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SISTEMA UNICO DE SAUDE SUS

Sistema Único de Saúde

Criado pela Constituição Federal de 1988, o Sistema Único de Saúde (SUS) completa 30 anos de
existência em 2018. Considerando que cerca de 80% da população brasileira hoje é dependente dos
serviços do SUS, a crise econômica atual é preocupante. A combinação de contextos restritivos e
políticas de austeridade e contenção da despesa pública, inclusive com a saúde, podem colocar em
risco os avanços conquistados e o direito à saúde para a maioria da população brasileira (DONIEC;
DALL’ALBA; KING, 2016).

Ao difundir o conhecimento epidemiológico aplicável às ações de vigilância, de prevenção e de con-


trole de doenças e agravos de interesse da Saúde Pública, oferecendo análises e avaliações dos
serviços oferecidos pelo SUS, o periódico Epidemiologia e Serviços de Saúde (RESS) desempenha
um importante papel em prol do aprimoramento e do fortalecimento do sistema de saúde brasileiro. A
RESS segue em sua missão e apresenta uma mostra do que vem sendo produzido pelas pesquisas
no campo da epidemiologia no Brasil.

O artigo de opinião de autoria de Draurio Barreira, pesquisador da Unitaid (Fundo Internacional para a
Compra de Medicamentos), intitulado “Os desafios para a eliminação da tuberculose no Brasil”, versa
sobre esta que é considerada a doença infecciosa mais letal da atualidade. Barreira comenta a pro-
posta ousada da estratégia da Organização Mundial da Saúde sob o título “End TB”, que tem como
meta a eliminação da epidemia global de tuberculose até 2035.

A “End TB” implica que os governos assumam a responsabilidade de garantir o acesso universal aos
serviços de saúde, bem como de investir em inovação e pesquisa para aperfeiçoar e introduzir novos
instrumentos capazes de acelerar o diagnóstico e tratamento dos casos da doença. Graças à articu-
lação de políticas públicas de proteção social, como o Sistema Único de Saúde (SUS) e o Programa
Bolsa Família (PBF), o Brasil atingiu as metas dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM)
antes do prazo estabelecido.

Entre os artigos originais, Ribeiro e colaboradores em “Microcefalia no Piauí, Brasil: estudo descritivo
durante a epidemia do vírus Zika, 2015-2016”, descrevem a ocorrência e as características de um
surto de microcefalia em nascidos vivos no Piauí, a partir de setembro de 2015. Os achados fortale-
cem a hipótese de possível vínculo entre a doença do vírus Zika e os casos de microcefalia.

Os casos foram detectados via diagnóstico clínico e de imagem, com registro nos sistemas de infor-
mações em saúde oficiais, a despeito das dificuldades para se fechar um diagnóstico via exames
laboratoriais.

Observou-se aumento da ocorrência de casos de microcefalia a partir de setembro de 2015, com pico
em dezembro de 2015, em que a prevalência chegou a 91,6/10 mil nascidos vivos, segundo dados do
Registro de Eventos em Saúde Pública (RESP). O estudo faz um alerta sobre a baixa qualidade do
atendimento pré-natal realizado atualmente no Brasil, em particular no Nordeste, sugerindo a inclusão
da pesquisa de infecção pelo vírus Zika no pré-natal.

No artigo “Concordância da causa básica e da evitabilidade dos óbitos infantis antes e após a investi-
gação no Recife, Pernambuco, 2014”, Marques e outros autores realizaram a investigação e a reclas-
sificação dos óbitos infantis, de acordo com os critérios de evitabilidade. Constatou-se que nove em
cada dez óbitos foram considerados evitáveis por intervenções do SUS, e aproximadamente, 70%
dos óbitos poderiam ter sido prevenidos se houvesse adequada atenção à mulher na gestação.

Os autores afirmam que a vigilância do óbito infantil contribuiu para uma melhor especificação das
causas básicas, redirecionando as causas intermediárias registradas nas declarações de óbito e
classificando corretamente a evitabilidade das mortes infantis. Assim, o artigo ressalta a importância
das ações de vigilância a adoção de uma estratégia de monitoramento com vistas à evitabilidade de
óbitos redução da mortalidade infantil.

Este número conta, ainda, com um estudo de Cascaes, Dotto e Bomfim sobre as “Tendências da
força de trabalho de cirurgiões-dentistas no Brasil, no período de 2007 a 2014”, que de maneira opor-
tuna, preenche uma lacuna importante na produção científica sobre o tema na atualidade. Outro arti-
go que trata sobre o campo da saúde bucal é de Lemos, et al. e trata da “Cárie dentária em povos do
Parque Indígena do Xingu, Brasil, 2007 e 2013”. Diferentemente do que ocorre com os indicadores de
cárie dentária de abrangência nacional, que vêm apresentando declínio, a prevalência da cárie dentá-

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ria não tratada em crianças e adolescentes do Parque Indígena do Xingu manteve-se elevada entre
2007 e 2013. Os autores afirmam que, para melhorar essa situação, são imprescindíveis programas
de atenção à saúde bucal que promovam uma atenção odontológica oportuna às comunidades indí-
genas.

Observa-se que uma parcela expressiva dos artigos publicados na RESS aponta as desigualdades
sociais e regionais com importantes entraves para o alcance das metas de integralidade da atenção e
da assistência à saúde no Brasil.

Nesse sentido, Silva e colaboradores em “Mensuração de desigualdades sociais em saúde: conceitos


e abordagens metodológicas no contexto brasileiro”, discorrem sobre integra a série “Aplicações da
epidemiologia”, apresentando os principais métodos de mensuração e monitoramento das desigual-
dades sociais em saúde, a fim de identificar os grupos mais vulneráveis (ou menos favorecidos), que
deveriam receber prioridade em intervenções de saúde pública.

A partir da coletânea de artigos apresentada neste número da RESS, percebe-se a relevância da


produção científica no suporte e direcionamento das políticas públicas de saúde, ao oferecer dados,
informações e análises, além de propor soluções para melhorar o acesso a ações e serviços do SUS.
Contudo, esse objetivo só será plenamente alcançado com empenho da ação governamental, tanto
para fomentar esses estudos quanto para implementar as inovações.

As Raízes do SUS

Não se pode falar de Sistema Único de Saúde, sem antes tentar resgatar uma trajetória de, no míni-
mo, 30 anos atrás. O que hoje denominamos de SUS tem raízes profundas nos textos dos relatórios
das últimas Conferências Nacionais de Saúde, que de alguma maneira traduziram o que à época se
pensava.

O Ministro da Saúde, Wilson Fadul, em 1963, na III Conferência Nacional de Saúde já levantava a
bandeira da Municipalização dos Serviços de Saúde. O pensamento de uma reforma no Sistema de
Saúde foi crescendo. Tiveram papel preponderante no desenvolvimento destas novas idéias os De-
partamentos de Medicina Preventiva e Social de algumas Escolas Médicas. Com projetos especiais
foram criando uma nova mentalidade voltada à integralidade das ações de saúde, aos serviços hie-
rarquizados, com assistência integral às pessoas e outras premissas mais.

Algumas universidades, e aqui vale lembrar a Faculdade de Saúde Pública da USP, que dando res-
posta a uma proposta do então Secretário Estadual de Saúde de São Paulo, Walter Leser, iniciou
cursos de formação de uma nova leva de sanitaristas com outro tipo de visão da realidade. Igualmen-
te importantes foram os departamentos de Medicina Social da UNICAMP, da UERJ e a Escola Nacio-
nal de Saúde Pública da FIOCRUZ. Todos formadores de opinião e que levaram consigo ao pensa-
mento e luta inúmeros profissionais.

