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ESTADO E SERVIÇO SOCIAL NO

BRASIL
Aula 4

Profª Carla Andréia Alves da Silva Marcelino


CONVERSA INICIAL

Como vai? Vamos dar início a mais uma aula de Estado e Serviço Social no Brasil!

Após estudarmos a evolução do pensamento na teoria política e a organização do Estado

Moderno em nossas aulas anteriores, pudemos ver que o contratualismo criou uma situação

hipotética da passagem de um Estado de Natureza para um Estado Civil garantidor do exercício das

liberdades individuais e responsável por manter a ordem através da elaboração, execução e aplicação
das leis. Este pensamento abriu as portas para o Estado Liberal que vimos em nossa aula 3, o qual

defendia a pouca regulação do Estado nos assuntos da economia, estabelecendo esta como esfera

da sociedade civil, cabendo ao Estado garantir a liberdade dos indivíduos e apenas atuar nas relações

particulares para dirimir conflitos.

O Iluminismo e a passagem das Monarquias Absolutistas para o Estado Liberal abriram espaço

para a discussão acerca dos direitos individuais dos homens, garantindo a não subserviência, a não

exploração, a proteção contra a tortura e os castigos físicos, dentre vários outros direitos os quais

foram supostamente sendo assegurados ao longo do tempo, no Estado Liberal, e mais fortemente

depois no Welfare State, após a Segunda Guerra Mundial. Mas, qual teria sido a intencionalidade de

tudo isto? Será que estes direitos valeram para todos? Será que valem para todos nos dias de hoje?

Nesta aula, pretendemos fazer uma análise crítica acerca da construção dos conceitos de

Cidadania e Direitos Humanos. Para isto, perpassaremos pela construção histórica da ideia de

cidadania, apontando quais foram as bases que criaram as condições propícias para esta discussão.

Na sequência, apresentaremos brevemente os contextos das Revoluções Inglesa, Americana e

Francesa, momentos históricos que foram fundamentais na construção moderna e contemporânea

da garantia dos Direitos Humanos e de Cidadania.


Na sequência, aprofundaremos o conceito de Direitos Humanos, o seu significado no tempo em

que foi construído e as nuances que envolvem este assunto. Após, apresentaremos brevemente

alguns organismos internacionais de defesa dos Direitos Humanos e o seu papel social, além de

elencarmos os principais tratados internacionais promulgados desde a chamada Convenção de

Genebra, em 1864, na qual se tem os primeiros esboços de um “direito humanitário”, até os tratados

vigentes nos dias atuais, dos quais o Brasil é signatário, e com os quais os assistentes sociais atuarão

cotidianamente no exercício de suas atividades. Ao fim desta aula, faremos uma reflexão crítica sobre

a Cidadania e os Direitos Humanos e as suas aplicabilidades nos dias de hoje, tempos em que temos

visto em marcha ligeira o avanço às violações de direitos e o estreitamento de direitos historicamente


conquistados.

Indicação de Leitura: para toda esta aula utilizaremos a obra na íntegra, disponível na

Biblioteca Virtual: “História da Cidadania”, de Jaime Pinsky e Carla Bassanezi Pinsky.

CONTEXTUALIZANDO

Provavelmente, você deve ter visto a foto do bebê sírio encontrado morto em uma praia da

Turquia, quando sua família se refugiava da Síria e tentava entrar na Europa. Esta cena causou
comoção internacional e suscitou uma série de discussões acerca dos Direitos Humanos de

refugiados e sobre as atitudes dos países Europeus que “fecham as suas portas” para milhares de

imigrantes e refugiados, gerando mortes, miséria e uma situação calamitosa de violações de direitos

dos seres humanos, que, em sua maioria, já saem dos seus países fugindo de guerras, de repressões

e de regimes opressores, em busca de vida melhor e acabam tendo seus direitos violados ou
encontram a morte pelo caminho.

Leia a reportagem a seguir sobre a crise migratória envolvendo os sírios e a Europa,

acompanhe esta aula e ao final voltaremos ao tema: <http://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/

09/foto-chocante-de-menino-morto-vira-simbolo-da-crise-migratoria-europeia.html>

PESQUISE
TEMA 1 - O QUE É CIDADANIA?

O que é Cidadania?

Responder a esta pergunta não é uma tarefa fácil, pois conforme afirmam Pinsky e Pinsky (2015),

o conceito de cidadania não é estanque, foi e está sendo construído historicamente e a sua

definição tem que ser situada no tempo e no espaço, pois pode variar conforme o momento

histórico em que estivermos estudando ou vivendo. Mesmo reconhecendo este caráter histórico e

temporal do conceito, os mesmos autores (p. 9) tecem um significado mínimo para a cidadania,

afirmando ser cidadão é.

[...] ter direito à vida, à liberdade, à igualdade perante a lei: é, em resumo, ter direitos civis. É
também participar no destino da sociedade, votar, ser votado, ter direitos políticos. Os direitos

sociais, aqueles que garantem a participação do indivíduo na riqueza coletiva: o direito à educação,
ao trabalho, ao salário justo, à saúde, a uma velhice tranquila. Exercer a cidadania plena é ter

direitos civis, políticos e sociais.

Concordando com Pinsky e Pinsky (2015), Melo (2016) ressalta que o significado da cidadania se

modifica constantemente pelas transformações sociais, pelo contexto histórico, mas principalmente

se transforma conforme as mudanças de paradigmas ideológicos dominantes na sociedade. Estes

autores também concordam que o conceito atual de cidadania não pode perpassar ou ficar restrito

apenas à questão do voto (votar e ser votado), mas precisa ser associado às condições de vida digna

das pessoas para que tenham condições de participar conscientemente dos processos democráticos

de decisão.

Na mesma linha segue Norberto Bobbio (1992), o qual afirma que o conceito de cidadania vai se

alterando conforme as demandas sociais, citando alguns exemplos: só se passou a ter preocupação

com a cidadania e com os direitos das pessoas idosas a partir do momento em que os avanços da

medicina garantiram longevidade aos seres humanos; nas sociedades em que somente quem era

proprietário era considerado cidadão, a proteção à propriedade privada teve o lugar de direito

fundamental. Portanto, a cidadania deve ser sempre analisada ao seu tempo e em determinado

contexto histórico.

