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Direito Penal

I - Teoria Geral da infracção como teoria da decisão penal


 Sistema de análise do conceito de crime e a decisão sobre a imputação de
responsabilidade

Definição de crime: Como é que se decide a aplicação da lei penal aos casos concretos na
perspectiva da confrontação directa do caso com a lei já identificada? Como é que se decide o
caso de acordo com o Direito?

É esta teoria da decisão do caso em face da lei penal e do Direito que a doutrina tem buscado
na teoria geral da infracção, propondo uma ordenação lógico-valorativa da determinação
da responsabilidade penal e a partir do confronto do facto concreto com os tipos legais de
crime.

Estamos aqui a falar de uma teoria sobre a definição de crime. Assim, o que a teoria
europeia de inspiração germânica costuma propor é o estudo da essência do crime a partir
das características comuns a todas as figuras de crime contidas num código penal.

Admite-se que todas as figuras previstas no CP como crimes (ex: homicídios, roubos,
violações) justificam a aplicação da pena respectiva, na medida em que são espécies de um
mesmo género: crime. O que é o crime?

Análise dos elementos da definição de crime:


1. Facto
 O crime tem de ser necessariamente um facto e não apenas uma atitude, um estado
de espírito ou uma intenção.
 É um facto, porque tem de exibir primariamente uma objectividade indiscutível,
uma tradução no mundo exterior sobre o qual seja exercível um juízo afirmativo de
verdade.
o Decorre dos princípios da legalidade e da reserva de lei que seriam
esvaziadas de conteúdo se não se referissem à definição de factos objectivos
como crimes.
o Para um direito penal que conceda ao juiz a possibilidade de determinar as
infracções na base de comportamentos subjectivos dos agentes, a proibição
da retroactividade da lei penal não atingirá um suficiente efeito garantístico,
porque uma tal lei penal não indicará com rigor objectivo os critérios da
acção que os agentes deverão evitar e, consequentemente, os critérios que o
julgador observará posteriormente.
 Da necessidade de o crime consubstanciar um facto objectivado resultam
consequências quanto às modalidades exigidas no comportamento que viola
a norma penal, bem como a necessidade de se ter atingido uma certa fase ou
grau de desenvolvimento da conduta infractora – é necessário que uma acção de
uma certa espécie tenha ultrapassado uma fase meramente interna ou de
preparação; Basta atingir uma certa realização ainda que incompleta (art. 22.º do
CP – fase de tentativa).

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o Comprar uma arma para matar alguém ainda não é matar, mas apontar a
arma na direcção da cabeça da vítima já se pauta por ser uma tentativa de
homicídio.
 A garantia de objectividade do facto implica que comportamentos perigosos, mas
pré-delectivos, não admitam legitima defesa por não se consubstanciarem
agressões ilícitas (art. 32.º do CP) e não configuram flagrante delito nos termos do
art. 256.º do CPP.

2. Acção:
 O crime é necessariamente uma acção – Comportamento voluntário, dominando ou
dominável pela vontade. Ex: Não será matar o disparo de uma arma contra uma
pessoa devido a um choque eléctrico que produziu no agente um acto reflexo.

Qual é o sentido da voluntariedade do comportamento?


 Escola clássica ou causalista (autores como Beling e Von Lizst): Voluntariedade
o O
formal do comportamento, independentemente de a vontade se dirigir à espécie de Para a
c
acção desenhada legalmente. acção a
o
o O conteúdo da vontade ou o seu objecto concreto era questão a ser valorada vontade
n
posteriormente e não impediria a verificação da condição primeira da não releva.
t
qualificação de um facto humano como crime – qualidade de acção do facto.
e
ú
 Escola finalista (pensamento de Welzel): O conteúdo da vontade era essencial para
o d
O
a identificação da acção.
Para a co
o Não teria sentido qualificar uma acção num homicídio se o comportamento
acção a d
o
foi comandado pelo sujeito num mero sentido fisiológico quando a vontade
vontade é a
n
se dirigiu exclusivamente a outro fim – Ex: Erro de um caçador que confunde
relevante. tv
e o vulto sobre que dispara com um animal, sendo aquele na verdade uma
eo
pessoa.
n
ú
t
d
Em ambas as posições a verificação de um comportamento voluntário é um primeiro a
o
momento da qualificação de um facto como crime (natureza de comportamento voluntário d
exteriorizado). Qual a diferença entre as escolas? Compreensão da vontade e do conceito ae
voluntário significativos para o Direito Penal. Assim: o
v
 Escola clássica ou causalista: A vontade compreende-se como causa de u
o
movimentos corpóreos numa perspectiva naturalística. o
n
 Escola finalista: A vontade é uma especificidade do comportamento humano, ts
correspondendo à condução para fins ou objectivos concretos previamente ae
seleccionados. u
d
eo
b
o
A primeira consequência que advém desta diversidade de definições de vontade e de j
u
acção pauta-se por ser as características necessárias para a verificação, no primeiro e
o
momento, do juízo que decide sobre a verificação de um crime. sc
 Escola clássica ou causalista: O primeiro juízo de verificação do facto bastava-se et
com uma constatação mínima de voluntariedade. o
u
 Escola finalista: Era exigida uma acção final (real ou potencial). c
o
o
b
jn
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cr
te
Além destas divergências sobre o objecto do primeiro juízo, há uma divergência mais
profunda sempre que se venha a entender que não é necessário autonomizar este primeiro
momento ou, então, que este primeiro momento não é a constatação de factos mas já é um
juízo valorativo sobre o sentido social de um acontecimento (próximo de um juízo de
ilicitude).