Surgiram movimentos organizados como o Cebes em 1976 que reuniu profissionais de Saúde das
mais diferentes áreas e iniciou uma discussão sobre um novo sistema de saúde. Outras associações
como ABRASCO, de Saúde Comunitária, a Associação dos Médicos Sanitaristas, Associação Paulis-
ta de Saúde Pública e outras formaram um corpo de pessoas lutando por um sistema de saúde mais
justo e igualitário.

Neste mesmo tempo movimentos populares como as Comunidades Eclesiais de Base, as Socieda-
des Amigos de Bairro e outras Associações de Moradores, Sindicatos de Trabalhadores, tomaram a
saúde como objeto de discussão em seus fóruns. Nisto, em 1976, assumem as prefeituras alguns
prefeitos, que colocaram como meta de seus governos voltarem-se para o social fugindo do modelo
então vigente de "Prefeituras tocadoras de obras". Estas Prefeituras, onde se destacam Campinas,
Niterói, Londrina, Rezende, São José dos Campos, Lages, montaram suas redes básicas de serviços
de saúde e seus serviços de emergência.

A maioria destes serviços se desenvolveu com ampla participação comunitária. Os recursos alocados
por estas Prefeituras na área de Saúde foram recursos próprios, sem nenhuma ajuda dos governos
federal ou estaduais. Foi o único dinheiro novo que se colocou na saúde nos últimos anos, indepen-
dente de qualquer reforma fiscal. Foi uma resposta formal dos administradores municipais às neces-
sidades da população diante de governos estaduais e federal que praticamente deixaram de expandir
seus serviços.

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Este corpo de idéias e práticas foi crescendo até se constituir numa proposta mais acabada que se
denominou PROPOSTA DA REFORMA SANITÁRIA. Esta proposta foi "emprestada" a Tancredo Ne-
ves e passou a ser denominada de proposta da Nova República para a área da Saúde.

Como se não bastasse a legitimidade da proposta pela sua origem de baixo para cima, através dos
vários atores acima citados, houve a consagração máxima na VIM Conferência Nacional de Saúde.
Administradores, profissionais e comunidade clamaram por mudanças radicais no nosso sistema de
saúde e fecharam a grande proposta que foi sacramentada na Constituição Brasileira e sua Lei Orgâ-
nica da Saúde.

Paralelamente a isto, iniciativas governamentais tentavam algumas propostas de alteração do Siste-


ma Único de Saúde. Umas ficaram no projeto preliminar no papel. Outras foram incrementadas como
em 1974 o Plano de Pronta Atenção que abriu as portas aos vários convênios de atendimento para
que este fosse mais universalizado e ágil. Depois, veio o Pró-Saúde que não chegou a ser implemen-
tado e foi logo sucedido pelo Prev-Saúde em sua dezena de versões mas que não chegou a aconte-
cer.

O CONASP, plano de menos ambição veio logo a seguir implantando a era das Ações Integradas de
Saúde e a Autorização de Internações Hospitalares em substituição à GIH, que tanto foi criticada pela
chance fácil de fraude.

Gentile dizia que o pagamento por US (como era no tempo da GIH) era fonte perene de corrupção,
pois dava chance quase que aberta, como um convite à fraude. Depois das AIS em 1983, veio o
SUDS em 1987. O SUDS era uma proposta de se unificarem as três esferas de governo pelo menos
enquanto a Constituição não decretasse e fizesse nascer o SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE, o SUS.
Não fosse a questão da necessidade de regulamentação, que só foi acontecer com a Lei Orgânica da
Saúde no final de 1990, hoje já teríamos contado com 5 anos de implantação do SUS.

O Nascimento do SUS

A constituição de 1988 trouxe inúmeras conquistas ao setor saúde, tanto direta como indiretamente.
Alguns princípios gerais consagrados nela são essenciais ao Sistema Único de Saúde. Cito apenas
três deles: a autonomia dos Estados e Municípios ainda que pertencentes a um Estado federado; o
princípio consequente da descentralização que rompe com toda a tradição ditatorial militar que en-
frentamos durante 25 anos; a valorização da cidadania puxando pela participação popular como me-
canismo de controle da sociedade como um todo, tanto do público como do privado.

Além destas questões gerais ainda temos uma outra questão que guarda especificidade com a saú-
de, mas em conjunto com a previdência e a assistência social. Foi o conceito assumido de Segurida-
de Social em seu todo, onde estes três setores se juntam e são financiados pelas mesmas fontes de
receita, e guiaram os mesmos princípios da igualdade, da universalidade, etc.

Passamos do conceito de previdência para aqueles que contribuem (incluindo benefícios, assistência
médica e social), para o conceito mais amplo de direitos de cidadania, extensível a todos os cidadãos
brasileiros, sem discriminação.

Na questão específica da saúde os avanços foram enormes. A saúde passa a constituir na Constitui-
ção toda uma Secção com vários artigos, o que não ocorrera nas Constituições anteriores. Isto repre-
sentou a grande revolução da saúde. Estes princípios foram melhor explicitados nas Leis 8080 e
8142.

Os princípios norteadores do Sistema Único de Saúde são os seguintes:

- Saúde como direito de todos e dever do Estado, ainda que se conte com a cooperação dos indiví-
duos, das famílias, da sociedade e das empresas;

- universalidade e equidade do acesso;

- fim da dicotomía entre promoção, prevenção, assistência e reabilitação, com ênfase na prevenção;

- integralidade na assistência ao indivíduo;

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- gratuidade;

- descentralização com gestor único em cada esfera de governo;

- participação complementar do privado, com preferência para os filantrópicos e os sem fins lucrati-
vos, ainda que a atividade privada seja livre, sob controle do Estado;

- ênfase em algumas áreas como saúde do trabalhador, vigilância epidemiológica, sanitária, alimen-
tação e nutrição, portadores de deficiência;

- participação comunitária efetiva através dos Conselhos de Saúde e das Conferências de Saúde.

- financiamento tripartite entre a União, Estados e Municípios e através dos recursos da Seguridade
Social.

Estes são alguns dos princípios filosóficos e operacionais do Sistema Único de Saúde.

Muita confusão inconsciente ou premeditada tem sido feita em relação ao SUS. A situação caótica
em que vive o setor saúde neste momento, leva a que muitas pessoas e mesmo autoridades atribu-
am isto ao SUS. Pelo que foi descrito acima podemos chegar à conclusão de que o SUS ainda não
existe, não conseguiu sair do papel.

Não se pode responsabilizar pelo CAOS aquilo que nem aconteceu. Numa análise realista, podemos
buscar em pelo menos trinta anos de descaso com o social, a verdadeira causa do que aí está. O
SUS é a resposta que brotou da sociedade, de baixo para cima, até se legitimar dentro da Constitui-
ção, para se criar o novo e trazer uma solução para a crise.

O Cenário Atual

A todos que vivemos diuturnamente a questão saúde em nosso país, preocupa sobremaneira o mo-
mento presente. Nunca estivemos em situação tão difícil e com chances de saída tão estreitas. O
investimento em saúde decrescente. A universalização do atendimento. A miséria atingindo a 32 mi-
lhões de brasileiros.

O descontrole acumulado de quase uma década de transição na busca de saídas viáveis, não politi-
camente assumidas pelos que dirigiram o país. Tudo isto e muito mais alicerçou o atual cenário em
que vivemos.

Os reais componentes do caos na saúde aí estão:

1. Aumento da demanda: universalização, desemprego e baixos salários, tornando proibitivo o uso de


sistemas complementares.

2. Agravamento da demanda, desemprego, miséria, pobreza e fome gerando mais doenças e agra-
vando as existentes.

3. Encarecimento da assistência: incorporação desordenada de equipamentos, medicamentos e es-


pecialização precoce e errônea dos profissionais de saúde.

