Você está na página 1de 14

HEMATOLOGIA VETERINÁRIA NA CLÍNICA DE PEQUENOS ANIMAIS

Suzy Cleide Vieira Santos1

RESUMO

O sangue é um tecido formado por três tipos de células: os glóbulos vermelhos,


também conhecidos como hemácias ou eritrócitos; os glóbulos brancos ou leucócitos
e as plaquetas, que são fragmentos de citoplasma dos megacariócitos e por um meio
intercelular, denominado plasma, que por sua vez é composto de 91,5% de água,
7,5% de sólidos orgânicos e 1% de sólidos inorgânicos. Assim como os seres
humanos, os animais também são estudados pela Hematologia veterinária,
principalmente os elementos que formam o sangue: plaquetas, células brancas e
vermelhas e o plasma. Ao verificar os níveis de cada um dos componentes do sangue,
os exames hematológicos proporcionam o melhor entendimento do funcionamento do
organismo do animal no momento em que ele chega à clínica. Sendo assim, esta
estudo tem como objetivo geral conhecer a importância da hematologia veterinária em
clínicas de pequenos animais. Trata-se de uma pesquisa descritiva com abordagem
bibliográfica, através de artigos científicos, livros e monografias. Conclui-se que os
exames de laboratório na clínica veterinária são mais utilizados como auxílio
diagnóstico subsidiário, por isso, podem fornecer muitas informações úteis, mas,
como todo exame diagnóstico, a avaliação inteligente dos resultados é vital.

Palavras-chave: Hematologia. Sangue. Animais Pequenos. Clínica. Diagnóstico

1 Aluna do curso de pós-graduação em Análises Clínicas Veterinárias da FACUMINAS, 2023.

1
1 INTRODUÇÃO

O sangue é um tecido constituído por três tipos de células: os glóbulos


vermelhos, também conhecidos como hemácias ou eritrócitos; os glóbulos brancos ou
leucócitos e as plaquetas, que são fragmentos de citoplasma dos megacariócitos e
por um meio intercelular, denominado plasma, que por sua vez é composto de 91,5%
de água, 7,5% de sólidos orgânicos e 1% de sólidos inorgânicos (FELDMAN; ZINKL;
JAIN, 2020).
Proteínas, tais como albumina, globulinas, fibrinogênio e demais itens de
coagulação respondem por 7% dos sólidos orgânicos do plasma, os 0,5% restantes
são compostos por um conjunto de substâncias nitrogenadas, gorduras neutras,
colesterol, fosfolipídeos, glicose, enzimas e hormônios. Os sólidos inorgânicos são
representados por minerais, como Na, K, Mg, Cu, e HCO3. O sangue é responsável
por cerca de 7,5% do peso de um animal (FELDMAN; ZINKL; JAIN, 2020).
O estudo das contagens de leucócitos do sangue auxilia na compreensão sobre
as possíveis disfunções apresentadas pelo paciente. Em geral, um leucograma
anormal permite a identificação de processos patológicos, mas não permite a
definição de um diagnóstico específico. Entretanto, a observação das anormalidades
leucocitárias e dos achados clínicos pode levar a um diagnóstico.
Na área da medicina, a Hematologia é a especialidade que estuda e trata
doenças do sangue e de órgãos hematopoéticos, onde se formam as células do
sangue. É de responsabilidade do médico que possui essa especialização realizar o
diagnóstico e o tratamento de condições que possam afetar o sangue e o local onde
ele é formado (RIBEIRO et al, 2018).
Assim como os seres humanos, os animais também são estudados pela
Hematologia veterinária, principalmente os elementos que formam o sangue:
plaquetas, células brancas e vermelhas e o plasma. Assim, é possível obter respostas
para a origem do problema, entender sua gravidade e oferecer respostas para os
questionamentos que surgem quando um animal apresenta sintomas de alguma
doença, principalmente as mais graves.
Ao verificar os níveis de cada um dos componentes do sangue, os exames
hematológicos proporcionam o melhor entendimento do funcionamento do organismo
do animal no momento em que ele chega à clínica. Com a análise detalhada de
células, proteínas e plaquetas, o veterinário consegue entender o que está causando

2
as alterações no organismo do pet e, por conseguinte, diagnosticar doenças como
leucemias e anemias. Dentre os vários exames de sangue realizados na área de
hematologia veterinária, destacam-se: hemograma, eritograma, leucograma,
trombograma, entre outros.
Sendo assim, esta estudo tem como objetivo geral conhecer a importância da
hematologia veterinária em clínicas de pequenos animais.

