EDUCAÇÃO DO

FUTURO
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“A questão do bem-estar e da equidade é
uma das tendências que aparece com força no
que podemos chamar de ensino superior do
futuro”, afirma Clio Nudel Radomysler, pesqui-
sadora e líder de Projetos de Ensino do Centro
de Ensino e Pesquisa em Inovação (Cepi) da
Escola de Direito de São Paulo da Fundação Ge-
tulio Vargas (FGV Direito SP). Um dos grandes
desafios das instituições, segundo a pesqui-
sadora, é fazer com que os modelos de ensi-
no não reproduzam as desigualdades sociais
Olhar global e que adotem medidas de apoio psicológico
estruturais e contínuas que considerem raça,
e local e busca
classe, gênero e orientação sexual.
O grupo de pesquisadores mapeou du-
rante todo o ano de 2021 as principais ten-
por equidade
dências, perspectivas e questionamentos
em relação ao futuro do ensino superior
e elencou cases positivos de instituições
balizam ensino
de ensino em cada um dos continentes do
planeta. Na África, por exemplo, a African
Leadership University (ALU) tem dois campi
superior
localizados em Ruanda e nas Ilhas Maurício,
mas muitas das atividades são descentrali-
zadas, espalhadas por outras regiões.
do futuro
No caso específico da rubrica bem-estar e
equidade, a ALU disponibiliza para cada alu-
no mentores de diferentes regiões do conti-
nente e do mundo para apoiar os projetos de
estudo de forma bem próxima. Desde 2020,
funciona o programa Culture as a Strength Ini-
tiative, que busca compartilhar, por meio de
simpósios e eventos em geral, os propósitos
e valores éticos e sociais existentes na comu-
Postura colaborativa e integração nidade acadêmica com todos os alunos. Uma
das prioridades é promover um ambiente uni-
com diferentes áreas também versitário saudável. “A criação de ambientes
são habilidades exigidas dos diversos para o aprendizado e uma relação de
confiança com os alunos são pontos centrais
novos profissionais nos casos que mapeamos”, diz a pesquisado-
ra. “Algo que todos vão vivenciar no mercado
de trabalho.”
Preparação para desafios complexos
De acordo com o estudo da FGV Direito SP, a
covid consolidou uma mudança de paradigma.
Se formar profissionais alinhados às demandas do mercado “O pensamento, agora, tem que ser cada vez
de trabalho do século 21 e capazes de entregar conhecimen- mais interconectado, em vez de direcional”, ex-
tos e soluções para a sociedade já era um dos desafios das insti- plica Clio. Por exemplo, os alunos precisam ser
tuições de ensino superior, essa missão ficou ainda mais evidente e
relevante no contexto pós-pandemia.
O avanço das transformações tecnológicas e a necessidade de ter
pessoas capazes de dialogar com outras áreas e trabalhar colaborati-
vamente para buscar soluções para problemas complexos são alguns
aspectos dessa nova realidade.
Nessa perspectiva, os aspectos técnicos de uma formação supe-
rior continuam essenciais. Mas, para que o aprendizado faça sentido
e o formando tenha bagagem suficiente para ingressar de forma qua-
lificada no mercado de trabalho, as instituições de ensino precisam
se desenvolver em diversas frentes.
9 tendências da
educação superior
desafiados a construir projetos que atendam
as necessidades reais da comunidade, em vez
de ficar apenas em debates e análises teóricas.
Isso reforça uma das exigências das cor-
porações atuais, algo que precisa estar pre-
sente na formação dos futuros profissionais,
que é “saber olhar o entorno”. Nesse contex-
to, experiências em curso no Brasil também
estão em sintonia com o que ocorre em ou-
tras partes do mundo.
“O que nós precisamos é preparar as pes-
soas para enfrentar os sistemas complexos
que estarão lá na frente. E a complexidade aqui
não significa algo difícil do ponto de vista téc-
nico, mas multidisciplinar. Com um viés social,
econômico, sustentável e assim por diante”,
destaca Marcello Nitz, pró-reitor acadêmico do
Instituto Mauá de Tecnologia (IMT).