4. Queda real do financiamento em proporção às necessidades sentidas e acumuladas.

As consequências não ficam restritas ao setor saúde. Elas se estendem pelo dia a dia num compro-
metimento total do meio ambiente e todos seus componentes em que vive o homem brasileiro. As
doenças infecto-contagiosas se multiplicam, as epidemias surgem incontroláveis. As novas causas de
morbi-mortalidade estão aí como os acidentes de trânsito, os acidentes de trabalho, a violência urba-
na e rural.

O SUS Como a Saída...

A sociedade tem que perceber que existe uma saída legal para tudo isto que aí está. Ela foi descrita
acima como preceito constitucional. Ainda não aconteceu, não se implantou. É necessário que, num
esforço coletivo, se busque a saída via implantação do SUS.

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A atual equipe dirigente do Ministério da Saúde, tendo à frente o Ministro Jamil Haddad e o Presiden-
te do INAMPS, Carlos Mosconi, desde que assumiu, fez um compromisso com a sociedade: VAMOS
IMPLANTAR O SUS.

Vamos CUMPRIR E FAZER CUMPRIR A LEI. A vontade política, que até então não existia entre os
dirigentes máximos da saúde, se mostra agora férrea. A decisão foi tomada e as providências se
encaminham desde dezembro de 1992. Numa atitude democrática, ao invés de, de pronto, lançarem
um novo programa através de Diário Oficial, tomaram o partido de discutir amplamente com todas as
forças sociais envolvidas.

Algumas centenas de reuniões foram realizadas pelo Brasil afora debatendo OS CAMINHOS, para
que se aperfeiçoasse o documento e houvesse adesão das instituições e da sociedade à forma de se
implantar o SUS. Finalmente após duas reuniões com o Conselho Nacional de Saúde que apresentou
propostas e sugestões numa primeira vez e posteriormente aprovou o documento com as modifica-
ções já realizadas, parte-se para a concretização da proposta.

O título do documento apresentado pelo Ministério da Saúde é: "A DESCENTRALIZAÇÃO DAS


AÇÕES E SERVIÇOS DE SAÚDE - A OUSADIA DE CUMPRIR E FAZER CUMPRIR A LEI". Este
documento não pretende inventar nada, acrescentar nada aos princípios constitucionais, apenas os
relembra. O inovador da proposta reside na coragem de tentar um caminho para que o SUS aconte-
ça. Sua discussão reside no COMO vamos concretizar aquilo que já é preceito legal.

A síntese da proposta é sair do sistema centralizado em que o INAMPS compra serviços em cada
rincão deste país, inclusive, inconstitucionalmente, até do sistema público.

Como descentralizar rapidamente num país de extensão continental, com as 27 realidades diferentes
de cada Estado brasileiro e mais de cinco mil municípios? A proposta prevê situação de processo
como a saída mais sensata. O processo vai se dar de maneira gradual, adequando-se a cada reali-
dade local, possibilitando que, num retrato, daqui há alguns meses possamos visualizar municípios e
Estados em situações diferentes mas, todos a caminho de urna gestão plena em sua esfera de go-
verno.

De uma situação incipiente, parte-se para uma descentralização parcial, depois semiplena e plena.
Na incipiente os municípios passam a ampliar seu nível de gerenciamento: unidades próprias, unida-
des estaduais locais, cadastramento dos vários serviços de saúde existentes, autorização de contra-
tos novos, montagem de sua equipe local de planejamento, avaliação e controle.

Numa segunda fase, a parcial, ele assume os contratos com os serviços privados complementares e
avaliação completa de todos os serviços de saúde existentes. Na plena temos uma gestão plena.

Cada uma destas fases terá um modelo de financiamento. Nas três primeiras ainda o teto será aquele
de produção de serviços, através de série histórica corrigida, levando-se em conta o critério populaci-
onal.

Ao atingirmos a fase plena o critério possivelmente será outro, podendo-se mesmo, à época, dispor
de condições e dados fidedignos para se regulamentar o art. 35 da 8080. A grande novidade do fi-
nanciamento é que a partir da fase parcial os recursos serão utilizados pelos municípios num sistema
de "vasos comunicantes" entre os recursos alocados para atividades ambulatoriais (SIA-SUS) e aque-
les alocados para as internações (SIH-SUS).

Este salto levará a que os municípios, administrando a totalidade de recursos poderão utilizá-los de
acordo com as suas prioridades, modificando o modelo assistencial e sendo beneficiados pela admi-
nistração de possíveis saldos da conta AIH economizada pela maior ênfase nas atividades promocio-
nais e preventivas em saúde. Na fase parcial, os recursos serão administrados mediante crédito. Na
semiplena e na plena, os recursos serão previamente repassados em espécie, no sistema de transfe-
rências intergovernamentais fundo a fundo.

Os pré-requisitos para que isto aconteça serão basicamente aqueles da Lei 8142, onde se exige de
cada esfera de governo a existência de Conselho de Saúde, Fundo de Saúde, participação com re-
cursos próprios como contrapartida, um plano de saúde, um relatório de gestão e o compromisso de
investir em recursos humanos através de um plano de cargos, carreira e salários. Tudo devidamente
amarrado nos princípios constitucionais e na Lei Orgânica da Saúde.

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Para que tudo isto seja viável, na introdução do documento abre-se uma discussão sobre alguns pon-
tos fundamentais sobre os quais devemos trabalhar para que este modelo de descentralização dê
certo. Não basta descentralizar para sairmos do caos. Existem princípios da lei que são essenciais
para que o SUS aconteça.

As Grandes Batalhas do Momento Atual

Para que o SUS saia das leis para a realidade devemos estar todos lutando para vencer algumas
batalhas que serão, se não vencidas, os verdadeiros empecilhos na concretização do SUS.

O Financiamento do SUS

Impossível pensarmos um concretizar o SUS sem que, urgentemente discutamos com a sociedade a
questão do financiamento do SUS. Com financiamento decrescente e custo crescente a matemática,
de antemão, garante que não vai dar certo. O que aconteceu nos últimos anos é que os princípios
constitucionais do financiamento do SUS não se concretizaram.

A primeira falha existente é o baixo investimento do governo federal em saúde (menos de 1% de seu
orçamento fiscal), ainda que tenha ficado claro na Constituição que cada esfera de governo deva
colocar recursos fiscais para sustentar o orçamento da Seguridade Social. A segunda falha é em
relação aos demais componentes de receita da Seguridade Social.

O que todos nós pensávamos, quando da implantação da idéia de Seguridade Social, é que o Orça-
mento da Seguridade Social fosse se constituir num grande fundo onde três parceiros iriam buscar
recursos indiscriminadamente de acordo com os percentuais históricos de sua necessidade (Saúde
30%, Previdência 65% e Assistência Social 5%). Isto não se deu. A fonte de contribuição de empre-
gados e empregadores foi mais destinada à previdência ficando a saúde com apenas 15% dela.

A fonte questionada (dinheiro podre) do FINSOCIAL foi mais alocado à saúde numa proporção de
mais de 50%.

E assim por diante. Quem definiu assim? baseado em que princípios? De outro lado quem deveria
administrar este fundo e distribui-lo seria o Conselho Nacional da Seguridade Social, mas isto não
aconteceu e quem administra é o Ministério da Previdência que se acha na autoridade de reter per-
centuais da saúde e de até mesmo, publicamente, anunciar que nos próximos meses não repassará
nada da contribuição de empregados e empregadores à saúde.

Acima do bem e do mal, e da própria constituição! Isto confirma o que sabíamos: a fragilidade do
setor saúde sempre contabilizado à conta das despesas e não do maior dos investimentos: a vida e
saúde do homem. Nunca a saúde gozou de prestígio e sempre foi deixada para trás nas negociações
essenciais.

