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Texto da aula Aulas do curso

Terapia das Doenças Espirituais

Antropologia tomista
A alma humana está na fronteira das criaturas espirituais e corporais. Por
isso, nela se reúnem tanto as faculdades dos anjos quanto as potências
animais. Mas é possível colocar tudo isso em equilíbrio? Em que lugar estão
alojados os "pecados capitais", que são as nossas doenças espirituais?

Santo Tomás, o Doutor Angélico, tem a resposta. Descubra qual é, nesta aula
de nosso curso de Teologia das Doenças Espirituais.

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Antes de identificar as doenças espirituais contra que o homem deve


lutar, é importante situar onde, no ser humano, ficam alojadas as paixões
e sobre qual visão antropológica se edifica a doutrina da Igreja.

Importa dizer, primeiro, que as paixões que levam a alma ao pecado se


encontram no composto corpo e alma. “[A alma humana] está (…) na
fronteira das criaturas espirituais e corporais, por isso, nela se reúnem as
potências tanto de umas e outras criaturas" [1], escreve Santo Tomás de
Aquino. Respondendo se todas as potências da alma estão na alma
como em seu sujeito, ele explica que:
“Há na alma operações que se realizam sem órgão corporal, como
conhecer e querer. Por conseguinte, as potências que são princípios
dessas operações estão na alma como em um sujeito. - Mas há
algumas operações da alma que se realizam com a ajuda de órgãos
corporais; por exemplo: a visão pelo olho, a audição pelo ouvido e de
maneira semelhante ocorre com todas as outras operações da parte
sensitiva e nutritiva. Por isso, as potências que são princípios de tais
operações estão no composto como no sujeito, e não apenas na
alma." [2]

O problema não está, como pensam os platônicos, no corpo material.


Fosse assim, os animais também poderiam pecar. No entanto, é sabido
que, de todo o reino animal, só o homem peca, pois é a única criatura
que possui alma imortal.

Para analisar como é o composto humano – corpo e alma – o que está


contaminado pelo pecado original, Tomás parte da experiência dos
animais, assinalando o que é comum tanto a estes quanto àquele. Ao
classificar os gêneros de potências presentes na alma, ele recorre a três
espécies de divisão:

“Há cinco gêneros de potências da alma, os quais acabamos de


enumerar. Três se dizem almas; quatro são modos de viver.
A razão desta variedade é que se distinguem diversas almas
segundo as diferentes maneiras com as quais a ação da alma
ultrapassa a ação da natureza corporal. A natureza corporal, toda
ela, está com efeito submetida à alma, e se refere a ela como matéria
e instrumento. Há, pois, uma operação da alma que de tal modo
ultrapassa a natureza corporal que nem mesmo é realizada por um
órgão corporal. E essa é a operação da alma racional. - Há outra
operação inferior à precedente que se realiza por meio de um órgão
corporal, mas não por meio de uma qualidade corpórea. E essa é a
operação da alma sensitiva. Com efeito, o quente e o frio, o úmido e
o seco, e outras qualidades corpóreas do mesmo gênero são
requeridas para a operação do sentido, mas não se segue daí que
essa operação se realize mediante a potências dessas qualidades.
Elas são exigidas somente para que o órgão esteja na devida
disposição. - Enfim, a operação menos elevada da alma se faz por
meio de um órgão corporal e pelo poder de uma qualidade corpórea.
Ultrapassa, no entanto, a operação da natureza corpórea, pois os
movimentos dos corpos dependem de um princípio exterior,
enquanto tais operações procedem de um princípio interno, e esse
modo de ação é comum a todas operações da alma. Tudo o que é
animado, com efeito, move a si mesmo de alguma maneira. E essa é
a operação da alma vegetativa: assim a digestão e as ações
consequentes se realizam, de modo instrumental, pela ação do
calor, como se diz no livro II da Alma.
Ora, os gêneros de potências da alma se distinguem segundo os
objetos. Quanto mais uma potência é elevada, tanto mais seu objeto
é universal, como já ficou explicado. Pode-se considerar o objeto da
operação da alma em três graus. Para certa potência da alma, o
objeto é somente o corpo unido à alma: tal é a potência vegetativa,
que não age, com efeito, senão em um corpo ao qual está unida a
alma. - Há outro gênero de potência da alma, cujo objeto é mais
universal, a saber todo corpo sensível e não somente o corpo unido
à alma. Há, enfim, outro gênero de potências da alma, cujo objeto é
ainda mais universal, a saber, não é mais somente todo corpo
sensível mas todo ente tomado em sentido universal. Assim fica
claro que os dois últimos gêneros de potências da alma possuem
uma operação que se relaciona não só com o que está unido à alma,
mas ainda com o que lhe é exterior. - Como é preciso, no entanto,
que o sujeito que opera esteja unido a seu objeto, assim é
necessário que o que é exterior, que é objeto da operação da alma,
se refira à alma de duas maneiras. Em primeiro lugar, enquanto é
apto para se unir à alma e nela estar por sua semelhança. Com
respeito a isso, há dois gêneros de potências, a saber, as sensitivas,
relativas ao objeto menos comum que é o corpo sensível, e as
intelectivas, relativas ao objeto comuníssimo que é o ente universal.
- A segunda maneira, conforme a própria alma esteja inclinada e
tenda para o que é exterior. E com respeito a isso, existem também
dois gêneros de potências da alma, a saber, as apetitivas, na medida
em que a alma se refere a algo exterior como ao fim, que é primeiro
na ordem da intenção. O outro gênero é o das potências
locomotoras, na medida em que a alma se refere a algo exterior
como ao termo da operação e do movimento. Com efeito, é para
obter um objeto desejado e intencionado que todo animal se move.
Quanto aos diferentes modos de vida, são distintos segundo os
graus dos seres vivos. Há seres vivos, em que não existe senão a
potência vegetativa, tais como as plantas. - Há outros que, além da
potência vegetativa, possuem a sensitiva, mas não a motriz segundo
o lugar: os animais imóveis, como as ostras. - Outros, ainda, têm
além disso a potência locomotora, são os animais perfeitos, que têm
necessidade de muitas coisas para viver e, portanto, devem-se
mover para procurar longe o que lhes é necessário. - Há, enfim,
outros seres vivos, que têm além do mais a potência intelectiva, que
são os homens. - Quanto à potência apetitiva, não constitui um grau
dos seres vivos, porque, em todo ser que haja potência sensitiva, há
o apetite, como está dito no livro III da Alma." [3]

