Você está na página 1de 624

ELaboRado Por: ALUNOs do 20-26

CooRdeNação e Edição FiNal: RUi GoRdo


ANo Letivo 2021-2022
Aula 1 – Perspetivas em Microbiologia ......................................................................................... 3
Aula 2 – Relações Hospedeiro – Parasita ...................................................................................... 8
Aula 3 – Propriedades Gerais das Bactérias ................................................................................ 11
Aula 4 – Antimicrobianos ............................................................................................................ 15
Aula 5 e 6 – Streptococcus e Enterococcus I e II .......................................................................... 23
Aula 7 – Staphylococcus .............................................................................................................. 34
Aula 8 – Enterobacterales I ......................................................................................................... 39
Aula 9 – Enterobacterales II ........................................................................................................ 46
Aula 10 – Pseudomonas, Acinetobacter ...................................................................................... 55
Aula 11 – Neisseria, Haemophilus, Legionella............................................................................. 59
Aula 12 – Chlamydia, Mycoplasma, Bordetella........................................................................... 65
Aula 13 – Mycobacterium ........................................................................................................... 74
Aula 14 – Vibrio, Campylobacter, Helicobacter........................................................................... 80
Aula 15 – Bactérias Anaeróbias ................................................................................................... 86
Aula 16 – Bacillus, Corynebacterium ........................................................................................... 97
Aula 17 – Espiroquetídios.......................................................................................................... 105
Aula 18 – Rickettsiaceae............................................................................................................ 117
Aula 19 – Dermatofitos, Leveduras ........................................................................................... 135
Aula 20 – Fungos Dimorfos e Filamentosos .............................................................................. 137
Aula 21 – Protozoários Intestinais ............................................................................................ 139
Aula 22 – Protozoários do Sangue ............................................................................................ 146
Aula 23 – Patogénese da Malária.............................................................................................. 156
Aula 24 – Protozoário dos Tecidos ............................................................................................ 165
Aula 25 – Nematodes ................................................................................................................ 178
Aula 26 – Trematodes, Cestodes............................................................................................... 187
Aula 27 – Propriedades Gerais dos Vírus. Diagnóstico Laboratorial das Infeções Víricas ........ 193
Aula 28 – Adenovírus, Papilomavírus e Parvovírus ................................................................... 201
Aula 29 – Picornavírus e Rotavírus ............................................................................................ 209
Aula 30 – Vírus das Hepatites ................................................................................................... 215
Aula 31 – Herpesvírus e Poxvírus .............................................................................................. 223
Aula 32 – Orthomyxovírus e Paramyxovírus ............................................................................. 234
Aula 33 – Arbovírus. Priões ....................................................................................................... 243
Aula 34 – Retrovírus .................................................................................................................. 250
Aula 35 – Bacteriófagos e Terapêutica Bacteriofágica.............................................................. 256
Aula 36 – Coronavírus ............................................................................................................... 264
Aula 37 – Infeção Associada aos Cuidados de Saúde ................................................................ 269
Aula 38 – Vacina para a Malária................................................................................................ 277
Aula 39 – Epidemiologia Molecular em Microbiologia Clínica .................................................. 284
Aula 40 – Profilaxia Ativa das Doenças Infeciosas .................................................................... 293

Não posso deixar de agradecer a todos os que contribuíram para que


estas notas da componente de microbiologia fossem completadas com
sucesso!

Carolina Santos Margarida Torres


Cátia Silva Maria Carolina Falé
Helena Sousa Maria de Catarina
Inês Jaques Maria Outeiro
Inês Pinto Maria Simioni
Inês Vaz Pato Mariana Pereira
Jéssica Machado Marta Silva
Joana Silva Matilde Calheiros da Gama
Leandra Salvador Raquel Julião
Leonor Araújo Raquel Pires
Leonor Dias Sara Justo
Leonor Guerreiro Simão Espinho
Madalena Calheiros da Gama

E restantes colegas que não apreciam ser nomeados aqui!

Obrigado pelo Esforço e por me Terem Aturado!!!


Data Docente
28/09/2021 Prof. Doutor Melo Cristino

Existem várias doenças que são causadas por bactérias:


• SSSS – síndrome da pele escaldada causada pela Staphylococcus aureos; é caracterizada
pela escamação da pele e consequente infeção dos tecidos.
• A infeção por clostridium pode causar gangrena gasosa, por exemplo na sequência de
uma complicação cirúrgica.

E por vírus:
• Varíola (POX vírus; é considerada atualmente a única doença completamente erradicada
no mundo)
• Linfoma de Burkitt (causado pelo vírus Epstein bar; é muito comum em África)
• Eczema herpético
• Existem vários tipos de vírus, desde os rotavírus (muito comuns) até aos bacteriófagos
(parasitam apenas bactérias).

Ou parasitas:
• Elefantiase do escroto/membros inferiores
• Malária, sendo a sua forma mais grave a malária cerebral.
• Os parasitas mais comuns podem ser fungos como aspergillus, rhizopus ou bipolaris;
protozoários como plasmodium, leishmânia e cryptoesporidium (causa diarreias
severas); ou helmintas como as ténias ou ascaris lumbricoides (lombrigas – terapêuticas
medicamentosas podem induzir a expulsão das lombrigas ainda vivas e em grandes
quantidades).

As bactérias podem assumir diferentes formas: esferas/coccus (ex: staphylococcus),


alongadas/bacilos (ex: clostridium), virgula/til (ex: helycobacter), espiralada…

A história da Microbiologia iniciou-se por volta do século XVII. A descoberta da existência de


microrganismos deu-se por mera curiosidade. Anthony van Leeuwenhoek realizou as primeiras
observações de microrganismos, aos quais chamou “animálculos”. No entanto, foi difícil à
comunidade científica da época crer na existência destes seres e assim passaram-se dois séculos
até a Microbiologia realmente aparecer.
No século XVIII, surge a peste na Europa. Nessa altura, os médicos só se aproximavam dos
mortos ou dos doentes devidamente precavidos. Ou seja, usavam vestuário protetor; uma
máscara com olhos de vidro e um longo nariz com fragrâncias para afastar o suposto “veneno”
causador da peste; luvas; um avental longo de cabedal e um bastão para tocar nos corpos dos
doentes. Portanto, já nesta altura se sabia que o agente causador da doença era algo que não
se via mas que estava lá.

Foi então no século XIX que se deu o nascimento da Microbiologia como uma ciência.
• Ignaz Semmelweis (1840)
o A mortalidade das crianças que nasciam de parto normal (e das mães) nesse
hospital era de cerca de 10%. No entanto, na mesma cidade, havia uma
maternidade na qual trabalhavam apenas enfermeiras- parteiras. Nesta
maternidade, a mortalidade era de 1%, portanto, 10 vezes menor do que no
hospital que era considerado o melhor da Europa. Semmelweis decidiu então
investigar o que é que se fazia nessa maternidade que levava a uma mortalidade
tão reduzida. No hospital, as mulheres morriam de febre puerperal, que é uma
sepsis, uma infeção muito grave que atinge o útero e depois se dissemina,
levando à morte na ausência de tratamento. Semmelweis pensou então que
esta infeção deveria ser provocada por qualquer coisa que era transportada nas
mãos dos médicos e dos estudantes de medicina. Isto porquê? Porque os
mesmos médicos e estudantes de medicina que faziam os partos às parturientes
eram os mesmos que estavam constantemente a fazer autópsias e a aprender
tudo aquilo que depois dava fama àquele hospital. Portanto, os médicos vinham
diretamente das salas de autópsias, usando o mesmo vestuário, para as salas de
partos e traziam nas suas mãos algo que depois desencadeava a morte das
crianças e das mães. O que Semmelweis fez foi implementar como obrigatória
a lavagem de mãos antes de fazer os partos. Em pouco tempo, a mortalidade
infantil e materna naquele hospital igualou a da maternidade onde só havia
enfermeiras. Isto vem mostrar a enorme importância das nossas mãos como
veículos de transmissão de agentes que causam infeções potencialmente
mortais.
• Louis Pasteur, responsável por:
o Fim da doutrina da Geração Espontânea;
o Meios líquidos de cultura bacteriana;
o Esterilização de materiais;
o Conceito de virulência e atenuação;
o Vacinação animal contra o carbúnculo;
o Vacinação humana contra a raiva.

No século XIX, o carbúnculo era uma doença que matava um grande número de animais na
Europa, principalmente ovelhas. Aos animais, bastava-lhes ingerirem esporos do bacilo
responsável pela doença e rebanhos inteiros eram dizimados. Ora, Pasteur conseguiu isolar a
bactéria e baixar a sua virulência em laboratório. No entanto, tanto para as populações como
para a comunidade científica era difícil acreditar na eficácia da vacinação.

Assim, para comprovar a sua descoberta, Pasteur procedeu à realização de uma experiência de
campo. Ele dividiu um grande rebanho ao meio. Metade das ovelhas foram vacinadas e a outra
metade não foi. Quando, na madrugada seguinte, foram ver os resultados, apenas as ovelhas
que tinham sido vacinadas se levantaram. As outras estavam mortas.

Nota: O conceito de virulência diz respeito à agressividade do microrganismo para o Homem.


• Robert Koch:
o Meios sólidos de cultura bacteriana;
o Descoberta dos agentes etiológicos do carbúnculo, da cólera e da tuberculose.
Apesar de Pasteur ter conseguido vacinar os animais contra o carbúnculo, não foi ele o
responsável pela identificação do bacilo, mas sim Robert Koch. O bacilo da tuberculose é
designado na gíria médica por B.K., que significa bacilo de Koch. No século XIX, a tuberculose era
uma doença muito temida, porque ela atingia principalmente as camadas mais jovens da
população e levava a uma morte lenta, prolongada, com declínio das capacidades intelectuais,
mas sem grande sofrimento, exceto na sua fase final. Foi então Koch que descobriu que a
tuberculose é causada por um agente infecioso, um microrganismo. Para além disso, Robert
Koch enunciou os chamados Postulados de Koch. Estes postulados são regras que devem ser
cumpridas para se poder dizer que um determinado microrganismo causa um dado tipo de
infeção.

o Postulados de Koch:
1. O mesmo microrganismo tem que estar presente em todos os casos da
doença. Por exemplo, um indivíduo que tenha tuberculose tem
necessariamente de ter a bactéria que é responsável pela doença;
2. Os microrganismos são isolados dos tecidos de um animal morto – tecidos
lesionados – e tem de ser preparada uma cultura pura;
3. Os microrganismos dessa cultura são inoculados num animal suscetível,
mas saudável. A doença é reproduzida, portanto, o animal adoece com a
doença típica;
4. Microrganismos idênticos são isolados e recultivados a partir do animal
experimental, do animal que ficou doente.

Nota: Cultura pura é a cultura de um de microorganismo onde estão ausentes outros tipos de
microorganismos.

Ainda hoje, para podermos afirmar que um determinado agente é responsável por uma infeção,
temos necessariamente que recorrer a este tipo de regras. Só cumprindo estas regras é que
podemos ter a certeza de que há a relação microorganismo-doença.

Século XX
• Alexander Fleming (1929):
o Descoberta da penicilina. Alexander Fleming era um cientista que trabalhava
com microrganismos, com o qual, uma vez, uma placa que continha colónias de
bactérias em crescimento, foi contaminada com um fungo, o Penicilium.
Fleming teve o bom senso de verificar que, nas proximidades do fungo, as
colónias de bactérias estavam a desaparecer. A Penicilina foi então o primeiro
antibiótico a ser usado.
• OMS (1979):
o A varíola foi considerada como a primeira doença a ser completamente
erradicada do planeta. Para além de ser uma doença mortal, a varíola é uma
doença extremamente mutilante, pois as cicatrizes por ela causadas são
indeléveis, irreversíveis. Esta doença sem tratamento, causada por um vírus, foi
erradicada graças a uma campanha de vacinação mundial que chegou mesmo
aos países mais recônditos. Hoje em dia, uma vez que a doença desapareceu, as
pessoas já não são vacinadas contra ela. Não se justifica estar a proteger
ativamente uma população contra uma coisa que já não existe. No entanto,
teme-se que esta verdade venha a ser fragilizada, porque há países que
ameaçam ter guardado o vírus para o usar como arma biológica.
• C. Venter, H. Smith e C. Fraser (1995):
o Descrição do primeiro genoma completo de uma microorganismo –
Haemophilus influenzae.

No início do século XXI

Há problemas que se mantêm e outros que chegam mesmo a agravar-se. Alguns deles são:
• Diarreias infeciosas: São a primeira causa de morte em todo o mundo, apesar de não o
serem nos países da Europa Ocidental, no Japão ou EUA. São especialmente perigosas
nos países em desenvolvimento.
• Infeções Respiratórias: são especialmente mortais nos dois extremos da idade. Afeitam
os mais idosos e os muito jovens.
• Tuberculose, SIDA e Malária: São consideradas pela OMS como sendo as três piores
epidemias do século XXI. Estas doenças não são idênticas. No entanto, a tuberculose e
a SIDA andam muitas vezes associadas. A Malária é importante nas regiões tropicais
onde existe o vetor responsável pela sua transmissão. É ausente em Portugal. Devem
concentrar-se todos os esforços para tentar eliminar estas três epidemias.
• Doenças transmitidas pela cadeia alimentar: Estas doenças são muito o fruto da
globalização. Por exemplo, a carne que se usa num restaurante de uma cadeia
internacional em Portugal, pode ser a mesma que se usa por exemplo na China. Se
houver a contaminação de alguns ingredientes com microrganismos raros, as infeções
são disseminadas a nível mundial. Outro exemplo é a crise das vacas loucas. Para ter
uma produção de carne mais elevada, o Homem, no fundo, transformou herbívoros em
carnívoros. Esta situação teve origem na Inglaterra, onde se começou a utilizar uma
ração alimentar a partir da carne de carneiro. Portanto, ao alimentar as vacas com essa
ração, um agente patogénico que até aí atingia apenas a espécie ovina, o da
encefalopatia espongiforme, passou a atingir também a espécie bovina. Então, como o
homem se alimenta da carne de vaca, começaram a aparecer casos de uma doença com
um período de incubação longo, mas que subitamente, levava à morte.
• Resistência aos antibióticos. Os microrganismos são muito mais eficazes do que o ser
humano a partilhar informação genética e, sobretudo, a multiplicar-se. Então, acontece
que, quando os microrganismos são ameaçados – os antibióticos ou destroem
rapidamente os microrganismos ou então impedem-nos de se dividirem – eles tentam
destruir o antibiótico. Quando o conseguem fazer, as bactérias transmitem a informação
genética (que permite evitar a destruição pelo antibiótico) de umas para as outras, quer
dentro da mesma espécie, quer para espécies diferentes.
Nota: Período de incubação é o período de tempo durante o qual a pessoa está infetada e não
sabe disso.

Novas ameaças:
• Bioterrorismo;
• Novas Infeções:
o Severe Acute Respiratory Syndrome (Síndrome Respiratório Agudo) ou
Pneumonia Atípica (SARS) - 2003;
o Middle East Respiratory Syndrome (MERS) – 2012;
o SARS-COV2 (COVD-19);
o Doença por virus Ébola – 2014;
o Doença dos Legionários – 2014 (Surto em Portugal), causada por inalação de
aerossóis contaminados com legionella; muito frequente nos sistemas de
arrefecimento de ar-condicionado.;
o Infeções por vírus Zika – 2015, induz quadros de anencefalia e é transmitido
através da picada de mosquitos.;
o Febre Amarela (Surto em Angola) – 2015-2016, atualmente existe vacina eficaz,
sendo esta recomendada quando viajamos para alguns destinos tropicais onde
a doença é comum.
o Sarampo - Pode expressar-se de formas graves, nomeadamente causando
pneumonias severas; atualmente quase não existe em Portugal devido à
vacinação eficaz. No entanto, é considerada uma doença endémica no Reino
Unido, Grécia, República Checa e Albânia, sendo recomendada a vacinação aos
viajantes.

Doenças que se têm alastrado no séc. XXI


Data Docente
28/09/2021 Prof. Doutor Melo Cristino

Apenas cerca de 10% de nós é humano – existem muito mais bactérias indígenas no nosso corpo
do que células humanas!
Microbioma representa o conjunto de todos os milhões de organismos que vivem connosco,
dentro do nosso corpo e à superfície da pele. É no intestino que a quantidade destes
microrganismos é maior; por outro lado, o globo ocular funciona como um local quase estéril
porque a lisozima presente na solução lacrimal destrói quase todos os microrganismos.
Quando nascemos somos praticamente estéreis e é durante o parto que múltiplas bactérias
começam pela primeira vez a colonizar o nosso corpo.
Podemos classificar os microrganismos como:
• Residentes – existem naturalmente numa determinada região do nosso corpo e são
capazes de viver e de se multiplicarem nas condições locais. Ex: staphylococcus
presentes na pele.
• Transitórios – surgem num determinado local do corpo, mas não se conseguem
multiplicar aí devido às condições existentes. Ex: E.coli na pele (esta é apenas residente
nos nossos intestinos).

É importante saber distinguir dois termos:


• Colonização – diz respeito à presença do microrganismo num dado local que não causa
dano estrutural ou funcional nem induz uma resposta imune exacerbada.
• Infeção – traduz o processo de aquisição de um microrganismo que se multiplica e causa
lesão estrutural ou funcional no hospedeiro.

A existência de microrganismos indígenas no homem apresenta inúmeros benefícios:


• São estes que controlam a resposta imunitária à infeção
• Previnem a colonização patogénica por microrganismos exógenos
• Sintetizam substâncias essenciais para a nossa sobrevivência (simbiose). Ex: vitamina K.
• São fundamentais para o processo de digestão
• Aumentam a nossa capacidade de regeneração e resistência à lesão.

Contudo, podem existir inconvenientes quando estes microrganismos se multiplicam em


excesso (após alteração das condições locais, terapêutica antibiótica ou imunossupressão) ou
quando colonizam um local onde não deviam existir ou que é naturalmente estéril.
A origem da infeção pode ser:
• Endógena – causada por microrganismos que já existem no nosso corpo. Ex:
complicações após uma intervenção cirúrgica onde a ferida pode ficar infetada. Esta é
muitas vezes uma infeção oportunista que resulta de uma quebra no equilibro.
• Exógena – a fonte de infeção é externa ao nosso corpo (ar, água, comida); pode
representar um caso de infeção ambiental ou infeção cruzada.
Ação patogénica
Depende sempre de uma porta de entrada (boca, trato urogenital, conjuntiva, pele, …) e de uma
porta de saída (ânus, boca no caso de infeções respiratórias, …).

Por vezes está envolvido um vetor/hospedeiro:


• Vetor – pode funcionar tanto como porta de entrada como de saída. Um vetor participa
ativamente na transmissão. Ex: mosquito pica e aspira o protozoário plasmodium que é
responsável por causar malária; depois o parasita evolui no seu interior até o mosquito
picar outro hospedeiro e transmitir a doença.
• Reservatório – representa um transportador passivo cuja transmissão não depende
exclusivamente da sua atuação. Ex: uma mosca pousa em fezes e fica com salmonela
nas patinhas; depois a mosca pousa num bolo e uma pessoa come e fica infetada.

Lesão = interrupção da estrutura/função a nível celular (necrose, mutação), tecidular


(inflamação, fibrose) ou orgânico (obstrução ductal).
É importante distinguir:
• Patogenicidade – é a capacidade de o agente patogénico causar doença.
• Virulência – traduz a capacidade relativa de um microrganismo causar lesão, estando
diretamente relacionada com a intensidade da lesão (é comparável entre diferentes
microrganismos). Neste caso fala-se em fator de virulência, que diz respeito ao
componente microbiano que é específico de uma determinada espécie e que é
responsável por lesar o hospedeiro.

Transmissão
Existem diferentes meios de transmissão, entre as quais se pode distinguir:
• Transmissão vertical – por exemplo, infeções transmitidas de mãe para filho (hepatite
B, toxoplasmose, etc)
• Transmissão horizontal – é a mais comum; entre pessoas sem relação aparente. Este
tipo de transmissão pode ser:
o Oral-oral (espirros, tosse) | tem elevado poder de disseminação
o Fecal-oral | é o método de eleição para a transmissão de doenças diarreicas.
o Sexual | através da boca, vagina, pénis, ânus, mãos…
o Através de um vetor | neste tipo de transmissão o vetor é estritamente
necessário à infeção; na sua ausência não há infeção.
o Zoonose | não envolve vetores; consiste na transmissão acidental de
patogénicos de animais para humanos. É particularmente comum em ovinos.
Neste tipo de infeção, o homem não consegue transmitir a outro homem; o
sentido é sempre animal → homem. Ex: brucelose nas cabras e ovelhas causa
mastites graves e ao consumirmos queijos não pasteurizados, a infeção pode
passar para nós.
o Zoonose com vetor | neste caso, trata-se de doenças transmitidas
naturalmente entre animais através de vetores que, acidentalmente, podem
infetar humanos. Ex: as carraças encontram-se normalmente na vegetação e,
embora o homem não seja o alvo preferencial, de forma oportunista pode
morder e transmitir doença.

A maioria das infeções está associada à ausência de lesão tecidular, mas pode haver destruição
celular direta ou lesão por toxinas a nível morfológico ou tecidular. Uma lesão pode também
causar uma resposta imune excessiva, ou até mesmo cancro.
• Bactérias que podem causar cancro: H. pylori (cancro do estomago)
• Vírus que podem causar cancro: HPV, Epstein-bar (linfoma de burkitt, cancro da
nasofaringe…), hepatite B/C (cancro do fígado)

Controlo da transmissão
• Transmissão fecal-oral (saneamento básico e acesso a água potável);
• Transmissão sexual (preservativo e redução da promiscuidade)
• Zoonoses (controlo das infeções entre animais com vacinas, tentando ao máximo
reduzir os reservatórios; controlo dos vetores, o que é muito mais difícil porque estes
ganham frequentemente resistência aos produtos utilizados e existe um grande impacto
ambiental)
• Transmissão oral-oral (até agora não existe controlo 100% eficaz; recomendam-se
vacinas, uso de máscara e distanciamento social)
Data Docente
28/09/2021 Prof. Doutor Mário Ramirez

Objetivos:
• Indicar o tamanho de uma bactéria e a sua relação com o tamanho das células
humanas
• Descrever a forma de um bactéria e de colónias bacterianas
• Nomear métodos para a identificação bacteriana
• Identificar os principais constituintes de uma bactérias e nomear a sua função
• Discutir o possível impacto dos constituintes de uma bactéria em processos
patogénicos

A distinção entre eucariotas e procariotas é feita pela


existência de estruturas membranares no citoplasma nas
eucariotas e não nas procariotas. Além desta distinção sabe-se
que as moléculas de DNA dos eucariotas são lineares, enquanto
nos procariotas são circulares e ainda possuem plasmídeos. Os
plasmídeos têm duas características importantes: são elementos
genéticos móveis que podem ser transferidos duma bactéria para
outras; e codificam genes responsáveis por características que
conferem resistência aos agentes antimicrobianos e genes que
codificam características virulentas através de estruturas de
superfície. Os Eucariotas são diploides, têm dois alelos do mesmo
gene, e os procariotas são haploides. Os Eucariotas têm mais DNA
e mais genes, e os procariotas menos DNA e menos genes, embora
a proporção não seja linear.

Tamanho dos microrganismos

Classificação
Propriedades fenotípicas: podemos medir nos microrganismos e são muito utilizadas no
dia-a-dia.
• Morfológicas:
o Quanto à forma das células, as bactérias podem-se dividir em quatro
tipos morfológicos:
▪ Cocos (forma arredondada); podem estar arranjados em:
• Diplococos (2 cocos lado a lado),
• Estreptococos (cadeias de cocos),
• Tétrades (4 cocos adjacentes),
• Estafilococos (conjunto de cocos com forma de cachos)
Ex: Staphylococcus aureus
▪ Bastonetes ou Bacilos ( forma alongada) Ex: Bacillus anthracis,
causador do carbúnculo;
▪ Espiroquetas ou Espirilos (forma ondulada) Ex: Treponema
Pallidum, responsável pela sífilis;
▪ Vibriões (forma em quarto crescente ou minguante) Ex: Vibrio
cholerae, que provoca cólera.

o A forma das colónias também é importante, tanto no bordo, como na


textura ou na forma como efetua o seu crescimentos
• Bioquímicas:
o Os fatores de crescimento usados pelas colónias também podem ser
usados para identificar as bactérias. Podem ser fastidiosas, ou seja,
retiram os fatores de crescimento do hospedeiro para se alimentarem.
o A capacidade de eliminar radicais de oxigénio é outra forma de
identificar as bactérias, nomeadamente a produção de: catalase,
peroxidase, superoxide dismutase, duperoxide dismutase combinada
com catalase ou superoxide redutase.
o Por outro lado outra forma de classificar as bactérias é pela respiração:
▪ Aeróbios: obrigatórios (só crescem na presença de oxigénio) (a),
facultativos (c) ou microaerófilo (necessita de uma quantidade
pequena de oxigénio para crescer) (d)
▪ Anaeróbios: obrigatórios (não crescem na presença de
ocigénio) (b), aerotolerantes (crescem na presença de oxigénio
mas não o utilizam) (e)

• Por fim, começa a ser utilizado um microscópio que mede a massa das proteínas
ribossomais e classifica as bactérias com base nesse dado.
Propriedades genotípicas: estão cada vez mais banalizadas nos dias de hoje. RNA e DNA
• PCR
• Sequenciação

Membrana citoplasmática: É uma estrutura fluída que constitui a principal barreira


entre o interior e o exterior das células. Local onde então muitas vezes ancoradas estruturas
como transportadores ou proteínas transmembranares.
Quando olhamos para a superfície das bactérias estas distinguem-se em dois grandes
grupos: Gram+ (cocos) ou Gram- (bastonetes).
As bactérias Gram+ apresentam uma
camada externa bastante espessa de
peptidoglicanos, cuja função é dar forma à
bactéria e suster a pressão osmótica da
mesma. Além do peptidoglicano temos
também a outras estruturas ancoradas, quer
no peptidoglicano quer diretamente a na
membrana citoplasmática das bactérias
Gram+. Os ácidos lipoteicóicos estão ligados
aos lipídios da membrana citoplasmática e os
ácidos teicóicos estão covalentemente ligados
ao a peptidoglicano, estando carregados
negativamente. Existem outros ácidos como os ácidos teicorónicos que são a fatores de
virulência importantes, pois têm uma atividade pró inflamatória. Existem algumas outras, alguns
outros géneros bacterianos que contêm a ácidos diferentes na sua superfície, nomeadamente,
por exemplo, os ácidos micólicos, que existem no género micobactéria, e que são responsáveis
pela ácido resistência. Portanto, para além dos ácidos micólicos, tem temos também na
superfície alguns polissacarídeos neutros.
Nas bactérias de Gram-, temos uma
membrana externa que cobre o a camada de
peptidoglicano, que sustemn a mesma a pressão
intracelular. Enquanto a membrana citoplasmática
interna é constituída por 2 folhetos simétricos, na
membrana externa, o folheto externo e o folheto
interno podem ter composições diferentes.
Nomeadamente no folheto externo da membrana
externa, temos o lipopolissacárido LPS, que é muito
importante porque tem uma atividade pró
inflamatória muito significativa e pode induzir ao
síndrome de Sépsis. O lipopolissacárido tem três
componentes principais: o lípido A que é o
componente tóxico, muitas vezes também
chamado endotoxina; um polissacárido somático que é característico da espécie; e um a
antigénio O que é altamente variável entre estirpes da mesma espécie, pois é a parte que está
mais exposta e portanto, é aquela que mais facilmente é vista pelo nosso sistema imunológico
levando o nosso organismo a montar respostas imunológicas levando a uma pressão seletiva.
Assim, a membrana externa além de ser uma barreira de permeabilidade a compostos
hidrofóbicos, é também uma barreira à passagem de antibióticos e, por ter sido selecionada nas
enterobacteriáceas, desenvolveu resistência aos sais biliares, o que lhe permite atingir o nosso
tubo digestivo.
Existem umas estruturas muito importantes na membrana externa, as porinas. Estas são
canais que permitem a passagem da maior parte das substâncias menores do que 600 Dalton.
No contexto das bactérias Gram- mutações nas purinas que vão alterar a composição do poro
fazendo com que as bactérias desenvolvam resistência a alguns antimicrobianos.

O método de coloração de Gram vai distinguir as bactérias entre Gram+ e Gram-, ficando
as grandes positivas azuis, enquanto as grandes negativas ficam rosas, Estando isso relacionado
com a espessura do peptidoglicano e a existência de uma membrana externa.

O glicocálix é a primeira camada a interagir com o ambiente e outros organismos,


nomeadamente o nosso sistema imunitário. Se a esse glicocálix se for abundante e for
claramente visível por microscopia óptica, chama-se cápsula. As cápsulas são constituídas por
polissacáridos e, nalguns caos por peptidos. São extremamente diversas e são um fator de
virulência importante, uma que protegem contra o sistema imunológico, promovem a adesão
das bactérias aos nossos tecidos, protegem contra a secura e atuam como reserva de nutrientes.

Os apêndices apresentam-se em três tipos nos procarióticas: os flagelos, as fímbrias ou


pili; e os pili sexuais; sendo que estes tipos de apêndices têm funções diferentes. Enquanto os
flagelos são usados para a locomoção, as fímbrias, ou pili, são usadas para a adesão aos tecidos
do hospedeiro, e os bissexuais são usados para prometer trocas genéticas. Os flagelos
classificam-se de acordo com o seu número e a sua distribuição na célula e permitem às
bactérias moverem-se e deslocarem-se a regiões importantes, nomeadamente, através de do
muco e atingir a superfície de uma mucosa. As fímbrias ou pili são usadas na adesão e são
estruturas mais curtas, finas e retas e que os pili e estão frequentemente envolvidas na
patogenicidade. Os pili são polímeros de uma única proteína, a que chamamos pilina, e na ponta
a desta fímbria de pilina temos a adesina, que vai mediar a adesão específica das bactérias,
principalmente a oligossacáridos que estão em glicoproteínas e glicolipídeos na superfície das
células dos nossos tecidos. Os pilis sexuais são estruturas mais longas, despesas e flexíveis e são
responsáveis pela transmissão de informação genética. Mas as diferenças não só não são só ao
nível da superfície, a temos os ribossomas.

Os ribossomas procarióticos são ribossomas 70s, tem uma subunidade 50s e uma
subunidade 30s; enquanto os eucarióticos são 80s, como a subunidade 60s e outra 40s. A
importância desta distinção prende-se nos antimicrobianos que atuam especificamente sobre
os ribossomas procarióticos não sobre os ribossomas eucarióticos que existem nas nossas
células.

Os endósporos são corpos internos que apresentam uma enorme resistência à


temperatura, à secura, a agentes químicos e pressões osmóticas, permitindo às bactérias que
os produzem sobreviver a processos de desinfeção normais a antimicrobianos e no meio
ambiente durante um longo período de tempo, podendo mais tarde infetar novamente um
hospedeiro suscetível. Os principais géneros que produzem endósporos são o género bacillus,
do qual os Bacilluss Anthracis é mais importante do ponto de vista das infecções humanas, e o
género Clostridium, que apresenta várias espécies que são importantes agentes de infeção para
o Homem. Podemos classificar a os esporos de acordo com a sua localização, poderá ser central
no Bacilos Anthracis, subterminal no caso do Bacillus cereus, ou terminal no caso Crostridium
tetani. O processo de esporulação é um processo de diferenciação celular, ou seja, a célula
vegetativa quando se divide, divide-se na célula mãe do esporo e na célula que vai constituir o
esporo, sendo que a célula mãe do esporo morre e liberta o mesmo.
Data Docente
28/09/2021 Prof. Doutor Mário Ramirez

O que é um antibiótico? No dicionário é aquilo que atua destruindo a vida; designação


de certas substâncias que atuam impedindo certas manifestações vitais de alguns
microorganismos, ou destruindo estes, sendo por isso aplicadas contra a ação patogénica de
certos parasitas em defesa do hospedeiro. O antibiótico deve inibir uma função essencial à
sobrevivência do microrganismo focando-se em três aspetos principais dos microrganismos: a
formação da Parede celular, nomeadamente a biossíntese do peptidoglicano e das estruturas
semelhantes que existem nos microrganismos, mas não existem nas nossas células; funções
relativas aos ácidos nucleicos; e a síntese de proteínas. A toxicidade deve ser seletiva, ou seja,
deve ser eficiente contra a bactéria, o microrganismo, mas deve ter pouca toxicidade para o
doente. Para além disso, existem dois tipos de a antibacterianos, aqueles que são
bacteriostáticos, ou seja, os que impedem o crescimento e a divisão bacteriana, mas não
destroem os microrganismos por si só, assim os antimicrobianos são sempre um ajudante no
controlo da infeção. Por outro lado, aqueles que são bactericidas, ou seja, aqueles que causam
a morte diretamente das bactérias. O facto de um antimicrobiano ser bacteriostático não quer
dizer que seja menos eficaz ou menos adequado do que um que é bactericida.

O que é que acontece quando tomamos um antibiótico? O nosso organismo existe com
milhões ou milhares de milhões de microrganismos e quando ficamos doentes entra no nosso
corpo um microrganismo que o habitualmente não existe dentro do mesmo, ou se existe acede
a um território anatómico diferente. Assim, quando tomamos um antibiótico, este não atua
exclusivamente sobre o microrganismo patogénico, mas sim sobre todos os microrganismos que
são suscetíveis e que vivem no nosso organismo, o que leva um desequilíbrio da nossa
microbiota. Se o microrganismo que causa a infeção que nos faz ficar doentes for resistente ao
antibiótico, pode até criar-se condições para o microrganismo se expandir e, portanto, tornar a
infeção mais grave ao tomarmos um muitos antibióticos. Esse é o caso típico das Gastroenterites
em que, de uma maneira geral, a administração de antibióticos e não é a indicada, exatamente
porque nós queremos manter a microbiota do tubo deste livro e não, perturbá-la por ação dos
antimicrobianos. A penicilina foi o antimicrobiano que teve maior impacto na medicina quando
foi descoberto, em 1928. No entanto, foi apenas na segunda Grande Guerra que existiu
produção em massa da penicilina a partir de um fungo ligeiramente diferente, o Penicillium
chysogenum. A penicilina inibe a síntese de parede celular e por isso é extremamente eficiente
contra bactérias de grande positivo, porque toda a maquinaria de síntese do peptidoglicano da
parede celular está exposta na superfície, enquanto nas bactérias de Gram-, devido à existência
de duas membranas que dificultam o acesso da penicilina ao peptidoglicano. A penicilina
também tem uma baixa toxicidade para o homem o que permite atingir elevados níveis no soro,
o que facilita a sua utilização.

A biossíntese do peptidoglicano é um processo complexo. Apresenta uma primeira fase,


no citoplasma da bactéria que é a síntese do monómero que vai constituir a parede, um
dissacárido de a ácido burânico com um pentapeptido. Este dissacárido é transportado para o
folheto exterior da membrana, onde é adicionada a uma ponte em algumas bactérias que vai
permitir a ligação cruzada das cadeias de peptidoglicano. Existem umas proteínas chamadas
PBPS, que a vão fazer a síntese, do peptidoglicano no folheto externo e depois vai haver uma
reciclagem do bactoprenilfosfato para o interior.
A síntese do peptidoglicano faz-se com a degradação de uma cadeia existente e a
inserção de três cadeias novas. Não pode haver um pequeno buraco na malha de
peptidoglicano, porque se existir a célula rebenta. Os Beta-lactâmicos ligam-se covalentemente
às PBP’s, Penicillin binding protein. Já se sabia estas proteínas se ligavam à penicilina mesmo
antes de se saber que participavam na síntese do peptidoglicano. Além disso os beta-lactâmicos
e impedem a reação de transpeptidação, ou seja, a reação que permite ligar as cadeias novas
de peptidoglicano às cadeias antigas de peptidoglicano.

As penicilinas levam ao potencial de libertação de componentes microbianos,


nomeadamente ácido teicóico, ou toxinas citoplasmáticas, como a pneumolisina ou o LPS que
está na membrana externa das bactérias Gram-. Estes microbianos tem atividade pró
inflamatória ou tóxica e a sua libertação pode requerer abordagens terapêuticas,
nomeadamente em casos de meningite, em que a dexametasona, um corticoide anti-
inflamatório, é administrada em caso de emergência na pediatria, sendo que a sua utilização
nos adultos é controversa, e por isso existem outras abordagens que se podem tentar para o
controlo da resposta imunológica sem haver uma imunossupressão generalizada.

Os Beta-lactâmicos são uma classe de antibióticos que tem um anel beta-lactâmico.


Alteração do alvo – o antibiótico (triângulo branco) encaixa perfeitamente no alvo e se
houver alteração do alvo o encaixe deixa de ser perfeito e, portanto, não há uma inibição desta
atividade.

Alteração de permeabilidade - impedindo o acesso do antimicrobiano ao seu alvo,


nomeadamente as purinas que impedem a entrada dos antimicrobianos nas bactérias de Gram-
, ou por bombas de efluxo que bombeiam o antimicrobiano para fora do citoplasma onde está
o seu alvo.

Inativação ou modificação enzimática - o enzima ou degrada o antimicrobiano ou


coloca grupos químicos que vão impedir a interação do antimicrobiano com o seu alvo.

Vias alternativas - se a bactéria precisa de “duas bolinhas azuis ligadas entre si” para
sobreviver e o antimicrobiano impede o enzima de catalisar a reação de ligação, se existir outro
enzima para catalisar a mesma reação a bactéria vai ser resistir.

Usando o exemplo de evolução


dos Estafilococos Aureus, a sua
resistência à penicilina por produção de
beta-lactamases aconteceu pouco
depois da penicilina ter sido utilizada na
prática clínica. As beta-lactamases são
muitas vezes codificadas em plasmídeos
e são responsáveis por cortar o anel
beta-lactâmico e impede a penicilina de
se ligar às PBPs impedir a síntese do
peptidoglicano. Estas enzimas são
excretadas posterior em bactérias
Gram+ e para o periplasma (espaço
entre a membrana interna e a membrana interna) em bactérias Gram-. Assim, havendo
produção de beta-lactamases por parte das bactérias arranjaram-se substâncias inibidoras de
beta-lactamases, que não tendo elas próprias necessariamente atividade antimicrobiana, vão se
ligar a estas enzimas e impedir-las de cortar o anel beta-lactâmico. Como exemplo destas
substências existe o ácido clavulânico, o sulbactam e o tazobactam.

As bactérias começaram a produzir beta-lactamases, que são insensíveis aos inibidores,


pelo que se desenvolveram novos derivados dos beta-lactâmicos, nomeadamente a meticilina,
que são resistentes às novas enzimas. Ao involuírem as bactérias desenvolveram novas PBPs, o
que no caso dos Estafilococos Aureus essas essa PBP é a PBP 2A que ocorreu pela viagem num
elemento genético móvel chamado o SCC MEC, que codifica uma nova PBP que não é inibida
pelas beta-lactamases e assim torna-se resistente à meticilina. Assim, os Estafilococos Aureus
utilizaram a inativação ou modificação enzimática e depois, no caso da meticilina, a alteração
do alvo ou as vias alternativas. Nas bactérias de Gram- não existe apenas a produção de beta-
lactamases no espaço periplasmático e a produção de PBP’s alternativas, mas também existem
mutações das purinas e o transporte ativo para fora do espaço periplasmático dos antibióticos
betalactâmicos que também pode levar à resistência.

Ainda, atuando sobre a biossíntese do peptidoglicano, existe uma outra classe de


antimicrobianos, glicopéptidos que atuam a um nível ligeiramente diferente do beta-lactâmicos.
Os glicopéptidos são ativos contra bactérias de gram-, ligando-se ao terminal D-ala D-ala do
pentapéptido que vai constituir o peptidoglicano e, portanto, impedem a reação de
transpeptidação. Ao contrário dos beta-lactâmicos que se ligam diretamente às PBPs, os
pentapéptidos ligam-se diretamente ao percussor do peprtidoglicano. Para além disso,
interagem também com a membrana e vão destabilizar a membrana, o que também pode
contribuir para a sua a ação antibacteriana.

O pentapéptido que constitui o pepetidoglicano, temos alguns aminoácidos D que são


aminoácidos especiais (normalmente o aminoácidos do nosso organismo são L) e, portanto, o
mecanismo de resistência aos glicopéptidos vai passar por degradar este terminal D-ala D-ala,
construir um terminal que D-ala D-lactato, com o qual os glicopéptidos não se vão conseguir
ligar, e por isso não vão conseguir impedir a reação de transpeptidaçãoe por isso deixam de
conseguir eliminar este D-ala para impedir o glicopéptido de se ligar. Estes são moléculas
grandes e, portanto, inativas contra bactérias de Gram-, porque não conseguem atravessar a
membrana externa, por isso a vancomicina e a teicoplanina são os mais utilizados. São
geralmente administrados por via parentérica e os genes encontram-se em plasmídeos e
transposões, sendo muito comum em Enterococos. Assim as vias alternativas são o mecanismos
de resistência mais comum aos glicopéptidos. Existem outros antimicrobianos que atuam quer
ao nível da síntese do monômero, quer ao nível da reciclagem do bactoprenilfosfato, no entanto,
a ciclosporina é muito tóxico, portanto não é usado e a bacitracina também, de ser
comercializada para a aplicação tópica e impede a reciclagem do bactoprenilfosfato.

As polimixinas, das quais a colistina é o exemplo de microbiano paradigmático, são


ativas contra bactérias de Gram-, nomeadamente contra os géneros pseudomonas, klebsiella e
acinetobacter, que são géneros multirresistentes associados a infeções adquiridas em ambiente
hospitalar. E são moléculas muito grandes que vão interagir com as membrana, tanto com a
membrana citoplasmática, cimo com diretamente com o LPS e com opanóides presentes na no
folheto externo da membrana externa das bactérias Gram- e vão promover a desagregação da
membrana. Assim, são antibióticos bactericidas.
Os inibidores da síntese proteica são bons antimicrobianos porque os ribossomas das
bactérias são muito diferentes dos das células eucariotas. Existem inúmeros antibióticos que
atuam ao nível do ribossoma, quer ao nível da formação do ribossoma, quer ao nível da reação
de transpeptidação, quer ao nível da fidelidade da tradução, quer a impedir a movimentação do
ribossoma no RNA mensageiro.
Os aminoglicosídeos inibem a formação do complexo de iniciação da fermiltionina.
Impedem o alongamento da cadeia polipeptídica e afetam a fidelidade da tradução. É a ligação
do antimicrobiano que vai fazer com que a leitura não seja correta e, portanto, a cadeia
polipeptídica que se forma, obviamente, não vai ser funcional, porque o polipéptido produzido,
não vai ter os aminoácido corretos. A resistência dá-se ao colocar grupos químicos a nestas
várias posições através da produção de enzimas e ao ter estes grupos químicos o antimicrobiano
já não vai conseguir interagir com o ribossoma. Assim o mecanismo de resistência é a
modificação enzimática.

As tetraciclinas inibem a entrada dos erros de transferência no Ribossoma e o


mecanismo de resistência é muitas vezes por bomba de efluxo, ainda que também haja
mecanismos de resistência às tetraciclinas em que há uma alteração do ribossoma.
O cloranfenicol inibe a peptidil-
transferase e o mecanismo de resistência é feito
por produção de um enzima chamado
cloranfenical acetil transferase, que vai pendurar
grupos acetil CoA no cloranfenicol e impedir-lo de
interagir com o ribossoma. Assim a inativação ou
modificação enzimática é o mecanismo de
resistência a mais comum.

O macrólidos e lincosamindas impedem a


formação da ligação peptídica e por isso a
transpeptidação entre os aminoácidos, sendo a
electromedicina, a claritromicina e
azitromicinatodos macrólidos que se classificam consoante o número de elementos no anel, o
que tem consequências farmacocinéticas e também na resistência. A clindamicina é uma
lincosamidas cujo mecanismo atua ao nível do ribossoma e tem mecanismos de resistência
comuns, embora seja diferente dos macrólidos a nível molecular. Assim o mecanismo de
resistência é por bomba de efluxo ativo em macrólidos de 14 e 15 elementos, mas não em
macrólidos de 16 membros nem em lincosamidas, outro mecanismo de resistência é a metilação
do RNA ribossomal. Assim os mecanismos de resistência são o acesso reduzido com a produção
de bomba de efluxo e a alteração do alvo por metilação do RNA ribossomal.

Mas existem alguns


antimicrobianos que não caem
propriamente numa lista, nomeadamente
as sulfonamidas e o trimetropim, que são
administrados conjuntamente um com o
outro e que atuam em dois passos
sucessivos na via da síntese do ácido fólico,
que está na base da síntese das purinas e
das pirimidinas que constituem o DNA e o
RNA. Portanto, estes dois antimicrobianos
agem sinergisticamente e é chamado
muitas vezes cotrimoxazol. O
sulfametoxazol é muito parecido com o ácido para-aminobenzóico e o trimetropim, porque é
muito parecido com o ácido fólico e, portanto, inibem competitivamente as enzimas que têm
como substratos naturais estes compostos. A resistência ao trimetropim é devida uma
dihidrofolato redutase alternativa e na presença da mesma há acumulação de mutações que a
tornam a bactéria resistente sulfametoxazol de uma forma muito elevada e, portanto, a bactéria
rapidamente se torna resistente. Assim a resistência provem de vias alternativas ou alteração
do alvo.
Uma outra classe de antimicrobianos
vai inibir as funções da girase e da
topoisometase. Estas controlam
superenrolamento da molécula de DNA para a
molécula caber dentro da bactéria e quando é
necessário haver transcrição ajudam no
desenrolamento da molécula de DNA. Os
antibióticos que vão inibir essas duas enzimas
são as quinolonas, a ciprofloxacina e da
ofloxacina, chamando-se à mais utilizadas
fluoroquinolonas, porque tem este átomo de flúor. O mecanismo de resistência e por bombas
de efluxo que estão mais disseminadas em matérias de Gram-, mas também mutações pontuais
nos genes gyr e par que são os genes da girase e da topoisomerase. As quinolonas têm uma
gama de gerações, a primeira geração porque tem apenas atividade contra bactérias de Gram-
e depois uma segunda terceira geração com cobertura também nas bactérias de Gram+. Os
mecanismos de resistência são assim o acesso reduzido com efluxo e a alteração no alvo.

Existem inibidores da RNA polimerase dentro da classe dos antimicrobianos que


interferem com os ácidos nucleicos, nomeadamente a rifampicina, que é utilizada em alguns
contextos contra bactérias de Gram+, mas sobretudo contra o na terapêutica de infeções por
micobactérias. Existem assim alguns antibióticos a que chamamos antibacilares por serem
específicos contra a micobactérias, a as micobactérias são também conhecidas como bacilos de
Koch, que foi o senhor Koch que as descreveu pela primeira vez. Estes antimicrobianos
específicos são: a isoniazida, que inibe a síntese dos ácidos micólicoso; o etambutol que inibe a
síntese do arabinoglicano, um polímero que substitui o peptidoglicano, o caso das
micobactérias; e a pirazinamida, que é um análogo da nicotinamida que é um cofator a
importante no metabolismo de oxidação-redução das bactérias e tem um mecanismo de ação
que ainda não é completamente conhecido. E como muitas vezes as micobactérias tem um
crescimento muito lento a administração de antimicrobianos não se reduz a apenas um
antimicrobiano, mas a vários antimicrobianos durante várias semanas.

Os antilepróticos, nomeadamente a dapsona, é um antibiótico que está relacionado


com as sulfonamidas e é muitas vezes usado em associação a devido à resistência com a
rifampicina na terapêutica da lepra. O microrganismo que causa a lepra é o Micobactéria Leprae
e daí a terapêutica da lepra ser durante várias semanas.

Outros antibióticos que não caem propriamente em nenhuma classe e que são
importantes são os nitroimidazóles, nomeadamente o metronidazol, que é muito ativo contra
bactérias anaeróbicas, mas também contra a protozoários. A nitrofurantoína é um
antimicrobiano secretado na urina em grandes quantidades e apenas funciona a baixo PH, sendo
ativo contra os agentes frequentes de infeção urinária, nomeadamente E. coli, é um antibiótico
de primeira linha contra a infeção urinária adquirida na comunidade.

Utilizamos combinações de vários antibióticos quando há um efeito sinergístico, por


exemplo, caso do Cotrimoxazol. Outra situação é quando queremos evitar o aparecimento de
organismos resistentes, por exemplo, o uso da combinação da Isoniazida, Rifampicina e
Etambutol para tratar a tuberculose. Nesta situação usa-se três antimicrobianos diferentes,
porque a probabilidade de selecionarmos resistência em cada um deles é relativamente elevada,
mas de selecionarmos resistência aos três é bastante mais reduzido. Sobretudo tendo em conta
que a terapêutica da tuberculose dura muito tempo. Mais uma situação do uso de combinação
de antimicrobianos é, por exemplo, para tratar infeções que nós sabemos que são
polimicrobianas, ou seja, que tem vários microrganismos, por exemplo, Gram+ e Gram-, e que
tem que cobrir todos esses microrganismos. O exemplo clássico é o abcesso intra-abdominal,
quando existe uma rutura do tubo digestivo e o conteúdo do tubo digestivo dispersa pelo resto
do corpo existem vários microrganismos e vamos usar vários antimicrobianos. Por fim usa-se
combinação de antimicrobianos para tratar infeções graves antes de termos a identificação do
agente, por exemplo, uma criança que entra com uma meningite e a colheita de liquor é feita
para enviar para o laboratório para se saber qual é o agente etiológico, no entanto trata-se para
os agentes mais frequentes de meningite naquela criança e após confirmação dos agentes
patogénicos atribui-se o ou os antimicrobianos adequados.
Os antifúngicos têm vários
alvos: síntese da parede celular dos
fungos, a membrana plasmática,
disrupção dos microtúbulos, inibição
da síntese de ácidos e inibição das
proteínas.

Os polienos, formam poros


diretamente na membrana, por
exemplo a anfotericina, são moléculas
grandes que intercalam na membrana
interagindo diretamente com os
fosfolipídios e o ergosterol que está
presente na membrana dos fungos formando poros devido a esses poros a célula deixa de
conseguir sobreviver.

Os azóis inibem uma enzima essencial para a síntese do ergosterol que é essencial a
diminuir a flexibilidade da membrana dos fungos e, portanto, sem ergosterol os fungos morrem.
Há exemplos de azóis, como o cetoconazol, o fluconazol e o voriconazol.

As equinocandinas inibem a síntese dos arabinoglicanos, sendo a caspofungina e


micafungina são dois exemplos.

Flucitosina é um análogo de um antibiótico que é incorporada aquando da síntese dos


ácidos nucleicos e também tem atividade antifúngica.
A griseofulvina interfere com os microtúbulos impedindo a formação do eixo que
permite a mitose das células.

Os mecanismos de resistência são alterações do alvo com alterações das enzimas ou


impedir o antifúngico de entrar com a mutações, quer nas permeases que permitem ao
antifúngico entrar na célula, quer a um aumento da atividade de enzimas ou de poros
codificados no citoplasma das bactérias que são estas transportadores conhecidos por MDR
(Multi Drug Resistent) porque são bombas de efluxo que bombeiam inúmeros antimicrobianos
para o exterior da célula.
Data Docente
30/09/2021 Prof. Doutor Melo Cristino

GÉNERO STREPTOCOCCUS

Morfologicamente:
- cocos gram positivos
- imóveis
- não-esporulados
- possuem uma cápsula que é um importante fator de virulência
- dispõem-se em cadeias

Figura 1 - Streptococcus

O meio de cultura utilizado para isolar estreptococcus é a gelose sangue e este meio permite-
nos observar os diferentes tipos de hemólise dos diferentes estrptococos:

Beta hemólise – hemólise total dos eritrócitos

Alfa hemólise – hemólise parcial da hemoglobina dos eritrócitos


(resulta na produção de biliverdina que é o pigmento que dá a cor
esverdeada observada neste tipo de hemólise).

Gama hemólise – ausência total de hemólise.


Figura 2 - Tipos de Hemólise
em Gelose Sangue

A análise dos diferentes tipos de hemólise causada pelos estreptococcus é muito importante na
sua classificação e distinção.

Estas aulas (5 e 6) vão focar essencialmente 3 tipos de estreptococos:


- Streptococcus pyogenes (Grupo A de Lancefield)
- Streptococcus agalactiae (Grupo B de Lancefield)
- Streptococcus pneumoniae

Os estreptococos beta-hemolíticos podem ser classificados em grupos de Lancefield, de


acordo com diferentes componentes das paredes celulares
STREPTOCOCCUS PYOGENES

CARACTERÍSTICAS:
- cocos gram positivos dispostos em cadeia
- beta-hemolítico
- grupo A de Lancefield
Figura 3 - Streptococcus pyogenes

ASPETOS EPIDEMIOLÓGICOS:
▪ coloniza transitoriamente a pele e a orofaringe
▪ cerca de 20% das crianças em idade escolar são portadoras desta bactéria na orofaringe,
sem ter sintomatologia (ou seja, estão apenas colonizadas)
▪ agente patogénico estritamente humano
▪ transmite-se principalmente por via aérea – associado às faringites; mas também pode
haver transmissão por contacto direto – pele leasada)

FATORES DE VIRULÊNCIA:

COMPONENTES ESTRUTURAIS TOXINAS / ENZIMAS


cápsula (ácido hialurónico) toxinas pirogénicas (Spe)
ácido lipoteicoico estreptolisina S
proteínas M estreptolisina O
proteína F estreptoquinase A
pili estreptoquinase B
peptidase C5a DNAses (A – D)

INFEÇÕES MAIS FREQUENTES:

❖ Amigdalite

- é a infeção mais frequente e menos grave causada por S. pyogenes


- cursa geralmente com febre, odinofagia e geralmente é visível o
exsudado purulento nas amígdalas
Figura 4 - Amigdalite

❖ Escarlatina

- causada não pela bactéria em si, mas pelas toxinas pirogénicas, que
ao causarem vasodilatação generalizada dão origem ao rash típico da
escarlatina e ao aspeto em framboesa da língua
- a bactéria continua na orofaringe e não na pele (geralmente a
escarlatina surge associada a uma amigdalite causada por uma
estirpe produtora das toxinas pirogénicas!) Figura 5 - Escarlatina
❖ Impétigo, Erisipela e Celulite

- infeções da pele e tecidos moles


- podem também ser causadas por Staphylococcus aureus
- neste tipo de infeções, o S. pyogenes encontra-se na pele
- impétigo: infeção superficial da epiderme
- erisipela: infeção da derme
- celulite: infeção no tecido celular subcutâneo

Figura 6 - Impétigo Figura 7 - Erisipela Figura 8 - Celulite

❖ Síndrome do Choque Tóxico

- infeção generalizada
- disfunção dos órgãos
- pode levar à morte em poucas horas
Figura 9 - Síndrome do Choque Tóxico

❖ Fasceíte Necrosante

- ocorre de forma rara mas é muito grave


- destruição extensa dos tecidos
- evolução rápida
- resulta grande parte das vezes na morte do doente
Figura 10 - Fasceíte Necrosante

Complicações Não-Supurativas:
→ Glomerulonefrite Aguda – relativamente frquente na europa; corresponde a uma lesão
renal que pode aparecer algum tempo após infeção com S. pyogenes.

→ Febre Reumática – atualmente muito rara no mundo ocidental; caracterizada


essencialmente pela febre e dores articulares, sendo que a consequência mais grave
associada à febre reumática é a lesão das válvulas cardíacas; tal como a
glomerulonefrite, não ocorre aquando da infeção com S. pyogenes, mas sim algum
tempo após a mesma.