A última novidade por mim "cantada" há meses atrás está para acontecer: recursos do FINSOCIAL
pagos por nós cidadãos, pois incluídos em todas as planilhas de custo e sonegados ou recolhidos em
juízo pelos empregadores, são alvo hoje de negociação com estes mesmos empregadores para aba-
terem nos recolhimentos atuais. Mais uma grande negociata se instaura neste país: recolher dos con-
tribuintes e consumidores, questionar a validade na justiça e se apropriar destes recursos como se
próprios fossem!!!

Uma terceira questão: a alocação de uma série de despesas outras que antes nunca tinham sido
alocadas em saúde, para usufruírem das receitas da seguridade social, transformando nossos insufi-
cientes 30% em praticamente apenas 20%. Foi assim que nos últimos anos se colocou na conta da
saúde recursos para o IBAMA, CIACs, Hospitais Universitários, Sistemas de Saúde próprios dos tra-
balhadores federais de outros ministérios, saneamento básico do Ministério de Ação Social e outros.

A quarta questão: os recursos fiscais de Estados e Municípios não estão entrando suficientemente na
conta. Os municípios que assumiram sua responsabilidade têm investido até 30% de seus orçamen-
tos próprios em saúde. Outros Estados e municípios, ao receberem recursos federais deixam quase
que automaticamente de recolher seus próprios recursos.

Aí estão as causas principais da falta de recursos. Some-se a isto o estado de desobediência civil em
que se mergulha a sociedade que não confia no governo: para cada cruzeiro arrecadado deixa-se de

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arrecadar 1,2 cruzeiros. No FINSOCIAL a sonegação é mais vergonhosa: para cada cruzeiro arreca-
dado deixa-se de arrecadar 2,8 cruzeiros!!!...

A saída financeira depende de aumento dos recursos pelas vias acima descritas e um melhor apro-
veitamento dos poucos e parcos recursos existentes.

A corrupção tem consumido, por estimativa, entre 30 e 40% dos recursos. Ainda se perde por mau
uso, por uso indevido, por um modelo assistencial inadequado, por baixo investimento em recursos
humanos (encarece a assistência pelo descompromisso de horário, tarefa, uso errado de equipamen-
tos e medicamentos, etc., etc.).

O Modelo Assistencial

Tem que haver uma grande discussão envolvendo a sociedade, os profissionais de saúde e os admi-
nistradores dos serviços de saúde sobre o modelo assistencial que estamos praticando.

Toda vez que se levanta esta questão os patrulheiros de plantão se enchem de uma santa indignação
e bradam que isto é defender uma medicina de pobre para pobre e de rico para rico. Isto é nivelar por
baixo. Nada melhor para arrefecer os ânimos que buscar subsídios em dados concretos.

A medicina cujo modelo teimamos em imitar, a norte-americana, tem gasto 3.250 dólares "per capita"
só em saúde (quase o dobro de nosso PIB "per capita"...) e ainda deixa sem assistência 40 milhões
de norte-americanos.

Nem de longe, no computo mundial, figura ele como o melhor tipo de assistência. Há países do mun-
do fazendo melhor medicina e gastando a metade destes recursos "per capita", como o Canadá.

E nós? Podemos colocar os pés no chão e ver o modelo que nos é possível enquanto tivermos pouco
mais de 2000 dólares "per capita" para cuidar de todas as nossas necessidades: alimentação, trans-
porte, habitação, educação, vestuário, cultura, lazer, etc., etc.?

Teimaremos ainda por muito tempo em lutar contra um modelo: hospitalocêntrico, medicamentaliza-
do, baseado em especialistas e equipamentos sofisticados (alguns deles proibidos ou fora de uso em
seus países de origem)? Corremos o risco de não discutirmos isto urgentemente com nossos conci-
dadãos e cristalizarmos, aí sim, uma medicina para pobres e outra para ricos, esta financiada por
cidadãos de segunda categoria.

O modelo que defendemos é aquele que se mostre mais resolutivo e que seja social e tecnicamente
aceito pela sociedade e que possa ser sustentado pela nossa economia. Sem estes três componen-
tes qualquer modelo que buscamos não terá a mínima chance de ser universalizado e buscar a equi-
dade que nada mais é que a justiça.

Os Recursos Humanos

Neste componente reside o grande problema atual da saúde e de outro lado o único caminho para se
chegar à solução.

O quadro enfrentado é de profissionais insatisfeitos devido à má remuneração e falta de condições de


trabalho. Muitos deles despreparados, com especialização precoce e inadequados ao desempenho
de suas funções principalmente nos serviços básicos de saúde. Ainda resta uma questão principal: o
conhecimento de nossa realidade, das propostas do setor saúde, do seu inserir-se na sociedade, de
seu comprometimento com as pessoas e com a sociedade.

O modelo liberal sonhado na infância, no vestibular e na faculdade nada tem a ver com a realidade do
dia-a-dia de nosso país. Além da decepção, alguns se enchem de revolta que é descarregada no
próprio exercício profissional.

O novo modelo assistencial pretendido pelo SUS tem em seu bojo a proposta de envolvimento dos
profissionais de saúde, valorizando seu trabalho através de um Plano de Cargos, Carreira e Salário
justo, com aprimoramento continuado não só no campo do conhecimento médico, mas na parte filo-
sófica de um sistema de saúde e nas relações humanas que levem ao comprometimento de todos
com a sociedade.

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O Controle Social

A Constituição é rica em defesa da participação dos cidadãos e em garantir-lhes inúmeros direitos,


como co-partícipes de nossa nação.

Cada dia nos convencemos mais que a cidadania é o maior direito, que temos todos a defender. É a
situação que primeiro nos iguala a todos, independente de qualquer outro predicado. Transitoriamen-
te trabalhadores, transitoriamente profissionais, mas sempre CIDADÃOS.

Os mecanismos constitucionais de participação da sociedade e do exercício do controle social são


genéricos e específicos. Os genéricos estão em medidas judiciais como o mandato popular e outros,
a defesa do consumidor, com seu código posterior, o direito a informações, o uso do legislativo como
um todo e de suas várias comissões.

Para a área específica de saúde foram garantidos três outros mecanismos específicos. O Ministério
Público que tem que zelar pelos setores considerados de relevância pública e foi só a saúde que
conseguiu esta qualificação na Constituição.

Os Conselhos de Saúde com sua formação paritaria: de um lado cidadãos usuários e de outro admi-
nistradores, prestadores e trabalhadores de saúde, com seu caráter deliberativo e sua competência
inclusive na auditoria financeira. Para auscultar a comunidade criou-se o grande fórum que são as
Conferências de Saúde, municipais, estaduais e nacional.

Estes mecanismos todos precisam ser divulgados e utilizados pelos cidadãos. Infelizmente a submis-
são foi uma das nossas características de povo durante muitos séculos e precisamos mudar, descru-
zar nossos braços, parar de achar que surgirão salvadores da pátria para modificar nossa situação,
ou em quem poderemos sempre colocar a culpa por tudo que acontece.

Os novos tempos do SUS clamam por uma maior e mais profunda participação popular ocupando os
lugares reservados pelas leis e trabalhando para transformar esta nossa realidade extremamente
iníqua.

Este é o momento atual do SUS. Esta é a saída legal para que transformemos nossa realidade. Ne-
cessário se faz que a sociedade, numa Santa Aliança (pacto social já está desgastado), faça com que
o SUS seja implantado, saia do papel e se torne realidade. Não apenas uma realidade gerencial, pela
descentralização, pela gestão plena, mas tendo isto como ferramenta para se conseguir o principal:
melhores condições de VIDA E SAÚDE PARA TODOS OS CIDADÃOS BRASILEIROS.

