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7 Decisão de Dividendos

A política ou decisão de dividendos caracteriza-se pelo percentual do lucro obtido dis-


tribuído em dinheiro aos acionistas.1 Os dividendos, é claro, reduzem a importância
dos lucros retidos e, por conseguinte, afetam a política de financiamento. Quanto mais
lucros a empresa retiver menor será a necessidade de recursos de terceiros para finan-
ciar os investimentos previstos. Portanto, a política ótima de dividendos é aquela
que atinge um equilíbrio entre os dividendos correntes e o crescimento futuro, e
maximiza o preço das ações da empresa.
Uma questão fundamental e polêmica é se a política de dividendos afeta o valor
das ações (o valor da empresa). Em outras palavras, a política de dividendos pode
criar valor para a empresa?
Modigliani e Miller provaram que, em mercados perfeitos, a política de dividendos
é irrelevante e não altera o valor da ação. Outros autores entendem que a política de
dividendos é um fator que altera o valor da ação, para mais ou para menos. O merca-
do tende a reagir positivamente dentro de uma política de dividendos fixos, ou com
aumento de dividendos, e negativamente quando há cortes de dividendos. A política
de dividendos de um percentual sobre o lucro, segundo pesquisas empíricas, também
não favorece o aumento do valor da ação no mercado, porque oscila conforme o lucro
e não dá tendências de estabilidade.

Sinalização para os Investidores


Os dividendos distribuídos em caixa podem ser vistos como um sinal para os investi-
dores. Presumivelmente, empresas com boas-novas sobre sua futura rentabilidade
querem expressar isso aos investidores. Os dividendos funcionam como um atestado
da confiança dos diretores no futuro da empresa e de sua lucratividade.
A importância do lucro a ser distribuído pode ser resumida nos seguintes aspec-
tos principais:

• é uma necessidade da empresa para manter nela mesma os investimentos já efe-


tuados pelos seus acionistas e investidores;

1
Denominamos genericamente acionista o detentor das ações ou cotas do capital social.
Acionista é quem tem ações de empresas organizadas juridicamente sob a forma de sociedade
anônima. Sócio ou cotista é o dono de cotas de empresas organizadas sob a forma de socieda-
de por cotas de responsabilidade limitada. Denomina-se dividendos a distribuição de lucros
aos acionistas; a distribuição de lucros aos sócios cotistas é denominada simplesmente distri-
buição de lucros. Trataremos genericamente de dividendos qualquer distribuição de lucros e
acionistas, quaisquer detentores do capital social.
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• é ponto fundamental para os planos estratégicos, objetivando a continuidade da


empresa;
• é a informação mais importante para os acionistas e investidores, para compara-
ção com seus custos de oportunidade.

Política de Dividendos
Tem sido observada uma tendência nas empresas em adotar uma política estável de
distribuição de lucros ou dividendos, de maneira a permitir, o máximo possível, que
os investidores adquiram confiança nessa política, e, com isso, influenciar positiva-
mente no valor de mercado das ações. Nesse sentido, uma distribuição estável e cres-
cente, não vinculada à oscilação dos lucros periódicos, pode transmitir aos acionistas
um sinal de confiança no desempenho da empresa.
A Tabela 7.1 apresenta os dois modelos mais utilizados de distribuição de
dividendos.

Tabela 7.1 – Políticas de Dividendos – em Dinheiro

Lucro do Quantidade Distribuição Fixa Distribuição Variável


Período – $ de Ações Valor s/Lucro Por Ação Valor s/Lucro Por Ação
$ % $ $ % $

Período 1 20.000 100.000 12.000 60 0,120 12.000 60 0,120


Período 2 22.000 100.000 12.000 55 0,120 13.200 60 0,132
Período 3 18.000 100.000 14.000 78 0,140 10.800 60 0,108
Período 4 15.000 100.000 14.000 93 0,140 9.000 60 0,090
Período 5 24.000 100.000 15.000 63 0,150 14.400 60 0,144

O modelo de distribuição fixa procura não reduzir o valor dos dividendos por
ação, mesmo que haja oscilação de redução no lucro de um ano para outro. Note que
no Período 3 houve uma redução do lucro do período, mas os dividendos distribuí-
dos foram maiores que os do período anterior. No Período 4 houve nova redução do
lucro total da empresa, mas a distribuição de dividendos continuou com o mesmo
valor por ação do período anterior. Esse modelo pode induzir os acionistas a ter uma
avaliação positiva e de estabilidade do desempenho da empresa e confiança em seus
administradores.
O modelo de distribuição variável de lucro por ação distribui uma parcela fixa dos
lucros. Assim, o investidor sabe, no exemplo apresentado, que a empresa deve sem-
pre distribuir 60% do lucro do ano na forma de dividendos. Contudo, caso haja osci-
lação no montante do lucro do período, haverá oscilação no dividendo por ação a ser
distribuído. Quando o lucro cai, cai também a parcela de lucro a ser distribuída, e,
consequentemente, o valor dos dividendos por ação. Portanto, em termos de rece-
bimento de dividendos, da ótica do acionista, esse modelo se caracteriza por um
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comportamento de instabilidade que pode ser transferido negativamente para a ava-


liação do preço de mercado da ação.