TERAPÊUTICA E RESISTÊNCIA AOS ANTIBIÓTICOS:


- Streptococcus pyogenes é sensível à penicilina! Nunca foram descritas resistências à
penicilina nesta bactéria, pelo que é o antibiótico de eleição para tratar infeções por S. pyogenes.
- Caso o doente seja alérgico à penicilina, utilizam-se macrólidos (ex.: eritromicina) ou
lincosamidas (ex.: clindamicina). Neste caso, podem existir resistências.
Resistência aos Macrólidos em S. pyogenes:

Dentro do fenótipo MLSB podemos ter um fenótipo constitutivo (cMLSB), em que a bactéria é
resistente a macrólidos e lincosamidas, e um indutível (iMLSB), em que a bactéria é resistente
às lincosamidas apenas na proximidade de um macrólido (basicamente a bactéria é resistente
ao macrólido e na zona de proximidade entre este e a lincosamida é induzida resistência a esta
última).
Assim, na presença de uma placa com discos de eritromicina (macrólido) e clindamicina
(lincosamida), os diferentes fenótipos apresentam o seguinte aspeto:

Figura 11 - placa com Figura 12 - fenótipo cMLSB Figura 13 - fenótipo iMLSB Figura 14 - fenótipo M
discos de antibiótico

STREPTOCOCCUS AGALACTIAE

CARACTERÍSTICAS:
- cocos gram positivos dispostos em cadeia (morfologicamente
semelhantes ao S. pyogenes)
- beta-hemolítico
- grupo B de Lancefield
- cresce no meio granada (meio muito seletivo que permite a
identificação de estreptococos do grupo B – as colónias crescem
a cor-de-laranja) Figura 15 - meio granada

ASPETOS EPIDEMIOLÓGICOS:
▪ bactéria mais importante das infeções do recém-nascido
▪ coloniza o intestino e a vagina (10%-30% das grávidas)
▪ coloniza a orofaringe (pouco importante)
▪ transmissão ao recém-nascido durante a gravidez ou parto
o maior risco de infeção:
- mãe colonizada por S. agalctiae
- rutura permatura de membranas
- trabalho de parto prolongado
- permaturidade
▪ a infeção no recém-nascido é muito grave e pode incluir as seguintes
componentes:
o sépsis (com bacteriémia)
o meningite
o pneumonia
▪ para evitar a infeção no recém-nascido é muito importante verificar se a mãe se
encontra colonizada por S. agalactiae antes do parto, para que nesse caso se
possa administrar profilaxia antibiótica

FATORES DE VIRULÊNCIA:
• Cápsula (serotipos Ia, Ib, II – VIII)
• Pili
• Hialuronidase
• C5a Peptidase

INFEÇÕES MAIS FREQUENTES:

Período Neonatal
→ Infeção Neonatal Precoce (< 1 semana)
o meningite, bacteriémia, pneumonia
o fonte endógena (transmissão no parto)
o serotipos Ia, III e V
→ Infeção Neonatal Tardia (> 1 semana)
o meningite, bacteriémia
o fonte exógena (mãe ou outras crianças)
o serotipo III

Mulher Grávida
→ Infeção pós-parto (endometrite)
→ Infeção urinária
→ Infeção de feridas
→ Bacteriémia

Adulto (não grávidas)


→ Infeções da pele e tecidos moles
→ Bacteriémia
→ Infeções dos ossos e articulações
→ diabéticos são um grupo que tem especial predisposição a infeções por
estreptococos do grupo B
TERAPÊUTICA E RESISTÊNCIA AOS ANTIBIÓTICOS:
- Penicilina é o antibiótico de eleição
- Penicilina + Aminoglicosídeo em infeções graves (a penicilina pode ser substituída por uma
cefalosporina ou por vancomicina em caso de alergia)
- Ampicilina ou Nitrofurantoína em infeções urinárias

PROFILAXIA DAS INFEÇÕES:


❖ Rastreio da colonização vaginal e retal nas grávidas (35-37ª semana)
❖ Nas grávidas colonizadas: quimioprofilaxia intra-parto – no momento do parto
(penicilina G, cefazolina, clindamicina ou vancomicina)
❖ Vacina conjugada em desenvolvimento

STREPTOCOCCUS PNEUMONIAE (PNEUMOCOCCUS)

CARACTERÍSTICAS:
- cocos gram positivos dispostos em cadeias
- cadeias de organização particular – cadeias curtas
formadas por dois cocos: diplococos
- alfa-hemolítico
Figura 16 - S. pneumoniae
(organização em diplococos)
FATORES DE VIRULÊNCIA:
• Cápsula! (sem dúvida o mais importante!)
• Proteínas de superfície (adesinas)
• Ácido teicoico
• Pili
• Protease para IgA secretora
• Pneumolisina
• Peróxido de hidrogénio

CÁPSULA POLISSACARÍDEA – conhecem-se neste momento 99 serotipos (chamam-se serotipos


porque existem soros contra todos os tipos de cápsulas polissacarídeas do pneumococos –
importante para as vacinas, como vai ser explorado mais à frente); sendo a cápsula constituída
por polissacáridos, é importante ter em mente que estes constituientes não são excelentes
estimulantes antigénicos, ao contrário das proteínas (mais uma vez, importante para as vacinas,
como vai ser explorado mais à frente!).
Identificação de serotipo capsular (prova de intumescimento
capsular (Quellung)): tendo os soros contra cada um dos
diferentes tipos de cápsula, se o soro que testarmos for o
correspondente à cápsula, esta aumenta muito de tamanho
(intumescimento capsular); caso contrário, não acontece nada.
Em alternativa a esta prova, é possível fazer uma prova de
aglutinação, em que se o soro for correspondente ao serotipo da
cápsula, eles aglutinam.

PILI – importantes para a aderência

ASPETOS EPIDEMIOLÓGICOS:
▪ coloniza a nasofaringe e orofaringe
▪ agente patogénico humano – só coloniza o ser humano
▪ mais de metade das crianças entre os 2 e os 8 anos (>50%) estão colonizadas, nos
adultos este valor é menor
▪ transmissão aérea (oral – oral)
▪ maioria das infeções são endógenas

INFEÇÕES MAIS FREQUENTES:

❖ Otite Média Aguda


- infeção do ouvido médio (não confundir com otite externa!)
- o pneumococo tem acesso ao ouvido médio através da trompa de eustáquio
- não é muito grave
- como é no ouvido médio, isto coloca alguns problemas de diagnóstico

❖ Rinosinusite
- infeção dos seios perinasais
- o pneumococo é dos agentes mais frequentemente causadores de rinosinusite

❖ Conjutivite
- infeção da conjuntiva ocular
- não é das infeções que ocorre com mais frequência, porque as nossas lágrimas têm substâncias
antibacterianas potentes (já sabem, chorem quando estiverem a desesperar com isto, pelo
menos afastam os bichinhos todos eheh), mas dentro dos agentes que causam infeção ocular, o
pneumococo é dos mais frequentes

❖ Pneumonia
- o pneumococo é a bactéria mais frequente que causa pneumonia no homem
- a pneumonia pode ser extremamente grave e levar a desfechos não favoráveis

❖ Meningite
- infeção mais grave causada por S. pneumoniae
- o pneumococo é a bactéria que mais causa meningite em indivíduos previamente saudáveis
(exceto em recém-nascidos! – o bestie S. agalactiae é o responsável nos recém-nascidos)
- infeção das meninges
MAIOR RISCO DE INFEÇÃO:
o Infeção vírica respiratória prévia – indivíduos ficam mais predispostos a pneumonia
pneumocócica
o Mais idosos (defesas mais frágeis!) – maior suscetibilidade para ter pneumonia,
meningite e bacteriémia
o Doenças hematológicas malignas, drepanocitose (anemia falciforme), asplenia
(ausência de baço), transplantados, infetados por VIH – altamente predispostos a ter
bacteriémia

DIAGNÓSTICO DE INFEÇÃO POR PNEUMOCOCOS:


1. Recolha de produto biológico
- em casos de otite do ouvido médio não existe recolha de pus, por ser um processo
invasivo.
- em casos de pneumonia realiza-se frequentemente a recolha de expectoração, mas
podem ser recolhidas secreções respiratórias através de broncoscopia e lavado bronco-
alveolar; também se realizam hemoculturas.
- em casos de meningite realiza-se a recolha de líquido céfalo-raquidiano e
hemoculturas.

2. Exame Direto
- observação ao microscópio com coloração gram (diplococos gram positivos)

3. Exame Cultural
- cultiva-se a bactéria em gelose sangue e observam-se as características das colónias
(alfa-hemólise)

4. Identificação
- solubilidade em bílis (pneumococo é insolúvel em bílis)
- prova de suscetibilidade à optoquina (pneumococo é sensível à optoquina)

5. Outra abordagem diagnóstica


- pesquisa de antigénio na urina (não se deve usar em crianças!)
- deteção por PCR (permite a identificação do pneumococo e da maioria dos serotipos
mais importantes)

TERPÊUTICA DAS INFEÇÕES:


Os alvos terapêuticos são sobretudo 3:
- Inibição da síntese do peptidoglicano (a mais importante!): penicilinas / cefalosporinas
- Inibição da síntese proteica (conseguida nos ribossomas): macrólidos
- Inibição da síntese ou replicação de DNA pneumocócico: fluoroquinolonas
RESISTÊNCIA À PENICILINA:
o Resultante de modificações do alvo (PBPs 1A, 1B, 2A, 2X E 2B) – o pneumococo vai
recebendo informação genética por transformação (não há um veículo específico de
transmissão do DNA), que vai diminuindo a afinidade das PBPs à penicilina devido às
diversas alterações que lhes vão sendo feitas
o Aquisição gradual de sequências de DNA estranho
o Genes com estrutura “em mosaico” – no pneumococo resistente à penicilina existem 4
ou 5 genes que codificam 4 ou 5 alterações nas PBPs que os tornam menos sensíveis à
penicilina, provenientes de diferentes estreptococos da cavidade oral
o Transformação a partir de estreptococos da cavidade oral

TERAPÊUTICA DAS INFEÇÕES RESPIRATÓRIAS:


▪ Penicilina (Amoxicilina)
▪ Macrólidos (claritromicina ou azitromicina)
▪ Cefalosporinas
▪ Novas quinolonas (levofloxacina ou moxifloxacina) – devem ser reservadas para casos
de resistência elevada aos antibióticos anteriores porque as quinolonas são antibióticos
altamente propensos a causar resistências por interferirem com o DNA

TERAPÊUTICA DA MENINGITE OU BACTERIÉMIA:


▪ Penicilina (se suscetível)
▪ Cefalosporina de 3ª geração (ceftriaxona ou cefotaxima)
▪ Vancomicina
▪ Pode associar-se vancomicina com uma cefalosporina de 3ª geração em terapêutica
empírica, enquanto se aguarda pelos resultados do teste de suscetibilidade aos
antibióticos e só depois adaptar a terapêutica conforme os resultados obtidos

VACINAS POLISSACARÍDICA E CONJUGADAS:


- O S. pneumoniae tem cerca de 99 serotipos conhecidos
- Cada serotipo é específico, ou seja, mesmo que uma pessoa seja imune a um
determinado serotipo, pode ainda assim ser infetada por outro serotipo
- Tendo isto em conta, é importante apostar na vacinação
- A 1ª vacina para o pneumococo é a PPV-23, uma vacina polisacarídica, mas esta não é
suficiente imunogénica nas crianças e nos indivíduos imunocomprometidos (não é eficaz).
- A vacina conjugada 7 valente PCV-7 tem uma proteína conjugada com os polissacáridos
capsulares de 7 serotipos, passando a ser altamente imunogénica e eficaz nos grupos em que a
PPV-23 não era suficiente; ainda assim, esta vacina cobre os 7 serotipos mais comuns nos EUA,
pelo que, embora fosse útil, vários serotipos importantes noutros países não estavam incluídos
nesta vacina.
- Foi então criada uma vacina conjugada 10 valente PCV-10, que tinha os 7 serotipos da
PCV-7 mais outros 3.
- 6 meses depois foi criada a vacina conjugada 13 valente PCV-13, que inclui os serotipos
da PCV-7 e PCV-10 com mais outros 3 serotipos; esta vacina é a que está em utilização no Plano
Nacional de Vacinação (desde 2015).
- Estas vacinas são muito importantes para proteger das infeções pneumocócicas
graves, mas é importante ter em mente que não protegem contra todos os serotipos, só os que
estão nas respetivas vacinas.
Momento de lazer e ostentação:
(tomem lá um gráfico’zinho que mostra que os portugueses aderiram bem à vacinação contra o
pneumococo nas crianças)

COBERTURA VACINAL PEDIÁTRICA COM PCV-7 E PCV-13 EM PORTUGAL

CURIOSIDADE: anuncia-se para breve uma vacina conjugada 20 valente (PCV-20), porque pouco
mais de metade (~54%) das infeções pneumocócicas em crianças são causadas por serotipos
ainda não incluídos nas diferentes vacinas existentes.

GÉNERO ENTEROCOCCUS

Morfologicamente são semelhantes aos Streptococcus: cocos gram positivos dispostos em


cadeia e também podem ser alfa, beta ou gama hemolíticos

Principais diferenças:
- não possuem cápsula
- estão presentes no ser humano e nos animais

Espécies mais importantes:


❖ Enterococcus faecalis
❖ Enterococcus faecium

ASPETOS EPIDEMIOLÓGICOS:
▪ Coloniza o tubo digestivo do homem e dos animais
▪ Sobrevive no ambiente por muito tempo
▪ A maioria das infeções são endógenas
▪ Transmissão homem a homem frequente no hospital
▪ Maior risco de infeção em doentes hospitalizados sob terapêutica com antibióticos de
largo espetro, sobretudo cefalosporinas (bactérias com virulência relativamente baixa,
causam infeção mais frequentemente em indivíduos debilitados ou hospitalizados)!

INFEÇÕES MAIS FREQUENTES:


❖ Infeção Urinária
❖ Infeções de feridas
❖ Infeções intra-abdominais
❖ Bacteriémia
RESISTÊNCIA AOS ANTIMICROBIANOS:
• Embora não sejam bactérias muito virulentas, são altamente resistentes aos
antibióticos.
• Resistência Intrínseca: cefalosporinas, clindamicina, quinolonas e co-trimoxazol
• Resistência Adquirida: penicilinas, aminoglicosídeos, macrólidos, tetraciclinas,
cloranfenicol, glicopéptidos e linezolide.

Figura 17 – Resistência a diferentes antibióticos Figura 18 – Resistência a diferentes antibióticos


(2019 – E. faecalis) (2019 – E. faecium)

Figura 19 – Resistência a diferentes antibióticos Figura 20 – Resistência a diferentes antibióticos


(2020 – E. faecalis) (2020 – E. faecium)

A partir destes gráficos que espelham as resistências destas espécies a diferentes antibióticos
no Hospital de Santa Maria, é possível verificar que o antibiótico de eleição para E. faecalis é a
ampicilina (alternativa – vancomicina) e para o E. faecium é a vancomicina (alternativa –
linezolide).
Ora, como estas espécies podem ser resistentes a variados antibióticos é essencial realizar um
antibiograma (teste de suscetibilidade aos antimicrobianos), para determinar a melhor opção
de tratamento.

TERAPÊUTICA DAS INFEÇÕES:


→ Estirpes suscetíveis à ampicilina:
Ampicilina ou Amoxicilina
→ Estirpes resistentes à ampicilina:
Glicopéptidos (vancomicina ou teicoplanina)
→ Estirpes resistentes aos glicopéptidos (VRE):
Linezolide, Tigeciclina ou Daptomicina
Data Docente
04/10/2021 Prof. Doutor Melo Cristino

Género Staphylococcus

• Definição do género
• Espécies patogénicas mais importantes
• Fatores de virulência
• Aspetos epidemiológicos
• Infeções mais frequentes
• Diagnóstico laboratorial
• Profilaxia
• Terapêutica das infeções estafilocócicas

Características morfológicas e culturais

Cocos Gram positivos (+) e que se dispõem em cacho. São imóveis, não têm flagelos e não
formam esporos. Podem ter cápsula, mas esta não é tão importante como é, por exemplo, para
os Streptococcus.
Do ponto de vista cultural, são bactérias que crescem nos meios de cultura habituais, não sendo
muito exigentes do ponto de vista nutritivo. O meio que mais se utiliza é a gelose de sangue,
onde crescem colónias de Staphylococcus relativamente grandes, opacas e que podem causar,
ou não, hemólise (também não muito importante, como era no caso dos Streptococcus). A cor
das colónias varia desde o branco até ao amarelo dourado. No caso do Staphylococcus aureus,
estas colónias são mais douradas. As maioria das restantes espécies formam colónias brancas.

Espécies mais importantes do género Staphylococcus

• Principal espécie patogénica (única que causa infeção no homem que produz a enzima
coagulase – importante na identificação laboratorial)

Staphylococcus aureus.

• Espécies coagulase-negativas (mais de 30)

Staphylococcus epidermidis (bactéria mais frequente que vive à superfície da pele);


Staphylococcus haemolyticus (a seguir à espécie anterior, é também frequente na pele);
Staphylococcus lugdunensis (terceiro na lista dos pertencentes à pele);
Staphylococcus saprophyticus (único dos Staphylococcus coagulase-negativos que causa
uma infeção primária no Homem, mais especificamente na mulher. Agente muito
frequente (segundo) de infeção urinária nas mulheres em idade sexualmente ativa –
cistites (é a única infeção que este agente causa) – apesar de o agente mais frequente
de infeção urinária ser Escherichia coli).

Aspetos epidemiológicos

• Staphylococcus aureus – Coloniza mucosa nasal (40-50% do pessoal das unidades


prestadoras de saúde são portadores) e pele humana (∼ 15 % portadores);
• Staphylococcus coagulase-negativa – pele (e mucosas);
• Transmissão por contacto direto (mãos) ou indireto (materiais contaminados).

Fatores de virulência

Componentes estruturais:

• Cápsula
• Peptidoglicano
• Ácido teicóico
• Proteína A
• Biofilme

Toxinas:

• Citotoxinas (α, β, γ, δ, PVL – Panton Valentine leucocidina)


• Exfoliatinas (ETA e ETB) – responsáveis pela Síndrome Estafilocócica da Pele
Escaldada (SSSS)
• Enterotoxinas (A – R) – provocam gastroenterites e diarreias
• TSST – 1 – Toxina do Choque Tóxico

Enzimas (ajudam a degradar os tecidos, para facilitar penetração):

• Coagulases (livre a ligada) – não se conhece bem o papel na virulência mas é,


como já referido, importante para o diagnóstico
• Hialuronidase
• Fibrinolisina
• Lipases
• DNAse

Doenças por ação direta da bactéria

Infeções cutâneas são muito frequentes, mas menos graves: impétigo – lesões da epiderme
(também pode ser causado por Streptococcus pyogenes), foliculite e furúnculo – infeções do
folículo piloso, com acumulação de pús (é uma bactéria piogénica).

Infeções dos tecidos moles são mais graves: celulite (infeção do tecido celular subcutâneo),
infeções de feridas quer sejam traumáticas, quer sejam induzidas pelos médicos (cirúrgica, por
exemplo) e queimaduras.

Osteomielite, artrite e outras localizações (após entrar em circulação pode entrar em


praticamente todos os órgãos, por exemplo, no pulmão por aspiração ou por disseminação
hematogénea, sendo agente de pneumonia e empiema em doentes previamente debilitados)
com acumulação de material purulento.

Causa também bacteriémia (com sépsis), em que existe multiplicação da bactéria no sistema
vascular, sendo o diagnóstico realizado por hemoculturas. Ao espremer lesões cutâneas
estafilocócicas, podemos induzir a entrada dos agentes em circulação e desencadear sépsis, com
edema e febre.
Pode ainda instalar-se no endocárdio valvular e causar endocardite.
Doenças por ação das toxinas

Síndrome Estafilocócica da Pele Escaldada (Doença de Ritter) – Por ação das Exfoliatinas A e B,
que levam à descamação intensa da epiderme, concedendo uma porta de entrada para outras
infeções.

Síndrome do Choque Tóxico – Leva à falência multiorgânica, tendo sido inicialmente associado
à utilização de tampões vaginais (as condições ecológicas de atmosfera, temperatura, etc. eram
propícias para a produção da TSST – 1). No entanto, este quadro também aparecia em indivíduos
do sexo masculino e crianças, pelo que a ideia inicial foi descartada.

Intoxicação alimentar – Talvez uma das doenças mais frequentes do estafilococos. Provocadas
pelas gastroentoxinas, não sendo necessária a ingestão do Staphylococcus aureus, basta ingerir
alimentos contaminados com as suas toxinas. Quadro clínico de diarreia e vómitos, que ocorre
entre 4h-6h após ingestão do alimento suspeito. Quando o quadro é de 24h-48h depois da
ingestão, provavelmente trata-se de contaminação por Salmonella.

Staphylococcus coagulase-negativa (CNS)

Fatores de virulência (têm muito fraca virulência no Homem)

• Parede celular
• Biofilme (slime)

Biofilme

As bactérias podem aderir a um material sintético (por exemplo, um cateter ou próteses


valvulares cardíacas), sendo que ao fim de poucos dias, devido à produção do biofilme, formam
uma massa dentro da qual ficam submersos e protegidos da ação dos antibióticos e dos
anticorpos e células efetoras imunológicas.

Infeções mais frequentes

• Infeções relacionadas com corpos estranhos (cateteres, próteses)


• Bacteriémia (doentes neutropénicos – por doença ou por terapêutica)
• Endocardite
• Infeção urinária na mulher jovem sexualmente ativa (Staphylococcus saprophyticus). É
um agente de infeção primária – não necessita de um hospedeiro imunocomprometido,
nem debilitado nem de material protésico para poderem causar uma infeção num
indivíduo previamente saudável.

Diagnóstico microbiológico

• Exame direto – Coloração Gram


• Exame cultural e identificação
• Antibiograma – Prova laboratorial de suscetibilidade aos antibióticos, porque no caso
de Staphylococcus aureus o resultado é imprevisível e deve sempre realizar-se devido
aos casos de resistência
• Deteção por PCR
Antibióticos relevantes para a terapêutica do género Staphylococcus

• Hoje em dia ninguém trata infeção por Staphylococcus com penicilina porque 98% das
estirpes são resistentes por produção da enzima β-lactamase/β-penicinilase que
destroem o anel β-lactâmico das penicilinas.
• Meticilina (apenas se usa laboratorialmente para representar as isoxazolilpenicilinas
porque é muito tóxica) e isoxazolilpenicilinas (pertencem às penicilinas) – Flucloxacilina
(o mais usado no tratamento de Staphylococcus aureus não resistentes à meticilina)
• Glicopéptidos (vancomicina), lipopéptidos (daptomicina) e oxazolidinonas (linezolide)
(se MRSA)

MRSA (Methicillin Resistant Staphylococcus aureus)

Resistência à meticilina

• Primeira descrição: Inglaterra (1961); Portugal (1985)


• Resultante de modificação no alvo na parede celular, onde a proteína de superfície
diminui a afinidade de ligação da meticilina
• Resistência ao nível de todos os β-lactâmicos: todas as penicilinas, todas as
cefalosporinas e os carbapenemos
• Podem ser multirresistentes: resistente a três ou mais antibióticos de
classes farmacológicas diferentes OU no caso do Mycobacterium
tuberculosis se for resistente a duas ou mais classes de antibióticos
diferentes
• Surtos epidémicos hospitalares (HA-MRSA) (1980)
• Determinante genético (SCCmec) com localização cromossómica
• Infeções na comunidade (CA-MRSA) (2000) – aparecem em indivíduos previamente
saudáveis, na pele e tecidos moles ou pulmão. PVL muito associada aos CA-MRSA

Portugal foi sempre um dos países com mais casos de MRSA na Europa.

Resistência à vancomicina – Staphylococcus aureus

VISA – Vancomycin-Intermediate Staphylococcus aureus CIM vancomicina = 8-16 mg/l

VRSA – Vancomycin-Resistant Staphylococcus aureus CIM vancomicina ≥ 32 mg/l

A parede celular de VISA é muito mais espessa do que dos MSSA ou MRSA.

A vancomicina é uma molécula muito grande que não consegue penetrar na parede e exercer a
sua função.

VRSA (resistência à vancomicina em Staphylococcus aureus) – MUITO RARA!!

• Primeira descrição nos EUA em 2002


• Estirpes albergam genes mecA e vanA
• mecA – modificação do alvo da meticilina (PBP2a)
• vanA – modificação do alvo da vancomicina (D-ala-D-ala → D-ala-D-lac)
• Gene vanA adquirido de Enterococcus spp. que, por conjugação, transferem esta
informação genética (plasmídeo) aos Staphylococcus aureus
• Um caso descrito em Portugal em 2013
Evolução da resistência em Staphylococcus aureus

Outras terapêuticas

• Estirpes MSSA
➢ Oxacilina, Dicloxacilina, Flucloxacilina

• Estirpes MRSA
➢ Vancomicina, Teicoplanina, Linezolide, Tigeciclina, Daptomicina, Ceftarolina

• Estirpes VISA e VRSA


➢ Linezolide, Co-trimoxazol, Tigeciclina, Daptomicina

Fazer sempre antibiograma!


Data Docente
13/10/21 Prof. Doutor Thomas Hänscheid

A interação de antibióticos (AB) com bactérias é usualmente transmitida pela exposição de


Escherichia coli a Penicilina (no caso do vídeo que mostrou – ampicilina) que faz “explodir” a
bactéria, ao actuar na parede, matando-a. Quando expomos as bactérias a muitos antibióticos,
não só em processos de tratamento de doentes (há muitas bactérias expostas a antibióticos em
contexto veterinário - nos animais/gado) estas vão ter mutações que depois tornam estas
bactérias resistentes.

Vídeo “The evolution of Bacteria on a “Mega-Plate” Petri Dish” – Harvard Medical School:
Criou-se uma placa de petri gigante que se dividiu em 9 bandas constituídas por solução de agar
e antibiótico em quantidades diferentes, sendo a concentração de AB fora para o centro: 0x, 1x,
10x, 100x e 1000x. O fundo é negro e há pigmentação das bactérias de branco.

O que se visualiza?
• Inicialmente, há uma distribuição uniforme das bactérias pelas zonas 0 até à zona a
partir da qual já não conseguem sobreviver (zonas 1);
• Nas zonas 1 visualizam-se bactérias a crescer mais lentamente, mas de forma resistente
ao ABx1, que competem pelo espaço com outras bactérias resistentes;
• Ao atingir uma barreira nova (zona 10) estas bactérias mutantes acabam por ter de
mutar novamente para poder sobreviver e assimilar a esta nova concentração;
• O mesmo cenário repete-se nas zonas 100;
• Após cerca de 11 dias, as bactérias mutantes são capazes de sobreviver a 1000x mais da
concentração à qual o wild-type consegue sobreviver.

Conclusões:
Através do processo de acumulação de mutações, podemos observar que bactérias que são
normalmente sensíveis a um antibiótico podem desenvolver resistências a uma concentração
extrema de AB num pequeno intervalo de tempo

Assim, o professor reforça a mensagem de que o intervalo de tempo de desenvolvimento das


resistências é curto e que não existe apenas 1 mutante responsável pela resistente, sendo esta
uma situação muito preocupante.

Qual é a importância clínica/real disto?

Caso clínico:
Jovem portuguesa de 22 anos, residente em Bali, desenvolve sintomas de infeção urinária. No
médico de família é prescrita terapêutica empírica com algumas melhoras, mas sem término da
infeção. No Hospital é feita uma hemocultura e são detetados 2 microorganismos (MO).

A Infeção Urinária remete-nos para o nosso tema da aula de hoje de entobacterales


(enterobacteriaceae como se chamavam antigamente), bactérias do intestino. A Escherichia coli
é um dos agentes mais frequentes e a infeção mais frequente é a Infeção urinária.

A infeção da jovem foi por E. coli, diagnóstico que se confirmou após 2/3 ciclos de tratamento
empírico. Para haver tratamento empírico, a jovem foi ao médico de família que inicialmente
lhe receitou um AB só para infeções urinárias – provavelmente fosfomicina ou nitrofuronteína
– tendo depois evoluído a terapêutica para uma cefalosporina/ciprofloxacina. A jovem
melhorou um bocado, mas não ficou curada.
Após este tratamento inicial, a jovem foi ao Hospital Universitário onde lhe realizaram uma
hemocultura. Os resultados demonstram a presença de E. coli na urina, para além de outra
bactéria:
• Trata-se de E. coli ESBL que é uma bactéria que produz uma enzima que inactiva todos
os β-lactâmicos (penicilinas e cefalosporinas), sendo, portanto, resistente a esses.
Assim, uma enterobacterales que produza esta enzima já é muito difícil de tratar.
• Apresentava ainda uma 2ª E. coli que era uma bactéria verdadeiramente multi-
resistente, produzindo uma enzima contra os carbapenemes. O TSA desta bactéria é
muito impressionante já que de todos os AB testados (que são uma lista grande) apenas
um é eficaz (ou seja, a bactéria é resistente a todos menos um) que é o que foi utilizado
para o seu tratamento.

Se este AB não existisse ela não poderia ter sido tratada. No caso desta jovem, sem tratamento,
talvez houvesse progressão para uma pielonefrite com sépsis, sem qualquer opção de
tratamento. Este caso remeter-nos-ia para o primeiro vídeo: há casos assim nos quais as pessoas
morrem por não haver opções de tratamento.

Enterobacterales
O nome desta família remete-nos para o reservatório destas bactérias, que é um dado
importante a conhecer de todos os MO. Esta informação é crucial para a história do doente! Se
não soubermos ou reservatório de cada bactéria não vamos conseguir saber se a pessoa esteve
ou não exposta à mesma ao colhermos a sua história clínica. O reservatório das Enterobacterales
é o intestino (humano e dos animais).

As características das bactérias podem ser mais ou menos relevantes para nós e para a prática
clínica:
• Bacilos, Gram negativos, não esporulados, motil ou não, crescem em aerobiose e
anaerobiose, fermentam glucose e reduzem nitratos;

Apesar da enorme quantidade de elementos, existem algumas que são mais relevantes e que
podem, inclusivamente, ser divididas em 2 grandes grupos:
• 32 géneros, 132 espécies;
Assim, a aula de Enterobacterales será dividida entre:
• Enterobacterales I - Menos patogénicos: causam doença habitualmente, mas esta não
é severa ou grave; não são “profissionais;
• Enterobacterales II -Muito patogénicos: Doença severa ou grave; MO “profissionais” (o
professor utiliza esta expressão para denominar MO que têm um nome que inclui a
doença que origina – ex: Yersinia pestis – Peste Negra; Salmonella Typhi - Febre Tifóide;
Shigella disenteriae - Disenteria).

Outras características das Enterobacterales:

• Ubíquos em água, terra, vegetação e parte da flora intestinal dos animais (incluindo o
Homem);
• Causam muitas infeções no Homem:
o 80% das estirpes clinicamente significativas;
o 30% das septicémias;
o 70% das infeções urinárias.

Dado o seu reservatório ser o intestino, a infeção mais importante é a Infeção urinária.
Especialmente na mulher é muito frequente, o que significa que todas as mulheres vão ter pelo
menos uma infeção urinária ao longo da vida.
Claro que podem causar muitas outras infeções importantes, como a Septicémia. Há casos
graves nos quais a septicémia pode vir da infeção urinária, apesar de não ser gerada por um
agente especialmente patogénico. Como pode acontecer isso?
• A bactéria pode causar infeção urinária chegando à bexiga, apresenta factores de
virulência para se poder “agarrar” às paredes da bexiga, local onde se vai multiplicar.
• Caso consiga chegar aos rins vai gerar problemas mais graves que cursam com febre alta
- Pielonefrite.
• Esta situação leva facilmente a uma sépsis, já que o rim recebe entre 20%-25% do
sangue que circula no corpo, e é muito fácil uma bactéria entrar no sangue.

Assim, e voltando às características das enterobacterales, apesar de todas nos ajudarem a


reconhecer a família, as mais relevantes para a prática clínica vão ser: ser MO Gram negativos e
a sua capacidade de redução de nitratos.

Podemos ver um frasco de cultura (de meio líquido) que é usado para colheita de sangue –
Hemocultura- que se realiza em caso de sépsis - uma situação gravíssima. Numa urosépsis, como
temos no caso clínico apresentado, estamos perante uma situação de perigo de vida, pelo que
para além da cultura da urina vamos fazer uma hemocultura. em laboratório a bactéria vai
crescer na hemocultura, e podemos fazer um gram que nos permita avaliar qual é a bactéria.
• HEMOCULTURA: A análise laboratorial será muito vantajosa para a nossa prática clínica
quando a hemocultura for positiva (porque se verificou o crescimento de um MO) e o
Gram nos identifique a reação do MO (positivo ou negativo ou sem reação). Nestas
circunstâncias vamos observar que uma hemocultura positiva de gram negativo: uma
opção mais possível é que sejam enterobacterales.
• TESTE DE TIRAS: Este teste pode realizar-se num consultório de médico de família,
analisando a urina do paciente no momento. Dá-nos diversas informações como a
presença ou ausência de leucócitos (relevante para confirmar a infeção) ou a redução
de nitratos a nitritos por atividade da bactéria. A redução de nitratos vai ser útil na
identificação do agente da infeção, uma vez que se for positiva terá de ser
Enterobacterales.

Nesta lista, encontramos a sublinhado o conhecimento mais relevante para manter em mente
relativamente a algumas espécies Enterobacterales relacionadas com doenças no Homem:
Outras características destas bactérias são que se tratam de MO Anaeróbios Facultativos,
crescendo não só em aerobiose (estufa normal) como também no intestino (onde não há O2).
Neste mecanismo de Anaerobiose ocorre o processo de Fermentação no qual se metabolizam
os açúcares produzindo ácido como produto.
Meio de cultura MacConkey:
• Utiliza-se esse mesmo Ácido no meio de MacConkey;
• Selectivo para enterobacterales:
o Contém sais biliares que inibe o crescimento de outras bactérias
o E. coli não é inibida neste meio
• Permite visualizar a fermentação de lactose:
o Algumas bactérias que nos interessam (como a E. coli e a Klebsiella) fermentam
lactose;
o Bactérias da 2ª aula (profissionais) sobretudo a Salmonella, não fermentam
lactose.
o COMO INTERPRETAR: (produzem ácido, virando a cor na presença de MO
fermentador):
▪ Lactose (+) – vermelho
▪ Lactose (-) – transparente

Qual a Importância desta cultura? Caso clínico de uma pessoa com sépsis:
• primeira informação recebida: “Gram Negativo” que nos diagnostica Enterobacterales;
• no dia seguinte no laboratório há passagem de meio de cultura para meio sólido
(MacConkey);
• No seguinte dia: podemos averiguar se cresceu Lactose (+/-)
Assim, caso haja suspeita de um doente com
Salmonella Typhi, e apesar do Gram (-), se for Lactose
(+) vamos poder excluir este agente e Febre tifóide.

Estas bactérias têm antigénios na superfície. Os mais


relevantes são o H e O (sobretudo o O).
Há muitas Escherichia coli e Salmonella diferentes! A
aglutinação dos antigénios serve para o diagnóstico e
epidemiologia. Exemplos:
• Escherichia coli K1, que contém o antigénio K -
associada a meningite neonatal;
• Escherichia coli O157:H7 – diarreia (colite
hemorrágica) e síndrome hemolítico urémico (HUS)- pode ser fatal por causar
insuficiência renal.

Neste tipo de diagnóstico com Teste de aglutinação é visível a presença de grumos quando a
mesma é positiva, e de uma solução homogénea caso seja uma reação negativa.

Que Infeções são causadas por Enterobacterales?

• Infeção Urinária: é a mais frequente;


• Intestino: (diarreias graves) Gastrenterite;
• Abdómen: Infeções associadas a intervenções cirúrgicas; Apendicite; Peritonite;
• Infeções corrente sanguínea: Sépsis;
• Sistema respiratório baixo: pneumonias (doentes ventilados);

Mais relevantes:
Pneumonia
Escherichia coli Cistite
Klebsiella pneumoniae Sépsis
Proteus Diarreia

Escherichia coli

• Amostra: urina
• MacConkey e Gelose de sangue: fermenta lactose, aspeto mucóide, cheiro desagradável
• Urina: Gram (-)

Origina:
• Infeção urinária (o mais frequente das bactérias isoladas)
• Septicemia
• Infeção cirúrgica (pos-operatório)
• Meningite neonatal
• Outras infeções (pneumonia, colecistite, peritonite)
• Gastrenterite (5 tipos diferentes)
o Mais grave, menos frequente: E. coli Enterohemorrágica (EHEC) – Shigatoxina
o Menos grave, mais frequente: E. coli Enterotoxinogénica (ETEC) – LS e ST
Klebsiella pneumoniae

• Amostra: expectoração
• MacConkey e Gelose de sangue: fermenta lactose, aspeto mucóide, halo em redor da
bactéria – indica a presença de cápsula;
• Expectoração: Gram (-); leucócitos (indicadores de infeção)
• Produz enzima contra carbapenemes

Origina:
• Infeções urinárias
• Pneumonias: com alguma frequência (Pneumonia em pessoas com doenças
subjacentes: alcoolismo, diabetes, etc.)
• Septicemia

Proteus mirabilis

• Amostra: urina
• MacConkey e Gelose de sangue: fermenta lactose, cheiro muito característico
• Urina: Gram (-); hidrólise de Ureia;
• Possui flagelos que permitem a chegada desde o seu reservatório à uretra; permite
invasão da placa de cultura quase na sua totalidade.

Origina:
• Infeção urinária: Cistite (após E. coli é o mais frequente das bactérias isoladas.)
• Ao ter a capacidade de hidrolisar ureia na urina – aumenta o pH – alcalinizando-o. Assim,
um dos AB mais utilizados – Nitrofurantoína – não funciona bem em pH alcalino,
portanto não funciona tão bem em Proteus.
Vídeo - Notícia 2020:
“17 pessoas internadas no hospital de São Sebastião, em Santa Maria da Feira, são portadoras
de uma bactéria multirresistente a antibióticos. Ainda assim, o hospital garante que não há
motivo para alarme. A New Delhi metalobetalactamase (NDM), é uma superbactéria resistente
a antibióticos como a penicilina e outros derivados que são bastante utilizados em medicina.”

Há 3 peças de informação importantes a retirar desta notícia:


• a primeira é que uma superbactéria não significa que ela seja muito patogénica, mas
sim que é muito resistente ao tratamento; neste caso é resistente aos carbapenemes;
• A segunda informação importante é que estas 17 pessoas estão colonizadas e não à
beira da morte; ou seja, estas 17 pessoas não estão necessariamente a demonstrar
sintomas de doença, no entanto, podem ter as suas fezes colonizadas. Por isso, se
eventualmente ficarem doentes e se tiverem uma infeção urinária esta será de
tratamento muito difícil;
• Outra informação importante é o nome da própria bactéria. O facto de se chamar New
Delhi (Índia) remete-nos para o facto de este microrganismo ter sido adquirido fora de
Portugal e, por isso, apresentar um quadro de resistências diferente. Na Índia, a
utilização de antibióticos é usualmente exagerada pelo que estes doentes podem ter
colonizado o seu intestino com microorganismos locais multiressistentes.

Numa infeção adquirida em meio hospitalar a problemática é maior uma vez que, para além de
continuar a haver contaminação através das fezes, existem mais portas de entrada para o
organismo:
• Pelo tubo de ventilação - causa pneumonia;
• pelo cateter venoso central - causa infeção;
• Através de algálias;
• Em situações de pós cirurgia
• em doentes diabéticos que podem ter úlceras possivelmente colonizáveis que depois
geram infeção

O que é que significa multirresistente?


Qual é o efeito da bactéria E. coli ESBL que produz uma betalactamase e da super bactéria NDM?
• bactéria E. coli ESBL (Extended Spectrum beta Lactamase):
o Não podemos usar nenhuma cefalosporina;
o Nem outras penicilinas
o podemos usar carbapenemes
• Super bactéria NDM (produz uma enzima contra os carbapenemes)
o O tratamento fica afetado ao não sobrar nenhum antibiótico dos mais
utilizados, incluindo carbapenemes.
Data Docente
13/10/21 Prof. Doutor Thomas Hänscheid

Vamos falar principalmente sobre três: a Salmonella, a Shigella e a Yersinia

E eis outra vez o mesmo quadro, mas agora


vamos mudar um pouco. Os outros todos
continuam lá como vêm, lembrem-se outra
vez de alguns do conhecimento “passivo”
como as Citrobacter das Enterobacteriáceas
que se vão associar a infeções no hospital,
são mais raras, bem como a Klebsiella spp. e
a E. coli, mais frequentes.

Antes de continuar tenho de falar um pouco sobre


a Salmonella, porque houve algumas alterações na
nomenclatura, ou seja, nos termos e na forma como
se refere às Salmonellas. Tradicionalmente, e eu
aprendi isso ainda na vossa idade, que todas as
salmonelas se escreviam a itálico, Salmonella typhi,
Salmonella enteritidis, Salmonella já não sei que
mais. “Já não sei que mais” quer dizer o quê? Que
há quase mil diferentes Salmonellas e,
normalmente, elas têm o nome em função do lugar
onde foram pela primeira vez descritas, como por
exemplo: S. aberdeen, S. minneapolis, S. cambridge
etc., mas todas em itálico. Também já aprenderam
que se eu escrever uma bactéria em itálico estou a
referir-me a uma estirpe, uma estirpe
suficientemente diferente de outra, ou seja, a Esquema de Kauffmann-White
Salmonella typhi seria muito diferente da baseado nos antigénios O, H
Salmonella enteritidis, o que, por acaso, não é bem
assim!
No fundo o que acontece é que hoje nós sabemos que todas estas Salmonellas são uma
única estirpe e essa estirpe chama-se Salmonella enterica. Agora vocês vão dizer “Epah, mas
Salmonella enterica isso é o quê?”. Nós aqui não falamos em estirpes, como podem ver na
tabela, falamos serotipos. Falámos sobre isto na primeira aula, serotipo tem a ver com soros,
com os antigénios, ou seja, esta é mais uma área onde se aplica aquela parte dos antigénios de
superfície. Lembram-se que eu falei dos antigénios O e dos antigénios H, que no caso da
Salmonella, não vou entrar em pormenores, mas os O têm números e os H têm letras. Esta
classificação, estes antigénios, servem para identificação do serotipo, ou seja, esta grande
história serve para explicar então o quê? Que eu aprendi Salmonella typhi e muitos laboratórios
continuam a transmitir isso dessa forma, ou seja, o resultado sai com S. typhi, S. enteritidis e
tudo em itálico, enquanto a forma correta seria Salmonella enterica Serotipo typhi, Salmonella
enterica Serotipo enteritidis.

Estamos na Faculdade de Medicina, por isso


toda esta conversa serve para vos dizer que
no exame vai aparecer exatamente dessa
forma: Salmonella enterica Serotipo typhi.
Então, com tudo isto já explicado, apresento
o que no fundo é um resumo de tudo o que
falei.

Salmonella, Shigella e Yersinia, quais as doenças que estas profissionais causam?

Começando pela Yersinia pestis que causa a peste negra. A Salmonella typhi e a
Salmonella paratyphi A, B e C (como podem ver continuam a usar o esquema antigo e não a
Salmonella enterica Serotipo typhi, porque é um nome demasiado comprido) causa o que se
chama Febre Tifóide. Não confundam a Febre Tifóide com a Tifo. São 2 doenças diferentes. Febre
Tifóide diz respeito à Salmonella, já a Tifo é causada por uma bactéria esquisita, porque tem um
crescimento e características muito particulares que é a Rikettsia, ou seja, Tifo não tem nada a
ver com Tifóide. Tifos quer dizer o quê? Para responder acho que ajuda pensar nisto, Febre
(vocês sabem), Tifóide (tifos vem das nuvens). Agora, “nuvens” quer dizer o quê? Como podem
imaginar uma pessoa com Febre Tifóide tem uma alteração na consciência, de tal forma que
para vocês, em Portugal, a pessoa parece estar nas nuvens.

As outras bactérias, especialmente a Shigella, causam diarreia. As diarreias são um pouco


diferentes entre si e tenho de falar um pouco disso. Diarreia não é igual a diarreia. Não pensem
que todas as diarreias são aquelas diarreias que vocês conhecem. Há vários espectros de
diarreia. Uma diarreia só aquosa, ou seja, fezes não moldadas, líquidas. Há uma diarreia que
cursa com inflamação da parede intestinal, com uma inflamação tão grande que pode até
sangrar, hemorragia, e, eventualmente, ulcerações e, eventualmente, um buraco no próprio
intestino com peritonite e a isso se chama Disenteria. Então como podem ver a Shigella é o
protótipo da Disenteria e é um agente que não causa uma diarreia banal…causa Disenteria e,
muitas vezes, é fatal. Enquanto as Salmonellas que não são typhis causam principalmente
diarreias menos graves. Então, mas agora ficámos um pouco baralhados, porque a Salmonella
aparece nas Gastroenterites e na Febre Tifóide, surge então mais um conceito que é importante
perceber.

As Salmonellas têm os tais mil-2mil diferentes serotipos distribuídos em 2 grupos


(gravem esta informação muito bem na vossa cabeça): um deles corresponde à Salmonella typhi
e paratyphi que causam Febre Tifóide e todas as outras são Salmonellas não-Typhi, “non-
typhoidal Salmonella”, este último grupo é um grupo enooorme (maioria dos serotipos) que vai
causar, principalmente, diarreia. Agora cuidado, porque como já devem ter percebido na
medicina nem tudo é preto e branco, nem noite e dia. Salmonella typhi está associada à Febre
Tifóide e os outros causam gastroenterite, claro que a Salmonella typhi, também durante aquela
doença, pode eventualmente causar um pouco de diarreia, mas mais importante é que as
Salmonelas não-Typhi, como p.ex. a Salmonella enteritidis, causa Gastroenterite e Sépsis. A
Sépsis aparece na tabela entre parêntesis porquê? Porque esta Salmonella não se esqueceu que
é irmã de outra Salmonella, ou seja, tem alguns daqueles mecanismos. Não causa habitualmente
uma Sépsis, uma doença mais grave, se formos saudáveis, mas se esta Salmonella infetar certas
pessoas p.ex. doentes com HIV, esta Salmonella pode ser tão patogénica, que consegue entrar
no sangue e causar Sépsis.

Último aspeto, mas menos relevante, vou só mencionar de passagem, que é o facto de no
grupo da Yersinia haver um ou outro agente que causa mais uma diarreia. A história mais típica
é a da Yersinia enterocolitica que causa uma Pseudoapendicite, apendicite causada por razões
desconhecidas, que causa uma infeção no intestino no local do apêndice e, muitas vezes,
quando estas pessoas se apresentam no hospital com diarreia mais grave o cirurgião pode
pensar em apendicite e tirar o apêndice, que não era necessário, mas isto é uma raridade.

Antes de falarmos mais dos agentes, tenho de falar um pouco aqui nas diarreias. Quando
tiverem um doente esqueçam este tipo de pergunta do género “ah Sra. Maria, então tem
diarreia?”, e ela, obviamente vai responder algo do género “ahhh…se eu tenho diarreia Sr. Dr.!”.
Não é esta a questão que se deve fazer a um doente com história de diarreia! Têm de perguntar
“Então e como é que é a diarreia, quantas vezes, qual o aspeto?” Isto é importante porque cada
pessoa tem uma ideia do que é a diarreia. A diarreia são fezes não moldadas, muitas vezes,
líquidas com pelo menos 4 a 5 dejeções por dia.

Este é um esquema que parece ridículo, mas que é


muito útil para as enfermeiras no hospital de Bristol
conseguirem avaliar o tipo de diarreia. E posso-vos dizer
que se perguntarem a doentes, que dizem que têm
diarreia, qual consistência das fezes vão ter grandes
surpresas! Há muitos doentes que dizem que têm diarreia
e que depois ao descrever, parece que as fezes afinal ainda
são bastante moldadas, o que nos faz ficar com grandes
dúvidas se de facto é mesmo uma diarreia de que se trata.

Há dois extremos de diarreia que é muito importante aprenderem para depois


aprenderem bem que bactérias é que as causam.
No extremo esquerdo do espectro temos uma diarreia que nem parecem ser fezes, que
até vai ser falada noutra aula, porque não é causada por uma Enterobacteriácea, mas sim pela
Vibrio cholerae. Na cólera podem ter diarreias com 10 a 15 litros de fezes diarreicas por dia. Se
são eliminados 10 litros de fezes, então já não são fezes, são quase só água, sem sangue e sem
inflamação, e a pessoa morre desidratada. No outro extremo veem o intestino até bastante
normal, mas à medida que vão para o lado da Disenteria observa-se um intestino revestido de
pus, que significa inflamação, vê-se até hemorragia e as fezes podem ser sanguinolentas. Isto é
a Disenteria, e agora estão a perceber porque é que a Shigella é um agente muito temido,
porque causa não uma diarreia, mas sim uma inflamação do intestino. Muitas das outras
diarreias que vamos falar, não só hoje, mas de muitas outras no futuro estão aqui algures no
espectro intermédio, um pouco mais para o lado diarreinogénico, ou aquoso, ou então um
pouco mais para o lado da Disenteria.

Já vos falei de cinco E. coli, e na altura disse que há duas, entre aquelas cinco, que são
importantes: uma que causa a Síndrome hemolítica-urémica e complicação que a precede, a
colite hemorrágica (E. coli O157:H7), e uma outra, mais banal, que causa a diarreia do viajante,
diarreia esta aquosa (E. coli ETEC).

Febre Tifóide
O que é?

Embora o agente seja uma Salmonella, esta não causa diarreia. Esta tem um ciclo de vida
quase igual ao que vão aprender nos parasitas, ou seja, uma pessoa fica infetada a comer ou a
beber qualquer alimento contaminado e depois a Salmonella vai para o intestino. E vai ser tão
agressiva que entra na corrente sanguínea e vai circular e causar Sépsis com febre altíssima.
Logo, é necessário sangue para o diagnóstico. A partir do sangue chega ao fígado, depois entra
na bílis, e é assim que volta a entrar novamente nas fezes, fechando-se o ciclo de vida. Numa
fase mais tardia pode causar diarreia, que é um sintoma menos frequente.

Posto isto, temos que debruçar-nos agora, em particular, sobre aquele aspeto que
mencionei no início e aqui começa a ser mesmo importante. Têm que saber para todas as
bactérias, micróbios, microrganismos, duas situações:

● Reservatório = onde a bactéria vive e se encontra habitualmente


● Via de transmissão

Na Salmonella não-Typhi, ou seja, naqueles mil quase 2 mil serotipos que causam
principalmente diarreia, o reservatório é os animais, sobretudo as aves e, em particular, as
galinhas. Encontram-se nas fezes das galinhas e, por esse motivo, conseguem chegar ao ovário
das galinhas, e essa é a razão pela qual estes microrganismos conseguem entrar nos ovos!
Certamente já ouviram falar que ovos crus são maus, porque podem estar contaminados com
Salmonella e isso tem consequências p.ex. naquela história do gelado. Muitas pessoas têm medo
de gelado, um bom gelado é feito a partir de ovos, e esses ovos não são cozidos, pode haver
contaminação com Salmonella e o gelado pode tornar-se perigoso. Quem diz gelado diz vários
outros alimentos à base de ovos crus. Qual o alimento “chave” que mais gente gosta, que é
confecionado com ovo cru? A mousse de chocolate! Mas a mousse de chocolate caseira! No
refeitório comem mousse de chocolate que não é caseira, qual é a diferença para a mousse
caseira? Porque nos refeitórios utilizam-se ovos pasteurizados. A mousse de chocolate que é
servida em grandes áreas tem que ter obrigatoriamente ovos pasteurizados. Não queremos de
repente 10000 alunos de um refeitório infetados com Salmonella. Mas antes da Salmonella estar
no ovo, está na galinha! Já todos nós comprámos frango congelado no supermercado e na
véspera tirámos o frango do congelador e colocámos a descongelar num prato no frigorífico. No
dia seguinte, esse prato está cheio de um líquido, rosado do sangue, que está cheio de
Salmonellas no caso de ter sido colonizado pela bactéria. Por este motivo é que este líquido é
bastante perigoso e pode levar a contaminação cruzada (p.ex.: mexer no líquido e depois ir
mexer numa alface que, normalmente, comemos crua). História/Caso típico: os homens que
fazem musculação precisam de proteínas e vão buscá-las aos ovos, bebendo ovos crus. Era eu
interno quando me chamaram à noite para o hospital porque estava lá um rapaz muito
agressivo, com músculos enormes, numa maca e o problema dele era uma diarreia desgraçada:
diagnóstico feito! Músculos grandes não se faz só com exercício, faz-se com toma de hormonas
e bebidas, percebeu-se então que ele andava a beber todos os dias 10 ovos crus…pimba,
apanhou Salmonella! Tudo isto para explicar aquilo que é o reservatório e o conhecimento que
é relevante aqui. Já também estão a perceber, em termos de saúde pública, o que seria
necessário fazer: inventar uma vacina contra Salmonella para as galinhas, e de facto estão a
trabalhar nisso.

*CURIOSIDADE SOBRE UMA RECEITA COM UM AVISO SOBRE A SALMONELlA


VER MINUTO 1:24:33 DA AULA PARA MAIS INFO*
Salmonella e Shigella - Transmissão

Se a Salmonella e a Shigella estiverem no intestino, há mais uma forma da transmissão


acontecer, não é só as aves! Se houver pessoas doentes, elas vão eliminar isso nas fezes, o que
também pode levar a transmissão, como?

Esta fotografia foi tirada na China. Mostra


alfaces muito bonitas, que não são mais bonitas
porque o senhor não foi ao AKI ou ao Leroy comprar
adubo. Aquilo que ele está a espalhar são fezes
humanas. Por isso é que em toda a Europa e não só,
é estritamente proibido usar fezes humanas para
adubar qualquer cultivo de plantas, ou seja, o que
for para consumo humano, porque podem ficar
contaminadas com Salmonella.

Agora vem a parte interessante e importante. A Salmonella typhi e a Shigella, aquelas que
causam doença mais grave como a Febre Tifóide e Disenteria, que estão digamos “mais
especializadas” a causar doença em nós, têm como reservatório apenas o Homem. Conseguem-
me dizer se ainda há muitos casos destes em Portugal? Não. Desde a década de 70/80, Portugal
evoluiu de tal forma, que todas as fezes humanas, como não podem ser usadas como estrume,
vão para as ETARs (Estação de Tratamento de Águas Residuais) e como todas as fezes vão parar
lá, não chegam a ir parar a outra pessoa. A não ser que vocês vivam na China. A transmissão da
Salmonella typhi de Homem para Homem, por via feco-oral, está quase limitada a países pobres.
Qual é a importância disto em termos práticos? Se tiverem uma pessoa a dizer “ah eu moro em
lisboa e não saí da cidade”, logo é impossível ser Salmonella typhi ou Shigella. No entanto, se
tiverem uma pessoa que voltou de Angola, que esteve lá a fazer qualquer coisa p.ex. negócios,
tem uma diarreia grave, isto é bastante sugestivo de que esta pessoa se poderá ter infetado com
uma alface ou assim contaminada com Shigella. É nisto que têm de pensar!

