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A Hora da Estrela, de Clarice Lispector

Márcia Lígia Guidin


Especial para a Página 3 Pedagogia & comunicação.
Objetivos
1) Estudar a última obra da importante escritora brasileira de maneira interpretativa.Saber por
que ela é tão original e importante para a literatura.

2) Analisar as diferenças de veículo: o romance e o filme homônimo de Suzana Amaral.

Ponto de partida
Como ponto de partida, é claro, pede-se aos alunos que leiam a pequena obra de Clarice
Lispector (às vezes chamada de novela), lembrando-lhes que é a última obra da escritora
(publicada em setembro de 1977, poucos meses antes de ela morrer) e que ela tem uma
peculiaridade: foi escrita aos fragmentos, simultaneamente a outra obra (que ficou póstuma:
"Um Sopro de Vida").

A autora estava já doente e o intrigante, no processo criador de Clarice Lispector, é que ambas
as obras têm narradores-autores que, dentro da obra, contam as histórias de suas
personagens.Ou seja, Clarice é a escritora que inventou outros escritores - que por sua vez
'inventaram' suas personagens. O personagem-autor de "A Hora da Estrela" chama-se Rodrigo
S. M., e o autor de "Um Sopro de Vida" não tem nome. A personagem do primeiro é Macabéa,
e a do segundo é Ângela Pralini.

Por que Clarice teria escrito duas obras simultaneamente com personagens que são escritores
(como ela própria) e que "escrevem" dentro da obra? Esse foco de interesse pode dirigir a
atenção para a leitura, que, sem essa informação, pode ser enfadonha, já que Rodrigo só vai
falar de sua personagem, Macabéa, bem adiante, depois de ter-se 'confessado' com o leitor por
páginas e páginas... Clarice Lispector usou esse expediente narrativo somente nestas últimas
obras, por quê?

Comentário
Para que o leitor venha a aproveitar a leitura de Macabéa - a pobre alagoana que não tinha
"nada": era feia, raquítica, órfã, semi-analfabeta, solitária, subempregada, ignorante, virgem,
tuberculosa... - sugere-se ao professor que leia os primeiros momentos em que Clarice (ops!
Rodrigo) fala sobre ela: "Há os que têm. E há os que não têm. É muito simples: a moça não
tinha. Não tinha o quê? É amenas isso mesmo: não tinha. Se der para me entenderem, está
bem; se não, também está bem".

Saber que há Rodrigo e Macabea é ótimo para pensarmos no estudo do foco narrativo:
narradores e personagens.

Estratégias e questões temáticas a discutir


1) A partir desse relacionamento entre o "autor" e sua personagem, o leitor verá como o autor a
trata. Esses (mal)tratos serão importantes para o fim da obra, em que ela morrerá atropelada?
Por que Rodrigo finge que não quer matá-la ao final da história, se ele mesmo diz que "ela
nascera para o abraço da morte?" Afinal, Rodrigo traiu sua personagem ou lhe deu um final
feliz, apesar do atropelamento?

2) As relações que Macabéa estabelece com outros personagens são passíveis de análise e
observação: Olímpico, o namorado que a despreza ("Você só faz chover") e a troca por sua
colega Glória; esta, a colega de trabalho, "loura de farmácia", que aceita o namorado da outra;
o chefe suburbano, que a avisa que será despedida em breve; o médico, "que não gosta de
pobre"; a cartomante, "Madama Carlota", cujos prognósticos nunca se cumprirão. Não serão
todos mais bem adaptados à vida urbana (ou suburbana) que Macabéa? Esta, em sua
ingenuidade teria sido usada por eles?

3) O atropelamento é a grande ironia da obra, não? Macabéa será atropelada após ouvir
prognósticos fabulosamente positivos (e irrealizáveis), quando atravessa a rua "grávida de
futuro" e morrerá diante de todos em sua 'hora de estrela'. Por que Rodrigo faz isso com sua
personagem? Por que o prognóstico de atropelamento chegou antes da cliente da cartomante?
4) Se fechamos o livro após a leitura, veremos que a obra também trata de uma questão social:
a adaptação do migrante nordestino ao trabalho e vida no sudeste do país. O que Macabéa
representa, afinal, dentro dessa leitura?

A obra e o filme
Após debate sobre a leitura, vale assistir ao filme de Suzana Amaral (1986), "A Hora da
Estrela" e discutir:

a) Nele, a cineasta abriu mão da existência de Rodrigo. Ou seja, ela optou por simplificar a
obra, tirando dela um personagem-narrador-autor, para narrar apenas a história da moça
alagoana. A pergunta é : por que Amaral teria optado por essa estratégia?

b) Outra boa questão é discutir por que Amaral deu à morte de Macabéa um final glamuroso,
que a obra literária não tem?

c) Ao professor, sugere-se discutir com os alunos que não é o fato de se ter mexido na
estrutura da obra literária que faz do filme algo pior ou melhor que o livro: deve-se saber que é
apenas uma opção interpretativa da autora do filme; e interpretar é nosso papel de inteligência
diante de livros ou filmes...

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