Do ponto de vista prático, o que vem ocor-
rendo na instituição privada da região do ABC
paulista é uma espécie de quebra das paredes
dos laboratórios. “Antes, cada disciplina tinha
o seu laboratório. Hoje, eles estão reunidos
por grandes temas, como inteligência artificial
e ciência de dados”, conta o pró-reitor. O mind-
set que o mercado exige, de que o cientista dis-
cuta com o designer e com o administrador, já
acontece desde a formação.
Segundo Clio, da FGV, outra tendência que
se destaca atualmente é o chamado aprendiza-
do ao longo da vida. “Não existe mais a história
de que a graduação ou a pós-graduação é o
ponto final. As instituições de ensino superior
precisam virar uma espécie de ponto de encon-
tro, onde diversos profissionais que já estão no
mercado, de diferentes idades, se reúnem para
debater novos desafios.”
Centro de Ensino e
Pesquisa em Inovação da
FGV Direito SP mapeou
perspectivas do setor
1 Interação global-local: olhar para o
mundo e para as comunidades do entorno
2 Liderança voltada para transformação
social: formar novos líderes com visão mais
coletiva ou sistêmica, a partir da criação de
espaços reflexivos, colaborativos e criativos
dentro das unidades de ensino
3 Democratização das instituições
de ensino superior: disseminação do
conhecimento de forma aberta e gratuita
4 Aprendizagem ao longo da vida:
como a universidade pode ser um espaço de
atualização e troca de saberes de profissionais
de diferentes idades e trajetórias
5 Formação integral e multi/inter/
transdisciplinar: integração e necessidade
de trabalho colaborativo com outras áreas
6 Personalização e flexibilidade para
docentes e discentes: possibilitando que
cada um construa sua própria trajetória
pessoal e profissional
7 Protagonismo dos estudantes e
cocriação em sala de aula: o centro do
processo de ensino e aprendizagem é o
aluno, e não mais o professor
8 Preocupação com bem-estar e
equidade: cuidar da saúde mental de todos
e tratar as desigualdades de forma estrutural
9 Novo papel da tecnologia: pandemia
colocou o tema em novo patamar, atribuindo-
-lhe um papel ainda mais central

Aprendizagem para acompanhar
as mudanças do mercado de trabalho
Conceito de lifelong learning, aprendizado
ao longo da vida, acompanha os alunos desde
a graduação no Instituto Mauá de Tecnologia
E
m um mundo em constante
transformação, em que a revolu-
ção digital avança rapidamente,
a preparação dos profissionais para os de-
safios do mercado de trabalho deve incluir,
entre outros fatores, a educação continua-
da e o chamado “lifelong learning” (apren-
dizagem ao longo da vida).
“Esse conceito está muito ligado à pos-
tura da pessoa, a algo voluntário, ao apren-
dizado autônomo”, explica o professor
Julio Lucchi, coordenador-geral da pós-
-graduação do Instituto Mauá de Tecnolo-
gia. “Temos um docente [José Predebon] da
pós-graduação, especialista em inovação,
que está com 90 anos e usa uma frase que
define bem essa postura: ‘Todo dia eu acor-
do e decido que eu vou ter que aprender
alguma coisa’”, conta.
No contexto brasileiro, a atualização
frente às novas tecnologias pode se traduzir
em oportunidades profissionais, principal-
mente na área de tecnologia da informa-
ção, onde há de 300 a 400 mil vagas abertas
à espera de candidatos qualificados.
“É lá que estão as melhores oportuni-
dades de emprego e os maiores salários no
momento. A pessoa tem que ter disposição
para aprender, se reciclar e se requalificar”,
diz Lucchi. “Isso se liga à ideia do lifelong
learning, que resgata aquele prazer de
aprender que temos quando criança para a
vida profissional. O estudar se torna um ato
contínuo”, acrescenta.