Melo (2016) explica que o primeiro significado de cidadania nasceu na Grécia antiga, quando

eram chamados de cidadãos àqueles que moravam nas cidades e participavam dos seus negócios.

Ou seja, era cidadão apenas aquele que participava da pólis, sendo que desta participavam, em
grande parte, apenas as aristocracias dominantes, sendo que delas não partilhavam os não nobres e

os estrangeiros. Assim, a cidadania era direito para poucos.

Dando um grande salto histórico, saindo da Grécia e da Roma antigas e passando para a Idade

Média, temos o início do sistema feudal. No feudalismo a questão da cidadania fica relegada, sendo

dado maior ênfase à questão da religião, às dádivas divinas. Neste período, as classes ou estamentos,

como chamaria o sociólogo Max Weber, teriam privilégios e benefícios dados por deus. Assim, os
nobres (senhores feudais e seus familiares), o clero (a igreja) e os camponeses (trabalhadores) tinham

direitos civis e políticos diferenciados, creditados à vontade divina.

Ainda seguindo com Melo (2016), no período chamado de Baixa Idade Média, com a formação

dos Estados Nacionais, a ideia de cidadania voltou à tona, mas vinculada especificamente aos direitos

políticos. A evolução deste conceito para além da ideia de votar e ser votado vai surgir apenas no

período do Iluminismo, importante período da história que já estudamos em nossas aulas anteriores.

Foi a partir do Iluminismo que começou a surgir o ideal de IGUALDADE e LIBERDADE, preconizando

o caráter de universalidade dos direitos, ou seja: IGUALDADE DE DIREITOS.

Na passagem da Modernidade para a Contemporaneidade, temos um marco das lutas pelos

direitos caracterizados nas três revoluções: Inglesa, Americana e Francesa, sendo que esta última

inaugurou o período da história ao qual chamamos de contemporaneidade. Sobre estas revoluções,

especificamente, estudaremos no próximo tema desta aula.

Na Contemporaneidade, até o final do século XIX e início do século XX temos ainda o conceito

de cidadania vinculado aos direitos políticos e foi somente após as duas Guerras Mundiais que este

conceito começou a ser aproximado de outros direitos. Neste contexto, Melo (2016, p.1), nos explica:

[...] o medo advindo das atrocidades praticadas e alicerçadas pela legalidade fez com que órgãos

internacionais e a própria sociedade civil passassem a entender cidadania como algo indissociável
dos direitos humanos. O conceito de cidadania passou a ser vinculado não apenas à participação

política, representando um direito do indivíduo, mas também o dever do Estado em ofertar


condições mínimas para o exercício desse direito, incluindo, portanto, a proteção ao direito à vida,

à educação, à informação, à participação nas decisões públicas.

É neste contexto que temos o conceito de cidadania que utilizamos atualmente. Ser cidadão

hoje, além de ter os direitos políticos garantidos, é ter também segurança social, condições mínimas
de reprodução da vida material, acesso a bens culturais, ao esporte, ao lazer e a todos os outros bens

materiais e imateriais que possam permitir a existência humana em sua completude.

TEMA 2 - CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA NAS REVOLUÇÕES


INGLESA E AMERICANA

Revolução Inglesa

Embora desde o Renascimento se tenha visto os primeiros movimentos de aproximação com a

razão em detrimento às verdades reveladas pela fé, os primeiros avanços das ciências, as primeiras
preocupações com a felicidade humana, com o bem-estar individual e coletivo, foram vistas somente

no período Iluminista, nos anos que o sucederam, e principalmente, nos anos posteriores que
inauguraram a Idade Moderna. Foram fundamentais neste processo as três Revoluções: Inglesa,
Americana e Francesa, já que delas surgiram as primeiras cartas, as primeiras declarações de garantia

da cidadania, ainda que esta fosse em grande parte limitada, como no caso americano.

Em sequência cronológica, a primeira das revoluções foi a Inglesa, ocorrida no século XVII

(iniciada em 1640 e encerrada em 1688) e que deu origem ao primeiro país capitalista no mundo.

Mondaini (2015) contextualiza essa revolução afirmando que desde o renascimento o homem já
buscava formas de compreender o mundo transcendendo às questões da religião, buscando os

próprios homens ser donos de seus destinos e tendo capacidade de explicá-lo,

“o primado resignador da fé recuou diante da força crítica e otimista do saber científico”

(p. 115),

...sendo que os homens passaram a buscar suas verdades a partir de seus próprios esforços
criativos. Neste sentido, os homens passam a questionar as desigualdades que até então eram dadas

como fatos naturais, como predestinação.

Os privilégios “dados por deus” aos nobres já não eram mais aceitos e tolerados com
passividades, e os homens passam a ter “uma consciência histórica da desigualdade” (p. 116) e

começam uma busca para passar da condição de súditos para a de cidadãos. Mas que cidadania era
esta? Esta pretensa cidadania perpassava, principalmente, pelo direito à propriedade.
Há que se considerar que àquela época ainda vigorava o feudalismo e que a justificação para a

posse de propriedade dos senhores feudais era de dádiva divina. Assim, podemos afirmar que a
Revolução Inglesa foi um levante contra o feudalismo tendo como foco o avanço do capital.

Mondaini (2015) segue nos explicando que a Revolução Inglesa foi primeiramente uma
revolução política e que esta abriu espaço para a revolução industrial. Nesta passagem, o autor

pontua três grandes mudanças:

a. a predominância da agricultura é substituída pela produção industrial;


b. surgimento de um sistema de transportes mais rápido e diversificado;

c. as crises de subsistência pela qual passou o feudalismo deu lugar a crises de superprodução e
baixa de preços dos produtos.