2 METODOLOGIA

Sob o ponto de vista de seu objetivo, foi utilizada a pesquisa descritiva, pois
tem como finalidade descrever as características de uma população, um fenômeno ou
experiência para o estudo realizado. Ela é realizada levando em conta os aspectos da
formulação das perguntas que norteiam a pesquisa, além de estabelecer também uma
relação entre as variáveis propostas no objeto de estudo em análise (GIL, 2016).
Foi realizada também uma pesquisa bibliográfica sobre o tema proposto, a
partir de fontes secundárias (livros e artigos científicos). De acordo com Gil (2016), a
pesquisa bibliográfica compreende o levantamento de toda a bibliografia já publicada
em forma de livros, periódicos (revistas), teses, anais de congressos, indexados em
bases de dados.
Os livros e artigos científicos foram buscados nas principais bases de dados
nacionais: Scielo, Google Acadêmico, CAPES, entre outras, através das seguintes
palavras-chave: “hematologia, sangue, pequenos animais, exames, clínica”. Foi
utilizado o caractere booleano “and”, pois combinou os termos da pesquisa para que
cada resultado da pesquisa contivesse todos os termos.

3 RESULTADOS E DISCUSSÕES

Para facilitar o entendimento sobre a temática escolhida e dinamizar os


resultados, as discussões foram divididas em tópicos, como a seguir.

3.1 Sangue e sua composição

O sangue é um tecido líquido, constituído pelo plasma, hemácias, leucócitos e


plaquetas. O plasma é formado por água, minerais, eletrólitos, vitaminas, proteínas,

3
lipídios e carboidratos. Já as hemácias transportam o oxigênio, os leucócitos
participam da defesa orgânica e as plaquetas atuam no processo de hemostasia2
(SILVA, 2017).
O sangue atua no interior dos vasos sanguíneos, sendo bombeado pelo
coração e tem como funções principais a nutrição e oxigenação dos tecidos. Por meio
do sangue são transportados os nutrientes (proteínas, carboidratos, lipídios,
vitaminas), hormônios e o oxigênio (O2) necessário ao metabolismo celular. O O2 é
transportado dos pulmões para os tecidos e o gás carbônico (CO2) no sentido inverso,
ou seja, dos tecidos para os pulmões. Além desses atributos, o sangue também ajuda
na regulação da temperatura corporal, recebe os produtos do metabolismo celular
(catabólitos) e levam-nos para os órgãos de metabolização e excreção (rins, pulmões
e fígado) para que eles sejam eliminados do organismo (ARAÚJO, 2019).
O volume total do sangue (volemia), corresponde a quase 7,5% do peso
corporal, diferenciando com a espécie, a idade e a ingestão ou perda de água. O
volume sanguíneo permanece estável pela constante passagem de líquidos
intersticiais para o meio vascular e vice-versa (FERREIRA, 2015). Entretanto, quando
ocorre situações que há perda do volume sanguíneo (hemorragia, problemas renais e
desidratação), configura-se como hipovolemia. Se a perca for de 70 a 80%, ocorre o
choque hipovolêmico que representa uma emergência e pode levar o paciente ao
óbito (ARAÚJO, 2019).
Segundo Laurino (2019), as células do sangue possuem um período de vida
breve, e a quantidade dessas células na circulação mantêm-se estável por ação de
um conjunto de órgãos e tecidos chamado sistema hematopoiético-lítico. Este sistema
é composto pela medula óssea, o baço, o fígado, o timo, os intestinos, os rins, o
estômago e os macrófagos3
No sistema hematopoiético-lítico são produzidas as células sanguíneas pelo
processo de hematopoiese, e as células senescentes, parasitadas ou defeituosas são
destruídas por hemocatarese. A produção e a destruição das células sanguíneas são
eventos fisiológicos que mantém o equilíbrio dentro dos valores normais para cada
espécie. Havendo mudanças nesses processos, há também uma diminuição ou
aumento dos tipos celulares do sangue decorrentes dos processos patológicos
(LAURINO, 2019).

