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COM
PARTÍCULAS
“PRIMAS” DOS
ELÉTRONS
PODE MUDAR
RUMOS DA
FÍSICA
GUERRA
FRACASSADA
TRATAR O USO DE DROGAS COMO CASO DE POLÍCIA É
COMPROVADAMENTE INEFICAZ, CARO E PERIGOSO PARA A
POPULAÇÃO — SOBRETUDO PESSOAS NEGRAS E PERIFÉRICAS.
ENTENDA O QUE PODE (E PRECISA) MUDAR NO BRASIL
COMPOSIÇÃO
NOVEMBRO DE 2023
03
CAPA
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CIÊNCIA
ERRATA: Na reportagem Contagem regressiva para viver, publicada na edição 379, constava que o médico Ronaldo Honorato, do Núcleo de Transplantes
do Instituto do Coração (InCor), em São Paulo, é cirurgião vascular; na verdade, ele é cirurgião cardiovascular.
SOCIEDADE
TEXTO Marília Marasciulo EDIÇÃO Luiza Monteiro ILUSTRAÇÃO Raul Aguiar DESIGN Flavia Hashimoto
UMA GUERRA
FRACASSADA
LANÇADA HÁ MEIO SÉCULO, CAMPANHA GLOBAL CONTRA AS DROGAS
CARREGA INJUSTIÇAS HISTÓRICAS, ALÉM DE CONSEQUÊNCIAS
ECONÔMICAS E SOCIAIS. DIANTE DA POSSIBILIDADE DE DEBATER
MUDANÇAS, BRASIL AINDA ESBARRA EM RETROCESSOS
R
Rio de Janeiro, 18 de outubro de 2023. Enquanto
a atenção mundial se voltava para o bombardeio
do Hospital Batista Al-Ahli, na Faixa de Gaza, o
Complexo da Maré, na Zona Norte da capital flu-
minense, passava pelo sexto dia de operações
policiais. Até então, uma pessoa havia morrido,
17 mil estudantes estavam sem aulas e mais de
3 mil atendimentos médicos haviam sido sus-
pensos. As estimativas são da organização co-
munitária Redes da Maré, que busca efetivar os
direitos dos mais de 140 mil moradores das 16
favelas do complexo — e mostram um pequeno
recorte dos efeitos de um conflito que perdura
há quase meio século: a guerra às drogas.
ERROS TÁTICOS
A política de guerra às drogas carrega consigo injustiças históri-
cas. Encampada pelo Ocidente principalmente a partir dos anos
1970 — quando o então presidente dos Estados Unidos, Richard
Nixon, elegeu as drogas como “inimigo público número um” —, a
proibição de substâncias psicoativas tem pelo menos dois séculos.
“Durante milênios, drogas foram usadas e raramente vistas como
ameaça à sociedade”, pontua o sociólogo e antropólogo Edward
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PLANO DE ATAQUE
Se hoje a ciência e até mesmo os formuladores da política de
guerra às drogas reconhecem que ela já nasceu fadada ao fracas-
so, por que seguimos investindo e apostando nisso? “Porque para
algumas pessoas, ela deu certo”, responde Guilherme Silva. Entre
elas, segundo o sociólogo da UFG, indivíduos envolvidos com o
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COMBATER COM
INFORMAÇÃO
Um dos exemplos mais evidentes de modelo bem-sucedido de
prevenção não proibicionista é o controle do tabagismo — do qual
o Brasil é exemplo mundial. O país foi o segundo do mundo, de-
pois da Turquia, a atingir o nível mais alto na metodologia da OMS
de prevenção ao cigarro. Desde 1990, profissionais da saúde são
capacitados para oferecer tratamento pelo SUS já na atenção pri-
mária. Além disso, legislações passaram a exigir que as empresas
de cigarro exibam mensagens de conscientização nas embalagens;
proibiram o ato de fumar em locais fechados e restringiram a pu-
blicidade e o patrocínio a eventos.