O processo de democratização da sociedade brasileira culminou com a promulgação da Constituição


Federal de 1988, que trouxe profundas mudanças na organização estatal, como a descentralização
de recursos, principalmente para a administração municipal, que ganhou autonomia e atribuições
para gerir e executar as políticas sociais desenhadas pelo governo central.

Este rompimento com um modelo altamente centralizado que caracterizou o período autoritário tam-
bém significou uma ruptura com o padrão de política social até então vigente, cuja incorporação das
demandas sociais se fez sempre de forma estratificada e excludente.

Na política de saúde, esta transformação gerou o Sistema Único de Saúde (SUS), que orientou sua
construção pelo princípio do direito universal à saúde dos cidadãos e o dever do Estado de provê-los
e com uma nova organização dos serviços, sob um comando único em cada esfera administrativa.
Conformaram-se sistemas municipais e estaduais de saúde, contemplando novas formas de articula-
ção entre as instâncias governamentais e novos instrumentos de participação social.

Como consequência, ocorreu uma redefinição significativa na composição e na dinâmica das estrutu-
ras de organização e gestão das políticas públicas, na medida em que se redefiniu não só a relação
entre as esferas de governo, mas também a relação do Estado com a Sociedade e o Mercado.

Mediante a descentralização dos núcleos de elaboração e implementação das políticas de saúde, o


compartilhamento das instâncias de poder decisório com a Sociedade Civil e a necessidade de con-
tratação pelo Estado de insumos e serviços de saúde junto ao mercado e sua articulação em busca
de integralidade da assistência, gerou-se um novo arcabouço institucional caracterizado por uma
dinâmica de gestão reticular. Este formato é composto por diversos núcleos decisórios independentes

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entre si, instâncias de pactuação e resolução de conflitos entre atores diversos, instrumentos de ges-
tão compartilhada de recursos, mecanismos de formação de metas e objetivos coletivos, entre outros,
capazes de promover interdependência e articulação de competências.

Mediante a descentralização dos núcleos de elaboração e implementação das políticas de saúde, o


compartilhamento das instâncias de poder decisório com a Sociedade Civil e a necessidade de con-
tratação pelo Estado de insumos e serviços de saúde junto ao mercado e sua articulação em busca
de integralidade da assistência, gerou-se um novo arcabouço institucional caracterizado por uma
dinâmica de gestão reticular.

Este artigo objetiva analisar o SUS como arcabouço institucional de gestão de uma rede de política,
apresentando seus principais mecanismos e instrumentos, bem como seus avanços e desafios atu-
ais.

A Gestão em Rede: Suas Características e Desafios

Uma rede consiste num fenômeno organizacional que, além dos aspectos fundamentais como com-
posição por atores autônomos, interdependência e padrões estáveis de relacionamento, desenvolve
uma institucionalidade voltada especificamente para o aprofundamento da interdependência existen-
te(Borzel, 1998; O`Toole, 1997).

Esta institucionalidade se compõe em torno do planejamento deliberado da divisão do trabalho e da


articulação estratégica voltada para a manipulação do ambiente em que opera a rede, ou seja, a rede
se desenvolve pelo trabalho coletivo especificamente planejado (Klijn, 2002).

Assim, somente quando há convergência interinstitucional para um objetivo comum são desenvolvi-
dos os laços necessários para articular a interdependência entre os atores de forma coordenada e se
pode afirmar que se desenvolve uma estrutura em rede.

À medida que se desenvolve a percepção de que o aprofundamento da interdependência consiste no


fator decisivo para a obtenção dos objetivos desejados, inicia-se um processo de coordenação delibe-
rado e planejado no sentido de dividir e organizar coletivamente o trabalho, originando uma estrutura
de governança em rede (Klijn e Koppenjan, 2000).

Os processos de definição e gestão de políticas públicas em contextos institucionais definidos por


uma governança em rede apresentam desafios extremamente diferentes daqueles presentes em
ambientes de coordenação unitária, tanto no que se refere à tomada de decisões e à definição de
metas e diretrizes, quanto à organização das estruturas de provisão de serviços e sua gestão contí-
nua.

Assim, tornam-se necessários, tanto o desenho de mecanismos institucionais e instrumentos de ge-


renciamento de processos de interdependência quanto o desenvolvimento de competências de ges-
tão especificamente voltadas para a atuação em ambientes interorganizacionais onde o poder, mais
que descentralizado, é diversificado (Agranoff e Mcguire, 1999).

A constituição das redes de política pode envolver a presença de diversos atores públicos (locais,
regionais e federais), privados, organizações não governamentais, cada um deles sujeito a ambientes
institucionais diferentes, o que proporciona orientações diversas e objetivos distintos. A multiplicidade
de atores presentes no contexto organizacional das redes ressalta a necessidade de se construir
convergência a partir de pluralidade e autonomia.

Somente quando há convergência interinstitucional para um objetivo comum são desenvolvidos os


laços necessários para articular a interdependência entre os atores de forma coordenada e se pode
afirmar que se desenvolve uma estrutura em rede.

A presença de diversos contextos institucionais gera objetivos particulares distintos e requer o desen-
volvimento de estratégias que visem a construção de convergências em torno de objetivos comuns e
a coordenação na construção das metas fixadas coletivamente (Fleury, 2002).

Cada ator específico tem seus objetivos particulares, mas seria limitado imaginar que sua participa-
ção em uma rede seria consequência de suas carências e do mero comportamento maximizador para
atingir seu objetivo pessoal ou organizacional. A construção de uma rede envolve mais do que isto,

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ou seja, requer a construção de um objetivo maior que passa a ser um valor compartilhado, para além
dos objetivos particulares que permanecem.

A habilidade para estabelecer este mega-objetivo, que implica uma linha básica de acordo, tem a ver
com o grau de compatibilidade e congruência de valores entre os membros da rede (Mandell, 1999).
Para chegar a este tipo de acordo é necessário desenvolver arenas de barganha, onde as percep-
ções, valores e interesses possam ser confrontados e negociados.

A estruturação destes espaços e processos de negociação faz parte da dimensão da estrutura da


rede, que diz respeito à institucionalização dos padrões de interação. O estabelecimento de regras
formais e informais é um importante instrumento para a gestão das redes (Bruijn e Heuvelhof, 1997)
porque especifica a posição dos atores na rede, a distribuição de poder, as barreiras para ingresso,
etc.

O processo decisório em redes requer, além da percepção efetiva da interdependência pelos atores
envolvidos, uma transformação relativa aos fundamentos culturais de relacionamento entre as partes
envolvidas, o desenvolvimento de estratégias e mecanismos de construção de consenso e de com-
partilhamento de percepções e a instituição de instâncias organizacionais de suporte e intermediação
entre os atores envolvidos. Como parte essencial desse processo, apresentam-se estratégias de
gestão por meio do monitoramento das relações e da construção de incentivos à formação de coali-
zões no interior dos clusters descentralizados de atores que possuem os recursos necessários à ope-
racionalização das políticas em questão (Mandell, 1999).

O Formato Institucional dos SUS e sua Dinâmica de Gestão

A construção do SUS representa uma ruptura no formato de constituição do Estado, no modelo de


proteção social e na forma de gestão das políticas sociais no país, tendo, portanto, redirecionado
também o padrão de relacionamento do Estado com a sociedade civil e o mercado. Este processo
gerou arranjos multi-organizacionais, característicos de governança em rede, onde a capacidade de
desenvolver estratégias e instrumentos de promoção e sustentação de interdependências se tornou
vital para o desempenho final do sistema de saúde. Isto é, envolve o planejamento e a articulação
estratégica no emprego dos recursos, a negociação em torno de objetivos comuns, a pactuação de
metas, a resolução mediada de conflitos, a integração por meio da articulação eficiente de bases de
provisão de serviços, entre outros.

