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DINAMISMO DO AGRONEGóCIO BRASILEIRO

A história econômica brasileira, com suas implicações sociais, políticas e culturais,


tem fortes raízes junto ao agronegócio. Foi a exploração de uma madeira, o pau
brasil, que deu nome definitivo ao nosso País. O processo de colonização e
crescimento está ligado a vários ciclos agroindustriais, como a cana-de-açúcar, com
grande desenvolvimento no Nordeste; a borracha dá pujança à região amazônica,
transformando Manaus num metrópole mundial, no início do século; mais
recentemente, o café torna-se a mais importante fonte de poupança interna e o
principal financiador do processo de industrialização.

O progresso do Sul do Brasil também está ligado ao agronegócio. A pecuária domina


os pampas; a exploração da madeira nas serras e a agricultura se desenvolve com a
participação das várias etnias que compõem o mosaico populacional da região:
portugueses, migrantes italianos, alemães, poloneses e outros. Da poupança da
agricultura, instalam-se agroindústrias, como a do vinho e dos móveis, da carne
bovina, de suínos e aves. De um campo trabalhador e próspero surgem vilas e
cidades que concentram serviços mais especializados e irradiam sua influência.

Mas o caminho do sucesso do agronegócio brasileiro e sulista não foi trilhado sem
percalços. Gerações passadas, mesmo com grande espírito empreendedor e
aventureiro, não dispunham de facilidades de infra-estrutura, como estradas e
armazéns; a industrialização dos produtos era realizada em máquinas precárias,
como os moinhos coloniais de pedra, os engenhos de cana tocados a força animal;
as dificuldades de transporte de produtos agrícolas in natura ou processados dos
centros produtores aos centros consumidores. A maioria venceu e como prova aí
estão a agricultura moderna, as eficientes agroindústrias e as pujantes cidades do
interior, principalmente do Centro-Sul e Centro-Oeste. Alguns sossobraram no
próprio campo, outros migraram para as cidades; outros aguardam condições mais
favoráveis para mudar de atividade.

A partir dos anos 70, o agronegócio brasileiro entra numa acelerada fase de
modernização, com diversificação da produção, aumento da produção e da eficiência,
notadamente da terra e da mão-de-obra. O aumento da eficiência da mão-de-obra
está relacionada com a mecanização e a disponibilização de energia elétrica. Novas
variedades de culturas e pastagens, aliadas a fertilizantes químicos, defensivos e
práticas culturais mais eficientes permitem que se produza mais, em uma mesma
área. O exemplo mais recente dessa transformação é o soja, que seguido do milho,
torna-se o grande desbravador de novas fronteiras agrícolas, principalmente no
Centro-Oeste. De uma produção de 1,5 milhões de toneladas, no início da década de
70, atinge a mais de 30 milhões de t., nos últimos dois anos, um crescimento de 20
vezes em menos de 30 anos. À transformação nas culturas de soja e milho, segue-se
a espetacular evolução de suínos e aves.

O agronegócio brasileiro compreende atividades econômicas ligadas, basicamente, a:


(i) insumos para a agricultura, como fertilizantes, defensivos, corretivos; (ii) a
produção agrícola, compreendendo lavouras, pecuária, florestas e extrativismo; (iii)
a agroindustrialização dos produtos primários; (iv) transporte e comercialização de
produtos primários e processados.

Como serviços auxiliares ao agronegócio incluem-se os financeiros, de pesquisa e


assistência técnica. A Figura 1 retrata, esquematicamente, para as lavouras os
diversos componentes deste sistema.

O conceito de agronegócio implica na idéia de cadeia produtiva, com seus elos


entrelaçados e sua interdependência. A agricultura moderna, mesmo a familiar,
extrapolou os limites físicos da propriedade. Depende cada vez mais de insumos
adquiridos fora da fazenda e sua decisão de o que, quanto e de que como produzir,
está fortemente relacionada ao mercado consumidor. Há diferentes agentes no
processo produtivo, inclusive o agricultor, em uma permanente negociação de
quantidades e preços. Os sistemas integrados de suínos e aves que há décadas
prosperam no Sul do País são uma forma de negociação entre fornecedores de
insumos, agricultores e processamento de produtos.

De que deriva a importância do atual agronegócio? Em primeiríssimo lugar, do seu


desempenho depende a segurança no abastecimento, principalmente de alimentos, in
natura e processados. A Europa, mais de meio século depois, não esquece a tragédia
da fome, durante e logo após a Segunda Grande Guerra Mundial. Até hoje subsidia
pesadamente seus produtores, da ordem de US$ 250 bilhões, uma agricultura
ineficiente do ponto de vista econômico. Crises de abastecimento interno de produtos
básicos no Brasil, embora não frequentes, têm trazido dificuldades de alimentação,
principalmente para as camadas mais pobres. Consequentemente, garantia de
suprimento adequado de alimentos é uma questão básica de equidade e justiça social.

O agronegócio é também importante na geração de renda e riqueza do País. Se é


verdade que a participação da agricultura na economia tem diminuído ao longo da
história recente do Brasil situando-se, nos últimos anos, ao redor de 10% do PIB, o
agronegócio na sua concepção mais ampla mantém uma elevada participação,
estimada entre 35 e 40%, o que significa uma valor ao redor de US$ 300 bilhões, para
uma PIB total de US$ 800 bilhões (1997/98).