Que diferença existe, então, entre a alma humana e as almas das plantas
e dos animais? Em resumo, “em que a alma das plantas é exclusivamente
vegetativa; a dos animais vegetativa e sensitiva; e a humana, além destas
faculdades, possui a inteligência." [4]

É possível identificar nas almas sensitivas duas realidades: o conhecer –


que está associado às faculdades cognoscitivas – e o desejar – que diz
respeito às faculdades apetitivas.

No que diz respeito às faculdades cognoscitivas, o homem tem em


comum com os animais os cinco sentidos externos – a vista, o ouvido, o
olfato, o tato e o gosto [5] –, e os quatro sentidos internos, a saber, “o
sentido comum, a fantasia, a imaginação, a estimativa e a memória" [6].
Explica o Aquinate:

“Como a natureza não falta no que é necessário, é preciso haver


tantas ações da alma sensitiva quantas se requerem para a vida de
um animal perfeito. Mas todas essas ações não podem ser
reduzidas a um só princípio, exigem potências diversas, uma vez que
a potência da alma nada mais é do que o princípio imediato da
operação da alma.
Ora, é preciso considerar que a vida de um animal perfeito requer
não somente que ele apreenda a coisa quando ela está presente aos
sentidos, mas ainda quando está ausente. De outra sorte, como o
animal se move e age em sequência à apreensão, ele não se poria
em movimento para buscar algo que estivesse ausente. Ora, é o
contrário que se observa sobretudo nos animais perfeitos que se
movem com movimento progressivo: dirigem-se, com efeito, para
um objeto ausente do qual têm conhecimento. O animal deve,
portanto, em sua alma sensitiva, não só receber as espécies das
coisas sensíveis no momento em que é modificada por elas, mas
ainda retê-las e conservá-las. (…) - Deve-se considerar, ainda, que se
um animal só se põe em movimento por objetos agradáveis ou
repugnantes para os sentidos, não haveria necessidade de afirmar
no animal senão a apreensão das formas que o sentido percebe e
com as quais sente prazer ou repugnância. Mas é necessário que o
animal procure umas coisas ou fuja de outras, não só porque
convêm ou não ao sentido, mas também por outras conveniências e
utilidades ou nocividades. Por exemplo: a ovelha que vê o lobo
chegar foge, não porque sua cor ou sua forma não são belas, mas
porque é seu inimigo natural. Igualmente o passarinho recolhe a
palha, não pelo prazer sensível, mas porque é útil para construir o
ninho. Portanto, é necessário que o animal perceba tais intenções
que o sentido externo não percebe. Deve haver, em consequência,
um princípio próprio dessa percepção, pois a percepção das formas
sensíveis é por uma modificação do objeto sensível, não porém a
percepção das intenções referidas.
Assim pois, o sentido próprio e o comum ordenam-se a receber as
formas das coisas sensíveis. Será dito adiante como eles se
distinguem. - Para reter ou conservar essas formas, ordena-se a
fantasia ou imaginação que são uma mesma coisa. A fantasia ou
imaginação é, com efeito, como um tesouro das formas percebidas
pelos sentidos. - Para apreender as intenções que não são
percebidas pelo sentido, ordena-se a estimativa. - Para conservá-
las, a memória, que é como um arquivo delas. É sinal disso que o
princípio da lembrança nos animais resulta de tal intenção. Por
exemplo, que isto é prejudicial ou é conveniente. E a mesma razão de
passado, pela qual responde a memória, deve ser contada entre
essas intenções.
Ainda se deve considerar que, em relação às formas sensíveis, não
há diferença entre os homens e os animais. São modificados da
mesma maneira pelos objetos sensíveis exteriores.
(…)
Não há necessidade, portanto, de afirmar senão quatro faculdades
sensitivas internas, a saber: o senso comum e a imaginação, a
estimativa e a memória." [6]

Todos esses sentidos são ligados às potências da alma sensitiva.