2 Resposta fisiológica normal do corpo para a prevenção e interrupção de sangramento e hemorragias.


3 Células de defesa, cuja atuação se dá no sistema imunológico.

4
Em se tratando de animais, principalmente os mais jovens, o sistema
hematopoiético atua com mais intensidade, promovendo o aumento das hemácias,
plaquetas e leucócitos quando comparado aos valores hematológicos de animais mais
velhos (LAURINO, 2019). Ainda nesse contexto, Araújo (2019) acrescenta que as
hemácias são as unidades morfológicas da série vermelha, e são denominadas
também de eritrócitos ou glóbulos vermelhos. São as células em maior número no
sangue, perfazendo um total de 40% do volume globular, formada por 61% de água,
32% de proteína (hemoglobina), 7% de carboidratos e 0,4% de lipídios (ARAÚJO,
2019).
Em animais de médio a grande porte, principalmente os mamíferos, as
hemácias maduras são anucleadas, possuem formato bicôncavo e não apresentam
organelas, por isso não sintetizam proteínas. Entretanto, em aves, répteis, anfíbios e
peixes o núcleo permanece durante toda a vida celular (ARAÚJO, 2019). Já os
eritrócitos ou hemácias, por meio da hemoglobina, têm como objetivo o transporte de
oxigênio dos pulmões para os tecidos e no sentido inverso transportam o gás
carbônico.
Ainda sobre as hemácias, Laurino (2019) destaca que a sua energia é utilizada
para manter a morfologia celular, a estrutura da membrana, as atividades enzimáticas
e outras funções para garantir a demanda de oxigênio para os tecidos. Já o tempo de
vida dos eritrócitos varia com a espécie animal, a presença de inclusões ou alterações
na morfologia da célula e a ocorrência de algumas doenças, principalmente as
hemolíticas.

3.2 Anemias: principal doença do sangue animal

Anemia é a diminuição da quantidade de glóbulos vermelhos ou


de hemoglobina no sangue. Pode também ser definida como a diminuição da
capacidade do sangue em transportar oxigénio. Quando a anemia é de aparecimento
lento, os sintomas são muitas vezes vagos e podem incluir fadiga, cansaço, falta de
ar ou diminuição da capacidade de realizar exercício físico (LESSA; NEVES; ROCHA,
2016). Quando é de aparecimento rápido os sintomas são mais evidentes, incluindo
estado de confusão, sensação de desfalecimento, perda de consciência ou aumento
da sede. Só quando a progressão da doença é significativa é que a palidez se torna
evidente. Os restantes sintomas dependem da causa subjacente à anemia.

5
Segundo Moreira (2017), existem três tipos principais de anemia: a que é
causada por perda de sangue; a que é devida à diminuição da produção de glóbulos
vermelhos; e a que é devida ao aumento da destruição de glóbulos vermelhos. Entre
as causas mais comuns para a perda de sangue estão o trauma físico e a hemorragia
gastrointestinal. Entre as causas da diminuição de produção estão a deficiência de
ferro e vitamina B12, talassemia e várias neoplasias da medula espinhal.
No caso dos animais, a anemia pode ser classificada como verdadeira
(absoluta) ou falsa (relativa). No primeiro tipo, ocorre uma real diminuição no número
de células vermelhas, resultando em alterações do eritrograma caracterizadas por
diminuição da CGH, do Ht e da Hb. Já na anemia falsa, ocorre uma hemodiluição,
causada pelo aumento do volume plasmático, resultando em uma falsa redução na
contagem global de hemácias (CGH), no hematócrito (Ht) e na concentração de
hemoglobina (Hb). Este tipo pode ocorrer em animais gestantes, lactantes, filhotes e
em casos de terapias com administração de fluidos (SILVA, 2017).
Na maioria das vezes a anemia é um distúrbio secundário relacionado a uma
causa primária como, por exemplo, na anemia ferropriva que é ocasionada pela
deficiência de ferro com consequente diminuição da produção de hemácias. Outro
exemplo de anemia é a causada por parasitas gastrintestinais hematófagos em
ruminantes e a infecção por Ancilostoma em cães (LOPES et al, 2017).
Outra situação que pode causar anemia é a presença de ectoparasitas
(carrapatos, pulgas, mosca do chifre), pois estes sugam o sangue e por isso, faz
diminuir a quantidade de hemácias, o Ht e a concentração de Hb. Algumas doenças
infecciosas também provocam anemia como a panleucopenia felina, cinomose,
leishmaniose, parvovirose, anemia infecciosa equina (AIE), babesiose, anaplasmose,
leptospirose, dentre outras (LOPES et al, 2017). Além dessas causas, a perda de
sangue, por hemorragia aguda ou crônica, é causa frequente de quadros de anemia
em animais domésticos e silvestres. Dessa forma, o tratamento das anemias envolve
o diagnóstico e resolução da causa primária que está provocando o quadro anêmico
(SILVA, 2017).
Dentre os principais sintomas da anemia em animais, destacam-se: diminuição
do volume sanguíneo (volemia); palidez das mucosas e dos órgãos e tecidos; cianose;
fraqueza muscular; apatia; dispneia; disfunção de órgãos e tecidos; hipóxia hepática;
taquicardia, entre outros (THRALL et al, 2015). Entretanto, o diagnóstico laboratorial

