre manifestações da cultura não são claramente consistentes ou
inconsistentes. Segundo Martin (2002), quando uma questão surge pode haver consenso entre
alguns indivíduos, enquanto outros são indiferentes à questão. A perspectiva da fragmentação
é difícil de ser articulada porque seu foco está na ambiguidade, e esta é difícil de ser
claramente conceituada.
Alvesson e Billing (2002) defendem que a cultura organizacional é formada por um
conjunto de simbolismos (rituais, mitos, estórias e lendas) e significados. O significado se
refere a como um objeto ou fala é interpretada, e pode tornar um objeto relevante e
significativo. Para esses autores, a pesquisa em cultura se concentra nos significados
ancorados e transmitidos de forma simbólica.
Hofstede et al. (1990) descrevem a cultura organizacional como um atributo interno de
uma organização, que é socialmente construída, determinada historicamente, e que
dificilmente muda. Para esses autores, a cultura se manifesta de diferentes formas, e os
elementos por eles destacados são os valores, símbolos, heróis e rituais, sendo que os rituais,
heróis e símbolos representam as manifestações mais superficiais da cultura, e os valores as
mais profundas. Os símbolos são as palavras, gestos, figuras ou objetos, a forma de vestir.
Podem aparecer e desaparecer constantemente, e por esse motivo são considerados a
manifestação mais superficial da cultura. Os heróis são pessoas vivas ou não, reais ou
imaginárias, que possuem características valorizadas em uma cultura. Os rituais são
atividades coletivas consideradas essenciais em uma cultura, como forma de cumprimento, e
cerimoniais, religiosos ou não. Os valores são considerados o núcleo da cultura, definem o
que é certo ou errado, e fazem parte do que uma criança aprende de forma até inconsciente; e
pelo fato de a aquisição ser precoce, a maioria dos valores é inconsciente (HOFSTEDE et al.,
1990).
Para Schein (1999), a cultura de um grupo é formada por um padrão de suposições
básicas compartilhadas, que podem ser entendidas como mecanismos de defesa cognitivos e
psicológicos que permitem a continuidade do grupo, e que foram aprendidas à medida que
solucionavam seus problemas de adaptação externa e de integração interna. O nível de
crenças e valores assumidos reflete as crenças e valores originais de alguém, que geralmente é
o líder.
Cameron e Quinn (2005) mostram que a maioria das discussões sobre cultura
organizacional concorda que a cultura é um atributo socialmente construído e que serve como
uma “cola” que mantém a organização unida. A cultura representa “como as coisas são por
aqui” e reflete a ideologia predominante que as pessoas têm em suas mentes. Transmite um
senso de identidade para os empregados, fornece guias, que não são escritos e nem falados,
sobre como progredir na organização. Os autores sugerem que as pessoas só atentam para sua
cultura até que esta seja desafiada, até que experimentem uma nova cultura, ou até que ela
seja exposta por meio de um modelo ou framework.

2.2 ORGANIZATIONAL CULTURE ASSESSMENT INSTRUMENT (OCAI)

A discussão de Cameron e Quinn (2005) sobre a importância da cultura organizacional


tem relação com a efetividade da organização. Na opinião desses autores, o sucesso ou
fracasso está relacionado também à importância ou negligência com que uma empresa trata
sua cultura organizacional, uma vez que a cultura é a “cola” que mantém uma organização
unida.
Diante desse cenário, a proposta desses autores foi ajudar os indivíduos a adotar formas
efetivas de diagnosticar e mudar a cultura organizacional, com o objetivo de aumentar o
desempenho organizacional. Eles fornecem um framework e uma ferramenta de sense making,
com passos sistemáticos e uma metodologia para ajudar gerentes e organizações a se adaptar
às demandas do ambiente em que a organização está inserida.
O instrumento desenvolvido por Cameron e Quinn (2005) para o diagnóstico de cultura
organizacional é o Organizational Culture Assessment Instrument (OCAI). O OCAI utilizou
como base o modelo teórico Competing Values Framework (CVF), e este, por sua vez, foi
concebido a partir de pesquisa realizada sobre os principais indicadores de organizações
consideradas efetivas.
Para que fique mais evidente a utilidade e a validade do modelo de Cameron e Quinn
(2005), destaca-se nesta revisão da literatura a metodologia utilizada no desenvolvimento do
CVF e do OCAI.

2.2.1 DESENVOLVIMENTO E METODOLOGIA DO COMPETING VALUES


FRAMEWORK (CVF)

