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BÁSICAS EM
COZINHA
Introdução
Sabemos que a alimentação é um fator importante de sobrevivência e que
precisamos nos preocupar com o que preparamos e ingerimos, mantendo
uma boa saúde e qualidade de vida; entretanto, essa preocupação não
advém de ideias modernas. Podemos encontrar as civilizações antigas
interagindo com os alimentos e os consumindo da forma que achavam
mais correta. Porém, alimentar-se nunca foi somente um aspecto de
sobrevivência, mas também a perspectiva de se divertir e de ostentar
sua posição social, bem como riqueza e requinte.
O ato de comer, de cozinhar e de encantar com o que se come se
transformou ao longo do tempo, mudando, principalmente, a forma
como o alimento é percebido e qual a sua importância para determi-
nado grupo social. Sendo assim, podemos perceber que as relações
encontradas entre os povos antigos e os alimentos, ou com o momento
de consumi-los, tinha significados importantes, e estes podem nos fazer
compreender melhor aquela sociedade.
Neste capítulo, você terá um panorama geral de como aqueles in-
divíduos agiam, interagiam e se portavam, não só perante a mesa e o
alimento, mas também diante de um grupo social, amigo ou inimigo.
Você também poderá compreender a alimentação, que nos permite
entender o indivíduo e a sociedade em que ele vive, e como nossa so-
ciedade chegou até esse patamar, percebendo as pequenas e intrínsecas
relações entre elas.
2 História da gastronomia
Figura 1. Proto-homem.
Fonte: Neveshkin Nikolay/Shutterstock.com.
História da gastronomia 3
Crescente fértil é a região, também conhecida como Mesopotâmia (entre rios), onde
hoje podemos encontrar países como Irã, Iraque, Turquia, Síria, Líbano, Israel e Jordânia.
Nessa região, foram encontradas espécies de vegetais e animais que posteriormente
foram domesticadas, como o trigo e a cevada e a cabra e o porco, por exemplo
(FRANCO, 2010).
História da gastronomia 5
A partir dessa maneira peculiar de vida, que proporcionou uma vida cita-
dina, encontramos traços de diversas atividades, tendo como mais interessante
uma forma organizada de hierarquia da alimentação, sendo na Mesopotâmia,
por exemplo, encontrado o primeiro registro escrito da profissão de cozinheiro
e as primeiras receitas (FREIXA; CHAVES, 2017).
Esses registros indicavam o que se consumia na Mesopotâmia e quais
eram as formas mais corretas de prepará-los, algo muito semelhante aos
receituários modernos. Sabe-se também que já eram feitos grandes banquetes
nesse período, os quais eram seletos aos mais abastados. Normalmente, esses
banquetes eram realizados juntos a celebrações religiosas nos templos locais
ou nas casas reais (FREIXA; CHAVES, 2017).
Sabe-se também que os mesopotâmicos aprimoraram as técnicas de con-
servação dos alimentos, utilizando meios, como a defumação, a salga ou a
imersão em óleo de oliva. Produtos como o mel e o óleo de oliva eram guar-
dados em grandes jarros. Além disso, os mesopotâmicos foram os primeiros
a fabricarem a cerveja e o vinho (FREIXA; CHAVES, 2017).
Já os egípcios tinham um caráter mais religioso à mesa. Devido à sua
crença em vida após a morte, os principais registros foram encontrados nos
sarcófagos e nas tumbas, que apresentavam os aspectos de vida do indivíduo
ali sepultado. Dessa forma, tudo o que era compreendido como um ato da vida
era representado nas iconografias mortuárias. Entretanto, as observações de
Tallet (2005 apud FREIXA; CHAVES, 2017) são passíveis de análise. Estas
falam sobre os egípcios terem conhecimento nutricional dos alimentos, o que
fez com que eles se alimentassem de forma bastante saudável.
Outro fato importante é como a divisão social no mundo egípcio se acen-
tuava em relação aos mesopotâmicos. Os mais pobres, no Egito antigo, consu-
miam o que estava mais à mão, produzindo muitos dos produtos, como cereais
e leguminosas, frutas e a carne de animais — principalmente caprinos e ovinos.
Além disso, estes tinham vários tipos de temperos e utilizavam muito o peixe,
que era encontrado em grande quantidade no Rio Nilo. Os mais abastados,
por outro lado, conviviam com banquetes, nos quais as iguarias dominavam
o cardápio. As aves eram amplamente consumidas, assim como os produtos
feitos à base de farinhas diversas (FREIXA; CHAVES, 2017).
Os egípcios, ao contrário do que se poderia pensar, já utilizavam utensílios,
como panelas e frigideiras feitas em barro ou metal, além de alguns talheres.