Porém, no início dessa revolução, em que pese a queda do feudalismo, o poder ainda continuou

concentrado nas mãos de poucos, já que predominava na Europa o Estado Monárquico Absolutista, o
qual já vimos em nossas aulas anteriores. Com o crescimento da burguesia, esta monarquia forte e

absoluta passa a ficar limitada em seus poderes, pois no contexto inglês a burguesia ascendente do
capital conseguiu matar o rei e criar o parlamento inglês. Assim, abre-se espaço para uma monarquia

limitada, na qual o rei reina, mas não governa.

O mesmo Mondaini (2015) afirma que a revolução inglesa pode ser caracterizada como a
revolução do trabalho contra o ócio. Ócio este vindo dos reis e dos nobres, que gozavam de suas

dádivas divinas que não foram conquistas por meios legítimos, dando lugar a um “novo sistema
marcado pela valorização do trabalho e da poupança, rompendo com a exaltação aristocrática do

ócio e do gozo dos prazeres da vida” (p. 120).

Assim, criam-se as condições essenciais para o desenvolvimento capitalista, já que a burguesia

toma o poder estatal para si, faz alianças com as demais classes sociais fortalecendo internamente o
país e trabalha para ampliar as relações externas com outras nações. A terra que era instrumento de

ócio e herança passa a ser vista como mercadoria; de fonte de subsistência passa ter lugar de fonte
de obtenção de lucros. Nesta nova ordem social surge também um novo código de valores, pautados

no LUCRO e no INDIVIDUALISMO, como afirma Mondaini (2015).

Importante ressaltar que, por nossa tradição marxista no Serviço Social, sempre que falamos em
revolução pensamos nas classes sociais proletárias assumindo o poder. No caso da revolução inglesa
e das demais que aqui estudaremos, esta foi uma revolução burguesa que usou as classes menos
favorecidas para depois espoliá-las dos benefícios obtidos na revolução.

Espoliá-las: significado: privar (alguém) de (algo) por meios ilícitos, ilegítimos ou


violentos; despojar, esbulhar.

[...] se num primeiro momento, as classes sociais subalternas são vistas com bons olhos pela

burguesia revolucionária (pois esta necessita recolher o maior número de foças a fim de abater o
inimigo principal aristocrático), num segundo instante, quando as tarefas propriamente burguesas

da revolução são completadas, as camadas inferiores são devidamente afastadas. Primeiro,


fisicamente, por meio da repressão das armas. Logo a seguir, simbolicamente, pelo ocultamente da

memória histórica em torno da sua participação no processo. (Rude apud MONDAINE, 2015, p. 127)

Assim, seguindo Mondaine (2015), na Revolução Inglesa estabeleceram-se os valores burgueses

de obtenção e manutenção da propriedade, resguardando o poder político apenas aos homens


proprietários, sendo que a ideologia protestante (religiosa) se sobressaiu em detrimento às
ideologias que poderiam ter estabelecido uma divisão mais equânime da propriedade e do poder.

Com esta lógica de defesa da liberdade individual e do direito à propriedade, começam a


estabelecer-se as bases para o Estado Liberal, que já estudamos em nossa terceira aula.

Como vimos, no Estado Liberal há a defesa intransigente aos direitos civis, os quais na Inglaterra

foram assegurados por meio de uma Carta de Direitos, sendo o Estado o protetor destes direitos.
Neste contexto, Bobbio (1992) afirma que a Revolução Inglesa e o processo que se seguiu a ela no

século XVII abriu espaço para o que o autor chama de “Era dos Direitos”, termo que inclusive nomina
uma de suas mais importantes obras. Este Estado Liberal inglês, como já citamos, defende

principalmente a propriedade, mas a propriedade aqui é aquela fundamentada no direito natural de


John Locke, que implica em entender a vida, a liberdade e os bens como propriedade: “o objetivo

grande e principal, portanto, da união dos homens em comunidade, colocando-se eles sob governo,
é a preservação da propriedade” (MONDAINE, 2015, p. 130).

John Locke foi um filósofo inglês descendente de uma família de burgueses comerciantes.

Esteve refugiado na Holanda por causa do seu envolvimento com pessoas acusadas de fazer
movimentos contra o Rei Carlos III. Seus pensamentos influenciaram todas as revoluções mundiais

durante o século XVIII. Locke defendia a garantia dos direitos de um povo (proteção da vida, da
liberdade e da propriedade).
Para ele, esses direitos deviam ser prioridade de um governo, e se os governantes não

pudessem, ou não quisessem respeitar esses direitos, o povo poderia derrubá-los e substituí-los por
alguém melhor. Fonte: <http://www.infoescola.com/filosofos/john-locke/>

Por fim, a Revolução Inglesa foi um marco na garantia dos direitos de cidadania, mas esta

cidadania ficou mais restrita aos homens que eram proprietários (no caso do exercício do poder),
garantindo-se aos demais o direito à vida e à liberdade, além do direito de possuir e preservar seus

bens. Apesar desta cidadania “seletiva”, Mondaini (2015) e Bobbio (1992) concordam que os ideários
desta revolução trouxeram a defesa de um conceito importantíssimo até os dias atuais: o da

TOLERÂNCIA. Pautados nas teses de John Locke, os ingleses alcunharam o respeito às diferenças,
defendendo a preservação das identidades individuais, reconhecendo a alteridade, em especial em

relação às questões religiosas que até então tinham sido os motivos de grande parte dos conflitos
ocorridos no mundo todo.

Revolução Americana

A Revolução Americana que culminou na Independência dos Estados Unidos da América,


segundo Karnal (2015), promoveu importantes transformações nos conceitos de cidadania e

liberdade, visto que o ideário da liberdade foi o que motivou o “sonho” da independência americana.

No século XVIII, o território que hoje forma os EUA era caracterizado por treze colônias inglesas.
A Revolução Americana, assim como a Inglesa, foi uma revolução burguesa, liderada por

comerciantes, fazendeiros, escravocratas e manufatureiros, classes que muitas delas viviam em guerra
entre si, mas que em nome da liberdade em relação à coroa inglesa uniram-se.