Para o desenvolvimento do CVF, Quinn e Rohrbaugh (1983) partiram do princípio de


que efetividade organizacional não é um conceito e sim um constructo, e para validar esse
constructo utilizaram uma lista de 30 indicadores para medir efetividade, elaborada por John
P. Campbell em seu artigo “On the nature of organizational effectiveness” (1977, apud
QUINN; ROHRBAUGH, 1983). Esta lista de 30 índices de efetividade organizacional foi
selecionada porque resultou de uma grande revisão de literatura relevante, com a intenção
declarada de obter uma compilação abrangente de critérios de efetividade. Além disso, a lista
de índices foi complementada com definições explícitas de cada termo ou frase. Finalmente, o
artigo de Campbell (1977) passou a ser muito citado na literatura sobre efetividade
organizacional e, em consequência, a lista ganhou foco e atenção.
Quinn e Rohrbaugh (1983) realizaram um estudo exploratório inicial com sete
especialistas, e um estudo secundário com um grupo de 45 teóricos e pesquisadores.
No primeiro estudo, os sete indivíduos convidados possuíam pesquisas e publicações na
área de efetividade organizacional, doutorado em diferentes instituições acadêmicas, e
conhecimento em diversas áreas como sociologia, negócios, psicologia, administração pública
e comportamento organizacional. Os sete deveriam fazer o julgamento em dois estágios, a fim
de reduzir e organizar a lista de 30 critérios (QUINN; ROHRBAUGH, 1983).
Na primeira etapa, os participantes deveriam aplicar quatro regras de decisão para
eliminar os indicadores: 1) não estar no nível de análise organizacional; 2) não ser um
indicador único, mas um composto de diversos indicadores; 3) não ser um constructo, mas
uma operacionalização particular; ou (4) não ser um indicador de desempenho organizacional.
Cameron e Quinn (1983) justificam a escolha dessas regras por terem sido geradas por
critérios metodológicos por Campbell (1977, apud QUINN; ROHRBAUGH, 1983), que
admitiu que os 30 indicadores variavam em generalidade, operacionalização e proximidade
com o constructo final. Na segunda etapa, os participantes foram convidados a avaliar a
similaridade entre possíveis pares dos indicadores restantes através de uma sequência
sistemática de comparação utilizando notas em uma escala de 1 (muito diferente) a 7 (muito
semelhante). Na instrução enfatizou-se que os julgamentos fossem feitos unicamente com
base na semelhança conceitual ou dessemelhança dos indicadores, em lugar da probabilidade
de que os dois critérios pudessem variar de acordo com o contexto organizacional ao longo do
tempo (QUINN; ROHRBAUGH, 1983).
Quinn e Rohrbaugh (1983) informam que a finalidade da primeira fase da tarefa foi
reduzir a lista de indicadores de efetividade para conter apenas aqueles referentes à avaliação
do desempenho de unidades organizacionais. Treze dos trinta indicadores foram eliminados
por seis dos sete membros do estudo. O algoritmo INDSCAL, desenvolvido por Carroll e
Chang (1970, apud QUINN; ROHRBAUGH, 1983), foi utilizado na elaboração de uma
escala multidimensional para a análise. Como em outros procedimentos de escala
multidimensional, presume-se que no INDSCAL a avaliação dos participantes com relação à
similaridade depende da distância entre o indicador e espaço psicológico subjacente comum a
todos os participantes. Segundo Quinn e Rohrbaugh (1983), três dimensões emergiram da
análise do INDSCAL: a primeira foi o foco organizacional (interno e externo), a segunda foi a
estrutura organizacional (flexível ou controladora), e a terceira dimensão foi interpretada
como um reflexo do grau de proximidade com os resultados organizacionais desejados (meios
e fins).
Com o resultado do estudo exploratório inicial, Quinn e Rohrbaugh (1983) decidiram
replicar o estudo em um grupo maior e mais diversificado de teóricos e pesquisadores
organizacionais. Foram convidadas 76 pessoas, e 45 completaram a tarefa, ou seja, 60% da
amostra. Para assegurar a participação de um conjunto de teóricos organizacionais e
pesquisadores experientes, competentes e diversificados, foram adotados os seguintes
critérios: ter publicação de pelo menos um artigo no Administrative Science Quarterly,
durante um período de dois anos antes do início do estudo primário. O Administrative Science
Quarterly foi selecionado devido a seu foco para o desenvolvimento das teorias das
organizações, sua alta seletividade com relação a artigos aceitos para publicação, e seu foco
interdisciplinar.
Segundo Quinn e Rohrbaugh (1983), o procedimento aplicado foi o mesmo do estudo
inicial, utilizando apenas os 17 indicadores não eliminados. O algoritmo INDSCAL foi
aplicado novamente nesta análise e as mesmas três dimensões emergiram, apresentando uma
pequena diferença entre a posição espacial dos indicadores.
Os resultados desta pesquisa sugerem que os pesquisadores organizacionais
compartilham uma estrutura teórica implícita e, por conseguinte, que os critérios de eficácia
organizacional podem ser classificados de acordo com três eixos ou dimensões de valores
(Figura 1). A primeira dimensão de valor está relacionada ao foco organizacional, a partir da
ênfase interna no bem-estar e desenvolvimento das pessoas na organização, e uma ênfase
externa no bem-estar e desenvolvimento da própria organização. A segunda dimensão está
relacionada à estrutura organizacional, a partir de uma ênfase na estabilidade e uma ênfase na
flexibilidade. A terceira dimensão está relacionada aos meios e fins organizacionais, uma
ênfase em processos importantes (por exemplo, planejamento e estabelecimento de metas) e
uma ênfase nos resultados finais (por exemplo, produtividade).

Figura 1. Apresentação simplificada da relação entre os três conjuntos de valores e os


critérios de eficácia

Fonte: Adaptado e traduzido de Quinn e Rohrbaugh (1983).

Segundo Quinn e Rohrbaugh (1983), embora cada uma dessas três dimensões tenha sido
reconhecida individualmente e discutida como problemas para os gestores resolverem, elas
nunca foram identificadas como elementos integrados de um único quadro conceitual. A
integração tridimensional destas dimensões torna possível a identificação de quatro modelos
básicos de efetividade organizacional. Quando os resultados da escala multidimensional são
analisados, torna-se claro que a separação dos 17 indicadores de eficácia em um espaço
tridimensional define graficamente quatro modelos e traz precisão considerável para o
desenvolvimento de um constructo de efetividade.
Cameron e Quinn (2005) chegaram a um framework baseado nas dimensões de Quinn e
Rohrbaugh (1983) para efetividade organizacional, o Competing Values Framework (Figura
2). A cada quadrante foi dado um rótulo para distinguir suas características principais - clã,
adhocracy, mercado e hierarquia. É importante notar que os nomes dos quadrantes não foram
selecionados aleatoriamente. Eles são derivados da literatura acadêmica, que explica como, ao
longo do tempo, os valores organizacionais têm-se associado com formas diferentes de
organizações. Os quatro quadrantes que emergiram dessas análises coincidem com as
principais formas de organização desenvolvidas na ciência organizacional. Estes quadrantes
também coincidem com as teorias de gestão sobre sucesso organizacional, abordagens
organizacionais de qualidade, e papéis e habilidades de liderança, conforme mencionados por
Cameron e Quinn (2005).