Quem tender a atribuir menor relevância ao requisito da acção poderá aceitar uma
responsabilidade criminal a partir do ficcionamento de comportamentos ou generalizar
como base do comportamento criminoso a mera violação de deveres de conduta. Ou seja, se
o sentido social, o significado desvalioso do acontecimento, for um critério absorvente da
própria objectividade do facto será possível equiparar generalizadamente as acções ou
omissões e admitir como relevantes comportamentos de duvidosa voluntariedade, como os
automatismos ou inconscientes.
 Esta ruptura com a relevância de uma acção factual sobrepondo-se a ela o
significado social de um comportamento está associada a concepções que
prescindem da acção como elemento da definição de crime (concepção bipartida do
crime)
o Para estas concepções: A questão prioritária na definição de crime é a
correspondência entre o significado do facto e a negação dos valores que a
norma penal visa proteger.

As várias concepções de acção social favoreceram a ruptura com a existência da acção


defendida pelas escolas clássica e finalista, pois procuravam uma significação social das
condutas em função das condutas valoradas negativamente pelas normas penais.
 Para estas concepções o problema de base é saber se uma certa conduta tem, por
exemplo, as características negativas de uma ofensa corporal; E não tanto saber se
se verifica o grau de exterioridade e domínio da vontade suficientes para uma
qualificação como acção em geral de um certo comportamento.

Nota: Quem autonomize a acção em si mesma será conduzido a autonomizar um momento


de juízo de pura constatação fáctica de que se está perante uma conduta voluntária no caso
concreto, independentemente da sua identidade como tipo de acção, e a condicionar pelas
características da acção os restantes juízos de valor sobre o facto. Nesta perspectiva,
também a ilicitude será condicionada pela vontade da acção relativamente ao dever
jurídico – não se reduzindo à puramente objectiva lesão de bens, direitos ou interesses.

A. O que significa exigir a integração da acção na definição do crime como seu


elemento?
Afirmar que o crime é uma acção significa que a qualificação de um facto como crime
pressupõe um certo grau de objectividade – a objectividade da concretização de uma
vontade no mundo das relações humanas. Esta objectividade não pode ser ficcionada pela
lei ou pelo valor que se queira atribuir aos factos.

A acção como elemento do crime tem um valor garantístico, porque a prova no processo
penal incide sobre um tipo de acontecimento cujo conhecimento e identificação não está

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dependente de valorações – pode ser discutido através de critérios de racionalidade não
especificamente jurídicos e tem um valor de articulação dos conceitos e valorações do
Direito com a estrutura da realidade.

A acção tem uma função sistemática na definição de crime – O próprio juízo de ilicitude
não pode ser concebido apenas como lesão de bens jurídicos (momento objectivo da acção),
mas tem de incluir um momento de contrariedade da vontade da acção (momento
subjectivo da acção) ao dever jurídico emanado da norma. E a própria culpa pressupõe a
censurabilidade do comportamento previamente à censurabilidade da personalidade do
agente: Só é culpa da pessoa na medida em que seja referida a um facto censurável.

A acção tem uma função negativa ou delimitativa: Exclui-se do crime comportamentos


praticados sob coacção física (vis absoluta), comportamentos reflexos e, por vezes,
certos comportamentos inconscientes e automáticos.