A Inglaterra havia negligenciado os cuidados com a colônia em detrimento dos problemas que

ao período estavam ocorrendo na Europa, como a disputa entre os ingleses e franceses por poder,
terras e território. Neste processo, o crescimento das colônias americanas foi visível, ampliando a

produção de bens e o comércio. Através do avanço das navegações, as colônias inglesas na América
começaram a vender seus produtos para locais mais distantes, expandido assim o capital e a riqueza.

Ao voltar os olhos para as colônias, a Inglaterra, já mais enfraquecida após a guerra contra a França,
de imediato atuou para tributar os colonos, no intuito de que estes pagassem os custos da guerra,

fortalecendo o país. Os colonos americanos insurgiram-se contra estas tributações e deram início ao
processo que culminou na independência dos EUA.
Outro fator que desencadeou o processo revolucionário foi a excessiva repressão da Inglaterra
sobre os colonos, impondo questões ideológicas e culturais aos americanos. Assim, em brevíssimo

resumo, o ápice da Revolução Americana se deu quando os colonos americanos buscaram a


liberdade (econômica, cultural, religiosa e politica) em relação aos ingleses.

Esta liberdade, segundo Karnal (2015), é a mesma liberdade desenhada e defendida por John

Locke, que a este período (século XVIII) já era bastante lido e estudado nas colônias americanas; este
conceito de liberdade estava também atrelado à ideia de felicidade comum. O mesmo autor afirma

que a influência de Locke fica evidente até mesmo no texto da Declaração de Independência dos
EUA:

“O texto da Declaração é uma lembrança quase literal dos princípios básicos do autor do Segundo

Tratado Sobre o Governo: direitos naturais, governo instituído para preservar os direitos naturais, e
direito à rebelião.” (p. 141)

A Declaração de Independência dos EUA, publicada em 1776, traz no seu texto que todos os
homens foram criados iguais e dotados de direitos inalienáveis, como a vida e a liberdade.

Seguida da Declaração, temos em 1787 a primeira Constituição Americana, na qual, segundo

Karnal (2015), fica evidenciada a esfera privada como sendo o espaço do cidadão, em detrimento da
tirania do Estado. Assim, a Declaração e a Constituição garantem o direito à liberdade e

protegem o cidadão da tirania do próprio Estado.

A Constituição Americana é tida por muitos com sendo o início, o alicerce, da democracia

moderna e contemporânea, já que inova ao separar formalmente os três poderes e garantir os


direitos, no plano formal a todos os cidadãos americanos. Porém, Karnal (2015) alerta que apesar de
um marco, estas cartas estabelecem uma controversa e contraditória cidadania, pois naquele período

nos EUA mulheres e brancos não proprietários não podiam votar e serem votados. Outro fator
bastante contraditório é que apesar da defesa intransigente das liberdades individuais, até parte do

século XIX, a escravidão era aceita e era legalizada.

Ora, como falar em direitos e em liberdade, se é permitido que uma parcela da população seja

propriedade de outros homens? A situação dos indígenas é, também, bastante questionada neste
processo, já que estes não foram alvo de qualquer política ou garantia de direitos durante e após a

Revolução Americana.
A cidadania americana, assim como em quase todos os lugares, foi sendo construída ao longo

do tempo, sendo que o voto universal masculino chegou mais rápido, em meados do século XIX, mas
o voto feminino foi uma realidade só apenas no século XX. A abertura ao direito civil e político de
todos os homens americanos no século XIX fez surgir o primeiro presidente vindo de camadas mais

populares (Andrew Jackson). Karnal (2015) coloca este fato como sendo um fator redundante da
democracia e da cidadania americana. Porém, o mesmo autor afirma que neste período o que houve

foi a extensão dos direitos à maior parte dos americanos, mas a desigualdade social ali não estava
acabada: “reduzidos à igualdade que não distingue mais o voto do intelectual do voto do

ignorante, o meio de distinção passa a ser o dinheiro. O que a política torna igualitário, o
sucesso financeiro distingue”. (p. 148)

Neste sentido, a cidadania não perpassava para os americanos pela questão da garantia dos
direitos sociais, a exemplo, já que prevalecia, como até hoje, os princípios da meritocracia, cabendo

ao próprio sujeito sair da sua condição de desfavorecido:

O sonho americano do sucesso material e de oportunidades iguais para todos constituiu uma

unidade poderosa. Não importa a realidade de miséria da maioria: difundiu-se a ideia de que o
trabalho duro levava as pessoas ao sucesso e que o fracasso era falta de esforço. [...] A pobreza não

era vista como uma chance de caridade ou um dado natural e consagrado, mas como fruto da
preguiça e da falta de esforço. Sair dela era um ato de vontade, jamais uma imposição do sistema

em si. (KARNAL, 2015, p. 149)

Por fim, Karnal (2015) afirma que os americanos evoluíram em seus conceitos de cidadania, mas

esta continua até os dias de hoje vinculada à ideia do exercício pleno das liberdades. Hoje o
problema americano com os direitos está no reconhecimento dos direitos dos cidadãos não

americanos e do que eles conferem como direitos aos seres humanos de outros países.

TEMA 3 - A REVOLUÇÃO FRANCESA E O CONTEXTO HISTÓRICO DA


CONSTRUÇÃO DA IDEIA DOS DIREITOS HUMANOS

A Revolução Francesa e o contexto histórico da construção da ideia dos Direitos Humanos

A Revolução Francesa é tida como o marco da passagem do conceito de cidadania restrito aos

direitos civis e políticos, para algo mais geral, mais amplo do ponto de vista do significado, que são
os Direitos Humanos.
Foi no ápice desta revolução que tivemos a primeira carta universal de direitos aos homens.
Vamos ao contexto.

Como já falamos da Revolução Francesa em nossa aula 3, cabe-nos aqui apenas um breve
resumo: no final do século XVIII, por volta da década de 1780, a França estava falida. Os exageros do

rei e sua corte para manter os privilégios deles, dos nobres e do clero, os gastos excessivos com

guerras e as constantes brigas com a Inglaterra estavam deixando a população insatisfeita. A

burguesia local era taxada com altos impostos. Impostos estes que eram usados para custear os
disparates e os gastos abusivos do rei.