Figura 2. Competing Values Framework

Fonte: Adaptado e traduzido de Cameron e Quinn (2005).

Cameron e Quinn (2005) defendem que as dimensões e quadrantes do CVF (Figura 2)


são robustos para explicar as diferentes orientações e também os valores de competitividade
que caracterizam o comportamento humano. Para os autores, a robustez das dimensões e a
riqueza dos quadrantes permitem classificar cada quadrante como um tipo de cultura, de
forma que representem elementos que são compreendidos como parte da cultura
organizacional: pressupostos básicos, orientações e valores. Partindo desse modelo, Cameron
e Quinn (2005) desenvolveram um instrumento que permite diagnosticar a orientação cultural
dominante de uma organização: o Organizational Culture Assessment Instrument (OCAI).

2.2.2 DESENVOLVIMENTO E METODOLOGIA DO ORGANIZATIONAL CULTURE


ASSESSMENT INSTRUMENT (OCAI)

Cameron e Quinn (2005) concluíram que cada quadrante do CVF representa um tipo de
cultura, e desenvolveram uma ferramenta (OCAI) para diagnosticar quais, entre os quatro
tipos, são dominantes em uma organização. Os autores definem os quatro tipos de cultura
baseados no CVF, como abordado a seguir.
Cultura Hierárquica
O grande desafio das organizações na virada do século XX foi o de produzir bens e
serviços eficientemente, para uma sociedade cada vez mais complexa. Para conseguir isso,
Max Weber (1947, apud CAMERON; QUINN, 2005) propôs um modelo que se tornou
clássico na teoria organizacional: a burocracia. A burocracia introduziu regras, especialização,
meritocracia, hierarquia e impessoalidade nas organizações. Como o ambiente era
relativamente estável, a chave do sucesso para as organizações estava em fazer com que
tarefas e funções fossem integradas e coordenadas, produtos e serviços uniformizados, e os
trabalhadores estivessem sob o controle de linhas claras de autoridade e de tomada de
decisões. A Cultura Hierárquica avaliada pelo OCAI é a cultura organizacional compatível
com esta forma de atuar, e é caracterizada por um lugar formal e estruturado para trabalhar,
onde os procedimentos definem o que as pessoas fazem. Os líderes eficientes são bons
coordenadores e organizadores. As preocupações de longo prazo da organização são a
estabilidade, previsibilidade e eficiência, e as regras e políticas formais são importantes para
manter a organização unida.
Cultura de Mercado
Devido aos desafios competitivos da década de 1960, outra forma de organização
tornou-se conhecida, com base nos trabalhos de estudiosos como Oliver Williamson (1975) e
William Ouchi (1981), conforme Cameron e Quinn (2005), e que enfatiza os custos de
transação. Este tipo de organização é orientado para o ambiente externo, e seu foco está nas
transações com grupos externos, como fornecedores, clientes, sindicatos e órgãos reguladores,
operando principalmente através de mecanismos de economia de mercado, dinâmica
competitiva e câmbio monetário, para criar vantagem competitiva. Lucratividade e resultado
das vendas são o foco principal, e os valores fundamentais que dominam esta cultura são
competitividade e produtividade. Os pressupostos básicos em uma cultura de mercado são que
o ambiente externo é hostil. A cultura de mercado, avaliada pelo OCAI, é a de um local de
trabalho orientado a resultados. Os líderes são duros, concorrentes difíceis e clientes
exigentes. A “cola” que mantém a organização unida é a ênfase em vencer. A preocupação de
longo prazo é determinar as ações competitivas para atingir metas e objetivos. O sucesso é
definido em termos de penetração de mercado, de ultrapassar a concorrência e obter a
liderança.
Cultura Clã
Pesquisadores como Ouchi (1981), Pascale e Athos (1981) e Lincoln (2003), conforme
Cameron e Quinn (2005), estudaram as organizações japonesas no final dos anos de 1960 e
início dos anos de 1970, e observaram diferenças fundamentais entre as organizações focadas
em mercado e hierarquia, nos Estados Unidos, e as organizações com a forma de clã, no
Japão. Os valores e objetivos comuns, coesão e participação, fazem parte da cultura clã. No
lugar das regras e procedimentos das hierarquias ou do foco em rentabilidade da cultura de
mercado, as características típicas do clã são o trabalho em equipe, programas de
envolvimento dos trabalhadores, e compromisso corporativo com os funcionários. Alguns
pressupostos básicos em uma cultura clã são que o meio ambiente pode ser mais bem gerido
por meio do trabalho em equipe e do desenvolvimento de funcionários. Os clientes são
tratados como parceiros. A cultura clã avaliada pelo OCAI refere-se a um lugar tipicamente
amigável para se trabalhar, onde as pessoas compartilham informações sobre si mesmas. A
organização é como uma grande família, na qual os líderes são tratados como mentores; ela é
mantida unida por lealdade e tradição, e o compromisso é alto. A organização enfatiza os
benefícios do desenvolvimento individual em longo prazo, dando grande importância à
coesão e à moral; e o sucesso é definido pelo clima interno.
Cultura Adhocracy
Segundo Cameron e Quinn (2005), a origem da palavra adhocracy é ad hoc, que
significa algo temporário, especializado e dinâmico. Enquanto o mundo desenvolvido sai da
era industrial e entra na era da informação, um quarto tipo ideal de organização surge, que é
mais sensível às condições turbulentas e aceleradas que, cada vez mais, tipificam o mundo
organizacional do século 21. Os pressupostos básicos são que as iniciativas inovadoras e
pioneiras levam ao sucesso, e as organizações estão no negócio principalmente para o
desenvolvimento de novos produtos e serviços e para se prepararem para o futuro. A maior
tarefa da gestão é fomentar o empreendedorismo e a criatividade. Assume-se que a adaptação
e a inovação levam a novos recursos e à lucratividade, então o foco está na criação de uma
visão de futuro, em uma anarquia organizada e na imaginação disciplinada. A cultura
adhocracy, avaliada pelo OCAI, é caracterizada por um ambiente de trabalho dinâmico,
empreendedor e criativo. As pessoas assumem riscos e a liderança eficiente é visionária e