B. Mas afinal, o que é uma acção para efeitos de responsabilidade penal?


Pauta-se por ser uma das mais acesas disputas entre escolas de pensamento.
 Teoria da acção causal: A acção era uma expressão corporal comandada pela
vontade e isto bastava para consubstanciar a objectividade de que depende a
qualificação do facto como crime.
 Teoria finalista: O retrato estrutural da acção que a teoria causalista pretendia
traçar era insuficiente, porque não integrava o momento de direcção da vontade
pelo agente e da orientação para um fim de um comportamento – A acção humana
era por conseguinte a acção final e os elementos subjectivos estavam
indissociavelmente associados à sua descrição objectiva.
o Welzel não entendia a finalidade como um conteúdo espiritual, de
significação, mas sobretudo uma orientação implícita do comportamento
exterior pela vontade. Assim, o momento ontológico em que se baseava a
valoração jurídica era um processo orientado para a modificação do mundo
exterior.

No fundo, ambas as teoria sustentavam uma estrutura comportamental,


independentemente da significação no mundo social, como base das valorações da
ilicitude e da culpa.

A discussão filosófica sobre a acção andou associada à teoria da vontade – pretendendo


identificar na acção as características do comportamento voluntário. Assim, a especificidade
do comportamento voluntário surge associada à capacidade de escolha entre alternativas e
de configuração de comportamentos como a realização de projectos.
 Esta configuração é um produto da compreensão da pessoa, do seu modo de
entender o comportamento próprio e alheio.
o O finalismo concebeu a acção quase sempre como um objecto empírico ou
natural, observável laboratorialmente, não dando completamente conta do
que significa a vontade humana na compreensão dos actos de cada pessoa;
Não poderia assim fazer um esqueleto de acção humana a expressão
objectiva de um comportamento voluntário.

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A compreensão do que seja efectivamente uma expressão objectiva de vontade
susceptível de ser a base de imputação de responsabilidade penal há-de exigir mais do que
a finalidade formal – Há-de exigir um conteúdo susceptível de ser compreendido pelo
próprio agente como uma sua decisão, um seu projecto para si e para qualquer pessoa
ou aquele algo que o agente poderia ter evitado

As acções intencionais exprimem os comportamentos voluntários de forma mais complexa,


porque correspondem à realização de projectos e a uma articulação entre os motivos e os
fins, embora isto não significa que os comportamentos intencionais não possam conter um
certo grau de automaticidade.
 A intenção não significa necessariamente um projecto mental vivido antes de
qualquer exteriorização, mas um sentido contextual de um certo comportamento.
Ex: Escrever à máquina, conduzir um automóvel ou tocar piano são
comportamentos intencionais que realizam projectos dos seus agentes, mas estão
envolvidos num grande grau de automaticidade.
o Diferem dos comportamentos instintivos ou de adaptação às resistências do
meio que caracterizam a actividade animal (que também são finais).

Os comportamentos negligentes (art. 15.º do CP) não revelam um projecto do sujeito, mas
assumem-se como desvios indesejados de uma direcção inicial. São ainda
comportamentos voluntários, na medida em que poderiam ser evitados pelos seus
autores se estes tivessem tido outra atitude no controlo das consequências dos seus actos.

A evitabilidade é o limiar inferior da voluntariedade, ao exprimir um momento mínimo


de escolha entre alternativas da acção.
 A construção finalística reconduz a negligência a uma finalidade potencial – a que
poderia ter existido no sentido de evitar o resultado criminoso.

C. As omissões não podem ser crimes?


É importante olharmos para o art. 10.º do CP. Continuando a ver as teses, ficamos a perceber
que ambas tiveram muitas dificuldades em enquadrar a omissão, porque nela falta o
momento exterior e causal que define a acção.
 Teoria finalista: Admitia que a omissão não seria um ente puramente normativo,
dependente da violação de um dever de agir, apelando à finalidade potencial.
o Welzel concluiu que as acções reais e possíveis são iguais na respectiva
dignidade ontológica sendo a possibilidade efectiva de acção o momento
pré-valorativo e objectivo em que se apoiaria o crime omissivo, para além
da violação do dever – Esta dimensão específica da omissão impõe que ela
só possa ser equiparada à acção onde o dever de acção for determinado por
uma relação de domínio ou de responsabilidade social institucionalmente
indiscutível com o bem jurídico.
 Ex: Se A. não trava a tempo o automóvel e atropela B. será
indiferente designar este comportamento como acção ou omissão
para efeitos da relevância penal, embora tenha características
omissivas, porque o agente é responsável pela conformação e
controlo da sua esfera de domínio da realidade. Há uma equipação

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da omissão à acção, permitindo fundi-las no conteúdo da norma
proibitiva.
 Noutras situações, a equiparação depende de uma opção legislativa
prévia relativamente à definição de esferas de responsabilidade
institucional – Ex: família, empresa, instituições sociais.