6
é o mais importante e seguro para confirmar as anemias, através do hemograma
completo, onde é avaliado o eritrograma.
Ainda segundo os mesmos autores, alguns fatores precisam ser levados em
consideração durante a avaliação do hemograma do animal, pois existem situações
fisiológicas que devem observadas no eritrograma, tais como: Idade – Animais mais
jovens podem ter números mais elevados de hemácias em decorrência da maior
atividade hematopoiética da medula óssea. Sexo – Geralmente os machos
apresentam maiores índices eritrocitários quando comparados às fêmeas, pois os
andrógenos (testosterona) são estimulantes da eritropoiese, enquanto os estrógenos
são inibidores. Altitude – Em locais de elevada altitude a tensão de oxigênio é menor
e pode resultar em uma situação de hipóxia. Raça - Algumas raças de cães de corrida
também apresentam mais eritrócitos em relação aos outros cães. Exercício – A prática
de exercício antes da coleta de sangue para realização do hemograma pode aumentar
os índices eritrocitários. Dessa forma, é importante realizar a coleta de sangue para
hemograma em animais descansados (THRALL et al, 2015).
De acordo com Santos, Silvério e Orfão (2015), as anemias também podem ser
classificadas, conforme a resposta da medula óssea, em dois tipos: regenerativas e
arregenerativas. Nas anemias regenerativas a produção de hemácias na medula
óssea mantem-se normal ou pode estar aumentada para tentar restabelecer a
redução dessas células no sangue periférico; são causadas por hemorragias ou
hemólise (SANTOS; SILVÉRIO; ORFÃO, 2015). Já nas anemias arregenerativas, a
medula óssea não consegue manter ou aumentar produção de hemácias em
consequência de lesões na medula óssea ou carência de substratos necessários à
eritropoiese (NAOUM; NAOUM, 2018). Estes dois tipos são bem visualizados no
eritograma.
Os principais sinais de anemias regenerativas são: anisocitose, macrocitose,
reticulocitose, policromatofilia, presença de pontilhado basófilo, corpúsculos de
Howell-Jolly e metarrubrócitos. Na veterinária as espécies, especialmente cães, gatos
e saúinos, diferem na sua resposta regenerativa e estas diferenças devem ser levadas
em consideração para determinar se uma anemia é regenerativa ou não (NAOUM;
NAOUM, 2018). Nessas espécies, a medula óssea ativa libera muitas células
imaturas, principalmente reticulócitos/policromatófilos, no sangue periférico. Dessa
forma, a contagem de reticulócitos é útil para estabelecer se a resposta é regenerativa
ou não (SOARES et al, 2016).