Breve histórico

O sistema de proteção social brasileiro, a partir da construção do Estado moderno em 1930, combi-
nou um modelo de seguro social na área previdenciária, no qual os benefícios dependem da existên-
cia de contribuições pretéritas, com um modelo assistencial para a população sem vínculos trabalhis-
tas formais, no qual os benefícios não asseguram a existência de direitos sociais.

No período da democracia populista (1946-1964), a expansão do sistema de seguro social fez parte
do jogo político de intercâmbio de benefícios por legitimação dos governantes, beneficiando de forma
diferencial os grupos de trabalhadores com maior poder de barganha, fenômeno este que ficou co-
nhecido como massificação de privilégios.

O regime burocrático-autoritário, no pós-1964, não rompeu com as características anteriormente


apontadas, mantendo a convivência dos modelos de seguro e de assistência em sistemas centraliza-
dos, fragmentados, ineficientes, superpostos e submetidos a uma lógica clientelista.

A inflexão que vão sofrer os sistemas e mecanismos de proteção social a partir da instauração do
regime burocrático-autoritário obedeceu a quatro linhas mestras: a centralização e concentração do
poder em mãos da tecnocracia, com a retirada dos trabalhadores do jogo político e da administração
das políticas sociais; o aumento de cobertura incorporando grupos e benefícios anteriormente excluí-
dos; a criação de fundos e contribuições sociais como mecanismo de autofinanciamento dos progra-
mas sociais; e a privatização dos serviços sociais (em especial a educação universitária e secundária
e a atenção hospitalar).

Com a Constituição Federal de 1988 inaugura-se um novo período, no qual o modelo da seguridade
social passa a estruturar a organização e formato da proteção social brasileira, em busca da univer-
salização da cidadania.

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Com a Constituição Federal de 1988 inaugura-se um novo período, no qual o modelo da seguridade
social passa a estruturar a organização e formato da proteção social brasileira, em busca da univer-
salização da cidadania. No modelo de seguridade social busca-se romper com as noções de cobertu-
ra restrita a setores inseridos no mercado formal e afrouxar os vínculos entre contribuições e benefí-
cios. Os benefícios passam a ser concedidos a partir das necessidades, o que obriga a estender uni-
versalmente a cobertura e integrar as estruturas governamentais. A inclusão da previdência, da saú-
de e da assistência como partes da seguridade social introduziu na Constituição os direitos sociais
com parte da condição de cidadania.

O novo padrão constitucional da política social caracteriza-se pela universalidade na cobertura, o


reconhecimento dos direitos sociais, a afirmação do dever do Estado, a subordinação das práticas
privadas à regulação em função da relevância pública das ações e serviços nestas áreas, uma pers-
pectiva publicista de co-gestão Governo/Sociedade, em um arranjo organizacional descentralizado.

Formação do SUS como um campo de gestão de redes

A Reforma Sanitária foi fruto de um amplo movimento social que se iniciou ainda nos estertores do
regime autoritário e que teve como objetivo central a democratização da saúde, entendida como a
universalização do acesso ao cuidado de saúde, mediante a criação de um Sistema Público Nacional
de Saúde.

Estas propostas foram incluídas na Constituição Federal de 1988, onde a saúde se inscreveu como
um direito de cidadania e um dever do Estado, requerendo que os serviços de saúde se organizas-
sem em um sistema único, público, universal, descentralizado e participativo de atenção à saúde. O
novo desenho do sistema representou uma mudança importante no poder político e na distribuição de
responsabilidades entre as distintas esferas do Governo: nacional, estadual e municipal.

Este processo de redefinição institucional do sistema de saúde originou um novo e diferente quadro
de desafios de gestão, uma vez que estabeleceu tanto estruturas decisórias quanto de organização e
provisão de serviços compostas por atores provenientes de diferentes jurisdições (Estado, sociedade
civil e mercado). Os principais desafios podem ser divididos de acordo com cada uma dos três princi-
pais eixos de relações institucionais que compõem o SUS, os quais demandam diferentes esforços
de gestão interorganizacional.

Em breves linhas, vamos tratar este desenho a partir das novas configurações das relações intergo-
vernamentais, das relações do Estado com a sociedade e das relações do Estado com o mercado.

1. Relações Intergovernamentais – consiste num conjunto de relações geradas pelo processo de


descentralização dos núcleos decisórios a partir da instituição de autoridades sanitárias em cada
esfera de Governo, dotadas de autonomia política para a gestão dos serviços prestados aos cida-
dãos, nos níveis de atenção correspondentes.

Isto implica na existência da divisão de funções entre a União, os Estados e os Municípios, sendo
estes últimos designados como a esfera principal na composição do novo sistema.

Implica também na criação de mecanismos de articulação que garantam a coordenação das interde-
pendências.

A autonomia das três esferas requer a presença de mecanismos e estratégias para o desenvolvimen-
to de esforços conjuntos e complementares, tanto no sentido de obter coerência na formulação de
políticas quanto na provisão de uma atenção integral aos cidadãos usuários do sistema, cabendo à
esfera central a responsabilidade pela coordenação geral das políticas nacionais de saúde.

Esta o faz mediante o desenvolvimento das normas e parâmetros para a estruturação, a organização,
o planejamento, o controle e a avaliação, na forma de diretrizes básicas de orientação do sistema,
incentivos para a adoção de programas e políticas, bem como por meio do fornecimento de condi-
ções necessárias à promoção da descentralização do mesmo.

Os grandes desafios do processo de gestão intergovernamental instituído pelo SUS relacionam-se


tanto à determinação de dotar os municípios das competências suficientes para assumir suas res-
ponsabilidades, quanto à necessidade de desenvolver estratégias eficientes de integração entre os
municípios, e destes com as demais esferas.

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A produção de resultados coletivos a partir de esferas autônomas, em ambientes de interesses nem


sempre convergentes, em se tratando de um país federal de ampla diversidade socioeconômica, polí-
tica e cultural, exige a presença de mecanismos capazes de promover processos de negociação vo-
luntária e pactuação.

As principais ferramentas institucionais desenhadas para este propósito consistem nas conferências
de saúde em cada esfera de governo, realizadas periodicamente, e nas comissões intergestoras e
consórcios intermunicipais.

As primeiras são mecanismos de formação de políticas públicas compostas a partir da esfera munici-
pal, cujas diretrizes e metas são tomados como fundamento para a elaboração das agendas referen-
tes à esfera estadual e finalmente à nacional. Com participação paritária do Governo e da sociedade
civil, as conferências representam um momento de diálogo e formação de consenso acerca de nor-
mas e valores que orientarão as estratégias políticas.

As comissões intergestoras representam espaços permanentes de composição decisória onde se


apresentam as autoridades gestoras na busca de resolução conjunta de problemas, como a alocação
de recursos financeiros.

As comissões intergestoras bipartites relacionam a autoridade estadual com as municipalidades, en-


quanto a comissão tripartite envolve ainda a presença da União no processo de pactuação e forma-
ção de consenso.

No que se refere às relações horizontais entre as esferas subnacionais, o intercâmbio e a alocação


de recursos assistenciais e financeiros pode ser viabilizado por meio da Programação Integrada e
Pactuada (PPI) que consiste num instrumento de negociação de recursos, onde os gestores com
excesso de oferta de serviço podem oferecê-la para outros gestores em troca do financiamento cor-
respondente. O nível gerencial imediatamente acima (Estados ou União) consolida as programações
e redistribui recursos financeiros de acordo com os pactos efetuados.

A produção de resultados coletivos a partir de esferas autônomas, em ambientes de interesses nem


sempre convergentes, em se tratando de um país federal de ampla diversidade socioeconômica, polí-
tica cultural, exige a presença de mecanismos capazes de promover processos de negociação volun-
tária e pactuação.