Yersinia pestis

A peste negra foi e é uma das doenças mais temidas na história da humanidade. A peste
alastrou pela Europa e matou quase metade de toda a população. Se pensarmos que a Covid já
nos está a causar problemas com uma taxa de letalidade de 2-3% , ou seja 2 a 3 pessoas em cada
100 morre, pensem como seria naquela altura. Ainda hoje se uma pessoa tiver uma peste
pulmonar mesmo com antibióticos a letalidade chega até aos 40/50% e é uma doença
gravíssima. O reservatório são os roedores, ratazanas, que vivem nos esgotos e no lixo. A
transmissão é feita através das pulgas, que se alimentam através do sangue das ratazanas. Numa
situação em que houve um grande surto da peste negra, no grande terramoto em S. Francisco
nos EUA, muitas casas colapsaram e ao colapsarem mataram também as ratazanas. Havia muitas
pulgas com sangue infetado daquelas ratazanas infetadas e que começaram a ficar com fome,
porque as ratazanas morreram. Então as pulgas começaram a picar pessoas, pelo que a doença
passou da ratazana para a pessoa. *STOR PASSOU UM VÍDEO A MOSTRAR A SINTOMATOLOGIA
DA PESTE, NO MINUTO 1:33:37 DA AULA PARA MAIS INFO*.

As pulgas, só as fêmeas, picam porque precisam das proteínas do sangue para produzir
os ovos. A pulga apresenta um proventrículo que apareceu no decorrer da sua evolução, que lhe
causa problemas ao chupar o sangue. Assim, quando a primeira picada não resulta, ela põe-se a
picar mais vezes até conseguir, o que aumenta a probabilidade de transmissão da doença.

*MOMENTO HISTÓRICO SOBRE OS 4 CAVALEIROS DO APOCALIPSE E OUTRO SOBRE A


PESTE BUBÓNICA
MINUTO 1:40:13 DA AULA PARA MAIS INFO*

Diagnóstico (vão falar melhor nas aulas práticas)

● Gastroenterite

o Colheita de fezes

o Coprocultura (para detetar a


Salmonella ou a Shigella)
● Febre Tifóide

A Salmonella entra no sangue e só mais tarde


aparece nas fezes, logo tenho de colher
hemoculturas e só mais tarde é que as fezes podem
ser úteis para o diagnóstico.

Mielocultura = hemocultura, mas sem usar sangue.


Esta bactéria atinge também a medula óssea, onde o
sangue está a ser produzido. Por isso, a amostra mais
útil para diagnóstico é o aspirado da medula óssea.
Como se faz a colheita? Penetrando o osso
(habitualmente o esterno por ser um osso mais fino)
e aspirando o seu conteúdo -punção da medula
óssea.

● Peste

No exame direto observa-se bacilos Gram –, mas


Gram- podem ser muitas outras Enterobacteriáceas.
Teste mais rápido e específico -> cora a Yersinia pestis
com uma coloração que fá-los parecer um alfinete de
dama.

Por isso: se uma pessoa tem um espessamento num


gânglio, se vem de uma parte do mundo onde pode
haver peste (p.ex. na Ásia) e se há alguma suspeita
devo avisar o laboratório porque o laboratório não
faz esta coloração habitualmente.
Data Docente
14/10/21 Prof. Doutor Thomas Hänscheid

Pseudomonas

CARACTERISTICAS FENOTÍPICAS
As bactérias deste género são:
● Bacilos Gram negativos,
● Aeróbios (embora algumas espécies possam crescer em condições de
● anaerobiose),
● Não fermentadores (obtendo energia através da oxidação dos
● açúcares),
● Biofilme
● Móveis
● Catálase positivo
● Oxidase positivo(distingue a Pseudomonas das enterobacterias)
● Sem esporos

Por outro lado, produzem um pigmento amarelo-esverdeado e têm um cheiro muito


caraterístico, útil no diagnóstico microbiológico de infeções por estas espécies.

CARACTERÍSTICAS DA P.AERUGINOSA

A espécie P. aeruginosa é a mais importante do género Pseudomonas.


É de salientar a capacidade de adaptação da P. aeruginosa a ambientes tão diversos como a
água, óleos de motores de explosão e até desinfetantes, o que torna esta bactéria
particularmente infeciosa para o ser humano.
Esta adaptação é devida à utilização de várias fontes de carbono e azoto para se desenvolverem.
Podem também sobreviver em soluções salinas concentradas (quando muitas bactérias não o
podem fazer) e toleram temperaturas extremas (de 20ºC a 42ºC, permitindo-lhes infetar
vertebrados de sangue quente e frio, insetos e plantas).

Mecanismos de Colonização

No que concerne aos mecanismos de colonização, o primeiro aspeto a salientar é o facto de,
habitualmente, a P.aeruginosa não fazer parte da flora comensal dos seres humanos. É, ao invés,
uma bactéria hospitalar, responsável essencialmente por infeções nosocomiais.
Quando, em alguns casos, integra a flora indígena, é sobretudo em indíviduos hospitalizados ou
que sofreram algum tipo de antibioterapia. Distribui-se preferencialmente por locais
anatómicos “húmidos”, nomeadamente, a nasofaringe, as axilas e o períneo.
Importa ainda ter em conta a colonização em indivíduos imunodeprimidos, uma vez que esta
conduz a taxas superiores de bacteriémia e consequente mortalidade, em indivíduos infetados
com esta bactéria, comparativamente com os não colonizados.
Reservatórios e Vias de Infeção
Um aspeto que é necessário ter em atenção diz respeito às fontes e vias de infeção destas
bactérias, uma vez que, se tivermos noções epidemiológicas acerca de um determinado
microrganismo será mais fácil fazer o diagnóstico. Por exemplo, destaca-se a associação da P.
aeruginosa, como bactéria hospitalar, à contaminação de água, de solutos diversos e de
dispositivos médico-cirúrgicos.

Fatores de Virulência
A P. aeruginosa possui diversos fatores de virulência inerentes aos seus mecanismos de infeção:
● Pili – com uma localização polar na bactéria, é importante na colonização por ajudar na
aderência às secreções respiratórias, nomeadamente a mucina – a aderência às células
do hospedeiro, nomeadamente às respiratórias

● Lipopolissacarídeos – localizam-se na membrana externa e ativam o lípido A, levando à


ativação da coagulação e interferindo no sistema complemento.

● Flagelo – com uma localização polar, confere mobilidade à bactéria, contribuindo para
a sua disseminação.
● Enzimas (que levam à lesão tecidual):
I. Exotina A – promove a ADP-ribosilação de proteínas;
II. Exoenzima S – promove a ADP-ribosilação de proteínas;
III. Elastase – leva à clivagem da elastina, colagénio e Ig;
IV. Protease alcalina – intervém na proteólise, inibe a ação do interferão gama;
V. Fosfolipase – intervém na hidrólise de fosfolípidos.

DOENÇAS ASSOCIADAS A P. AERUGINOSA


De acordo com o que já foi referido anteriormente, as doenças associadas às infecções a P.
aeruginosa são doenças nosocomiais, sendo as mais frequentes:
● Infecções respiratórias baixas em doentes ventilados;
● Infecções urinárias em doentes cateterizados, sob instrumentação do aparelho urinário,
com prostatite crónica ou com cálculos renais;
● Feridas cirúrgicas superficiais e profundas;
● Peritonites em doentes sob Diálise Peritoneal Crónica Ambulatória;
● Meningites
● Otite externa
● Endocardite

FACTORES PREDISPONENTES
Existem determinados fatores que predispõem o paciente à infeção a P. aeruginosa que, estão
ligados ao hospedeiro e não aos fatores de virulência da bactéria. Seguem-se alguns exemplos
desses fatores e possível apresentação clínica correspondente:

● Fibrose quística (doença hereditária em que as pessoas produzem um muco muito


espesso e os cílios não funcionam. As pseudomonas assim colonizam.)
● Bronquiectasia ( é um brônquio que está mais dilatado e por isso não funciona tão bem)
● Cateterização e manipulação do aparelho urinário – Infecção urinária;
● Catéteres intravasculares – Celulite / Tromboflebite supurativa;
- A infeção por P. Aeruginosa tem mau prognóstico.

OPÇÕES TERAPÊUTICAS
Tendo em conta a resistência natural da P. aeruginosa, surgem como possíveis opções
terapêuticas, os seguintes antimicrobianos:
● Cefalosporinas de 3ª geração (ex: ceftazidima);
● Penicilina de espectro largo associadas a inibidores de betalactamases (ex:
piperacilina+tazobactam);
● Monobactamos (ex: aztreonam);
● Carbapnemos (ex: imipenem, meropenem).
● Aminoglicosideos (ex: gentamicina), usado a nível local;
● Fluoroquinolonas(ex: ciprofloxacina) – único antibiótico oral que actua na infecão
urinária a Pseudomonas;
ao provocar o
encerramento de canais
de purina, induzem uma
resistência aos
carbapenemos
● Polimixinas (ex:
colistina) – acção muito
potente mas também
muito tóxico.

Acinetobacter

O mais conhecido é o Acinetobacter baumannii (única espécie do Acinetobacter que oxida


glicose)

● Coco-bacilo Gram negativo


● Aeróbio
● Não fermenta a glicose nem lactose
● Oxidase negativo
● Catálase positivo
● Distingue-se da Pseudomonas Aeruginosa por ser oxidase negativo
● Muito resistentes, mas pouco patogénicos
Epidemiologia
- Ubíquos no ambiente, estando presentes no solo, água e comida;
- São colonizadores da pele e do trato respiratório;
- No ambiente hospitalar estão associados aos ventiladores, cateteres e outros aparelhos.

Doenças associadas
A infeção mais comum é a Pneumonia, seguida de infeções de trato urinário, endocardite, pele
e tecidos moles, meningite e infeções oculares.

Diagnóstico
Distinguem-se das Enterobacterias por não fermentarem glícidos nem reduzirem nitratos. São
oxidase negativos e catalase positivos.

NOTA: Crescem em Mac Conkey, mas não fermentam a lactose

Tratamento
Colistina em monoterapia, mas também se pode usar um carbapeneme ou uma quinolona, com
a opção de se adicionar amicacina ou ceftazidima. O sulbactam também é eficaz. O TSA é
fundamental na orientação terapêutica.
Data Docente
18/10/2021 Prof. Doutor Mário Ramirez

Hoje vamos falar sobre a família de bactérias Neisseriaceae e Pasteurellaceae. As Neisseriáceas


são bactérias diplococos Gram negativos, aeróbias, sendo que os géneros mais importantes nos
seres humanos são a Neisseria, a Morazella, a Kingella e a Eikenella. Dentro das Neisseria
podemos referenciar as duas espécies principais, a Neisseria gonorrhoeae, que como o nome
indica resulta na gonorreia e a Neisseria meningitidis, que origina a meningite. A Neisseria
gonorrhoeae, também designada de gonococo, causa uma doença sexualmente transmissível
(STD), logo o modo de transmissão é pelo contacto sexual com um indivíduo infetado. Possui
uma elevada prevalência e uma baixa mortalidade. Por outro lado, a Neisseria meningitidis,
também designada de meningococo, faz parte do microbiota do aparelho respiratório superior,
sendo a partir daqui que causa infeção. A doença por esta causada possui uma baixa prevalência
e alta mortalidade, ao contrário da gonorreia. A Neisseria gonorrhoeae provoca uma infeção na
superfície das mucosas, nomeadamente no cérvix, na uretra, no reto, na faringe e na conjuntiva.
Não causa doença nas crianças pois infeta apenas o epitélio vaginal pós-púbere, visto que o
epitélio vaginal pré-púbere é queratinizado, ou seja, possui células escamosas que são
resistentes à infeção, ao contrário do primeiro que é constituído por uma mucosa. A gonorreia
na mulher afeta o cérvix, causando uma endocervicite, sendo que os sintomas são corrimento,
disúria (dor e urgência a urinar, visto que a bactéria afeta o uretélio, causando uma uretrite) e
dor abdominal, sendo 50% das mulheres assintomáticas. A amostra para a identificação da
bactéria deve ser retirada do cérvix, utilizado um espéculo, deve-se evitar a microbiota vaginal.
O Gram identifica a bactéria em menos de 50% dos casos, logo o exame de cultura é o mais
importante na identificação. No homem, como não possuem cérvix, a infeção é principalmente
uretral, sendo que se apresenta um exsudado uretral, podendo este ser abundante e purulento
ou escasso e transparente. O indivíduo também apresenta disúria e apenas 10% dos homens
são assintomáticos, contrastando com o elevado número nas mulheres. A amostra retirada deve
evitar os comensais, sendo que o Gram identifica em mais de 95% dos casos a bactéria,
continuando a ser importante realizar a cultura, não só para identificar a bactéria, mas para fazer
o antibiograma.

O que esperamos encontrar numa coloração Gram do


exsudado uretral é um conjunto de leucócitos
polimorfonucleares (as células de maiores dimensões
na imagem à direita) e os diplococos, que
correspondem à bactéria Neisseria Gonorrhoeae,
dentro ou perto destes (células de menores dimensões
à direita). Esta bactéria pode ainda causar uma infeção
no reto ou na faringe, devido ao contato genital, ou
seja, através do sexo retal ou oral. No caso da gravidez,
também através do sexo, esta bactéria pode atingir o bebé e provocar uma conjuntivite
designada de Ophtalmia neonatorum. Pode ser realizada uma profilaxia por aplicação tópica de
nitrato de prata, iodopovidona, tetraciclina e eritromicina. Contudo, atualmente, como as mães
são seguidas e testadas para o gonococos, já é questionada a necessidade desta profilaxia. A
infeção por gonococos quando assintomática vai resultar uma infeção crónica, ascendente, visto
que ascende do cérvix até ao endométrio, provocando a doença inflamatória pélvica= PID,
resultando em gravidezes ectópicas e na infertilidade. Quando é realizada uma microscopia por
varrimento, observamos o endométrio com diversas bolinhas que correspondem às bactérias.
Esta bactéria também pode provocar bacteriémia, sendo que o foco inicial pode ser genital, retal
ou faríngico, disseminando-se de seguida através do sangue podendo atingir as articulações,
resultando em artrite, observando-se um tornozelo inchado, com calor, rubor e dor ao toque.

Os fatores de virulência na Neisseria são a cápsula (apenas no meningococo), os pilus ou


fímbrias, o lipo-oligosacárido, as proteínas de superfície que originam os serotipos, que podem
ser “Por, Opa ou Rmp”. O Lipo-oligossacárido, é semelhante ao LPS mas sem os oligossacáridos
O e é um fator determinante da inflamação por estimulação da produção de TNF- alfa. A
sialização do Lipo-oligossacárido=LOS, permite uma resistência da bactéria ao soro
(complemento e opsonização) e promove uma atividade pró-inflamatória. Por outro lado, as
proteínas de superfície (Por, Opa e Rmp), permitem uma aderência e invasão celular e um
controlo da resposta imunitária. Estas bactérias também permitem a aquisição de ferro (Tbp1/2
e Lbp) e as proteases do IgA, produzidas nas mucosas, permitem um controlo da resposta
imunitária.

Como é que ocorre a infeção por Neisseria


Gonorrhoeae? A bactéria é transmitida através do
contato sexual, entra por endocitose nas células do
epitélio uretal, vaginal, anal ou faríngeo, ocorre a
transcitose até à porção basal das células, onde se dá a
exocitose para o tecido correspondente. Aqui, os
macrófagos tentam matar as bactérias mas estas
sobrevivem dentro dos mesmos, sendo que depois
através de enzimas acabam por provocar dano às
células dos epitélios e por fim são libertadas para o
lúmen dos órgãos falados, ocorrendo novamente todo
este ciclo. Os fatores de risco da Neisseria gonorrhoeae
são: possuir múltiplos parceiros sexuais, possuir
defeitos congénitos no complemento, que como sabemos faz parte da nossa imunidade inata,
sendo um elemento essencial para o controlo destas bactérias, logo defeitos no mesmo,
aumentam a probabilidade de infeção. Existe maior incidência desta infeção em indivíduos
jovens, entre os 15- 30 anos, pois são os mais sexualmente ativos. O controlo baseia-se no
tratamento de todos os parceiros sexuais e o uso do preservativo. O tratamento deve ser feito
com penicilina, contudo há resistências, por isso podem ser utilizados outros beta-lactâmicos
nomeadamente as cefalosporinas, como a ceftriaxona, mas também já existem resistências,
com quinolonas, como a ciprofloxacina, com tetraciclinas (Doxiciclina), com macrólidos
(Azitromicina), visto que estes últimos são utilizados no tratamento da Chlamydia trachomatis,
uma doença que acompanha normalmente a gonorreia.

Na Neisseria meningitidis, a transmissão faz-se através de aerossóis, invadindo o nosso sistema


através das fossas nasais ou boca. Promove a sua própria transcitose, atingindo os tecidos
subjacentes ao epitélio nasofaríngeo, atingindo depois os vasos sanguíneos ou diretamente as
meninges. Produz o LPS, que origina TNF, que compromete a barreira Hematoencefálica. Os
fatores de virulência desta bactéria são a cápsula, ao contrário do gonococo, sendo que devido
às proteínas de superfície, possui 12 serotipos distintos, A, B, C, E(29E), H, I, J, L, W (W135), X, Y,
Z, contudo os mais importante são apenas o A, B, C, W, X e Y. É uma bactéria gram-negativa. A
maioria das cápsulas desta bactéria contêm ácido siálico, nomeadamente a B, C, W E Y. Como o
nosso organismo também possui ácido siálico, não é um alvo fácil para o nosso sistema imune e
por exemplo o ácido siálico da cápsula B, mimetiza estruturas presentes nas células neuronais,
logo não é um bom alvo do nosso sistema imune. Vamos ver que existem vacinas conjugadas
para o serotipo A, C, W e Y, contudo não existem as mesmas para o serotipo B. Como acontece
no gonococos, o complemento é essencial na defesa, sendo que deficiências primárias no
complemento provocam um maior risco de doença. Essas deficiências primárias podem ser nos
fatores precoces, afetando a opsonofagocitose, existindo uma suscetibilidade maior ao
pneumococos, por outro lado, podem ser deficiências nos fatores tardios, afetando o complexo
de ataque à membrana, o que não aumenta a suscetibilidade ao pneumococos. Isto acontece
porque o pneumococos é uma bactéria gram-positiva onde a opsonofagocitose é muito
importante no combate à mesma, enquanto que o complexo de ataque à membrana é essencial
no combate às bactérias gram-negativas, logo
essencial no combate aos gonococos ou
meningococos. O Lipooligossacárido - LOS, é
inflamatório, visto que estimula a produção de
TNF-alfa, citoquinas e é reconhecido pelo TLR-4.
Promove a aderência, interfere na deposição do
complemento devido à presença de ácido siálico,
interfere com os péptidos antimicrobianos e possui
uma composição muito variável, podendo
contribuir para diferenças entre as estirpes. O fator
de opacidade Opa, é responsável pela captura de ligandos e subversão do sistema imunitário,
sendo que o Opc, liga-se à vitronectina presente no nosso tecido conjuntivo, promovendo a
invasão via integrinas. Os pili são responsáveis pela adesão inicial, fazendo um movimento de
twitching motility, facilitando no processo infecioso. Esta bactéria, origina bacteriémia,
podendo ser designada de meningococemia, que causa pequenas lesões cutâneas, que
designamos de petéquias (pequenos derrames na pele), que podem coalescer formando lesões
hemorrágicas extensas, numa fase mais extensa, sendo que para diagnosticarmos esta infeção
fazemos uma colheita de sangue, para realizar uma hemocultura.

A Neisseria meningitidis causa epidemias,


como as que acontecem a cada 2, 3 anos, no
cinturão da meningite africano (imagem à
direita), que englobam diversos países da
África subsariana. A meningite é uma
emergência médica, sendo que os sintomas
associados são febre, mau estar geral,
cefaleias, desorientação, confusão, as
pessoas não conseguem responder a
perguntas simples, rigidez da nuca, sendo que
nos bebés, observamos irritabilidade e
rejeição dos alimentos. Para o diagnóstico realizamos uma punção lombar, fazendo um exame
direto do líquido cefalorraquidiano onde observamos os diplococos Gram negativos dentro dos
leucócitos (característica desta espécie), sendo também realizado um exame de cultura: uma
hemocultura e a cultura do LCR. A transmissão desta bactéria ocorre através de aerossóis, sendo
que o tratamento pode ser feito com penicilina (existem resistências) e com cefalosporinas,
como a ceftriaxona e a cefotaxima, que possuem uma elevada permeabilidade via barreira
hematoencefálica, algo importante no contexto da meningite. Os contatos, como os familiares,
colegas de infantário têm 500 x maior probabilidade de contrair a doença, logo pode ser feita
uma profilaxia com rifampicina, ciprofloxacina (quinolona) e ceftriaxona (cefalosporina, que
penetra melhor na barreia hematoencefálica). A incidência da infeção por meningococos é mais
elevada nas crianças com 2 anos, diminui depois, aumentando nos adolescentes e jovens
adultos, devido à elevada aglomeração e de contatos mais íntimos entre os mesmos (partilha da
microbiota da orofarínge), depois nos adultos volta a diminuir aumento por fim, nos idosos. As
vacinas que existem contra o meningococos podem dividir-se em apenas polissacarídeas,
existindo uma quadrivalente: A, C, W e Y ou em vacinas conjugadas (que ligam covalentemente
um polissacárido a uma proteína), podendo ser quadrivalente: A, C, W e Y ou monovalente: C (a
presente no plano nacional de vacinação). Nenhuma destas vacinas como já tínhamos visto,
inclui o serotipo B, visto que este é um homopolímero de ácido siálico que mimetiza
polissacáridos presentes no nosso organismo sendo um fraco agente imunogénico. Assim a
vacina que existe para a Neisseria meningitidis tipo B é a 4CMenB. A eficácia e a efetividade da
vacina 4CMenB têm sido questionadas, sendo que por estudos realizados no Reino Unido,
observamos uma descida da incidência do serotipo B, uma manutenção da incidência dos
serotipos W e Y (observou-se um aumento da incidência do serotipo W recentemente),
enquanto que após a implementação da vacina do serotipo C, observou-se um desaparecimento
quase total da incidência deste serotipo.

Mudando agora de género, temos a Kingella, bacilos gram negativos, sendo o agente mais
importante a Kingella Kingae, que no passado era considerada pouco importante, contudo
atualmente é considerado um agente importante por ser responsável por osteoartrites em
pediatria. Estes bacilos gram negativos, colonizam a nasofaringe, sendo que se inicia a
colonização aos 6/ 7 anos de idade, aumentando a percentagem de indivíduos colonizados a
partir dessa idade. É também aos 6/ 7 anos que observamos um aumento considerável das
infeções, provavelmente pelo facto do indivíduo contactar pela primeira vez com a bactéria, não
apresentando ainda defesas consideráveis. As infeções são osteo-articulares ou podemos
observar uma bacteriémia oculta, ou seja, as crianças aparecem nas urgências com quadros de
febres, dores articulares gerais, mal-estar, contudo sem indícios de sépsis, o que não indicia por
si só bacteriémia. Contudo ao fazermos uma hemocultura, percebemos que esta está presente
e pode ainda resultar em endocardite. Os fatores de virulência são o pili (importante para a
adesão), a cápsula, as toxinas e as OMV (out membrane vesicles). O crescimento é difícil,
ocorrendo em garrafas de hemocultura, sendo que por vezes é necessário utilizar o PCR para
identificar este agente, pois as garrafas de hemocultura podem positivar numa fase tardia de
incubação. Relativamente ao tratamento, pode ser utilizada a ampicilina, que apresenta
resistências, logo utiliza-se as cefalosporinas.

Relativamente às Pasteureliáceas, são


bacilos gram negativos, aeróbios facultativos,
englobando os géneros: Haemophilus,
Actinobacillus, Aggregatibacter e Pasteurella.
O género principal é o Heamophilus, pois é o
mais importante em casos de infeção. Estas
bactérias crescem em gelose de chocolate,
que não tem nada de chocolate, apenas a cor.
O que acontece é que causamos a lise dos
eritrócitos, estes libertam a hemoglobina,
que oxida ficando com este tom acastanhado.
A espécie mais frequente dentro deste
género é a H. influenzae, responsável pelas patologias: pneumonia, sinusite, otite, meningite,
epiglotite, celulite e bacteriémia (as restantes espécies resultam nas mais diversas patologias
expostas na imagem à direita).

O H. influenzae origina em gelose de sangue (imagem à


direita) um satelitismo à volta das colónias maiores de
estafilococos ou estreptococos hemolíticos, ou seja,
cresce à volta destas colónias, visto que produzem o fator
V, que é o NADH, necessário ao crescimento desta
bactéria. Também cresce em gelose de chocolate, pois a
hemoglobina, liberta o fator V e a henima, ambos
necessários ao crescimento da bactéria. Assim, ao colocarmos duas tiras impregnadas com o
factor X= hemina e o fator V=NADH, se as bactérias estiverem a crescer entre as tiras,
observamos o crescimento do H.influenza, pois são necessárias para tal. Se as bactérias
crescerem apenas adjacentes à tira com o fator V, estamos a observar o H. parainfluenzae. O H.
influenzae possui os serotipos de A a F e um serotipo não tipável= HiNT, pois não possui cápsula.
O mais importante é o H. influenzae do tipo B-HiB, pois era a causa mais importante de
meningite em crianças com menos de 5 anos antes da existência da vacina conjugada. Os
indivíduos são portadores na nasofaringe sendo a partir desta que ocorrem as infeções.

Observando as imagens de expetoração pela coloração de


gram (à direita), vemos que as bactérias encontram-se livres,
fora dos leucócitos, ao contrário do que acontece com a
Neisseria Meningitidis, que se encontram dentro dos
mesmos. A incidência da doença por H. influenzae do tipo B
é maior aos 6 meses de idade, sendo que vai reduzindo a
partir de 1 ano de idade, altura da vacinação. Relativamente
às apresentações clínicas antes da vacinação, 50 a 60% das
meningites bacterianas eram causadas por esta bactéria,
sendo que em 2-5% dos casos resultavam em mortalidade, mesmo com antibioterapia,
enquanto 15-30% dos casos resultavam em sequelas auditivas ou neurológicas. Com a
introdução da vacinação, primeiramente uma vacina polissacarídea e de seguida uma
conjugada, observou-se um grande declínio dos casos de meningites causadas pelo H.Influenzae.
Atualmente as infeções por esta bactéria são principalmente pneumonias, bacteriémias sem
foco, sendo o papel da mesma sobre a DPOC um pouco controversa, apesar desta bactéria ser
bastantes vezes isolada nestes casos. Cerca de 75% destes H.influenzae são não tipáveis, ou seja,
sem cápsula. Relativamente ao tratamento, esta bactéria produz uma elevada taxa de beta
lactamases, sendo as cefalosporinas a terapêutica de eleição, podendo utilizar-se também:
Cloranfenicol, Quinolonas, Sulfametoxazol. É necessário testar a suscetibilidade aos antibióticos
visto que são conhecidas diversas resistências.

Agora passando para a Legionella, ouvimos falar à uns anos atrás sobre o surto desta bactéria
em Vila Franca de Xira, sendo que naquela altura, a Câmara Municipal de Vila Franca de Xira,
informou a população de que a bactéria não era transmitida pela ingesta de água mas sim
através da inalação da mesma, visto que a Legionella vive nas amibas da água. A Legionella
pneumophila é uma bactéria intracelular facultativa, infeta protozoários, forma biofilmes, vive
na água, é resistente ao cloro e à temperatura e prefere água tépida. A transmissão, como já
referido, é feita pelo contato a aerossóis da água contaminada (chuveiros, torres de
arrefecimento (caso de Vila Franca de Xira), ares condicionados, fontes ou jacúzis), sendo que
existe apenas um caso de transmissão Homem-Homem, de um senhor que foi para o Porto e
contamina a mãe. A maioria dos casos de infeção são esporádicos, contudo podem ocorrer
surtos como o descrito anteriormente, sendo que 70% dos casos são obtidos na comunidade,
20% associados a viagens e 10% associados a cuidados de saúde. A infeção causa febre de
Pontiac, uma síndrome gripal, auto-limitada (2-5 dias) não necessitando de tratamento
antimicrobiano. Por outro lado, pode causar a doença dos legionários (Vila Franca de Xira), uma
pneumonia grave, com uma taxa de mortalidade de 10% e que requer tratamento
antimicrobiano. Depois do surto em Vila Franca de Xira, tivemos outro, no Hospital de São
Francisco Xavier, pois a água do mesmo estava contaminada. Os fatores de risco associados à
infeção por esta bactéria são ser do sexo masculino, ser fumador, ter mais de 50 anos, o
alcoolismo, a imunossupressão, as doenças crónicas (Diabetes, doença pulmonar ou cardíaca),
uma viagem recente, as neoplasias hematológicas e a terapêutica biológica anti-TNFalfa.
Relativamente à epidemiologia, a Legionella apresenta uma distribuição global sendo que existe
um maior número de casos no sul da Europa, em princípio devido ao facto de termos verões
mais quentes, ficando a água mais quente. Esta bactéria está no entanto sub-diagnosticada. O
diagnóstico é realizado através do exame de cultura, utilizando-se a expetoração como produto,
sendo necessário um meio especial, o BCYE, que contém L-cisteína, ferro e carvão ativado. É
pouco sensível visto que a sensibilidade varia entre 20-80%. Outro método de diagnóstico é o
teste de antigénio, através da urina dos doentes, sobretudo, os que possuem doença dos
Legionários, onde é detetado o LPS do serotipo 1 (sendo que como 95% das infeções são
causadas por este serotipo, o facto do teste de antigénio identificar apenas este, não costuma
ser um problema). Este teste é positivo às 48-72 horas após o início dos sintomas, mantendo-se
positivo durante semanas a meses após a resolução dos mesmos. Apresenta uma sensibilidade
de 56-99%. Ainda temos o teste de PCR, realizado através da expetoração, urina ou sangue
(soro), mas ainda em desenvolvimento e com uma sensibilidade muito variável, dependente do
produto utilizado (entre 0-100%). Por fim, temos o teste da presença de anticorpos no sangue,
sendo utilizado apenas para estudos epidemiológicos visto que a presença dos anticorpos
aparece após 3 semanas da infeção, realizando-se um estudo retrospetivo. No entanto, não
existe seroconversão em 25% das infeções. Relativamente à terapêutica, é utilizada a
azitromicina (macrólido), a levofloxacina, a moxifloxacina (duas quinolonas), sendo possível
utilizar uma doxiciclina (tetraciclina) para em conjungação com os outros fármacos em situações
mais críticas. Em situações mais graves, adicionamos a conjungação de TMP/SXT ou rifampicina
aos fármacos anteriores.

A Legionella pneumophila apresenta um sistema de


secreção tipo IV, que liberta proteínas efetoras
(importantes fatores de virulência) para dentro do
hospedeiro, interferindo com o metabolismo do
mesmo. A bactéria entra no hospedeiro, num vacúolo,
não permitindo a entrada dos efetores que libertou
no hospederio para dentro deste vacúolo, replicando-
se no mesmo, libertando-se de seguida do hospedeiro
de modo a infetar novas células.
Data Docente
28/09/2021 Prof. Doutor Mário Ramirez

Chlamydiaceae e Mycoplasma
Extremamente pequenas (as mais pequenas bactérias descritas)
Ciclo de vida complexo
Genomas muito pequenos (< 1Mb) – poucos genes
Não possuem uma verdadeira parede celular (ainda que a estrutura de superfície seja
muito semelhante com a de bactérias que já conhecemos)

1. Chlamydia e Chlamydophila
Nota: O género Chlamydophila apareceu há pouco tempo (cerca de 5 anos), por isso, nos textos
mais antigos só vai aparecer Chlamydia.

• Cocos extremamente pequenos


• Parasitas intracelulares obrigatórios
• Ciclo de vida bastante complexo

Ciclo Vida das Chlamydias

Nota: Os Corpúsculos Elementares são as partículas infeciosas da Chlamydia


• Não têm peptidoglicano
• São muito parecidas com as bactérias Gram –
Membrana externa, Camada P e Membrana
interna

Membrana externa:
• LPS (tal como nas bactérias Gram -);
• MOMPs (Major outer membrane protein) – estruturas proteicas constituídas por várias
subunidades de uma proteína que se encontram à superfície. São o principal alvo da
resposta imunológica;
• CRPs pequena – permitem a ligação das CRPs grandes à membrana externa.

Camada P:
• Semelhante ao peptidogliano;
• CRP grande (Cysteine-rich protein) – conjunto de proteínas ligadas entre si;
Cisteína é um aminoácido que tem enxofre e que permite fazer ligações covalentes entre
proteínas diferentes. É por ser rica em cisteína que vai haver a formação desta CRP grande,
formando esta estrutura semirrígida semelhante ao peptidoglicano.

Espécies Patogénicas:

A. Chlamydia trachomatis
Infeções superfícies mucosas:
o Cérvix
o Uretra
o Reto/Ânus – causa proctite (tal como a Gonorrhea)
o Conjuntiva
Recém-nascidos (transmissão durante o parto)
o Pneumonia

Diferentes serotipos (definidos pela MOMP) causam doenças diferentes.

Cérvix e Uretra
Mulher – Endocervicite e uretrite
o Corrimento Vaginal purulento
o Disúria
o Dor abdominal
o Assintomática em 80% das mulheres

Infeção estende-se até ao endométrico, provocando


Doença Inflamatória Pélvica (PID) ou Salpingite

o Responsável por Gravidez Ectópica e Infertilidade

Homem - Uretrite
o Exsudado uretral (mais claro/ menos purulento que o provoca pelo Gonococos)
o Disúria
o Assintomática em 20% dos homens
o Infeção concomitante com Neisseria Gonorrhoeae – é importante quando detetamos
um, procurar o outro ou quando detetamos um, tratar logo para ambos;
o Pode estar associada ao Síndrome de Reiter – doença sistémica (uretrite, conjuntivite,
poliartrite e lesões mucocutâneas espalhadas pelo organismo);

Algumas estirpes de Chlamydia trachomatis estão associadas ao Linfogranuloma venéreo


(LGV) que era uma infeção muito comum em África. É uma infeção dos monócitos em que os
gânglios linfáticos que drenam as regiões afetadas estão inchados (granulomas linfáticos) e,
numa fase mais tardia da doença, vai haver uma fistulação do gânglio linfático com drenagem
do pus para o exterior.
Outros serotipos de Chlamydia trachomatis são ainda responsáveis por Tracoma que é
uma conjuntivite crónica, bilateral e que leva ulceração da córnea e formação de um pannus
provocando cegueira (sendo a causa mais importante, a nível mundial, de cegueira infeciosa). A
transmissão faz-se: de pessoa para pessoa ou através de moscas que levam a infeção de criança
para criança; verticalmente, através da mãe para os filhos.
As regiões mais afetadas pelo Tracoma são: Austrália, Ásia Ocidental, sul da Península
Arábica, África, Brasil e México.

Caso clínico:
2 bebés do sexo feminino que nascem relativamente próximas uma da outra
Partos sem complicações
Têm pesos mais do que aceitáveis (2605g e 3025g)
Desenvolveram febre uma ao 3º dia e outra ao 13º dia após nascimento
Rx torácico mostra infiltrações difusas e reticulares
PCR (proteína C reativa – é um sinal de infeção): 13.1 mg/dL e 6.5 mg/gL (muito elevada – valores
de referência < 1mg/dL)
Leucocitose sem eosinofilia (18700/µL e 31200/µL)

Suspeita de Pneumonia

Recolheu-se:
• Zaragatoa Orofaringe (não porque seja uma amostra do aparelho respiratório inferior,
mas porque é a forma mais fácil de ver uma etiologia viral)
• Sangue (pneumonias cursam muitas vezes com bacteriemia)
• Líquor – principal agente da pneumonia é Streptococus Pneumoniae que também pode
causar meningite (daí recolhermos LCR)
EXAMES DERAM TODOS NEGATIVOS
(Não foram detetados vírus na zaragatoa da orofaringe nem bactérias, quer no sangue como
no líquor)

Diagnóstico etiológico: Presença de antigénios na conjuntiva e nasofaringe e anticorpos IgM no


soro ---- infeção por Chlamydia trachomatis
Terapêutica: Eritromicina (16 e 12 dias)

Conclusão: Pneumonia por transmissão vertical (tínhamos Chlamydia trachomatis no canal de


parto). Esta transmissão vertical ocorre em cerca de 10-20% de nados de mães infetadas e tem
um período de incubação que pode ir de 3 dias a 3 semanas
Tratamento (Chlamydia trachomatis)
Macrólido:
o Azitromicina – dose única (cara!)
o Doxicilina/ Tetraciclina – mais barata que a Azitromicina, mas com terapêutica de 7 dias
(e no caso de LGV são 21 dias)
o Eritromicina – cuidado nas grávidas e latentes

Diagnóstico
o Deteção de anticorpos/antigénios
o Métodos moleculares (PCR DNA) – tem de haver uma suspeita porque tem de ser pedido
São métodos muito sensíveis em que é possível detetam concentrações mínimas
do agentes… Contudo, podem ser demasiado específicos:
Na Finlândia, houve testes falsos-negativos para Chlamydia trachomatis porque o teste
molecular que estavam a usar estava dirigido a um local, na estirpe de Chlamydia trachomatis,
que estava a causar o surto, onde havia uma mutação num primer e, por isso, o primer não
conseguia amplificar aquela região (região 23S).
o Cultura – é muito complexa e pouco sensível pelo que, muitas vezes, a Chlamydia
trachomatis não é detetada

B. Chlamydophila pneumoniae
o Organismo TWAR (Taiwan acute respiratory agent);
o Causa Pneumonia Atípica com infiltrados intersticiais;
o Mais de 50% apresentam evidência serológica de infeção anterior (a infeção parece ser
muito mais frequente do que aquilo que pensamos, se bem que a sua deteção em casos
agudos é rara);
o Envolvido no desenvolvimento de Arteriosclerose – estas bactéricas também infetam
células musculares lisas e endoteliais, levando a uma resposta inflamatória crónica e,
consequentemente, a Arteriosclerose.

Diagnóstico:
o PCR
o Recolha de amostras do aparelho respiratório inferior (expetoração)
Nota: a expetoração é produzida pelos doentes, mas muitas vezes estes não conseguem produzi-la por
estarem mais fragilizados ou, no caso das crianças, por ser complicado de explicar o que é que têm de
fazer. Assim, há critérios que nos permitem perceber se a amostra é boa ou não (se tem muita saliva ou
não --- flora do aparelho respiratório superior contém bactérias que podem causar infeções do aparelho
respiratório inferior.

Terapêutica: Macrólidos, Doxiciclina, Levofloxacina

C. Chlamydophila psittaci
o Ornitose – infeções que são adquiridas através de pássaros
(zoose – animais no geral / ornitose - pássaros)
o Sintomas e sinais bastante inespecíficos: cefaleia, febre alta, mialgia, artralgia, tosse não
produtiva
o Transmissão faz-se por inalação de fezes secas de aves infetadas, sobretudo aves
exóticas;
o Infeção pode ter um curso relativamente benigno (tempo de incubação e recuperação
longos – cerca de 5 semanas); na infeção grave os sintomas agravam-se nas primeiras 4
semanas e o tempo de recuperação pode chegar às 8 semanas, podendo mesmo levar
à morte;
o Infeções acontecem esporadicamente em pessoas que têm aves exóticas (desde
papagaios a araras) mas também podem acontecer surtos:
P. ex.: Surto em 2019 em trabalhadores em matadouros de aves em que 10 pessoas foram
infetadas e 3 delas hospitalizadas.
o DNA C. psittaci 80% casos linfoma ocular anexial – regressão com doxiciclina.

2. Mycoplasmoidaceae e Metamycoplasma
• Pertencem à classe dos Mollicutes - não têm peptidoglicano (têm a superfície “mole”);
• Têm colesterol na membrana externa (ao contrário da maior parte das bactérias) e têm
folhetos assimétricos, com fosfolípidos na camada interna e lipoproteínas no folheto
externo.

Espécies Patogénicas:

Mycoplasmoides pneumoniae
Mycoplasma Metamycoplasma hominis
Mycoplasmoides genitalium

Ureaplasma urealyticum (classe diferente dos Mycoplasma mas parecidos)

• Infetam sobretudo aparelho respiratório e genitourinário;


• Tal como as Chlamydias, têm um ciclo de reprodução complexo em que temos os
corpúsculos elementares e os corpúsculos filamentosos (que se reproduzem dentro do
vacúolo nas nossas células).

A. Mycoplasma pneumoniae
Ataca células epiteliais do aparelho respiratório
o Faringite
o Bronquite
Causa Pneumonia (sem padrão sazonal, ou seja, não são mais
frequentes no inverno do que no verão – ao contrário das Microscopia de transmissão de um corte
pneumonias causadas pelos Streptococus pneumoniae) árvore respiratória ciliada – células no muco
são os mycoplasmas

Se tivermos uma pneumonia no verão temos


de suspeitar de Mycoplasma pneumoniae

o Responsáveis por 15-20% pneumonias na comunidade;


o + Frequente em: crianças mais jovens, crianças em idade escolar e adultos jovens
(depois vai diminuindo com o aumento da idade, ao contrário do que acontece com o
Pneumococos).
Caso Clínico:
Doente 27 anos
Apresenta-se na urgência com dispneia, ou seja, dificuldade em respirar
História de febre intermitente há 3 semanas – típico destas infeções que têm
um curso prolongado
Recolhido sangue e expetoração, mas as culturas vêm todas negativas Pneumonia bilateral difusa
Terapêutica empírica: Vancomicina (cobrir Staphylococcus), Ceftriaxona
(cobrir Pneumococos), Azitromicina (para cobrir Mycoplasmas e Chlamydias) e Oseltamivir
(antivírico – estamos sobretudo a cobrir o vírus Influenza)

Agravamento dos sintomas ao 7º dia em que é necessário intubar e colocá-lo num ventilador
Retiradas Biópsias pulmonares (suspeita de infeção por fungos filamentosos que não
conseguiríamos detetar através das culturas) – negativas para todos os microrganismos

Falecimento do doente ao 14º dia


Autópsia releva hemorragia extensa dos pulmões com coagulação intrapulmonar disseminada

Fatores virulência:
o Células são móveis – movem-se para a base das células ciliadas;
o Organelo de adesão, contendo a Proteína P1, que mantêm as células aderentes à base
das células ciliadas e vilosidades;
o Contacto da bactéria com a membrana das células é essencial porque os Mycoplasmas
vão produzir radiais de O2 e peróxido de hidrogénio, atacando as membranas das
células ciliadas. Isto leva a uma despolarização da membrana com paragem do
batimento ciliar. Assim, o sistema que leva o muco dos brônquicos para a árvore
respiratória superior para este ser expelido ou deglutido deixa de funcionar, o que
promove a migração das bactérias para os pulmões, causando, então, a pneumonia. As
fosfolipases membranares também contribuem para este tipo de mecanismo.

Longo período de incubação e tempo de infeção:

1º sinais de infeção podem ocorrer na 1ª/2ª semana;


Cultura positiva entre a 2 e 7ª semana;
Sintomas respiratórios podem só aparecer entre 3 e
6ª semana;

Pessoa está muitas vezes infetada, mas sem


sintomas, o que aumenta a transmissibilidade

o Antes utilizavam-se os testes de Crioaglutinina e de fixação do complemento mas são


testes pouco sensíveis e específicos pelo que deixaram de ser usados;
o Transmissão faz-se por secreções respiratórias nomeadamente a colegas de escola e
família que são aqueles que têm um contacto mais íntimo com o doente.
Diagnóstico:
Cultura aeróbia
Serologia de anticorpos (+ frequente)
Métodos moleculares, nomeadamente através PCR feito diretamente a partir da amostra

Tratamento:
Doxiciclina (Tetraciclina)
Eritromicina ou outros macrólidos (apesar de estar a haver uma resistência emergente a estes)
Quinolonas (estão, neste momento, a ter uma revisão da usa utilização, por estarmos mais
conscientes dos efeitos da sua utilização)

B. Ureaplasma urealyticum
o Causa Uretrite não gonocócica
o São parte da microbiota normal do organismo
o Potencialmente resistentes à tetraciclina

C. Metamycoplasma hominis e Mycoplasmoides genitalium


o Associados à Doença Inflamatória Pélvica;
o São parte da microbiota normal do organismo (detetá-los não significa que seja
necessário começar antibioterapia);
o Potencialmente resistentes à eritromicina e macrólidos no geral e à tetraciclina.

Micoplasmas e SIDA
Alguns micoplasmas aparentam ser potenciadores da ação do HIV, aumentando a
transmissibilidade, como, por exemplo: (têm sido algo de estudos recentemente)
o Mycoplasmopsis fermentans
o Malacoplasma penetrans
o Mycoplasmoides pirum

Micoplasmas e Clamídeas (resumindo…)


o Causam doenças dos aparelhos respiratório e urogenital;
o Têm diagnóstico microbiológico complicado – muitas vezes tem de ser feito através de
PCR específico;
o Muita virulência em “pacotes” pequenos;
o Tratamento com tetraciclinas ou macrólidos.

Bordetella
Diplococos Gram –
Várias espécies:
o Bordetella pertussis –Tosse Convulsa
o Bordetella parapertussis – Tosse Convulsa numa forma menos agressiva/menos
virulenta que a Bordetella pertussis
o Bordetella bronchiseptica – Doença respiratória em cães, porcos e ocasionalmente no
homem (considerada uma zoonose)
o Bordetella holmesii – Tosse Convulsa
A. Bordetella pertussis
Fatores principais:
o Adesinas: pertactina, hemaglutinina e fímbrias – promovem a adesão destas bactérias
às células do aparelho respiratório humano;
o Toxina traqueal – destrói células ciliadas e está relacionada com o PG (peptidoglicano);
o Toxina pertússica – aumenta secreção de muco (responsável pelos sinais e sintomas da
tosse convulsa);
o Toxina dermo-necrótica – sensível à temperatura / pode ter um papel importante na
patogenicidade da doença apesar da sua função ainda não ser conhecida.

Doença exclusiva do Homem


Doença pediátrica, mas a epidemiologia está a mudar!

Vídeo: Vemos um bebé com tosse convulsa: tosse repetidamente e começa a não conseguir
tossir e respirar ao mesmo tempo.

Diagnóstico:
• Cultura é difícil – tempo de incubação de
cerca de 7-10 dias; tempo catarral de 1-2
semanas; fase paroxísmica de 2-4 semanas;
convalescença de 3-4 semanas (ou mais);
• PCR (positivo a partir da fase catarral);
• ELISA – teste para detetar anticorpos
contra a toxina pertússica, hemaglutinina,
pertactina e fímbrias.
Normalmente os doentes só procuram cuidados saúde quando já estão na fase paroxísmica em
que já podemos ter culturas negativas porque é pouco sensível, sendo feito o diagnóstico por
PCR.

Terapêutica:
• Suporte
• Antimicrobianos – úteis numa fase inicial, mas numa fase tardia, a sintomatologia já não
tem que ver com a presença bactérias mas sim com a presença das toxinas. Macrólidos
são a terapêutica de eleição, sobretudo a Azitromicina e Claritromicina.

Prevenção:
• Vacina
o Formulações acelulares: da toxina, da pertactina e da hemaglutinina (ou seja,
dos 3 antigénios);
o Tríplice (DTP: tétano, difteria e tosse convulsa) – plano nacional vacinação
• Antimicrobianos – também podem ser usados de forma profilática nos contactos mais
próximos do caso índice. Macrólidos: Azitromicina
Estudos:
o Apesar da vacinação (DTP), em 2016 houve um aumento de casos de bebés com tosse
convulsa
o Outro estudo mostra-nos que, antigamente, a mortalidade por tosse convulsa
aumentava com a idade, entre 1-12 meses, enquanto que atualmente a mortalidade
ocorre mais entre os 1-3 meses (maioria da mortalidade ocorre antes da vacinação!)
o Dados Reino Unido, 2012: aumento da incidência da doença, não só nos mais jovens,
mas também nas crianças entre os 10-14 anos ou com mais de 15 anos, incluindo adultos
(o que se fez foi aumentar a vacinação, o que levou a uma diminuição dos casos)
o O número de casos em crianças de mães não vacinadas antes do parto – tem pico em
2012 mas depois mantém-se estável nos anos seguintes; Após vacinação das mães, fez-
se também um estudo do número de casos nestas crianças de mães já vacinadas e o que
se viu foi que este número era mais baixo do que nas crianças de mães não vacinadas
o Estudo da vacinação durante a gravidez:
o Se a vacina for administrada 28 dias antes do parto: número de casos era de 31
em 229
o Se fosse administrada entre 7 a 27 dias antes parto: 4 em 213
o Se fosse administrada entre 0-6 dias antes ou 1-13 dias depois parto: 3 em 179

Sugere que há uma transferência de anticorpos maternos ao recém-nascido


que é ideal se a vacinação for feita entre 7-27 dias antes parto

Houve uma recomendação para vacinação das mulheres grávidas por parte da DGS,
saindo uma orientação, em 2016, para a vacinação até às 32 semanas para evitar os
casos que ocorriam nas crianças antes de poderem ser vacinadas
Data Docente
20/10/21 Prof. Doutor Thomas Hänscheid

Robert Koch: Descreve, em 1882, o agente da tuberculose.

Postulados de Koch

Para saber que uma bactéria é a causa de uma doença, essa bactéria tem de preencher os
postulados:
1. Conseguir isolar o agente da pessoa doente.
2. Deve ser possível cultivar o agente em laboratório.
3. Ao inocular um animal, a doença deve aparecer outra vez.
Com estes 3 passos, prova-se que o agente é a causa da doença.

Tuberculose (TB)

• Doença infeciosa transmitida por inalação de gotículas ou aerossóis.

Diferença entre aerossóis e gotículas: O tamanho. As gotículas são maiores e são


transportadas num raio de 1-2m. Os aerossóis, por serem mais pequenos, são transportados
numa maior distância. Os aerossóis podem começar a evaporar, reduzindo ainda mais o seu
tamanho e peso, continuando a ser transportados num espaço fechado. Neste último caso, a
ventilação de espaços fechados é muito importante para prevenir a infeção por estes agentes.

Mycobacterium

O prefixo mycos refere-se ao fungo, pelo facto de o Mycobacterium parecer crescer na


forma de filamentos, mais associado a fungos, e não tanto na forma de bacilos.

Caracteristicas:
• BAAR: Bacilo Ácido Álcool Resistente.
Coloração pelo método de Ziehl-Neelsen (ZN):
1. Fucsina fenicada (mordente) e calor (permite a entrada do corante na
bactéria).
2. Descoloração com ácido (ácido sulfúrico) e álcool
3. Azul de metileno como corante de contraste.

Coloração com fucsina Método de Ziehl-Neelsen (ZN)

• Parede com natureza lipídica, com ácido micólico, que não cora pelo método de Gram.
Quando utilizado o método de Gram, ao microscópio o background aparece corado mas
as bactérias aparecem transparentes. Quando expomos a preparação de
Mycobacterium a ácido sulfúrico, o Mycobacterium retém a coloração, o que não
acontece com outras bactérias. Daí dizer-se ácido-resistente.
• Aeróbicas
• Crescimento lento – semanas!

Tempo de geração: tempo que uma bactéria precisa para se replicar 1 vez.

Exemplo para comparação:


Tempo de geração da E. coli: aprox. 20 min (em 24h multiplica-se aprox. 72 vezes).
Tempo de geração do Mycobacterium: 18h (necessário aproximadamente 54 dias para
se obter uma colónia igual à de E. coli em cultura em 24h).
M. tuberculosis - cultura

2 4 6 8
semanas semanas semanas semanas
Cultura pode demorar até 6-8 semanas!!

As amostras de expetoração podem estar contaminadas com bactérias da boca, com


tempo de geração muito menor, que invadem a placa de cultura.

Caso clínico:
3 pessoas (mulher de 25 anos, homem de 55 anos, criança de 5 anos) entram hoje na
Urgência com tosse, febre,…

Como fazemos o diagnóstico?


Em caso de suspeita de tuberculose, colhe-se amostra de expetoração.

2º Cultura
1º Microscopia
Meio de Löwenstein-Jensen ou
Método de Ziehl-Neelsen (ZN)
Middlebrook

Cultura pode demorar até 6-8 semanas


Criança
Só deteta 50-70% dos casos
Mulher e homem
Havendo poucas bactérias na expetoração, como vamos usar apenas uma gota de
expetoração na lâmina para observação, eventualmente podemos não encontrar estas bactérias
à microscopia, produzindo um falso negativo.
O número de bactérias na expetoração é diferente em função de certas condições: um
adulto terá uma tuberculose mais localizada (semelhante a um abcesso cheio de bactérias),
tendo, deste modo, mais bactérias na expetoração (muito provável que a microscopia seja
positiva). No caso de uma criança ou de um doente com HIV com tuberculose, a tuberculose é
mais disseminada. O pulmão não tem uma grande lesão, mas sim várias lesões, pelo que a
expetoração terá frequentemente menos micobactérias, sendo que a microscopia pode ser
negativa.
O PCR não é usado por rotina no diagnóstico de tuberculose por ser muito caro.

Mycobacteriaceae – uma classificação “simples”

➔ Mycobacterium tuberculosis complex


• M. tuberculosis
• M. bovis
• M. africanum
• outros

➔ Micobactérias “atípicas” ou MOTT (Mycobacterium other than tuberculosis)


• Mycobacterium avium-intracelulare complex (MAC)

➔ Mycobacterium leprae (M. lepromatosis)

Partes do corpo que podem ser afetadas por Mycobacterium:

Septic arthritis Skin infections


osteomyelitis Lepra

Tuberculose

Meningitis, Urinary tract


encephalitis infection

Endocarditis Sexually transmitted diseases


Myocarditis
Pericarditis
Letalidade associado a COVID-19: 2-3%
Letalidade associada a tuberculose: 10-11%

Mycobacterium tuberculosis

É o mais importante, porque a doença é grave e leva à morte se não for tratada.
A doença é difícil de diagnosticar.

Transmissão
• Por via inalatória;
• Tossir uma vez ou falar 5 minutos produz >3000 partículas infeciosas, espirrar produz
ainda mais partículas;

Doença
• Suor
• Palidez
• Fraqueza
• Hemoptise

TB pulmonar TB ganglionar TB óssea - “mal de Pott” Meningite


(miliar – derrame)

Diagnóstico

Amostra:
Expetoração (pús, urina, biópsia, sangue)

Microscopia: Cultura
Ziehl-Neelsen Meio de Löwenstein-
Auramina Jensen ou Middlebrook

M. bovis

Transmissão
• Infeta gado bovino.
• Transmissão por contacto direto: ordenhar (mãos).
• Transmissão por consumo de leite - é evitada pela pasteurização do leite.

A infeção a partir do consumo de leite pode ocorrer através do estômago ou consequente


do próprio ato de beber leite, pelo facto de algumas bactérias serem inaladas e chegarem ao
pulmão. No pulmão, a doença é igual a uma tuberculose.

Nota: a bactéria da vacina BCG (bacilo Calmette-Guèrin) é M. bovis atenuada por múltiplas
passagens (sete anos).

Micobactérias “atípicas” ou MOTT

Dizem-se “atípicas” porque embora sejam muito resistentes, devido à sua parede
semelhante à da Mycobacterium tuberculosis, não têm quase patogenicidade nenhuma.
Aparecem na água e no solo. Existem praticamente em todo o lado, mas devido à baixa
patogenicidade, não têm importância.
As MAC quando encontram um hospedeiro com sistema imunitário muito enfraquecido
causam doença. A infeção é reconhecida nos doentes com HIV, quando estes doentes quase já
não possuem células CD4.

Mycobacterium leprae

Não é infeciosa como a infeção por Mycobacterium tuberculosis.


Afeta a pele e os nervos periféricos, levando a perda de sensibilidade.
A Europa quase não regista infeções. A maioria dos casos de infeção ocorre no Brasil e
na Índia.

Transmissão
• Ainda não se sabe bem como se transmite.
• Não é por contacto direto.
• Possível transmissão através do espirro (grande número de bactérias na mucosa nasal).