3. Tipicidade:
 O papel da tipicidade é central e comanda a ordem de valorações
o A ilicitude e a culpa são necessariamente enquadradas pela tipicidade.

Beling
 Autor clássico.
 Teorizou a tipicidade como um verdadeiro juízo autónomo.
 Crime = facto (acção) análogo ou correspondente ao facto descrito na norma que se
idealizou como ilícito (contrário ao Direito) e culposo (censurável ao seu autor).
 A tipicidade seria uma qualificação do facto criminoso, ainda não valorativa, mas
apenas lógica e classificatória.
 Numa primeira fase do seu pensamento, a tipicidade (autónoma da ilicitude)
consistiria numa verificação da correspondência do aspecto externo-objectivo
do facto à lei.
o O tipo também era descritivo de modo a que a constatação da adequação do
facto à lei era um mero juízo de facto sem ponderação valorativa. Ex:
Homicídio – A tipicidade consistiria na correspondência ao tipo de
homicídio do facto externo e objectivo pelo qual se poderia descrever a
acção de matar.
 Depois desta fase seguia-se, para o autor, a verificação da anti-juridicidade ou da
ilicitude do facto típico: Constatação da contrariedade do facto à ordem jurídica
no seu conjunto, designadamente por não existirem causas de justificação.
 Finalmente seguia-se a fase da culpa – Valorar-se-ia os momentos subjectivos do
facto, a relação de vontade psicológica do autor com o facto.
 Numa segunda fase do pensamento, Beling reconhecer que a tipicidade não era uma
valoração ou uma qualidade do facto criminoso era apenas um enquadramento ou
delimitação da ilicitude.
o O tipo passou a ser visto como a necessária referência de ilicitude – um
quadro legal da descrição do facto. A tipicidade seria o enquadramento e a
concretização das valorações da ilicitude e culpa.

 Esta evolução de pensamento este associada à distinção entre a figura do tipo


indicador de ilicitude e a do tipo ilícito.
o Tipo indicador: A tarefa de enquadramento do facto concreto no facto legal
é o primeiro momento de qualificação do facto como crime, não produzindo
verdadeiros juízos de valor. Só num segundo momento é que se iria avaliar
a contrariedade com a ordem jurídica – A tipicidade seria apenas a
verificação de um indício de crime.
o Tipo ilícito: A tipicidade passa a ser não apenas o indício, mas a fonte da
anti-normatividade e, por isso, fundamentaria a ilicitude do facto.

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A. Qual é o sentido desta discussão sobre a tipicidade?
Esta discussão resulta sobretudo de se ter concluído que existe um traço geral comum à
qualificação de qualquer facto como crime que é a verificação de uma consequência
imprescindível entre o facto descrito legalmente e o facto concreto. Causou divergência1,
mas concluímos que:
 A tipicidade não é um produto de juízos de facto sem qualquer momento valorativo.
o A tipicidade contém um momento de imputação que pressupõe uma
avaliação comparativa do sentido do facto legal e do facto concreto.

FALTA: Pag. 22 – 52

II – A acção
 A acção como limite de responsabilidade e pressuposto geral de responsabilidade
penal

Os finalistas pretendiam realizar, através da técnica de imputação penal do crime, um


modelo de responsabilidade baseado na acção livre e responsável dos indivíduos. Ou seja,
estes indivíduos agiriam decidindo em face das normas que lhes eram dirigidas e
orientando a sua conduta para os respectivos objectivos.
 Os indivíduos eram motiváveis directamente pelas proibições e susceptíveis de
responsabilidade quando tal possibilidade fosse indiscutível. Como é que sabemos
que é indiscutível? Realizavam acções racionalmente orientadas para fins. Só as
acções finais seriam objecto possível de proibição e revelariam a possibilidade de
ter sido cumprida a proibição.
o A esta racionalidade dos fins acrescia a crença de que o modo de
relacionamento do indivíduo com o sistema não dependia de motivações
especiais ou de características subjectivas próprias – estaria
uniformemente possibilitado pelo essencial de toda a acção humana e pela
racionalidade final da mesma, comum a todos os indivíduos. Mais uma vez,
onde a acção final existisse, existiria a possibilidade de o agente ser
motivável pela norma, fora das situações de erro.
 A acção final não dependia de contextos culturais ou sociais, nem
aspectos individuais específicos, pois a acção era vista como
estrutura empiricamente observável e o juízo de culpa não
dependia das características individuais do agente reveladas
na acção; Dependia apenas de uma censurabilidade segundo
critérios ético-sociais. Portanto, introduziam-se na acção os
momentos subjectivos, esquematizados e depurados das
complexidades individuais, subtraindo-se à culpa qualquer
momento de atitude. A culpa tornou-se um juízo normativo e
objectivado.