Dividendos em Ações
Outra possibilidade de distribuição de lucros é a emissão de uma quantidade de
novas ações, aumentando o número de ações que expressam o capital social da
empresa. O objetivo, nesse caso, e na maior parte das vezes, é reter caixa dentro
da empresa para novos investimentos, ao mesmo tempo que procura satisfazer os
acionistas com alguma possibilidade de realização em dinheiro pela venda das ações
adicionais recebidas.
Esse modelo, no caso brasileiro, não pode ser acionado de forma automática, uma
vez que se faz necessário, antes, uma assembleia geral para autorizar o aumento de
capital. Além disso, nem todos os acionistas necessariamente vão se interessar por
integralizar a sua parte, motivo pelo qual é um modelo pouco utilizado. A Tabela 7.2
apresenta um exemplo desse modelo, denominado geralmente bonificação em ações.

Tabela 7.2 – Política de Dividendos – Bonificação em Ações – Período 5

Valor do Patrimônio Líquido ao Final do Período 5 $ 180.000 a


Valor de Mercado da Empresa ao Final do Período 5 $ 120.000 b
Quantidade de Ações 100.000 c
Valor Patrimonial por Ação $ 1,80 d=a:c
Valor de Mercado da Ação $ 1,20 e=b:c
Valor dos Dividendos a Distribuir $ 15.000 f
Valor da Ação Acertado para Fins de Bonificação $ 1,50 g
Quantidade de Ações a Serem Distribuídas como Dividendos $ 10.000 h=f:g
Nova Quantidade de Ações do Capital Social 110.000 i=h+c
Valor Patrimonial da Ação Após a Bonificação $ 1,64 j=a:i

Uma variável fundamental nesse modelo é o preço de referência da ação utilizado


como base para a distribuição. No exemplo apresentado, o valor utilizado foi
$ 1,50, que não é o valor de mercado da ação corrente nem o valor patrimonial da
ação. É importante ressaltar que, nesse modelo, há uma diluição automática do valor
patrimonial da ação, que pode ter reflexo negativo no próprio valor de mercado.

Continuidade da Empresa e Manutenção do Capital


Há dois conceitos de manutenção do capital: manutenção do capital físico e manu-
tenção do capital financeiro. O conceito de manutenção do capital físico, ou capaci-
dade física da empresa indica que esta deve manter sempre a sua capacidade opera-
cional, medida por meio do conjunto de bens e direitos necessários às suas atividades
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operacionais, de forma que possa garantir a capacidade de geração de lucros. Nesse


conceito, a empresa deve manter sempre o valor monetário a preços atualizados
dos ativos necessários para suas operações.
O conceito de manutenção do capital financeiro está ligado à atualização mone-
tária do capital investido, em termos de custo de oportunidade ou índices gerais de
preços. Esse conceito centra-se, então, na atualização monetária do capital investido,
sem especificar os bens que a empresa deve ter em seu poder.
Esses dois conceitos podem ser visualizados de maneira simples e resumida
dentro de uma demonstração de resultados (Horngren et al., 1996, p. 781).
Considere que uma empresa investiu $ 100.000 em capital, que foi imediatamente
utilizado na compra de mercadorias. As mercadorias foram vendidas, um ano
depois, por $ 150.000. O custo de reposição do inventário de mercadorias,
um ano depois, é de $ 120.000. Não houve inflação no período.

Manutenção do Manutenção do
Capital Financeiro Capital Físico
Vendas $ 150.000 $ 150.000
Custo das Vendas $ 100.000 $ 120.000
Lucro $ 50.000 $ 30.000

Nesse exemplo, sob a ótica da manutenção do capital físico, o lucro a ser distri-
buído precisa ter como parâmetro o resultado avaliado em $ 30.000. Se distribuir os
$ 50.000, a empresa necessitará de mais $ 20.000, para repor sua capacidade física
operacional.

Lucro que Pode Ser Distribuído


Considerando o conceito de manutenção do capital, Szuster (1985) define qual deve
ser o lucro passível de distribuição: todo o lucro não necessário à manutenção do capital
pode ser distribuído.
Dentro dessa abordagem, a política de dividendos deverá ter como base um mode-
lo de mensuração do capital físico e do financeiro. O capital físico terá como referen-
cial o valor dos ativos necessários para a manutenção da capacidade de geração de
lucros; o capital financeiro terá como referencial o custo financeiro de oportunidade
de mercado e inflação geral de preços. O lucro a ser distribuído será o valor da empre-
sa que exceder o valor do capital a ser mantido.