As práticas abusivas do rei tanto na economia, como no controle dos tribunais com condenações

injustas levaram a população ao levante. É importante relatar que as pessoas presas por estes

disparates do rei eram levadas para um local chamado de Bastilha, uma fortaleza de concreto na qual

eram literalmente “jogados” todos aqueles que contrariavam o rei e a sua corte. Após uma série de
acontecimentos, o ápice da Revolução Francesa, o seu símbolo máximo, foi a queda da Bastilha,

momento em que o povo invadiu este local símbolo dos abusos do rei.

Odália (2015) afirma que é consenso na literatura sobre os direitos de que a Revolução Francesa

inaugura um novo tempo nesta compreensão, mas alerta para o fato de que não podemos descolar

nossa análise do fato de que esta revolução ocorreu no século XVIII, no bojo das ideias iluministas,
com predomínio da razão humana como sendo o centro da ética, da moral, da autonomia, ou seja,

da ação humana pautada exclusivamente na sua vontade racionalmente orientada.

Neste contexto, a autora afirma que há a formação de uma consciência histórica pelos homens, a

qual “não é exclusividade do intelectual, mas também da classe ascendente, da burguesia que

percebe a sua importância nas transformações sócio-políticas, econômicas e culturais [...]” (p. 160).

O homem começa a buscar mais veementemente a ideia de felicidade, tanto individual quanto

coletiva e começa a se desenhar a possibilidade, utilizando palavras do senso comum, de “um mundo
melhor”. A Revolução Industrial deflagrada na Inglaterra foi fundamental neste processo, pois com o

aumento da produção, a maior possibilidade de acesso aos bens produzidos e mais tempo livre aos

homens que agora tinham parte das suas tarefas realizadas pelas máquinas, abriram espaço a esta

busca por um novo tipo de sociedade, veja:


O homem só pode pensar em felicidade como um projeto de sociedade [...] quando criou os

meios de fazer com a educação, a produção de alimentos, a fabricação das cosias de que precisava –
tecidos, roupas, máquinas, etc. – aumentasse a tal nível que deixassem de ser um privilégio para

poucos para ser uma possibilidade para todos. Isso não significou, nem significa hoje, que todos os

homens tenham tudo o que queriam e que não exista ainda desigualdade e injustiça. Significa apenas

que, a partir do século XVIII [...] o homem criou os instrumentos de que necessitava para produzir em
abundância e viver confortavelmente. (ODÁLIA, 2015, p. 160)

Para consolidar estas ideais de bem comum, de liberdade e igualdade, a Revolução Francesa tem

como ápice a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789. Reunidos em Assembleia

Nacional, o Terceiro Estado, representantes do povo Francês, reconhecem que o desprezo pelos

direitos naturais dos homens é a principal causa dos males públicos e da corrupção política e
decidem nesta carta fixar os direitos naturais, inalienáveis e “sagrados” dos homens, a fim de que

todos os três poderes, ao desenvolverem seus trabalhos, o façam de forma a conservar e respeitar os

direitos dos homens e garantir a chamada “felicidade geral”. Os principais direitos fundamentados

nesta Declaração são: liberdade, propriedade, segurança e resistência à opressão. O exercício da


liberdade também é delimitado na carta, sendo o seu limite o “direito de fazer tudo o que não

prejudique os outros”.

Neste sentido, por assegurar direitos, mas também especificar deveres, a Declaração acaba

colocando as leis acima dos direitos do homem. Primeiro cumpre-se as leis, e através delas assegura-

se o exercício dos direitos.

Bobbio (1992) dá uma importância fundamental à Declaração, afirmando que ela demarca o fim

do Antigo Regime e demarca, ao menos simbolicamente, o início de uma nova era. É preciso aqui
fazer uma ressalva quanto ao fato de que Bobbio é um defensor do Estado Liberal e por isso ele verá

a Revolução Francesa e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão como um olhar menos

crítico do que outros autores. Analisando a Declaração, Bobbio afirma que o núcleo doutrinário do
documento possui três eixos, definidos em seus artigos:

Condição natural dos indivíduos que é anterior à sociedade civil. Ou seja, os homens NASCEM
livres e iguais em dignidade e direitos, todos eles, de forma universal, nascem providos deste direito.
B

Finalidade da sociedade política, que é posterior ao Estado de Natureza: embora não cite a

palavra contrato, o texto da Declaração traz que os homens se associam politicamente e criam o

Estado, o qual tem o dever de defender os direitos naturais do homem.

A legitimidade do poder cabe à nação: o poder deveria emanar do povo, as leis deveriam ser a

expressão da vontade geral, não mais seria aceitos os soberanos absolutos, donos indivisíveis do
poder.

Apesar de inaugurar uma nova era, como diz Bobbio, precisamos também ter um olhar crítico a
todo este processo. Odália (2015) faz uma crítica a esta Declaração, argumentando que há um

paradoxo nela, já que se refere à garantia dos direitos civis e políticos, fala de igualdade e liberdade e

confere o direito à propriedade privada, mas não se preocupa e nem se refere, em momento algum,
àqueles homens não proprietários e que viviam em miséria. Ou seja, a igualdade ficava no aspecto do

direito, de ser igual perante às leis, mas não quanto à participação social na riqueza produzida

coletivamente.

Assim, fica explicitado que a ampliação do conceito de cidadania e que o reconhecimento do

homem enquanto sujeito que tem a felicidade e o bem-estar por direito, que tem o direito de ser

livre, de exercer a sua vontade, significou grande avanço para a humanidade, principalmente pelo
fato de pretender ser UNIVERSAL, em afirmar que TODOS os homens seriam iguais, sem recortes.

Mas é sabido que nem à sua época e nem até os dias de hoje, os tratados internacionais garantiram a

igualdade e o acesso de todos.