Competência técnica
O professor alerta que a perspectiva
do lifelong learning não exclui a necessi-
dade de uma educação formal. “Quando
falamos de aprendizagem ao longo da
vida pode dar a impressão de que esta-
mos abolindo o diploma. Mas não é isso.
A educação formal não vai acabar, pois o
mercado de trabalho não abriu mão da
competência técnica. Ela é a base, o fun-
damento. Mas, além dela, vão ser exigidas
outras habilidades, como saber usar as
novas tecnologias”, exemplifica.
De acordo com ele, é preciso cada vez
mais ter essa base de forma sólida para po-
der sobreviver nesse mundo incerto e que
muda a todo momento. “Esses fundamen-
tos vão permitir continuar aprendendo
sempre. A tecnologia que conheço é útil
hoje, mas amanhã ela pode ser substituída.
Então, vou ter que aprender a nova e tenho
necessidade dessa aprendizagem ao longo
da vida para me reposicionar e me requali-
APRESENTADO POR
ficar com as novas ferramentas.”
Ele dá como exemplo um engenheiro
da área automobilística, formado há 15
anos. “Ele tem o fundamento, mas hoje o
veículo é outro – híbrido, elétrico, autôno-
mo – e o conceito de mobilidade também
mudou. Daí a necessidade de atualização.”
Pós-graduação
e educação
Encurtar o caminho
Para essa requalificação profissio-
nal, uma opção são os cursos oferecidos
pelas instituições de ensino, que têm a
informação organizada e adequada ao
que o mercado está querendo. “A escola
continuada
possui a estrutura para encurtar o cami-
nho desse aprendizado, com os cursos de
São mais de 40 cursos
pós-graduação. Hoje, eles não têm mais divididos em especialização,
aquela estrutura rígida, linear e sequen- aperfeiçoamento e atualização
cial”, destaca Lucchi.
Na Mauá, por exemplo, os cursos de
pós são modulares. O aluno pode fazer um
módulo de atualização profissional, seguir ÁREAS:
com outro de aperfeiçoamento e então par-
tir para o terceiro módulo, em que obtém Engenharia
o certificado de especialização ou MBA. Se- Automotiva, Civil, de Alimentos, de Computação,
gundo o professor, muitos estudantes não de Controle e Automação, de Embalagem, de
param no terceiro módulo. “Temos alunos Processos, Energia e Sustentabilidade, Indústria
que estão no quinto módulo. Eles vão cur- 4.0 e Indústria Digital
sando de acordo com as necessidades e de-
mandas, percebendo que aquilo vai gerar Gestão
evolução profissional.”
Gerenciamento de Projetos, Gestão,
Indústria 4.0 e Indústria Digital
Aprender na prática
Lucchi ressalta que o conceito de life-
long learning está presente na Mauá des-
de a graduação, com grande flexibilidade Tecnologia da Informação
curricular e uso intenso de metodologias Ciência de Dados, Indústria 4.0 e Indústria Digital,
ativas – que colocam o aluno como pro- Inteligência Artificial, Segurança Cibernética, TI
tagonista do seu aprendizado. Assim, o
estudante trilha o seu próprio caminho.
Um aluno de Engenharia Química, por
exemplo, pode fazer no último ano da
graduação um conjunto de disciplinas COMO FUNCIONA
eletivas que vão permitir que ele se volte Na pós-graduação, cada módulo tem duração
para uma determinada área, como ciên- de um semestre (120 horas) e oferece certificação
cia de dados.
