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MATERIAL CEDIDO PARA USO EXCLUSIVAMENTE DIDÁDICO DURANTE AULA DE SEMIOLOGIA

PROTOCOLO

AZIA / DISPEPSIA

INTRODUÇÃO
Azia e dispepsia são sintomas comuns que se originam no trato gastrointestinal superior. Os pacientes geralmente
descrevem os sintomas da azia e má digestão como uma sensação de queimação que geralmente se origina na área
subesternal e irradia em direção ao pescoço ou garganta, normalmente causando gosto ácido ou amargo na boca. A azia,
de forma isolada e não recorrente, é considerada um sintoma benigno com evolução autolimitada, porém, em alguns casos,
está associada a doenças mais graves, que requerem encaminhamento ao médico. Desta forma, o farmacêutico deverá
distinguir entre as situações que requerem intervenção farmacêutica, daquelas que requerem encaminhamento a outros
profissionais ou serviços de saúde.

ACOLHIMENTO DA DEMANDA
Acolher significa receber bem, dar conforto, escutar e tornar-se responsável pelo atendimento da queixa apresentada pelo
paciente, ou no mínimo, auxiliá-lo na escolha do melhor itinerário terapêutico. O farmacêutico deve identificar situações
que requerem intervenção ou atendimento rápido do paciente por outro profissional ou serviço. Uma vez que, para o alívio
da azia, habitualmente o indivíduo acometido opta pelo autocuidado, é fundamental que o farmacêutico acolha esta
demanda de maneira adequada, a fim de discernir situações que requerem intervenção daquelas que indicam necessidade
de atendimento do paciente por outro profissional ou serviço de saúde.

ANAMNESE
Na prática clínica, nem sempre é possível prever a causa da azia ou má digestão com base apenas na avaliação dos
sintomas, porque os pacientes podem não descrever adequadamente o que realmente sentem. Além disso, há uma
sobreposição considerável dos sintomas. Azia e má digestão também podem ocorrer em associação com outras condições
de saúde que não são autolimitadas, como doença do refluxo gastroesofágico e úlcera péptica, e podem se sobrepor com
os sintomas relacionados à síndrome do intestino irritável. No entanto, o tratamento com medicamentos isentos de
prescrição é adequado para a maioria dos pacientes com sintomas sugestivos de azia e / ou má digestão. Assim, a
avaliação do paciente é imprescindível para determinar se a condição é autolimitada ou se o indivíduo deve ser
encaminhado para avaliação de outro profissional. Os sinais e sintomas característicos são:

• dor abdominal superior, queimação ou desconforto


• plenitude pós-prandial
• saciedade precoce
• enjoos
• náusea/ ou vômitos
• azia
• eructação
• distensão abdominal
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Na anamnese, também deve ser investigado o uso de medicamentos que podem causar azia e má digestão, expostos no
Quadro 1 abaixo.
QUADRO 1 - Medicamentos que podem causar azia e má digestão
• Suplementos de potássio • Glicocorticoides
• Digitálicos • Niacina
• Ferro • Genfibrozila
• Teofilina • Narcóticos
• Antibióticos orais (especialmente ampicilina e • Colchicina
eritromicina) • Quinidina
• Anti-inflamatórios não esteroides • Estrógenos
• Levodopa
Fonte: Elaborado pelo autor (2018)

PLANO DE CUIDADO
A partir da análise das informações coletadas, o farmacêutico, excluindo os casos de encaminhamento identificados na
anamnese farmacêutica, procederá à seleção de condutas e elaboração de seu plano de cuidado, de forma compartilhada
com o paciente, a fim de atender as suas necessidades e problemas de saúde.

O plano de cuidado do paciente envolve a seleção de condutas para promover o alívio ou resolução da azia e má digestão,
proporcionando bem-estar e manutenção das atividades da vida diária. O plano contém as ações pactuadas entre o
paciente e o farmacêutico, embasadas nas melhores evidências disponíveis, e de forma coordenada com o restante da
equipe de saúde envolvida no cuidado.

No atendimento da demanda “azia e má digestão” são possíveis as seguintes condutas (CFF, 2013a, 2013b):

• Encaminhamento ao médico ou a outro serviço de saúde;

• Prescrição de terapia não farmacológica;

• Prescrição de terapia farmacológica;

• Outras intervenções relativas ao cuidado à saúde do paciente.

