Projeto de Intervenção apresentado à disciplina de Desenvolvimento
Infantil e Adolescente ministrada pela professora Fernanda Cerutti
Pedro Jardel da Silva Coppeti
Porto Alegre, 15 junho de 2020.
INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, muito se tem debatido sobre a escuta de crianças e
de adolescentes vítimas de violência sexual nas diversas instâncias do Sistema de Garantia de Direitos (SGD1). Esses debates têm sido relevantes no sentido de reafirmar princípios estabelecidos em normativas internacionais e nacionais de proteção integral a crianças e a adolescentes. Reconhecer que estes são sujeitos de direitos e que devem ser tratados como pessoas em condição peculiar de desenvolvimento constituem etapas imprescindíveis no processo de atendimento, de acompanhamento e de apoio a crianças e a adolescentes em situação de violência sexual. Nesta perspectiva, a busca de alternativas técnicas e de procedimentos humanizados deve ser fundamentada nas disposições contidas no Cap. II do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA 2), que trata do Direito à Liberdade, ao Respeito e à Dignidade, para evitar a revitimização dos sujeitos atendidos. É do conhecimento dos profissionais que atuam na área da infância e da adolescência que a Rede de Proteção 3, composta por segmentos da Assistência Social, da Saúde, da Educação e do Sistema de Segurança e de Justiça, não tem conseguido realizar essa escuta, de forma a garantir os direitos de crianças e de adolescentes vítimas. O que tem sido observado é que ocorre a repetição da história da violência sofrida a cada um dos atores que compõem essa rede, em ambientes os mais diversos possíveis e, quase sempre, sem o cuidado devido com quem está sendo ouvido – no caso, a criança ou o adolescente –, com quem está ouvindo– o profissional –, com o ambiente em que essa escuta ocorre e com as técnicas adequadas, ou não, para a realização desta tarefa. Segundo Amorim (2010, p. 2), “tanto a falta, quanto o excesso ou a inadequação na condução deste processo, podem revitimizar crianças e adolescentes.” Ainda com base no pressuposto estabelecido pelo inciso III do art. 87 do ECA, crianças 1 Sistema de Garantia de Direitos (SGD) - O Sistema de Garantia de Direitos constitui-se na articulação e integração das instâncias públicas governamentais e da sociedade civil, na aplicação de instrumentos normativos e no funcionamento dos mecanismos de promoção, defesa e controle para a efetivação dos direitos da criança e do adolescente, nos níveis Federal, Estadual, Distrital e Municipal. Fonte: http://www.sedh.gov.br/clientes/sedh/sedh/spdca/sgd. 2 Aprovado pela Lei Federal n.º 8.069/1990. 3 Redes de Proteção – As redes são uma aliança de atores/forças num bloco de ação político operacional (...). O foco do trabalho em redes não é um problema imediato, isolado, mas a articulação de sujeitos/ atores/forças para propiciar poder, recursos e dispositivos para a ação, auto-organização e a autorreflexão do coletivo (FALEIROS, 1998). e adolescentes, quando em situação de exploração, de abuso, de crueldade e de opressão, devem receber serviços especiais de prevenção e de atendimento especializado. Portanto, demandam uma escuta qualificada. Ressalte-se, nesse contexto, o direito de ser ouvido, conforme disposto na Convenção Internacional dos Direitos da Criança (1989), sobretudo quando em sofrimento decorrente de qualquer tipo de violência. Daí a urgente necessidade de qualificação dos profissionais que produzem essa escuta, respeitando-se o direito à intimidade e à individualidade destes e o direito de não falar, caso este seja o seu desejo. Nesta perspectiva, “devem ser respeitadas as condições subjetivas que muitas vezes os colocam sem condições de se expressarem sobre a violência vivida ou presenciada.” (AMORIM, 2010, p.5). O acompanhamento e o apoio a crianças e a adolescentes pós- depoimento constituem etapas da intervenção, compreendidas com base em um processo que inclui o antes, a preparação para o depoimento e o acompanhamento posterior, considerando os impactos que possam advir da revelação. Destarte, propõem- se apresentar alternativas de cuidado para crianças e adolescentes quando dos seus relatos, nas diversas portas de entrada do Sistema de Garantias de Direitos (SGD), sobre as situações de sofrimento de violência, especialmente nos casos de violência sexual.
OBJETIVOS
OBJETIVO GERAL
- Implementar um método de atendimento psicossocial visando prestar apoio e
acompanhamento a crianças e adolescentes vítimas de agressão sexual e que necessitam prestar depoimento.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
- Possibilitar uma escuta qualificada através de um aporte técnico e especializado.
- Garantir resolubilidade a situações de grave violação de direitos ou de sofrimento psíquico, com efetividade e celeridade. - Propiciar um espaço diferenciado de acolhimento e de escuta aos sujeitos que sofreram graves violações físicas, psíquicas ou sexuais. - Fortalecer os sujeitos envolvidos, conforme o lugar e a posição em que se encontram, com a minimização do sofrimento no decorrer do processo de elaboração da situação traumática. - Criar condições para que os sujeitos resignifiquem os traumas sofridos, deslocando-se do sentimento ambíguo de culpa e de vitimização, para a criação de autonomia e o fortalecimento da resiliência.