Para o coordenador, um diferencial
importante dos cursos da instituição é 1 MÓDULO → atualização profissional
que eles são muito ligados à prática, ao
possibilitarem colocar a mão na massa
com técnicas, equipamentos e ambientes
2 MÓDULOS → aperfeiçoamento
preparados para isso. “Além do corpo do-
cente altamente qualificado, temos pro-
fissionais do mercado. E hoje, na Mauá,
para cada sala de aula convencional, 3 MÓDULOS → especialização ou MBA
dispomos de dois laboratórios. Somos
muito voltados para o aprender fazendo,
Educação continuada:
inclusive na pós-graduação, com gente
qualificada e que faz no dia a dia.” cursos de 40 horas
6 7

vações está a criação da graduação em Direito,

a primeira gratuita e oferecida por uma insti-
tuição pública na região metropolitana de São
Paulo, após quase dois séculos do surgimento
do curso de Direito da Universidade de São
Paulo (USP).
O curso da Unifesp nasceu em 2021 a par-
tir de um projeto pedagógico que tem um viés
acentuado na pesquisa e na extensão. A pro-
posta curricular se conecta aos direitos huma-
nos, às políticas públicas e à cooperação inter-
nacional. Já o estágio vai colocar os alunos em Soft skills
clínicas jurídicas, onde eles terão acesso tanto
à prática simulada quanto à real, no atendi- valorizadas
mento à comunidade do entorno do campus
de Osasco, onde o curso foi aberto.
pelo mundo
Para o professor Manoel Francisco do Ama- corporativo
ral, da Faculdade de Educação da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp), é necessá-
rio, desde a educação básica, se voltar para a Segundo o programa Jornada
formação geral do estudante, de forma mais
humanizada e integral, considerando questões para o Futuro, da Cia de Talentos
sociais e universais.
“É preciso uma formação para que as pes-
soas tenham preocupações em cuidar das cau- Autoconhecimento: É a senso comum faz a diferença

Profissional do século
sas ambientais, das camadas mais oprimidas chave para o profissional em qualquer negócio.
[da população], das crianças, dos idosos, das compreender a sua história,
questões sanitárias. Ou seja, a educação pre- reconhecer seus aprendizados Mindset ágil: A forma de

21 deve aliar técnica

cisa dar conta de formar as pessoas para uma e tomar decisões mais pensar impacta positiva
visão planetária, na qual o foco não seja ape- conscientes e alinhadas com os ou negativamente tanto na
nas nos interesses pessoais, mas no indivíduo seus objetivos. sua vida pessoal quanto na

e lado socioemocional
Autoconhecimento, As rápidas transformações na socie-
dade e no mercado de trabalho exi-
resiliência e capacidade gem, cada vez mais, profissionais que, além
de dialogar com outras de conhecimento técnico de excelência (hard
skills), tenham também habilidades socioe-
áreas e trabalhar em mocionais (soft skills) – como criatividade e
capacidade de trabalhar em equipe para lidar
equipe são habilidades com as questões complexas do nosso tempo
fundamentais para de forma ampla e interdisciplinar.
“As chamadas hard skills (cursos, idiomas)
ingressar no mercado são importantes. Mas as soft skills também
são úteis para que ocorra um crescimento den-
e ascender na carreira tro das organizações depois da contratação”,
aponta Paula Esteves, coCEO do Grupo Cia de
Talentos. Segundo a executiva, especializada
em formação e gestão de pessoas, o ideal é
que a balança entre os dois conjuntos de co-
nhecimento esteja sempre ajustada. “A junção
das duas coisas é necessária e fundamental.”
Tanto é que universidades públicas e pri-
vadas estão cada vez mais mergulhadas no
caminho de unir formação acadêmica e o de-
senvolvimento de habilidades pessoais. “Os
alunos do primeiro ao penúltimo ano têm 15%
do currículo voltado para workshops e semi-
nários dados por profissionais das mais va-
riadas áreas e que não são do corpo docente
da instituição”, conta Marcello Nitz, pró-reitor
acadêmico do Instituto Mauá de Tecnologia
(IMT). A tradicional escola de engenharia lo-
calizada no ABC paulista há tempos abraçou
uma visão transdisciplinar do ensino superior.