TEMA 4 - PRINCIPAIS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS


HUMANOS

Embora a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, promulgada na França, dissesse que

todos os homens são iguais em direitos, ela foi precursora, mas não foi universal. Ou seja, ela não foi

um tratado que garantisse a todos os cidadãos do mundo os Direitos Humanos em todos os países

do mundo. Ou seja, ela não se caracterizou como um Tratado Internacional.


De acordo com Queiroz (2016, p.1), os Tratados Internacionais de Direitos Humanos são:

[...] um acordo internacional concluído por escrito entre Estados e regido pelo Direito

Internacional, quer conste de um instrumento único, quer de dois ou mais instrumentos conexos
[...]. Além do termo ‘tratado’, diversas outras denominações são usadas para se referir aos

acordos internacionais. As mais comuns são: Convenção, Pacto, Protocolo, Carta, Convênio, [...]

Tratado ou Acordo Internacional. Alguns termos são usados para denotar solenidade (por

exemplo, Pacto ou Carta) ou a natureza suplementar do acordo (Protocolo).

Muitos autores concordam que a gênese dos tratados internacionais dos Direitos Humanos

esteja na chamada Convenção de Genebra, sendo este o primeiro tratado que pretendia ser universal

e versava sobre “direitos humanitários”. Gasparetto Junior (2016) explica que este primeiro tratado foi
fruto dos esforços de um Suíço, chamado Henri Dunant, o qual demostrou grande preocupação com

os sujeitos vítimas das guerras e conflitos ocorridos na Europa no século XIX. Dunant tinha interesse

em melhorar os serviços sanitários nos atendimentos de campanha durante as guerras e conflitos e

em 1863 convocou uma primeira reunião, em Genebra, para debater os direitos humanitários e as
questões sanitárias em situação de guerra, sendo esta reunião, ainda que informal, a primeira das

muitas Convenções de Genebra ocorridas. Nesta primeira convenção nasce também a organização

Cruz Vermelha, a qual terá livre acesso e proteção nas áreas em guerra.

Em 1864, um acordo diplomático entre vários Estados, a Convenção de Genebra é oficializada e

publicado o seu primeiro tratado oficial, o qual determinava regras internacionais para proteger
feridos e doentes das forças armadas. A primeira vez que ocorreu a verdadeira aplicação da primeira

Convenção de Genebra foi na Primeira Guerra Mundial.

Após o encontro de 1864, outras três reuniões aconteceram e ampliaram os tratados da

Convenção de Genebra, clique em cada ano para conhecer:

1906

Ocorre o segundo encontro, o qual estendem os direitos humanitários também aos feridos,
enfermos e náufragos, protegendo-os também no mar, dos ataques das marinhas.

1929
Ocorreu a terceira Convenção de Genebra e definiu, além do que já constava da convenção,
o tratamento humanitário aos prisioneiros de guerra. Após a Segunda Guerra Mundial, ocorreu

novo encontro.

1949

Quando se rediscutiram várias regras das convenções anteriores, face às atrocidades vistas

durante a guerra recém findada, preocupou-se com a proteção de civis em áreas ocupadas e

acometidas por conflitos, evitando abusos por parte das forças armadas.

Após a Quarta Convenção de Genebra, outros três protocolos foram inseridos aos Tratados

Internacionais escritos nestas convenções, todos eles com foco na proteção às vítimas de conflitos,

guerras e guerras civis. Em caso de violação das leis estabelecidas pelos tratados das Convenções de
Genebra, os países signatários podem ser julgados em processos diante da Corte Internacional de

Justiça ou Tribunal Internacional de Justiça

Apesar da Convenção de Genebra ser o primeiro tratado com preocupação característica de

Direitos Humanos, o Direito Internacional dos Direitos Humanos, ou seja, os Direitos Humanos

enquanto área do Direito surge oficialmente após a Segunda Guerra Mundial, coincidindo também

com a criação da Organização das Nações Unidas – ONU. Dizer que os Direitos Humanos passam a
ser objeto do Direito Internacional implica dizer que agora ele sai apenas da esfera do “dever ser”, da

carta ideológica de proteção aos seres humanos, e passa a ser regulado pelo Direito, com aplicação

de punições e sanções aos Estados e organizações que não respeitarem a esses direitos.

A partir deste momento, a defesa e proteção dos direitos humanos deixam a esfera “doméstica”

de cada Estado e passam a ser interesse internacional. Piovesan (2016, p. 2), analisando o
reconhecimento dos Direitos Humanos enquanto área do Direito Internacional, complementa que:

[...] seu desenvolvimento pode ser atribuído às monstruosas violações de direitos humanos da era

Hitler e à crença de que parte dessas violações poderiam ser prevenidas, se um efetivo sistema de
proteção internacional de direitos humanos existisse.

Conforme o sítio eletrônico das Organizações das Nações Unidas, em 1945 foi criada a ONU,
após a reunião de cerca de 50 países que estiveram nos EUA na Conferência sobre a Organização

Internacional e que redigiram a Carta das Nações Unidas, ratificada mais tarde por vários países. A

ONU nasce então com o objetivo de:


“cooperação em relação ao direito internacional, à segurança internacional, ao desenvolvimento

econômico, ao progresso social, aos direitos humanos e à paz mundial. Ou seja, seu principal
objetivo é manter a cooperação entre todas as nações do mundo.” (fonte:

https://nacoesunidas.org/)

A ONU possui uma estrutura dividida em cinco órgãos: a Assembleia Geral, o Conselho de

Segurança, o Conselho Econômico e Social, o Secretariado e o Tribunal Internacional de Justiça.


Estes órgãos dividem-se entre as funções de deliberação e aplicação do direito internacional.

Confira, acessando o ícone a seguir, a Carta das Nações Unidas: <http://www.unfpa.org.br/A

rquivos/carta_das_nacoes_unidas.pdf>

O primeiro e mais importante Tratado Internacional promulgado já nos moldes da cooperação


entre as Nações Unidas foi a Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada por 48 Estados

em 1948. Esta Declaração inaugura uma nova fase nos Direitos Humanos, conforme explica Piovesan

(2016, p. 4):

A Declaração de 1948 introduz a concepção contemporânea de direitos humanos, marcada pela

universalidade e indivisibilidade desses direitos.