A lepra não é uma doença muito infeciosa (mesmo com as lesões características na
pele).

Doença
Lepra tuberculoide: lesões da pele e does nervos, que leva a perda de sensibilidade.
Lepra lepromatosa: lesões da pele.
As lesões constantes podem levar à perda das mãos e dos pés.
É uma doença desfigurante, crónica.
Não reduz a idade da pessoa.

Diagnóstico
Mycobacterium leprae não cresce em cultura (in vitro), apenas por inoculação no
armadillo. Isto tem repercussões no seu diagnóstico e torna difícil o desenvolvimento de uma
vacina.
A lepra só é diagnosticada por microscopia (PCR existe mas não funciona muito bem).
A amostra é colhida por raspagem de lesões cutâneas ou da mucosa nasal.
Realizando um exame com método de ZN da amostra colhida de um doente com este
tipo de lesões cutâneas, faz-se o diagnóstico de lepra se detetarmos BAAR.
Em suma:

Organismo Transmissão Reservatório


Por via inalatória
M. tuberculosis Homem
(contacto direto – raro)
Animais domésticos
M. bovis Contacto direto, leite
(especialmente gado bovino)
Homem
M. leprae ?
(armadilho, esquilo?)
Ubíquo: terra, água,
Micobactérias atípicas Ingestão, contacto direto
alimento, pó, animais

Eventualmente, uma alternativa de diagnóstico poderá ser PCR ou realtime PCR (“GeneXpert”)
• Deteta M. tuberculosis.
• Deteta resistência a RIF.
• Turn-around-time: 2 horas.
• Recomendada pela OMS.
Data Docente
25/10/21 Prof. Doutor Thomas Hänscheid

Hoje vamos falar de 3 bactérias, que apesar de terem pouco em comum a nível de
patologia, antigamente eram considerados praticamente irmãs e da mesma família
(particularmente o Helicobacter e o Campylobacter).
São todos Gram negativos mas coram bastante mal, ou seja não absorvem muito bem a
coloração de gram.

Vibrio

V. cholerea é a primeira bactéria da qual vamos falar. Podemos ver pela capa deste jornal de
1912, que dentro dos Vibrios a mais relevante é a do V. cholerea, sendo dos responsáveis para
uma das grandes doenças mais temidas e para a qual existiu uma quarentena. A quarentena que
existe atualmente para o Covid não foi logicamente inventada para esta situação, mas sim para
a Peste Negra, e foi utilizada no passado durante as últimas décadas para aproximadamente 10
doenças.
Uma das doenças para a qual se utilizava a quarentena era causada pelo V. cholerea, responsável
por uma diarreia gravíssima que pode matar dentro de 1 a 2 dias, no máximo, e que se propaga
de uma forma quase explosiva em certas situações.

Antes de falar de V. cholerea, é importante mencionar que há mais do que uma espécie. V.
cholerea causa diarreia, pelo que
podemos assumir que os outros do
mesmo grupo também podem causar
gastroenterite. é relevante informar que
estas bactérias também podem causar
infecções dos tecidos moles,
principalmente infecções associadas a
feridas. Neste caso das feridas, o
contexto é um pouco diferente já que os
Vibrios têm uma característica muito relevante para perceber a importância do mesmo, que ao
facto de elas conseguirem tolerar concentrações de sal muito elevadas. A importância desta
informação para o V. cholerea é óbvia, uma vez que é um agente que causa diarreia, sendo que
a própria diarreia cheia de bactérias vai contaminar a água doce e também salgada na qual as
bactérias conseguem sobreviver.

Qual seria o contexto do V. vulnificus numa ferida? Como pode este causar a infecção?

Caso Clínico do New England Journal of Medicine: caso de um cirurgião que, durante a atividade
da pesca, ao realizar a limpeza dos peixes se cortou com uma faca no dedo, ainda numa fase em
contato com a água salgada. Portanto, tinha as mãos na água salgada que por sua vez estava
contaminada pelo Vibrio, neste caso V. vulnificus, e causou infecção do dedo. A importância
desta infecção é tamanha que este cirurgião teve de ser operado para limpeza de todos os
tecidos moles, retirando o pus e todos os vestígios da bactéria, e ainda amputação do dedo
cortado. Este procedimento deveu-se ao facto desta infecção ser gravíssima, uma vez que
poderia ter progredido para uma bacteriémia ou sépsis colocando a vida dele em risco.
Portanto é importante manter em mente que, sempre que o termo Vibrio aparece não devemos
pensar apenas no V. cholerea, apesar de este ser de longe o mais importante do que o V.
vulnificus. Portanto, as infecções de tecidos moles não são apenas causadas pelos Streptococcus
pyogenes e Staphylococcus aureus, sendo este um bom exemplo de um outro agente que causa
graves infecções dos tecidos moles.

Vibrio cholerea

Não há um único V. cholerea, no fundo a história das variantes da qual agora estamos muito
conscientes por causa da Covid aplica-se a muitos outros microorganismos, neste caso na
nomenclatura de serotipo e também de biótipo.

Os diferentes V. cholerea que existem estão associados a diferentes surtos: pandemias e


epidemias. A grande importância desta informação reside no facto de que quando queremos
desenvolver uma vacina, e tendo bactérias que são diferentes, é óbvio que muito provavelmente
os antigénios que estão na superfície, que servem para desenvolver a vacina, não serão
exatamente iguais.

No passado não havia uma rede de água como atualmente pelo que as pessoas iam buscar água
a uma bomba pública. Em Soho, uma parte de Londres, houve um grande surto de cólera, mas
naquela altura ninguém sabia que as bactérias eram causa de doença. Acreditava-se que
houvesse outras origens para a cólera, no entanto John Snow, era cético quanto a estas crenças
então mapeou os casos da área, percebendo que a maioria dos casos de cólera se concentravam
em volta da bomba pública. apesar de não saber ao certo a causa do problema afirmou que
provavelmente era a bomba pública conseguindo convencer as autoridades a desativarem essa
bomba pública. Por causa desta intervenção o surto de cólera passou, representando a ligação
entre epidemiologia e saúde pública.

Assim, já falámos da transmissão e de onde vem a bactéria ou seja, o seu reservatório. a bactéria
sobrevive bem até em água salgada, o que não significa que prefira se viver ali apenas que tem
a capacidade de contaminar todas as fontes de água.
Surtos:
• Yemen: surto atual
• Haiti: houve um grande terramoto que destruiu todas as infraestruturas e claro as fezes
contaminaram a água que estava disponível para beber. nestes cenários há sempre um
grande risco de haver surtos de doenças como a cólera.
• Angola: há 5 ou 6 anos houve recomendações da DGS que indicavam que era necessário
ter cuidado ao viajar para Angola.

Vídeo “The Story of Cholera”

Aqui podemos ver a Transmissão fecal-oral:


• contaminação de água potável
• moscas
• mãos não lavadas - contaminação cruzada com objetos e mãos

VIBRIO SPP.
• Bacilos Gram negativos: coram mal
• Morfologia: bastonetes com uma ligeira curva “Kommabacillus” – “vírgula”
• Não esporulados
• Fermentam
• Habitat: água (água salgada)
o No nosso sangue a percentagem de sal é de 0,9%. Este é o valor presente no
soro fisiológico (isotónico)
o No manitol salgado concentração sobe para 7% ou 9%.
o Água do mar: é mau beber água do mar porque retira água do nosso corpo, por
que tem entre 2-3% de concentração de sal.
o Na Costa Oeste da América Latina: Cozinha-se ceviche - estes mariscos não são
cozinhados, mas sim cozidos com ácido de limão, não sendo cozidos com calor.
se o marisco estiver contaminado com vídeo que está na água salgada, vai
entrar no marisco que, ao não ser cozinhado, vai ser uma grande fonte de
infecção. Assim o governo incentiva a que o marisco seja cozido previamente
para evitar estes surtos.

Cólera
Usualmente existem surtos ou epidemias locais de cólera activas, no entanto esta já causou
pandemias bastante graves, que eram bastante temidas na altura (a higiene e tratamento de
água eram bastante precárias) causando 2000000 de mortes. Sempre que houve surtos era em
áreas densamente populadas, com muitas pessoas envolvidas, pelo que os resultados eram mais
catastróficos.
Porque é que esta doença é tão grave? Porque esta doença provoca uma diarreia séria. Se
lembrarem da aula das enterobactericea, há 2 extremos de diarreia com protótipos de bactéria
para ambos:
• Diarreia Aquosa - Vibrio
• Diarreia com invasão de tecido (inflamação, febre, sangue) – Shigella

A vibrio cholera não causa invasão, mas produz uma toxina que faz com que o nosso corpo, a
nossa musoca, vai expelir imensa água para o intestino. Esta água sai como diarreia, “Rice water
stoll”, esbranquiçada, ligeiramente acastanhada. Dada a quantidade de água que sai, não existe
moldagem ou castanho típico. Esta quantidade pode chegar a 10 litros de água por dia, sendo
que se existirem essas perdas, pode-se morrer em 24h. O primeiro tratamento que vem à cabeça
é rehidratação, mas nenhuma pessoa consegue chegar a beber 10 litros de água, sendo que se
torna necessário realizar hidratação EV. Em países como Yémen, Angola ou países afetados por
catástrofes naturais, pode ser bastante problemático conseguir realizar estes tratamentos. Este
tipo de tratamento não existia no passado.
Imaginemos que se perdem 2, 3, 5 litros de água. Para além da água, perdem-se também
eletrólitos, sendo o mais relevante o potássio, sendo também a sua perda mais mortífera. É
também um desafio o correcto doseamento da infusão de eletrólitos. Um pequeno desvio do
normal, é relativamente bem controlado pelo corpo humano. No entanto, a administração
excessiva de Potássio provoca uma hipercalemia. Uma das formas de execução de pena de
morte nos EUA é um “cocktail” administrado de forma endovenosa: dentro desse cocktail, existe
um barbitúrico, usado para anestesiar a pessoa, o curare, que vai paralisar os músculos, e
finalmente o potássio, servindo este para causar uma paragem cardíaca. O excesso de Potássio
causa arritmias, levando à paragem cardíaca com valores acima de 6 ou 7. Isto levanta
problemas na rehidratação dos doentes também.

Qual é então a patogénese?


A vibrio é um protótipo não só para uma diarreia aquosa, mas também para o efeito de toxinas.
Qual é a consequência das toxinas? Se pensarem no processo:
• A bactéria é ingerida
• Multiplica-se
• Produz toxina que se liga às células do intestino
• Toxina provoca a libertação de água e eletrólitos da mucosa intestinal através da ligação
às células.
Neste caso, os antibióticos vão ter uma utilidade limitada. A diarreia é provocada pela
toxina, e se já existir uma grande quantidade de toxina no intestino, mesmo se se matarem todas
as bactérias, a toxina vai manter o seu efeito. Assim, uma hipótese de tratamento seria um
anticorpo que eliminará o efeito da toxina, no momento ainda em investigação. Carvão não tem
o melhor efeito para tal.

Diagnóstico:
• Doente com diarreia aquosa gravosa, desde 2 Litros/dia até 15 litros dia. Nem todas as
diarreias aquosas têm um diagnóstico clínico, portanto há meios para averiguar as
causas, para se saber qual é o agente.
o Microscopia óptica: Exame directo com coloração Gram das fezes não é útil,
dada a presença de inúmeras bactérias, sendo um factor de confusão. Ao avaliar
as fezes, encontra-se a flora intestinal, E. Coli, entre outras. Se tivermos uma
salmonela, ou uma shigella, não vale a pena fazer gram, porque só se vai
encontrar gram negativos. No caso de cólera, a quantidade de água que é
expelida vai ajudar a eliminar do intestino a flora normal, sendo que o que fica
na “rice water” é basicamente só bactérias Vibrio cholera. São bactérias gram
negativas e têm uma forma de vírgula, portanto, vale a pena realizar um teste
directo, sendo que na presença de múltiplos achados com estas características
faz basicamente o diagnóstico.
o Teste Rápido: também conta que a toxina é uma proteína, claro que podemos
desenhar um teste rápido para a detecção desta proteína, à semelhança do que
se faz para a Covid.
o Cultura: em meio específico TCBS (Thiosulfate Citrate Bile salts Sucrose)

Tratamento:
• Rehidratação!!!!!
o H2O e eletrólitos por via oral/endovenosa: existe uma solução à venda na
farmácia. Em países pobres, nos quais não seja possível comprá-la, há fórmulas
caseiras que incluem sal, açúcar e algum sumo rico em potássio.
• Antibióticos (secundariamente)
o diminuição da duração da diarreia
o diminuição do número de bactérias eliminadas (controlo da epidemia)
o Tetraciclina ou cotrimoxazol (resistência!), ciprofloxacina

Vacina:
Existe uma vacina para proteção contra a cólera, no entanto o grande problema da vacina é que
apenas tem uma proteção muito reduzida. Utiliza-se quando há surtos para diminuir o impacto
no local do mesmo.

Campylobacter spp.
É um grupo de bactérias que causa diarreia, sendo os mais relevantes Campylobacter jejuni e
Campylobacter coli. Tenho 2 grupos de bactérias:
• Campylobacter fetus: causa abortos em animais domesticados (vacas) normalmente,
mas pode causar em pessoas. É grave, mas raro;
• Campylobacter jejuni e coli: causa diarreias , semelhante à Samonella Typhi
Caracteriza-se por Bacilos Gram negativos, não esporulados, móteis com um flagelo terminal,
com morfologia em forma de “vírgula“/”gaivota”, que crescem em microaerofilia. Esta
característica identifica-sa numa coprocultura (cultura de fezes para diagnóstico) incubando
esta bactéria num meio particular:
o Meio selectivo: cefoperazona, vancomicina, cicloheximida;
o Temperatura específica: a 42ºC; Inibem o crescimento de outras bactérias da
flora intestinal permitindo a proliferação do agente.
o Atmosfera diferente: durante 48-72 horas em atmosfera de 5-6% O2 e 10%5
CO2 (em jarra) – muito menos oxigénio!

Este diagnóstico é sempre muito tardio, pois demora cerca de 3-4 dias, sendo que nem todos os
laboratórios têm a capacidade de o realizar. Assim, o Campylobacter é muito subdiagnosticado,
e, portanto, muito mais frequente do que esperamos.
Pensa-se que tenha havido um shift nos agentes mais causadores de diarreia: apesar de se
verificar que a Salmonella não typhi foi o agente mais causador de diarreia bacteriana no
passado, no entanto hoje em dia o Campylobacter é bastante mais frequente.

Reservatório e via de transmissão:


O Campylobacter tem como reservatório os animais de criação (frango, galinha e até mesmo
outros animais utilizados para produção de leite e carne) A forma industrial de produção em
massa causa uma forte transmissão entre os animais que ficam contaminados e nos contaminam
quando ingerimos produtos desta natureza: carne mal cozinhada, leite não pasteurizado ou
produtos derivados.

A diarreia em si não é muito grave, sendo mais semelhante com a causada por Disenteria,
podendo passar rapidamente. A característica chave que deve ser sempre associada ao
Campylobacter é que este tem uma sequela (complicação) que, muitas vezes, só aparece 3
semanas mais tarde: Síndrome de Guillain Barré (SGB).

O síndrome de Guillain Barré é uma reação do nosso sistema imune que pode acontecer depois
de várias doenças (não apenas após Campylobacter), sendo a incidência após Campylobacter
1:1000 casos. Apesar de parecer um número reduzido, 1000 casos de diarreia são poucos por
ano, independentemente do país. Este síndrome elimina o isolamento de bainha de mielina dos
nervos, impossibilitando o seu funcionamento correcto e resultando numa paralisia muscular. A
paralisia é grave, especialmente se ocorrer no diafragma.
A recuperação deste síndrome é possível, na maioria dos casos, mas nem sempre é completa.
As medidas aplicadas durante a fase mais grave da doença podem permitir a recuperação dos
músculos respiratórios mas, por exemplo, nem sempre se recupera da paralisia dos membros
inferiores.

Helicobacter spp.
À semelhança das restantes bactérias abordadas nesta aula, também o Helicobacter apresenta
uma morfologia peculiar e é Gram negativo.
Helicobacter pylori é uma bactéria capaz de sobreviver no estômago, onde temos Ácido
Clorídrico quase puro (produzimos aproximadamente 1L por dia), o que complementa a nossa
proteção de infeções por via oral.
O Helicobacter produz um enzima denominado urease, que o permite transformar a ureia
(altamente concentrada no estômago) em amoníaco e bicarbonato. Ambos produtos são bases
fortes, o que neutraliza os ácidos em redor da bactéria, protegendo-a dentro do estômago.
Uma infeção por Helicobacter pode relacionar-se com o desenvolvimento de cancro que se inicia
por uma gastrite crónica induzida por Helicobacter, que evolui para uma gastrite trófica,
metaplasia intestinal, displasia intestinal e, eventualmente, cancro.

Portanto o progresso desde colonização, inflamação local (gastrite) pode levar a esta inflamação
crónica, na qual o tecido está a ser invadido pelo sistema imune, levando a cancro. Um dos
efeitos que podem surgir neste processo é o aparecimento de úlceras!
Esta descoberta veio desmistificar as crenças de que as bactérias não podiam dar origem a
cancro e de que as úlceras eram apenas devidas a stress ou uma excessiva produção de ácido
clorídrico.

Testes para H. pylori:


• Biópsia feita com gastroscopia: A deteção desta bactéria no estômago baseia-se muito
na sua capacidade de produção de urease. Assim, esta amostra é analisada no sentido
de verificar se há uma mudança de cor no meio de teste (alteração do pH do meio)
confirmando a presença de produção de urease e, logicamente, da bactéria.

Gastrite: A bactéria provoca alterações morfológicas no estômago, resultando em úlceras e


cancro.

Reservatório e via de transmissão


Esta bactéria é muito frequente e o seu reservatório é o Humano. A infeção é tão frequente que
dependendo do nível de higiene e idade das pessoas, a maioria delas fica infectada. Qual é a
importância desta informação? Se analisarmos as distribuições epidemiológicas da infeção
verificamos que há uma enorme incidência em pessoas maiores de 60 anos, o que nos leva a
pensar que talvez todas essas pessoas desenvolvam gastrite/úlceras. No entanto isto não se
verifica, uma vez que se descobriu que a bactéria apresenta 2 variantes baseadas no factor de
virulência da bactéria:
• CagA+ : mais grave
• CagA-
Assim, na presença de úlceras deve ser sempre identificado o agente. De facto, o stress e a
produção aumentada de ác. clorídrico originam úlceras na ausência de bactérias, sendo o
tratamento distinto nestes casos.
O tratamento da úlcera com eliminação da bactéria hoje em dia é diferente: actualmente o
tratamento das demais causas subjacentes precede ao tratamento da bactéria, de forma a só
tratarmos os casos que vão realmente ter uma bactéria de factor de virulência associados.

Diagnóstico:
• Gastroscopia – Biópsia e teste de urease
• Teste respiratório – C13 ureia
Data Docente
25/10/2021 Prof. Doutor Mário Ramirez

Existem vários géneros de bactérias anaeróbias, dos quais os mais importantes são Bacteroides,
Prevotella, Fusobacterium, Porphyromonas, Propionibacterium e os clostrídeos (Clostridium e
Clostridioides). Estes não estão geneticamente relacionados entre si, apesar de terem em
comum o facto de apenas crescerem na ausência de oxigénio.

As infeções por anaeróbios são bastante diversas. Entre elas estão:

• Abcessos cerebrais;
• Infeções da boca e placa dentária;
• Infeções pulmonares, nomeadamente pneumonia por aspiração - nestes casos, o
reflexo da deglutição está comprometido e o conteúdo do tubo digestivo (rico em
bactérias anaeróbias) acaba por atingir os pulmões em vez de seguir para o esófago;
• Infeções intra-abdominais;
• Endocardite e bacteriémia;
• Infeções da pele e tecidos moles;
• Infeções do aparelho genital e urinário.
Estes agentes são uma parte importante da microbiota humana1. Por exemplo, na cavidade oral
cerca de 90% das bactérias são anaeróbias, o que parece contraditório visto que é um local com
oxigénio. A sobrevivência das bactérias nestes locais deve-se à formação de biofilmes, dentro
dos quais o ambiente é completamente anaeróbio. O trato digestivo também é largamente
colonizado, apesar de não fazer parte do meio interno e de possuir duas aberturas para o
exterior. Cerca de 99% das bactérias no cólon são anaeróbias.

A pele também é muito


colonizada por bactérias
anaeróbias, embora seja um
órgão exposto à nossa
atmosfera rica em oxigénio.
As bactérias sobrevivem em
ambientes gordurosos ou
através de biofilmes.

Outro exemplo é o aparelho


genital feminino, em que
existem vários anaeróbios
ou bactérias
aerotolerantes.

1
As bactérias realçadas a amarelo foram indicadas na aula como exemplo de microbiota
anaeróbia dos respetivos tecidos.
É a partir destes territórios de colonização que as bactérias anaeróbias causam infeções
oportunistas nos locais anteriormente referidos, ao invadir tecidos aos quais normalmente não
têm acesso ou por menor competição por parte de outras bactérias da microbiota.

Clostridium
O género Clostridium e outros relacionados são talvez os mais importantes em termos de infeção
humana, destacando-se C. perfringens, C. tetani (agente do tétano), C. botulinum (agente do
botulismo) e Clostridioides difficile (agente importante de diarreia nosocomial, antes Clostridium
mas recentemente recolocado no atual género). Todas estas bactérias são bastonetes
anaeróbios obrigatórios produtores de esporos, e têm distribuição ubíqua pelo meio ambiente,
encontrando-se em todo o tipo de habitats.

Clostridium perfringens
Gram positivo responsável por intoxicações alimentares e bacteriémia (embora também possa
ser um agente de contaminação aquando da colheita de sangue para hemocultura). Também é
muito frequentemente isolado em infeções, especialmente da pele e dos tecidos moles –
celulite, miosite supurativa e gangrena gasosa. No entanto, também pode colonizar feridas sem
causar infeção.

Gangrena gasosa

O aspeto típico envolve acumulação em bolhas de CO2 produzido pela bactéria através de
fermentação. Estas bolhas aparecem em radiografia como regiões de menor opacidade.

Era muito comum em ferimentos de guerra até à 1ª Guerra Mundial, devido às feridas que
surgiam nos pés dos soldados e que adquiriam o C. perfringens em contacto com a lama, pois
este agente é ubíquo no solo. É muitas vezes uma infeção polimicrobiana porque todos os
microrganismos do meio podem aceder a tecidos profundos e causar infeção.

Estas infeções surgem quando há isquemia ou hipóxia local devido a um menor aporte de sangue
e menor oxigenação do tecido, favorecendo os agentes anaeróbios. Estão também
frequentemente associadas a perfuração e maceração do tecido (situações com menos O2).

À medida que surge edema e formação de vesículas gasosas vai haver compressão dos vasos, o
que agrava a situação e favorece a proliferação destas bactérias. A infeção por C. perfringens
leva à produção de toxinas que causam manifestações como necrose em locais distantes ao da
infeção.

Celulite » Para além de C. perfringens a celulite pode ser causada por agentes não anaeróbios,
como o Staphylococcus aureus e o Streptococcus pyogenes.
Gastroenterite e intoxicação alimentar

C. perfringens causa também intoxicação alimentar, um tipo de gastroenterite de onset rápido.


A doença pode ter uma complicação gravem as bastante rara, chamada enterite necrotizante.

A toxo-infeção por C. perfringens dá-se através dos esporos, que se encontram no meio
ambiente e germinam nos alimentos. As bactérias resultantes têm no tubo digestivo condições
ideais para a sua proliferação (um ambiente anaeróbio a 37oC), o que leva a uma produção
acentuada de CO2, responsável por parte da sintomatologia de distensão do cólon e flatulência
acentuada. Numa fase final do crescimento há produção de novos esporos e libertação de uma
toxina que provoca diarreia. Esta ajuda na libertação dos esporos, que vão novamente para o
meio ambiente para repetir o ciclo noutros indivíduos.

Fatores de virulência

Produção de toxinas, das quais as principais são:

• α – fosfolipase c citotóxica e necrosante; leva a uma destruição maciça dos leucócitos,


evitando uma resposta imunitária eficaz; provoca hemólise e destruição de plaquetas e
células endoteliais.
• β – toxina necrosante, provoca destruição da mucosa e estase intestinal (paragem dos
movimentos intestinais -> as bactérias aumentam o tempo de permanência no tubo
digestivo e consequentemente a sintomatologia da doença.
• ε (épsilon) – aumenta a permeabilidade vascular intestinal, promovendo a libertação de
fluidos para o lúmen e levando a
diarreia.
A classificação do C. perfringens
dá-se de acordo com a presença
das toxinas, que são detetadas por
PCR. Os tipos mais comuns são o A
(possui apenas toxina alfa) e o B
(possui alfa, beta e épsilon). Ambos
fazem parte da microbiota do solo
e existem no tubo digestivo tanto
de seres humanos como de animais.

Outros fatores de virulência: toxina ι (iota), necrosante e aumenta a permeabilidade vascular; δ,


θ, γ, μ, ν, enterotoxina e neuraminidase.

Diagnóstico etiológico

Um dos aspetos mais importantes do diagnóstico de infeções por anaeróbios é avisar o


laboratório de que existe essa suspeita, pois as amostras têm de ser manipuladas numa
atmosfera sem oxigénio – em particular através de câmara de luvas em anaerobiose ou
pequenas incubadoras (frascos, tubos etc).
A coloração de Gram é importante, mas as reações de identificação bioquímica e o TSA são feitos
de forma diferente em relação aos aeróbios. A própria colheita e transporte da amostra é muito
diferente – por exemplo, para hemocultura tem de ser utilizada uma garrafa própria, onde o
sangue deve ser introduzido imediatamente após a colheita. Existem outros recipientes próprios
para colheita e transporte de amostras em que há suspeita de agentes anaeróbios. Quando não
temos a certeza se a infeção por estes agentes é uma possibilidade, colhemos duas amostras
sempre que possível, uma para processamento em aerobiose e outra para condições de
anaerobiose.

Tratamento

O tratamento das infeções por C. perfringens, nomeadamente as da pele e tecidos moles, é feito
em parte através de desbridamento cirúrgico. A eliminação do tecido necrosado é essencial para
permitir não só eliminar algumas bactérias mas também uma melhor irrigação do tecido
saudável, e portanto melhor penetração dos antibióticos a administrar. Estes incluem penicilina
(muito eficaz) e cloranfenicol (partilha com a clindamicina a capacidade de inibir a síntese
proteica e como tal a produção de toxinas).

Clostridium tetani
É responsável pelo tétano, uma doença com sinais típicos, em especial uma parálise rígida
devido à contração de toda a musculatura do corpo - os dedos das mãos ficam em forma de
garra e os dos pés em posição perpendicular à planta do pé. Nos tempos modernos esta
manifestação grave já não é tão frequente, mas verifica-se um esgar ou riso sardónico (trismo)
característico.

A entrada da bactéria dá-se na maioria dos casos através de uma ferida, mas as manifestações
clínicas não se devem à sua proliferação, mas sim à disseminação de uma toxina chamada
tetanospasmina. Esta pode culminar em paragem cardiorrespiratória por ação nos músculos
associados ao coração e aos pulmões. A transmissão nunca ocorre de pessoa para pessoa, sendo
o agente sempre adquirido do meio ambiente.

Uma amostra colhida da ferida corada com Gram mostrará bactérias Gram-positivas
esporuladas, com um esporo em posição terminal que dá a este agente uma forma de baqueta
de tambor, raquete ou fósforo.

Fatores de virulência

A produção de toxinas é essencial para os sinais típicos da doença, destacando-se duas:

• Tetanolisina – hemolisina sem aparente importância na infeção e patologia do tétano;


• Tetanospasmina – proteína dimérica (tal como as outras toxinas deste género de
bactérias) responsável pela sintomatologia. Leva à inibição da libertação de GABA nos
neurónios que transmitem os impulsos nervosos de contração do músculo. O GABA é
um neurotransmissor inibitório cuja falta leva a uma estimulação constante da
musculatura.

Diagnóstico » Não se faz por cultura porque é muito raro conseguirmos observar o Clostridium
tetani em caso de patologia. É essencialmente clínico.

Tratamento e vacinação

Implica desbridamento total da ferida para eliminar a maior quantidade possível de bactérias
produtoras de toxina que lá possam estar. De seguida administra-se metronidazole, um
antibiótico que tem atividade específica contra bactérias anaeróbias (e também alguns
parasitas). Os cuidados de suporte, nomeadamente a ventilação, são também muito
importantes para a sobrevivência dos doentes.

Podemos também administrar como tratamento imunoglobulina humana anti-tetanospasmina,


sobretudo em caso de doentes HIV ou outros imunossuprimidos que não possam responder à
vacinação. A vacinação em casos suspeitos de tétano é recomendada porque se trata de uma
vacina de toxóide, logo estimula a produção de anticorpos contra a toxina, o que ajuda a
controlar a doença.

A vacinação com o toxoide é terapêutica, mas também preventiva. A primeira toma é aos 10
anos e é reforçada 15 anos depois (aos 25). A partir daí o reforço é de 20 em 20 até se chegar
aos 65 anos, quando a ser de 10 em 10. Antes das mudanças no esquema de vacinação, era
sempre de 10 em 10 anos.

Clostridium botulinum
Esta espécie consiste num grupo muito diverso de bactérias geneticamente não relacionadas
entre si, mas todas causadoras de botulismo. Distinguem-se pela produção de uma toxina
chamada botulina, da qual existem 7 tipos diferentes (A-G; A, B e E são as mais importantes). A
botulina é o veneno mais poderoso conhecido – bastam 10 pictogramas para matar um ser
humano.

Estas toxinas são proteínas diméricas que impedem a fusão das vesículas que contém os
neurotransmissores excitatórios com a membrana do neurónio -> não há excitação do músculo,
logo deixa de haver contração. Ou seja, tem efeito contrário à tetanospasmina de Clostridium
tetani, que impede a reabsorção destes neurotransmissores. Portanto, ao contrário do tétano,
o botulismo é uma doença que se caracteriza por parálise flácida.
A entrada pode ser através de uma ferida, mas é muito mais frequente por ingestão e absorção
da toxina ao nível do tubo digestivo. Este agente é ubíquo no solo, onde existem esporos que
germinam, muitas vezes associados a alimentos. A bactéria prolifera nestas condições e produz
a toxina, cuja ingestão e absorção causa botulismo.

C. botulinum é então um agente de intoxicação alimentar em que a botulina contamina os


alimentos, muitas vezes enlatados. Quando vemos deformações na lata ou ouvimos gás a sair
mediante a abertura é sinal de fermentação com produção de CO2, o que pode indicar presença
desta bactéria. A toxina é eliminada pela fervura, mas assim que os alimentos arrefecem pode
haver germinação dos esporos, que são resistentes.

Os sinais típicos de botulismo incluem parálise flácida da musculatura e dilatação das pupilas,
que também não reagem a estímulos luminosos. Isto deve-se à inibição da libertação da
acetilcolina pelo mecanismo explicado anteriormente. Apesar de esta doença ser relativamente
rara em Portugal, existem por vezes surtos – o último episódio importante ocorreu em setembro
de 2015 com 5 casos confirmados, através do consumo de alheiras.

Botulismo infantil

C. botulinum nos adultos causa sobretudo uma toxémia, em que há ingestão de botulina já
existente nos alimentos e a sintomatologia acontece por absorção no tubo digestivo, mas existe
também botulismo infantil.

Esta patologia acontece quando temos germinação dos esporos no tubo digestivo, com as
bactérias a crescer e produzir toxina in situ. Está muitas vezes associado à ingestão de mel, pó
ou terra contaminados. Afeta crianças muito pequenas (maioria 2 semanas – 6 meses) porque
estas têm um microbioma que ainda não está estabilizado, ou seja, ainda não há bactérias para
competir e impedir a germinação do C. botulinum. A microbiota dos adultos já é completamente
organizada e vai geralmente impedir a germinação dos esporos. Estima-se que seja responsável
por 4-15% das síndromes de morte súbita nesta idade.

O diagnóstico pode ser feito por coprocultura tanto em crianças (por pesquisa da bactéria, visto
que está no tubo digestivo) como em adultos (por deteção de toxina), embora nos adultos seja
geralmente suficiente a apresentação clínica do doente.

O tratamento passa pela lavagem gástrica e/ou enema (clister) para eliminar as bactérias do
tubo digestivo; segue-se a administração de imunoglobulina anti-botulina (A, B, E) de cavalo, o
que pode levar a choque anafilático, uma vez que a imunoglobulina é heteróloga. Uma vez que
a paragem cardiorrespiratória é a complicação mais perigosa, os cuidados de suporte são
essenciais, especialmente ventilação. A antibioterapia não está indicada porque perturba ainda
mais a microbiota do tubo digestivo.

A toxina botulínica pode ser usada como um agente terapêutico para distonias e estrabismo,
mas também em intervenções cosméticas (botox) visto que impede a formação de rugas.
Contudo, os efeitos não são permanentes, o que requer aplicações múltiplas.
Clostridioides difficile
Membro da microbiota intestinal em cerca de <3% dos adultos mas presente em 20-40% dos
doentes hospitalizados sob antibioterapia. É um microrganismo intrinsecamente resistente aos
antibióticos mas também produz esporos, o que lhe permite permanecer no tubo digestivo
mesmo com a ação de antimicrobianos a que pudesse ser suscetível.

É responsável por diarreia de intensidade variável que pode evoluir para um quadro de colite
pseudomembranosa. Este caracteriza-se por um cólon completamente coberto de muco e
fibrina (e leucócitos), em que o lúmen praticamente desaparece. Este quadro é observável por
colonoscopia e impede a reabsorção de água no cólon, o que origina diarreia e eventualmente
obstrução, com possíveis complicações graves.

É o agente mais frequente de diarreia nosocomial (associada a permanência num hospital) e


também em lares de idosos. Há uma associação muito forte com o consumo de antibióticos,
nomeadamente ampicilina, cefalosporinas, clindamicina e amoxicilina.

Fatores de virulência

A patogénese deve-se sobretudo à produção de toxinas:

• A – Enterotoxina, faz parte da própria bactéria e é libertada aquando da sua destruição.


Leva à acumulação de fluidos no lúmen.
• B – Tem atividade citotóxica por despolimerização da actina, causando um aumento da
permeabilidade do epitélio do tubo digestivo.
• Toxina binária – funciona como marcador epidemiológico de uma das estripes mais
importantes para infeções hospitalares mas parece não ter papel relevante na infeção.
Outros fatores de patogénese incluem adesinas, que promovem a adesão da bactéria às células
do cólon, hialuronidases que degradam o ácido hialurónico (componente da matriz da lâmina
própria), e a produção de esporos, que permite à bactéria a permanência no tubo digestivo e no
meio hospitalar.

Diagnóstico

O diagnóstico faz-se através de deteção das bactérias nas fezes por coprocultura, mas é
necessário provar que existe atividade citotóxica (avaliada em células em cultura). Em
alternativa, temos deteção imunológica da enterotoxina e da citotoxina, ou deteção molecular
por PCR. Poderá fazer-se uma colonoscopia para observação em casos de suspeita de colite
pseudomembranosa. Existem algoritmos de diagnóstico bastante complexos pelo facto de
podermos ter um estado de portador sem doença ativa.
Tratamento

Como em qualquer diarreia é essencial manter o equilíbrio de fluidos. Para além disso, o
tratamento passa por descontinuar o antibiótico durante 1-14 dias e administrar metronidazole
ou vancomicina oral (uma vez que não é absorvida, atua no tubo digestivo). Como alternativa
podemos usar fidoxamicina, um antibiótico mais recente, de espetro mais reduzido, que
perturba menos a microbiota. A teicoplamina é controversa, mas a tigeciclina pode ser
considerada em terapia de combinação.

Também se pode fazer por transplante fecal de fezes de um indivíduo saudável para reconstituir
a microbiota saudável, que irá conseguir controlar o C. difficile. Isto levanta alguns problemas,
como “Que dador? Qual a segurança?”, no entanto este método já é usado em vários países
com elevada taxa de sucesso. A administração é feita por uma sonda nasal que liberta as fezes
no intestino, através de um enema, ou simplesmente misturado com chocolate e ingerido por
via oral.

Em caso de recorrência e como medida preventiva podemos usar:

• Rifaximina - fármaco baseado na rifamicina que não é absorvido e se administra por via
oral.
• Probióticos - pouco estudado.
• Medicamentos baseados na microbiota humana - cada vez mais usados.
• Anticorpos monoclonais anti-toxinas A (Actoxumab) e B (Bezlotoxumab) - têm sido
muito usados em casos mais difíceis de controlar.
• Existem vacinas em fase de desenvolvimento (algumas já na fase III).

Clostridium septicum » Associado ao cancro do cólon, leucemia e diabetes. A infeção tem


um mau prognóstico. Detetável em hemoculturas.

Clostridium sordellii » Síndrome do choque tóxico subsequente a abortos induzidos.

Clostridium tertium » Associado a infeções da pele e tecidos moles sobretudo subsequentes


a traumatismos.
Lactobacillus
Género de agentes poucos virulentos que causam:

• Bacteriémia transitória, nomeadamente associada ao parto;


• Bacteriémia oportunista, sobretudo em imunocomprometidos;
• Endocardite (Lactobacillus casei) - caso reportado no HSM num doente com lesão
valvular derivada de febre reumática e com alimentação rica em iogurtes. Tratado com
uma prótese valvular e penicilina + aminoglicosídeo.

Actinomyces
Fazem parte da microbiota da cavidade oral e do tubo digestivo. Podem causar lesões
supurativas crónicas – foi mostrado na aula um caso no qual se retirou uma amostra de pus e
observou ao microscópio Actinomyces israelii. O tratamento é penicilina, à qual este género é
universalmente suscetível.

Outros anaeróbios Gram positivos


Peptococcus e Peptostreptococcus » microbiota da boca, do aparelho respiratório superior e
aparelho genito-urinário.

Eubacterium, Bifidobacterium e Arcanobacterium » microaerófilos. Na aula, este grupo foi


associado com Streptococcus anginosus, S. constellatus e S. intermedius – todos eles agentes de
infeção, por exemplo de
pneumonia complicada em
adultos e de endocardite.

Cutibacterium acnes (antigamente Propionebacterium acnes) – agente da acne vulgar,


resistente às tetraciclinas, eritromicina e clindamicina; forma biofilmes.

Outros anaeróbios Gram negativos


Prevotella

Veillonella

Fusobacterium

• Fusobacterium necrophorum
Síndrome de Lemiérre é uma manifestação interessante mas bastante rara. »
Bacteroides

• Bacteroides fragilis
Talvez o mais frequente dos anaeróbios, apresenta resistência aos antimicrobianos e
vários fatores de virulência – cápsula, fímbrias, hialuronidase e DNAse. Quando produz
beta-lactamases estas podem proteger outras bactérias da ação dos beta-lactâmicos.
Porphyromonas

• Porphyromonas gingivalis
Agente de periodontite – infeção do periodonto, região onde a gengiva encontra os
dentes. Importante em infeções orais – devemos sempre considerar os anaeróbios.
Campylobacter – abordado no contexto das gastroenterites.
Terapêutica

Geralmente metronidazole (antibiótico exclusivo para anaeróbios), mas também podem ser
usados carbapenemes, tigeciclina ou beta-lactâmicos com inibidor de beta-lactamases (por
exemplo piperacilina+tazobactam).

Em suma,
Os anaeróbios são uma parte importante da microbiota das mucosas, nomeadamente pele,
cavidade oral e trato digestivo, aparelho genito-urinário.

A infeção por anaeróbios tem muitas vezes a ver com a invasão de tecidos danificados por
traumatismos, em que temos um baixo potencial redox, ou seja, baixo aporte de oxigénio que
permite o crescimento das bactérias.

A maioria das infeções são polimicrobianas – um caso paradigmático é a peritonite por


perfuração do tubo digestivo, em que os anaeróbios que existem em grande abundância na
microbiota invadem o peritoneu. Temos sempre que considerar o potencial de diversidade
microbiana destas infeções quando escolhemos a terapêutica.

As infeções são frequentemente abcessos (infeções coletadas), gangrena, celulite, peritonite,


infeções de mordeduras (a boca dos animais é também rica em anaeróbios), doença inflamatória
pélvica (também pode estar associada a uma proliferação anormal de anaeróbios na
microbiota), pneumonia por aspiração e bacteriémia.

A terapêutica faz-se por drenagem e desbridamento dos tecidos afetados e instituição de


antimicrobianos específicos, nomeadamente metronidazole, clindamicina ou cloranfenicol
(ambos evitam a produção de toxinas), e beta-lactâmicos + inibidor de beta-lactamases (pois
podem haver resistências). Considerar sempre que podemos ter anaeróbios gram + e gram - (e
também aeróbios) na mesma infeção.

Por fim, relembra-se que quando há suspeita de anaeróbios, a colheita e o envio para o
laboratório deves ser feitos em condições que os preservem. O laboratório tem de ser avisado
desta suspeita, visto que o manuseamento de anaeróbios requer cuidados específicos.
Data Docente
26/10/2021 Prof. Doutor Mário Ramirez

Género Bacillus
Aspetos a abordar:
1. Definição do género
2. Espécies patogénicas mais importantes
3. Fatores de virulência
4. Aspetos epidemiológicos
5. Infeções mais frequentes
6. Diagnóstico laboratorial
7. Profilaxia
8. Terapêutica das infeções

O género Bacillus é um género que produz esporos, identificados a verde (imagem A –


microscopia ótica) e com a seta (imagem B – microscopia eletrónica).
Possui uma cápsula posta em evidência através da coloração de tinta da china, excluída pela
cápsula (imagem c – microscopia ótica).

A B C

2
As espécies mais importantes são:
• Bacillus anthrasis – carbúnculo (cutâneo, inalatório, gastrointestinal)
• Bacillus cereus – Gastrenterites, infeções oculares, infeções oportunistas

Bacillus anthracis:

Epidemiologia:

• O carbúnculo (antrax, em inglês) é uma doença dos animais herbívoros que, só


acidentalmente pode atingir o homem por contacto com animais ou os seus produtos
(ex: lã) - zoonose. A doença assume um sério problema em países onde a vacinação
animal não é praticada ou impossível de realizar (por exemplo, a doença em animais
selvagens em África).
• Os esporos já foram usados em bioterrorismo (Bioterrorismo EUA 2002: envio de
envelopes com esporos de Bacillus anthracis para redações de jornais e políticos,
senadores em Washington e governadores de alguns estados. Não só os destinatários,
mas também os distribuidores desenvolveram a infeção. Identificou-se também a
presença de esporos no ambiente onde as cartas eram processadas e onde eram
abertas).

• Transmissão ao homem: inoculação cutânea (95%), inalação ou ingestão (muito rara)

• Sem transmissão Homem a Homem (replicação bacteriana ocorre nos gânglios linfáticos
mediastínicos e não na árvore tráqueo-brônquica)

Fatores de Virulência:
• Não estão confinados no cromossoma, apenas nos plasmídeos:
• 1 plasmídeo que codifica a cápsula (pXO2) e um que codifiica as toxinas letal e
edematosa (pXO1)
• Cápsula: não é de polissacáridos, mas sim de ácido glutâmico (aminoácido)
• Toxina letal: responsável por maior parte da sintomatologia (2 subunidades: antigénio
protetor da neutralização + fator letal -morte celular)
• Toxina edematosa

Carbúnculo:

Carbunculose cutânea:
• a mais comum
• conhecida por “Pústula maligna”
• Contacto dos esporos com feridas prévias:
o prurido local
o pápula (vesícula)
o pústula indolor (7-10 dias)
• mais frequente nos braços (maior exposição aos animais)
Carbunculose pulmonar:

• Inalação de esporos
• Período de latência de 2 ou + meses
• Envolve os gg mediastínicos
• Disseminação sanguínea com meningite (50% dos casos), sépsis e morte em
aproximadamente 3 dias

Caso clínico (associado a um caso de bioterrorismo em 2001 no EUA)


Febre, mialgias e mal estar (4 dias). Confusão, vómitos, sem alterações respiratórias.
Suspeita de meningite. Realização de Rx torax

Se a suspeita é de meningite, porque se terá feito um rx ao tórax, sem alterações respiratórias?


R: Muitos dos agentes que causam pneumonia também causam meningite (ex: streptococcus
pneumoniae e Haemophilus influenzae)

Rx com identificação de pneumonia intersticial difusa e aumento dos


gânglios linfáticos mediastínicos, típico da carbunculose pulmonar.

Colheita do LCR: Bastonetes Gram + → suspeita: Carbunculose


pulmonar
Hemocultura positiva (24h): Bacillus anthracis
Doente vem a falecer ao 3º dia de hospitalização

Teria sido útil fazer uma cloração Gram direto do sangue colhido?
Habitualmente não se faz Gram direto do sangue, uma vez que o n.º
de bactérias em circulação é muito pequena.
Carbunculose pulmonar é EXCEÇÃO, uma coloração Gram do
sangue periférico seria útil.

Diagnóstico laboratorial:
Carbunculose inalatória: colher produtos do aparelho respiratório, sangue, líquor
Carbunculose cutânea: colheita de conteúdo das vesículas que circundam a lesão principal

Exame direto: coloração Gram


Exame cultural: identificação bactéria
Antibiograma: útil para a discussão das opções terapêuticas

Profilaxia:
Vacinação animal
Vacinação humana em casos específicos, mas tem efeito limitado:
• Áreas endémicas
• Veterinários
• Militares (bioterrorismo)
Esporos persistem anos no solo
Bioterrorismo
Terapêutica:
Suscetível: Penicilina, Doxicilina, Eritromicina, Ciprofloxacilina, Clindamicina, Vancomicina
Resistente: co-trimoxazol, cefalosporinas

De eleição: Ciprofloxacina ou doxicilina (com associação)

Bacillus cereus:

Fatores de virulência:
2 exotoxinas responsáveis pela intoxicação alimentar
• Uma é termo-estável, persiste com o aquecimento dos alimentos →forma
emética (associada ao vómito)
• Outra é termlábil, destruida pela fervura → forma diarreica

Infeções:
Intoxicação alimentar (ingestão da toxina sem proliferação da bactéria)
• Arroz – forma emética
• Carne e vegetais – forma diarreica
• Poucas horas após a ingestão alimentos → início dos sintomas
• Duração variável (8-10h emética; 20-36h diarreica)
Infeção ocular (pós traumatismo) – ex: quando se corta a relva

Diagnóstico laboratorial:
Intoxicação alimentar: isolamento da bactéria nos alimentos suspeitos e identificação
da produção de toxinas → com fins de saúde pública e não clínicos

Infeção ocular: isolamento da bactéria a partir do humor vítreo ou outros tecidos


afetados

Terapêutica:
Intoxicação alimentar – presença de toxinas sem proliferação bacteriana: terapêutica
sintomática, manter a hidratação

Infeção ocular: remoção do corpo estranho + antibioterapia (vancomicina, clindamicina ou


ciprofloxacilina)

Género Corynebacterium

Aspetos a abordar:
1. Definição do género
2. Espécies patogénicas mais importantes
3. Fatores de virulência
4. Aspetos epidemiológicos
5. Infeções mais frequentes
6. Diagnóstico laboratorial
7. Profilaxia
8. Terapêutica das infeções
1
É uma bactéria Gram + (A), embora na coloração às vezes surjam bactérias rosadas.
É pleumórfica, bastonete mais comprido ou semelhante a um coco.
Cresce em meio com telurite -B- (microorganismos a preto, boa visualização) e em
gelose de sangue -C- (colónias pequenas).
Faz parte da microbiota da pele, pelo que pode contaminar colheitas de produtos da
pele ou de hemoculturas.

A B C

2
As espécies mais importantes são:
• Corynebacterium diphtheriae – difteria
• Corynebacterium jeikeium – Bacteriémia, infeções oportunistas
• Corynebacterium urealyticum – Infeção urinária, Bacteriémia, infeções oportunistas

Fatores de virulência:
Exotoxinas (A-B)
• segregadas no local da infeção
• inibe síntese proteica
• codificadas pelo gene tox (bacteriófago beta)
• produzida apenas pelas estripes lisogénicas

Outros fatores de viruência mal conhecidos


4 biotipos de Corynebacterium diphtheriae: var. gravis; var. mitis; var. belfanti; var. intermedius.

Infeções:
Difteria respiratória (uma das causas mais importantes de mortalidade infantil no séc XVII):
• infeção faríngea com pseudomembranas (resultantes da resposta imunitária
orquestrada pelo hospedeiro) → risco de obstrução respiratória
• miocardite com paragem cardíaca e morte
Difteria cutânea (têm adquirido maior importância nos últimos anos)
Caso clínico:
Doente 67 anos, Sexo feminino, Contacto com animais (16 gatos, 6 cães, 1 raposa):
Corynebacterium ulcerans

Necrose da mão, sinais inflamatórios de toxémia em todo o braço

Recolha por zaragatoa na lesão e hemocultura → negativas


Pús por desbridamento cirúrgico → difteróides não valorizados (parte da microbiota
da pele)

Dia 7: desbridamento no bloco por agravamento do quadro, recolha de pús →


Corynebacterium ulcerans
Terapêutica: 21 dias com cefuroxima (cefalosporina) e clindamicina (atua na síntese
proteica, útil na diminuição da produção de toxinas).

Fatores de risco (difteria cutânea):


• Viagem (país tropical, mesmo que seja não endémico)
• Lesões da pele (picada de mosquitos) ou lesões em tecidos profundos
• Contacto com animais de companhia (ulcerans)
• Estripes produtoras de toxinas normalmente mais agressivas
• Profilaxia dos contactos (não está ainda indicada mas tem sido um assunto
discutido)

Profilaxia (difteria respiratória):


• Vacinação com toxoide (vacina tríplice: difteria, tétano e tosse convulsa -> DtaP)
• Profilaxia dos contactos: penicilina ou eritromicina

Aspetos epidemiológicos:
As infeções por Corynebacterium têm vindo a alterar-se:
Ao longo do tempo, os casos têm vindo a baixar até 2014.
• A partir de 2015 há um aumento do n.º de casos, com fração significativa de C.
diphteriae toxigénica (A).
• Maioria C. Diphteriae: infeções cutâneas em crianças com < de 16 anos, adultos
mais velhos
• Maioria C.ulcerans: infeções respiratórias (cutâneas em pessoas mais velhas)
• 75% infeções com estripes toxigénicas -> não vacinados!!
Em 2016, na Venezuela, houve um reaparecimento de difteria, surto esse que continua
a ocorrer com 1688 casos confirmados e 284 mortes em 2019.
Em 2015, em Espanha, um doente morreu por difteria respiratória, não estando
vacinado.
OMS chama a atenção para a diminuição de administração de vacinas na América Latina,
durante a pandemia.
Em 2019, no Reino Unido, uma criança com 5 anos vem à urgência com chagas muito
impressionantes e prurido nos membros inferiores, após 3 semanas de uma viagem de
algumas semanas à Serra Leoa → Corynebacterium difteriae

Terapêutica (Corynebacterium difteriae):


• Antitoxina diftérica (evitar rx com formação de pseudomembranas e obstrução
da via aérea)
+
• Antibiótico (penicilina ou eritromicina)

Outras espécies:

Corynebacterium jeikeium:
• Agente oportunista (meningite em doentes VIH)
• Coloniza a pele de doentes hospitalizados
• Multirresistente: terapêutica com vancomicina

Corynebacterium urealyticum:
• Agente oportunista (imunossupressão, mal formações, procedimentos
urológicos, antibioterapia)
• Infeções urinárias – pielonefrites associadas a cálculos renais e bacteriémia
• Multirresistentes: terapêutica com vancomicina
Diagnóstico laboratorial:
• Colheita do exsudado faríngeo com zaragatoa (respiratório); outros:
hemocultura, pus, liquor
• Sementeira em meios específicos
• Identificação microbiana
• Prova de produção de toxina – Prova de Elek, ELISA
• PCR – deteção gene tox (mas existem estripes que possuem o gene mas não
expressam a toxina)

Prova de Elek: Anticopro contra a toxina

Deposição/precipitação da toxina
quando encontra o anticorpo
Data Docente
27/10/2021 Prof. Doutor Mário Ramirez

Espiroquetas – bactérias em forma de saca-rolhas

Género Treponema:
• Espiroquetídeos finos;
• Superfície semelhante a bactérias Gram-: com duas membranas típicas, mas sem LPS
(lipopolissacárido – fator endotoxina que tem atividade toxica sobre as células do
hospedeiro e também atividade pró-inflamatória forte);
• Não são cultiváveis em vitro facilmente;
• Bactérias têm de ser crescidas em células endoteliais de coelho e mesmo assim têm
tempo de duplicação longo (30h) e apenas por algumas gerações. Ao fim de algumas
gerações, estas bactérias deixam de se dividir o que dificulta o seu estudo.
• Células frágeis, suscetíveis a secura e a uma elevada tensão de oxigénio
Qualquer exposição mais prolongada ao oxigénio ou à secura destrói as células, o que dificulta
o seu crescimento.
• Tem flagelos peri plasmáticos, ao contrário de outras bactérias em que o flagelo é
externo à bactéria, no treponema está no peri plasma

(Fotografia de microscopia ótica, por


fluorescência veem se as espiroquetídeos e
as estruturas laranja: células do endotélio do
coelho que utilizamos para crescer
bactérias)

Diagrama em que está representado o


flagelo. O flagelo vem da membrana
Na fotografia de microscopia eletrónica de
interna, mas não sai para a membrana
externa e acompanha toda a bactéria. É por
transmissão, vemos um corte sagital em que
ação destes flagelos que as bactérias se vão vemos os endoflagelos entre a membrana
mover citoplasmática e a membrana externa.
Qual é a vantagem deste tipo de organização dos flagelos?
Não existe exposição das proteínas que constituem o flagelo ao hospedeiro, portanto no meio
exterior.
A flagelina é uma proteína bastante conservada do ponto de vista estrutural.
Temos alguns toll-like receptors TLR (componentes do sistema imune inato que vão reconhecer
essa proteína e, portanto, alertar o nosso sistema imunológico para a presença de um agente
externo). Ao terem os flagelos internos, isso não acontece, o que contribui para uma
característica muito importante dos treponemas que é serem muito pouco imunogénicos.

O género treponema tem 4 espécies principais o treponema pallidum que se divide em 3


subespécies diferente: a subespécie pallidum, a subespécie endemicum, a subespécie pertenue
e o treponema carateum.
Estas bactérias não são distintas morfológica ou antigenicamente, o que quer dizer que, por
exemplo, por observação microscópica nós não conseguimos distinguir estas diferentes
subespécies ou até a espécie Carateum da espécie a pallidum. No entanto, as doenças que
causam são muito diferentes.

Correlção entre espécies e doenças:


Treponema pallidum subespécie pallidum é o agente da sífilis - doença sexualmente
transmissível.
A subespécie endemicum é responsável por uma infeção que é o bejel (sífilis endémica) que era
muito importante na Europa, mas que hoje em dia está praticamente erradicada ou
completamente erradicada.
A subespécie pertenue que é responsável pela framboesia tropical, uma doença de países
tropicais.
O treponema carateum que é a responsável pela pinta que também em Portugal não existem
endemicamente, mas existe no Brasil é e, portanto, a devemos alguns casos em Portugal de
pessoas por exemplo oriundas do Brasil.
(NOTA: APENAS T. PALLIDUM SUBSP. PALLIDUM É UMA DST)

Pinta
• é uma doença endémica da América central e do Sul
sobretudo nas regiões áridas, norte do Brasil;

• é responsável por uma pigmentação característica na cara


que depois evolui para lesões populares do tipo da psoríase
e é acompanhado desta perda de pigmento;

• Transmissão por contato com pessoas infetadas, portanto é


uma doença que é relativamente transmissível e, portanto,
permanece démica em algumas regiões da América central
e do sul.
Bejel
Sífilis endémica
• Era endémica na Europa até ao século 19 tendo sido
posteriormente erradicada
• é uma doença que leva a sinais de infeção na face e numa fase
mais avançada da infeção podemos observar uma necrose
extensa dos tecidos afetados e (ausência da a cavidade nasal,
por necrose do tecido).