Ainda assim, não existe fórmula mágica — nem modelo que possa
ser replicado sem levar em consideração os aspectos sociais de
cada país. Por enquanto, o Brasil parece estar longe de chegar a
um consenso. Um fato, porém, é certo: “os países que não endere-
çaram esse problema sucumbiram”, resume Patrícia Marino. E ne-
nhum deles venceu essa guerra na base de tiro, porrada e bomba.
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ENTREVISTA
“Evidenciar
a tragédia
seria melhor
do que o que
ambientalistas
vêm fazendo”
T
Timothy Morton tem uma missão: falar sobre
ecologia para pessoas que não estão nem aí para
ecologia. Apesar de seu pai ter sido ativista do
Greenpeace, Morton critica o ambientalismo tradicional e
busca referências na filosofia e nas artes para elaborar uma
nova maneira de enfrentar a catástrofe ambiental. “Meu
pai costumava parar navios baleeiros com um barco quan-
do estava no Greenpeace. É algo que tinha uma dimensão
de liberdade simbólica. Ele tinha que fazer isso de novo na
semana seguinte, e de novo, e de novo, até que as pessoas
notassem”, lembra.
“Essa é a proposta do
livro: dar às pessoas uma
razão para comprar o
ambientalismo”
Timothy Morton aponta possíveis estratégias para o movimento
ambiental engajar contra a crise climática
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FORÇA ESTRANHA
OS MÚONS, PARTÍCULAS “PRIMAS” DOS ELÉTRONS, ESTÃO SE
COMPORTANDO DE MANEIRA INCOMUM EM EXPERIMENTOS DO FERMILAB,
O QUE PODE INDICAR A PRESENÇA DE UMA FORÇA DESCONHECIDA.
ESTARÍAMOS DIANTE DO FIM DA FÍSICA QUE CONHECEMOS?
(Fotos: Getty Images)
A
Antes de ganhar um Prêmio Nobel, em 1965, o
físico estadunidense Richard Feynman estava
se sentindo meio estagnado na profissão. Na se-
gunda metade da década de 1940, ele dava aulas
na Universidade Cornell e pensava em como po-
deria voltar a se “divertir” com a física, em vez de
se dedicar a pesquisas que não despertavam seu
interesse. Um dia, no café da universidade, sua
atenção se voltou para um rapaz que brincava
de jogar para o alto um prato com o brasão da
Cornell. À toa, o físico fez algumas contas e notou
que o logo girava exatamente duas vezes mais
rápido do que o movimento de oscilação (ou pre-
cessão) do prato no ar — fica mais fácil visualizar
a precessão se imaginarmos um pião que gira
sobre seu próprio eixo, inclinando-se de um lado
para o outro. Ou seja, Feynman observou que a
rotação do prato equivalia a duas vezes a pre-
cessão, na proporção de dois para um.
A PARTÍCULA
(NEM TANTO) DE DEUS
O Universo é rico em mistérios. Mas há três deles que tiram o sono
dos cientistas: (1) a existência da energia escura, (2) a existência da
matéria escura — coisas que ninguém tem a mínima ideia do que
são, mas juntas constituem cerca de 95% do cosmos — , e (3) o pa-
radeiro da antimatéria.
PRECISÃO DE MILHÕES
Agora, os pesquisadores apontam suas ferramentas para os
múons, partículas já bastante conhecidas, que chegam à Terra
através de raios cósmicos ou podem ser geradas em laboratório
— no caso, em aceleradores como o Fermilab. Eles se parecem
com os elétrons, mas têm massa 200 vezes maior e sobrevivem
apenas dois milionésimos de segundo. “Assim como os elétrons,
os múons agem como se tivessem um minúsculo ímã interno. Num
campo magnético forte, a direção do ímã do múon sofre preces-
são, ou oscila, tal como o eixo de um pião ou giroscópio”, explica
o físico Marcelo Lapola, professor do departamento de Física da
Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Rio Claro e colunista
da GALILEU. A velocidade desse movimento depende de uma pro-
priedade do múon conhecida como “momento magnético”, que os
físicos abreviam como “g”.