No que se refere às relações horizontais especificamente entre os gestores municipais, está prevista
também na institucionalidade do SUS a possibilidade de instauração de consórcios entre municípios
para a gestão de problemas locais comuns e a construção de estratégias de regionalização. No en-
tanto, esse é um recurso institucional ainda de pouca utilização no sistema, talvez em virtude da qua-
se ausência de incentivos ao seu desenvolvimento.

O processo de descentralização foi realizado de maneira progressiva e regulado pelas instâncias


centrais passando as instalações e os recursos humanos dos níveis mais altos às municipalidades. A
administração do sistema local de saúde, incluindo os recursos financeiros transferidos às municipali-
dades, está condicionada pelo cumprimento das normas e requisitos estabelecidos pelas instâncias
centrais.

As evidências demonstram que o processo de construção de competências gerenciais nas esferas


subnacionais da federação encontra-se em estágio bastante avançado, estando a quase totalidade
dos estados e municípios habilitados a assumir pelo menos as funções mínimas a eles disponibiliza-
das, embora permaneça a questão das assimetrias e desigualdades, tanto entre os municípios quan-
to entre os estados.

Da mesma forma, a construção de relações horizontais entre as autoridades sanitárias nas duas esfe-
ras permanece sendo uma questão em aberto, assim como se encontra pouco definido o papel do
Governo estadual no conjunto das relações verticais entre as três esferas.

Desta forma, o SUS configura um formato institucional onde nenhum dos atores do Estado detém os
recursos suficientes, nem para prover atenção integral, nem para impor os rumos da política de saú-
de, sendo indispensável o constante exercício e aperfeiçoamento dos instrumentos e mecanismos de
desenvolvimento das relações intergovernamentais no sentido de ampliar o potencial de consenso,
de compartilhamento de percepções e de aprofundamento da interdependência, sem os quais torna-

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se deficitária ou mesmo insustentável a produção de resultados eficazes em contextos de governança


em rede.

O SUS configura um formato institucional onde nenhum dos atores do Estado detém os recursos
suficientes, nem para prover atenção integral, nem para impor os rumos da política de saúde, sendo
indispensável o constante exercício e aperfeiçoamento dos instrumentos e mecanismos de desenvol-
vimento das relações intergovernamentais.

As pesquisas recentes sugerem que não há o desenvolvimento de esforços significativos no que se


refere à redução das assimetrias de capacidade de gestão, o que torna difícil ampliar o potencial dos
municípios de assumir com sucesso responsabilidades novas e mais complexas, assim como tam-
bém diminui suas possibilidades de formar relações eficazes, verticais e horizontais, de intercâmbio
de recursos e competências.

Quanto ao papel desempenhado pelo gestor estadual e as questões referentes ao desenvolvimento


das relações de caráter horizontal, em 2001 foi instituída uma estratégia de regionalização da gestão
e da assistência à saúde, definindo o gestor estadual como principal responsável por conduzir a arti-
culação de municípios adjacentes na composição de clusters de provisão de serviços. O objetivo é
fortalecer a interdependência municipal, ampliar a capacidade regional de prover atenção integral
com maior equidade, além de racionalizar o uso de recursos por ganho de escala mediante a aloca-
ção eficiente de investimentos (Mafort-Ouverney, 2005).

Entretanto, tal estratégia, após mais de três anos de implementação, ainda não apresentou resulta-
dos efetivos e encontra dificuldades no sentido de se tornar um marco regulatório institucionalizado e
legitimado pelos atores que integram o SUS. Sendo assim, a indefinição no que se refere ao papel do
gestor estadual e a incapacidade de construção de estratégias de horizontalização favorecem a ma-
nutenção do papel indutor e centralizador do governo federal.

2. Relações Estado/Sociedade – constitui-se em um conjunto de estruturas composto pelas rela-


ções de intermediação de interesses entre os atores sociais e a burocracia estatal no âmbito do pro-
cesso de controle social desenvolvido a partir da institucionalização das instâncias de democratização
do SUS.

O processo de abertura das instâncias decisórias do Estado brasileiro durante a década de 1980
permitiu a inserção de demandas diferenciadas por meio da maior participação política de grupos
antes excluídos. Esta opção estava fundada em uma concepção de que o Estado deveria conter me-
canismos institucionais de controle e de incorporação de interesses plurais que pudessem confrontar
sua tomada por grupos particulares.

A existência de canais de inserção de demandas e interesses diversos transformou por completo todo
o processo decisório, e, por conseguinte, a gestão das etapas de composição das políticas de aten-
ção à saúde. Uma vez que o poder da burocracia gestora passou a ser compartilhado com a Socie-
dade Civil, sua autonomia na condução do sistema de saúde está restrita à ação da democracia deli-
berativa, o que corrobora a necessidade dos gestores de se orientarem na busca do interesse públi-
co.

O principal aspecto gerencial relativo ao compartilhamento do poder decisório reside no entendimen-


to, por parte dos gestores, de que a definição tanto dos macro-objetivos, das principais diretrizes e
metas da agenda das políticas públicas de saúde em cada uma das três esferas, quanto os aspectos
processuais relativos à sua implantação, estão sujeitos à ação política dos diversos grupos de inte-
resse presentes nas arenas decisórias do SUS, que são os Conselhos de Saúde.

Em cada nível do SUS existe um Conselho de Saúde, constituído 50% de representantes do Governo
e 50% de representantes da sociedade civil (usuários, provedores, profissionais, etc.). Este mecanis-
mo permite a participação e o controle social nos processos de elaboração de políticas, de ordena-
mento de prioridades e execução de políticas.

Assim, a atitude e as competências de gestão necessárias para a produção de resultados coletivos


no campo sanitário, a partir de interesses possivelmente divergentes, envolvem a construção de pro-
cessos de articulação política e de mediação de conflitos, o que exige que os gestores atuem perma-
nentemente na construção de agendas de compartilhamento de percepções e ajustes de interesses.

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Este processo envolve ainda o desenvolvimento de relações de complementaridade entre burocracia


e a sociedade civil organizada, visando construir suporte político para a elaboração e a implementa-
ção de políticas e programas. Da mesma forma, tais relações permitem e impulsionam a ação organi-
zada no sentido de ampliar a capacidade de monitoramento e fiscalização de metas e resultados, o
que contribui significativamente, tanto no sentido de intensificar o processo de accountability, quanto
aumentar a eficiência da ação estatal.

Entretanto, embora seja evidente a institucionalização do processo de participação da sociedade


organizada via conferências e conselhos de saúde na definição de prioridades, estratégias e metas
da política de saúde nas três esferas da federação, permanece ainda por se consolidar a capacidade
efetiva de exercício de controle social pelos conselhos.

Neste sentido, diversos fatores influem neste processo como a disponibilidade de recursos para a
operação dos conselhos, a cultura política de cada município, o nível de instrução da população, as
relações do executivo com o legislativo, a ação de lideranças, a origem social dos membros dos pró-
prios conselhos, entre outros.

Diversas pesquisas apontam o predomínio do caráter apenas consultivo dos conselhos em detrimen-
to de seu papel decisório, enfatizando que em algumas situações estes operam somente na legitima-
ção de decisões previamente definidas pelo executivo.

Entretanto, cabe reiterar que tais instâncias possuem um amplo potencial de atuar não só na amplia-
ção da eficiência da ação das políticas públicas, mas também na promoção do caráter democrático
da gestão do Estado.

De qualquer forma, mesmo que o caráter recente da real implementação dessas estruturas ainda não
permita avaliações concretas mais positivas, deve-se considerar que existem grandes diferenças
entre os conselhos, determinadas pelas prévias diferenças sociais e políticas existentes. Um maior
estudo e acompanhamento deste instrumento possibilitariam mesmo o desenho de incentivos neces-
sários à consolidação dessas instâncias, em resposta a verificação de reais deficiências existentes
em cada região da federação.