As metas terapêuticas consistem na redução dos sintomas gástricos, da sensação de queimação e desconforto pós-
prandial, bem como na prevenção de novos episódios.

TRATAMENTO
As escolhas terapêuticas devem basear-se na frequência, duração e gravidade dos sintomas, no custo da medicação,
potenciais interações entre os medicamentos e preferências do paciente.
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ALGORITMO DE TRATAMENTO

FONTE: Adaptado de Handbook of Nonprescription Drugs -16th Ed.2009

TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO


A adoção de medidas não farmacológicas é útil para reduzir o desconforto causado pela azia, prevenir complicações e
evitar a utilização desnecessária de medicamentos. Dentre elas, têm-se:

• Evitar alimentos, bebidas e atividades associadas a um aumento da frequência e gravidade dos sintomas.
• Se possível, evitar o uso de medicamentos que possam agravar a azia ou sintomas dispépticos.
• Evitar comer grandes refeições.
• Parar ou reduzir o consumo de tabaco.
• Perder peso, caso estiver com excesso de peso e não for gestante.
• Usar roupas soltas.
• Evitar gatilhos, como: excesso de lactose, compostos cítricos, picantes, ou alimentos com alto teor de gordura, bebidas
com cafeína ou gaseificadas, sorbitol (encontrado em doces sem açúcar e goma).
Se estiverem presentes sintomas noturnos:
▪ Evitar deitar-se dentro de 3 horas de uma refeição.
▪ Elevar a cabeça da cama usando travesseiro de espuma.
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TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
Para o tratamento farmacológico da azia, os principais medicamentos isentos de prescrição são os antiácidos isolados e
em combinações. Na Lista de Medicamentos Isentos de Prescrição (LMIP) é clara a restrição aos inibidores da bomba de
prótons, que são tarjados independentemente da dose ou da indicação. Já em relação aos antagonistas dos receptores
H2, existe uma lacuna, uma vez que não são restritos, mas são tarjados no Brasil, necessitando de prescrição médica. No
Quadro abaixo são apresentados os medicamentos utilizados no tratamento da azia, sua respectiva posologia, orientações
importantes aos pacientes, situações especiais de uso e contraindicações.

Antiácidos Apresentação e posologia usual Comentário


Risco de constipação; A capacidade de
Hidróxido de Alumínio Comprimido 230 mg: 460-920 mg VO, 1h absorção de hidróxido de alumínio e a sua
após as refeições e ao deitar permanência no trato gastrointestinal pode
retardar a absorção de vitaminas e alguns
medicamentos (Ex., tetraciclinas)
Suspensão 61,5 mg/ml – 300-600 mg, 4-7 Antiácidos devem ser utilizados com cautela
x/dia em pacientes com doença renal, histórico de
úlcera gastrointestinal, gestantes e suspeita
de apendicite.
O uso de antiácidos pode mascarar
sangramento gastrointestinal causado pelo
uso de AINEs.
Doses altas e o uso prolongado podem causar
hipersecreção gástrica e efeito rebote.

Hidróxido de Suspensão 400 mg/ 5 ml: 5-15 ml VO, O uso excessivo, particularmente na presença
Magnésio conforme necessário, 1h após as refeições, de insuficiência renal, pode levar para
até 4 x/dia. hipermagnesemia, com consequências
cardiovasculares e neurológicas.
Age como laxantes osmóticos; superado por
co-formulação com hidróxido de alumínio.
Antiácidos devem ser utilizados com cautela
em pacientes com doença renal, histórico de
úlcera gastrointestinal, gestantes e suspeita
de apendicite.
O uso de antiácidos pode mascarar
sangramento gastrointestinal causado pelo
uso de AINEs.
Doses altas e o uso prolongado podem causar
hipersecreção gástrica e efeito rebote.
Hidróxido de Alumínio Comprimido mastigável (dimeticona 153 mg Antiácidos devem ser utilizados com cautela
+ Hidróxido de + hidróxido de alumínio 200 mg + hidróxido em pacientes com doença renal, histórico de
Magnésio de magnésio 25mg) (Maalox®) – 2-4 cp 4 úlcera gastrointestinal, gestantes e suspeita
x/dia de apendicite.
O uso de antiácidos pode mascarar
sangramento gastrointestinal causado pelo
Pastilha (hidróxido de magnésio 185 mg + uso de AINEs.
carbonato de cálcio 231,5 mg + hidróxido de Doses altas e o uso prolongado podem causar
alumínio 178 mg) – 1-2 pastilhas/dia. hipersecreção gástrica e efeito rebote.