Framboesa Tropical
• é uma doença típica de climas quentes e húmidos
• há uma lesão papular inicial e depois aparecem lesões
secundárias ulcerosas e que são infeciosas
• se a infeção se tornar crónica leva a malformações
ósseas por osteíte crónica
(parecem framboesas são lesões muito avermelhadas do
tamanho mais ou menos de uma framboesa)

Framboesa tropical - África Subsaariana aliás mais na África do Golfo da Guiné e na


Ásia, por cima da Austrália, na Indonésia e na Papua-Nova Guiné;
Begel - também na África subsariana, mas na África mais seca, na península arábica,
na Turquia e nos países adjacentes;
Pinta - como vos tinha falado a temos aqui a América Central e o norte do Brasil e
também a Venezuela.
Treponema pallidum
• Não tem quase proteínas na membrana externa (superfície bastante lisa), portanto não
tem antigénios;
• O facto de não ter quase proteínas na membrana externa faz com que este
microrganismo seja bastante silencioso, portanto bastante invisível ao nosso sistema
imunitário;
• Proteínas importantes:
➔ as proteínas de TPRTPR (treponema pallidum repeat proteins), que são porinas e
adesinas que são proteínas importantes na evasão à resposta imunitária;
➔ a proteína BamA é essencial à inserção de proteínas na membrana externa e é um
epitopo conservado portanto não é variável entre estirpes, o que facilita o
reconhecimento deste antígeno.
• Bactéria tem ainda outras adesinas, nomeadamente adesinas que vão interatuar com a
fibronectina e com a laminina.
• Protease de zinco - palilisina que degrada trombos e a matriz extracelular.
• Tem um cone na ponta do treponema claramente visível em microscopia electrónica de
transmissão. O cone medeia a adesão.

(Desconhecem-se quais os mecanismos moleculares que medeiam quer a adesão quer a


potencial virulência que as células apresentam por contato com esta estrutura).

SIFILIS
• é a terceira doença sexualmente transmissível mais prevalente nos Estados Unidos da
América e na Europa. Em Portugal, em particular, não será diferente imediatamente a
seguir à Chlamydia trachomatis e Neisseria gonorrhoeae;
• é uma infeção exclusiva do ser humano;
• Transmissão faz-se por contato sexual ;

(Há uma hipótese que foi defendida durante muito tempo de que a sífilis tinha sido uma doença
trazida do Novo Mundo, com a sugestão de que teria sido apenas introduzida na Europa no século
15. Ou seja, que antes do século 15, antes dos descobrimentos, não tinha havido sífilis na Europa e
que teriam sido os marinheiros ao retornarem do Novo Mundo que teriam trazido a doença.
Estudos genómicos não são concordantes com esta hipótese. Parece que a doença já existia na
Europa.)

Qual é o quadro dos sinais e sintomas da sífilis e qual é a sua evolução ao longo do tempo?
A sífilis primária aparece com um sifiloma no local da infeção que aparece 2 a 10 semanas após
a exposição em cerca de 70% das pessoas.
É uma lesão indolor que acaba por resolver espontaneamente 1 a 3 meses após a infeção.
Que outros locais possíveis?
Contato sexual pode acontecer em outros locais anatómicos, nomeadamente, na cérvix, no reto
e na orofaringe.

A sífilis primária é altamente infeciosa o que favorece a transmissão, portanto nesta altura
apesar destas lesões serem indolores, são lesões altamente infeciosas e, portanto, o indivíduo
vai transmitir a infeção com grande probabilidade.

Sífilis secundária
4 a 10 semanas após a lesão primária surge entramos numa
fase a que chamamos a sífilis secundária com sinais de
disseminação sistêmica da infeção por vezes, as únicas
queixas são de uma síndrome gripal (dores musculares e
articulares generalizadas sem sinais específicos). Há muitas
vezes linfo adenopatia, portanto com dor também nos
gânglios linfáticos e por vezes com este rash disseminado que
é típico da sífilis e com o aparecimento de pigmentação
também nos pés, na planta dos pés e nas mãos.
O rash não poupa a planta dos pés e as mãos ao contrário de
outros de outros rash.
A sífilis secundária resolve espontaneamente 2 a 3 semanas,
no entanto se houver lesões como estas que vemos aqui nas
costas deste indivíduo elas são altamente infeciosas, portanto
se recolhermos o escudado lúpus destas lesões vemos
claramente muitos treponemas o que vai também favorecer
a transmissão.

Sífilis latente
Quando a sífilis secundária resolve entramos na sífilis latente em que não há sinais visíveis de
infeção nem sintomas, mas temos a permanência dos treponemas em locais Imune
privilegiados, ou seja, em territórios em que a atividade do sistema imunológico não é tão forte
nomeadamente, por exemplo, a pele ou os olhos.
Durante a sífilis latente precoce que vai até um ano ou 2 anos após o início da infeção, podemos
ter o reaparecimento dos sintomas e aí o indivíduo torna-se novamente infecioso enquanto
numa fase tardia a probabilidade de contágio já é reduzida.

Sífilis terciária
A sífilis terciária que aparece em cerca de 30% dos indivíduos não tratados (sabemos isso devido
a um estudo um estudo que ficou famoso pela falta de ética e pelos problemas éticos que
levantou que foi O estudo de Tuskegee no Sul dos Estados Unidos. Nas comunidades de origem
africana foi feito um estudo em que havia um braço de controlo que não era tratado sabendo
nós que temos um tratamento muito fácil e altamente eficaz contra a sífilis e esse estudo esteve
em curso desde 1932 até 1972 em que rebentou um escândalo sobre ele).
A sífilis terciária aparece entre 3 e 30 anos após a infeção primária.
O indivíduo não é infecioso e a sintomatologia que temos é devido a uma resposta imunológica
exacerbada, nomeadamente, cegueira artrite malformações ósseas complicações
cardiovasculares devido a aortites e a demência, portanto a neuros-sífilis que faz com que as
pessoas fiquem doentes.

(Na altura antes dos antimicrobianos eram tratados com mercúrio, o que era altamente toxico
para o hospedeiro).

Sífilis congénita
A sífilis congénita - se a mãe estiver infetada com a sífilis, a transmissão in útero é frequente
uma vez que o treponema pallidum consegue atravessar a placenta.
São muitas vezes causa de aborto espontâneo e parto pré-termo.
Sinais de sífilis secundária em crianças: esplenomegalia, perda da pele da mão e os sinais mais
graves de infeção muito semelhante àquilo que nós vimos no begel portanto uma infeção a
disseminada

Esta infeção no recém-nascido resulta em má formações, portanto, é muito importante fazer


um teste à grávida durante o primeiro trimestre e novamente no terceiro trimestre e fazer o
tratamento se os testes forem positivos.
O exame microscópico a partir do produto da lesão é informativo utilizando um anticorpo
fluorescente, no entanto a este tipo de abordagem está em desuso e é muito difícil obter os
reagentes.
O PCR a partir do produto da lesão também é muito sensível como vocês já sabem das técnicas
moleculares, no entanto, não existem testes comerciais aprovados e não podemos usar este
tipo de abordagem em sangue ou líquor porque temos poucos microrganismos apesar dos sinais
sistémicos de doença de que eu vos falei tanto.
(Não esquecer: no caso da neurossífilis, que é uma manifestação neurológica, acabamos por ter
poucos microrganismos).

Diagnóstico
Temos os testes serológicos que são aqueles que são mais utilizados e estes testes dividem-se
em 2 grupos:
Treponemicos - medem os IgM os IgG produzidos contra antígenos proteicos de T.pallidum que
em princípio são muito específicos.
Não Treponémicos - medem os anticorpos que nós produzimos contra antigénios lipídicos
libertados pela bactéria ou pela lise das células do hospedeiro nomeadamente a cardiolipina e
obviamente são menos específicos.
Testes treponemicos TT:
• Recolhemos o soro para o teste sendo
que o plasma ou líquor também são aceites em
alguns dos testes;
• A sua sensibilidade é variável (depende
da fase da doença). Numa fase muito precoce
da doença nós podemos ter menos anticorpos
produzidos e a sensibilidade será menor,
portanto a sensibilidade varia entre 82 e 100%,
mas são altamente específicos com uma
especificidade de cerca de 99%.;
• São positivos 6 a 14 dias após a lesão
primária e permanecem positivos na fase convalescente, ou seja, como são testes
muito específicos vão detetar anticorpos presentes na fase convalescente.

Testes rápidos treponemicos POC:


• Podem ser feitos a partir do sangue soro ou plasma;
• São menos sensíveis;
• A sua sensibilidade depende do teste e do produto;
• Sensibilidades a variarem entre os 80 e os 90%;
• Estes testes não distinguem infeção aguda de convalescente.

Testes não treponemicos:


• Não vão detetar diretamente
anticorpos contra as proteínas do treponema,
vão detetar anticorpos contra os lípidos,
sobretudo;
• vamos recolher soro ou plasma
Nota: VDRL também pode ser feito no líquor
• a sua sensibilidade é variável e também
depende da fase da doença variando entre 71 e
100%;
• tem uma boa especificidade de 98%
• são positivos cerca de 10 a 15 dias após a lesão primária;
• se o tratamento da infeção for bem-sucedido os títulos baixam, ou seja, ao contrário
dos testes treponemicos em que se mantêm positivos na fase convalescente. Nestes os
títulos vão baixar e isso tem consequências para nós medirmos a eficácia da terapêutica;
• no entanto estes testes apresentam falsos negativos (efeito prozone);
• também temos ainda uma taxa de falsos positivos bastante relevante de cerca de 2 a
5% e esta falsa por falsa positividade vai ser influenciada pelas condições do hospedeiro.
Temos a sífilis primária depois a sífilis latente e a sífilis tardia.
Temos aqui o aparecimento dos anticorpos um pouco antes das 2 semanas.
Se fizermos tratamento ainda assim vamos continuar a detetar anticorpos contra antígenos proteicos da sífilis, portanto estes testes
treponemicos não nos vão servir para medir o sucesso do tratamento, no entanto, os testes não treponémicos que aparecem mais
tardiamente do que os testes treponemicos (estes anticorpos que aparecem mais tardiamente) sobem e conseguimos detetá-los em cerca
de 90% dos doentes.
Depois se não houver tratamento eles vão cair muito lentamente, mas se houver tratamento vai haver um abaixamento com o
desaparecimento por volta de um ano após a exposição ao agente.
Temos uma fração dos doentes em que esta queda vai ser mais lenta esta queda dos anticorpos não treponemicos vai ser mais lenta e
depois então vamos entrar numa fase ainda de baixos anticorpos, mas que se vão manter durante muito tempo
Vai ser uma percentagem de cerca de 20% dos doentes que vão manter então estes anticorpos.

Como é que nós fazemos o diagnóstico?


Temos 2 hipóteses:
começarmos com um teste não treponemico:
-> se o teste não treponemico for negativo então não tratamos;
-> se for positivo então fazemos um teste treponemico confirmatório:
-> se o teste treponemico confirmatório for negativo então não tratamos.
-> se for positivo tratamos.

começarmos com teste treponemico:


-> se o teste treponemico for negativo está o caso resolvido não tratamos;
-> se o teste treponemico for positivo temos que perguntar se temos uma história prévia de tratamento ou seja
será que os anticorpos que nós estamos a detetar não são resultado de uma infecção aguda naquele momento,
mas de uma infeção passada. Se tiver havido hipótese de ter havido sífilis no passado então fazemos um teste
não treponemico:
-> se o teste não treponemico for negativo não tratamos ou então usamos um teste diferente e
recomeçamos
-> se o teste não treponémico for positivo então claramente temos a um caso agudo e devemos tratar.
Algumas condições vão aumentar os falsos positivos dos testes não treponemicos,
nomeadamente, por exemplo:
• a gravidez - é uma altura em que os testes são indicados;
• toma recente de uma vacina;
• um toxicodependente.

Mesmo os testes treponemicos têm falsos positivos no caso da toxicodependência e também


no caso da doença de Lyme ou em jovens que têm acne vulgar bastante exacerbada.

Temos que estar atentos à possibilidade de termos falsos positivos.

Como é que se faz o tratamento?


• penicilina (não há resistências);
• a duração do tratamento depende da fase da doença sendo mais curta na fase inicial e
mais prolongada nas fases tardias;
• segunda linha: a doxiciclina, a ceftriaxona portanto uma cefalosporina e azitromicina
mas temos agora resistência aos macrólidos.

O tratamento deve ser feito a todos os parceiros sexuais e, portanto, é muito importante quando
identificamos um caso de sífilis identificarmos quem foram os parceiros sexuais para eles
poderem vir à consulta e serem tratados ainda que ainda não apresentem sinais de infeção.
A prevenção inclui medidas de barreira em que durante o ato sexual não há um contato direto
entre os 2 indivíduos.

Epidemiologia
Qual é a epidemiologia da sífilis?
Temos uma maior incidência da infeção entre os 20 e os 44 anos e sobretudo nos homens
porque são as idades de maior atividade sexual e também são as idades onde há mais parceiros.
Nos vários países o rácio de casos identificados em homens e em Mulheres, por exemplo, na
Croácia temos cerca de 12 casos identificados em homens para um caso identificado em
Mulheres e por aí adiante.
Portugal com cerca de 3 casos identificados em homens para cada caso identificado nas
Mulheres.
Isto poderá simplesmente refletir um diagnóstico mais ativo em indivíduos do sexo masculino.
Porque é que isto que acontece? O número de casos em Mulheres está mais ou menos estável
em 2% por 1000 habitantes.
Os números de casos em homens têm aumentado e este aumento de casos na Europa está
associado a homens que têm sexo com homens, portanto o sexo homossexual entre homens. O
número de casos tem aumentado sendo que o número de casos entre homens heterossexuais
e mulheres se tem mantido mais ou menos constante.
Vendo por sexo e por orientação sexual, vemos que realmente a maior parte dos casos cerca de
70% dos casos ocorre em homens que têm sexo com homens. A maior parte dos casos
felizmente é primária e secundária ainda assim temos um número de casos significativos de
latente precoce, mas felizmente poucos casos de latente tardia.

Em Portugal, o número de casos de sífilis tem variado muito ao longo dos anos.
A partir dos anos 80 deu-se uma diminuição e agora mais recentemente os dados mais recentes
da DGS vão até 2016, tivemos um aumento muito grande dos casos de sífilis.
Felizmente, o rastreio durante a gravidez faz com que o número de casos de sífilis congénita
tenha vindo a diminuir de uma forma sustentada ainda que em 2016 houve 4 casos.
A maior parte dos casos está situado no Norte e na região de Lisboa e vale do Tejo e menos
casos nas restantes regiões de saúde.

Género Borrelia
• borrelia burgdorferi - responsável pela doença Lyme nos Estados Unidos
• borrelia recurrentis - febre recorrente (epidémica)
• borrelia hispanica - foi detectada na Península Ibérica, responsável pela febre recorrente
(endémica)
• borrelia garinii - nos Estados Unidos e na Ásia, doença de Lyme
• borrelia afzelii - doença de Lyme também nos Estados Unidos e na ásia

➔ São maiores que os outros espiroquetídeos;


➔ Crescem em meio complexo, portanto não necessitam de células de eucariotas
para crescer;
➔ Apresentam um tempo de duplicação longo cerca de maiores de 18 horas;
➔ Crescem em ambiente de microaerofilia, sendo que o seu crescimento necessita
de meios próprios e, portanto, é invulgar fazermos crescimento em laboratórios
de microbiologia clínica de rotina;
➔ Transmissão faz-se por vetores por insetos: o piolho e a carraça são os
transmissores.

Doença de Lyme
Apareceu na cidade Lyme nos Estados Unidos.
Há um eritema migrante (formação começa por ser apenas numa
região central e depois migra fazendo esta forma de alvo),
portanto, tem uma região central com um eritema e depois um
anel que se forma à volta e depois uma manifestação tardia no
aparelho musculosquelético, sistema nervoso ou cardiovascular.
A confirmação da infeção faz-se por critérios para diagnóstico
que são: o isolamento da borrelia ou uma demonstração de
produção da IgM ou de IgG contra os espiroquetas sendo que tem que haver um aumento
significativo entre a fase aguda e convalescente.
Muitas vezes os sintomas não são valorizados e este a doença manifesta-se apenas com uma
síndrome gripal que pode durar cerca de 4 semanas.
Portanto a disseminação hematogénica leva à formação desta
pigmentação típica, pode haver artrite, manifestações neurológicas,
complicações cardíacas e isto pode levar a uma doença crónica de
pele.

Febre recorrente
• também associada à picada de carraças;
• é recorrente porque os antigénios major que são expressos pelos espiroquetas vão
mudando ao longo do tempo;
Numa primeira onda de infeção a
maioria expressa este antigénio
vermelho e depois existe uma
população minoritária que expressa
o antigénio amarelo, nós montamos
uma resposta contra o antigénio
vermelho, eliminamos os
espiroquetas vermelhos e os
espiroquetas amarelos dominam.
Aparece numa fração pequena
espiroquetas verdes montamos uma
resposta contra os amarelos
aparecem os verdes e por aí adiante.
Portanto por isso é que é recorrente porque temos ondas de febre.

• o diagnóstico é sorológico produção de anticorpos através de testes de


imunofluorescência direta ou indireta quer no soro quer no líquor. Podem ser apenas
positivos de 2 a 4 semanas após os sinais.
• o tratamento faz-se com tetraciclinas ou penicilinas
• a prevenção é claramente a higiene e evitar a exposição aos vetores
Em Portugal, também temos doença de Lyme borreliose que nos anos mais recentes temos tido
um aumento do número de casos.
A maior concentração dos casos dá-se na região norte, mas também na Lisboa e vale do Tejo e
no Algarve.

Leptospiras
• são espiroquetídeos que têm LPS (lipopolissacarídeo);
• têm o flagelo interno;
• leptospiras que são agentes patogénicos: o interrogans, kirchneri e noguchii entre
outros.
Há uns que têm uma violência intermédia e há outros que aparentemente não causam infeção
no homem. Existe uma correlação da presença de alguns genes que nós achamos que estão
ligados à patogenicidade e ao facto das estirpes serem patogénicas ou não, sendo que as
estirpes que são intermédias ou saprófitas não têm esses fatores de virulência.

Portanto esses fatores de virulência permitem à bactéria quando em contato com a pele,
quando existe uma quebra de barreira, elas entrarem para a derme.
Entrando na derme vão ligar-se e infetar os fibroblastos e mover-se através da matriz
extracelular até atingirem os vasos sanguíneos. Atingindo os vasos sanguíneos vão se ligar à
plasmina, secretar hemolisinas que vão degradar os eritrócitos, ativar a cascata de coagulação,
degradar e inativar o complemento e vão ter a capacidade de invadir através das ligações das
células endoteliais e disseminar-se para outros para outros locais no corpo.
Sendo que os macrófagos vão tentar fagocitar e sobretudo através da produção de radicais de
oxigénio vão tentar destruir estes invasores.
O reservatório das leptospiroses são roedores e pequenos mamíferos.
A infeção faz-se por contato com urina infetada ou água contaminada.
Muitas vezes a infeção é subclínica, não apresenta sinais nem sintomas, mas pode também
evoluir para uma meningite ou para uma disfunção renal e hepática sendo que nos casos mais
graves temos uma hemorragia disseminada.
O diagnóstico faz-se por cultura, portanto a leptospira cresce em cultura no laboratório a partir
do sangue do líquor ou da urina. É necessário meio específico para fazer esta cultura leptospira,
mas também podemos fazer PCR a partir do sangue do licor ou da urina.
A detecção de anticorpos a partir do soro é muitas vezes usada para identificar esta infeção e o
Microscopic agglutination test (MAT) é o Gold standard sendo que também pode ser feita por
ELISA.
O tratamento faz-se com penicilina ou doxiciclina (tetraciclina) e também podemos usar
profilaticamente no caso de exposição quando temos um surto. Os surtos de leptospira
acontecem muitas vezes por ingestão ou contato com água contaminada e aí podemos usar
estes antimicrobianos profilaticamente.
Em Portugal, a leptospirose é uma doença que tem sido mais detetada nos últimos anos.
Provavelmente, ela sempre existiu e tínhamos era um problema de diagnóstico. Portanto vemos
que a partir do final da década de 80 temos um aumento dos casos e depois uma diminuição no
princípio dos anos 2000 e mais recentemente um novo aumento em Portugal.
A leptospirose é particularmente associada aos Açores.
Os dados da DGS são um bocadinho diferentes. Entre 2013 e 2016 realmente a Região Autónoma
dos Açores é devido à exploração com vacas que depois tem ratos associados por causa das
rações. A urina dos ratos vai contaminar os cursos de água e tem muitos casos de leptospirose -
102 casos. Mas também existe no Norte no centro em Lisboa e vale do Tejo, portanto não é um
problema exclusivo dos Açores.
Data Docente
28/10/2021 Prof. Doutor Mário Ramirez

Vamos falar sobre 2 géneros bacterianos muito diferentes, o Género Rickettsia e o Género
Coxiella, que são agentes importantes de infeção humana. Temos aqui, nesta primeira imagem,
uma coloração de Gimenez, em que vemos aqui as bactérias coradas de rosa e vemos uma célula
humana corada com o núcleo e o citoplasma de
azul. E o que vemos aqui claramente é que estas
bactérias são intracelulares e estão livres no
citoplasma, ao contrário de outras bactérias
intracelulares que vivem dentro dos
fagossomas, portanto, não livres no citoplasma
mas num fagossoma, a partir do qual elas
controlam o meio ambiente. Coloração de Gimenez

Rickettsia

Focando-nos primeiro nas Ricketsias. As Rickettsiaceae são uma família de bactérias composta
por sobretudo 2 géneros bacterianos, o género Rickettsia e o género Orientia.
São parasitas intracelulares obrigatórios, que vivem livres no citoplasma das células
eucarióticas, sobretudo das células endoteliais, e são bactérias que têm uma superfície muito
semelhante a bactérias de Gram negativo, ou seja, têm 2 membranas, sendo que o género
Orientia não tem nem peptidoglicano nem o LPS, que é a endotoxina, o componente da
membrana externa, das bactérias de Gram negativo que temos falado já várias vezes.

A infeção da célula endotelial inicia-se


com a adesão da Rickettsia à célula, o
que promove a sua fagocitose. Depois
a bactéria sai do fagossoma e fica livre
no citoplasma, onde se vai dividir.
Quando as bactérias resultantes
atingem um determinado nível, vamos
ter: a lise da célula hospedeira no caso
da Rickettsia prowazekii; no caso da Rickettsia tsutsugamushi é um processo de “budding” (as
bactérias vão juntar-se à membrana celular e vão promover a sua libertação através de vesículas
membranares); e no caso da Rickettsia rickettsii é através de “filopodiums”, em que a bactéria
provoca um estiramento da membrana até haver uma lise que é focal e que, portanto, não leva
à morte da célula endotelial como acontece no caso da Rickettsia prowazekii.

Quais são as Rickettsias mais importantes para o ser humano e como se faz a sua
transmissão?

Temos neste quadro as várias


Rickettsias e os vários vetores
que são essenciais à
transmissão das várias
Rickettsias. Temos carraças,
ácaros, piolhos e pulgas,
todos eles a transmitir
Rickettsias diferentes.
• A febre das
montanhas rochosas
é causada pela
Rickettsia ricketsii.
• A Rickettsiose
vesicular e o tifo rural são transmitidos por ácaros.
• O tifo epidémico e a febre das trincheiras, causados, respetivamente, por R. prowazekii
e R. quintana, são ambos transmitidos pelo piolho.
• O tifo endémico murino é causado por R. typhi, transmitida pelas pulgas.

Para além de termos um vetor que são estes vários ectoparasitas, temos também os
reservatórios, que são muitas vezes roedores, sendo que no caso do piolho podem ser também
os humanos e os esquilos.

Qual é a Rickettsiose mais importante no nosso contexto? A Rickettsiose mais


importante no nosso contexto é a Febre escaro-nodular mediterrânica.
Febre escaro-nodular mediterrânica

Também conhecida como febre botonosa, febre da carraça, ou febre mediterrânica. É uma
doença causada pela Rickettsia conorii, da qual nós conhecemos 2 subespécies: a Rickettsia
conorii conorii e a Ricettsia conorii israelensis, sendo que a israelensis foi reconhecida mais
recentemente e está associada a uma maior virulência.

Esta doença é caracterizada por um quadro de febre, exantema, e escara de inoculação (é esta
tríade de sinais que define a febre escaro-nodular mediterrânica). A febre é geralmente elevada
(superior a 39ºC) e cede mal a antipiréticos (portanto aqueles fármacos que nós usamos
normalmente para controlar a febre não são muito eficazes nestes casos). De resto, apresenta-
se como um síndrome gripal (mialgias, artralgias, por vezes dor abdominal, náuseas, diarreia e
também fotofobia). O exantema aparece cerca de 3 a 5 dias após o início da febre, e pode ser
um exantema muito claro ou uma coisa mais fruste (?).

O exantema é uma vasculite generalizada. É um exantema maculo-papular ou maculo-papulo-


nodular porque faz nódulos; é não pruriginoso (não dá comichão); é um exantema ascendente
(inicia-se nos membros inferiores e depois vai lentamente subindo até ao tronco e membros
superiores num prazo de cerca de 24 a 36 horas), há um atingimento das regiões plantares e
palmares (ao contrário, por exemplo, do exantema que temos com as faringites por
Streptococcus do grupo A, que vai poupar as regiões plantares e palmares), por vezes atinge a
face e o couro cabeludo e, numa fase mais tardia, pode tornar-se purpúrico ou petequial com
derrames claros.
Qual é a apresentação deste exantema? Temos aqui vários exemplos:

Senhor com exantema no tronco Exantema ainda nos membros inferiores


(só no pé)
Exantema nas costas de um jovem Exantema com atingimento palmar (tal
como se vê no caso da sífilis, por
exemplo)

O exantema por vezes não é tão claro, sobretudo nas pessoas de pele mais escura. Nas pessoas
de pele mais clara vê-se claramente.

Exantema no abdómen. Perímetro Exantema na parte da


abdominal bastante claro frente do joelho

A transmissão desta doença faz-se por picada de uma carraça


infetada, nomeadamente a Rhipicephalus sanguineus, que é a
carraça do cão. Na imagem ao lado vemos 2 ninfas de
Rhipicephalus sanguineus, o macho à direita e a fémea à
esquerda. Portanto, estas carraças são os principais vetores e
reservatórios desta bactéria (a R. conorii). Há uma transmissão
vertical da bactéria na carraça (a carraça transmite a bactéria à sua descendência), e a
transmissão aos vertebrados faz-se através das glândulas salivares da carraça (quando a
carraça morde, é aí que vai transmitir). Os cães são reservatórios transitórios uma vez que a
infeção no cão é auto-limitada (o cão consegue eliminar a Rickettsia, portanto não vai ser o cão
que vai transmitir).

Muito importante nestes casos é a identificação da lesão de inoculação – em francês chamada


“tache noire”, porque, como vemos aqui na imagem abaixo do braço do senhor, vemos
claramente que parece uma mancha negra. É uma escara, e é o local onde a carraça se ficou a
alimentar. Nas imagens a baixo vemos a escara no tornozelo, onde é mais frequente (é menos
frequente nos membros superiores, é muito mais frequente nos membros inferiores). No
tornozelo e na parte de trás do joelho são sítios muito frequentes para a carraça se alimentar.

A escara desaparece em 10 a 20 dias sem deixar cicatriz, portanto é comum que as pessoas
apenas procurem cuidados de saúde mais tarde quando já não existe a carraça. Muito
importante do ponto de vista da prevenção deste tipo de infeções é que, para haver
transmissão das Rickettsias é necessário que haja uma permanência da carraça a alimentar-se
durante entre 6 a 20 horas, portanto, é bastante tempo de permanência da carraça, o que quer
dizer que se nós detetarmos a carraça e a retirarmos antes deste tempo, é muito menos provável
que haja transmissão da doença.

É na fase de alimentação que vamos ter a transmissão da


doença. Vemos aqui, nestas próximas 2 imagens (Figura
1 e Figura 2) o ingurgitamento da carraça. As carraças
têm um ciclo que é bi-anual: no primeiro ano as ninfas
eclodem e alimentam-se e desenvolvem-se no adulto, e
no ano seguinte o adulto desenvolve-se e vai-se
Figura 1
reproduzir.
Figura 1 - Carraça na fase de ninfa. Neste primeiro ano
temos a carraça às 0 horas (0H – fase em que as carraças
aparecem), 24 horas, 48 horas, 72 horas e mais de 96
horas de alimentação.
Figura 2 - No ano seguinte temos já o adulto. Há o
aumento do tamanho da carraça com o aumento do Figura 2

tempo de permanência no hospedeiro.


Nestas figuras 1 e 2 estamos a ver o caso do Ixodes scapularis (espécie de carraça), que é o vetor
da doença de Lyme ( doença causada pela bactéria Borrelia Burgdorferi).
Onde é que costuma aparecer esta lesão de
inoculação, esta escara?
No quadro ao lado temos um estudo português,
feito em Portugal, em adultos. É um estudo
relativamente pequeno (17 doentes), mas
vemos que na região inguinal e na periumbilical
tivemos muitas vezes deteção da escara, e
depois também a encontrámos na axila, coxa,
dorso, ombro, cotovelo, nádega e fossa ilíaca
esquerda.

Nas crianças é sobretudo encontrada no couro cabeludo, e no caso da Rickettsia conorii


israelensis (é mais agressiva, tem um quadro de doença mais agressivo) a escara nem sempre
está presente, mesmo dentro do tempo em que esperaríamos ver a escara.

A febre escaro-nodular mediterrânica aparece em “ondas” epidémicas. Vemos no gráfico


abaixo, em Portugal, a distribuição do número de casos notificados entre 1988 e 2000 – onda
com pico em 91, depois baixa em 94, depois outro pico em 96, depois outra descida em 98, um
pico em 99 e depois volta a descer em 2000. Isto tem haver com as condições metereológicas
de temperatura e humidade que fazem com que haja mais ou menos carraças às quais as
pessoas possam estar expostas.
Dentro de Portugal, quais são as regiões mais afetadas? As regiões mais afetadas em Portugal,
entre 1989 e 2000, foram o Alentejo (32 casos por 100 000 habitantes) e Bragança (60 casos por
100 000 habitantes). Bragança tem o dobro de casos que o Alentejo, e por isso a ideia que muitas
vezes temos de que a febre da carraça é uma doença sobretudo do sul não é verdade.
Por grupo etário, a maior parte dos casos acontece em crianças entre os 1 e os 14/15 anos.
Julga-se que isto tenha a ver com uma maior proximidade das crianças com os animais e também
com um maior contacto com o solo.

A doença tem uma maior prevalência estival, o que sugere o papel importante das ninfas na
transmissão, uma vez que a eclosão dos ovos da carraça e o aparecimento das ninfas surge no
final da primavera/ princípio do verão. No gráfico abaixo temos um total de 4404 casos, em
Portugal, e vemos que a doença ocorre sobretudo ente Junho e Outubro. O aquecimento global
tende a manter o vetor ativo durante todo o ano, por isso a incidência e a sazonalidade da
doença podem alterar-se com as alterações climáticas.
Diagnóstico da Febre Escaro-nodular mediterrânica

O diagnóstico é clínico, através da tríade de sinais (febre+exantema+escara). A informação


epidemiológica também é importante (época do ano (maior incidência estival), contacto com
cães, realização de atividades ao ar livre).

O diagnóstico laboratorial é apenas confirmatório e pode ser feito através de colheita de


sangue, de produtos dos exantemas ou da escara, para isolamento em laboratórios de
referência. Os mesmos produtos podem ser usados para PCR, para deteção do DNA, também
apenas em laboratórios de referência. A imunofluorescência indireta, como pesquisa de
anticorpos anti-rickettsia no soro do doente é o método de diagnóstico mais disseminado.

Prevenção da Febre Escaro-nodular mediterrânica

A prevenção passa pela desparasitação


regular dos cães, e, no ser humano,
minimizar a exposição da pele em áreas
em que potencialmente existam
carraças (usar chapéu, meias altas, calças,
…, para evitar expor as pernas, onde as
carraças rapidamente podem procurar
uma refeição), utilização de roupas claras (facilita a deteção da carraça, se forem umas calças
pretas ou escuras é mais difícil distinguir a carraça, que também é escura), utilização de
repelentes (nomeadamente o DEET (N,N-Dietilo-meta-toluamida), que é um repelente
extremamente eficaz, que quando compramos um repelente devemos procurar e ver qual é a
percentagem de DEET que o repelente tem, e quanto maior for, mais eficaz é o repelente a evitar
as picadas dos insetos e das carraças e outros agentes), cuidados de higiene com eliminação
das possíveis carraças (depois de termos um contacto ou termos estado no campo, olharmos
com algum cuidado para as regiões onde as carraças possam estar ( região inguinal,
periumbilical, atrás dos joelhos, etc.)). Se detetarmos uma carraça, a remoção da carraça é
essencial, devemos utilizar éter ou cloreto de etilo para matar a carraça, e devemos retirar a
carraça com uma pinça sem garras, porque as garras podem esmagar a carraça. A pinça deve
ser fina com bordos lisos, e devemos introduzir a pinça entre a cabeça da carraça e a pele,
removendo lentamente a carraça, para a remover completamente. E depois, devemos resistir à
tentação de esmagar a carraça, porque podemos criar aerossóis com Rickettsia e que podem
ser fonte de infeção.

Tratamento da Febre Escaro-nodular mediterrânica

No caso de haver infeção, devemos fazer um tratamento com antimicrobianos dirigidos,


nomeadamente a doxiciclina (é uma tetraciclina), que devemos usar mesmo em crianças,
apesar das contra-indicações por causa do esmalte dentário e da ossificação, macrólidos como
antimicrobiano de 2º linha, nomeadamente a azitromicina, ainda que a eficácia desta esteja
ainda por confirmar de uma maneira inequívoca, e o cloranfenicol, que é eficaz também mas
atualmente pouco utilizado.

Outras Ricketsioses que temos na Europa: Tibola (causada por Rickettsia slovaca),
Linfangite (causada por Rickettsia sibirica mongolitimonae), e ainda outras Rickettsias
específicas de algumas regiões da Europa.
Tibola

Causada por todas estas Rickettsias reconhecidas há relativamente pouco tempo: Rickettsia
slovaca, Rickettsia raoultii e Rickettsia rioja. A Rickettsia rioja foi identificada aqui mesmo ao
lado, em Espanha.
Tibola quer dizer “Tick-
borne lymphadenopathy”.
Há outras 2 entidades
também associadas: o
DEBONEL (“Dermacentor-
borne necrosis erythema
lymphadenopathy”) e o
SENLAT (“Scalp eschar and
neck lymphadenopathy”).
Eles são os sinais típicos
deste tipo de infeção:
escara grande no couro cabeludo, que acontece em cerca de 95% dos casos (é uma escara
grande, como vemos na fotografia acima), há uma linfadenopatia local (sobretudo na região do
pescoço), ao contrário da febre escaro-nodular mediterrânica/febre da carraça em menos de
5% dos casos temos exantema, e a evolução é muito lenta (pode demorar 1 a 2 meses, com
sinais inespecíficos de cansaço). Esta escara vai causar uma alopecia (perda de cabelo)
permanente.

Será que estes casos só acontecem no campo?

Caso: Doente, do sexo masculino, com 51 anos, sem abrigo numa grande cidade francesa, que
é trazido para a urgência porque os voluntários que estavam a fazer o apoio aos sem-abrigo o
viram com febre (mais de 40ºC), confuso, desorientado, com mialgias, hipotenso. Foi colhido
sangue e verificou-se haver alterações de algumas enzimas hepáticas, trombocitopenia, foi
colhido sangue para hemocultura, e foi feita uma punção lombar, por suspeita de meningite (de
acordo com a febre e o doente estar confuso e desorientado). A observação direta do liquor foi
negativa, e as culturas tanto da hemocultura como da punção lombar vieram também negativas.
No entanto, o doente ficou na urgência durante muito tempo sem que ninguém lhe prestasse
muita atenção. Passadas cerca de 24h, dá-se banho ao doente, e após 25h sem terapêutica e
depois da observação inicial incompleta e demorada, quando se vai dar banho ao doente,
detetam-se 22 carraças (vemos nas fotografias abaixo ninfas da espécie Rhipicephalus
sanguineus em vários locais do corpo do doente).

Deteta-se também uma escara, faz-se uma biópsia da escara, e institui-se imediatamente
terapêutica com doxiciclina e ciprofloxacina. Ainda assim, o doente vem a falecer cerca de 10
horas depois.
Esta infestação tão grande de carraças levou a que fosse introduzido um inóculo tão elevado
que levaram a que o doente falecesse. Portanto, isto nem sempre é uma infeção benigna como
nós temos o hábito de pensar na febre da carraça.
Em Portugal há um estudo publicado em 2008, no Journal of Infectious Diseases, em que eles
viram que a mortalidade era cerca de 21% em doentes hospitalizados. Ou seja, aqueles doentes
que procuram cuidados de saúde e têm necessidade de ser hospitalizados pelo estado em que
já se encontram têm uma mortalidade de 21% (cerca de 1 em 5, mortalidade bastante elevada).
Os autores identificaram o alcoolismo como fator de risco, o que provavelmente terá também
a ver com o facto de não haver uma higiene por parte destes indivíduos.
Ehrlichia e Anaplasma

São parasitas intracelulares obrigatórios. Ao contrário das Rickettsias, vivem no fagossoma


(evitam a fusão com o lisossoma, que tem aquelas enzimas que deviam ir matar as bactérias no
fagossoma). Infetam leucócitos (os monócitos e os granulócitos), causando a sua lise.
Têm uma superfície semelhante às bactérias de Gram negativo, tal como as Rickettsias, mas
sem LPS e sem peptidoglicano.
Existem 3 espécies principais: A Ehrlichia canis, a Ehrlichia chafeensis (a mais importante) e o
Anaplasma phagocytophilum.
Durante o crescimento destas bactérias elas apresentam 2 formas morfológicas, que
conseguimos ver na imagem ao
lado: os corpos elementares
(mórulas), e os corpos reticulares
(mesmo ao lado, em que vemos os
pontinhos, que são depois a
partícula infecciosa). A transmissão
faz-se também por carraças.

Mórulas de Ehrlichia canis em células DH82

Apresentação
A apresentação é um síndrome gripal, com sinais e sintomas bastante inespecíficos,
leucopenia, trombocitopenia, e transaminases elevadas. A convalescença destas infeções é
prolongada.

Diagnóstico
O diagnóstico faz-se por PCR em laboratórios de referência, por deteção de mórulas em sangue
periférico pela coloração de Giemsa (mas este é um método pouco utilizado) e por serologia
(mas atenção que há reações cruzadas!).

Tratamento
Tal como no caso das Rickettsias, a terapêutica faz-se com doxiciclina, mesmo nas crianças, e a
rifampicina como 2º linha.
Prevenção
Tal como nas Rickettsias, a prevenção passa por minimizar a exposição da pele em áreas onde
potencialmente existam carraças (utilização de chapéu, calças, …), utilização de roupas claras
(para facilitar a deteção da carraça), de repelentes com DEET, e os cuidados de higiene com
eliminação de possíveis carraças que possam estar a alimentar-se.

Caso: Doente do sexo masculino, com 21 anos, que se apresenta em Janeiro de 1991 (no pico
do Inverno) ao serviço de urgência do Hospital de Évora. Ele é tratado para o vírus da gripe, uma
vez que tinha um síndrome gripal (o tratamento é sintomático).
3 dias depois há um agravamento dos sintomas, ele recorre ao hospital porque a febre não cede
aos antipiréticos, e quando se apresenta tem uma febre de 39,5ºC, queixa-se de cansaço,
mialgias, anorexia (perda de apetite), tosse seca. Apresenta sinais ligeiros de icterícia (resultante
de perda de função do fígado), tem leucopenia e trombocitopenia, não tem exantema nem
escara, diz que não tem cães mas afirma ter visitado uma quinta há 2 semanas. Nestas
circunstâncias o doente é internado, a urina escurece durante a primeira semana (sinal de
acumulação de bilirrubina na urina) e sangra do nariz (epistaxe).
2 semanas depois tem alta, mas ainda com sinais de alterações hepáticas (tanto a urina como
os parâmetros enzimáticos sugerem haver ainda alterações hepáticas).
Fazem-se várias serologias, é negativa para a febre tifóide, para a brucelose, para a febre escaro-
nodular e para a borreliose de Lyme. A imunofluorescência (IFA) para Ehrlichia chaffeensis é
positiva (no soro que é retirado 15 dias após os sintomas, o título é 1 para 1024, quando 2 meses
depois já é 1 para 128, e uma terceira serologia retirada numa altura da qual não se sabe
exatamente a data dá 1 para 64). Este aumento do título na fase aguda, com uma diminuição na
fase convalescente é diagnóstico da infeção e portanto, neste caso, uma vez que estamos a
detetar Ehrlichia chafeensis, para Ehrlichia chafeensis.
Nesta altura é feito também um estudo serológico retrospetivo a 425 amostras de soro que
estavam em banco. 3 destas amostras foram positivas para Ehrlichia chafeensis, 17 para
Anaplasma phagocytophilum (ou seja, aparentemente muitas infeções que não tinham sido
detetadas anteriormente), e 4 amostras foram positivas para ambos. Portanto, aparentemente
já tínhamos deixado passar uma série de infeções porque não tínhamos procurado
especificamente estes agentes.
Coxiella
Indo para o último género de que temos de falar, que é o género Coxiella, neste caso, vamos
falar da espécie Coxiella burnetii. São também parasitas intracelulares obrigatórios, vivem no
fagossoma (tal como no caso da Ehrlichia), também evitam a fusão do fagossoma com o
lisossoma, evitando, assim, a sua própria destruição. Infetam leucócitos (monócitos e
macrófagos). E importante no caso da Coxiella, têm uma variação de fase, havendo uma fase I
e uma fase II, que podemos detetar serologicamente e que têm a ver com o curso da doença.

A Coxiella burnetii tem hospedeiros muito variados, pode viver nos mamíferos, nos pássaros ou
nas carraças, sendo que os principais reservatórios que vão transmitir a bactéria ao Homem
são as vacas, as ovelhas, as cabras e, apenas se
infetados recentemente (portanto vão ser muito
mais raros como reservatórios de transmissão), os
cães, gatos e coelhos. A carraça não transmite a
doença ao Homem, ao contrário do que temos
estado a ver para os outros agentes, mas esta
bactéria tem uma extrema resistência a
condições ambientais adversas, podendo persistir no leite de vacas, ovelhas ou cabras durante
muito tempo, e no solo durante meses a anos. No leite também pode resistir a alguns
tratamentos que possam ser feitos para a tentar eliminar do leite.

A bactéria atinge concentrações elevadas


na placenta do gado afetado. Pode levar
ao aborto espontâneo no gado (vemos na
imagem ao lado uma vaca a eliminar a
placenta). A contaminação dos solos, uma
vez que as placentas depois ficam no solo,
geram partículas que ao serem inaladas
são infeciosas, e esta infeção, ao
contrário das outras transmitidas por
carraça, não tem um padrão sazonal, ainda que por vezes estas outras infeções transmitidas
por carraça também apareçam sem ser no verão, como no caso que vimos daquele doente em
Évora.
A doença aguda da Coxiella burnetii é semelhante a um síndrome gripal (tem início abrupto,
febre alta, cansaço, mialgias, cefaleias, …), e geralmente é uma infeção auto-limitada, que se
resolve entre 1 a 3 semanas, portanto, prolonga-se um pouco mais do que uma gripe, ou,
melhor dizendo, que uma constipação; as complicações possíveis são hepatite ou pneumonia
(são raras mas ocorrem, por isso devemos estar vigilantes)).

A doença crónica é sobretudo uma endocardite subaguda, que é mais prevalente quando os
doentes têm comorbilidades (por exemplo, patologia cardíaca de base, imunossupressão, ou
quando as mulheres estão grávidas, … ou seja, se nestes casos há uma infeção por Coxiella
burnetii é mais provável termos depois este tipo de doença crónica). Pode iniciar-se meses a
anos após a infeção aguda (portanto é uma coisa que se pode declarar relativamente
rapidamente após a infeção aguda ou declarar-se muito mais tarde), e tem hemoculturas
“negativas” (portanto nós não conseguimos detetar a bactéria em circulação no sangue).

Diagnóstico
O diagnóstico faz-se por imunofluorescência indireta (IFA): na fase aguda queremos identificar
anticorpos IgG e IgM contra antigénios da fase II (portanto, a fase II tem a ver com a fase aguda
da infeção); na doença crónica queremos identificar anticorpos contra antigénios da fase I e
fase II, sendo os títulos dos anticorpos contra a fase I geralmente superiores. Também
podemos fazer a deteção dos anticorpos por ELISA.
Podemos usar PCR para deteção de DNA da bactéria, que faz-se apenas em laboratórios de
referência e apenas é útil na fase aguda, na fase crónica já não vamos conseguir detetar.
E podemos fazer a cultura, que também apenas se faz em laboratórios de referência, mas é
muito rara, ainda que atualmente já se faça em meios acelulares (antigamente nós tínhamos
que utilizar culturas de células para crescer esta bactéria, sendo que apesar desta bactéria ser
intracelular durante a infeção, já temos meios acelulares onde as podemos crescer no
laboratório, mas o crescimento é tão difícil e é tão complicado que apenas acontece em
laboratórios de referência).

Prevenção
A prevenção no gado faz-se pela vacinação, mas apenas em animais não infetados, nós não
podemos vacinar os animais infetados.
Tratamento
O tratamento faz-se com doxiciclina (tetraciclina) e hidroxicloroquina, que é um agente
alcalinizante e que esteve agora na moda por causa do SARS-CoV-2.

Nós poderíamos pensar que a Coxiella burnetii é apenas uma infeção de países
subdesenvolvidos, mas não é assim. Houve um surto muito grande na Holanda, entre 2007 e
2010. Vemos aqui, na imagem abaixo, o nº de casos por 100 mil habitantes, e vemos que há uma
grande concentração nesta região (olhar para a setinha no mapa da esquerda), e vemos que isto
coincide com o maior número de explorações caprinas (olhar para a setinha no mapa da direita)
(cabras para leite ou para consumo animal). Verificou-se que a transmissão vinha das cabras.
Não se pode vacinar animais infetados, e por isso o que se teve de fazer foi abater um enorme
nº de cabras para tentar controlar o surto.

O surto na Holanda aparece em 3 anos consecutivos, como vemos no gráfico em baixo: em 2007
temos um aumento do nº de casos ligeiro, em 2008 temos um aumento maior, e apenas em
2009 é que as autoridades de saúde realmente introduziram estas medidas, tão danosas do
ponto de vista económico, de abater as cabras, mas conseguiu-se com isso controlar o surto,
que teve um total de 4026 casos (é um dos maiores surtos conhecidos).
Para além da doença aguda, a Holanda
instituiu imediatamente um programa
para vigilância da doença crónica.
Vemos no gráfico ao lado os casos de
doença crónica.
Anteriormente ao surto (o surto foi
em 2008-2009) tínhamos poucos
casos de doença crónica, que
começam a aumentar em 2009. Em
2010 temos muitos casos de doença
crónica (a barra branca com pintinhas
corresponde ao número de casos de
doença crónica comprovados, a barra
completamente branca são os casos
prováveis e a barra preta com pintinhas brancas são os casos possíveis) com um número muito
elevado de casos comprovados, que depois tem um pico em 2011, e desde aí que os números
têm baixado. Ou seja, tem uma declaração sobretudo no primeiro ano ou nos poucos meses
depois da infeção aguda e depois tem vindo a baixar até 2016, altura em que o programa foi
extinto porque os números já estavam concordantes com os números observados
anteriormente ao surto. Isto foi uma maior vigilância de casos de patologia cardíaca, e de facto
o que se verificou foi que havia várias complicações, nomeadamente complicações vasculares e
de endocardites, com um número significativo de mortes, como podemos ver na figura abaixo.
Em baixo temos uma curva de Kaplan-Meier. Das pessoas que tiveram uma infeção sem foco
vemos quantas delas é que vieram a falecer no prazo de 400 dias, e são muito poucas. Mas
naquelas que desenvolveram endocardite, ou infeção vascular e endocardite, ou só infeção
vascular, temos uma mortalidade muitíssimo maior.

Conclusão: Na Holanda, após o surto de 2009-2011, dos 439 doentes diagnosticados com febre
Q crónica (portanto, com Coxiella burnetii, a febre Q é infeção de Coxiella burnetti), de 4016
casos agudos (são cerca de 10% dos doentes que desenvolvem a infeção crónica), a mortalidade
foi de 27% (118 doentes morreram), e destes 35% (54) tinham infeção vascular, 32% (27) tinham
endocardite, e 47% (20) tinham tanto endocardite como infeção vascular. A sobrevivência a 5
anos daqueles que tiveram febre Q crónica comprovada ou provável foi de 64% (portanto, uma
taxa de mortalidade muito significativa por parte desta infeção).
Data Docente
28/10/21 Prof. Doutor Thomas Hänscheid

Os fungos podem ser encontrados em muitos locais diferentes no meio ambiente e sua função
pode ser tanto positiva como negativa. É por considerado que têm uma distribuição ubíqua, não
esquecendo que podem ser patogênicos, mas também são essenciais na biodegradação de
matéria orgânica.

Na maior parte das vezes os fungos são oportunistas, ou seja, apenas causam patogenicidade
em casos específicos de comprometimento do sistema imune.

São sobretudo aeróbicos sendo que alguns são aeróbicos facultativos (fermentadores)
Um dos fungos mais particulares, e frequentes é o claviceps purpurea, associado à clivagem do
centeio, também conhecido como ‘’esporão do centeio’’.
Este fungo infecta o centeio. As sementes infectadas por fungos não são separadas antes do
processo de moagem. Neste caso, a farinha usada para fazer pão, o que causa intoxicações
alimentares e no passado causou intoxicações coletivas.
As toxinas mais proeminentes e potencialmente patogênicas são as toxinas alcaloides de
ergotamina (causa vasoconstrição e contração de músculos lisos. Estas propriedades são ainda
usadas em alguns fármacos. Esta toxina tem alguns efeitos psicotrópicos, o que chegou a ser
confundido no passado com casos de ‘’bruxismo’’.

Os fungos são seres eucariotas, que apresentam núcleo bem organizado (contido na membrana
nuclear) e mitocôndrias. A sua membrana celular é constituída por ergosterol e têm uma parede
celular constituída por quitina. Devido a isto, a maior parte dos antifúngicos têm como principal
alvo o ergosterol.

A maioria dos fungos são seres gram-positivos aeróbios. Comparativamente às bactérias, o seu
tempo de crescimento é elevado.
Por exemplo, para obter uma geração de mycobacterium são necessárias 18h, muitas vezes, os
fungos associam-se a bactérias.

Podemos considerar duas formas morfológicas: fungos filamentos e leveduras.

Um dos fungos mais perigosos, a nível patológico é o cryptococcus neoformans. Este fungo é
então o agente fúngico mais associado a meningites. Tem como reservatório natural os desejos
de pombos (pode haver inalação de esporos ou leveduras).

Pode também causar pneumonia; e em doentes imunodeprimidos pode causar meningite e


outras infecções generalizadas

Outro fungo com particular relevância é a candida albicans. A candidíase é bastante frequente;
sendo que tem como reservatório natural o humano (fezes, boca, vagina). Ou seja, trata-se de
agente fungo residente na flora do organismo e que sendo oportunista por encontrar forma de
desenvolver uma infecção.
A candidíase oral está mais relacionada com infeção por HIV ao passo que a candidíase vaginal
está mais relacionada com o tratamento com antibacterianos.
A candidíase sistêmica ocorre frequentemente por quimioterapia; e as infeções mais severas
podem mesmo conduzir a septicemias por candida, que tem um desfecho com mau prognóstico
(fatal).
Alertar ainda para uma estirpe de cândida emergente, isolada recentemente a cândida auris,
extremamente resistente.

Um aspecto a ter em consideração, relativamente a fungos, é que por norma estes são menos
resistentes (o que se relaciona com o alvo terapêutico; o ergosterol é fundamental para a
existência e multiplicação dos fungos).
É também importante considerar que os fungos requerem um cuidado relacionado com o seu
diagnostico especial. O diagnóstico é laboratorial, mas é fundamental que o laboratório seja
alertado quando se suspeita de uma amostra obtida por infecção fúngica: os meios de cultura
necessários são especiais, o tempo de incubação é superior e também são necessárias algumas
condições de incubação especificas (temperatura).
Data Docente
02/11/21 Prof. Doutor Thomas Hänscheid

O ar está inevitavelmente contaminado com fungos filamentosos; que são altamente


oportunistas. Os dermatófitos são fungos que atingem/colonizam a pele morta. Dermatófitos é
uma designação comum para um grupo de três géneros de fungos que causam infecções em
animais e humanos denominadas dermatofitoses. Os géneros das formas anamórficas destes
fungos são: Microsporum, Epidermophyton e Trichophyton.
Os dermatófitos causam infecções na pele, cabelo e unhas devido à sua capacidade de obter
nutrientes de matéria queratinizada. Estes organismos colonizam os tecidos queratinosos e a
inflamação é causada pela resposta do hospedeiro a subprodutos metabólicos. Geralmente a
sua ocorrência restringe-se à camada cornificada da epiderme devido à sua incapacidade de
penetrar tecidos vivos em hospedeiros imunocompetentes.

Os fungos podem ser divididos sobretudo em filamentosos e dimórficos.

Os fungos filamentosos (devido à presença de hifas) caracterizam-se por ter um micélio aéreo
(projeta-se para o exterior e é responsável pela esparolação) e um micélio vegetativo que se
desenvolve no substrato, penetrando-o e assim conseguindo captar nutrientes.

A identificação dos fungos filamentos é possível pelo micélio aéreo.


Como já foi referido, os fungos podem ser benéficos ou deletérios uma vez que podem causar
asma, alergias, irritações brônquicas, intoxicações alimentares (toxinas resistentes ao calor,
altas temperaturas). De realçar que as toxinas se disseminam pelos alimentos e que podem ser
encontradas nas ‘’partes limpas’’ dos alimentos, como é o exemplo do pão.
Por outro lado, é também relevante, considerar o seu papel farmacológico, uma vez que
produzem penicilina e cefalosporinas.

Algumas toxinas que são produzidas pelos fungos são apresentadas na tabela a baixo. Chamar
apenas a atenção para hepatoxinas (associadas a cancro do fígado)

Aspergilose: trata.se um uma infeção fúngica relevante e que acontece quando aspergillus
germina os alvéolos e contamina os vasos sanguíneos. Esta situação clinica é uma das grandes
complicações experienciadas por pacientes com COVID-19 internados em UCIs.

No caso de pneumonia, onde se colhe expetoração o diagnóstico e feito por imunocitoquímica.


Em pessoas saudáveis a presença de aspergillus é ‘’normal’’ mas não invade tecidos.