inovadora. A “cola” que mantém a organização unida é o compromisso com a experimentação
e inovação. A ênfase é estar na vanguarda de novos conhecimentos, produtos e serviços. A
agilidade para a mudança e para enfrentar novos desafios é importante, e o sucesso significa
produzir produtos e serviços únicos e originais.
Segundo Cameron e Quinn (2005), estudiosos apontam controvérsias relacionadas a
como definir, medir e quais dimensões devem caracterizar a cultura organizacional.
Quanto à definição, o conceito de cultura organizacional surgiu inicialmente de duas
raízes disciplinares diferentes: antropológica (organizações são culturas) e uma base
sociológica (organizações têm culturas). Em cada uma dessas disciplinas, foram
desenvolvidas duas abordagens diferentes para a cultura: uma abordagem funcional (a cultura
emerge do comportamento coletivo) e uma abordagem semiótica (a cultura reside em
interpretações individuais e cognitivas). O Competing Values Framework adota a definição de
cultura representada pela base sociológica e funcional (CAMERON; QUINN, 2005).
Para medir a cultura organizacional, Cameron e Quinn (2005) mencionam três
estratégias disponíveis: 1) abordagem holística, em que o pesquisador faz imersão e
observação participante; 2) abordagem metafórica ou linguística, em que o investigador
utiliza documentos, estórias e conversa; e 3) abordagem quantitativa, em que se usam
questionários e entrevistas.
Segundo esses autores, a pesquisa de culturas organizacionais torna-se impossível
quando a imersão em cada um dos indivíduos é obrigatória. Para realizar comparações entre
várias culturas é necessária a utilização de métodos quantitativos. É crucial, no entanto, que
ao responder a um instrumento de pesquisa, os indivíduos relatem valores subjacentes e
pressupostos (cultura), e não apenas atitudes ou percepções superficiais (clima).
Com relação à dimensão, Cameron e Quinn (2005) defendem que duas dimensões
merecem atenção, que são conteúdo e padrão. As dimensões de conteúdo se referem aos
aspectos da cultura organizacional que devem ser usados como pistas em cenários, para que
indivíduos identifiquem seus valores culturais. As dimensões de padrão As dimensões de
padrão referem-se a um perfil de cultura que é produzido pela pontuação dada em um
instrumento de avaliação da cultura. Para que isso ocorra os autores sugerem que seja
utilizado um procedimento de análise de cenários em que os respondentes identifiquem a
própria cultura da organização. Estes cenários servem como ferramenta emocional e cognitiva
para trazer atributos culturais fundamentais para a superfície. Pesquisadores descobriram que
indivíduos descrevem a cultura de suas organizações de acordo com arquétipos psicológicos,
e a informação cultural é interpretada no contexto de seus arquétipos subjacentes.
Cameron e Quinn (2005) observam que a maneira pela qual a cultura organizacional é
naturalmente interpretada é congruente com as dimensões do Competing Values Framework.
O OCAI possui seis dimensões que, combinadas, refletem valores culturais fundamentais e
pressupostos básicos sobre a forma com que a organização funciona. As seis dimensões são:
1) Características dominantes da organização, ou como as organizações se caracterizam de
forma geral; 2) O estilo e a abordagem de liderança que permeiam a organização; 3) O
gerenciamento dos funcionários, ou o estilo que caracteriza a forma pela qual os funcionários
são tratados, e como é o ambiente de trabalho; 4) A “cola” organizacional que mantém a
empresa unida; 5) A ênfase estratégica, que define quais as áreas que guiam a estratégia
organizacional; 6) O critério que define o sucesso, como a vitória é determinada, e o que deve
ser premiado e celebrado. Essas seis dimensões podem ser observadas na descrição dos tipos
de cultura do OCAI.
Segundo Cameron e Quinn (2005), foi possível provar a confiabilidade e a validade do
OCAI, pois o instrumento foi e ainda é utilizado por muitos pesquisadores em diversos tipos
de organizações. O resultado do coeficiente de confiabilidade (Alfa de Cronbach) foi
estatisticamente significante e satisfatório para os quatro tipos de cultura, todos acima de 0,7.
O limite inferior geralmente aceito para o Alfa de Cronbach é 0,7, podendo diminuir
para 0,6 em pesquisa exploratória (HAIR; ANDERSON; BLACK, 2005).
A validade mostra em que medida um fenômeno que se supõe ser medido é realmente
medido. Ou seja, o OCAI realmente mede cultura organizacional? Cameron e Freeman (1991,
apud CAMERON; QUINN, 2005) produziram evidências da validade do OCAI em um estudo
da cultura organizacional em 334 instituições de ensino superior, com a participação de 3.406
indivíduos, incluindo presidentes, pesquisadores, alunos, chefes de departamento e membros
do Conselho. Segundo os autores, a análise gerou resultados altamente consistentes com os
valores esposados e atributos organizacionais de cada tipo de cultura do CVF, ou seja, fortes
evidências para a validade do instrumento foram produzidas.
Para mensurar a cultura organizacional por meio do OCAI, Cameron e Quinn (2005)
selecionaram a escala ipsative, em que os respondentes devem dividir 100 pontos entre as
alternativas apresentadas no questionário. Os autores informam que é possível aplicar a escala
utilizando também a escala normativa tipo Likert de cinco ou sete pontos. No entanto,
escolheram a escala ipsative, pois esta destaca e diferencia a singularidade cultural que existe
em uma organização. Com a utilização da escala ipsative os respondentes são forçados a
identificar as trocas que realmente ocorrem na organização. Com a escala tipo Likert os
indivíduos tendem a avaliar todos os quadrantes com notas altas, ou todos os quadrantes com
notas baixas, e com isso não é possível identificar diferenças.
Cameron e Quinn (2005) destacam que, durante anos de pesquisas nas organizações,
descobriram que o Competing Values Framework pode ser utilizado para avaliar outros
aspectos de uma instituição, além da cultura organizacional, tais como liderança
organizacional, efetividade organizacional, gerenciamento da qualidade total e o papel do
gerenciamento de recursos humanos.