Assim, a responsabilidade penal baseava-se no pressuposto de coincidência entre a


racionalidade individual e social e na possibilidade de funcionamento preventivo-geral do
sistema penal. Portanto, há no pensamento finalista um prenúncio do funcionalismo (que

1 Pags. 22 e 23 do livro da prof.

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concebe a definição do crime em função dos fins da sociedade ou de uma necessidade de
estabilização das expectativas sociais acerca do crime e da pena).
 Na perspectiva funcionalista, a acção é definida como a referência do critério de
eficácia possível das normas – aquilo que é motivável pelas normas. Jakobs diz-nos
que a produção de resultados, evitável individualmente, é o conceito superior
para agir doloso e negligente.
o O conceito para a responsabilidade penal é o conceito adequado ao
funcionamento preventivo-geral das normas.

O pensamento finalista permite que se chegue a esta posição, apesar de não este ponto de
partida.

MFP: A acção tem sido o conceito que exprime o pressuposto básico da responsabilidade
por culpa, condicionando o tipo de comportamento que pode ser designado por crime. A
necessidade de um conceito que cumpra esta função parece impor-se para quem entenda
como questão fundamental do sistema penal a garantia de uma atribuição de
responsabilidade, baseada na autonomia dos destinatários das normas (não se bastando
com a legitimidade derivada da prossecução de fins preventivos, de fins sociais, associada à
protecção de quaisquer bens jurídicos).
 A acção é um critério essencial de um sistema que faz depender a responsabilidade
penal de uma ideia de autonomia e responsabilidade pessoal.
o Este conceito básico na construção dos pressupostos de responsabilidade
penal correspondem à legitimidade de responsabilização conferida
apenas pelos fins supra-individuais da intervenção penal.

 Comportamentos inconscientes e os automatismos. Responsabilidade penal e


complexidade crescente da acção social

Até onde se pode aceitar a qualificação de um comportamento como acção? Onde a


consciência ou o domínio do corpo estiverem perturbados existirá ainda assim uma
acção?

Uma resposta para estas questões tem sido procurada a partir de dois prismas:
1. Corresponde ao conhecimento científico e foi acentuado pelo próprio pensamento
finalista – A finalidade caracterizadora da acção não exigiria uma consciência
reflexiva e controladora de todo o desenrolar de um comportamento.
o As acções desenvolvidas com alguma automaticidade seriam também
acções finais. Esta finalidade inconsciente seria caracterizadora de uma
acção humana por constituir um produto de experiência e de aprendizagem.
Portanto, seria controlável normativamente.

2. A questão essencial foi saber em que termos a responsabilização penal poderá


legitimamente apoiar-se em momentos do comportamento anteriores ao acto
criminoso, sem cair numa antecipação da criminalização relativamente ao acto nem
ter de aceitar uma culpa pela personalidade ou pela condução da vida (que tendo a
colidir com os princípios da legalidade e do direito penal do facto).

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o A resposta a esta questão acentuaria certos modos tipificáveis de
relacionamento entre o acto inconsciente ou automático e momentos
anteriores identificáveis (ou tipificáveis) que corresponderiam a violação de
deveres cognoscíveis pelo agente – Ex: Ingerir bebidas alcoólicas
conjuntamente com certos medicamentos; Conduzir tomando
medicamentos que diminuam acentuadamente os reflexos.

A prof. entende que estes dois prismas suscitam problemas e alternativas dogmáticas
importantes. Há uma contraposição notória: Posição de generalizada responsabilização
penal de comportamentos automáticos e de algumas perturbações vs posição mais
moderada que, nos casos de falta de consciência (ex: provocada pela embriaguez), restringe
a intervenção penal a certos tipos de casos em função de um critério distintivo.

1. Automatismos:

Posição de generalizada responsabilização


penal
 Stratenwerth: Pode haver acção desde
que exista dirigibilidade inconsciente –
O processo global em que o acto se
enquadra seja explicado pela
experiência.
 Jakobs: Teoria da previsibilidade –
Decisivo será poder afirmar a concreta
evitabilidade individual do
comportamento; Possibilidade de
controlo do automatismo pela
consciência.

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