Apenas como curiosidade, a mucormycosis, infeção causada por mucorales, pensava-se


erradicada mas é agora considerada re-emergente, estando associada à COVID-19

Em relação aos fungos dimórficos, estes caracterizam-se por ter duas fases no seu ciclo de vida
distintas: uma fase em que se encontram na sua forma filamentosa (em que estão presentes no
meio ambiente) e uma fase em que assumem a forma de levedura (no corpo humano e em que
são extremamente patogênicos)

Em suma, podemos fazer o diagnóstico de infeções fúngicas utilizando vários métodos


nomeadamente:
1- Microscopia de produtos biológicos (pus, esparolação, etc)
2- Análise histologia (histoquimicamente)
3- Por métodos de cultura (já foram expressos os cuidados e características a ter em
atenção)

É também essencial tratar infeções fúngicas, e na sua maioria, utilizam-se fármacos que tem
como alvo terapêutico a parede celular dos fungos (rica em ergosterol)

Em casos de infeções graves, utiliza-se anfotericina B por via endo venosa, mas que possui
muitos efeitos secundários.

Utilizam-se também derivados de azóis:


Imidazol: clotrimazol, ketoconazol, miconazol (que podem ser via oral e endo-venoso) e que se
utilizam para tratar infeções sistêmicas (e que por isso tem espectro alargado) como infeções
urinarias, vaginite

Utiliza-se também o caspofungim e o anidulahungin para tratar infeções sistêmicas mais severas
(relacionadas com indivíduos imunocoprometidos por quimioterapia)
Data Docente
03/11/2021 Prof. Doutor Melo Cristino

Amibas

As amibas têm uma forma de vida como trofozoíto, uma forma ativa com mobilidade, e uma
forma de quisto, de resistência, que ao entrar no hospedeiro dá origem à forma vegetativa.

A principal amiba intestinal é a Entamoeba histolytica, a única que causa infeção no Homem, as
restantes são comensais, não estando demonstrada a sua patogenicidade para ser humano.

No entanto, é importante reconhecê-las para distinguir da E. histolytica e embora não causem


infeção no Homem, pode encontrar-se em individuos que ingeriram água ou alimentos
contaminados com fezes.

Nota: Dientamoeba fragillis não é uma amiba, é um flagelado (nomeação antiga)

Entamoeba histolytica:
Ciclo de vida:

-Os quistos eliminados nas fezes contaminam a água e os alimentos, diretamente ou através de
moscas.
-São ingeridos por outro hospedeiro (outro Homem), através da alimentação ou consumo de
água contaminada.
-Os quistos resistem ao pH ácido do estômago.
-No cólon (Intestino distal), o quisto
desintegra-se e dá origem à forma
vegetativa (trofozoítos), onde provocam as
principais lesões: ulceração com diarreias
sanguinolentas; invasão da mucosa do
cólon, podendo causar também infeções no
fígado, nomeadamente abcessos hepáticos
e cólicos.

- Formas morfológicas: trofozoítos (forma patogénica) e quistos (forma infetante)

- Ação patogénica: Disenteria amebiana e abcessos amebianos

- Habitat: intestino do homem (frequente zonas tropicais e sub-tropicais)

- Diagnóstico: pesquisa de trofozoítos (poucos minutos após recolha) ou quistos nas fezes;
pesquisa de antigénio nas fezes;
provas serológicas (invasão mucosa desencadeia uma resposta imunológica);
PCR

Outras amibas, não patogénicas (Distinguem-se pela morfologia e número dos nucleos e corpos
cromatóides):

• Entamoeba coli
• Entamoeba hartmanni
• Entamoeba polecki
• Endolimax nana
• Iodamoeba butschlii

Direita: trofozoítos
(1ª coluna: E.histolytica)
Esquerda: quistos
(1ª coluna: E.histolytica)
Flagelados

São protozoários que se movem através dos seus flagelos.

Dientamoeba fragilis
Pode causar diarreia não sanguinolenta, possui um flagelo, existe no cólon é aí que causa
infeção, sem invasão. Não se conhecem quistos deste protozoário, apenas formas vegetativas.
Como os trofozoítos se degradam facilmente é dificil perceber como se dá a transmissão, uma
das hipótese seria que o protozoário consegue penetrar num ovo de um helminta (Enterobius
vermicularis). O Professor nunca identificou este protozoário,por isso pressupõe-se que é muito
raro.

- Formas morfológicas: trofozoítos


- Ação patogénica: síndrome diarreico
- Habitat: Intestino do Homem, porco e gorila
-Diagnóstico: pesquisa de trofozoítos nas fezes (infeção simultânea com Enterobius vermicularis)

Giardia intestinalis/lambdia
Protozoário intestinal + frequente no nosso pais (está presente em todo o mundo).

- Formas morfológicas: trofozoítos (forma ovóide com 4 pares de flagelos e 2 núcleos), forma
quística (contamina água/alimentos)
- Ação patogénica: diarreia ou síndroma de má absorção (crianças); portadores assintomáticos;
agente frequente de diarreia do viajante;
não invade, adere à mucosa e perturba a absorção (ID proximal)

- Habitat: intestino de animais herbivoros domesticos e selvagens; água doce (lagos e rios)
-Diagnóstico: pesquisa de quistos nas fezes (várias amostras devido a eliminação intermitente);
trofozoítos no aspirado duodenal;
antigénio nas fezes (ELISA ou testes imunocromatográficos);
PCR
- Profilaxia: evitar ingestão de água e alimentos contaminados (viajantes devem ferver água
antes de ingerir; garantir um bom funcionamento dos filtros da rede de distribuição de água)
Quistos

Trofozoítos

Trichomonas vaginalis: (protozoário urogenital)


Não provoca diarreia; é um protozoário flagelado que causa infeção genital sexualmente
transmissível (uretrite -> homem; vaginite -> mulher), podem ser assintomáticos
(principalmente o homem)

- Forma morfológica: trofozoítos

- Habitat: Homem

- Transmissão: sexual

- Ação patogénica: causa infeção genital sexualmente transmissível:


o Uretrite/prostatite -> homem
o Vaginite -> mulher
o Podem ser assintomáticos (principalmente o homem)

- Diagnóstico: pesquisa de trofozoítos no exsudado vaginal ou uretral


(tamanho=1 leucócito)
PCR
Ciliados
Movem-se pela ação de cílios.

Balantidium coli
Vive no porco e pode acidentalmente ser transmitido ao Homem
- Formas morfológicas:Trofozoito (intestino do porco) -> Excreção nas fezes como quisto ->
ingestão pelo Homem

-Ação patogénica: disenteria balantidiana (diarreia sanguinolenta)

- Habitat: intestino do porco

- Diagnóstico: pesquisa de trofozoítos e quistos nas fezes

2 trofozoítos + 1 quisto (esq -> dta)

Coccídeos

São protozoários com ciclos evolutivos mais complexos e estão associados à indivíduos
imunossuprimidos.

Cystoisospora belli:
Ciclo de vida:
- Homem ingere um oocisto (resultam da
componente sexuada do ciclo de vida do parasita).

- Oocisto rompe e liberta os esporozoítos que


parasitam as células do intestino delgado proximal.

- Nas células passam para a forma de esquizonte


(esquizogonia) e libertam os merozoítos do seu
interior.

- Os merozoítos podem infetar novos enterócitos ou


diferenciarem-se em gâmetas masculinos
(microgametocíto) e femininos (macrogametocito) -
> fertilizam: oocisto.
- Quando são eliminados nas fezes, os oocistos são imaturos e no exterior (1-2 semanas) ocorre
a sua maturação, tornando-os aptos para infetar um novo hospedeiro.

- Formas morfológicas: trofozoítos, esquizontes, gametocitos (forma patogénica) e oocistos


(forma infetante)

- Ação patogénica: diarreia ou síndroma de má absorção; diarreia grave e prolongada em


imunocomprometidos (SIDA), pode cursar com portadores assintomaticos

- Localização intestinal: intracelular

- Habitat: intestino do porco

- Diagnóstico: pesquisa de oocistos nas fezes

- Profilaxia: melhoria das condições sanitárias e de higiene pessoal

- Terapêutica: co-trimoxazol

Cryptosporidium:
Dimensões menores que Cystoisospora belli

- Ciclos de vida semelhantes: única diferença é que os oocistos excretados já se encontram na


sua forma matura, o que facilita a transmissão.

- Espécies: C.hominis (apenas existe no hHomem); C.parvum

- Formas morfológicas: trofozoítos, esquizontes, gametocitos (forma patogénica) e oocistos


(forma infetante)

- Ação patogénica: diarreia auto-limitada nos imunocompetentes, diarreia grave e prolongada


nos imunocomprometidos, portadores assintomáticos

- Localização inestinal: intracelular mas extracitoplasmatica, por baixo da membrana celular (ver
imagem abaixo)

- Habitat: hominis (intestino do homem), parvum (intestino de animais-mamiferos, repteis,


peixes → zoonose)
- Diagnóstico laboratorial: pesquisa de oocistos nas fezes, antigénio nas fezes (ELISA,
imunoflorescência direta), PCR

- Profilxaia: melhoria das condições sanitárias e higiene pessoal, consumo de água potável
Cyclospora cayetanensis:
Possui semelhanças ao Cryptosporidium , nomeadamente no ciclo de vida
Exclusivo do homem, atinge tubo digestivo, nomeadamente o cólon.
- Formas morfológicas: trofozoítos, esquizontes, gametócitos (forma patogénica) e oocistos
(forma infetante); ciclo evolutivo nas células epiteliais da mucosa

- Ação patogénica: diarreia do viajante, autolimitada nos imunocompetentes, diarreia grave e


prolongada nos imunocomprometidos, só encontrado em humanos
Data Docente
03/11/2021 Prof. Doutor Melo Cristino

Nesta aula, vamos falar sobre


protozoários do sangue,
especialmente o mais importante de
todos, o agente da malária, o
Plasmodium spp..
A malária é uma doença
tropical e subtropical, que atinge
quase todos os continentes (exceto a
Austrália), de forma endémica (no
mapa, mesmo nos países que
aparecem como não apresentando
casos, existem doentes frequentes de
malária, devido às viagens e migração
para zonas endémicas).
Mesmo em Portugal, que não tem malária endémica há muitas décadas, é raro o mês
onde não se diagnostique 4-5 casos de malária (no HSM). Devido à pandemia, têm havido menos
casos, pois houve uma diminuição das viagens, tanto dos portugueses a viajarem para países
endémicos (por exemplo, África), como pessoas destes países viajarem a Portugal. Com o
levantar das medidas de controlo da pandemia, será de esperar um aumento, novamente, dos
casos de malária em Portugal.

A malária é uma doença transmitida por um vetor (artrópode que ativamente transporta
o agente infecioso). Neste caso, o
agente infecioso é o Plasmodium, e
o artrópode transportador é um
mosquito do género Anopheles (a
fêmea, porque é a única que se
alimenta de sangue; o macho
alimenta-se de sucos vegetais, de
plantas, pelo que não pica o
Homem). Se repararem, o
Anopheles cria um ângulo agudo
com a superfície em que está
pousado, ao contrário de outros
mosquitos que aterram
paralelamente à superfície.

O ciclo evolutivo da malária é bastante complexo: é um coccídeo como os protozoários


intestinais (falados na aula anterior). Têm uma componente sexuada e uma componente
assexuada (neste caso, a fase assexuada passa-se no Homem e a fase sexuada passa-se no
mosquito).
Começando pela parte humana:
1. O mosquito pica o Homem
para fazer uma refeição de
sangue;
2. Ao picar, inocula o Homem
com esporozoítos, que são a
forma infetante do Plasmodium,
encontrados nas glândulas
salivares do mosquito e
libertados em conjunto com a
saliva (a saliva é injetada para
impedir a coagulação do sangue
ao ser aspirado pelo mosquito);
3. Os esporozoítos encontram-se
na nossa corrente sanguínea, e
atravessam primeiramente o
fígado, onde passam pelo ciclo
exo-eritrocitário (está noutra
aula);
4. Depois deste ciclo hepático,
que ocorre ainda com o
paciente assintomático, a partir
do momento em que se
libertam os merozoitos do
esquizonte hepático, os
merozoitos vão infetar os
eritrócitos circulantes, dando
origem a uma forma morfologia,
o trofozoíto (forma em anel) –
representa o início da
sintomatologia (febre);
5. O trofozoito vai evoluir para
um esquizonte (uma forma com
várias células), que rebenta e liberta merozoitos, que vão repetir todo este ciclo.
Algures neste ciclo, os trofozoitos diferenciam-se em células sexuadas (masculina –
microgametócito; feminina – macrogametócito), que vão dar continuidade ao ciclo evolutivo.
No Homem, as células sexuadas não têm nenhum destino particular, sendo degradadas. Mas, se
o mosquito picar o Homem, e o Homem tiver malária, o inseto ingere todas as formas
morfológicas em circulação, das quais apenas as células sexuadas vão dar continuidade ao ciclo
evolutivo dentro do Anopheles fêmea. As células sexuadas, dentro do mosquito, acabam por se
fertilizar e originar o oocisto, que, depois de amadurecer, liberta os esporozoítos que migram
para as glândulas salivares do mosquito. Quando o mosquito voltar a picar outro humano,
recomeça todo o ciclo.

Como é que nós fazemos o diagnóstico laboratorial da malária? Sobretudo por observação do
sangue periférico.

Existem duas técnicas possíveis, normalmente complementares: gota espessa (técnica que
permite concentrar maior quantidade de sangue, onde temos de destruir os eritrócitos, vendo
apenas o que está no seu interior) e esfregaço fino (técnica normal com que se observa o nosso
sangue, por exemplo, para hemogramas – espalhamos o sangue numa lâmina de modo a
conseguirmos ver células individualizadas ao microscópio).

Coramos o sangue com um dos corantes habituais adequados (Giemsa…). Este é o exemplo de
como podemos ter numa mesma lâmina as duas técnicas.

A gota espessa permite observar muito mais eritrócitos à procura de parasitados do que o
esfregaço, mas perde-se a relação do eritrócito com o parasita, que vamos ver que é de grande
importância para a identificação das espécies.
No esfregaço fino, como podemos ver, já se conseguem ver as relações dos plasmódios com os
eritrócitos (eritrócitos parasitados, estruturas típicas de plasmódios).

O diagnóstico também pode ser feito por testes de antigénio


(imunocromatográficos) – existem testes, como por exemplo, o da
imagem à esquerda, que diz PF (Plasmodium falciparum, espécie
principal) e PAN (todas as outras), e a da direita, que só permite
identificar o PF.

Este teste pode ser bastante conveniente para certas zonas de


África, onde não existe um bom acesso a corrente elétrica para que
se possam usar os microscópios, sendo uma alternativa de fácil
execução e rápida leitura, que permite fazer o diagnóstico com
uma boa especificidade, quando as condições não são as mais
adequadas para a microscopia.

Há várias espécies causadoras de malária no Homem. Como é que as podemos diferenciar?


Através dos eritrócitos parasitados (tamanho, granulações, forma, intensidade do parasitismo)
e dos parasitas (trofozoitos, esquizontes, gametócitos, intensidade do parasitismo).

Há, atualmente, quatro espécies de plasmódio infeciosas exclusivas ao Homem: Plasmodium


malarie (mais antigo e mais adaptado ao Homem), Plasmodium vivax, Plasmodium ovale,
Plasmodium falciparum (mais importante, responsável pelos quadros de malária mais graves).
Há um quinto, Plasmodium knowlesi, um plasmódio dos macacos, que existe na Ásia, e que
pode, acidentalmente, transmitir-se ao Homem (zoonose).
• Plasmodium falciparum: os trofozoitos são muito bem desenhados, muito anelares,
muitas vezes binucleados (há casos de vários parasitas num mesmo eritrócito); muitas
vezes, o esquizonte não se vê no sangue periférico (quando aparecem é um sinal de
muito mau prognóstico), aparecendo mais nos vasos profundos (muitos núcleos no seu
interior); os gametócitos são típicos deste plasmódio (forma de banana/foice [daí o seu
nome]).

Fig. Estágios do Plasmodium falciparum: (1) Eritrócito normal; (2)-(18)


Trofozoítos [(2)-(10) Trofozoítos anelares]; (19)-(26) Esquizontes [(26)
Esquizonte em rutura]; (27),(28) Macrogrametócitos; (29),(30)
Microgametócitos
• Plasmodium vivax: os trofozoitos têm uns contornos muito menos bem definidos, com
granulações típicas (também existem no ovale), tendo preferência por eritrócitos mais
jovens e maiores, os reticulócitos; os esquizontes já se observam em circulação na
periferia, com um grande número de núcleos; os gametócitos só têm um núcleo.

Fig. Estágios do Plasmodium vivax: (1) Eritrócito


normal; (2)-(6) Trofozoítos jovens; (7)-(18)
Trofozoítos anelares; (19)-(27) Esquizontes; (28),(29)
Macrogrametócitos; (30) Microgametócitos
• Plasmodium ovale: é muito parecido ao vivax, mas, normalmente, os eritrócitos
parasitados adquirem uma forma ovaloide, com uma estrutura franjada, numa das
pontas; também tem granulações típicas; também se encontram em circulação; os
esquizontes têm menos núcleos que os do vivax; também tem preferência para
reticulócitos.

Fig. Estágios do Plasmodium ovale: (1) Eritrócito


normal; (2)-(5) Trofozoítos jovens anelares; (15)
Trofozoitos; (16)-(23) Esquizontes; (24)
Macrogrametócitos; (25) Microgametócitos
• Plasmodium malarie: transita em eritrócitos de pequenas dimensões; o trofozoito vê-se
bem, e tem uma estrutura que parece formar uma faixa em banda equatorial ao longo
do eritrócito (muito sugestivo, mas nem sempre presente); os esquizontes têm poucos
núcleos; também aparecem em circulação periférica.

Fig. Estágios do Plasmodium malarie: (1) Eritrócito normal; (2)-(5)


Trofozoítos jovens; (6)-(13) Trofozoítos; (14)-(22) Esquizontes; (23)
Gametócito em desenvolvimento; (24) Macrogrametócitos; (25)
Microgametócitos
• Plasmodium knowlesi: semelhante ao malarie (disposição em faixa de banda) e
falciparum (multiparasitismo).

Fig. Estágios do Plasmodium knowlesi: (1) Eritrócito normal; (2)-(9)


Trofozoítos jovens; (10)-(12) Trofozoítos em desenvolvimento; (13)-
(15) Trofozoítos; (16)-(23) Esquizontes; (24) Macrogametócito; (25)
Microgametócito
O diagnóstico diferencial é feito através da análise do conjunto, ou seja, temos de ver vários
eritrócitos parasitados para chegar a uma conclusão. Existem sinais indiretos que podemos
utilizar quando a quantidade de parasitas ainda é muito baixa para serem identificados: o
pigmento malárico (hemozoína – pigmento de brilho metálico que resulta da fagocitose por
células fagocitárias) nos neutrófilos e/ou monócitos; a trombocitopenia; já a anemia e a
leucopenia não são sugestivas de malária, ainda que possam acompanhar a infeção.

Como é que se faz a profilaxia na malária? Temos várias componentes – uma é o controlo dos
vetores (aquilo que devemos fazer quando nos dirigimos para zonas endémicas), com
inseticidas, repelentes de insetos (sobretudo na madrugada e ao fim da tarde), redes
mosquiteiras, vestuário adequado (comprido, que cubra ao máximo as zonas do corpo mais
expostas) e drenagem de águas estagnadas (são os locais onde os mosquitos põem os ovos);
Depois, quando nos deslocamos para uma zona endémica num período curto de tempo, há
indicação para quimioprofilaxia (administração de um fármaco anti-malárico a uma pessoa que
não está doente, para que, quando estiver no período de exposição numa zona tropical, haja
quantidade suficiente desse fármaco na corrente sanguínea que consiga destruir os
esporozoítos logo no momento em que ocorrer a inoculação no indivíduo), com, por exemplo,
cloroquina/mefloquina/doxiciclina. A vacina está em estado avançado de desenvolvimento.

Outro parasita do sangue importante é a Babesia spp, que tem um ciclo evolutivo diferente do
plasmódio. É um parasita do rato, habitualmente, e que é transmitido por picadas de carraça,
que, estando infetada depois de picar o rato, se picar o ser humano, pode transmitir a babesiose.
Como podem ver, há trofozoitos nos eritrócitos, como existiam na malária.

Os casos desta doença são mais descritos nos Estados Unidos. Em Portugal, não costuma haver
este tipo de infeções.
Data Docente
04/11/2021 Prof.ª Doutora Maria Mota

Hoje, em novembro de 2021, temos de nos questionar, realmente, porque é que nós
continuamos a falar de malária. O facto de as doenças infeciosas serem causadas por um agente
que vem de fora foi uma ideia que surgiu no séc. XIX. A higiene, o desenvolvimento de vacinas
e o desenvolvimento de antibióticos, introduzidos nesta altura, foram algo que nos fez mudar
como seres humanos à face da Terra. Provavelmente nada teve tanto impacto como as vacinas,
mas fez algo mudar (ex.: esperança média de vida na transição para o séc. XIX no mundo inteiro
de 29/30 anos e neste momento é de 80 anos). Claro que nem tudo foi apenas as vacinas e os
antibióticos, mas, provavelmente, o ganho de vida entre 29/30 anos e aquele que é depois 60/70
anos é praticamente todo dado com isso.
Portanto, tivemos uma forma de estar completamente diferente na vida. Deixou de haver,
praticamente, mortalidade durante primeiros anos de vida e, obviamente, as pessoas vivem até
ao final da sua vida sem grandes problemas, um pouco por causa disso.

No entanto, temos doenças infeciosas das quais estão aqui connosco e ainda têm um impacto
brutal no ser humano, e uma delas é a Malária.
No caso da malária, os números que existem e que são mais claros são após a 2º Guerra Mundial.
Mas nós sabemos que esses números são uma estimativa do que acontecia.

O que vocês estão a ver aqui (gráfico)


são o nº de mortos por malária (em
milhões) ao longo do tempo (1950 - dias
de hoje), por continentes.

Após a 2º GM, fizemos uma grande campanha global, liderada pela OMS, para a irradicação de
Malária. Nós já conhecíamos o parasita da malária, desde a transição do séc. XIX para o séc. XX
e já sabíamos que era transmitido por um mosquito. No entanto, demorou todas estas décadas
para pensarmos que teríamos condições para tentar erradicar a malária do mundo. Foram feitas
algumas campanhas menores em partes específicas do mundo, uma vez que a incidência era
diferente, mas esta campanha à escala mundial surgiu porque a Malária já estava em todo o
lado (só para terem noção, todos os estados dos EUA reportaram malária à exceção do Alasca),
obviamente com diferentes incidências.

Nós tivemos malária até 1958, ano em que foi considerada erradicada de Portugal.

As campanhas foram muito bem-sucedidas na Europa. A malária foi erradicada localmente na


Europa e América do Norte, ficou residual na América do Sul. Obteve-se um sucesso enorme na
Ásia, apesar de estarmos longe da erradicação. Mas o que é certo é que teve um impacto muito
baixo em África.
Geralmente quando se tem algum sucesso ou bastante sucesso, temos a tendência de nos
“sentar à sombra da bananeira”. E o que é certo, é que essa campanha foi vista como muito
bem-sucedida por vários cientistas (se lerem reviews dessa época as pessoas achavam que era
uma questão de tempo e deixava de haver parasita da malária – nunca aconteceu).

A malária nunca foi erradicada por várias razões, mas principalmente porque as ferramentas
que estávamos a usar nesta altura, que era o inseticida DDT (usado e criado durante a 2ºGM) e
a cloroquina (fármaco fantástico que matava o plasmódio de uma forma muito eficaz),
tornaram-se ineficazes quando começaram a surgir parasitas resistentes à cloroquina e
mosquitos resistentes a este inseticida.

O que é certo é que, a seguir aos anos 70, deixou de ser um problema para a América do Norte
e Europa e, obviamente, acalmou tudo. Com isto, tivemos casos a ressurgirem na Ásia e pensa-
se que a África viveu, a seguir à década de 70, um muito maior número de casos à data
observado. Não temos noção do quanto estes números são reais (estimativas), mas o que é
certo é que atingimos, no final do séc. XX, um número de casos em África que nunca tinha sido
visto. Claro que a população sofreu uma explosão, o que contribui para o aumento de casos.
Mas o que é certo é que esta campanha nunca teve efeito.

Deste modo, na transição do século, uma nova campanha foi posta no mundo, de uma forma
muito mais global que a anterior. Claro que o mundo se encontrava muito diferente. Cinquenta
anos depois não tinha nada a ver em termos de tecnologia, ciência, etc…
Esta foi uma campanha global que envolveu, não só entidades nacionais, OMS, mas entidades
que foram criadas por muitos fundos privados. Obviamente tudo isto teve um impacto enorme.
Uma fundação privada foi criada com uma quantidade de financiamento nunca antes vista no
planeta: Fundação Bill e Melinda Gates, e que tinha como objetivo erradicar 3 doenças
infeciosas: malária, SIDA e tuberculose. A ideia era erradicar:
• o plasmódio, o agente que causa a malária
• o HIV
• Mycobacterium tuberculosis

Falando especificamente da malária, a verdade é que puseram em marcha uma campanha de


erradicação e foi muito bem-sucedida nos primeiros 15 anos. Hoje em dia calcula-se que
ultrapassa os 50% o declínio de mortes por malária e foi visto como algo extremamente bem-
sucedido. As pessoas começaram a pensar “Uau, é desta vez que isto vai acontecer!”, mais uma
vez.
Agora estávamos a conseguir ter um impacto enorme também em África. A verdade é que, já
não tínhamos a cloroquina nem o DDT, mas tínhamos outras ferramentas muito parecidas já
criadas na década de 60/70/80:
• Artemisinina, fármaco incrível que foi descoberto por uma cientista chinesa nos anos
60/70, extremamente eficaz. É construído com combinações de outros fármacos, que
são alteradas de região para região
• Deixou de ser usado a técnica de aviões enormes que “largavam” inseticida devido ao
impacto ambiental, para usarmos inseticida de duas formas muito localizadas mais
muito eficientes:
o IRS (“indoor residual spraying”): pessoas que levam o inseticida numa maleta e
atuam dentro das casas e fazem o spray em locais que sabem que os mosquitos
gostam de estar (fissuras, águas paradas,…)
o ITN: redes mosquiteiras usadas para cobrir as camas que são impregnadas com
inseticida. Têm um lado mecânico, impedindo que o mosquito atinja a pessoa
que está na cama, e um lado com inseticida que faz com que o mosquito não
volte a atacar porque é morto.

No entanto, o que começamos a observar desde 2015, foi um plateau com uma certa tendência
de crescimento, quer do número de mortes, quer do número de casos de malária, ao longo
destes últimos anos.
A razão de isto estar a acontecer não é logo entendível de imediato. Obviamente, está a começar
a surgir algumas regiões, primeiramente na Ásia e agora em África, de resistência à Artemisinina.
Pensamos que essa ainda não é a razão principal para se estar a observar isto, mas o que é certo
é que todas as medidas que nós temos levam a um cansaço da população.

Nas populações é muito difícil manter estes IRS e ITN, ano após ano. Além disso, se o número
de mortes começa a diminuir, há uma tendência de descanso, e obviamente, acalmam-se as
medidas. Provavelmente, serão estas as razões.

O que é certo é que a comunidade chega à conclusão que nós precisamos de novas medidas,
novas soluções, novos fármacos e de uma vacina, para podermos controlar e diminuir o número
de mortos (ainda temos meio milhão de crianças <5 anos que morrem todos os anos).

Este ano foi pela primeira vez recomendado pela OMS uma vacina contra a malaria. Está cá
connosco desde 2012/2013, mas mesmo antes da pandemia foi autorizado para ser testado em
algumas regiões de África de uma forma muito controlada e em pequenos casos. Também em 3
países já foi administrada de forma mais generalizada e mostrou-se muito segura. O único
problema é que é muito pouco eficiente: apenas cerca de 30% de proteção contra malária. Ou
seja, precisamos de novas soluções.
E se alguns estão a desenvolver novas vacinas, outros estão a desenvolver novos fármacos. Nós,
o nosso laboratório e vários no mundo, achamos que nós ainda não percebemos bem a
patogénese da malária. E a ideia é: se nós não compreendemos bem o nosso inimigo, vai ser
muito difícil combatê-lo.
Portanto, o que vou vos trazer aqui são algumas ideias que estão a ser desenvolvidas no nosso
laboratório e depois falo-vos do que é que está a ser feito no mundo.

Malária:
A malária em si é uma doença que surge quando uma parasita, o plasmodium, infeta eritrócitos
no nosso sangue. Muitas vezes sem tratamento, o nosso sistema imune parece conseguir
controlar a multiplicação, mas em alguns destes casos este parasita simplesmente infeta os
eritrócitos, multiplica-se em 20 ou 30 parasitas e continua-se a multiplicar, e cada um volta a
multiplicar-se em 20 ou 30. Milhões e milhões das nossas células vermelhas são infetadas, mas,
acima de tudo, cria uma resposta inflamatória tão forte no nosso organismo que estas pessoas
acabam por sucumbir e morrer.

A verdade é que nós temos cerca de 200 milhões de novas infeções todos os anos e temos cerca
de 400 mil/500 mil crianças que morrem. Ou seja, a grande maioria das pessoas sobrevive, mas
ainda há um número considerável de mortes.

Uma pergunta que as pessoas têm muito é: porque é que uns indivíduos sobrevivem e outros
não? Obviamente, como vocês imaginam, é uma pergunta tão básica que imediatamente é
daquele tipo de perguntas que quando surge uma doença infeciosa e nós vemos que, numa
aldeia, uma determinada família que já foram infetados todos, mas não morrem ou nunca
sequer foram infetados, enquanto há outros que são infetados e morrem todos, é uma das
perguntas mais feitas e há várias razões para que se isso aconteça.
A malária é uma doença tão importante no mundo, que moldou a genética do ser humano, e
algumas das mutações mais persistentes no genoma humano, sejam elas G6PD mutation ou
mutações hemoglobina A, são porque conferem uma proteção contra a malária severa e contra
a morte por malária. Sabemos que pessoas com este tipo de mutações raramente ficam doentes
por malária, apesar de poderem ser infetadas. E, por isso, elas foram mantidas no nosso genoma
e há uma assinatura da malária que está connosco desde sempre.

Mas também sabemos que isto não explica tudo. Quando se procura no ser humano razões para
as quais umas pessoas desenvolvem maior severidade à doença, fazem-se correlações. A maior
correlação que existe entre severidade da malária e algo que acontece (nível patológico) é a
quantidade de parasita que existe no organismo desses pacientes.

O que vocês vêm, nesta publicação de 2013,


são quadros de pessoas que:
• estão infetadas, mas não têm
sintomas (asymptomatic),
• têm sintomas, mas nada muito grave
(uncomplicated malaria)
• casos muitos severos (severe
malaria).
O que vocês têm no eixo do x é a quantidade
do parasita no organismo. E o que nos vemos
é que há uma correlação entre a quantidade de parasita com a maior
severidade destes casos. E, portanto, não é de estranhar, uma vez que temos um agente exterior
que nos causa doença, quanto mais ele está presente → mais doença ele causa.

Só que, o que é que faz um parasita estar mais presente ou menos presente?
Um deles pode ser que termos estirpes de parasitas que se multiplicam mais ou menos.
Maior multiplicação → maior virulência.
Mas também temos o facto do nosso sistema imune ser ou não capaz de controlar a infeção.
Ambas estas razões dependem da genética do parasita e/ou da nossa capacidade de resposta,
ou seja, da nossa genética.

O que eu vos quero mostrar é que nem sempre é apenas isso. Nós tivemos um estudo em que,
no fundo, fez uma prova de conceito de nós podemos ter o mesmo parasita a infetar exatamente
a mesma pessoa, mas em dias diferentes esta parasita torna-se mais ou menos virulento,
conforme o ambiente (depende da quantidade de nutrientes e energia → favorecem a sua
multiplicação). Estas experiências foram feitas em ratinhos.
• RATINHO 1 (gordinho): tem uma dieta
normal, come tudo o que quer, quando
quer.
• RATINHO 2: come apenas 70% das
calorias do ratinho 1, dieta super
saudável. Este ratinho vive mais 50% do
que o ratinho 1, se mantiver esta dieta.

Após 2 semanas, estes ratinhos são infetados.


Ao fim e um/dois dias do parasita estar em
circulação no ratinho 1, o parasita multiplicou-
se muito mais e, portanto, está muito mais
presente em todo o organismo do que no
ratinho 2.

Tínhamos aqui 2 hipóteses:


• O parasita replica-se mais ou menos porque há ausência ou presença de um
determinado nutriente essencial à sua multiplicação;
• O hospedeiro tem tudo, mas o parasita percebe que o hospedeiro tem menos energia
e o parasita decide não gastar todas as suas reservas energéticas neste hospedeiro.

E, entre estas duas hipóteses, a verdadeira é a segunda. O parasita ativamente escolhe dividir-
se em mais ou menos. E como sabemos isso? Nós descobrimos qual é o sensor. O parasita tem
um sensor que deteta o estado nutricional do hospedeiro.

O que vocês têm neste gráfico é exatamente isto. Em que o que estamos
a quantificar é em cada célula vermelha, quantos parasitas é que se
multiplicam em cada ciclo. Se nós tivermos a dieta do Ratinho 1, o
parasita multiplica-se de uma maneira. Se tivermos a dieta do ratinho 2
(restrição calórica), o parasita multiplica-se menos. Mas isto é para um
parasita que tem tudo. Mas quando nós descobrimos este sensor, se
nós fizermos a experiência pra um parasita que é geneticamente
alterado e lhe tirarmos este sensor, o parasita multiplica-se exatamente
da mesma forma independentemente da dieta onde está. Isto implica
que o parasita, nas condições de baixos nutrientes não multiplica, não
porque não consegue, mas sim porque decide ativamente multiplicar-
se menos.
Claro que as pessoas perguntam: mas porque é que o parasita faz isto? Não é o parasita, todas
as células de todos os organismos que existem à face da Terra, têm esta capacidade de detetar
um dia a comer menos ou não comer mesmo, e entrar neste modo de poupança de energia.

Isto foi para vos mostrar esta mudança conceptual. Antes pensávamos que única correlação era
a capacidade do parasita de se multiplicar mais ou menos, mas também tínhamos a noção que
havia algo na nossa genética que, sendo nós capazes de controlar mais ou menos o número de
parasitas, simplesmente nós poderíamos ir num caminho de maior ou menor severidade da
doença. O que nós vemos aqui é um conceito diferente que exatamente no mesmo parasita e
no mesmo hospedeiro, mas que dependendo do ambiente e da capacidade energética
disponível, simplesmente este parasita tem a capacidade de decidir se se multiplica mais ou
menos, portanto, se se torna mais ou menos virulento.
Há 2 razões principais para nós nos preocuparmos com isto:
• Se nós descobrirmos esta antena que faz com que o parasita se multiplique, podemos
manipulá-la, através de fármacos, para que esta sinta que está sempre num ambiente
pobre → menor replicação → menor virulência
• O parasita que é eucariota (ou seja, já nem é nem um vírus nem uma bactéria; já é um
organismo desenvolvido com muitas capacidades) e que vive à custa de outro tem uma
grande capacidade de adaptação e, portanto, nós temos de pensar que o parasita tem
a capacidade de detetar nutrientes, provavelmente também vai ter sensores para
detetar resposta imune, presença de fármacos, etc… É algo que nos faz pensar que o
parasita pode ter ou não a capacidade de identificar tudo o que nós introduzimos no
sistema e adaptar-se a ele. Isto faz com que todas as estratégias que temos contra o
parasita tenham os seus dias contados.

Para além de nem todos os indivíduos morrem quando infetados com a malária, a verdade é
que, dos que sucumbem à doença, nem todos morrem da mesma forma. A malária causa vários
tipos de morte e vários síndromes/doenças que podem levar à morte. Os mais frequentes são:
• Malária cerebral:
o Hoje em dia questiona-se se é a principal causa de morte
o Síndrome neurológico
em que as crianças
chegam, ainda estão ok
(brincam, correm, etc.),
mas dentro de pouco
tempo deixam de
reconhecer a mãe e,
rapidamente, entram
em coma e acabam por
morrer
• Síndrome de stress respiratório
o Pode ser 2 tipos
▪ Causado pela
acidose que
existe durante estas infeções
▪ Forte resposta inflamatória nos pulmões que fazem com que estes
deixem de funcionar
• Anemia severa
o Há quase um parar da produção de eritrócitos, levando à morte por anemias
severa.

Nós temos usado, no nosso laboratório, modelos animais para estudar a razão porque é que uns
morrem com uma coisa e outras morrem com outra. Apesar de não ser exatamente o que se
passam em humanos, são uma ferramenta fantástica que nos permite manipular e perceber o
que exatamente o que acontece. E tal como nos seres humanos que foram mostradas certas
correlações, os modelos animais provam que o morrer com um ou outro depende quer da
genética do parasita, quer da genética do hospedeiro.
E aqui dou-vos 2 exemplos: os mesmos ratinhos, C57, se forem infetados com o mesmo número
de parasitas, mas de duas estirpes diferentes de parasitas:
o Um desenvolve um síndrome
neurológico – 5% destes ratinhos morre
com síndrome neurológico, são visíveis
grandes hemorragias, resposta
inflamatória enorme, cérebro inchado
(imagem 2)

o Um desenvolve um síndrome de
stress respiratório, onde vemos o
tecido pulmonar com uma resposta
inflamatória brutal (imagem 2)

No entanto, sabemos que também depende do hospedeiro, porque agora temos exatamente a
mesma estirpe de parasita, P. berghei ANKA, mas com duas espécies diferentes de ratinhos
→ C57 morre com síndrome neurológico e DBA morre com síndrome de stress
respiratório.

Nós ao longo do tempo fomos mostrando que existem moléculas de hospedeiro que podem
estar na base desta heterogeneidade:
• enzima Heme oxygenase-1 (HO-1) protegia os ratinhas da malária cerebral;
• VEGF (fator de angiogénese) pode estar na base deste stress respiratório.

Na nova campanha (falada no início), foi observado que as redes mosquiteiras não tiveram um
impacto só nas mortes por malária, mas também na redução da mortalidade infantil em geral.
Conclui-se então que à uma grande predisposição de crianças com infeção por malária para
outros tipos de bacteriémia. Ou seja, tu tens malária e, portanto, tens uma predisposição para
teres infeções por outros tipos de bactérias que podem levar à morte.

Consequentemente, pensámos que o ser humano, os mamíferos e grande parte dos organismos
à face da Terra, para além das suas células, têm muito mais células não-humanas (no caso do
ser humano), que são células de bactérias presentes em vários órgãos (principalmente tubo
digestivo). O que acontece é que estas crianças com malária, provavelmente, a doença provoca
uma diferente “barreira” no intestino para bactérias que normalmente estão presentes mas não
causam doença → bacteriémia que pode levar à morte.

De seguida, fomos testar em ratinhos com os modelos necessários: não vamos pensar só num
tipo de síndrome, vamos pensar no síndrome neurológico e de stress respiratório. E é para vos
mostrar que os animais morrem exatamente ao mesmo dia, com exatamente o mesmo tipo de
parasitémia (parasitas no sangue), mas morrem com síndromes completamente diferentes.

Desta forma, uma outra experiência que o nosso laboratório fez foi pensar: vamos ter ratinhos
germ-free, completamente assépticos (sem qualquer bactéria no seu organismo), e vamos
infetá-los e verificar se a morte é diferente. Foi verificado que:
• a morte não era diferente no síndrome neurológico (malária cerebral), em
comparação com aqueles que tinham microbiota normal
• no síndrome de stress respiratório a morte era bastante diferente. Os ratinhos que
tinham microbiota normal morriam, mas uma percentagem dos animais sem
microbiota não morriam sequer e mesmo os que morriam, morriam mais tarde.

Fomos sequenciar a microbiota do intestino e verificar se era diferente nos ratinhos infetados.
E É DIFERENTE. Mas o problema é que era tão diferente no síndrome de stress respiratório como
no síndrome neurológico. Portanto nós não vimos diferença nenhuma. Até decidirmos olhar
para os pulmões…
→ Os pulmões não são órgãos estéreis, também têm a sua microbiota com uma menor
quantidade de bactérias comparada à do intestino.
• Verificamos que:
o A quantidade de bactérias num ratinho não-infetado ou infetado que iria
desenvolver síndrome neurológico nos dias seguintes era muito parecida. No
entanto, nos ratinhos que iam desenvolver síndrome do stress respiratório
estavam muito mais elevadas.
o A diversidade de bactérias num ratinho não-infetado ou infetado que iria
desenvolver síndrome neurológico era muito grande (o que é normal). Já no
ratinho que ia desenvolver síndrome do stress respiratório era muito reduzida,
quase todas as bactérias eram do mesmo tipo (típico de um pulmão com
bactérias letais).
E se mudarmos de hospedeiro e infetarmos com o mesmo parasita? É a mesma coisa.

Tem sido mostrado que uma das razões para patologia por malária severa é a capacidade que
os parasitas, quando estão a infetar células vermelhas, de adesão às células endoteliais dos
vasos → resposta inflamatória enorme, pode ser um determinante de malária severa.

Com o parasita Pb ANKA, conseguimos com que este não aderisse aos vasos. Mostramos que no
processo de sequestração nas células endoteliais dos pulmões é muito mais eficaz em
parasitas normais, do que naqueles que não conseguem aderir aos vasos. Quando isto
acontece, voltamos a ter o nível de bactérias muito reduzido nestes pulmões com uma
diversidade saudável.
Portanto, os parasitas que levam o hospedeiro a desenvolver stress respiratório gostam de
sequestrar mais nos pulmões e, ao sequestrarem mais nestes pulmões, fazem com que bactérias
criem um ambiente, que cresçam mais e, simplesmente, tornam-se menos diversas.

Nós fomos tentar descobrir o que estava a acontecer nos pulmões. Vou me focar na citoquina
IL-10, que geralmente é protetora. Provavelmente esta citoquina chega ao tecido para tentar
protegê-lo do parasita que está a sequestrar os pulmões, mas ao fazer isso, está a criar um
ambiente onde algum tipo de bactérias adora multiplicar-se.
→ Ao inibir a sinalização da citoquina IL-
10, verificamos que, apesar de não termos
qualquer impacto no síndrome
neurológico, temos um impacto enorme
no síndrome de stress respiratório,
fazendo com que os animais passem a
sobreviver, porque deixam de ter o
crescimento destas bactérias nos pulmões.

→ Ao inibir as células produtoras de IL-


10, também conseguimos proteger a 100%
estes pulmões do crescimento de bactérias.

O objetivo com este estudo é: e se conseguirmos diminuir o a capacidade de multiplicação


destas bactérias com um antibiótico.
O que vos quero dizer é que, neste caso, a característica especial deste parasita de poder
sequestrar nos pulmões leva a que estes respondam tentando proteger o tecido mas, ao mesmo
tempo, criam um ambiente perfeito à multiplicação de um tipo específico bactérias → disbiose
do microbiota pulmonar.

Nós geralmente vemos como componentes principais o hospedeiro e o organismo causador de


doença, mas o que viemos mostrar é que temos uma tríade:

No mundo procura-se saber:


• Como é que este parasita se estabelece no fígado.
• Como é que o parasita se estabelece no mosquito, onde tem reprodução sexuada.
• Como é que bloqueamos o parasita no sangue.
• Como é que bloqueamos as formas pré-sexuadas que o parasita faz no sangue para
serem transmitidas ao mosquito.
Data Docente
04/11/2021 Prof.ª Luísa Figueiredo

Persistência em tecidos: uma forma de vida e uma barreira ao tratamento anti-parasitário.

Parasitas protozoários são organismos unicelulares que podem causar doenças em humanos,
bem como em animais, pois muitos destes protozoários são zoonóticos. A transmissão pode
ocorrer pela rota fecal-oral ou através de insetos.
Os protozoários podem ser divididos em duas classes: os Kinetoplastideos e os Esporozoários.

Os Kinetoplastideos têm normalmente um órgão, neste caso é um flagelo, que lhes permite ter
motilidade própria. Dentro destes Kinetoplastideos temos:

1. Leishmania species, que causa Leismaniose;


2. Trypanosoma brucei, que causa a doença do sono;
3. Trypanosoma cruzi, que causa a doença de chagas.

Leishmania Trypanosoma Trypanosoma


species brucei cruzi

Em relação aos Esporozoários, temos:


1. Toxoplasma, que causa Toxoplasmose;
2. Cryptosporidium, que causa Cryptosporidiosis (causa diarreias);
3. Plasmodium, que causa Malária.

Toxoplasma Cryptosporidium Plasmodium


Toxoplasmose

• Toxoplasma gondil é sobretudo intracelular;


• 11-60% da população mundial está infetada (800-4500 milhões de pessoas). A
percentagem é muito variável porque depende muito dos países em questão;
• Esta doença é muitas vezes inócua, pelo que a maioria das pessoas recupera da infeção
sem precisar de tratamento;
• Diagnóstico: teste serológico (IgG ou IgM);
• Tratamento: pirimetamina, sulfadiazina, ácido folinico.

Este diagrama representa o ciclo de vida de Toxoplasma gondil, sendo que não é necessário
sabê-los de cor. Precisamos apenas de saber que existem várias partes e que são complexos.

Este gato é um hospedeiro obrigatório, pois é aqui que temos os gametas masculino e feminino,
onde ocorre a meiose, que é um evento importante na vida de todos os seres vivos (ocorre a
fecundação, ocorre um grande aumento da diversidade, etc). Quando o gato defeca, os oocistos
são libertados com as fezes, sendo que podem ser ingeridos (exemplo da transmissão fecal-oral).

Estes Esporozoito transforma-se e vai invadir uma quantidade diferente de células (este parasita
não é muito esquisito).

O Taquizoito vai replicar-se, forma várias taquizoitos, sendo um ciclo que se vai repetir, e, em
situações de stress, que não são muito conhecidas, este parasita deixa de se replicar e forma
um Bradizoito, uma espécie de cisto, um parasita que vai estar um pouco dormente, que não vai
causar muita patologia e que tipicamente se acumula no cérebro e noutros tecidos.

Em algumas situações (sendo que são poucas as conhecidas), como uma deficiência imunitária,
estes bradizoitos deixam de estar latentes, são libertados para a corrente sanguínea e são depois
transmitidos para o gato.

Portanto, a Toxoplasmose ocorre em humanos e em roedores, é uma infeção crónica, pode ser
assintomática, sendo que pode causar complicações em condições particulares, como
toxoplasmose cerebral e ocular.

É de realçar a parte do ciclo (bradizoito) em que os parasitas se encontram dormentes.


Leishmaniose

• 20 espécies de Leishmanis: infantum / donovani/ major / mexicana / amazonensis, etc;


• 12 milhões de pessoas infetadas (países mediterrânicos, Médio Oriente, América do Sul,
etc);
• 2 formas de Leishmaniose: visceral (fatal) e cutânea;
• Diagnóstico: biópsia fixada e sujeita a coloração de Giemsa
• Tratamento: antimoniato de meglumina, stibogluconato de sódio, amphotericin B
liposomal, sulfate de paromomicina, miltefosina; eficácia variável, toxicidade e injeções
dolorosas IV/IM.

Em relação ao ciclo de vida, é bastante complexo, sendo que a transmissão é feita por um inseto,
o flebótomo, sendo que estes mudam bastante de morfologia, o seu metabolismo, etc.
No humano, o parasita vai infetar apenas os macrófagos (é um parasita que escolhe
determinadas células para serem infetadas), perde o seu flagelo, e vai-se transformar no que se
chama uma amastigota, e entra num ciclo mais pequeno de replicação. É neste momento que
existem as manifestações clínicas, dado neste ponto existir uma grande quantidade de parasita,
apresentando-se também uma resposta imunitária.
Mais uma vez, dentro deste ciclo bastante complexo temos uma parte do ciclo onde os parasitas
podem entrar em latência (quadrado no canto superior direito da imagem), deixando de se
replicar, permanecendo metabolicamente inativos, sendo que é mais difícil eliminar estes tipos
de parasitas são mais difíceis eliminar com estas drogas.
Trypanosoma cruzi → Doença de Chagas

• Trypanosoma cruzi é intra e extracelular, consoante


a fase do ciclo de vida;
• 16 milhões de pessoas infetadas (América do Sul);
• Infeções são ligeiras, mas podem ser vitalícias;
geralmente são controladas pela resposta imune;
• Diagnóstico: observação microscópica dos parasitas
na amostra de sangue; serologia IgG;
• Tratamento: Benznidazol, Nifurtimox (durante 30-60
dias).

Em relação ao ciclo de vida, temos parasitas, neste caso


intracelulares, que podem replicar-se ou então transformar-
se em parasitas que se deixam de replicar, entrando em
estado de latência.

Trypanosoma brucei → Trypanosomíase Humana Africana (doença do sono)

• Trypanosoma brucei é sempre extracelular;


• Existem várias espécies, mas as que causam doença no ser humano são T.b. gambiense
e T.B. rhodesiense. As restantes espécies causam doença no gado;
• Cerca de 2000 novas infeções / ano (África sub-Sariana);
• Infeções: são fatais se não forem tratadas, o que é raro, pois normalmente os parasitas
estão (melhor ou pior) adaptados ao seu hospedeiro, por forma a conseguir viver nele
sem o matar, ou pelo menos sem o matar logo;
• Dignóstico: serológico IgG, observação microscópica dos parasitas na amostra de
sangue;
• Tratamento: suramina, melarsoprol, eflornitina, nifurtimox+eflornitina, fexinidazol (o
primeiro tratamento oral).

O ciclo de vida é mais uma vez constituído por duas


partes, uma que representa os eventos relacionados
com o vetor e outra relacionada com o que se passa
no hospedeiro, que é um mamífero, pode ser um
humano. Os parasitas encontram-se no sangue e
podem sair deste e infetar vários tecidos,
nomeadamente o tecido adiposo, a pele, cérebro, etc.
A questão será se existiram formas persistentes,
sobretudo aquelas que colonizam os tecidos, que é o
que se verifica nos outros ciclos de vida, e a sua
importância: qual a vantagem que um parasita terá ao
fazê-lo, tipicamente reduz a severidade da doença.
Existe depois o interesse farmacológico uma vez que
estas formas persistentes têm um metabolismo muito
reduzido não são tão fáceis de ser eliminadas.
Normalmente os fármacos utilizados para eliminar
parasitas, vírus, etc, têm como algo alguma proteína
ou algum mecanismo envolvido na replicação do
parasita ou na produção do nutriente ou molécula muito importante produzida de cada vez que
o parasita prolifera. Portanto, está subjacente que o parasita está a proliferar, o que é impedido.
Se existem formas persistentes que não proliferam, o fármaco em princípio não tem efeito. O
mesmo problema verifica-se em bactérias: a resistência de bactérias deve-se muitas vezes ao
facto de existirem bactérias persistentes.

A sobrevivência do parasita e do hospedeiro depende de um equilíbrio entre, por um lado, os


parasitas proliferarem e quantos mais parasitas são, maior será a resposta imunitária e maior
será em princípio a patologia, se não estiver controlada; e, por outro lado, a persistência, que é
um mecanismo onde haverá menor proliferação dos parasitas, podendo ter como efeito um
doente assintomático.

Formas persistentes:
• Proliferação mais lenta; Estas duas primeiras alterações fazem com que
• Metabolismo mais lento; exista resistência a tratamentos
• Resistência a tratamentos.

A questão é se, no caso do Trypanosoma brucei, que causa


a doença do sono, há parasitas persistentes em tecidos
extravasculares?
Estes parasitas são muito facilmente mantidos em cultura,
pois são extracelulares, bastando ter um meio (e MDM?)
e os parasitas crescem, sendo que em laboratório se
procura responder às seguintes perguntas:
1. Qual é a biologia de parasitas extravasculares?
2. Qual a sua contribuição para a patologia?
3. Os parasitas extravasculares são eficazmente eliminados pelos tratamentos?
A vantagem da investigação biomédica é a utilização
de ratinhos em experiencias em que se formulam
hipoteses e se estabelece causas e consequências.
Por outro lado, quando se realiza investigação clínica,
não se injeta nada num paciente, de forma que, muitas
vezes a investigação clínica tem de ficar por
associações de eventos que, depois com um ratinho ou
outros modelos animais ou mesmo em cultura, se
pode então estabelecer causalidade.

O modelo utilizado em laboratório para estudar estudar a


infeção por Trypanosoma brucei é um ratinho da estirpe em
particular (indicada na imagem), no qual se injetam os
parasitas ( a estirpe também em particular indicada na
imagem).

No gráfico de sobrevivencia representado, 100


significa que todos os ratinhos estão vivos, e
portanto, no início da experiencia 100% dos
animais estão vivos. Cada vez que há um ratinho
que morre, ou dois ou três, o número de ratinhos
vivos diminui e, portanto, a escadinha encarnada
significa que os animais estão a morrer.
Um animal não infetado mantém-se vivo (animais
saudáveis, de 8 semanas, portanto não vão morrer
por envelhecimento em 50 dias), mas um ratinho
infetado morre em média à volta de 35 dias.
Existem várias formas de mediar o número de
parasitas no sangue ( no ciclo de vida foi
referido que os parasitas vivem no sangue e
tecidos). No grafico apresentado temos a
quantidade de parasitas no sangue e como
essa quantidade oxcila. Isto é tipico de uma
infeção por Trypanosoma brucei. Uma infeção
de Malária faz exatamente a mesma coisa e
isto porque estes dois parasitas têm um
mecanismo, chamado variação antigénica, que
invade o sistema imune e, portanto, ir controlando a quantidade de parasitas, fazendo uma
“corrida do gato e do rato” entre o hospedeiro e o parasita.
Nota: Parasitémia é detetável a maioria dos dias. Varia entre 106 – 108 parasitas /mL.

O Trypanosoma brucei não se


encontra distribuído de igual forma
nos diferentes órgãos. Esta
distribuição é caracterizada através
da Imuno-Histoquímica, em que
precisamos de um anti-corpo
antiparasita Anti-VSG (inespecífico),
que vai fazer com que seja possível
a observação dos parasitas sob a
forma de pintas castanhas.
É de relevar que o tecido adiposo é um tecido extremamente parasitado.

Para comprovar que tal achado não era um artefacto, foram realizadas uma série de
experiencias, mostrando-se na figura
imuno-histoquímica ampliada de tecido
adiposo, em que a castanho temos os
parasitas e a azul uma coloração de
núcleos, os núcleos ou dos próprios
adipócitos ou de células imunitárias que
entraram para dentro do tecido e estão
em luta com os parasitas. Temos uma
visualização bastante clara de uma
resposta imune a tentar lidar com um
agente infeccioso. Nalgumas células
castanhas é percetível a morfologia do
parasita.

Como não há biologia sem quantificação, utilizou-se um método de quantificação para


determinar a quantidade de ADN de parasita que estava dentro de cada órgão. O gráfico mede
a quantidade de parasitas num órgão (parasite load), é uma escala logarítmica, no dia 6 e no dia
28 da infeção. Consegue-se perceber que, no dia 6, o órgão com mais parasitas é o sangue,
seguido do tecido adiposo, e só depois o rim, o
pulmão, o coração e o cérebro é que aparecem
com órgãos parasitados, mas com pelo menos
100, 1000 menos parasitas. O tecido adiposo é,
dos tecidos sólidos, o que apresenta mais
parasitas.
No dia 28, o sangue tipicamente já tem um
bocadinho menos de parasitémia e o tecido
adiposo é, portanto, aquele que tem agora maior
carga parasitária. O tecido adiposo é o maior
reservatório de parasitas em ratinhos.

O parasita extracelular no espaço intersticial do


tecido adiposo.