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Buscando alcançar os resultados deste estudo, que são entender quais os objetivos,
resultados e justificativas para a escolha do OCAI; analisar se ele é utilizado para o
diagnóstico da cultura organizacional, como variável dependente ou independente, ou para
estabelecer relação com outros constructos; e verificar o tipo de escala empregada na
aplicação do instrumento (ipsative ou normativa), foi utilizado o método de revisão
bibliográfica sistemática.
Segundo Conforto, Amaral e Silva (2011), este é um método científico para a busca e
análise de artigos de uma determinada área da ciência. Galvão e Pereira (2014) relatam que os
métodos para elaboração de revisões sistemáticas preveem: (1) elaboração da pergunta de
pesquisa; (2) busca na literatura; (3) seleção dos artigos; (4) extração dos dados; (5) avaliação
da qualidade metodológica; (6) síntese dos dados (metanálise); (7) avaliação da qualidade das
evidências; e (8) redação e publicação dos resultados.
Primeiramente, foi realizada uma busca na literatura nacional e internacional por meio
de revisões bibliográficas sistemáticas, que tinham por objetivo analisar aspectos como
finalidade, objetivos e justificativas da utilização do OCAI nas pesquisas acadêmicas
internacionais e nacionais. Um levantamento da literatura nacional e internacional, sem filtro
de período, nas bases de dados da CAPES, SPELL, SciELO, EBSCO e ProQuest, utilizando
as palavras Organizational + Culture + Assessment + Instrument, e Competing + Values +
Framework, não encontrou estudos da mesma natureza.
Na sequência foi realizada uma coleta dos dados, adotando os seguintes critérios: busca
exploratória de artigos nacionais, sem filtro de período, nas bases de dados SPELL, SciELO e
ProQuest, utilizando as palavras nos títulos, resumos e palavras-chave: [competing + values +
framework], [modelo + de + valores + competitivos], [organizational + culture + assessment
+ instrument], [instrumento + avaliação + cultura + organizacional], [cameron + quinn],
[diagnóstico + da + cultura], [avaliação + da + cultura]. Não foi utilizado filtro para o período,
de modo a se obter a maior quantidade possível de estudos relacionados ao OCAI na literatura
nacional. Com base nesses critérios obteve-se 1.392 artigos, e, após da leitura dos resumos, 13
artigos foram identificados por atenderem os objetivos de busca. Após a leitura dos objetivos
dos artigos, foi necessário eliminar quatro deles por não apresentarem a aplicação do
instrumento (questionário), que é o foco desta pesquisa, restando, assim, nove artigos para
análise.
O passo seguinte foi realizar uma leitura completa dos artigos e, finalmente, fazer uma
análise crítica sobre a finalidade, objetivos e justificativas da escolha do OCAI para estes
artigos, e quais os resultados encontrados.

4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

Uma análise inicial e estatística dos nove artigos nacionais selecionados que utilizaram
o OCAI revelou que 23% (3) dos artigos são originários de autores filiados à Faculdade de
Economia e Administração da USP (FEA/USP), 23% (3) da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte (UFRN), e os demais artigos (3) foram produzidos, cada um, por diferentes
instituições: Universidade Federal do Ceará (UFC), Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Sul de Minas Gerais (IFSULDEMINAS) e Universidade Federal do Paraná
(UFPR).
Com relação à autoria, foi identificado que a autora que mais produziu artigos
utilizando o OCAI foi SILVA, L. M. T., que também é referenciada como BARRETO, L. M.
T. S, com quatro artigos (44% do total).
As publicações ocorreram entre 1998 e 2015, lembrando que não foi utilizado filtro por
ano, na busca pelas publicações, com o objetivo de alcançar maior abrangência da literatura. É
possível verificar que até 2011 houve uma publicação por ano, em 1998, 2007, 2010 e 2011,
duas publicações em 2013 e duas em 2014, voltando a uma em 2015. A autora SILVA, L. M.
T. (também identificada como BARRETO, L. M. T. S), que possui o maior número de artigos
(4), vem publicando desde 2007, e seu último artigo foi em 2014.
No Quadro 1 apresenta-se um resumo dos nove artigos identificados para a análise, em
ordem cronológica de publicação, incluindo filiação institucional, primeiro autor, periódico e
respectivo Qualis, as escalas encontradas, a finalidade da utilização do OCAI, se houve
justificativa para a escolha deste instrumento, e qual o tipo predominante de cultura do OCAI
encontrado em cada pesquisa.