7
Em equinos a medula óssea normalmente não libera reticulócitos no sangue
periférico. Assim, nessa espécie, reticulocitose/policromatofilia não são observados
como resposta regenerativa. Em casos muito raros de perda de sangue aguda ou
anemia hemolítica, alguns poucos policromatófilos e metarrubrócitos podem ser
encontrados no sangue (SOARES et al, 2016).
A medula óssea equina também pode liberar macrócitos normocrômicos.
Macrócitos são os glóbulos vermelhos jovens (maiores do que as hemácias maduras)
que se coram como células maduras (normocrômicos). Este geralmente é o único
sinal de regeneração em cavalos anêmicos e quando muito numerosos podem
aumentar o RDW e VGM. Hemogramas seriados e o exame da medula óssea podem
ser utilizados para avaliar o grau de regeneração eritróide e determinar se a anemia é
ou não regenerativa. Entretanto, o mielograma, por ser um exame invasivo, não é
utilizado na rotina de avaliação da resposta eritróde regenerativa (SOARES et al,
2016).
Em ruminantes os reticulócitos/policromatófilos também não são observados
no sangue periférico de animais saudáveis. Nessas espécies, em animais com
severas anemias hemorrágicas ou hemoliticas, a resposta reticulocitária é pequena.
Sendo assim, a quantificação de reticulócitos não fornece informações adicionais para
avaliar se a anemia é regenerativa ou não (SOARES et al, 2016).
Outra classificação das anemias, diz respeito ao mecanismo patofisiológico:
hemorrágicas, hemolíticas, por deficiência de ferro, doenças inflamatórias, doença
renal crônica. Anemias hemorrágicas - São comuns em animais. Elas ocorrem devido
à perda de sangue de forma aguda ou crônica, podendo ser externa ou interna. Podem
ocorrer devido a traumas, perda excessiva de sangue em procedimentos cirúrgicos,
defeitos hemostáticos, intoxicação por anticoagulantes, entre outras situações
(ALMEIDA; SOARES; WARDINI, 2016; FEREIRA et al, 2017). Anemias hemolíticas -
Anemia hemolítica ocorre devido à destruição (lise) anormal e excessiva das
hemácias de maneira intravascular (no interior dos vasos sanguíneos) ou
extravascular (FERREIRA et al, 2017). Anemias por deficiência de ferro - Ocorre
quando o ferro torna-se limitante para a eritropoiese. O ferro é um componente
essencial do grupo heme da hemoglobina e, na sua ausência, a hemoglobina não
pode ser produzida em quantidades suficientes. A sua deficiência pode resultar em
uma anemia microcítica e hipocrômica (ALMEIDA; SOARES; WARDINI, 2016;
FEREIRA et al, 2017). Anemia de doenças inflamatórias - Na atualidade, o câncer, a

8
doença hepática e a doença gastrointestinal são consideradas doenças crônicas e
inflamatórias que podem comprometer a eritropoiese, levando a uma anemia
chamada de anemia de doenças inflamatórias por serem mediadas por citocinas
inflamatórias, mesmo que não haja evidência clínica ou laboratorial de inflamação no
animal (ALMEIDA; SOARES; WARDINI, 2016). Anemia da doença renal crônica - A
insuficiência renal crônica (IRC) é a doença renal mais comum em cães e gatos
idosos. Esta síndrome é caracterizada pela incapacidade de funcionamento dos rins
devido à perda progressiva dos néfrons, dentro de um período de meses a anos. Na
IRC também é relativamente comum o desenvolvimento de anemia normocítica,
normocrômica (arregenerativa), que muitas vezes favorece a manifestação de
letargia, fraqueza muscular, anorexia e perda de peso. O fator principal do
aparecimento da anemia na IRC é a diminuição da síntese de EPO pelos rins
(ALMEIDA; SOARES; WARDINI, 2016).

3.3 Hematologia veterinária e parâmetros hematológicos

A hematologia não é recente, desde 1910, o pioneiro Burnett decifrou o sangue


de várias espécies de animais domésticos. Na mesma época, foi confirmado que o
hemograma dos processos inflamatórios em equinos é caracterizado por leucocitose
e neutrofilia e que na reticulite traumática nos bovinos pode ocorrer neutrofilia absoluta
com contagem de glóbulos brancos normais.
Na rotina clínica de animais caseiros como cães e gatos, a hematologia como
meio semiológico é importante para a determinação do perfil hematológico desses
animais porque auxilia no estabelecimento do diagnóstico, prognóstico e
acompanhamento da saúde, além de se ter informações sobre o estado clínico geral
do animal (RIBEIRO et al, 2018).
Diversos estudos baseados no perfil hematológico de felinos domésticos são
publicados, principalmente no que se refere a avaliações hematológicas em gatos não
sadios, como os infectados com o Vírus da Leucemia Felina (FeLV) (ALMEIDA;
SOARES; WARDINI, 2016; FEREIRA et al, 2017). Tesser et al, (2016) afirmam que a
interpretação do hemograma é delicada, devido a variações que ocorrem devido à
idade, raça, alimentação, manejo, condições geográficas e habitacionais, e estado
fisiológico do animal. Além disso, fatores comportamentais, como o estresse agudo,
podem desencadear respostas humorais que alteram a concentração das células