Temos, na promeira imagem,


um adipócito, com a sua
membrana, sendo que para
cima é constituído por
material lipídico, e depois
temos um vaso, com uma
célula endotelial, um glóbulo
vermelho e, fora do vaso
temos um trypanosoma e um
linfócito, que provavelmente
está a ser atraído para vir
eliminar este parasita.

Na segunda imagem temos a amplificação do quadrado da primeira, onde é visível o


tripanossoma, a linha preta muito distinta à sua superfície, muito mais carregada do que a
membrana do adipócito devido à quantidade de proteína que a mesma tem, ficando muito mais
denso aos eletrões.

É um parasita extracelular (não está dentro do adipócito nem dentro do glóbulo vermelho nem
dentro do linfócito), está dentro do espaço intersticial. Por outro lado, o trypanosoma cruzi
também consegue ir para o tecido adiposo mas ele entra para dentro dos adipócitos e neles
vive.

Existem vários parasitas que se


acumulam no tecido adiposo. A
ilustração mostra o Trypanosoma
brucei a azul escuro a viver no
espaço intersticial entre
adipócitos, a azul claro o
trypanosoma cruzi, a viver no
interior do adipócito, sob formas
intracelulares, mas também pode
estar a viver no sangue, na sua
forma extracelular. Temos
também o parasita da malária,
que vive sempre dentro dos
glóbulos vermelhos (na maioria do ciclo de vida vive dentro dos glóbulos vermelhos).

No tecido adiposo, os glóbulos agarram-se, ficando citoaderidos às células endoteliais dos vasos.
Isto acontece preferencialmente em alguns órgãos, nomeadamente no pulmão e tecido
adiposo.

Existe um tropismo para o tecido adiposo que nos leva a pensar que o tecido adiposo seja um
ambiente em que estes parasitas tenham alguma vantagem.

Existem tripanossomas específicos que infetam


outros tipos de animais (ex: Tripanomíase animal
africana) e que causam uma doença devastadora e
tem limitado uma grande parte do
desenvolvimento de algumas regiões de África
porque as próprias pessoas sabem que devem
evitar levar o seu gado para zonas em que existam
moscas, etc, porque senão as vaquinhas ficam
completamente caquéticas e acabam por morrer.

Os parasitas do tecido adiposo podem voltar ao sangue? Ou será o tecido adiposo um beco sem
saída?

Os parasitas do tecido adiposo são viáveis e proliferam no sangue.


Na experiência realizada, de um primeiro ratinho infetado foram recolhidos os órgãos, que
foram homogeneizados e ingetada uma pequena parte num ratinho. A questão era se os
paratitas contidos no homogeneizado eram capazes de estabelercer uma nova infeção e se
conseguíamos ver os seus descendentes, uns dias depois, medindo a quantodade de parasitas
no sangue, a chamada parasitémia.

Os resultados encontram-se
representados neste gráfico, em que
vamos ver que percentagem destes
ratinhos é que mostram a parasitémia.
No dia 0 e no dia 1 não havia nenhum
animal que mostrasse parasitémia; ao
dia 2 já começamos a ver que aqueles
ratinhos que foram injetados ou com
parasitas do sangue ou do tecido
adiposo começam a mostrar
parasitémia no sangue; ao dia 3 animais
que levaram injeção de sangue
começaram a ser positivos e ao dia 4 os
animais que levaram parasitas homogeneizados do tecido adiposo já estão positivos. Os outros
animais que levaram injetados com homogeneizados de coração e de cérebro, demoraram
umpouco mais de tempo mas também eles acabaram por ficar todos infetados.

Isto mostra que os parasitas que estão nos órgãos, pelo menos quando é facilitado (através do
homogeneizado), têm a capacidade total de, num novo animal, proliferarem. Portanto, não há
nada intrínseco dentro do parasita que o impeça de desenvolver.

O que esta experiência não mostra é se o parasita é capaz de, num contexto de um tecido
normal, que tenha a sua matriz extracelular, os vasos, uma fisiologia perfeitamente diferente,
sair do espaço extracelular e atravessar e entrar dentro do vaso.

Mostra que o parasita não está num beco sem saída, consegue sair, crescer e infetar outros
animais.

Clinicamente e em termos farmacológicos sabems que isto é um problema pois os parasitas


provavelmente podem sair e regressar ao sangue, e portanto, temos de os ter em conta quando
estamos a pensar em patologia e tratamento.

Os parasitas do tecido adiposo e do sangue são funcionalmente idênticos?


Foram relizadas um conjunto de experiências.
Comparação do transcriptoma de parasitas do sangue e tecido adiposo:
A primeira tem por base a análise transcriptómica, comparando-se o conjunto dos RNA´s de
parasitas do sangue e do tecido adiposo, sendo que as culturas A e B são grupos controlo.
Este esquema tem por nome heat map (“mapa de calor”), onde a azul o RNA é pouco abundante
e a encarnado o RNA é muito abundante.
Cada linha é um transcrito,
portanto, o primeirp
transcrito é pouco expresso
no sangue e muito expresso
no tecido adiposo, o segundo
a mesma coisa, e portanto
temos um conjunto de genes
que são pouco abundantes
quando o parasita está no
sangue e muito abundantes
quando o parasita está no tecido adiposo. Temos depois um conjunto que corresponde
exatamente ao contrário. No total isto corresponde a 20% dos genes do parasita e, portanto,
sugere que, se os RNA´s são diferentes, provavelmente a quantidade de RNA e,
consequentemente, a quantidade de proteína, serão diferentes.

Se temos um parasita com determinadas proteínas e outro parasita com proteínas um


bocadinho diferentes ou com quantidades diferentes, provavelmente estes parasias não têm a
mesma função (não fazem exatamente a mesma coisa e, portanto, não são iguais).

Após uma análise mais


cuidada destes genes,
chegou-se à conclusão de
que alguns genes estão
relacionados com o
metabolismo de lípidos.

O metabolsimo de lípidos
num parasita qe está dentro
de tecido adiposo faz todo o
sentido.

Em colaboração com Terry


Smith, fizeram uma análise
lipidomica, na qual se
descobriu que, quando os parasitas estão no tecido adiposo, eles ativam uma via chamada beta-
oxidação de ácidos gordos. Esta via é utilizada para produzir ATP, ou utilizada para produzir
metabolitos que depois são utilizados para fazer outras coisas dento da célula.

A beta-oxidação está inativa quando os parasitas vivem no sangue e está ativada quando os
parasitas vivem no tecido adiposo.

Esta descoberta foi importante porque durante muito tempo não se sabia se o Trypanosoma
brucei era capaz de utilizar ácidos gordos como fonte de metabolitos e energia, tendo esta
descoberta sido possível num ambiente completamente novo que nunca tinha sido estudado
antes → quando os parasitas estão alojados e rodeados de adipócitos, provavelmente estão a
captar ácidos gordos que estão a ser libertados pelas células vizinhas (adipócitos), adaptando-
se e ativando o mecanismo de beta-oxidação, utiliza os ácidos gordos (que provavelmente vêm
dos adipócitos, este passo ainda é alvo de estudo) como fonte de energia.

Isto demonstrou que os parasitas, metabolicamente, quando estão no sangue e no tecido


adiposo, são diferentes. Uns utilizam beta-oxidação e os outos não.
Mais recentemente foi realizada uma análise semelhante (uma vez que se tem em consideração
todos os genes), mas neste caso, em vez de se medir toda a quantidade de RNA de cada gene
do parasita, mede-se a quantidade de proteína → Análise proteómica.

Algumas das observações


feitas ao nível do RNA foram
confirmadas, mas o mais
evidente é que no tecido
adiposo, os parasitas têm
uma quantidade grande de
proteínas que é menos
abundante do que quando
os parasitas estão no
sangue. No tecido adiposo
os parasitas sintetizam
menos proteínas. Quando se
foi perceber que tipo de proteínas eram estas –análise presente no primeiro gráfico-, vemos que
tem tudo a ver com síntese proteíca, pois temos tradução, resposta a stress, biogenese de
ribossoma, folding de proteínas e transporte de aminoácidos , pelo que, os parasitas do tecido
adiposo parecem reduzir a capacidade de sintetizar proteínas (ATFs são adipose tissue forms,
são os parasitas que colonizam o tecido adiposo). Mas sugere apenas, não prova.

O ciclo celular é diferente entre parasitas do sangue e tecido adiposo.


Como prova de que os parasitas do tecido adiposo reduzem a capacidade de sintetizar proteínas
foram realizadas experiências adicionais.

A primeira passou pela observação do ciclo celular e sintese


proteíca. O ciclo celular é importante porque quando um parasita
ou uma célula qualquer eucariota produz menos proteínas,
tipicamente é porque não precisa de duplicar o seu conteúdo
celular, pois não se vai dividir tantas vezes. (ex: se uma bactéria
estava a dividir-se de 20 em 20 minutos e passa a dividir-se de 3
em 3 horas, não precisa a cada 20 minutos de duplicar o seu
conteúdo proteico, faz esta duplicação em 3 horas). E, portanto,
por minuto a síntese proteica vai ser menor.

Se os parasitas no tecido adiposo estão a sintetizar menos proteínas, provavelmente estão a


proliferar mais lentamente. Sabemos que no sangue o Trypanosoma brucei multiplica de 7 em
7 horas, e, portanto, os parasitas vão demorar um bocadinho mais de tempo.
Para comprovar estas hipóteses, forem induzidas infeções em ratinhos, extraíram-se os
parasitas de cada um dos tecidos (adiposo e sangue) e foi realizada uma coloração com EdU, um
composto que vai apenas marcar os parasitas em divisão.
É depois realizada microscopia, sendo que o tipo de
imagem obtida encontra-se no slide. Vemos todos os
parasitas nos primeiros dois quadrados (Hoechst)
porque vemos todo o DNA daqueles parasitas.

Na coluna do meio (EdU) só são visiveis os que foram


marcados com EdU, que são os que estavam a dividir-
se.

Quando temos parasitas no sangue (BSFs), temos mais pontinhos do que quando temos prasitas
no tecido adiposo (ATFs).
No gráfico temos a quantificação das imagens descritas
acima: quando os parasitas estão no sangue, temos mais
parasitas positivos para a marcação EdU, enquanto que
os parasitas do tecido adiposo menos.

Portanto, o que isto mostra é que no tecido adiposo os


parasitas proliferam menos.

Os parasitas dos tecidos estão “protegidos” dos fármacos?

Para estudar a sua implicação para com os fármacos,


foram realizadas expreriências (por enquanto apenas
com um fármaco, a investigação ainda pode mudar).
Temos uma infeção, tratamos com Suramina ao 21
dia, e, um dia depois (dia 22), ou sete dias depois (dia 28), fomos medir, usando PCR, a
quantidade de parasitas presentes nos tecidos.

Quando tratado com suramina, é


expectável uma redução do
número de parasitas ao longo do
tempo. A quastão que se queria
perceber é se havia uma diferença
nesta redução entre o tecido
adiposo e os outros tecidos
(pulmão, coração, rim, testículos).
Em amarelo encontram-se
indicados os tecidos adiposos que o
ratinho tem em diferentes locias
anatómicos (TA Gonodal, TA Retroperitoneal, TA Mediastinico, TA Perirenal, TA Interscapular,
TA Mesentérico).

Ao fim de 7 dias, não são detetáveis parasitas (está abaixo do limite de deteção) no pulmão,
coração, rim, testículos,…, no entanto, ainda detetamos no tecido adiposo.
Neste momento está a repetir-se esta experiência num período de tempo mais longo e utilizar-
se outros fármacos.
RESUMO:
Data Docente
05/11/21 Prof. Doutor Thomas Hänscheid

Classificação

Morfologia:

Nemátodos (“round-worm”) Tremátodos (“fluke”→”flat Cestodes (“tape-worm”)


Worm”)

N. americanus ♀ ♂ F. hepática Taenia saginata


A. duodenale ♀ ♂ F. buski
E. vemicularis ♀ O. filenus
T. sprialis ♀ ♂ C. sinensis
T. trichiura ♀ ♂ P. westermani
H. heterophyes
S. mansoni ♂
S. mansoni ♀

Campos da parasitologia:

Tanto os protozoários (células unicelulares que assumem todas as funções) como as helmintas
(seres multicelulares cujas células são especializadas) podem causar infeções no intestino e
infeções sistémicas (dos tecidos), de forma que:
Protozoários (unicelulares):
- Infeções do intestino;
- Infeções sistémicas (dos tecidos)→ ex: malária.

Helmintas (multicelulares):
- Infeções do intestino;
- Infeções sistémicas (dos tecidos).
Nemátodos (“round-worm”):
A imagem (Excercitações de Vena, Medinensis et de
Vermiculus Capillaribus Infantium, GH Velschius,
Augsburg, 1674) ilustra a extração de helmintas das
pernas.
No vídeo demonstrado em aula, populações bebiam
água contaminada com larva de Dracunculus
medinensis. Passado um ano, a helminta cresce e
emerge numa ferida cutânea dolorosa, tendo de ser
removida. Não existe tratamento farmacológico para
esta condição, pelo que a helminta tem de ser removida
manualmente, sendo enrolada à volta de um pau, todos
os dias, por semanas. A helminta tem de ser puxada com
muito cuidado, pois, caso contrário, esta vai partir-se e
a parte que se encontra ainda no interior vai retrair,
sendo que a parte reprodutiva, os seus ovos, vão ser libertados dentro da perna, o que pode ser
fatal uma vez que são antigénios que podem causar um choque anafilático.

Curiosidade: a origem do símbolo de Medicina,


o bastão e a serpente, vem, muito
provavelmente, da altura em que se considerou
esta helminta o mal, uma serpente, a sair da
perna. Foi também nessa altura extraída
enrolando-a num bastão. Quem na imagem
procedia à remoção da helminta da perna do paciente era um
antecessor dos médicos.

Dracunculose (Dracunculus medinensis):


O ciclo de vida é muito importante pois é essencial para a
eliminação e controlo da doença.
A helminta sai pela perna, mas porquê? A resposta é
relativamente simples: a helminta é uma femea adulta que tem
de depositar os ovos que se encontram dentro dela no exterior.
Para tal tem de abrir um buraco na pele para sair e colocar os
ovos. Os seus ovos são colocados na água, pelo que, como
mostrado no vídeo, a dracunculose existe em sitios onde as
pessoas, nomeadamente as crianças, estão com os pés na água.
A helminta, ao sentir que os pés se encontram dentro de água,
fura a pele, sai e começa a por os ovos.
Os ovos, postos na água, desenvolvem-se em larvas e estas larvas
vão invadir um pequeno inseto que vive na água, a pulga d´água
(Daphnia).
A infeção ocorre quando é ingerida água não tratada, engolindo o inseto que tem no seu
interior a larva. Chega tudo ao estômago, o inseto é digerido (morre) e a larva vai ser
libertada. Esta vai entrar na mucosa do intestino e migra pelo corpo até à perna, começa a
crescer e torna-se adulta.
O ciclo de vida fecha-se quando a pessoa entra na água e a helminta vai tentar por os ovos.
Conhecendo o ciclo de vida podemos eliminar esta doença, sendo que a Dracunculose era
uma doença muito frequente no passado já foi quase (quase) erradicada na Índia, na Ásia quase
já desapareceu e em África já só existe em algumas zona, como a área da Somália, Etiópia, onde
há sempre guerras e situações complicadas, sendo difícil lá controlar esta doença quando há
mais problemas, como sobreviver.
As duas partes mais importantes para a eliminação é a educação e depois uma intervenção
simples, como filtrar a água, uma vez que os ovos são depositados na água, o que pode ser
conseguido com qualquer tecido, pano, pois o inseto é suficientemente grande para ficar retido.
Estas medidas permitem eliminar a infeção e, portanto, a doença.

Geo-helmintas:
Helmintiases adquiridas aquando da ingestão de água ou outro produto contaminado. Existem,
no entanto, exceções, como Ancylostoma duodenale e necator americanus, em que a larva
infecciosa já se forma no meio ambiente. Regra geral, geo-helmintas originam helmintiases que
têm um ciclo de vida em que alguma parte existe na terra (geo) e são adquiridas por falta de
higiene, ou seja, são doenças (mais) tropicais não por gostar mais dos trópicos, mas por
existerem mais áreas com falta de higiene.
Outras geo-helmintas: ascaris lumbricoides, strongyloides stercoralis, trichuris trichiura e
toxocara canis.
Existem centena de milhões de casos, são extremamente frequentes.
As helmintas que causam infeções nos intestinos são micróbios que podem viver muito tempo,
alguns até podem viver anos, o que apresenta uma implicação: não se podem adaptar como um
vírus ou uma bactéria, que se replica muito (muito) rápido e desenvolve resistências, adaptando-
se. Ou seja, a parte evolutiva, pelo menos tão rápido, não se aplica. Tem de ser uma evolução
muito mais longa, durante muito mais anos.
Desta forma, estas helmintas co-evoluiram com o ser humano durante milhares de anos, sendo
reccorente no passado ter infeçõs com estes microrganismos. Em termos evolutivos, nós
(professor e alunos) somos das primeiras gerações “anormais” que não foram infetadas. Isso é
importante pois a evolução das helmintas levou-as a causar uma infeção com poucos ou
sintomas nulos, apresentando muitas vezes um valor patogénico (clínico) reduzido.

Ascaris lumbricoides:
Geo-helmita mais frequente, cumummente denominada
de lombriga, que, se uma pessoa tem uma infeção no
intestino, estas podem ser expelidas nas fezes.
A fonte de infeção é a terra e os alimentos contaminados.
Ciclo de vida:
(1) a terra fica contaminada → uma pessoa infetada tem
no seu intestino as helmintas fêmeas e machos (são as
fêmeas que são mais compridas, chegam a atingir 20-30 cm).
Esta helminta coloca muitos ovos que saem com as fezes e vão
para a terra.
(2) as larvas são ingeridas dentro dos ovos através da ingestão
de alimentos contaminados. O ovo vai eclodir e a larva sai. A
larva não vai crescer logo e tornar-se adulta, vai permanecer
larva e penetra pela mucosa e vai entrar na corrente sanguínea.
(3) Começa então a circular o sangue e o seu tamanho é de tal
forma adaptado que vai ficar presa no leito capilar dos pulmões.
(4) A larva abandona o sangue e entra no alvéolo, seguindo-se
um movimento de ascensão em que a
larva sobe através da traqueia, dando
apenas um pouco de comichão, dado o
seu tamanho muito reduzido, que
provoca reflexo de tosse e que leva a que a larva seja engolida por se encontrar contida na
expetoração.
(5) A larva volta para o intestino e só agora começa a crescer e chega ao tamanho do adulto.
RESUMO: ovo→ terra→ ovo (com larva no interior) → intestino→ eclode→ sangue→pulmão→
boca (traqueia) → tosse→ intestino.
É importante saber o ciclo de vida de Ascaris lumbricoides uma vez que existem duas doenças
associadas a este microrganismo. Embora seja considerada uma helminta do intestino, e a maior
parte da clinica relevante esteja associada ao intestino, parte da clínica associa-se ao pulmão,
nomeadamente pela síndrome de Löffler, que é uma forma da doença pulmonar (pneumonia)
eosinofílica (os eosinófilos estão muito associados a doenças com parasitas e helmintas),
caracterizada por sintomas respiratórios leves ou pela ausência destes (mais frequentemente,
tosse seca), opacidades pulmonares migratórias e efêmeras e eosinofilia sanguínea periférica.
Nota: a geo-helminta está no intestino geralmente para causar problemas noutra parte do
corpo.

Em crianças é frequente ocorrer contaminação por centenas de helmintas (quando ocorre


ingestão de poucas helmintas, estas vão consumir a pouca comida que precisam e a sua
presença no intestino é bastante assintomática). Em certos casos, existem tantas Ascaris no
intestino que se tem de proceder a uma operação de remoção pois estas podem causar
obstrução do mesmo, o que leva a gangrena do intestino e pode causar a morte. Especialmente
com crianças, a infeção com muitas Ascaris em África podem ser fatais, ou seja, é uma quastão
de dose e não de falta de higiene.
Poucos Ascaris→ nenhum valor patogénico
Muitos Ascaris → valor patogénico elevado
Existe ainda mais um problema associado com o Ascaris, pois este, com os seus 20 cm, por uma
razão desconhecida, gosta muito de se enfiar em buracos (pode ser uma coisa da natureza para
ele ficar no intestino e não tentar sair pelo anus). Já aconteceu crianças brincarem com um anel
infetado por Ascaris e engolir o anel sem querer e quando o anel saiu, saiu Ascaris dentro do
anel. Exsite um buraco no intestino em que, se o Ascaris se enfia lá, a pessoa morre, sendo este
os sulcos do pâncreas, ou seja, o que vem do pâncreas é extremamente agressivo e se o ducto
for obstruido, origina-se uma pancreatite fatal.
Pode dar-se o caso de apendicite por causa do Ascaris, mas não é muito recorrente dado que o
Ascaris se enfia lá dentro e não dá problemas.

Necator americanus (hookworms):


Provoca geo-helmentiases duodenais que apresentam uma boca com
ganchos no seu interior que usam para se agarrar.
Ciclo de vida: (1) os ovos de pessoas infetadas vão para o meio
ambiente, sendo que vão já eclodir no meio ambiente. Estas doenças
são comuns nos trópicos, em que existe água relativemente morna ou
quente onde estas larvas existem nesta água. Pessoas que trabalhem
nos arrosais, e não tenha dinheiro para comprar botas de borracha,
estas helmintas conseguem penetrar pela pele. (2) vai depois entrar
pelo sangue até ao pulmão, até que atinge o intestino.
A doença causada por Necator americanus tem um pormenor
interessante em que esta helminta é muito
pequena, ve-se mal a olho nu, mas, pela
presença dos ganchos, agarra-se à parede da
mucosa. Isto acontece não só para que depois não se desprendam,
mas também para causar pequenas feridas e uma pequena
hemorragia, ou seja, a mucosa vai sagrar, pois estas helmintas não sobrevivem do conteúdo do
intestino, mas sim do conteúdo do sangue. São, no verdadeiro sentido,
vampiros, pois vão sugar o sangue.
Em relação à sintomatologia, não se verifica nenhum problema de
diarreia ou dor abdominal, mas, pelo contrário, uma anemia
gravíssima.
O valor de referência de hemoglobina é de 14-15 g/dL (as mulheres
têm menos, cerca de 13 g/dL).
O vídeo mostrado em aula (https://youtu.be/7BwgpYexMjk) encontra-se
associado ao QR code para que quem imprimiu a sebenta o possa ver.
No sul dos Estados Unidos, os escravos que viviam e trabalhavam em condições precárias de
higiene estavm infectados com imensos hookworms e que criou possivelmente a ideia de que
os africanos, principalmente os que trabalhavam nas plantações daquela zona, eram todos
perguiçosos porque não tinham força para trabalhar. No entanto, esta falta de força advinha da
infeção com estas helmintas.

Enterobius vermicularis (oxiuríase):


Esta doença provoca prurido anal e isto acontece porque
esta helminta vive no fim do intestino, no anús, e a fême,
que vive lá, durante a noite sai e deposita os seus ovos
por cima da pele à volta do ânus. A criança acorda de
manha e tem os ovos na pele, que a vão irritar e, como
as criança não se controlam, coçam essa área e ficam
com as mãos contaminadas (com ovos). Colocam por fim
a mão na boca e isso leva a uma autoinfeção, mas mais
grave, pois vêm os irmãos, o pai ou a mãe dar tau tau ao
bebé e todos ficam infetados. Esta infeção não tem nada
a ver com níveis de higiene, mas se uma pessoa fica
infetada na família, habitualmente é preciso logo tratar
toda a família. Normalmente é efetuado o tratamento
duas vezes, pois o primeiro serve para tratar os adultos,
a fêmea que está no intestino, mas os ovos ainda estão
na pele e podem eclodir e a pessoa vai depois reinfetar-
se por causa disso. Por essa razão, passada uma semana, dez dias, dá-se um novo tratamento
para matar a segunda geração daquelas helmintas.
Esta imagem (tirada do vídeo
https://youtu.be/Jqs4S9bzolA) mostra uma
rectoscopia, em que se olha logo para a
porção final do reto, em que se percebe
que estas helmintas são altamente
móveis, o que lhes facilita a saída do ânus
à noite.
Diagonóstico: Técnica da fita-cola→ A
pesquisa é feita através de fita cola que foi
colada em volta do ânus e depois colada numa
lâmina que é enviada para laboratório, para
que se estudem os ovos que ficaram retidos na
fita cola. Esta técnica deve ser efetuda de
manha. Não serve de nada enviar fezes para
análise, pois os ovos não se encontram nestas
mas sim na pele que circunda o ânus.
Os geo-helmintas do intestino
geralmente não causam sintomas
quando são poucos, auto-limitados,
sobre o intestino, não sabemos que os
temos. Por outro lado, quando temos
muitos mais helmintas, podem causar a
doença, mas o mais importante é que
esta doença não está necessariamente
associada ao intestino. No caso da
ancilostomíase, alguém com anemia
pode ter estes ancilostomas no
estômago a chupar o sangue. Quando
temos um paciente jovem com anemia,
a caysa pode ser uma helmintíase
intestinal.

Transmissão:

(1) ingestão de alimentos


1.1) contaminados com fezes 1.2) carne mal cozinhada

A helmintíase sistémica (dos tecidos), embora seja uma doença muito mais grave, está muito
limitada a algumas zonas, como os trópicos.→ é um problema que em Portugal quase não existe.

A filaríase são helmintíases sistémicas que apresentam larvas tão pequenas que podem ser
ingeridas por vetores, que são normalmente moscas, e quando estas picam outra vez para
chupar sangue, podem ingetar estas larvas que depois causam doença. Por ser moscas e não
mosquitos, o que é importante, porque geralmente têm preferências de reprodução diferentes,
ou seja, não é necessariamente uma água estagnada.

(2) por um vetor


Em relação à filaríase, existem três:
1. Filaríase linfática: wuchereria bancrofti, brugia malayi, brugia timori
2. Loiase: Loa loa
3. Oncocerose (cegueira dos rios): onchocerca volvulus
Destes, o mais importante é o primeiro e o terceiro, a Loa Loa Loiase não tanto.

Em relação ao ciclo de vida Filaríase linfática, a mosca vai


picar, sendo que existem moscas que picam ou só durante
o dia ou só durante a noite, estando relacionado com a
epidemiologia no local do mundo onde estas moscas
existem, o que apresenta uma consequência, em que as
microfilariae aparecem no sangue só durante a noite ou só
durante o dia, porque elas “sabem” que as moscas picam
só durante a noite ou só durante o dia. De forma que, se
tivermos um doente infetado e queremos fazer o
diagnóstico, teremos de procurar as filárias no sangue,
tirando, portanto, sangue e fazer uma lâmina (como o
diagnóstico da malária).

Quando se faz esta pesquisa durante o dia em locais em


que a mosca pica durante a noite, vamos ter sempre um
resultado negativo. Nestes casos, para diagnosticar temos
de hospitalizar o doente ou pedir-lhe para voltar à noite
para fazer a colheita e posterior diagnóstico.
Portanto, a mosca vai picar e ingerir as larvas, vai injetá-las outra vez e esta larva vai migrar no
corpo. No corpo há duas partes onde estas migram: na porção subcutânea da pele ( no caso da
Loiase e da Oncocerose (cegueira dos rios) ) e, no caso da Filaríase linfática, como o nome indica,
vão entrar no corpo e migrar para os vasos linfáticos.
Numa pessoa infetada com Filaríase linfática, em tantos vasos
linfáticos, poucas vão ter uma baixa expressão e sintomas da infeção.
No entanto, se uma pessoa vive em África e tem infeções recorrentes
por Filaríase linfática (“vão-se infetar, infetar, infetar,…”), vão existir
tantas Filaríases nos vasos linfáticos que estes ficam obstruídos,
causando linfoedema.
Na imagem encontra-se uma pessoa que tem Filaríase linfática, que
lhe provocou elefantíase da perna. O mais grave é que, uma vez os
vasos linfáticos obstruídos, não é possível desobstruí-los, é uma
doença crónica que fica para sempre. Nunca mais volta a ter uma
perna normal. No passado havia casos tão graves que s pessoas eram
expostas no circo, na Europa. É uma doença gravissíma, sendo que
uma perna pde pesar 59 kg ou mais.
Mais grave é o facto de isto poder aparecer noutras partes do corpo,
sendo que no homem ode aparecer no escroto.
Não é apenas uma questão estética: uma pessoa que tenha um escroto
que pese 50 kg ou mais é gravissímo! Como podem ver no exemplo
desta criança, cuja doença foi descrita há um ano atrás, em cujo
escroto pesou possivelmente entre 30-40kg. Embora não tenha
encontrado uma fotografia, o professor disse que foi descrito um caso
em que o escroto pesou 200 Kg, em que a pessoa nem se conseguia
levantar sozinha. Estes casos exigem cirurgias bastantes complicadas,
que nestes países muitas vezes
não existe possibilidade.

Filaríase linfática:

• 120 milhões infetadas


• Transmissão por mosquitos
• Diagnóstico: pesquisa de microfilariae no sangue
• Tratamento: DEC, ivermectina
Filaríase- Loa loa

• Transmissão por mosquitos


• Diagnóstico: pesquisa de microfilariae no
sangue
• Tratamento: DEC

É uma doença parecida que migra na camada


subcutânea que pode causar lesões, nódulos muito
dolorosos, que podem aparecer no olho, sendo que a
helminta se mexe no olho, sendo necessário uma
pequena cirurgia para remoção da mesma. Estas larvas
ne pele podem causar problemas.

Mais grave, a oncocerciase- cegueira


dos rios-, estas larvas não só migram na
pele e submucosa, mas podem entrar
em frente da lente e podem causar
uma reação crónica que leva à
cegueira.

Como nota introdutória da próxima


aula, o homem pode infetar-se com
Ascaris de outras espécies,
nomeadamente do gato e do cão, que
pode causar doenças diferentes.
Data Docente
08/11/21 Prof. Doutor Thomas Hänscheid

Mais uma aula sobre parasitas helmintos, segunda parte.


Lembrem-se que como disse na aula de dia 5, podem construir um quadro com os quatro
campos, um para parasitas, protozoários intestinais, helmintos do intestino, embora têm de ter
cuido porque estes podem ter muitas vezes manifestações que não estão relacionadas com o
intestino, como a anemia, prurido anal, e depois os helmintos que causam infeções sistémicas e
dos tecidos, o que vais ser falado mais à frente na aula de hoje, quando falarmos dos dois grupos
de tecidos que são trematodes e cestodes.

Ténia solium
Existem duas espécies de ténia, uma proveniente da vaca e outra proveniente do porco.

Ciclo de vida da ténia:


Como podemos ver na imagem, existe uma fita muito ramificada que chega aos 2 ou 3 metros,
que na realidade é uma cadeia que tem vários pedaços, e que cada pedaço corresponde a um
“útero” que está cheio de ovos que saem como as fezes para um ambiente. De seguida os porcos
vão ingerir alimentos que provêm de pastos que estavam contaminados com ovos. Ocorre a
eclodia no porco e os ovos vão originar larvas por um quisto que se chama cisticerco: quisto que
contem no interior o futuro helminto.
Este fenómeno ocorre, em princípio, em qualquer
parte do corpo porco, principalmente nos
músculos do porco, mas também no cérebro e
outras partes.
Os humanos, ao comerem a carne do porco crua
ou malcozida, ingerem quistos com as larvas.
Dentro do nosso organismo nasce a ténia.
No entanto, raramente se come carne de porco
crua ou malcozida. O problema esta na carne de
vaca.
Ao ingerirmos carne de vaca malcozida, ingerimos
os quistos com as larvas, que vão para o nosso
intestino e lá a larva vai sair do quisto e tornar-se
numa ténia.

Como podem ver a imagem ao lado, a ténia chega facilmente a 2 ou 3 metros


de comprimento. Podem também ver que não é uma fita, mas sim um
conjunto de pequenos pedaços, parecendo mais uma cadeia. No desenho é
mais fácil entender esses pequenos pedaços, que são denominados de
proglótide. Como podem ver na imagem de baixo, cada um destes é um
útero.
Às vezes, as pessoas queixam-se de ter encontrado “coisas brancas nas fezes”, que já é raro,
porque as partes no fim da helmíntia, as proglótides, podem partir-se e sair. Deste modo,
quando alguém está infetado com uma ténia, não é raro encontrar estes pedaços nas fezes.

Sintomatologia:
-Perda de peso; É um mito. “Uma fitinha tão fininha com a ténia não vai ficar com todas as
calorias que nos ingerimos de modo a notar-se uma perda de peso.” No entanto, no caso de ser
uma infeção por múltiplas ténias, a situação seria diferente. De qualquer modo, uma infeção
destas é rara, ou seja, normalmente não há infeções por múltiplas ténias, em contraste com o
que falamos na última aula, uma vez que o meio de transmissão é o consumo de carne crua.
Em Portugal, a ténia é muitas vezes designada por “bicho solitário” por se encontrar quase
sempres sozinha. É o único país em que se dá esta designação à ténia (de acordo com o
professor).
No entanto pode haver situações em que a pessoa é infetada por mais do que uma ténia, apesar
de não serem muitas.
É também pouco provável que a ténia cause uma obstipação, devido ao seu tamanho, um
“sintoma” que também está muitas vezes incorretamente associado.

Nos anos 30 e 40, devido ao mito relativo à ténia e perda de peso, vendia-se “ovos higienizados”
de ténia para as mulheres infetarem-se de prepósito, com o intuito de perderem peso.
Obviamente isso não funciona.

Contudo, a base dos mitos tem algum fundamento real. Algures na história, uma comunidade
estava a morrer à fome, com falta de mantimentos. Assim, o peso deles era baixo. Algumas das
pessoas estavam infetadas com ténias, pelo que pode ter surgido o mito.

Relativamente aos sintomas, já vimos que a ténia não causa perda de peso nem obstipação.
Causa “dor de barriga”, desconforto abdominal, que são sintomas muito generalizados e que
não dão grande informação.

Assim, qual seria a razão que levaria alguém a um medico quando está infetado, se não tem
sintomas específicos? Uma hipótese é a observação de “coisas brancas” nas fezes, as
proglótides.

A proglótide tem uma fita inteira, e depois cada peça do proglótide é um útero, que pode
aparecer como uma coisa branca nas fezes, mas para isso é necessário olhar para as fezes, o que
nem todas as pessoas fazem. Mesmo quando o fazem, normalmente não é razão para irem ao
medico, quando esse é o único fator.

Sendo assim, o mais provável é irem ao medico quando vêm o proglótide a mexer-se. Sendo o
proglótide “um útero”, histologicamente é constituído por musculo, o que lhe confere
movimento. Sempre que alguém vir uma coisa branca nas fezes a mexer-se, deve ir ao medico,
porque não é normal e pode ser uma proglótide.
O diagnostico é feito com a pesquisa de ovos nas fezes.

Na aula passada falamos de Nemátodos e nesta aula vamos falar de Tremátodos e Cestodos,
sendo que, em principio vamos falar de 3 helmintos, que são os mais relevantes:a ténia, no caso
dos tremátodos, os Shcistosoma e no caso dos cestodes, os Echinococcus.

Em carne infetada, podemos encontrar cisticercos, que são


“bolinhas” brancas do tamanho da cabeça de um fósforo,
sendo que estas podem estar em grandes quantidades no
musculo de um animal que tenha comido muito pasto
infetado.

NOTA: Para evitar a transmissão ou infeção por estes


helmintos, não é permitido o consumo de carne proveniente
de animais que não sejam mortos no matador, de modo que a carne possa ser inspecionada
pelo veterinário.

Na imagem ao lado podemos observar um exame imagiológico de


joelhos humanos, com vários pontos brancos, cisticercos, no
músculo das pernas.
Os cisticercos aparecem brancos na radiografia, uma vez que estão
calcificados. Qualquer corpo estranho ao nosso organismo vai ser
eliminado pelo sistema imunológico. Quando o sistema imune não
consegue eliminar o corpo estranho vai tentar matá-lo e depois
calcifica-lo.

No entanto, de acordo com o ciclo de vida descrito anteriormente, estes helmintos infetam o
intestino humano, vão para os pastos e depois infetam os músculos dos animais, voltando com
a cadeia alimentar para o humano, no trato digestivo,
Assim, como os humanos, normalmente não comem pasto, como é que poderiam ficar infetados
nos músculos? A resposta é comerem alimentos que estavam contaminados, tal como o pasto
dos animais. Para alem disto, os nossos músculos apenas podem ser infetados pela ténia do
porco e não pela ténia da vaca. (“deve ter sido um processo evolutivo; talvez sejamos mais
parecidos com o porco do que com a vaca”).

O problema está no facto de, em infeção no humano, a ténia não tem preferência em infetar os
músculos, podendo ir para os olhos, cérebro, para o coração (que é um musculo), e para outras
partes do corpo. Deste modo é possível ver em imagens TC cisticercos no cérebro. A presença
destes cisticercos no cérebro pode levar à ocorrência de convulsões.
Podem também interferir no sistema nervoso, quendo presentes na medula, levando à paralisia.

Assim, podemos ver que a cisticercose é uma doença grave, motivo pelo qual as fezes humanas
nunca podem ser utlizadas como fertilizante (“estrume”).

Diagnóstico:
-Teníase: pesquisa de ovos nas fezes ou de proglótides
O problema é a existência de cisticercos na fase do diagnóstico. Dependendo do local onde o
cisticerco se encontra, a dificuldade em realizar uma biopsia varia: no musculo é muito mais fácil
fazer uma biopsia, mas quando se encontra no cérebro, fica tudo mais difícil. Assim, como não
podemos fazer uma biopsia e cultura, temos de recorrer a métodos serológicos, pesquisando
anticorpos, o que é difícil de encontrar e avaliar.
Equinococose:
Echinococcus granulosis
Existem dois termos para descrever coisas diferentes: temos equinococose e o eritadidose

Equinococose é o ciclo normal silvestre. Eritadidose ocorre quando o humano entra no filme e
fica doente.

Equinococose:
Começamos com a ovelha, que também tem quistos. Os quistos formados pelo echinococcus
têm diametros de 5, 10 ,20 cm ou mais. Dentro de cada cisto podemos encontrar muitas
centenas ou milhares de helmíntias, sendo que cada um tem a capacidade de criar um novo
quisto.
Habitualmente, estes quistos encontram-se no fígado das ovelhas, porque quando ingerem os
ovos, estes vão eclodir e migrar pelo sangue para o primeiro “leito” que drena o intestino, que
é o fígado.

Ciclo de vida:
As ovelhas infetadas vão ser caçadas pelos lobos, que lhes comem as entranhas. Deste modo
comem os quistos. Assim, a helminta vai crescer no intestino, onde vai depositar os seus ovos.
Através das fezes, os ovos vão ser depositados no meio ambiente, sendo que a ovelha, quando
está a pastar vai ingerir os ovos dos helmintas.
É um ciclo de vida facl e simples entre a ovelha e o lobo. Mas então como é que o Homem entra
no ciclo e se infeta?
Pode ocorres de várias formas, sendo o mais comum com um hospedeiro intermédio: o cão.
A infeção ocorre quando ingerimos ovos, mas em princípio,
nenhum humano via comer os pastos infetados pelos lobos.
No entanto, os cães podem ingerir os ovos, depois quando
defecam podem infetar as zonas onde estão a ser plantados
ou cultivados vegetais, e nós ingerimos os ovos dessa forma.
Os ovos são um pouco viscosos, pelo que podem ficar
“presos” no cão. Este depois lambe-se e quando damos
festas ao cão, corremos o risco de ficar com ovos não mão.
Se por algum motivo levamos a mão à boca sem a lavar
primeiro, podemos ingerir ovos que depois vão
desenvolver--se no intestino em helmintas e o ciclo
perpetua-se.

Mas como é que o cão ingere os ovos?


Em Évora, por altura da Páscoa, houve uma feira onde vendiam os cordeiros para as pessoas
comerem. Os cordeiros estavam vivos e eram mortos no local de venda. Assim ficavam com
3 partes: a carne que ia ser comida (musculo), a pele que depois era vendida aos
compradores de pele e as entranhas que ninguém queria. Deste modo, as entranhas eram
atiradas para o chão e à noite os cães comiam as entranhas e consequentemente os ovos
dos helmintos. Foram tantos os casos de infeção por echinococcus que o hospital de Évora
criou uma consulta dedicada a estes casos.
Também no matadouro separa-se as entranhas da carne, mas nestes locais, o controlo de
infeção é superior e as entranhas não ficam no chão. No entanto, em regiões mais pobres,
as entranhas são simplesmente deitadas fora e depois ingeridas por cães, o que não deveria
acontecer. A situação em Évora foi resolvida com a criação de contentores próprios para a
colocação das entranhas de modo que os animais não consigam comer, logo não se infetem.
Voltando à doença, os humanos ocupam o lugar da ovelha
no ciclo de vida. Deste modo, os ovos vão eclodir, formar
quistos no fígado e em outros orgãos, pulmão ou cerebro.

Consequências:
Lesão no osso: é parecida com a destruição causado por
um sarcoma. Para se fazer o diagnostico de sarcoma é
necessário fazer-se uma biopsia. Deste modo, a biopsia
leva à rutura do quisto e os helmintos saem do quisto (isto
aconteceu a uma rapariga porque o medico não pensou
na hipótese de ser uma infeção parasitaria).
Deste modo, os helmintos ficaram livres no osso, musculo, etc., levando à criação de muitos
novos quistos. Para salvar a vida da rapariga tiveram de tirar a perna desde a anca, ou seja, não
por amputação, mas tiraram a perna para impedir a progressão da infeção para o abdómen.
A infeção por echinococcus pode ser fatal, caso haja, por exemplo um trauma no fígado, onde
se encontram os quistos, levando à sua rutura e consequentemente, formação de novos quistos.

Schistosoma
Schistosoma é um trematode e tem duas formas relevantes. Shistosoma haematobium vive nos
capilares da bexiga, e entre os S. mansoni e S. intercalatum que vivem nos capilares do intestino.
Ciclo de vida:
Nos capilares temos os helmintos adultos. Vivem entre 7 e 8
anos, juntos. A fêmea põe ovos que têm uma espicula e que se
prendem aos capilares de bexiga ou do intestino. Como com
qualquer corpo estranho ao organismo, o nosso corpo vai fazer
uma reação inflamatória, que ao longo do tempo leva o ovo
para fora do capilar, para o intestino, ou seja às fezes, ou à urina
na bexiga, saindo depois para o meio ambiente.
No meio ambiente, vai para a água, levando à formação da sua
forma infeciosa, que depois infeta os caracóis, hospedeiro
intermediário. Desenvolve-se dentro do caracol, levando à
formação de uma forma infeciosa que sai do caracol e devido à sua forma de seta ou flexa,
consegue penetrar a pele intacta, levando à infeção no homem, e o ciclo perpetua-se.

Transmissão: penetração da pele:


Pode ocorrer nas plantações de arroz, quando não são usa
botas de plástico, ou em africas nas possas de água onde as crianças
nadam e são expostas ao longo da vida.
O problema está na exposição continua ao agente, havendo assim
maior probabilidade de este penetrar na nossa pele, sendo que,
mesmo assim é possível ocorrer infeção numa só exposição.
Antigamente, as lavadeiras passavam muito tempo a lavar a roupa no riu, estando com as pernas
dentro de água durante esse tempo. Por esse motivo, em Portugal, estas cistotomias eram
conhecidas como a doença das lavadeiras.

Temos na realidade duas doenças, uma associada ao intestino, e outra que está associada à
bexiga.
Schistosomiase intestinal (bilharzoise)
Nem todos os ovos que são postos nos capilares do
intestino vão ficar presos aí, sendo transportados para
o leito mais próximo pela corrente sanguínea, que é o
fígado. Deste modo, os ovos no fígado vão provocar
cirrose hepática, o que é fatal. Pode afetar o baço,
levando ao aumento do fígado, baço, como podemos
ver na imagem em baixo:

Esta doença não tem cura,


sendo a única solução um
transplante. Sendo que
transplantes são muito improváveis em regiões como africa ou outras
regiões menos desenvolvidas, estas infeções são muito perigosas.

Schistosomiase urinaria (bilharzoise)


É mais conhecida, uma vez quando os ovos entram na urina
ocorre uma pequena hemorragia. O sangue é uma
substância que cora muito bem qualquer coisa.
Logo é um sintoma ou sinal facilmente detetado.
Em africa, em moçambique, há lugares onde todas as
crianças têm a urina vermelha.
Mas a presença de sangue na urina não é um problema.
Uma pessoa poderia viver com a urina com sangue. O
problema é a constante inflamação do musculo da bexiga,
o que pode levar a um carcinoma.
Na imagem de baixo podemos ver a diferença entre a urina
normal e a urina com sangue. Ao lado está uma imagem do carcinoma e a presença de dezenas
de ovos que estão presos na parede muscular da bexiga.
Esta é então uma doença muito
grave que afeta 200 milhões de
pessoas.

O diagnostico é feito pela


pesquisa de ovos nas fezes ou na
urina.
Tratamento: praziquantel
Data Docente
08/11/21 Prof. Doutor Marcos Pinho

Os vírus são parasitas intracelulares obrigatórios pois dependem das células hospedeiras para
se replicarem. Têm um tamanho que vai desde ~18 nm (parvovírus e picornavírus) até ~300 nm
(poxvírus e herpesvírus).

Estrutura do Virião
● Possui sempre genoma (DNA ou RNA) e
cápside proteica.
● Pode possuir um envelope lipoproteico e
proteínas com diversas funções (p.e.
fatores de transcrição), que são variáveis
de vírus para vírus.

Classificação dos Vírus


A mais utilizada é a classificação com base
no tipo de ácido nucleico que possuem.
Ciclo Viral
Difere de vírus para vírus consoante a complexidade dos mesmos, mas existe um padrão geral
que é seguido por todos.
As diferenças principais entre vírus prendem-se com as fases de entrada e saída da célula em
vírus com envelope versus vírus sem envelope, e também com replicação e transcrição do
genoma em vírus de DNA versus vírus de RNA.

1. Adsorção – Consiste no reconhecimento e ligação a recetores celulares.


Os vírus possuem proteínas de superfície que lhes permitem ligar-se a recetores nas células.
Para alguns vírus existem também co-recetores que medeiam esta ligação e permitem a entrada
do vírus na célula. De um modo geral é a interação entre as proteínas virais e o recetor do
hospedeiro que determina o tropismo do vírus. No esquema abaixo vemos os recetores
celulares das células do hospedeiro que são utilizados por alguns vírus nesta fase.

2. Internalização
Dá-se de maneira diferente consoante seja um vírus sem ou com envelope.
● Vírus Sem Envelope: Normalmente entram por endocitose ou por translocação, sendo
que na translocação fazem uso de algumas propriedades polares que lhes permitem
deslizar através da membrana.
● Vírus Com Envelope: Entram por fusão com a membrana.

3. Descapsidação – Libertação dos ácidos nucleicos e eventualmente algumas proteínas


que possam estar dentro do virião.
Pode ocorrer no citoplasma imediatamente após a internalização, como na maioria dos vírus de
RNA, ou na proximidade do núcleo, como nos vírus de DNA em que o seu processo de replicação
será feito no núcleo.

4. Síntese
a. De Ácidos Nucleicos

Vírus de DNA – A replicação e transcrição ocorrem no núcleo, exceto nos poxvírus.


● Replicação: Nos vírus mais simples é utilizada a DNA polimerase do hospedeiro,
enquanto que os vírus mais complexos codificam as DNA polimerases virais, para a
replicação.
● Transcrição: Por norma todos usam a RNA polimerase DNA dependente do hospedeiro,
para que os mRNA criados tenham as modificações necessárias para poderem ser lidos
pelos ribossomas da célula hospedeira. No entanto, no caso dos poxvírus, que fazem
estes processos no citoplasma, são utilizadas RNA polimerases do próprio vírus.

Vírus de RNA – A replicação e transcrição ocorrem no citoplasma.


O vírus tem obrigatoriamente de codificar uma RNA polimerase RNA dependente, ou seja, que
faz cópia do RNA a partir do genoma de RNA do vírus. Isto é particularmente importante para
os vírus de RNA de senso negativo pois têm estes de fazer com que se formem moléculas de
mRNA que consigam ser lidas pelos ribossomas.
No caso dos retrovírus, eles codificam uma DNA polimerase RNA dependente (transcritase
reversa).

b. De Proteínas
Numa primeira fase são transcritos genes de proteínas que vão ter um papel na replicação e
transcrição, como as polimerases. Posteriormente há replicação do genoma do vírus e síntese
das proteínas estruturais, com formação das partículas infecciosas.

5. Montagem
Muitas das vezes as proteínas têm sinais de reconhecimento que permitem que este processo
ocorra.

6. Extrusão
Libertação das novas partículas virais. Geralmente, nos vírus sem envelope ocorre por lise da
célula hospedeira e nos vírus com envelope ocorre por gemulação (aproveitando a membrana
da célula para o seu envelope).
São produzidas milhares de partículas e a maioria são defectivas, ou seja, devido a erros na
replicação ou na montagem, a maioria das partículas não tem potencial para infetar outras
células. Geralmente, apenas 1 em cada 10 partículas libertadas tem potencial infeccioso.

Diversidade Genética
Este processo de multiplicação tem consequências para a diversidade genética dos vírus. A
indução de diversidade genética é feita pelos seguintes mecanismos:
● Mutações – Devem-se à baixa fidelidade da polimerase viral e à taxa de replicação
elevada. Os vírus de RNA têm uma taxa de mutação superior. As consequências podem
ser:
○ Inativação de genes essenciais, sendo que a progenia dos vírus deixa de ser
capaz de infetar novas células.
○ Atenuação, isto é, redução da virulência do vírus.
○ Alteração do tropismo.
○ Mutantes condicionais, como por exemplo a sensibilidade à temperatura. Note-
se que muitas vezes estas mutações são utilizadas para a produção de vacinas
com vírus “vivos”.
● Recombinação
○ Exemplo 1: No HSV 1 e HSV 2 pode haver troca de segmentos de material
genético se se verificar a infeção de uma célula por 2 ou mais vírus, com criação
de vírus híbridos.
○ Exemplo 2: “Reassortment” em vírus influenza, que são vírus com o genoma
segmentado pelo que quando há infeção do mesmo hospedeiro por estirpes
diferentes de vírus influenza pode haver a combinação de segmentos.

Diagnóstico das Infeções Víricas


● Identificação do Agente – É relevante para saber como lidar com o doente, que agentes
antivirais utilizar caso sejam relevantes e pode levar à descontinuação de antibioterapia
que tenha sido iniciada.
● Utilização de Agentes Antivirais – Para o tratamento do doente. Os vírus não crescem
em meios sintéticos no laboratório pelo que não se determina suscetibilidade a
antimicrobianos como se determinaria numa bactéria, mas podem ser detetadas
mutações específicas. A deteção da carga viral é relevante na monitorização do
tratamento e curso da doença.
● Rastreio e Medidas de Saúde Pública

Os métodos de diagnóstico disponíveis são os seguintes:


● Isolamento do vírus
Podem ser utilizadas linhas celulares, sendo essencialmente utilizadas:
1. Linhas Primárias – Linhas celulares obtidas diretamente a partir do tecido de um
hospedeiro e que conseguem ser mantidas em laboratório, mas por norma não por
muito tempo.
2. Linhas Contínuas – Linhas celulares derivadas de células tumorais ou modificadas em
laboratório que ganham a capacidade de se dividir indefinidamente.
Podem também ser utilizados animais (não são utilizados no diagnóstico) ou embriões (para a
vacina da gripe são utilizados ovos embrionados).
O isolamento em cultura permite a multiplicação do vírus e a observação do efeito citopático,
isto é, do efeito que o vírus tem nas células. O conhecimento do efeito citopático de
determinado vírus numa determinada linha celular pode ajudar a fazer a identificação do
mesmo.
A escolha de uma linha celular é crítica para realizar o isolamento do vírus devido ao seu
tropismo, isto porque não é qualquer linha celular que vai permitir o crescimento de um
determinado vírus. Este processo não é aplicável a vírus não
viáveis ou não cultiváveis.

Imagem de Titulação de Vírus – Contagem do número de


partículas virais presentes numa determinada solução. Cada
um dos pontos visíveis corresponde a um local onde ocorreu
lise celular.

● Deteção dos Viriões por Microscopia


A microscopia eletrónica permite visualizar a morfologia dos viriões
(tamanho, estrutura e glicoproteínas). Este processo tem uma baixa
sensibilidade e exige que a amostra que se esteja a analisar tenha um
número relativamente alto de viriões presentes, estando limitado a alguns
tipos de infeção. Em infeções respiratórias muitas vezes o número de
partículas virais na amostra acaba por não ser suficiente para ser
observável.

Estas duas técnicas – isolamento do vírus e deteção dos viriões por


microscopia – foram utilizadas no passado, mas atualmente não são
utilizadas por serem laboriosas e morosas. Podem ter importância em
contexto de investigação e na caracterização e deteção de novos vírus.

● Deteção e Quantificação de Ácidos Nucleicos


A técnica de PCR permitiu um grande avanço na deteção de infeções
víricas. Possui sensibilidade e especificidade elevadas. É um teste
“universal”, isto é, desde que haja o mínimo de conhecimento sobre o vírus
em questão podem-se desenvolver primers e tentar detetar praticamente
qualquer vírus.
Existem esquemas “multiplex” que permitem detetar vários vírus ao
mesmo tempo, por exemplo, com uma amostra de LCR num doente com
meningite pode-se rapidamente fazer o screening para tentar detetar os
agentes virais mais frequentes para possivelmente confirmar uma etiologia vírica e descartar
um etiologia bacteriana.
PCR em Tempo Real – Neste tipo de PCR são utilizados fluorocromos e um sistema de deteção
da fluorescência, pelo que se consegue acompanhar em tempo real a formação das moléculas
de DNA viral sintetizadas e o aumento do sinal. Isto difere do PCR convencional em que no fim
se tem de executar uma eletroforese em gel e visualizar as bandas. Este processo permite fazer
a quantificação do material genético em determinada amostra e isto pode ser importante em
casos de doentes com VIH ou VHC para estimar a carga viral e acompanhar a progressão da
doença e monitorizar a resistências à terapêutica.

PCR “Point-of-Care” – Têm estado em


desenvolvimento. Em termos de rapidez
equiparam-se aos testes de antigénio,
mas com uma sensibilidade superior. Isto
consegue-se porque a amplificação do
DNA é feita de forma isotérmica, através
do uso de determinadas enzimas.
Existe também a nova tecnologia LAMP
(Loop Mediated Isothermal
Amplification), que faz com que se
formem mais sítios de ligação aos
primers acelerando a reação.
● Deteção de antigénios virais

Existem variados métodos para a deteção de antigénios virais, como:

○ Imunoensaios Enzimáticos (EIA): Como o ELISA. São os mais relevantes e mais


utilizados. Geralmente são feitos em placas de microtitulação com 96 “poços”.
Podem ser feitos de forma direta (esquema da esquerda) ou indireta (esquema
da direita).

● Imunocromatografia: São testes “point-of-care”, isto é, que permitem ter o


resultado com muita rapidez.

● Testes de Aglutinação: Por norma têm menor sensibilidade que os 2 anteriores.


● Imunofluorescência Direta ou Indireta

Tanto os imunoensaios enzimáticos como a imunocromatografia podem ser usados não só para
detetar os antigénios como também os anticorpos.

A deteção de antigénios virais é um meio de diagnóstico muito importante pela sua rapidez e
acessibilidade (kits de diagnóstico). Além disso, estes testes permitem a determinação de
serotipos, que pode ser relevante. No entanto, não é aplicável a todos os vírus e exibe menor
sensibilidade que o PCR, visto que não ocorre amplificação da amostra viral.