Quadro 1 – Artigos identificados para a análise da utilização do OCAI

Filiação Cultura
N Ano 1º Autor Periódico e Qualis Escala Finalidade Justificou?
Institucional Predominante
Revista de
SANTOS, Likert 5 Relação com
1 1998 FEA/USP Administração A2 Não Não informado
N. M. B. F. pontos outro constructo
Contemporânea
SILVA, L. Revista Não Relação com
2 2007 UFRN B3 Não Clã
M. T. et al. ADM.MADE informou outro constructo
Os 4 (1 por
SILVA, L. Turismo: Visão Não Relação com
3 2010 FEA/USP B2 Não empresa
M. T. e Ação informou outro constructo
pesquisada)
Revista
TARIFA, Não
4 2011 UFPR Ciências B3 Diagnóstico Não Hierárquica
M. R. informou
Administrativas
BARRETO
Revista de Escala Relação com Clã, seguida de
5 2013 UFRN , L. M. T. A2 Sim
Administração ipsative outro constructo adhocracy
S.
Relação com
outro constructo
IFSULDEMI ROCHA, Não Clã, seguida de
6 2013 Gest. Prod. A2 Cultura é Sim
NAS L. C. S. informou mercado
variável
independente
Revista
BRAGA, Eletrônica de Likert 5
7 2014 UFC B2 Diagnóstico Não Adhocracy
G. G. Ciência pontos
Administrativa
Revista
BARRETO
Brasileira de Não Relação com
8 2014 UFRN , L. M. T. B1 Sim Não informado
Pesquisa em informou outro constructo
S.
Turismo
Relação com
Revista de outro constructo
REIS, G. Escala
9 2015 FEA/USP Administração B1 Cultura é Sim Mercado
G. ipsative
Mackenzie variável
independente
Fonte: Elaborado pela autora