Diversas pesquisas apontam o predomínio do caráter apenas consultivo dos Conselhos de Saúde em
detrimento de seu papel decisório, enfatizando que em algumas situações estes operam somente na
legitimação de decisões previamente definidas pelo executivo.

3. Relações Estado/mercado – Apesar da proposta de reforma sanitária inscrita no texto constituci-


onal e que compõe as diretrizes de estruturação do SUS ter originado um sistema público, boa parte
das bases econômicas de produção da oferta de insumos e serviços encontra-se alocada em unida-
des de mercado. Este fato é consequência da política de organização do modelo médico-sanitário
anteriormente existente, que privilegiou a compra de serviços aos produtores privados e foi estrutura-
do visando à reprodução ampliada de setores industriais de elevada composição tecnológica, como a
indústria farmacêutica e de equipamentos médicos.

Durante as duas primeiras décadas, a Reforma Sanitária não foi capaz de transformar a realidade
prévia em termos da estrutura de insumos e oferta nem das características de organização dos servi-
ços.

Uma vez que a produção de medicamentos, equipamentos hospitalares e outros insumos é funda-
mentalmente realizada por empresas multinacionais, o Governo tem sido incapaz de controlar tanto
as condições de oferta quanto os preços destes produtos. Como os leitos hospitalares para o SUS
são predominantemente ofertados pelo setor privado contratado (aproximadamente 63%), a distribui-
ção de hospitais e recursos humanos é altamente concentrada nas regiões urbanas mais ricas do
país.

Assim, a estruturação e a dinâmica de provisão de serviços de saúde no âmbito do SUS, necessari-


amente estão relacionadas à contratação de um conjunto de provedores inseridos num ambiente
cujos princípios de condução são os do mercado, e não aqueles estabelecidos na Constituição de
1988, nos quais a saúde é considerada um bem público, independentemente do seu provedor ser
público ou privado.

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Como os leitos hospitalares para o SUS são predominantemente ofertados pelo setor privado contra-
tado (aproximadamente 63%), a distribuição de hospitais e recursos humanos é altamente concentra-
da nas regiões urbanas mais ricas do país.

Sob a ótica da produção de serviços aos cidadãos pelo SUS, a necessidade de buscar no mercado
unidades de provedores de serviços especializados e mesmo fatores de produção para tal, implica
em desafios de gestão relacionados à equidade e à integralidade da assistência, principalmente em
políticas setoriais envolvendo níveis mais elevados de complexidade tecnológica. Os desafios intrín-
secos à equidade referem-se às disparidades regionais ocasionadas pela concentração de recursos e
de infra-estrutura produtiva nas áreas de maior grau de urbanização.

Quanto à integralidade da assistência, os desafios referem-se tanto à integração dos diversos servi-
ços contratados pelo Estado no âmbito do SUS, quanto à hierarquização destes por níveis de com-
plexidade, uma vez que a qualidade da provisão não depende única e exclusivamente do desempe-
nho isolado de cada unidade.

A existência de diversos provedores contratados relacionados a uma política setorial específica, cada
qual especializado em um aspecto da assistência, implica na insuficiência de garantia quanto à rela-
ção causal entre o desempenho individual dos provedores contratados e o resultado geral em termos
de bem-estar dos cidadãos.

A baixa capacidade do aparelho estatal para desenvolver parâmetros e instrumentos regulatórios


efetivos impede o cumprimento da função reitora do Estado na condução do SUS, que muitas vezes
se submete aos interesses privados, mais poderosos e altamente organizados.

A efetividade dos serviços está relacionada à capacidade do Estado de organizar e estruturar de for-
ma adequada uma rede integrada a partir dos fundamentos constitucionais do SUS.

A integração e hierarquização dos serviços contratados tornam-se imprescindíveis para a efetividade


das políticas de saúde, uma vez que somente uma adequada coordenação interorganizacional entre
os provedores, por meio de mecanismos de referenciamento e contra-referenciamento, gestão con-
junta de casos e o desenvolvimento de programas multidisciplinares, é capaz de garantir a provisão
de qualidade.

As ações desenvolvidas e os instrumentos gerados para a implementação dos processos de regiona-


lização e hierarquização da rede de serviços no âmbito do SUS constituem as estratégias voltadas
para a garantia da integralidade da assistência, diante da fragmentação gerada não só pela necessi-
dade de contratação de provedores privados, mas também pela busca do estabelecimento de uma
coordenação adequada destes com os serviços alocados no interior do aparelho público para poder
hierarquizá-los através dos níveis de atenção e complexidade.

O aprofundamento do processo de regionalização e hierarquização da atenção à saúde, iniciado du-


rante a década de 1990, recebeu importante impulso por meio da edição da Norma Operacional de
Assistência à Saúde (NOAS/01) que consolidou de forma detalhada o relacionamento entre as bases
de serviços especializadas dos municípios.

Cada base municipal é tomada como um módulo assistencial composto por um cluster de serviços de
determinada complexidade, onde os municípios que possuem núcleos capazes de realizar procedi-
mentos de maior complexidade configuram referências para os demais módulos assistenciais.

Os módulos assim referenciados se agrupam em microrregiões, que, por sua vez, formam as regiões
a partir das quais se divide a assistência à saúde de cada Estado da Federação.

Da mesma relevância que a capacidade de articulação das bases privadas de provisão de serviços, a
questão referente à gestão dos processos de contratação e o monitoramento dos resultados perma-
nece sendo um aspecto indefinido na organização do SUS, o que afeta de maneira extremamente
negativa a articulação estratégica no emprego dos recursos, reduzindo significativamente a racionali-
dade sistêmica (econômica) e a eficiência do SUS.

A Tabela sintetiza os principais avanços e desafios à consolidação do SUS como campo de gestão
de políticas em rede.

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Tabela

Avanços e desafios na construção do SUS como uma rede de gestão de políticas

Embora se apresentem tensões presentes nos três eixos de relações institucionais definidos para a
análise do SUS, percebe-se claramente que os principais desafios estão relacionados ao eixo das
relações intergovernamentais.

A análise do SUS a partir dos critérios fixados como característicos de uma gestão em rede aponta
para uma forte necessidade de horizontalização das relações intergovernamentais, com o fortaleci-
mento das instâncias subnacionais. Isto implica não só ampliar a autonomia dos municípios e solidifi-
car o papel do Estado como coordenador regional, mas também consolidar a capacidade dos conse-
lhos no exercício do caráter deliberativo de suas atribuições. Desta forma seria possível assegurar a
governança desejável em cada um dos níveis do sistema, bem como sua articulação com os demais
níveis.

Os desafios apontam cada vez mais para a necessidade de fortalecimento dos atores e para a hori-
zontalização das relações de poder. Isso demonstra que, para além dos aspectos estruturais, não se
pode negligenciar a dinâmica do exercício do poder.

Somente assim é possível reduzir o papel indutor das instâncias centrais do SUS, além de, ao ampli-
ar a autonomia e a força dos sistemas locais e regionais, possibilitar o fortalecimento da regulação e
do controle sobre os provedores privados.

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A análise da gestão do SUS nos leva a questionar a ênfase dada na literatura contemporânea aos
processos de institucionalização de interdependências.

Ainda que o SUS tenha construído diversas instâncias de construção de regras coletivas, os desafios
apontam cada vez mais para a necessidade de fortalecimento dos atores e a horizontalização das
relações de poder. Isso demonstra que, para além dos aspectos estruturais, não se pode negligenciar
a dinâmica do exercício do poder.

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