Hidróxido de magnésio 125 mg + carbonato


de cálcio 50 mg + hidróxido de alumínio 180
mg - Uma a duas colheres das de
sobremesa (10 a 20 mL) 30-60 min após às
refeições e
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à noite, ao deitar-se. A dosagem poderá ser


aumentada ou reduzida, de acordo com as
necessidades do paciente.

Dimeticona 153 mg + hidróxido de alumínio


200 mg + hidróxido de magnésio 25mg (Ma-
alox®) - 1-2 colheres de sobremesa, 4 x/dia.
Cada colher de chá corresponde a 5 mL, en-
quanto que de sobremesa corresponde a 10
mL.
Antiácidos devem ser utilizados com cautela
Sal de fruta ENO® Bicarbonato de sódio + carbonato de sódio + em pacientes com doença renal, histórico de
ácido cítrico (2,3g + 0,5g + 2,25g / 5g) – 1-2 úlcera gastrointestinal, gestantes e suspeita
envelopes dissolvidos em 2/3 de um copo de apendicite.
com água. O uso de antiácidos pode mascarar
sangramento gastrointestinal causado pelo
uso de AINEs.
Doses altas e o uso prolongado podem causar
hipersecreção gástrica e efeito rebote.
Antiácidos devem ser utilizados com cautela
Estomazil® Bicarbonato de sódio + citrato de potássio + em pacientes com doença renal, histórico de
citrato de sódio + ácido cítrico + carbonato úlcera gastrointestinal, gestantes e suspeita
de sódio /5 g - 1-2 envelopes dissolvidos em de apendicite.
2/3 de um copo com água. O uso de antiácidos pode mascarar
sangramento gastrointestinal causado pelo
uso de AINEs.
Doses altas e o uso prolongado podem causar
hipersecreção gástrica e efeito rebote.
Antiácidos devem ser utilizados com cautela
Sonrisal® Carbonato de sódio 0,4 g + ácido em pacientes com doença renal, histórico de
acetilsalicílico 0,325 g + ácido cítico 1,5 g + úlcera gastrointestinal, gestantes e suspeita
bicarbonato de sódio 1,7 g / comprimido ou de apendicite.
envelope – 1-2 cp ou envelopes quando O uso de antiácidos pode mascarar
necessário. sangramento gastrointestinal causado pelo
uso de AINEs.
Doses altas e o uso prolongado podem causar
hipersecreção gástrica e efeito rebote.
LuftaGastroPro ® Alginato de sódio 1000 mg + bicarbonato de Antiácidos devem ser utilizados com cautela
potássio 200 mg 5 a 10 mL após as três em pacientes com doença renal, histórico de
principais refeições do dia e antes de dormir úlcera gastrointestinal, gestantes e suspeita
de apendicite.
O uso de antiácidos pode mascarar
sangramento gastrointestinal causado pelo
uso de AINEs.
Doses altas e o uso prolongado podem causar
hipersecreção gástrica e efeito rebote.
Bloqueadores H2 Apresentação e posologia usual Comentário
Ranitidina Profiláxia, 75-150 mg 30 a 60 min antes das Risco de dor abdominal, constipação, diarreia
refeições ou bebidas; máx 300 mg/dia. e dor de cabeça.
Tratamento, 75-150 mg 1 ou 2x/dia; máx 300
mg/dia.
Antiflatulento Apresentação e posologia usual Comentário
Simeticona Simeticona 125 mg cáps 125 a 250 mg por Risco de diarreia, náusea, regurgitação e
via oral, conforme necessário, após as vômito.
refeições e à hora de dormir; máx 500 mg /
24 horas; 40 mg comp 125 por via oral 3
vezes ao dia, conforme necessário, após as
refeições e 1 comprimido à hora de dormir
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para fornecer alívio durante a noite; máx 500


mg / 24 horas.
Fitoterapia Apresentação e posologia usual Comentário

Peumus boldus Peumus boldus 67 mg ou 0,67 ml/10 ml;


Capsulas 67 mg: 1 caps 4 x/dia (6/6h);
Flaconetes 10 ml ou soluções 150 ml (0,67
ml/10 ml): 10 ml ou 1 flaconete, 4 x/dia.
Legenda: VO: via oral
Fonte: Elaborado pelo autor (2018)

AVALIAÇÃO DOS RESULTADOS SEGUNDO A OTICA DO FARMACEUTICO

Para avaliação dos resultados, o farmacêutico deverá reavaliar os sinais/sintomas associados à azia e má digestão, sendo
importante a investigação daqueles considerados de alerta para encaminhamento.