O objetivo de Santos (1998), no artigo 1, foi explorar o impacto da cultura


organizacional no desempenho da empresa. Não foi identificada uma justificativa explícita
para a escolha do OCAI. A escala utilizada foi do tipo Likert com 5 pontos, mas o autor não
forneceu informações sobrea utilização de versão traduzida para o português ou da versão
original em inglês. Os resultados encontrados apontam para duas direções: a cultura está
significativamente associada ao desempenho organizacional, e as empresas com cultura forte
alcançam melhor desempenho.
No artigo 2, Silva et al. (2007) buscam estabelecer relações entre a cultura
organizacional e o desempenho dos colaboradores, fazendo a correlação entre os constructos.
Verificou-se a predominância da cultura clã, e uma relação positiva com o desempenho dos
colaboradores e negativa com a cultura hierárquica. A cultura adhocracy exerce influência
positiva. A cultura de mercado, quando analisada isoladamente, age de forma negativa. A
cultura de mercado, quando aliada à cultura clã, exerce influência positiva no nível de
desempenho. O estudo comprovou a existência efetiva de relações entre desempenho
profissional e cultura organizacional. Não foi mencionada a justificativa para a escolha do
OCAI, e nem qual escala foi utilizada (tipo Likert, upsative, se traduzida, etc).
No artigo 3, Silva, Medeiros e Costa (2010) têm por objetivo descrever as
características e peculiaridades da relação entre cultura organizacional e qualidade dos
serviços turísticos, fazendo a correlação entre os constructos. Os resultados sugerem que as
culturas clã e adhocracy estão associadas a melhores níveis de qualidade dos serviços que as
culturas de mercado e hierárquica. Não foi identificada uma justificativa explícita para a
escolha do OCAI, e não foi informada pelos autores qual a escala utilizada (tipo Likert,
upsative, se traduzida, etc).
Tarifa et al. (2011), no artigo 4, não informam que tipo de escala utilizaram na pesquisa.
Apesar de pretenderem verificar se a cultura organizacional influencia as práticas de
controladoria, os autores somente utilizaram o OCAI para fazer o diagnóstico da cultura
organizacional, sem estabelecer qualquer relação estatística entre cultura e práticas de
controladoria. Não foi justificada a escolha do instrumento. Os autores identificaram a
predominância da cultura hierárquica em todas as dimensões do OCAI (características
dominantes, liderança organizacional, gerenciamento de pessoas e equipes, união
organizacional, ênfase estratégica e critérios de sucesso). São destacados os valores
relacionados ao foco interno, direcionados para a integração organizacional, em que os
colaboradores aceitam a autoridade hierárquica imposta, tendendo à estabilidade nas funções
e controle da situação.
No artigo 5, de Barreto et al. (2013), os autores têm por objetivo entender a relação
entre os quatro tipos de cultura do OCAI e o estilo de liderança transformacional e
transacional de Bass e Avolio (1993, apud BARRETO et al., 2013). Os autores justificam a
utilização do CVF pela vantagem de exprimir como a cultura das empresas enfatiza o
ambiente interno ou externo. Os autores informam que essa característica é importante para
compreender, na relação entre liderança e cultura, como esta se desdobra na interação dos
restaurantes estudados com o mercado em que atuam, enquanto outros modelos de cultura não
permitiriam esse tipo de observação. Os resultados identificaram correlações entre os
constructos: foram encontradas correlações negativas entre a dimensão “gerenciamento por
exceção” e a cultura adhocracy, e entre a dimensão “consideração individualizada” e a cultura
hierárquica. A cultura adhocracy apresenta maior probabilidade de gerar líderes
transformacionais. Foi observado o predomínio das culturas clã e adhocracy. Os autores
informam que utilizaram uma escala ipsative validada e adaptada por Silva (2002, apud
BARRETO et al., 2013), e que a adaptação foi realizada na versão original, na qual sugere-se
que o respondente distribua 100 pontos entre as alternativas, de acordo com a extensão em
que cada alternativa se assemelha à sua cultura. Para facilitar as respostas, Silva (2002),
conforme Barreto et al. (2013), alterou a pontuação de 100 para uma escala de 1 a 4, onde 1
seria a alternativa que melhor representasse a cultura e 4 a que mais se distanciasse da
realidade.
Rocha, Pelogio e Añez (2013), no artigo 6, investigaram a relação entre cultura
organizacional (variável independente) e clima organizacional (variável dependente).
Segundo os autores, o CVF foi escolhido, pois está em consonância com a vertente
epistemológica funcionalista adotada para a pesquisa, que considera que a cultura é um
atributo inerente à organização, podendo ser identificada, mudada e medida empiricamente.
Os tipos culturais predominantes encontrados foram clã e mercado. Com relação ao clima,
houve destaque para os fatores “apoio da chefia e da organização” e “conforto físico”, fatores
coerentes com a cultura clã. Os perfis culturais mostraram influência sobre os fatores do clima
organizacional. Os resultados permitiram concluir que há relações entre os perfis culturais e
os fatores determinantes do clima organizacional nas organizações pesquisadas. Os autores
não informam qual o tipo de escala utilizada (upsative ou normativa), e se foi uma versão
traduzida para o português ou a original (em inglês).
Braga, Ferraz e Lima (2014), no artigo 7, informam que o objetivo foi verificar se
empresas industriais associadas com o fator inovação apresentam, em sua maioria, uma
cultura de inovação (adhocracy). Os resultados apontam que este tipo de cultura não
predomina (26,7%), mas houve um resultado homogêneo entre a cultura de mercado (29,2%),
cultura hierárquica (22,5%) e cultura clã (21,7%). Os autores não justificam a escolha do
instrumento e informam que a escala utilizada foi do tipo Likert com 5 pontos, e a versão
traduzida por Santos (2000, apud BRAGA; FERRAZ; LIMA, 2014). No entanto, esse autor
não foi encontrado nas referências, não sendo possível aprofundar a investigação com relação
à escala.
Barreto, Albuquerque e Medeiros (2014), no artigo 8, buscam estabelecer a relação
entre a estratégia de gestão de pessoas e as capacidades organizacionais e desempenho
organizacional. Eles consideraram a estratégia de gestão de pessoas como a variável
independente, o desempenho organizacional como a variável dependente, e capacidades
organizacionais como variável mediadora. Cameron e Quinn (2005) destacam que, durante
anos de pesquisas nas organizações, descobriram que o Competing Values Frameworkl pode
ser utilizado para verificar outros aspectos de uma instituição além da cultura organizacional,
tais como liderança organizacional, efetividade organizacional, gerenciamento da qualidade
total e o papel do gerenciamento de recursos humanos. Neste artigo os autores utilizaram o
aspecto de gerenciamento de recursos humanos (estratégia de gestão de pessoas), descrito por
Cameron e Quinn (2005). Os autores justificam a utilização do modelo, pois este permite
definir diferentes abordagens da gestão de pessoas na organização e possibilita a investigação
de diversos aspectos como cultura, liderança, efetividade, gestão da qualidade e gestão de
pessoas. Como resultado, os autores perceberam que tanto as configurações de estratégias de
gestão de pessoas quanto as capacidades organizacionais são complementares e que,
dificilmente, a escolha entre um ou outro modelo irá proporcionar um desempenho superior.
Os resultados apresentados comprovaram que melhorias gerais no desempenho são efeito de
um conjunto de práticas de gestão de pessoas. Os autores não informam qual tipo de escala foi
utilizada (upsative ou normativa) e se foi uma versão traduzida para o português ou a original
(em inglês).
No artigo 9, Reis e Azevedo (2015) investigaram as relações entre tipos culturais e o
agir autêntico (autenticidade), sendo autenticidade a variável dependente e cultura
organizacional a variável independente. Segundo Yu e Wu (2009, apud REIS; AZEVEDO,
2015), o CVF captura a essência das principais dimensões culturais abordadas pelos modelos
existentes, e o questionário é simples e sucinto, e por este motivo foi o instrumento escolhido.
Os resultados indicaram que determinados tipos de cultura organizacional (clã e adhocracy)
estão positivamente relacionados à autenticidade no trabalho, tendendo a favorecer a
expressão de autenticidade. Culturas hierárquicas estão negativamente relacionadas, podendo
inibir a expressão de autenticidade. Observou-se ainda que a posição de chefia estava
associada a maiores escores de autenticidade, independentemente do tipo de cultura
organizacional. Os autores utilizaram uma escala ipsative adotada por Barreto et al. (2013),
em que Silva (2002, apud BARRETO et al., 2013) realizou uma adaptação da versão original,
que sugere que o respondente distribua 100 pontos entre as alternativas de acordo com a
extensão em que cada alternativa se assemelha à sua cultura. Para facilitar as respostas, Silva
(2002) alterou a pontuação de 100 para uma escala de 1 a 4, onde 1 seria a alternativa que
melhor representasse a cultura e 4 a que mais se distanciasse da realidade.
Um dos questionamentos levantados, como objetivo desta pesquisa, está relacionado ao
tipo de escala utilizada pelos autores, e é possível observar somente dois artigos que
empregaram a escala ipsative recomendada por Cameron e Quinn (2005).
Analisando as justificativas de todos os artigos para a escolha do OCAI, quatro dos
nove artigos não apresentam essa informação (artigos 1, 2, 3, 4 e 7). A falta de justificativa
para a escolha do instrumento pode levar a se questionar se outras opções para a medição de
cultura organizacional foram consideradas e se outras abordagens para diagnóstico da cultura
poderiam ter sido utilizadas.
Os artigos que apresentaram a justificativa para escolha do OCAI (5, 6, 8 e 9), de modo
geral, destacam a simplicidade do modelo em capturar diversos aspectos, não somente da
cultura organizacional, mas também de liderança, efetividade, gestão de qualidade e gestão de
pessoas. Foi destacado também o fato de o OCAI ser eficiente para analisar a cultura em
termos comparativos. Essas justificativas demonstram coerência com o modelo do CVF.
Dois artigos (4 e 7) utilizaram o OCAI com o objetivo de diagnosticar a cultura
organizacional, nos quais as culturas predominantes foram, respectivamente, hierárquica e
adhocracy.
O artigo 4 foi o único entre os nove artigos a analisar as dimensões do OCAI:
características dominantes, liderança organizacional, gerenciamento de pessoas e equipes,
união organizacional, ênfase estratégica e critérios de sucesso. Os resultados apontaram que
existe a predominância da cultura hierárquica em todas as dimensões.
Os artigos 1, 2, 3, 5, e 8 utilizaram o OCAI para analisar a cultura organizacional
associada, respectivamente, aos constructos desempenho organizacional, desempenho dos
funcionários, qualidade de serviços, e liderança. Dois artigos (6 e 9) utilizaram o OCAI para
tratar a cultura organizacional como variável independente, e outros constructos
(respectivamente clima e autenticidade) como variáveis dependentes.
A predominância dos tipos de cultura organizacional do modelo de Cameron e Quinn
(2005) encontrados nos artigos foi: cultura clã, seguida de adhocracy, mercado e, por último,
a hierárquica.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a intenção de alcançar os objetivos desta pesquisa, foi realizado um resumo