9
sanguíneas dos felinos, com diminuição do CHGM, aumento no número total de
eritrócitos, hematócrito, plaquetas e de leucócitos totais (FAM et al, 2020).
Para adequado entendimento dos exames hematológicos, é indispensável a
comparação dos resultados alcançados com os valores de referência estabelecidos
para cada espécie (LIMA et al., 2015). Entretanto, a maioria dos valores de referência
disponíveis na literatura é de autores estrangeiros, o que dificulta o adequado
entendimento dos resultados (GONZÁLES et al, 2021; TESSER et al, 2016). Assim,
os principais exames hematológicos utilizados nas clínicas de pequenos animais são:
Hemograma Completo: Esse exame analisa todas as informações mais
importantes sobre o sangue, como as hemácias (células vermelhas), leucócitos
(células brancas), proteínas e plaquetas.
Eritrograma: Analisa o número, tamanho, cor e formato das hemácias,
hematócrito (massa das hemácias), concentração de hemoglobina, contagem de
reticulócitos (hemácias jovens) e a presença de parasitas.
Plaquetograma ou Trombograma: Realiza a contagem de plaquetas, elementos
muito importantes para o processo de coagulação sanguínea.
Leucograma: Realiza a contagem do número total de leucócitos (células de
defesa do corpo) e os valores individuais dos diferentes tipos. Assim, as principais
doenças hematológicas (sanguíneas) de cães e gatos são:
Anemia Hemolítica Imunomediada (AHIM): Por definição, anemia é a redução
do número de hemácias, hemoglobina, ou ambas, no sangue. A AHIM é uma anomalia
causada pelo sistema imunológico do cão, que passa a atacar as próprias hemácias
do organismo, resultando em hemólise (destruição das hemácias). Pode ser causada
pela produção indevida de anticorpos contra as hemácias ou pela alteração da
estrutura externa dessas células devido a toxinas, agentes infecciosos ou câncer. O
animal apresentará gengivas pálidas, frequência respiratória aumentada, pode se
cansar facilmente, desmaiar ou ficar desorientado por conta da baixa oxigenação do
cérebro. Algumas raças como Cocker Spaniel Americano, Poodle, Sheepdog, Shih-
tzu e Maltes são mais suscetíveis a essa doença.
Babesiose: Transmitida pelo carrapato, é causada pelo
protozoário Babesia. Esse microrganismo invade e causa a destruição das hemácias
dos cães, resultando em anemia. Os cães podem apresentar fraqueza, febre,
linfonodos aumentados, gengivas pálidas e urina escurecida.

10
Erliquiose: Também transmitida pela picada do carrapato, é causada por
bactérias do gênero Ehrlichia. Essas bactérias invadem as células de defesa do
organismo, podendo causar febre, linfonodos aumentados, dificuldade respiratória,
hemorragias, anemia e até problemas neurológicos.
FIV: Sigla para Vírus da imunodeficiência Felina, ataca o sistema imunológico
do gato, de forma semelhante ao vírus HIV humano. É transmitido normalmente por
brigas, reprodução ou contato entre a mãe infectada e seu filhote. Por conta de o
sistema imune estar prejudicado, o animal se torna suscetível a contrair diversas
outras infecções. Alguns sintomas são febre, anemia, linfonodos aumentados e perda
de peso e apetite.
FeLV: Sigla para Vírus da Leucemia Felina, inibe o sistema imunológico do gato
e é uma das causas mais comuns de morte de gatos domésticos. Assim como a FIV,
predispõe o animal a outras doenças e é transmitido pelo contato com os fluidos
corporais de gatos infectados, como saliva, sangue ou urina. Causa febre, perda de
peso, linfonodos aumentados, anemia e pode predispor a linfoma, um câncer no
sistema linfático.
O hemograma é a ferramenta utilizada para avaliar o tecido sanguíneo e seus
componentes como auxilio diagnóstico para doenças hematológicas e sistêmicas e é
composto pela avaliação do eritrograma, leucograma e plaquetograma, sendo os
dados obtidos de forma manual ou automatizada, fornecendo resultados quantitativos
e qualitativos (SOARES et al, 2016).
O eritrograma é a parte do exame hematológico que corresponde a avaliação
de eritrócitos sanguíneos, contemplando os seguintes parâmetros: número total de
eritrócitos, dosagens de hemoglobina e hematócrito e índices hematimétricos (Volume
Globular Médio [VGM] e Concentração de Hemoglobina Globular Média [CHGM]),
assim como o exame microscópico da morfologia eritrocitária (NAOUM; NAOUM,
2018).
Dentre os índices hematimétricos, o VGM ainda é o mais usualmente utilizado
na avaliação das anemias, associado à análise das alterações na morfologia das
hemácias, que também pode fornecer informações interessantes no reconhecimento
de diversos tipos de anemia (GROTTO, 2009). Embora o CHGM também seja utilizado
para a avaliação das anemias, classificando-as de acordo com a quantidade de
hemoglobina presente nas hemácias, sendo hipocrômicas quando CHGM diminuídos,