O Caso Brasileiro – Algumas Características


A legislação brasileira, basicamente por meio da Lei no 6.404/76, das Sociedades por
Ações, exige a distribuição de dividendos, que deve constar do estatuto social da
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companhia. Caso não haja a previsão de distribuição de dividendos no estatuto, este


deverá ser pelo menos 25% do lucro líquido do exercício.

Tributação e Classes de Ações


No formato de dividendos, os lucros distribuídos não são tributados na distribuição
pela companhia distribuidora, mas não podem ser considerados como despesas
dedutíveis para fins de impostos sobre o lucro. Também não sofrem nenhuma tribu-
tação na declaração de rendimentos das pessoas físicas ou jurídicas que os receberem.
Caso não haja a condição de tag along2 no estatuto da companhia, as ações pre-
ferenciais receberão 10% a mais do valor do dividendo por ação destinado às ações
ordinárias. Assim, se os dividendos destinados às ações ordinárias forem de $ 1,20
por ação, as preferenciais receberão $ 1,32 por ação.

Juros sobre o Capital Próprio (JSCP)


No Brasil, foi criada em 1995 a figura da dedutibilidade dos juros sobre o patrimônio
líquido (JSPL), pagos às pessoas físicas e jurídicas detentoras das ações do capital das
empresas (Artigo 9o da Lei no 9.249, de 26/12/95).
A empresa poderá deduzir os juros, para fins dos impostos sobre o lucro, das
importâncias pagas aos acionistas sob essa figura jurídica. Os JSCP serão calculados
pela taxa de juros de longo prazo (TJLP) sobre o total do patrimônio líquido,
excluindo-se o valor das reservas de reavaliação, e poderão ser considerados divi-
dendos distribuídos para fins de dividendo mínimo obrigatório.
A empresa pode distribuir até 50% do lucro líquido do período após os impos-
tos sobre o lucro, ou até 50% dos lucros acumulados – dos dois o maior. A distribui-
ção dos JSCP será tributada na fonte em 15% e considerada exclusiva para pessoas
físicas, e aproveitável em futuras distribuições de lucros para pessoas jurídicas rece-
bedoras. Tributariamente, os JSCP são considerados despesas financeiras para quem
paga e receita financeira tributável para pessoas jurídicas que recebem.
Essa figura é muito interessante, pois permite uma distribuição maior de resul-
tados, ao mesmo tempo que encoraja as empresas a se capitalizarem com lucros
retidos, evitando maior endividamento financeiro. Os dividendos distribuídos,
outrossim, levam a vantagem de não ser tributados por quem recebe.

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Condição que determina que, no caso de venda das ações ordinárias pelo grupo controlador,
a companhia deverá garantir aos acionistas preferenciais a condição de vender suas ações ao
comprador, que deverá obrigatoriamente comprar por no mínimo 80% do valor pago pelas
ordinárias.
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Considerando a retenção de 15% de IR e a dedutibilidade para a empresa, há um


ganho financeiro de 19% para a empresa que distribui. O ganho será um benefício
para os acionistas pessoas físicas em distribuições futuras. No ato, contudo, o acio-
nista recebe 15% a menos do que receberia sob a forma de dividendos.

Efeito da Dedutibilidade dos JSCP 34% dos Impostos sobre o Lucro


Retenção de IR na Fonte 15%
Ganho Financeiro para a
Empresa Distribuidora 19%
* Para a Receita Federal, os JSCP são considerados receitas financeiras tributáveis pelo PIS e
Cofins.

Questões e Exercícios
1. Considere os seguintes dados de uma companhia aberta:
Lucro Patrimônio Lucro
Líquido – $ Líquido – $ Distribuído – $
Período 1 35.000 175.000 20.000
Período 2 32.000 187.000 22.000
Período 3 45.000 210.000 22.000
O capital da empresa é expresso por 50 mil ações. Calcule o lucro por ação de
cada período.
2. Com os mesmos dados do exercício anterior, imagine que, no lugar do lucro dis-
tribuído apresentado, a empresa use um modelo de distribuição na proporção do
lucro, da ordem de 60% do lucro líquido. Qual será o lucro por ação em cada
período?
3. Ainda considerando os dados do Exercício 1, suponha que a empresa, em vez de dis-
tribuir em dinheiro os $ 22.000, o faça em ações bonificadas. Para tanto, toma como
base do valor da ação a média entre o valor de mercado corrente, que é de $ 3,80, e
o valor patrimonial do Período 3. Calcule a quantidade de ações a ser emitida e
entregue em ações, bem como o novo valor patrimonial após essa bonificação.
4. Tomando os mesmos dados do Exercício 1, considere que o valor de mercado da
ação ao final dos períodos 1 e 2 tenha sido, respectivamente, $ 5,00 e $ 4,00.
Calcule a rentabilidade anual, tomando como base o valor de mercado e os divi-
dendos recebidos.
5. Com os dados obtidos no Exercício 4, calcule a rentabilidade do patrimônio
líquido nos períodos 1 e 2, e faça suas observações após uma análise compara-
tiva entre os dados obtidos.

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