Universalidade porque clama pela extensão universal dos direitos humanos, sob a crença de que

a condição de pessoa é o requisito único para a titularidade de direitos, considerando o ser humano
como um ser essencialmente moral, dotado de unicidade existencial e dignidade, esta como valor

intrínseco à condição humana. Indivisibilidade porque a garantia dos direitos civis e políticos é

condição para a observância dos direitos sociais, econômicos e culturais e vice-versa. Quando um

deles é violado, os demais também o são. Os direitos humanos compõem, assim, uma unidade
indivisível, interdependente e inter-relacionada, capaz de conjugar o catálogo de direitos civis e

políticos com o catálogo de direitos sociais, econômicos e culturais.

A partir desta Declaração, muitos outros tratados foram promulgados, com os quais os futuros

assistentes sociais atuarão no seu dia a dia. O Brasil é signatário de grande parte deles. Ser signatário

de um Tratado Internacional significa que além de assiná-lo, o país considerará o seu conteúdo na
elaboração e aplicação de suas leis, além de criar legislações que ratifiquem os seus conteúdos.
Um exemplo muito conhecido de ratificação de um tratado no Brasil é o Artigo 227 da

Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8069/1990), os quais ratificam


os preceitos da Convenção dos Diretos da Criança. Órgãos internacionais auxiliares também foram

criados ao longo do tempo para tratar de assuntos específicos vinculados aos direitos, sendo

exemplos a UNICEF, que cuida especificamente dos assuntos de crianças e adolescentes e a

Organização Internacional do Trabalho que trata da proteção ao trabalho e garantia de direitos


mínimos aos trabalhadores.

Os tratados internacionais também acompanham as demandas de seu tempo, sendo

atualmente objetos de muitos tratados às questões afetas ao meio ambiente, como exemplo o
Protocolo de Kyoto.

Conheça alguns dos principais Tratados Internacionais com os quais trabalham os Assistentes

Sociais Brasileiros:

Declaração dos Direitos da Criança/Declaração de Genebra (1929)

Declaração dos Direitos da Criança (1959)


Regras de Beijing – Regras Mínimas para a Administração da Justiça da Infância e da Juventude

(1985)

Convenção sobre os Direitos da Criança (1989)


Diretrizes de Riad – Diretrizes para Prevenção da Delinquência Juvenil (1990)

Regras Mínimas para a Proteção dos Menores Privados de Liberdade (1990)

Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1966)

Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966)


Convenção contra a Tortura Outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes (1984)

Convenção sobre a Eliminação da Discriminação Racial (1968)

Convenção sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher (1979)

Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura (1985)


Convenção Interamericana de Direitos Humanos (1969)

Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (1994)

Convenção Interamericana para Eliminação de todas as formas de Discriminação contra Pessoas

Portadoras de Deficiência (2001)


Protocolo Facultativo à Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação

contra a Mulher (1999)

Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança sobre o Envolvimento de


Crianças em Conflitos Armados (2000)

Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança sobre Venda, Prostituição e

Pornografia Infantis (2000)

Protocolo Facultativo à Convenção contra a Tortura (2002)


Convenção OIT º 182 - Sobre Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e Ação Imediata

para sua Eliminação (1999)

Convenção OIT nº 138 - Idade Mínima para Admissão em Emprego (1976)

Diretrizes das Sobre Emprego e Condições Adequadas de Cuidados Alternativos com Crianças
(2009)

TEMA 5 - REFLEXÕES SOBRE CIDADANIA E AOS DIREITOS


HUMANOS NA ATUALIDADE

Apesar de todos os avanços aqui demonstrados, é importante termos em mente que a

ampliação do conceito de cidadania não apenas aos direitos civis e políticos, mas também aos
direitos sociais, tais como educação, segurança alimentar, cultura, dentre outros, não significa que no

plano da realidade todos os cidadãos tenham conquistado o direito a usufruir destes direitos.

Embora os direitos políticos, de votar e ser votado, sejam assegurados a todos os cidadãos em

quase todos os países do mundo, os direitos civis ainda ficam limitados à propriedade, pois quem

detém maior poder econômico consegue usufruir de maior número de direitos, sendo típica a frase
do senso comum “justiça só funciona para os ricos”.

Já os direitos sociais, com a ofensiva neoliberal ocorrida no mundo todo e no Brasil, a qual
apregoou o Estado mínimo com pouca intervenção deste sobre a vida dos cidadãos e a redução dos

direitos garantidos pelo poder público, fez reduzir a oferta e o acesso a estes direitos, prejudicando

assim também o exercício dos direitos civis e políticos, já que pessoas em condição de miséria e

extrema pobreza, sem acesso aos serviços públicos que lhes garantam um mínimo de condição de
(sobre)vivência, sem acesso à educação formal e informal, sem qualificação profissional, dificilmente
terão interesse e condições de participar da vida civil e política, já que têm como prioridade mínima a

reprodução da sua vida material e dos seus.

Entretanto, os Direitos Humanos precisam ser vistos com parcimônia e é necessário fazer uma

leitura crítica do conceito desde a sua gênese. Embora a primeira Declaração, promulgada no bojo da

Revolução Francesa pareça um grande avanço, é importante ter em mente que ela surge no intuito
de defender as liberdades individuais, liberdades estas que perpassam desde os aspectos subjetivos

da vida, como questões religiosas e ideológicas, mas principalmente versava sobre o direito

inalienável à propriedade privada, à sua preservação, manutenção e ao direito do indivíduo de, no

âmbito da sociedade civil, negociar, vender, trocar, lucrar, sem a intervenção do Estado sobre estes
processos.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos vem a ratificar este processo, com uma

preocupação primeira de proteger à vida e garantir a vivência longe de maus tratos e abusos de

poder.