11
normocrômicas quando CHGM estiver dentro dos parâmetros de referências e
hipercrômicas quando CHGM estiver aumentado (NAOUM; NAOUM, 2018).
O leucograma faz parte do hemograma e representa a avalição da série
leucocitária sanguínea, onde são realizadas as contagens total e diferencial (valores
relativos e absolutos) dos leucócitos e a avaliação morfológica dos mesmos
(SANTOS; SILVÉRIO; ÓRFÃO, 2015). A contagem diferencial dos leucócitos é
definida com a contagem individual das células que compõe a série leucocitária, como
os neutrófilos (segmentados e bastonetes), basófilos, eosinófilos, linfócitos e
monócitos (MAYA, 2018).
Por fim, o plaquetograma é constituído pela contagem total de plaquetas e
análise da sua morfologia (THRALL et al, 2015). As plaquetas têm a função de se
aderir as paredes dos vasos sanguíneos, assim evitando hemorragias. Nos animais a
colheita de sangue para a realização do plaquetograma precisa que ser realizada sem
trauma e/ou estresse para não alterar a contagem das plaquetas e podem ser
contadas de forma automática ou manual (LOPES et al, 2007; SOARES et al, 2016).

4 CONCLUSÃO

Se os olhos são o espelho da alma, o sangue é o espelho do corpo humano.


As células do sangue (hemácias, leucócitos e plaquetas), avaliados no hemograma,
são os principais indicadores de saúde de um organismo. Assim, a Hematologia
dedica-se justamente a decodificar estes componentes, analisando suas morfologia e
fisiologia em busca de alterações que possam sinalizar doenças ou problemas de
saúde.
Por isso, a hematologia estuda também os tecidos formadores de sangue, em
especial a medula óssea. Resultados anormais podem indicar a presença de uma
variedade de condições, incluindo as anemias, leucemias e infecções – muitas vezes,
antes mesmo que o paciente apresente os sintomas da doença. Nesse sentido, o
hemograma é considerado um dos exames com maior importância para avaliação da
saúde geral.
O hemograma é constituído pelas informações quantitativas (número total de
células, contagem diferencial, índices hematimétricos) e qualitativas (morfologia do
esfregaço sanguíneo). Uma interpretação adequada depende de ambos. As amostras

12
de sangue devem ser analisadas tão logo seja possível sua coleta, pois ocorrem
alterações morfológicas nos leucócitos dentro de horas.
Conclui-se que os exames de laboratório na clínica veterinária são mais
utilizados como auxílio diagnóstico subsidiário, por isso, podem fornecer muitas
informações úteis, mas, como todo exame diagnóstico, a avaliação inteligente dos
resultados é vital. Assim, com a evolução da hematologia veterinária, os diagnósticos
ficaram mais eficientes, favorecendo o tratamento de diversas doenças ligadas ao
sangue dos animais.
Ademais, a observação de um esfregaço obtido com uma simples gota de
sangue é essencial para a avaliação clínica dos pequenos animais, podendo gerar
informações importantes. Os sinais de regeneração, alteração do número de
leucócitos e os desvios à esquerda (resposta inflamatória), assim como a presença
de inclusões ou hemoparasitas são dados importantes para o diagnóstico.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA N. R.; SOARES L. C.; WARDINI A. B. Alterações clínicas e hematológicas


em gatos domésticos naturalmente infectados pelo Vírus da Leucemia Felina (FeLV).
Revista de Saúde, [s.l.], v. 7, n. 1, p. 27-32, 2016.