analítico de cada um dos artigos, finalizando com uma análise geral da utilização do OCAI.
Retomando os questionamentos deste trabalho, procurou-se avaliar criticamente quais os
objetivos e os resultados encontrados na utilização do OCAI, quais as justificativas para a
escolha do instrumento, se ele é utilizado como variável dependente ou independente, se
estabelece relação com outros constructos, e qual o tipo de escala ou abordagem utilizada na
sua aplicação.
Observou-se que não existe um padrão predominante da utilização do OCAI no que diz
respeito aos objetivos, pois alguns autores o utilizaram para diagnosticar a cultura
organizacional, alguns o associaram com outros constructos. Os resultados encontrados pelos
artigos, em geral, identificaram relação entre os constructos. Diante dessas observações, é
possível inferir que o OCAI é uma ferramenta que pode ser utilizada de múltiplas formas para
atingir objetivos diversos, em pesquisas relacionadas à cultura organizacional.
Notou-se também que apenas dois artigos utilizaram a escala ipsative, recomendada por
Cameron e Quinn (2005). Pode-se sugerir que os autores não tinham a intenção de obter os
benefícios dessa escala, que é destacar e diferenciar a singularidade cultural que existe em
uma organização. Outra possibilidade é o fato de a escala tipo Likert apresentar menor
dificuldade para os indivíduos responderem o questionário, ou ser mais adequada quanto
associada a outros constructos. Foi observado que a falta de informação sobre a escala
utilizada, como a tradução ou o seu tipo, denota que o aspecto metodológico da escala de
Cameron e Quinn (2005) foi pouco explorado pelos pesquisadores. No caso da versão
traduzida do inglês para o português, seria importante descrever como essa tradução foi feita,
como, por exemplo, realizar uma back translation.
Destaca-se que as seis dimensões do OCAI (características dominantes, liderança
organizacional, gerenciamento de pessoas e equipes, união organizacional, ênfase estratégica
e critérios de sucesso) foram exploradas em um dos artigos. Outro artigo focalizou em sua
análise o aspecto de gerenciamento de recursos humanos mencionado por Cameron e Quinn
(2005), mostrando que o Competing Values Framework pode ser utilizado para analisar
outros aspectos de uma instituição, além da cultura organizacional. Esses dois artigos
demonstram que existe um potencial de análise na utilização do OCAI.
É possível concluir que o OCAI poderia ser mais bem explorado, tanto como ferramenta
de diagnóstico cultural, quanto como uma variável (independente, dependente, moderadora ou
mediadora).
O conhecimento derivado deste trabalho mostra-se relevante para as pesquisas
acadêmicas sobre cultura organizacional, pois demonstrou que o OCAI, apesar de ser
utilizado não apenas para diagnóstico de cultura organizacional, mas também associado a
outros constructos, ainda possui potencial a ser explorado e aprofundado, como por exemplo,
as seis dimensões de conteúdo e os benefícios da escala ipsative.
Convém apontar como limitação o número reduzido de artigos nacionais encontrados
nesta pesquisa. Para futuros estudos, sugere-se explorar artigos internacionais e focalizar
outros aspectos e análises, como Alfa de Cronbach, validade convergente e discriminante,
análise de regressão múltipla ou equações estruturais.

6. REFERÊNCIAS

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