ATIVIDADE
A experiência no processo de acompanhamento a crianças e a
adolescentes vítimas de violência sexual, que necessitam prestar depoimento nas instâncias extrajudiciais e judiciais será realizada por uma equipe multidisciplinar, composta pelos atores responsáveis pelo Sistema de Garantias dos Direitos elencados no Estatuto da Criança e do Adolescente.
A atividade considera três etapas:
• O acolhimento e atendimento inicial. • A escuta e a preparação para o depoimento, que ocorre durante o processo de acompanhamento. • O acompanhamento posterior a esse momento. Reposicionar o sujeito em outra rede de relações, voltada para a proteção e o redirecionamento de sua vida.
MÉTODO DE EXECUÇÃO
1. Atendimento inicial ou triagem: Ao chegar à instituição, a criança
ou adolescente são recebidos e ouvidos pelo Serviço Social para avaliação da demanda e especificidade do atendimento. A depender do caso, em que já se sabe anteriormente qual é a demanda, pelos encaminhamentos feitos por delegacias, promotorias de justiça ou por uma das varas especializadas, dentre outras, e que trazem registros do atendimento dessas instituições, o acolhimento pode ser realizado por dupla de profissionais para uma escuta mais qualificada e realização de procedimentos emergenciais necessários. Realizado o acolhimento e feito o levantamento da história do sujeito atendido e a avaliação dos riscos a que estão submetidos os membros da família, bem como das condições socioeconômicas destes, o caso é encaminhado ao setor jurídico e psicológico para avaliações específicas. 2. Atendimento técnico: tem a função de avaliar as demandas individuais para realização dos encaminhamentos a outros serviços especializados e da rede. De posse dos dados colhidos pelas entrevistas e pela observação, a equipe deve realizar o estudo de caso para levantamento das demandas que foram identificadas e que necessitam de intervenções imediatas e de curto prazo, como também daquelas que necessitam de outras intervenções mais aprofundadas levando-se em consideração a dimensão do risco vivenciado pela criança ou adolescente. Esses dados também servem para subsidiar a elaboração do Plano Individual de Atendimento, instrumento que norteia as ações técnicas do atendimento. O PIA compreende um conjunto de procedimentos pedagógicos e terapêuticos definido por equipe multiprofissional por meio de Estudo de Caso, subsidiado pelas avaliações psicológica, social, pedagógica, jurídica e de saúde (física, mental, sexual, reprodutiva). Visa construir, com a criança ou com o adolescente e com sua família, as atividades que auxiliarão nos seus desenvolvimentos pessoal e social. 3. Acompanhamento e monitoramento: processo de atendimento e de apoio que inclui a avaliação dos encaminhamentos realizados e os efeitos das medidas tomadas pela equipe técnica, com apoio da família, para a vida da criança e do adolescente. Esta etapa também compreende a orientação e a preparação para os procedimentos judiciais, incluindo o depoimento e o acompanhamento posterior.
A infraestrutura recomendada para a execução é de uma sala especial
(para a escuta), outras salas de trabalho e de apoio, de preferência em espaço próprio, com mobiliários, aparatos físicos (equipamentos de informática, computadores, equipamento de gravação e demais suprimentos), que podem ser cedidas pelo Poder Público, Poder Judiciário, Ministério Público, OAB, Faculdades, entre outros. Não há previsão orçamentária, uma vez que a atividade será desenvolvida de forma voluntária pelos servidores dos entes parceiros. De outro lado, os recursos são disponibilizados pelas próprias instituições e órgãos parceiros, seja referente ao transporte, seja pessoal. Quando inexistentes, é possível soluções alternativas, a serem buscadas junto aos conveniados, que serão: Instituto Médico Legal, Conselhos Tutelares, Prefeituras Municipais, Universidades e demais órgãos que compõe a rede de proteção do ECA. REFERÊNCIAS
1. FALEIROS. P. V. Redes de exploração e abuso sexual e redes de proteção.
CECRIA - Centro de Referências, Estudos e Ações sobre Crianças e Adolescentes. Disponível em: http://institutochamaeleon.files.wordpress.com/2013/04/rede-de-explorac3a7c3. 2. AMORIM, S.M.F. Ética do psicólogo: reflexões sobre a postura ética do profissional de psicologia no atendimento a crianças e adolescentes vítimas de tráfico para fins de exploração sexual. ln: Sistematização do Programa de Assistência a Crianças e Adolescentes Vítimas de Tráfico para Fins de Exploração Sexual - Programa TSH/ Abrigos/Partners of the Américas: Brasília, 2007. 3. ARRUDA, J. S. de. Defesa e responsabilização: a prática do Cedeca/BA. In: ARRUDA, J. S. de; SANTOS, S. Viva Maria! Viva João! Construindo estratégias para o enfrentamento à exploração sexual. Salvador: Cedeca, 2009. 4. CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. (Brasil). Falando sério sobre a escuta de crianças e adolescentes envolvidos em situação de violência e a rede de proteção: propostas do Conselho Federal de Psicologia. Brasília: Conselho Federal de Psicologia, 2009. 5. REBOUÇAS, M. C.; SANTOS, S. Crianças e adolescentes em situação de exploração sexual e tráfico para esse fim: uma proposta de intervenção psicossocial (Caderno de Textos do Programa de Ações Integradas e Referenciais de Enfrentamento a Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes – PAIR), Brasília: SDH/PR, 2009.