ARAÚJO, Vitor de Sousa. Perfil hematológico de gatos oriundos do projeto vida


digna da universidade federal rural da Amazônia, Belém, Pará, Brasil. Monografia
do curso de especialização em Medicina Veterinária, UFRA, Belém – PA, 2019.

FAM, A. L. P. D. et al. Alterações no leucograma de felinos domésticos (Felis catus)


decorrentes de estresse agudo e crônico. Revista Acadêmica: Ciências Agrárias e
Ambientais, v. 8, n. 3, p. 299-306, 2020.

FELDMAN, B. F.; ZINKL, J. G.; JAIN, N. C. Schalm’s Veterinary Hematology. 5. ed.


Lippincott: Willians & Wilkins, 2020.

FERREIRA, M. P. Hematologia. Revista Brasileira de hematologia e hemoterapia.


v. 35, n. 1. P. 41-244, 2015.

FERREIRA, R. F. et al. Perfis hematológicos, bioquímicos e proteína plasmática total


de gatos infectados com o Vírus da Leucemia Felina. Archives Of Veterinary
Science, [s.l.], v. 22, n. 4, p.111-115, 2017.

GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 2016.
GONZÁLES, F. H. D. et al. Perfil bioquímico sanguíneo de cães e gatos na cidade de
Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. Arquivos da Faculdade de Veterinária
UFRGS, v. 29, p. 1-6, 2021.

13
LAURINO, Felipe. Alterações hematológicas em cães e gatos sob estresse.
Trabalho de Conclusão de Curso em Medicina Veterinária. Universidade Júlio de
Mesquita Filho. Botucatu, SP. 2019.

LESSA, C. R; NEVES, S. M; ROCHA, A. A. Doença falciforme: Diagnóstico diferencial


por biologia molecular. Revista Científica da FASETE, 2016.

LOPES, S. T. A. et al. Manual de patologia clínica veterinária. 3.ed. UFSM-CCR.


Departamento de clínica de pequenos animais, 2017.

MAYA, G. C. Utilidad Del extendido de sangre periférica: los leucócitos. Medicina &
Laboratorio, [s.l.], v. 14, n. 9-10, p. 411-455, 2018.

MOREIRA, Gisele Fabris, et al. Aspectos Fisiológicos da Atividade Física em


Portadores de Anemia Falciforme. Monografia, UNIFESP/EPM, 2017.

NAOUM, P. C.; NAOUM, F. A. Hematologia Laboratorial - Eritrócitos. 2. ed. São


José do Rio Preto: Academia de Ciências e Tecnologia, 2018.

RIBEIRO, M. M. et al. Perfil hematológico de caninos recém-nascidos do município de


São Luís – Maranhão. PUBVET, Londrina, v. 12, n. 1, p.1-5, jan. 2018.
SANTOS, L. A.; SILVÉRIO, A. S. D.; ORFÃO, L. H. Perfil leucocitário de uma
população do sul de Minas Gerais. Revista da Universidade Vale do Rio Verde, Três
Corações, v. 13, n. 1, p.506-513, 2015.

SILVA, Malena Noro. Hematologia veterinária. Belém: UFPA, 2017.


SOARES, B. F. et al. Estudo comparativo entre o hemograma humano e veterinário.
Ensaios e Ciência: Ciências Biológicas, Agrárias e da Saúde, [s.l.], v. 16, n. 4, p.87-
100, 2016.

TESSER, S. et al. Perfil hematológico de cães e gatos na cidade de Bento Gonçalves,


Rio Grande do Sul, Brasil. Arquivos de Ciências Veterinárias e Zoologia da
UNIPAR, Umuarama, v. 19, n. 1, p. 47-52, jan./mar. 2016.

THRALL, M. A et al. Hematologia e bioquímica clínica veterinária. 2. Ed. Rio de


Janeiro: Guanabara Koogan, 2015.

14

Você também pode gostar