“Temos a oferta de aproximadamente 200 se-
minários por semestre. Os estudantes podem
escolhê-los livremente. É uma oxigenação
muito boa ‒ há aulas, por exemplo, de ciên-
cias políticas”, completa.
Questões sociais e universais
Na Universidade Federal de São Paulo (Uni-
fesp), que tem campi na capital e em Diadema,
Guarulhos e Osasco, entre outros municípios
paulistas, currículos arejados e diversificados
também têm sido a tônica. Entre as várias ino-
social e no bem comum”, afirma o pedagogo.
Aspectos cognitivos,
intrapessoais e interpessoais
Paula Esteves, da Cia de Talentos, reforça
que, apesar de ferramentas técnicas em mãos
e de treinamento para ter uma visão comple-
xa da realidade, a vida profissional dos atuais
estudantes e concluintes do ensino superior
vai depender bastante de suas competências
socioemocionais.
“Hoje, os maiores motivos ligados aos
desligamentos estão atrelados às soft skills”,
afirma a executiva. A boa notícia, segundo
Paula, é que existem formas de as pessoas
continuarem melhorando e aprendendo nesse
campo. Há questões cognitivas, de saber en-
frentar problemas críticos, além das questões
intrapessoais, da pessoa consigo mesma, e in-
terpessoais, de como o ser humano reage aos
estímulos dos outros.
“O autoconhecimento tem um papel im-
portante, além da questão da comunicação.
A pandemia ainda evidenciou um outro as-
pecto: a resiliência”, ressalta Paula. “A pró-
pria Cia de Talentos montou o programa ‘Jor-
nada para o Futuro’, que oferece conteúdos
de forma gratuita, por meio de podcasts e
e-books, para as pessoas mapearem e aper-
feiçoarem suas soft skills.”
Cultura e valores: Os ideais da
pessoa devem estar alinhados
com a cultura e os valores da
empresa. Saber identificar as
ferramentas que apoiam esse
processo é fundamental para
uma carreira feliz.
Protagonismo e resiliência:
A conquista dos objetivos
depende de protagonismo para
se responsabilizar por escolhas
e atitudes e de resiliência
dentro e fora do trabalho.
Empatia: Muito mais do que
a capacidade de se colocar
no lugar do outro, é um
dos pilares da inteligência
emocional. É por meio dela
que bons relacionamentos são
construídos.
Criatividade e inovação:
Problemas precisam ser
resolvidos em todas as áreas
de atuação, e a capacidade de
encontrar soluções além do
profissional.
Comunicação e influência:
Saber se comunicar de forma
clara, assertiva e respeitosa
pode melhorar o desempenho
nos processos seletivos e na
atuação profissional.
Visão de negócios: Desenvolver
uma boa visão de negócios
significa conhecer as
ferramentas certas para
se destacar em processos
seletivos, no mercado e nesse
“novo” mundo.
Networking: Conectar-se
com outros profissionais do
mercado é essencial para abrir
portas e encontrar as melhores
oportunidades.
8 Outra alternativa, segundo Cabral, é o
Competências
tecnológicas
favorecem ingresso
no mundo profissional
Mercado de trabalho exige pessoas
qualificadas para atender ao surgimento
acelerado de novas demandas, sobretudo
aquelas impulsionadas pela revolução digital
Cada vez mais as empresas reco-
nhecem na transformação digital
a alavanca responsável pela sobrevivência
e pelo crescimento do negócio. No entanto,
não basta investir em tecnologia. É preciso
encontrar profissionais que tenham uma
formação alinhada a essas novas necessi-
dades do mercado e saibam acompanhar o
constante desenvolvimento e aplicação dos
recursos e ferramentas tecnológicas.
Quem vai escolher uma carreira, por sua
vez, valoriza ainda mais o papel da sala de aula
para se manter em vantagem em um ambiente
que passa por uma evolução tecnológica em
uma velocidade sem precedentes.