Além disso, deverá realizar acompanhamento do paciente para identificação precoce de problemas relacionados à
segurança dos medicamentos. Pacientes que apresentam eventos adversos devem ser orientados a suspender o
medicamento e encaminhados a outro profissional de saúde.

A adesão ao tratamento deve ser avaliada pelo farmacêutico antes de considerar falha na terapia.

No Quadro 2 abaixo é apresentado o perfil de cada classe de medicamentos utilizados no tratamento da azia.

QUADRO 2 – PERFIL DE AÇÃO DOS MEDICAMENTOS UTILIZADOS NO TRATAMENTO DA AZIA E MÁ DIGESTÃO


Medicamento Início de ação Duração de ação Alívio dos sintomas
Antiácidos <5 minutos 20-30 minutos Excelente
BH2 30-45 minutos 4-10 horas Excelente
BH2 + antiácidos <5 minutos 8- 10 horas Excelente
BH2: Bloqueador de H2.
Fonte: adaptado Handbook of Nonprescription Drugs -16th Ed.2009

ENCAMINHAMENTO
O farmacêutico deve realizar o encaminhamento a outros profissionais de saúde no momento do acolhimento da demanda
sempre que o paciente apresentar um dos seguintes sinais e/ou sintomas de alerta:

• Idade superior a 45 anos se os sintomas se desenvolverem pela primeira vez


• Os sintomas são persistentes (mais de 5 dias) ou recorrentes
• A dor é severa
• Hematêmese ou melena
• A dor piora ao esforço
• Vômito persistente
• Falha terapêutica
• Presença de reação adversa importante
• Perda de peso associada
• Crianças com idade até 12 anos
• Gestante
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REFERÊNCIAS
Silva FM. Dispepsia: caracterização e abordagem. Rev Med (São Paulo). 2008 out.-dez.;87(4):213-23.

Talley NJ, American Gastroenterological Association. American Gastroenterological Association medical position statement: evaluation
of dyspepsia. Gastroenterology. 2005 Nov;129(5):1753-5 full-text

Talley NJ, Vakil NB, Moayyedi P. American gastroenterological association technical review on the evaluation of dyspepsia.
Gastroenterology. 2005 Nov;129(5):1756-80

National Institute for Health and Clinical Excellence (NICE). Dyspepsia and gastro-esophageal reflux disease: Investigation and
management of dyspepsia, symptoms suggestive of gastro-esophageal reflux disease, or both. NICE 2014 Sep:CG184 PDF

Scottish Intercollegiate Guidelines Network (SIGN). Dyspepsia: a national clinical guideline. SIGN 2003 Mar PDF or at National Guideline
Clearinghouse 2004 Jan 26:3723, guideline reaffirmed 2007

BLENKINSOPP, A.; PAXTON, P.; BLEKINSOPP, J. Symptoms in the Pharmacy: A Guide to the Management of Common Illness.
[s.l: s.n.].

CONSELHO FEDERAL DE FARMÁCIA. Resolução no 586 de 29 de agosto de 2013. [s.l: s.n.].


CONSELHO FEDERAL DE FARMÁCIA. Resolução no 585 de 29 de agosto de 2013. [s.l: s.n.].

KENNEDY, E.; CLYDE, J. Responding to Minor Ailments. [s.l.] NHS Education for Scotland, 2008.
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Autores:

Alcindo de Souza Reis Junior


Aline de Fátima Bonetti
Bruna Aline de Queirós Bagatim
Cínthia Caldas Rios Soares
Fernanda Coelho Vilela
Fernando Henrique Oliveira de Almeida
Inajara Rotta
Livia Amaral Alonso Lopes
Natália Fracaro Lombardi
Thais Teles de Souza
Walleri Christini Torelli Reis
Wallace Entringer Bottacin

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