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No aspecto social, a agricultura é o setor econômico que ainda mais ocupa mão-de-
obra, ao redor de 17 milhões de pessoas, que somados a 10 milhões dos demais
componentes do agronegócio, representa 27 milhões de pessoas, no total. É o setor
que ocupa mais mão-de-obra em relação ao valor de produção: para cada R$ 1
milhão, o número de ocupados, em 1995, era de 182 para a agropecuária, 25 para a
extração mineral, 38 para a construção civil. Mesmo reconhecendo-se os benefícios da
transformação de uma sociedade agrária para uma industrial-urbana, não se pode
esquecer que esta tem capacidade limitada de absorver mão-de-obra. Principalmente
em regiões menos desenvolvidas, os setores da agricultura, da agroindustrialização e
de áreas correlatatas serão importantes para o crescimento da renda e do emprego.

No contexto da recente crise cambial, o agronegócio tem sido um fator que minimizou
os desequilíbrios das contas externas do Brasil. A agricultura, além de ser a âncora do
Plano Real contra a inflação, contribuiu decisivamente para as exportações com saldo
comercial setorial positivo da ordem de US$ 11,7 bilhões de dólares em 1997 e de
10,6 bilhões em 1998. Os setores não agrícolas foram altamente deficitários. (Ver
Gráfico 1)

Gráfico 1: Saldo Setorial da Balança Comercial Brasileira.


A importância do agronegócio reside também em sua capacidade de impulsionar outros
setores. Quando a produção agrícola movimenta os setores que estão antes da
fazenda, como máquinas, adubos, defensivos, chamamos a isto de efeitos para trás;
quando a agricultura impulsiona os setores produtivos que se situam depois da
porteira da fazenda, como a agroindústria, o transporte e a comercialização das safras,
estes são efeitos para a frente.

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A agricultura e a agroindústria tem fortes impactos para trás e principalmente para


frente. A tabela 1 indica que para cada mil unidades de produção de seu setor, são
exigidas x unidades de produção dos demais setores produtivos. Cada R$ 1.000 reais
produzidos pela agropecuária resultam R$ 5.636 que são gerados em atividades que
estão depois da fazenda (agroindústria, transporte, comercialização) e de mais R$ 623
sobre atividades antes da fazenda (máquinas, fertilizantes). Os setores agroindustriais
apresentam mais impacto sobre atividade para trás, como a própria agricultura. Para
efeitos comparativos, depois da agropecuária, o setor que tem mais impacto para
frente é o refino de petróleo com R$ 3.719.
Quais são as perspectivas do agronegócio brasileiro para o futuro? As perspectivas são
promissoras. O Brasil detém terras abundantes, planas e baratas, como são os
cerrados com uma reserva de 80 milhões de hectares, dispõe de produtores rurais
experimentes e capazes de transformar essas potencialidades em produtos
comercializáveis e detém um estoque de conhecimentos e tecnologias agropecuárias,
transformadoras de recursos em produtos.

Porém, restam alguns condicionantes para que a potencialidade do agronegócio se


concretize. Primeiro, depende de uma política macroeconômica saudável. Taxas de
juros elevadas, inflação alta ou moeda sobrevalorizada, como aconteceu no período
1994-98, prejudicam tremendamente o agronegócio. A sobrevalorização cambial
transferiu uma fábula de recursos dos setores exportadores (agricultura e
agroindústria) para os importadores (inclusive os turistas), podendo ser apontada
como a grande causa do não crescimento das safras de grãos, nos últimos anos. O
dólar relativamente fraco em relação ao real favoreceu a importação de algodão e trigo
e deprimiu sua produção interna. Finalmente, em janeiro deste ano houve uma
correção cambial, o que permite prever novo impulso no setor.

Outro entrave para o pleno desenvolvimento do agronegócio é a falta de infra-


estrutura adequada. Transporte terrestre por longas distâncias em estradas mal
conservadas elevam os custos e deprimem os preços dos produtos, a nível de
produtor. Os projetos em curso do Programa Brasil em Ação, como os Corredores
Multimodais, pretendem corrigir estas distorções, principalmente no Centro-Oeste,
onde o problema é mais grave.

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Em terceiro lugar, o processo de desenvolvimento do agronegócio só se realiza dentro
de um arcabouço legal apropriado. Os contratos entre os diferentes agentes
econômicos têm que ser respeitados, a começar com o direito da propriedade privada.

Outro obstáculo sério ao desenvolvimento pleno do agronegócio está relacionado ao


sistema tributário. Com uma economia aberta ao exterior, isto é com possibilidade de
exportar e importar qualquer produto do agronegócio, a carga tributária deve ser
compatível com a dos nosso competidores. Como nosso concorrentes, inclusive no
Mercosul, tem impostos baixos, fica difícil ao produtor brasileiro competir nos
mercados externos; vezes há que perde o próprio mercado interno porque os produtos
importados chegam mais baratos. Não há como o produtor rural e a agroindústria
serem competitivos com governos vorazes em criar novos impostos, aumentar os
atuais e com mecanismos complexos de arrecadação, o que aumenta os custos de
produção. Reforma tributária é urgente, com diminuição da carga e simplificação dos
procedimentos na tributação.

Concluindo, ressaltam-se 4 pontos básicos sobre o agronegócio: (i) está nas raízes do
nosso processo de desenvolvimento; (ii) contribui decisivamente para a renda,
emprego, exportações, desenvolvimento do interior e equidade regional; (iii) tem
grande potencialidade para sua expansão, por dispormos de terra, mão-de-obra e
tecnologia; e, (iv) para que esta potencialidade se concretize, são necessários políticas
macroeconômicas saudáveis, melhoria da infra-estrutura física (estradas, portos) e
reforma tributária, com diminuição da carga tributária sobre a produção e simplificação
dos procedimentos.

Esta é a trajetória para o desenvolvimento pleno do agronegócio brasileiro.

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