Além da questão da tecnologia, labora-
tórios multidisciplinares, parcerias com insti-
tuições de ensino internacionais e programas
de estágio no exterior e de aproximação com
empresas locais para o fomento de projetos
de pesquisa e desenvolvimento (P&D) são al-
guns dos diferenciais que os estudantes têm
procurado na formação superior para chegar
ao mercado em melhores condições de empre-
gabilidade.
Com a escassez de talentos, a retenção de
profissionais será fundamental para dar sus-
tentação à transformação digital, como mos-
tram consultorias internacionais. A pesquisa
“Como se preparar para o futuro do trabalho”,
da Boston Consulting Group (BCG), ouviu pro-
fissionais de 190 países, incluindo o Brasil, e
constatou: as empresas que combinam com-
petências em tecnologia e pessoas com dife-
rentes habilidades em torno de uma estratégia
comum geram resultados superiores.
Experiências práticas
As demandas das empresas disparam
um alerta para as instituições de ensino, que
precisam oferecer, além do conteúdo teórico,
vivências cada vez mais alinhadas às expec-
tativas do mercado de trabalho.
“Hoje, o desafio das universidades é pro-
porcionar cada vez mais experiências reais
relacionadas ao mundo das empresas. Com
a velocidade da transformação digital que
vemos hoje, o ideal é que as instituições de
ensino consigam conciliar o que é visto em
sala de aula com vivências práticas”, suge-
re Paulo Renato Macedo Cabral, gerente de
Inovação do Sebrae. “Por exemplo, em pe-
quenas empresas, em startups, por meio de
visitas aos empreendimentos e de palestras
dos executivos nas faculdades.”
O que o estudante
deve buscar na
sua formação
Especialistas que participaram
desta reportagem apontam
alguns caminhos
9
estímulo a empresas juniores dentro das fa-
culdades, com a liderança dos alunos. Isso
para que eles desenvolvam o empreende-
dorismo e tenham contato com as pequenas
empresas inovadoras, em fase de desenvol-
vimento, a partir da economia digital.
Novas competências
para um novo tempo
Hoje, entre as habilidades mais procu-
radas nos profissionais estão a consciência
digital, a aderência e experiência com os
conceitos ESG [que correspondem a práticas
ambientais, sociais e de governança de uma
organização], a humanização das relações
por meio de um perfil comunicativo e en- Codesenvolvedora de soluções SAP, a
gajador e a rápida tomada de decisão para msg global solutions está presente em 23
transformar planos em ações, diz André Frei- países e emprega cerca de 1.200 pessoas.
re, sócio-diretor da EXEC Capital Humano. Na seleção de profissionais, explica Meire
“Essas competências são importantes para do Carmo, head de RH, a empresa busca
uma mudança geracional, em que líderes lidam por quem tenha conhecimentos técnicos
com uma população de funcionários, clientes nos processos do segmento no qual atua-
e fornecedores mais alinhados com os precei- rá, sejam eles acadêmicos e/ou adquiridos
tos de sustentabilidade, ética, diversidade e
humanização. Sem essas habilidades, dificil-
na sua trajetória profissional. Além disso,
acrescenta, têm destaque aqueles com
mente o líder conseguirá engajar seus times e mentalidade de dono, espírito de equipe e
crescer na carreira”, analisa Freire. que estudam constantemente.
Como destaca a diretora de Inovação da
Confederação Nacional da Indústria (CNI),
Gianna Sagazio, as inovações disruptivas
estimulam uma demanda maior por profis-
sionais com alto nível de formação – princi-
palmente os pós-graduados.
Para aumentar as chances de inserção,
“quem tem interesse em trabalhar em fun-
ções relacionadas à fronteira tecnológica
deve perseguir seus estudos e atividades
ligadas à pesquisa científica e tecnológica.
O profissional que conseguir se capacitar em
áreas relacionadas à tecnologia e à gestão
da inovação tenderá a obter melhores inser-
ções no mercado”, afirma a diretora da CNI.
