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A soberania da vírgula
A vírgula é, e não por acaso, o corpo e a alma da pontuação. Quem não a ama não
a domina, e quem não a domina não escreve direito. A bem da verdade, os outros sinais,
em sua maioria, têm comportamento burocrático, não sendo difícil aprender a empregá-
los.
O contrário ocorre com a vírgula, cuja variedade de emprego é um desafio
constante.
Já por isso, quando a tratam como parte igual do conjunto, não dando o devido
desenvolvimento a seu estudo, alguns autores pecam por omissão, pois, na verdade, o
conjunto é quase inteiramente ocupado pela vírgula.
Uma prova? Quantas vezes ela aparece no parágrafo acima? 14. E quantos pontos?
5. Não há dúvida: a vírgula, carro-chefe de todos os pontos, reina soberana em qualquer
texto.
Até mesmo os poemas em versos livres da fase revolucionária do Modernismo, que
tentaram prescindir da pontuação, jamais conseguiram eliminá-la.
Para que serve o ponto, mesmo? Para fechar período, fechar parágrafo, fechar
texto. E acabou. É apenas um assistente: quando a vírgula vai embora, o ponto fecha a
porta.
Para que serve o ponto de interrogação? Para marcar frases interrogativas. Mas o
pobre nem consegue distinguir interrogação total de interrogação parcial.
E para que serve a vírgula? Nem ela mesma, se pudesse responder, teria certeza
total de quantas funções pode exercer, sintáticas, lógicas, estilísticas. Uma enormidade.
Mais uma prova? Quantos livros existem dedicados ao ponto, ou ao ponto de
interrogação?
Nenhum, porque não há mais que dois ou três parágrafos a escrever sobre eles.
E sobre a vírgula? Artigos, capítulos de livros, livros inteiros.
Por isso, se ela pudesse falar, diria que um livro com um nome ao estilo de Manual
de Pontuação seria impróprio e incoerente: por mérito e justiça, deveria ser substituído
por Manual de Virgulação.
CHOCIAY, Rogério. A soberania da vírgula. Revista Língua Portuguesa. Disponível em:
< http://revistalingua.uol.com.br/textos.asp?codigo=11911>.
4) No período “Já por isso, quando a tratam como parte igual do conjunto, não dando o
devido desenvolvimento a seu estudo, alguns autores pecam por omissão”, a conjunção
em destaque poderia ser substituída, sem prejuízo ao sentido do período, por:
a) Logo
b) Sempre que
c) À medida que
d) Assim que
e) No entanto
O gerúndio é só pretexto
Ele chegou furtivo, espalhou-se feito gripe e virou uma compulsão nacional. Em
menos de uma década, o gerundismo cavou pelas bordas seu lugar sob os holofotes do
país. É o Paulo Coelho da linguagem cotidiana. Nas filas de banco, em reuniões de
empresas, ao telefone, nas conversas formais, em e-mails e até nas salas de aula, há
sempre alguém que "vai estar passando" o nosso recado, "vai estar analisando" nosso
pedido ou "vai poder estar procurando" a chave do carro. É fenômeno democrático, sem
distinção de classe, profissão, sexo ou idade. O gerundismo já foi alvo de tantos e
calorosos debates, que mesmo a polêmica em torno dele pode estar virando uma espécie
de esporte de horas vagas, quase uma comichão a que poucos parecem indiferentes.
Embora não haja explicação única para a origem do fenômeno, sua popularidade chama
a atenção não só de especialistas da língua, mas de empresários e ouvidos sensíveis a
saraivadas repetidas do mesmo vício.
Principalmente porque, por trás da aparente certeza sintática, podemos estar diante
de um fenômeno com implicações semânticas e pragmáticas - seu sentido, alargado ao
dia-a-dia, pode dizer algo sobre a própria cultura brasileira, nem sempre lembrada quando
se discute o assunto.
O uso repetitivo do gerúndio tem nome próprio: endorréia. Sim, a palavra é parente
da diarréia, para alegria dos humoristas. Mas a vítima do gerundismo não é o gerúndio
isolado, in natura, é a estrutura "vou estar + gerúndio", uma perífrase (locução com duas
ou três palavras).
Em si, a locução "vou estar + gerúndio" é legítima quando comunica a idéia de uma
ação que ocorre no momento de outra. A sentença "vou estar dormindo na hora da
novela" é adequada ao sistema da língua, assim como quando há verbos que indiquem
ação ou processo duradouros e contínuos: "amanhã vai estar chovendo" ou "amanhã vou
estar trabalhando o dia todo", por exemplo.
Aquilo que se deu o nome de gerundismo se dá quando nós não queremos
comunicar essa idéia de eventos ou ações simultâneas, mas antes falar de uma ação
específica, pontual, em que a duração não é a preocupação dominante. A coisa piora
mesmo quando a idéia de continuidade nem deveria existir na frase. "Vou falar" narra algo
que vai ocorrer a partir de agora. "Vou estar falando" se refere a um futuro em andamento
- "estar" dá idéia de permanência no tempo. Nesses casos, o gerúndio é usado em
situações mais adequadas ao uso do infinitivo (aquele que não dá idéia de ação em
curso, mas de assertiva). É no mínimo forçado falar de uma ação isolada, que se
concluiria num ato, como se fosse contínua. Quando respondemos ao telefone "vou estar
passando o recado", forçamos a barra para que o recado, que potencialmente tem tudo
para ser dado, não tenha mais prazo de validade.
PEREIRA, Luiz Costa. O gerúndio é só pretexto. Revista Língua Portuguesa. Disponível em:
< http://revistalingua.uol.com.br/textos.asp?codigo=10887>.
I. No texto, as palavras “diarréia”, “língua” e “vício” são acentuadas pelo mesmo motivo,
por serem palavras paroxítonas terminadas em ditongo.
II. No texto, as palavras “sintática”, “semântica” e “gerúndio” são acentuadas pelo mesmo
motivo, por serem palavras proparoxítonas.
III – No texto, a palavra “trás” não deveria ser acentuada, pois se trata de um monossílabo
tônico.