Os Tratados Internacionais que a antecederam e os que a sucederam cuidam de questões

específicas, como o direito de crianças, contra o trabalho escravo, contra a tortura, proteção aos

direitos das mulheres, dos negros e das pessoas com deficiências, mas em nenhum momento,
nenhum dos Tratados existentes até os atuais dedicou qualquer linha que seja de seus textos a

acabar com a desigualdade social. A desigualdade, no máximo, é minimizada em alguns textos com a

garantia de políticas e direitos compensatórios aos não proprietários e aos menos favorecidos,
ficando a questão da igualdade expressa apenas na abrangência das leis, ou seja, igualdade perante

as leis, imperando até os dias de hoje a lógica meritocrática, como se qualquer ser humano fosse

capaz de, por meio de seus esforços próprios, superar a pobreza e as condições de subjugação a que

muitos estão sujeitos.

Por estas razões que você leu na tela anterior muitos teóricos e pensadores que utilizam a teoria

crítica marxista serão críticos severos da lógica e do ideário da cidadania e dos direitos humanos, mas
não o fazem porque são contrários a estes como querem nos vender os conservadores, mas o fazem

por ter a convicção de que a liberdade e igualdade não significaram a participação igualitária na

riqueza produzida. Bem como para os marxistas, nenhum homem será plenamente livre e autônomo
enquanto for expropriado do produto do seu próprio trabalho.
TROCANDO IDEIAS

Agora que você já conhece um pouco sobre a construção dos ideários de Cidadania e de
Direitos Humanos, as conjunturas históricas em que estes termos foram alcunhados e o alcance

destes.

Analise a atual conjuntura de violações e negações de direitos, de retrocessos democráticos, de

avanço do conservadorismo, depois acesse o fórum e dê a sua opinião sobre a efetividade dos

Tratados Internacionais de Direitos Humanos, pensando na situação brasileira e na relação do Brasil


com os demais Estados/países.

NA PRÁTICA

Suponhamos que você já é um assistente social e está trabalhando dentro de uma unidade de

execução de medidas socioeducativas de internação, destinadas aos adolescentes que cometeram

atos infracionais.

Durante os atendimentos aos adolescentes privados de liberdade, você começa a ouvir uma

série de relatos de uso de violência por parte de funcionários responsáveis pela segurança, dentre
elas a prática de torturas, castigos físicos e humilhações, sendo possível inclusive visualizar marcas no

corpo dos usuários, os quais amedrontados, temem denunciar a situação aos órgãos de proteção e

defesa dos direitos humanos.

Sabedor do segundo princípio do Código de Ética do Assistente Social, o qual coloca como

premissa básica aos profissionais a “defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e

do autoritarismo” você decide denunciar a situação à direção da unidade socioeducativa, a qual diz
que tomará as providências. Passado algum tempo, as situações de tortura se agravam e nenhuma

providência foi tomada. Os agentes socioeducativos passam a tratá-lo com frieza e desferir olhares

ameaçadores, pois sabem que você denunciou a situação. Em meio a esta situação, você descobre
que as violações aos direitos ocorrem com a conivência da direção e muitas vezes a seu mando. Além

disto, as condições de habitabilidade do local são insalubres, a alimentação é precária e faltam


materiais de higiene pessoal aos adolescentes. Quais seriam as possibilidades de ação neste caso?
Reflita.
Indicação de leitura para auxiliar na sua reflexão: Brasil será denunciado na ONU por causa
dos presídios capixabas. Acesse no link: <http://memoria.ebc.com.br/agenciabrasil/noticia/2009-
11-11/brasil-sera-denunciado-onu-por-causa-de-presidios-capixabas>

SÍNTESE

Nesta aula pudemos traçar as bases para a construção dos ideários de Cidadania e de Direitos
Humanos, conhecendo as bases históricas e os contextos em que cada um foi erigido.

Primeiramente, vimos sobre o conceito de cidadania e que este não pode ser visto de forma
estanque, pois os direitos dos cidadãos foram sendo ampliados e restritos, sistematicamente,

conforme os contextos históricos vivenciados em cada país. Ademais, a cidadania é mais restrita às
leis e aos direitos de cada Estado, de cada nação, não sendo universais: cada país terá a sua forma de
acesso e a sua definição de cidadania, com mais ou menos direitos, para mais ou menos pessoas.

Já os Diretos Humanos estão inscritos na senda do Direito Internacional e são tidos como
“universais”, do ponto de vista formal.

Ou seja, todos os cidadãos do mundo teriam estes direitos garantidos, sendo os principais o
direito à vida, às liberdades (de pensamento e de expressão, de posse de propriedade, religiosa, etc.,

à igualdade, à integridade física e moral, dentre outros). Os países signatários dos tratados que
violam os seus preceitos podem ser julgados e responsabilizados pelo Tribunal Internacional da ONU.

Por fim, apontamos que não se pode ter apenas uma visão romantizada acerca da Cidadania e
dos Direitos Humanos, pois estes surgiram num contexto de defesa da propriedade privada e das
liberdades individuais, sendo que a pretensa igualdade se refere apenas à igualdade perante as leis,

já que nenhum dos Tratados Internacionais visa a qualquer ação dos Estados signatários para
erradicar as desigualdades sociais.

Igualmente, uma parcela generosa da população, em especial no Brasil, ainda é expropriada dos
seus direitos sociais mínimos, e em que pese nosso país ser signatário de grande parte destes
Tratados Internacionais, ainda vemos presente em nossa sociedade o preconceito, à discriminação, às

práticas de violências mais diversas, em especial contra as chamadas “minorias”, tais como crianças e
adolescentes, negros, população LGBT, pessoas com deficiência, dentre tantos outros.
REFERÊNCIAS

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Campus, 1992.

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PIOVESAN, Flávia. Tratados internacionais de proteção dos direitos humanos: jurisprudência


do STF. 2016. Disponível em: <www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/.../16470-16471-1-PB.pdf>.
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QUEIROZ, Rodrigo C. F. C. L. Tratados internacionais de direitos humanos: noções gerais e a


problemática em redor da hierarquia legal. 2016. Portal Âmbito Jurídico. Disponível em

http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11604>. Acesso em
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VIEIRA, Evaldo. Os direitos e a política social. 3.ed. São Paulo: Cortez, 2009.

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