Exercitar a criatividade e a ousadia
Desenvolver competência de gestão para medir o resultado antes e depois de colocar
uma inovação em prática
Ter persistência e visão de futuro, já que os processos de inovação muitas vezes não
são de curto prazo
Participar de projetos que envolvam temas relacionados à inovação ou de squads
– pequenas equipes multidisciplinares formadas por pessoas com diferentes
habilidades, porém com um objetivo em comum
Investir em cursos de complementação da formação acadêmica e coaching/mentoria
‘Autoconhecimento é uma
jornada sem fim, fundamental
em todas as áreas’
Segundo o consultor
Dante Mantovani,
o mercado busca
profissionais que procuram
se conhecer e que sejam
capazes de articular
diferentes saberes

O aprendizado segmentado em
“caixinhas” ainda é uma realidade
na maioria das instituições de ensino su-
perior do País, de acordo com o consultor
de educação corporativa, coach e trainer
Dante Mantovani. Por isso, depois que os
profissionais entram no mercado de traba-
arquivo pessoal/divulgação

lho, eles terão que desenvolver novas ha-

bilidades para, então, começarem a galgar
novos degraus. Para o engenheiro e psicó-
logo que adora ajudar pessoas e empresas
a se transformarem, como ele mesmo gosta
de dizer, o autoconhecimento, uma jorna-
da sem fim, é essencial em todas as áreas.
Confira na entrevista a seguir.
O que mais pesa hoje para a contratação
de quem sai da faculdade?
No começo da carreira, você é contrata-
do pela “caixinha” que você sabe, porque a
maioria das pessoas ainda é formada dessa
maneira. Precisamos rechear melhor os cur-
sos para que eles contribuam na formação
de seres humanos mais completos.
E depois?
À medida que você vai subindo de posi-
ção, entretanto, como ocorre com os direto-
res, você tem que entender de várias coisas,
e não só da sua área. É importante ter noção
de um pouco de tudo para saber discutir com
o cara da contabilidade, com o pessoal do RH
e assim por diante.
É fundamental, portanto, juntar as “cai-
xinhas” ao longo da vida profissional?
A palavra que resume bem tudo isso é
interdisciplinaridade. Cada vez mais a gente
precisa juntar as caixinhas. Eu procurei juntar
Dante Mantovani, consultor
de educação corporativa
duas, a da engenharia com a da psicologia.
Não é ser especialista em tudo, mas entender
um pouco das outras coisas além daquela em
que você se formou. Veja, até a filosofia está
no meio da engenharia, por exemplo. Vamos
supor que um carro autônomo precisa tomar
uma decisão importante. A ética está entrando
no código de programação.
É possível resumir, de alguma forma, o
que o mercado de trabalho quer hoje?
O mercado de trabalho busca pessoas que
procuram se conhecer, saber do que gostam e
entender o que é importante para elas. Além
disso, é relevante o profissional saber o que ele
está ou não está disposto a aceitar no trabalho.
Por isso, desde sempre, o jovem pode procurar
desenvolver seu autoconhecimento e aprovei-
tar as experiências não apenas na escola for-
mal, nas aulas, mas em como ele se comporta
em atividades mais amplas, em geral.
Poderia dar um exemplo?
Quando tem trabalho em grupo, ele assu-
me a liderança? Que assunto mais o mobiliza?
Quanto mais os jovens se conhecerem, melhor,
porque as empresas querem saber não só o
que eles fazem bem, mas se eles se encaixam
na cultura da companhia. Conhecer-se aju-
da muito, saber no que você é bom ou não. E
saber isso é uma jornada que não tem fim. Eu
achava que gostava de marketing, mas, quando
passei a trabalhar com isso, eu vi que gostava
do assunto e até de estudar sobre isso, mas
esse não é o campo em que navego à vonta-
de. Descobri que eu navego mais à vontade em
comportamento humano. E sou engenheiro de
formação. Olha a volta que eu dei. Mas, apesar
disso, não jogamos conhecimento fora.