Eles também utilizavam os fornos de barro, o que conferiu a capacidade
de produzir pães no formato convencionado atualmente. A conservação do
alimento também foi aprimorada por esse povo, que salgava, secava ao sol, ou
então guardava na própria gordura do animal, assim como o confit é feito hoje.
6 História da gastronomia
Não seria estranho que outros grupos sociais, além dos contemporâneos,
mesopotâmicos e egípcios, também utilizassem a religião como base de seus
hábitos alimentares. Sendo assim, tanto no oriente próximo, com os hebreus,
quanto no oriente distante, com chineses, as crenças dominaram o mundo
gastronômico. Os hebreus ditavam sua alimentação a partir dos conceitos
estipulados pelo seu livro sagrado (Torá), enquanto os chineses seguiam uma
filosofia milenar que prega a essência dos opostos (Yin e Yang), como o frio
e o quente e o equilíbrio entre eles.
Já no Ocidente, o mediterrâneo se caracterizou por um complexo emara-
nhado de pessoas, distintas entre si, mas que acabaram se conectando devido
aos elementos alimentares que eram inseridos nas sociedades ali presentes e
pelas trocas culturais estabelecidas entre eles. Os gregos, por exemplo, tinham
hábitos alimentares muito semelhantes aos nossos, os quais foram transmitidos
para os romanos, formulando as bases da cozinha ocidental, sendo assim, os
gregos acabaram tendo hábitos alimentares adquiridos a partir dessas trocas
mediterrâneas.
Os romanos, por sua vez, adquiriram seus hábitos a partir de interações
realizadas com os gregos durante a dominação do Sul da Itália. Dessa domi-
nação, os romanos aperfeiçoaram sua rudimentar cozinha, como acreditavam
os gregos. Nesses movimentos internos, entre romanos e gregos, a função de
cozinheiro foi de fato consumada, gerando o que podemos chamar de origem
da cozinha ocidental. A partir desse momento, a cozinha começou a sofrer
mutações, não só no ocidente, mas por todos os grupos humanos espalhados
pelo mundo.
a França ganhou com seus cozinheiros, os quais deram vida à chamada Idade
de Ouro da cozinha francesa (FREIXA; CHAVES, 2017).
A gastronomia contemporânea e
uma nova alimentação
A era moderna foi um período de grande debate dentro da sociedade. A
burguesia em ascensão cuidadosamente articulou um esquema político que
derrubou a monarquia francesa e preocupou as demais monarquias europeias,
que começaram a se comprometer com as classes mais baixas ou menos
importantes, como a burguesia.
Na França, a revolução contribuiu para uma transformação alimentar e
de hábitos alimentares, principalmente por permitir que grandes cozinheiros
pudessem criar seus espaços. Com a queda da nobreza, muitos cozinheiros
perderam seus empregos e precisaram abrir o seu restaurante ou trabalhar nos
que já existiam. Isso proporcionou uma nova concepção de como a cozinha
deveria funcionar, servir e encantar. A burguesia abastada também contribuiu
para a modernização dos restaurantes, os quais se tornaram mais exigentes
e refinados.
As mudanças sociais forçaram o ramo da alimentação a se reinventar.
Com essas mudanças, grandes nomes passaram a ditar as normas e a criar as
técnicas, que mais tarde seriam essenciais para a gastronomia. Carême, que já
era renomado antes da revolução, manteve-se importante, fundando um novo
momento da cozinha francesa, que acabaria por guiar a gastronomia mundial.
Parte desses elementos foi confirmada e escrita por aqueles que se tornaram
os primeiros críticos gastronômicos da história, responsáveis também por
representar as sensações, os sabores, as técnicas e o requinte que essa nova
gastronomia passou a ter. Isso também incentivou a melhoria dos restaurantes,
que passaram a buscar o padrão e a qualidade descritos pelos grandes críticos
da época.
Outros fatores contribuíram para que se criasse a gastronomia que conhe-
cemos hoje, mas o principal foi a associação do restaurante ao hotel, momento
em que a pessoa poderia agregar não só o descanso, mas também a alimentação
de boa qualidade, o requinte e a praticidade. Quem mais se destacou nesse
ramo foi Escoffier, que gerenciou a cozinha de um dos hotéis mais elegantes
do mundo, além de ser patrono do sistema de brigadas de cozinha, na qual
delimitava a função de cada membro da produção, permitindo a melhor ad-
ministração do chefe de cozinha.
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Leituras recomendadas
ABREU, E. S. et al. Alimentação mundial: uma reflexão sobre a história. Saúde e Sociedade,
São Paulo, v. 10, n. 2, p. 3-14, ago./dez. 2001.
FLANDRIN, J. L.; MONTANARI, M. História da alimentação. 7. ed. São Paulo: Estação
Liberdade, 1998.
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