O conhecimento intelectivo – a inteligência –, no entanto, escapa ao


universo dos animais. Pode parecer incrível, já que, por exemplo, o
cérebro de um macaco é só um pouco menor que o cérebro humano. É
que essa superioridade do ser humano não se encontra tanto no corpo –
algumas gramas de massa encefálica não são capazes de explicar a
diferença abissal entre o ser humano e o macaco –, mas na alma. Os
homens são capazes de abstração, pelo que chegam aos universais;
além disso, angustiam-se com o futuro e com a própria realização, pelo
que se identifica a sua vocação à eternidade, a algo mais amplo que o
simples horizonte dos sentidos.

No que diz respeito às faculdades apetitivas, o homem tem em comum


com os animais o apetite sensitivo, que é classificado em potência
concupiscível e potência irascível:
“Sendo o apetite sensível uma inclinação que se segue à apreensão
dos sentidos, como o apetite natural é uma inclinação que se segue
à forma natural, deve portanto haver na parte sensitiva duas
potências apetitivas: uma, pela qual a alma é absolutamente
inclinada a buscar o que lhe convém na ordem dos sentidos, e a fugir
do que pode prejudicar, é a concupiscível; a outra, pela qual o animal
resiste aos atacantes que combatem o que lhes convém e causam
dano, é a irascível. Em consequência, se diz que seu objeto é 'aquilo
que é árduo', pois sua tendência a leva a superar e a prevalecer
sobre as adversidades." [7]

Novamente, é preciso esclarecer que essas duas potências estão


ligadas ao físico. Nos animais, portanto, elas acabam com a morte. “As
almas dos animais não subsistem por si, mas apenas a alma humana.
Portanto, as almas dos animais se corrompem quando o corpo se
corrompe, e a alma humana não pode se corromper (…)." [8]. Além do
apetite sensível, o homem possui o apetite da vontade, que o faz inclinar-
se livremente a uma direção determinada, fazendo, por exemplo, jejuns e
sacrifícios, por amor de algo ou alguém.

Acontece que o ser humano não é só espiritual. Os anjos têm apenas a


inteligência e a vontade. O conhecimento que possuem é puramente
intelectual e o seu único apetite é a vontade. No homem, porém, tocam-
se o mundo angélico e o mundo animal, em cujos apetites sensíveis,
sobretudo, se alojam as doenças espirituais – como a gula, a luxúria, a
ira, a tristeza etc. Não é verdade, portanto, que o corpo é ruim. O
problema do ser humano – como já dito – está no composto corpo e
alma.
Para solucionar esse problema, diz Santo Tomás, citando Aristóteles, a
razão deve dominar os apetites da carne de forma política:

“Como diz o Filósofo no livro I da República: 'É preciso considerar no


animal, um poder despótico e um poder político: a alma domina o
corpo por um poder despótico, o intelecto domina o apetite por um
poder político e régio'. O poder despótico é aquele pelo qual alguém
comanda os escravos, que não têm a capacidade de resistir à ordem
do chefe, pois nada têm de próprio. O poder político e régio, por sua
vez, é aquele pelo qual se comanda a homens livres que, embora
submetidos à autoridade do chefe, têm entretanto algo próprio que
lhes permite resistir às suas ordens. - Da mesma forma se diz que a
alma domina o corpo com um poder despótico, pois os membros do
corpo não podem de nenhuma forma resistir às suas ordens, mas
imediatamente se movem ao desejo da alma, a mão, o pé, e todo e
qualquer membro que pode receber naturalmente um impulso da
vontade. Mas se diz que o intelecto, ou a razão, comanda o irascível
e o concupiscível com um poder político, porque o apetite sensível
tem algo próprio que lhe permite resistir à ordem da razão." [9]

A proposta deste curso é ensinar as almas cristãs a “amansarem" sua


carne, com a qual conviverão até o fim de suas vidas. Sem negociar os
princípios – porque o pecado é sempre pecado –, urge que aprendamos
a conduzir o nosso ser para a direção correta.

Referências

1. Suma Teológica, I, q. 77, a. 2

2. Suma Teológica, I, q. 77, a. 5


3. Suma Teológica, I, q. 78, a. 1

4. Tomás Pègues, O. P., A Suma Teológica de Santo Tomás de Aquino em


forma de Catecismo, I, XIII, 5

5. Cf. Suma Teológica, I, q. 78, a. 3

6. Suma Teológica, I, q. 78, a. 4

7. Suma Teológica, I, q. 81, a. 3

8. Suma Teológica, I, q. 75, a. 6

9. Suma Teológica, I, q. 81, a. 3, ad 2


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