● Deteção de Anticorpos

Atualmente tem usos bastantes específicos. É necessário que ocorra seroconversão, isto é,
produção de anticorpos para determinado antigénio. Normalmente é direcionada a um agente
específico.

Exemplo 1: Deteção de IgM/IgG para distinção


entre uma infeção recente e uma infeção passada.
No gráfico está representado o seu uso para
diagnóstico da mononucleose infecciosa – os IgM
surgem rapidamente no início da infeção e
posteriormente surgem os IgG, sendo que neste
caso surgem IgG com 2 alvos diferentes (EBV VCA e
EBNA).

Exemplo 2: Western Blot. É um teste importante na


confirmação de infeção por VIH. Consiste em separar antigénios do vírus numa membrana e
fazer a sua transferência. São produzidos em laboratório vários antigénios do vírus. Quando o
soro do doente tem os anticorpos contra os antigénios típicos do VIH, vemos o aparecimento de
bandas por conjugação do anticorpo com o antigénio. As infeções por VIH são por norma
detetadas inicialmente por um teste que utiliza uma combinação dos imunoensaios enzimáticos
para deteção do antigénio viral.
Data Docente
09/11/2021 Prof. Doutor Mário Ramirez

PAPILLOMAVIRIDAE
Existem mais de 200 tipos diferentes de vírus de Papiloma Humano, dividem-se em 5 géneros
principais: α (o mais importante na infeção humana), β , γ , ν e μ. Todos eles são vírus sem
envelope, com um genoma circular e DNA em cadeia dupla. Apesar de haver vírus do Papiloma
que infetam várias espécies animais, os vírus que infetam os humanos apenas infetam os
humanos, pelo que infeção por estes não tem uma componente zoonótica. A replicação do DNA
acontece no núcleo, o que fez com que estes vírus fossem aproveitados para fazer vacinas.

VÍRUS DO PAPILOMA HUMANO

O vírus tem um pequeno número de grelhas abertas de leitura ou ORF´s (open reading frames).
É um epissoma circular, ou seja, é capaz de persistir nas células do hospedeiro livremente e de
se replicar e particionar nas células-filhas.

Vemos nesta imagem exemplos do


género α, μ e β respetivamente.
Tem um genoma circular, com uma
região reguladora – LCR. Tem genes
E (genes precoces), responsáveis
pela transformação da células
hospedeira, codificam proteínas
essenciais à replicação do vírus e à
sua manutenção (incluindo por
exemplo o gene que codifica a DNA-
Polimerase). Depois tem os genes L
(genes tardios) que codifica as
proteínas estruturais do vírus.

PATOGÉNESE

A infeção acontece nas células mais basais das mucosas, como a epiderme, ocorrendo aqui nos
queratinócitos basais. À medida que vai havendo uma diferenciação celular até ao estrato
córneo, há também a replicação do vírus, a maturação dos viriões e depois a libertação dos vírus
no estrato.

Do lado direito do slide está uma descrição das várias proteínas codificadas por este vírus. As
proteínas E1 e E2 ligam-se ao DNA; a E5 é uma onco-proteína que ativa a replicação por resposta
ao EGF (epidermal growth factor) pelo que promove a divisão celular e impede as células-
hospedeiras de entrarem em apoptose; as proteínas E6 e E7 são responsáveis pela
transformação que ocorre nos tipos mais agressivos do vírus do Papiloma Humano; por último
temos as proteínas estruturais L1 e L2.
TIPOS DE VÍRUS

Há dois tropismos muito diferentes:

● Tropismo Cutâneo: Causa uma infeção frequente – verrugas – sobretudo em crianças e


jovens.
● Tropismo para a Mucosa: Dentro dos vírus com este tipo de tropismo temos os HPV de
baixo risco e os HPV de alto risco, capazes de transformar e imortalizar as células do
hospedeiro.

GÉNEROS HPV

Como já foi referido antes, o género α é o mais importante. Muitas vezes infeções com os
géneros β e γ são assintomáticas, podendo, contudo, causar doença em imuno-comprometidos.
Quando temos infeções não-α as lesões são muitas vezes na pele (verrugas).

- Espécies α1, α8, α10, α13 pertencem ao grupo mais frequente, que causam lesões na pele,
também no epitélio oral e cervical.

- Espécies α9, α7, α5, α6, α11 são de alto-risco, com capacidade carcinogénica.

- Espécies do género β causam infeção assintomática, contudo a infeção pode ser transmitida (é
possível detetar DNA viral nas células pilosas, o que sugere que o folículo piloso é um local de
infeção, mesmo sem sinais claros da mesma).

TRANSMISSÃO

Os vírus do Papiloma são resistentes à inativação (pelo facto de não terem uma camada lipídica)
e a infeção (sintomática ou assintomática) pode levar à libertação de partículas virais.
A transmissão faz-se por:
● Contacto direto com a pele/mucosa infetada;
● Contacto sexual (sobretudo nos vírus que afetam o aparelho génito-urinário);
● Passagem através do canal de parto (dá-se uma transmissão vertical da mãe infetada
para o filho);
● Contacto com superfícies com partículas virais;
INFEÇÕES MAIS COMUNS

→ Verrugas

Muitas vezes acontecem nas mãos (dorso da mão) e joelhos (região extensora),
sobretudo em crianças. A transmissão faz-se por contacto e a infeção tem uma
incubação prolongada, que pode ir dos 2 aos 6 meses, pelo que os sinais podem
aparecer muito tardiamente. Esta infeção tem uma resolução espontânea, ainda que
possa demorar vários anos até acontecer.

- Verrugas Vulgares (HPV 1, 2, 4, 7, 27 e 57);


- Verrugas Plantares ( HPV 1, 4 e outros tipos não tão frequentes como o 57, 60, 63, 65
e 66);
- Verrugas Planas (HPV 3 e 10);
- Verrugas Filiformes: (= às vulgares, sobretudo HPV 2);

As verrugas podem também ser genitais, os chamados Condilomas Acuminados. Os


tipos de vírus que as causam são semelhantes às anteriores. Em termos de fatores de
risco são indivíduos com HIV ou imunossupressão, e indivíduos com doenças
sexualmente transmissíveis. Este género de verrugas pode levar anos a resolver-se, pelo
que pode ser importante fazer intervenções terapêuticas.

Em 80% dos casos, as verrugas têm uma resolução espontânea no período de 2 anos.

RISCO: BAIXO OU ALTO? Baixo!

Risco está maioritariamente associado com a função das proteínas precoces E6 e E7, que no
caso dos vírus de alto risco levam à imortalização das células infetadas e no caso dos vírus de
baixo risco (como é o caso dos vírus que causam as verrugas) não levam a esta imortalização.

A proteína E6 em vírus de alto risco inibe a ativação do fator p53 (anti-tumoral), inibe apoptose,
inibe diferenciação em queratinócitos, inibe a resposta através de IFN… não tendo os mesmos
efeitos em vírus de baixo risco. De uma mesma forma, a E7 leva a instabilidade genómica em
vírus de alto risco, e nos de baixo risco isto não acontece.

Assim:

● HPV baixo risco: Causam verrugas anogenitais e condilomas acuminados;


● HPV alto risco: Causam cancro do colo do útero (HPV 16 e 18), cancro da vagina, ânus
pénis;

EPIDEMIOLOGIA DO HPV

A infeção por vírus do Papiloma Humano está associada ao início da atividade sexual havendo
um atraso em relação à infeção e as primeiras lesões que poderão ser cancerosas. Com a
estabilização do número de atividades sexuais e do número de parceiros há uma descida na
prevalência da infeção e da lesão. A prevalência de cancro aumenta consistentemente com a
idade.
Em países mais desenvolvidos o pico da infeção ocorre no pico da atividade sexual, nos jovens
adultos, diminuindo depois, não só por haver uma maior estabilidade de parceiros, mas também
pela elevada quantidade de rastreios feitos e sensibilização que é feita, nomeadamente em
termos das medidas barreiras.

Noutros países menos desenvolvidos há uma prevalência mais ou menos constante.

PATOGÉNESE: CANCRO DO COLO DO ÚTERO

Este é um slide algo que complexo, mas que recapitula a informação já dada, especificamente a
infeção que ocorre em camadas mais basais. De destacar que a infeção que leva ao cancro do
colo do útero ocorre sobretudo na zona de transição entre o epitélio escamoso que existe na
vagina e a mucosa endocervical.

Nas imagens histológicas no canto direito vemos na imagem de cima um cérvix normal, já na
imagem de baixo temos marcação para um marcador tumoral, e vemos uma lesão de tipo CIN1
e CIN3 (mais avançada e agressiva) – Nota: CIN significa Cervical Intraepithelial Neoplasia.

A infeção inicial por HPV, num ano, pode-se tornar em infeção persistente, o que pode levar a
lesões do tipo CIN1 (não malignas) e reversíveis. Se a infeção persistir para além de um ano,
podemos ter lesões de CIN2 (pré-malignas) ou 3 (já malignas). Ainda assim pode haver
eliminação da infeção. Passado vários anos podemos ter deteção de cancro da cérvix.
PREVENÇÃO DE CANCRO DO COLO DO ÚTERO

→ Prevenção Primária: comportamentos saudáveis e vacinação.


→ Prevenção Secundária: programas de rastreio.
→ Prevenção Terciária: tratamento.

Portanto, um passo essencial na prevenção é a Colposcopia, uma observação do colo do útero


bastante aumentada através de um espéculo. Retira-se amostras da cérvix e envia-se para
citologia de forma a realizar o teste Papanicolaou.

Os testes citológicos têm uma sensibilidade relativamente baixa para lesões pré-cancerosas,
devem ser feitos num intervalo relativamente curto e quando se obtêm resultados equívocos
deve-se fazer um colposcopia com uma amostragem específica de zonas que possam ser pré-
cancerosas (o chamado triage test).

Se fizermos teste para a deteção de HPV a sensibilidade é mais alta, podemos espaçar mais esses
testes, mas ainda assim em resultados positivos temos de fazer uma colposcopia e retirar
amostras de regiões com lesões.

O teste simultâneo, ou seja, com envio de amostras citológicas e deteção de HPV, foi
introduzido apenas nos últimos anos. É o que tem maior sensibilidade, permite uma maior
extensão de tempo entre testes, e que requer menos triagens.

VACINA HPV

A vacina é baseada em “Virus-like particles”, ou seja, partículas semelhantes a vírus, mas que
não contêm o genoma viral. Contêm apenas as proteínas estruturais do vírus. Existem várias
vacinas, uma bivalente (destinada aos tipos mais agressivos, o 16 e 18), uma tetravalente e uma
nove-valente.
A vacina que está atualmente no PNV é a nove-valente, apresenta uma elevada eficácia, previne
cerca de 90% das infeções persistentes se tomada antes da primoinfeção, daí ser administrada
aos 10 anos de idade. Tem também um grande efeito de proteção de grupo.

OUTRAS PATOLOGIAS HPV

● Carcinoma Anal
● Carcinoma Pénis e Vulva
● Carcinoma Cabeça e Pescoço
● Papilomatose Respiratória Recorrente (transmissão vertical)
● Condilomas Acuminados/Verrugas Anogenitais
POLYOMAVIRIDAE

São vírus mais pequenos que os Papillomaviridae, tendo um genoma menor, que é circular e de
DNA. Os vírus mais comuns são o BKV e JCV. São ubíquos sendo que a maior parte da população
é infetada até aos 15 anos.

A transmissão faz-se por via aérea, mas também por água contaminada, urina ou saliva.
Estabelecem latência, no rim, em células B, na linhagem monocítica e noutras células, sendo,
contudo, vírus em que a infeção é assintomática. A reativação do vírus acontece em casos HIV,
imunossupressão ou gravidez.

ADENOVIRIDAE

Existem 7 espécies (A->G), existindo mais de 50 tipos. Não têm envelope, têm genoma linear de
dsDNA com proteínas terminais essenciais à replicação do mesmo.

PATOGÉNESE

O vírus entra na célula hospedeira libertando-se para o citoplasma e injeta o seu genoma no
núcleo. Os genes precoces (tal como acontece com os Papilomavírus e Poliomavírus) vão
interferir com o metabolismo da célula, bloqueando a apoptose e estimulando a divisão celular
para que haja replicação dos vírus, o que permite fuga às defesas. Há uma acumulação de
partículas virais no núcleo e libertação de viriões por lise celular.

Temos então dois tipos de infeção:


● Infeção Lítica: em células mucosas e epiteliais.
● Infeção Latente: ao nível dos macrófagos, células T, células adenoides… contudo, não há
transformação de células (como acontecia com papiloma)!!

EPIDEMIOLOGIA

A transmissão dá-se por via fecal-oral (os vírus são resistentes aos ácidos do aparelho digestivo,
proteases e bílis), via aérea e por contacto, inclusivamente nas superfícies visto que vírus são
resistentes a desinfetantes e secura. A água contaminada também pode agir como vetor de
disseminação.
A infeção tem um período de incubação que vai de 2 dias a 2 semanas, ocorrem sobretudo no
inverno e princípio da primavera. A primoinfeção ocorre até aos 5 anos, sendo que a maioria
das infeções são assintomáticas, mas muito infeciosas, o que permite a circulação sustentada
do vírus na população.

TIPOS DE INFEÇÃO POR ADENOVÍRUS

● Respiratória
Tipos 1-7
Tipos 4 e 7 causam surtos em recrutas militares

● Faringite
Semelhante à faringite estreptocócica, acompanhada de conjuntivite

● Conjutivite e Queratoconjuntivite Epidémica


Mucosa da pálpebra fica nodular

PREVENÇÃO E TRATAMENTO DE ADENOVÍRUS

Passa por lavagem das mãos, colocação de cloro nas piscinas e, no caso de militares, toma de
vacinas vivas atenuadas contra os tipos 4 e 7.

Quando temos virémia em imunossuprimidos podemos considerar administrar anti-víricos


como:
● Cidofovir: análogo da citosina que inibe a DNA-Polimerase vírica, eficaz contra todos os
adenovírus;
● Ribavirina: análogo da guanosina que inibe polimerases víricas, eficaz contra a espécie
C de adenovírus;

DIAGNÓSTICO DE ADENOVÍRUS

● Deteção por PCR


● Cultura de Células

PARVOVIRIDAE

Como o nome indica, é pequeno/parvum (18-26nm). Quanto a tipos mais comuns temos o B19
(causa eritema infecioso e crise aplástica), o bocavírus (infeção respiratória e gastroenterite), o
PARV4 e 5 e o AAV (adeno-associated vírus). É um vírus de cadeia duplas linear – ssDNA linear.

B19

Este codifica 2 proteínas estruturais e 1 não estrutural, infetando apenas células em mitose,
sobretudo células da linhagem eritroide que têm o recetor de antigénio P (globosídeo). Tem
uma transmissão via aérea através de secreções respiratórias, replica-se ao nível da nasofaringe
e aparelho respiratório superior. Causam uma viremia e disseminam até à medula óssea
podendo também atravessar a placenta nas grávidas. Estas infeções são caracterizadas por febre
baixa que progride para sintomas mais graves.
EPIDEMIOLOGIA

Transmite-se durante todo o ano havendo um pico no início do verão e fim de inverno. Há uma
evidencia de infeção em 40-60% dos jovens adultos e 90% da população mais velha.

Em termos de sintomas, cerca de 50% das infeções são assintomáticas. A primoinfeção resulta
numa artropatia (artralgias bilaterais com ou sem edema articular), sobretudo em mulheres.

ERITEMA INFECCIOSO

Pertence a uma das 5 rashs mais comuns em pediatria (as outras são varicela, rubéola, roséola
e sarampo). Constitui um rash eritematoso maculopapular, vermelho brilhante encontrado
sobretudo na face e coxas. Rash facial resolve-se em 2-4 dias, mas o reticular pode persistir.

Acontece sobretudo em crianças até aos 6 anos e aos pais das mesmas sendo que ocorrem
sobretudo devido à resposta imunológica ao vírus.

GRUPOS DE RISCO (B19)

Anemias crónicas, talassemias, imunodeprimidos ou indivíduos com terapêuticas biológicas que


impeçam proliferação das células B. Na gravidez a infeção tanto pode ser assintomática como
causar hidropsis fetalis ou mesmo aborto espontâneo.

DIAGNÓSTICO ETIOLÓGICO

PCR no soro e no sangue ou deteção de IgM e IgG. Não apresenta terapêutica especifica nem
vacinas.

BOCAVÍRUS

TRANSMISSÃO

Tem transmissão via aérea (HBoV-1) ou fecal-oral (HBoV-2, HBoV-3, HBoV-4).

EPIDEMIOLOGIA

40% das crianças entre os 18-23 meses são seropositivas e todos os indivíduos com mais de 2
anos são seropositivos. Causam infeções durante todo o ano havendo maior incidência durante
o inverno e primavera.

O HBoV-1 causa tendencialmente infeções respiratórias, já os restantes causam gastroenterite.

DIAGNÓSTICO ETIOLÓGICO

RT-PCR de amostras da nasofaringe, aparelho respiratório, fezes e soro.

TERAPEUTICA E PREVENÇÃO :

Não há terapêutica nem vacinas.


Data Docente
10/11/2021 Prof. Doutor Mário Ramirez

PICORNAVIRIDAE
São vírus pequenos (prefixo pico), de RNA com cadeia simples positiva e sem envelope (formam
estruturas quase cristalinas).

Existem 9 géneros principais, salientando:


- Enterovírus;
- Rhinovírus;
- Hepatovírus (vírus da hepatite A);
- Cardiovírus;
- Apthovírus;

Algumas características dos Picornaviridae:

• A injeção do material genético no citoplasma é suficiente para causar infeção da célula


(contudo o processo patológico natural é ligeiramente diferente disto, como veremos
adiante).
• Replica-se no citoplasma e leva à produção de uma única poliproteína, que é depois
clivada nas várias proteínas ativas.
• A maioria dos vírus desta família são citosólicos (permanecem no citoplasma, pelo que
não vão para o núcleo, nem se associam ao RE).

• Apresentam um aspeto ou com


espículas projetadas (imagem B), ou
com espículas mais internas (imagem
A).
• As cápsides são polímeros de
subunidades repetidas (4 proteínas
estruturais), por onde o material
genético é ejetado.

• Com a entrada do genoma dá-se uma inibição da transcrição e tradução no hospedeiro.


• São produzidos cerca de 100.000 viriões/células e o ciclo de replicação dura 3-4h.
• Entram pela orofaringe, mucosa intestinal ou aparelho respiratório superior, causando
uma virémia e infetar os tecidos alvos (podendo resultar numa segunda virémia).
• A resposta humoral na mucosa pode prevenir a infeção! Se não for evitada, a própria
presença de anticorpos no soro pode prevenir-se a doença.
ENTEROVÍRUS

Existem mais de 90 serotipos, pelo que uma resposta contra um dado serotipo não é protetora
quanto a outro serotipo. São extremamente resistentes, quer ao pH, quer à temperatura, quer
aos detergentes. Os serotipos mais importantes são:

- Vírus Coxsackie;
- Vírus da Poliomielite;
- Virus Echo – enteric cytopathic human orphan;
- Parechovirus;
- Enterovirus genéricos;

Como já foi referido, os enterovírus são muito resistentes, pelo que sobrevivem em ETARs e à
passagem no estômago, pelo que podem permanecer nas fezes. A libertação de vírus nas fezes
de uma pessoa infetada por durar mais que 30 dias. É, portanto, através das fezes humanas que
se dá a transmissão, quer seja por via fecal-oral direta, quer através do tratamento de esgotos
e lixeiras que contaminam os lençóis freáticos que resulta em água contaminada.

Estes vírus são citolíticos, pelo que a sua patogenicidade não está relacionada com a resposta
imunológica. A proteção à infeção faz-se com anticorpos neutralizantes, com grande
importância da resposta IgA e IgG.

PATOGENICIDADE

Temos então o reconhecimento das proteínas nas espículas do vírus pelos recetores da célula
hospedeira, o que estimula a endocitose. A acidificação do vacúolo de endocitose leva à ejeção
do RNA viral, que será depois replicado num “organelo de replicação”, produzindo depois não
só as proteínas necessárias à replicação do vírus, como as proteínas da cápsula que formam os
pentâmeros necessários à formação de viriões. Há 2 vias de libertação dos viriões: 1) Via
Lítica/Clássica; 2) Via Não-Lítica em que se dá a formação de estruturas membranares a partir
do RE em volta dos viriões e fusão dessa estrutura com a membrana plasmática permitindo a
libertação dos mesmos (é basicamente uma exocitose).
Os enterovírus apresentam dois recetores:
-Recetor de entrada: permite o reconhecimento da célula hospedeira.
-Recetor de ejeção (i.e, ejeção do vacúolo de endocitose para dentro da célula): permite a
ativação da ejeção do genoma do vírus, dá-se um alargamento das proteínas que constituem o
virião, de forma a produzir o canal que leva à expulsão do genoma para o citoplasma da célula.

→ Vírus da Poliomielite

Está presente há mais de 4000 anos, sendo endémico na população humana. É bastante
estável, pelo que não causa epidemias. Existem três tipos de vírus da poliomielite: 1, 2
e 3.

O que é a poliomielite? É uma parálise flácida, característica por uma hiporreflexia (não
há expressão de reflexos habituais) e sensibilidade intacta.

Infeção por vírus da Poliomielite:

-O vírus da poliomielite causa infeção assintomática em mais de 90% dos casos, estando
limitada à orofaringe e ao intestino.

-Quando há infeção sintomática:


• Polio Abortiva - Caracterizada por irritabilidade, apatia, dor extrema e dor de
garganta.
• Polio Não-Paralítica – Ocorre durante a fase aguda, que acontece em 1-5% das
infeções, caracterizada por febre, fraqueza assimétrica de vários músculos e
alguns sinais meníngeos.
• Polio Paralítica - Acontece em 0,1-2% das infeções. É a doença major, em que
ocorre a paralisia muscular (especialmente dos membros), que começa a
manifestar-se 3-4 dias após desaparecimento dos sintomas de doença minor, e
que ocorre devido à invasão do SNC a partir do sangue com inflamação e morte
neuronal. A fase de recuperação pode reverter o quadro de paralisia, contudo
pode também acontecer todo o quadro de poliomielite clássica, já visto
anteriormente.
• Polio Bulbar – envolve os músculos da faringe, cordas vocais e outros
envolvidos na respiração. Apresenta uma elevada mortalidade (75%).
• Síndrome Pós-Pólio – Corresponde a uma sequela tardia que acontece entre
30-40 anos após infeção aguda. É uma deterioração dos músculos afetados
inicialmente.

PROFILAXIA

A Poliomielite apresenta duas vacinas, a vacina de Salk (injetável, muito segura,


inativada) e a vacina de Sabin (oral, atenuada).

Nota: A Poliomielite é uma das doenças que se está a tentar erradicar.


→ Vírus Coxsackie e Vírus Echo

- Vírus Coxsackie A (lesões vesiculares): Causa Herpangina, uma infeção caracterizada


por febre, odinofagia, anorexia e vómitos. Formam-se lesões típicas no palato mole,
úvula e amígdalas. É autolimitada e transmitida por saliva e fezes.

- Vírus Coxsackie B (B “body”): Causa a Doença de Bornholm, caracterizada por um início


súbito de febre, dor torácica aguda unilateral, autolimitada (com recorrências após crise
inicial), com transmissão também por saliva e fezes. Como complicações desta doença,
pode haver miocardite e pericardite, potencialmente mortal em recém-nascidos e
bebés, mas benignas em adultos.

A doença mais frequente, causada tanto pelos Coxsackievirus como pelos Echovirus é o
Síndrome Mão-Pé-Boca que acontece sobretudo nas crianças, havendo 1-2 dias de febre
ligeira (abaixo dos 38ºC), dor de garganta, vómitos e irritabilidade, ulcerações dolorosas
na língua e parte interna dos lábios e bochechas. Pode formar-se um rash que evolui
para lesões vesiculares em volta da boca, palmas das mãos e plantas dos pés. É uma
doença autolimitada com transmissão através de secreções respiratórias, saliva e fezes,
estando os surtos muito associados aos jardins de infância. As complicações principais
são a perda de unhas e envolvimento do SNC, dando-se uma meningite assética,
paralisia flácida aguda e encefalomielite (EV-A71).

- Vírus EV-A71: É o mais neurotrópico de todos os NPEV, estando a sua patologia


relacionada com a resposta inflamatória, havendo já vacinas específicas para estirpe
circulante (apenas na China).

ENTEROVÍRUS NO SNC: DIAGNÓSTICO

Faz-se deteção dos vírus nas fezes, também sangue e líquor, mas são menos sensíveis. Pode-se
também fazer PCR.

→ Enterovírus D68

É menos robusto que os outros Enterovírus uma vez que não sobrevive à passagem pelo
estômago. Apresenta uma temperatura ótima de 33ºC, encontrada no nariz por
exemplo, pelo que este vírus causa maioritariamente infeções respiratórias como
faringite, bronquite e pneumonia. Este vírus é também neurotrópico, podendo causar
meningite. A sua transmissão faz-se por contacto e aerossóis.

DIAGNÓSTICO

Faz-se por deteção do vírus em amostra proveniente do aparelho respiratório, por


zaragatoa da orofaringe ou por aspirado. Também se pode encontrar os vírus no sangue,
fezes e LCR, apesar de mais raro. Pode-se usar PCR e serologia.

ENTEROVÍRUS E OUTRAS DOENÇAS – Síndrome Pós-Polio, Esclerose lateral amiotrófica, Diabetes


de Tipo I, Cardiopatia Viral Crónica.
RHINOVÍRUS

Têm uma temperatura ótima de crescimento de 33ºC pelo que se encontram


predominantemente no nariz. São destruídos num pH baixo, apresentam o mesmo recetor que
os Coxsackie (ICAM-1) e apresentam mais de 100 serotipos distribuídos em 3 linhagens
principais: A, B e C. A sua transmissão dá-se por contacto e por aerossóis.

A maioria da replicação viral acontece no nariz e é o principal agente das constipações, tendo
uma maior incidência em crianças. Cerca de 50% das infeções são assintomáticas.

CALICIVIRIDAE

São semelhantes aos picornavírus, são vírus de RNA de cadeia positiva. O Norovírus é a espécie
mais importante nas infeções humanas.

NOROVÍRUS

São a causa mais frequente de gastroenterite na américa (tanto epidémica como endémica).
Tem uma dose infeciosa muito baixa, cerca de 10 viriões são suficientes. Infeta células no
intestino o que resulta em diarreia, e causa uma limitação no trânsito gástrico o que pode
resultar em vómitos. A imunidade contra este é de curta duração.

O surtos acontecem a partir de água contaminada ou marisco. Pode haver transmissão via fecal-
oral ou pelo vómito, uma vez que o vírus é resistente à secura, ao calor e a desinfetantes. A
libertação de viriões pode acontecer entre 3 dias a 4 semanas após os sintomas e é uma infeção
autolimitada. O diagnóstico faz-se por PCR nas fezes.

REOVIRIDAE

ROTAVÍRUS

É também um causador importante de gastroenterite, apresenta um genoma de RNA em cadeia


dupla segmentado. Apresenta uma gama elevada de resistência ao pH (3.5-10), sendo também
resistente a detergentes e congelamento.

Apresenta vários serotipos, grupos e subgrupos.


Todas as crianças têm pelo menos uma infeção até aos 3-5 anos.

A entrada nos enterócitos


faz-se por reconhecimento
de um recetor, formando um
endossoma. Com a
acidificação do endossoma o
vírus liberta-se para o
citoplasma. O RNA viral vai
para o viroplasma, organelo
que produz depois as
diversas proteínas virais e
constrói os viriões.

Os sintomas não são devidos à destruição do epitélio intestinal ou a uma resposta inflamatória,
mas sim a uma estimulação neurológica que aumentam a motilidade no tubo digestivo, com
consequente aumento dos vómitos e de secreção de líquidos e sais do tubo digestivo. Esta
ativação neuronal dá-se por intermédio da proteína NSP4.

Apresenta uma transmissão fecal-oral, com libertação de viriões entre 2-7 dias após o início dos
sintomas. A resposta IgA é absolutamente essencial para a proteção.

Os sintomas da infeção por rotavírus são febre, letargia, anorexia, diarreia e vómitos. Este vírus
tem uma maior incidência em crianças com menos de 2 anos, havendo diversos surtos em
creches.

O diagnóstico faz-se por RT-PCR nas fezes.

Quanto a tratamento, como em todas as gastroenterites, passa por reidratação. A profilaxia por
vacinas (penta-valente e mono-valente).
Data Docente
10/11/21 Prof. Doutor Thomas Hänscheid

Hepatites

• Uma hepatite, por definição, é uma inflamação do fígado;


• As hepatites podem ser causadas pelos vírus da hepatite A, B, C, D e E, mas também por
outros agentes, como bactérias e alguns parasitas, por exemplo;
• Um dos sintomas da hepatite é a icterícia. As pessoas com icterícia grave, ou seja, com
níveis de bilirrubina elevados, apresentam os olhos amarelados e, dependendo do tom
de pele, isto é, caso se trate de uma pele clara, esta pode também encontrar-se
amarelada. Para além dos olhos amarelados, a icterícia provoca também comichão na
pele;
• Quase todos os vírus causam uma sintomatologia parecida, normalmente falta de
energia, prostação, eventual febre, etc.; no entanto, os olhos amarelados são uma
sintomatologia não típica que nos deve levar logo a pensar nos vírus da hepatite A, B, C,
D e E, uma vez que são a causa mais frequente desta situação;
• Os vírus Epstein-Barr, cytomegalovirus e o vírus da febre amarela são outras possíveis
causas de hepatite.

Tipos de hepatites

• Aproximadamente 5.3 milhões de pessoas nos Estados Unidos têm hepatite;


• Tudo o que infeta o fígado e causa inflamação corresponde a uma hepatite por
definição;
• A hepatite A é a primeira e corresponde ao tipo de infeção que ganhamos a partir de
água e comida contaminadas com fezes, ou seja, através de uma transmissão feco-oral.
Pode causar hepatite aguda grave mas não causa hepatite crónica;
• A hepatite B pode causar infeção crónica e é uma doença sexualmente transmissível
muito relevante em todo o mundo. Temos uma vacina muito eficaz para a hepatite B;
• A hepatite C é transmitida de pessoa para pessoa através de fluídos biológicos,
normalmente por transfusão de sangue por via parentérica ou atividade sexual, pelo
que também pode ser classificada como uma doença sexualmente transmissível. Causa
danos no figado e pode levar à morte. Não temos vacina mas temos um tratamento
eficaz;
• Saber quais os vírus que causam hepatite aguda e quais os que causam hepatite crónica
é importante para o diagnóstico. O diagnóstico é feito por serologia, isto é, através da
deteção de antigénios e anticorpos no sangue. Existem certos padrões de antigénios e
anticorpos que indicam se estamos perante uma hepatite aguda, uma hepatite crónica,
uma hepatite aguda em fase de ser crónica ou uma hepatite aguda em resolução, por
exemplo;
• Antes não havia tratamento para nenhuma infeção causada por vírus, mas com a
evolução da ciência e através dos antivírus descobertos para o HIV, foram adaptados
alguns fármacos para o tratamento das hepatites, sendo que algumas já tem
tratamento;
• Melhor do que tratar é prevenir e as hepatites A e B já têm vacinas altamente eficazes;
• A hepatite B pode causar doença crónica e grave mas já fomos vacinados contra esta
doença através do plano nacional de vacinação em crianças. Em África, há muita gente
positiva e crónica para hepatite B, especialmente mulheres que engravidam e têm então
filhos que já nascem infetados com hepatite B;
• A hepatite aguda é uma inflamação do fígado que só tem dois possíveis resultados finais
(outcomes): na maioria das vezes curamo-nos, a infeção resolve-se e a pessoa fica imune
para o resto da vida; mas, em alguns casos, a hepatite aguda pode ser tão fulminate que
a pessoa morre;
• A hepatite crónica é uma inflamação que dura muito tempo e um dos seus problemas é
o facto de que não se pode fazer quase nada contra isso, isto é, a inflamação do fígado
progride. Uma hepatite crónica (inflamação crónica do fígado) pode desenvolver-se
depois para uma cirrose hepática, isto é, uma situação em que o fígado deixou de
funcionar, que, por sua vez, progride muitas vezes para um cancro. No início temos
sintomas inespecíficos como fadiga, depois icterícia e mais tarde fígado cirrótico e
cancro;
• Em relação às hepatites A e E, o vírus da hepatite E é menos relevante porque o que
existe mais na europa é o A, que é agora endémico, sendo que o da hepatite E existe
mais na Ásia e na índia. São ambas hepatites agudas que podem ser fulminantes,
principalmente a hepatite E e especialmente se a infeção ocorrer numa mulher grávida;
• As hepatites B, C e D não causam hepatite aguda fulminante mas sim uma hepatite que
fica crónica, visto que o corpo não consegue eliminar o vírus, pelo que a pessoa pode
continuar a transmitir o vírus e desenvolver fígado cirrótico e cancro;
• Os 4 aspetos mais importantes a abordar para cada um destes vírus são a sua
transmissão; o tipo de infeção, isto é, se é aguda ou crónica; o tratamento; e a existência
ou não de vacinas.

Vírus da hepatite A

• A transmissão deste vírus é por via feco-oral com contaminação de certos produtos
alimentarescom fezes, como comida e sobretudo água, que são posteriormente
ingeridos. As mãos podem também ser uma via de transmissão, caso estejam
contaminadas e as levemos à boca.
• Causa infeção e inflamação do fígado auto-limitada, isto é, ficamos muito doentes mas
eventualmente eliminamos a infeção sem ser necessário tratamento;
• Não existe tratamento para a hepatite A;
• A melhoria das condições de higiene fez com que a hepatite A desaparecesse
praticamente em Portugal, mas nos países em que a higiene é bastante precária ainda
tem um papel muito relevante, sendo por isso bastante importante na medicina do
viajante, visto que se formos viajar para certos países de África devemos vacinar-nos
contra a hepatite A.

Vírus da hepatite B

• Na hepatite B, o vírus pode danificar o


figado e causar cancro;
• O vírus propaga-se através de fluídos
corporais infetados que entram no
corpo, como pode ser o caso do sangue,
do sémen, dos fluídos vaginais e dos
fluídos anais. Algumas situações em que
se pode apanhar este vírus são durante
o nascimento, em que uma mulher com
hepatite B pode passar a infeção ao seu
bebé, durante atividades sexuais sem preservativo, na partilha agulhas, de colheres,
giletes ou até mesmo escovas de dentes, uma vezes que uma quantidade pequena de
sangue, que pode até nem ser possível observar é suficiente para infetar outros;
• A saliva não permite a transmissão do vírus mas a escova de dentes pode ser um meio
de transmissão, uma vez que durante a lavagem de dentes podem ocorrer hemorragias
e o sangue pode então contaminar as escovas;
• Os líquidos biológicos são principalmente o sangue, tal como no HIV, não nos infetamos
através da saliva, mas sim através de qualquer coisa que pode fic ar contaminada com
sangue;

HIV vs Hepatite B

• O HIV apareceu como um doença nova e gerou muito medo, mais do que a hepatite B,
porque tinha uma elevada mortalidade e não havia tratamento. Mas quando analisamos
os estudos epidemiológicos verificamos que o vírus com maior taxa de infeção é a
hepatite B e não o HIV;
• O vírus da hepatite B é o agente mais antigo, pelo que já se adaptou bastante a nós,
sendo que mesmo sem quantidades muito baixas é capaz de causar infeção;
• Em África, o grande problema relativamente a este vírus é a transmissão de mãe para
filho, enquanto na Europa o maior problema é o sexo não protegido;
• É comum a existência de coinfeções de HIV e hepatite B em pessoas que vivem em África
e também no caso dos toxicodependentes;

Comparações entre vírus

• Os vírus das hepatites A e B têm diferentes


formas de transmissão, uma é por via feco-
oral (A) e a outra por contacto sexual ou
sanguíneo (B);
• Mais do que um ser um vírus de RNA (B) e o
outro de DNA (B), a principal diferença entre
estes vírus e que tem um impacto na vida
real é que um não tem envelope (A) e o
outro tem (B);
• O envelope é uma estrutura lipídica, pelo que os vírus que têm envelope são mais fáceis
de eliminar em comparação com os vírus que não têm, uma vez que são muito
facilmente eliminados com álcool ou lavagem com sabão;
• O coronavírus tem envelope, pelo que nos protegemos dele através da lavagem e
desinfeção das mãos; se fosse um naked virus, isto é, um vírus sem envelope, seria muito
difícil de eliminar;
• A resistências dos agentes a fatores ambientes
adversos, como, por exemplo, o álcool, define a
facilidade ou dificuldade que temos em elimina-los;
• Por isso, o vírus da hepatite A é muito difícil de
controlar, só é possível com muito boas medidas de
higiene; enquanto o vírus da hepatite B é relativamente
fácil de eliminar;
• Assim vemos que as fezes humanas não podem ser
usadas para estrumar produtos agrícolas, uma vez que,
para além de outros agentes, ficam também alguns
vírus a contaminar os produtos que ingerimos;
• Se olharmos para este tema como se o vírus tivesse uma
escolha na sua via de transmissão, de certo que este
preferia ser transmitido por via feco-oral, pois seria mais
resistente a condições adversas;
• Numa transmissão sexual ou parentérica, como é o caso da hepatite B, entram poucos
vírus, que só depois se conseguem replicar, pelo que, quando são transmitidos, são
muito poucos e logo o sistema imunitário entra em ação para os eliminar. O envelope
ajuda na primeira fase de replicação, pelo que é bom para estabelecer a infeção nestes
casos de transmissão;
• Na transmissão da hepatite A temos que uma pessoa vai engolir qualquer coisa
contaminada, pelo que os vírus entram no corpo em grandes quantidades, não
precisando de envelope para estabelecer a infeção.

Incidência das hepatites A e B

• A hepatite A existe em quase todo o mundo, mas principalmente em países com baixas
condições de higiene;
• A hepatite B está também distribuída pelo mundo, sendo que em África existem
bastantes casos em particular devido à transmissão materno-fetal;
• Portugal não apresenta muitos casos de hepatite A mas de hepatite B sim;
• As crianças não apresentam muitos problemas quando infetadas com o vírus da hepatite
A, pois, em termos evolutivos, na infância vão contactar com imensos virus, estando
bem preparadas para adoecer muitas vezes de forma não grave. Como acontece no caso
da varicela, a criança fica doente mas o adulto fica muito mais, embora os adultos
adoeçam menos frequentemente do que as crianças que, em certos países, estão em
contacto com terras contaminadas com o vírus. Ou seja, a hepatite A causa doença mais
grave nos adultos do que nas crianças.
• Na hepatite B é importante perceber qual a percentagem de pessoas que desenvolvem
hepatite crónica. Nos adultos a via de transmissão mais provável é a transmissão sexual
e verificamos que apenas cerca de 10% desenvolvem doença crónica. No caso da
transmissão materno-fetal, o bebé já nasce com a infeção, o que é bastante grave tendo
em conta que quase todos os bebés que já nasceram infetados, cerca de 95%, vão
desenvolver no futuro doença crónica e possivelmente uma cirrose. Assim, o grupo que
mais temos de ter a certeza que está protegido é o grupo das mulheres grávidas, sendo
que todas deviam estar vacinadas.
• Não existe tratamento para a hepatite A, só podemos atuar a nível sintomático;
• Para a hepatite crónica B já apareceram alguns tratamentos: temos o interferão α, um
modelador do sistema imunitário, que mostrou algum benefício, no entanto, apresenta
muitos efeitos secundários e não é muito eficaz; temos também o lamivudine 3TC, que
é um dos medicamentos que foram analisados para o HIV e que se descobriu que pode
também funcionar para a hepatite B, assim como vários outros que não são usados no
caso do HIV mas que foram desenvolvidos e mostram alguma eficácia para esta
hepatite;
• A mensagem chave é que para a hepatite aguda não há nenhum tratamento, equanto
que para a hepatite crónica há tratamento mas que só controla a doença, ou seja, não
é curativo e as pessoas com hepatite B vão ter a doença para o resto da vida, tal como
acontece no HIV, isto é, podemos tratar mas não conseguimos curar, apenas suprimimos
a reprodução do vírus;
• Existem vacinas quer para o vírus da hepatite A, quer para o vírus da hepatite B: a Havrux
corresponde à vacina contra a hepatite A e a Engerix corresponde à vacina contra a
hepatite B, no entanto, atualmente é mais usual o uso da vacina Twinrix, que junta as
duas vacinas numa só, permitindo vacinar de uma só vez contra as hepatites A e B.

Imunologia e infecciologia das hepatites

• O diagnóstico das hepatites é feito através de serologia, ou seja, através da deteção de


antigénios, partes do vírus ou anticorpos no sangue;
• IgM e IgG são dois anticorpos diferentes, sendo que o IgM está presente na fase aguda
da infeção e o IgG na fase tardia;
• Não conseguimos determinar o IgM em todas as situações, há doenças em que só
conseguimos determinar o IgG;
• Através da análise do gráfico, verificamos que no caso da hepatite, a doença aparece
após a exposição ao vírus e logo temos o surgimento e aumento do IgM, sendo que o
IgG só aparece e aumenta mais tarde. Num doente com olhos amarelhos, ou seja, com
sintomatologia, podemos determinar o IgM e o IgG, mas se analisarmos uma pessoa
anos após ter a infeção, agora já recuperada, apenas identificamos o anticorpo IgG que
a protege;
• Não temos apenas um antigénio e um anticorpo, temos 3 estruturas: HBsAg (antigénio
surface), HBeAg (antigénio envelope), HBcAg (antigénio core) e os seus respetivos
anticorpos. Assim, em teoria, devíamos ter 6 estruturas mas apenas temos 5, isto
porque na realidade não temos o antigénio HBc. Isto acontece porque o seu anticorpo
aparece tão depressa que em termos práticos não conseguimos determinar o antigénio;
• A vacina da hepatite apresenta o antigénio HBs e o
anticorpo que nos protege é o anti-HBs, ou seja, na
vacina temos HBs e quando vamos determinar os 6
parâmetros numa pessoa vacinada temos só Anti-
HBs, sendo isto o que nos indica que a pessoa foi
vacinada;
• O primeiro marcador serológico a aparecer em
alguém infetado após exposição ao vírus da hepatite
B é o antigénio de superfície da hepatice B (HBsAg),
que pode ser detetado normalmente cerca de um
mês depois da exposição, sendo que os sintomas ocorrem normalmente 12 semanas
após exposição. Quando o teste serológico do HBsAg é positivo, o ADN do HBV pode ser
detetado no sangue do paciente, sendo a duração da deteção de HBsAg e ADN do HBV
variável. 50% dos pacientes vão testar negativo para HBsAg e HBV DNA 7 semanas
depois dos sintomas da doença aguda aparecerem, sendo que todos os pacientes que
recuperam de uma infeção aguda vão ser HBsAg e HBV DNA negativos 15 semanas
depois do aparecimento dos sintomas.
• O antigénio da hepatite B HBeAg é normalmente detetado em pacientes com doença
aguda, sendo que a presença de HBeAg no sérum indica normalmente mais titers de
virus e mais infeciologia, sendo a titer de um vírus corresponde à menor concentração
de um vírus capaz de infetar células;
• A presença de anticorpos Anti-HBe indica níveis mais baixos de vírus e menos
infecciologia. A combinação do IgM Anti-HBc com o HBeAg e o HBsAg indica uma fase
aguda e normalmente uma elevada infecciosidade;
• O antigénio HBc também está presente mas não o conseguimos determinar porque o
anticorpo é tão rápido que vai elimina-lo, pelo que nunca somos capazes de o detetar,
só conseguimos identificar os anticorpos, primeiro IgM e depois IgG.

Vírus da hepatite C

• O vírus da hepatite C é um vírus de RNA;


• Comporta-se como o vírus da hepatite B, podendo transmitir-se por via sexual ou por
via parentérica através de uma transfusão sanguínea, o que foi um grande problema nos
anos 80;
• Provoca doença crónica muito mais frequentemente que a hepatite B, podendo evoluir
para cirrose e cancro. A hepatite B torna-se crónica frequentemente em bebés mas
raramente em adultos, enquanto na hepatite C quase todos os infetados, cerca de 90%,
desenvolvem hepatite crónica, tendo posteriormente o problema da cirrose e cancro
hepático;
• Tem distribuição a nível global, como seria de esperar de um vírus com transmissão
parentérica;
• Os vírus de RNA, como o da hepatite C, do HIV e do Coronavírus, não se replicam de
forma fiável, isto é, cometem muitos erros, o que pode levar ao surgimento de novas
variantes. Apesar de tudo, o Coronavírus consegue controlar alguns destes erros mas o
vírus da hepatite C não, o que faz com que as novas mutações levem a uma nova geração
de vírus. Algumas mutações tornam os novos vírus inviáveis, isto é, o erro é terminal,
mas muitos outros vão surgir com alterações ligeiras diferentes do anterior. Isto é um
problema para o sistema imunitário, que pode não reconhecer o vírus e não o conseguir
controlar tão facilmente quanto antes. É também um problema ao nível das vacinas,
que deixam de ser eficazes. Estes vírus sofrem mutações tão frequentemente que é
quase impossível criar uma vacina para eles;
• No entanto, para que estas mutações todas lhe sejam possíveis, estes vírus de RNA têm
de ter uma estrutura específica, normalmente com uma grande quantidade de enzimas
e outras estruturas próprias que lhe permitam replicar, produzindo moléculas de DNA a
partir de moléculas de RNA, entre outros passos de replicação. Estas são enzimas que
as nossas células não têm, o que permite ao mundo da farmacologia produzir
tratamentos contra estes vírus;
• A partir de experiências para o tratamento do HIV, criou-se o sofosbuvir, um fármaco
que, através da inibição de determinadas proteínas, consegue inibir a repliação do vírus
da hepatite C, evitando assim a doença;
• Ou seja, não há vacina para a hepatite C mas conseguimos tratar e curar pessoas com
hepatite C crónica, embora o tratamento seja bastante caro.

Vírus da hepatite D

• O vírus da hepatite D não existe por si só, isto é, sozinho este vírus não consegue causar
hepatite. Isto acontece porque lhe falta o antigénio HBs.
• Assim, o vírus da hepatite D só consegue causar infeção em 2 situações: infetando uma
pessoa ao mesmo tempo que o vírus da hepatite B ou infetando uma pessoa que tem
hepatite B crónica. Isto acontece porque o vírus da hepatite D precisa do HBs do vírus
da hepatite B para conseguir estabelecer infeção, o que faz com que a hepatite D só
exista associada à hepatite B, isto é, quem não tem ou não tinha hepatite B não vai ter
hepatite D.
• Em laboratório isto permite-nos detetar alguns erros. Por exemplo, se temos uma
amostra A, B e C negativos temos obrigatoriamente de ter também D negativo, visto
que só determinamos D quando há B.
• Não há vacina contra o vírus da hepatite D mas esta também não é precisa, pois a vacina
contra a hepatite B protege-nos simultaneamente contra os vírus das hepatites B e D.
Isto acontece porque a vacina contém o antigénio HBs, que vai induzir a produção do
anticorpo Anti-HBs, ou seja, se estamos vacina dos contra HBs, estamos protegidos
contra a hepatite D, que precisa deste antigénio para causar infeção.

Vírus da hepatite E

• O vírus da hepatite E é bastante idêntico ao da hepatite A, uma vez que a sua


transmissão dá-se também por via feco-oral e que é um vírus de RNA sem envelope;
• É mais frequente na Ásia e causa doença mais severa em mulheres grávidas.
Data Docente
11/11/21 Prof.ª Doutora Catarina Costa

Herpesvírus Humanos
Os herpesvírus humanos são vírus de DNA, linear, cadeia dupla, com envelope.
Agrupam-se em famílias mas possuem características em comum como a morfologia do virião,
modo de replicação e capacidade de estabelecer infeções latente.
O DNA genómico está envolvido com uma cápside, rodeada pelo tegumento (local onde estão
as proteínas e enzimas virais que ajudam a iniciar a replicação). O DNA e o tegumento estão
envolvidos por envelope lipídico com glicoproteínas (de ligação do vírus, suão, proteção contra
o sistema imunitário). Como possuem envelope, são sensíveis a vários agentes como
detergentes, dissolventes, desidratação, etc...

From Murray, Rosenthal, Pfaller,


Medical Microbiology, 7th Edition

Aqui temos uma tabela em que vemos como é que os vírus se agrupam nas 3 subfamílias, com
base nas diferenças nas características virais, como o genoma, tropismo para dadas células,
efeito citopático, local da infeção latente, patogénese da doença e manifestação clínica.

Os pontos de interrogação na tabela significam que pode haver mais células e formas de
transmissão para além das enumeradas.

Todos são ubíquos, com exceção do HHV-8, causando infeções comuns.


Habitualmente cursam com doença benigna, sobretudo em crianças, embora em
imunocomprometidos poderão provocar infeções com morbilidade e mortalidade significativas.

A replicação dos HHV


Inicialmente há a libertação de recetores
específicos e fusão com a membrana, e o DNA
é libertado para o núcleo.
Dá-se a transcrição (através de uma RNA
polimerase viral) e a replicação do genoma
(DNA polimerase viral) – amplificação do
material genético.
Na passagem do núcleo para o RE, citoplasma e
aparelho de Golgi, as cápsides com o genoma
adquirem as proteínas do tegumento e o
envelope.
Por fim, as partículas virais já formadas são
libertadas por exocitose ou lise celular.

Nota: a DNA polimerase viral para além de ser


importante para a replicação do vírus também
é um alvo terapêutico.

Vírus Herpes simplex


HSV 1 e HSV 2

São similares em muitos aspetos, mas podem ser distinguidos com algumas diferenças.

Proteínas:
• Possuem aproximadamente 80 proteínas (50% necessárias para a replicação, outras
envolvidas na interação com o hospedeiro e resposta imunitária)
• DNA polimerase e timidina cinase (possíveis alvos terapêuticos)
• Possuem muitas glicoproteínas que servem para a ligação do vírus, fusão, proteínas
estruturais, escape ao sistema imunitário...

Patogénese:
A infeção inicial é em células mucoepiteliais onde há as manifestações da doença e infeção lítica.

HSV 1 e 2 podem infetar os mesmos tecidos e causar doenças similares, mas têm predileção por
determinados locais: HSV1 causa sobretudo infeções da cintura para cima; HSV 2 da cintura para
baixo ( o que não quer dizer que não possam causar infeção noutros locais).

Podem ficar em estado de latência em neurónios, podendo haver reativação intermitente a


partir do estado latente (devido a stress ou imunossupressão), podendo, no entanto, ser
particularmente grave em pessoas que tenham algum problema no sistema imunitário. A tabela
abaixo ilustra alguns fatores que podem reativar a infeção viral.

Habitualmente as infeções recorrentes são menos severas, mais curtas e mais localizadas do que
a infeção primária.
Como se dá a infeção latente?
Após a infeção inicial, o vírus replica-se nas células -> transporte retrógrado para os gg nervosos
-> vírus regressa ao local de infeção inicial onde pode produzir lesões vesiculares (com inúmeras
partículas virais) -> lesão cura habitualmente sem cicatriz

T CD8 e IFN-γ são essenciais para manter a latência --> distúrbio: reativação

A proteção inata é normalmente suficiente para limitar a progressão da infeção, mas na ausência
de imunidade celular funcional -> infeção + severa e disseminação para outros órgãos.

Epidemiologia:

Transmissão através da saliva, secreções vaginais e outros fluidos resultantes das lesões
• HSV 1 (via oral),
• HSV 2 (via sexual, mas não exclusivamente, transmissão vertical no parto)
A pessoa infetada é fonte de contágio a vida inteira

Fatores de risco (doença primária): crianças, pessoas sexualmente ativas e profissionais de


saúde (contacto com vesículas infetadas)

Pode ser transmitido da mãe para @ filh@ durante o parto.

Infeções primárias por HSV 2 em idade + tardia (início da atividade sexual),

Sem incidência sazonal ou local

Manifestações Clínicas:

Infeção primária:
- Muitas vezes assintomática
- Pode aparecer sobre a forma de faringite ou estomatite herpética
Sintomas: febre, irritabilidade, dificuldade em comer e engolir,
- Duração > do que as infeções recorrentes.

Principal manifestação após reativação -> herpes labial

Outras manifestações que podem surgir após reativação:


• Queratite herpética (limitada a um olho ou recorrente)
• Panarício herpético (no dedo, contacto da pele com as vesículas, comum em
profissionais de saúde)
• Herpes gladiatorum (prática de desporto com contacto físico intenso)
• Eczema herpético (em crianças com eczema ativo)
• Herpes genital (HSV2 e HSV1) – > infeção recorrente + curta e – severa
o XY: pénis e uretra;
o XX: vulva, vagina, colo do útero e área perianal (com secreção vaginal mucoide
e prurido)
Complicações:
- Encefalite
- Infeção visceral
- Meningite (complicação infeção genital HSV2)
- Infeção no recém-nascido (com alguma fatalidade e + frequentemente adquirido na passagem
pelo canal vaginal. Como a resposta imunitária do bebé ainda se encontra pouco desenvolvida,
esta infeção pode causar atrasos no desenvolvimento do bebé e morte)

Diagnóstico:
- Critérios clínicos podem ser suficientes
- Visualização do efeito citopatico em células: é produzido em 2 ou 3 dias, imagem de células
não infetadas (cima) e infetadas (baixo) -> citoplasma aumentado e presença de inclusões;
- PCR e técnicas moleculares: são + rápidas, sensíveis e permitem a distinção entre HSV1 e 2;
- Cultura de células (modo + definitivo mas pouco usual)

Tratamento:

Aciclovir e derivados:
• análogo nucleosídeo: inibe DNA polimerase viral,
• atua apenas na fase lítica da doença, não atua na fase de latência;
• a fosforilação inicial do fármaco pela timidina cinase viral é essencial para que ele atue
• incorporação do farmáco prevenindo a enlongação do DNA viral

Prevenção:
- Evitar contacto direto com lesões
- Algumas vacinas em ensaios clínicos mas nenhuma ainda disponivel

Vírus varicela-zoster
VZV

Causa varicela (infeção primária) e herpess-zoster ou zona (recorrência)


Aquisição por inalação:
1- Trato respiratório
2- Vírus para as células do retículo endotelial (via hematogénea e linfática)
3- Virémia secundária
4- Chega à pele onde progride desde a formação de vesículas, pápulas e crostas
A replicação no pulmão é fonte de contágio e por isso é a varicela é muito contagiosa.

Varicela:
Um dos enxantemas da infância
Apenas ocorre no ser humano
Normalmente sintomática, com infecciosidade elevada
Febre, rash maculopapular após período de incubação de aprox 14 dias
Lesão maculopapular forma uma vesícula de base eritematosa
Lesões podem causar comichão (infeção secundária bacteriana)
A infeção primária é mais severa em adultos do que em crianças (resposta imunitária mais
exacerbada)

Diagnóstico: exame físico (verificar lesões em vários estadios de desenvolvimento, poupa


palmas das mãos mas não o couro cabeludo) e história do doente

Herpes zoster (zona):


Quando se dá a reativação do vírus, normalmente associada a adultos.
Infeção em doentes imunocomprometidos ou recém-nascidos pode resultar em doença
potencialmente fatal com disseminação orgânica.
Normalmente surge unilateralmente com vesículas bastante dolorosas.

Complicações: danos em neurónios podem cursar com nevralgia pós-herpética e herpes zoster
ophtalmicus

Diagnóstico:
- Como o vírus é muiro lábil, temos má replicação in vitro
-Efeitos citopáticos semelhantes a HSV (recolha de lesões da pele, amostras
respiratórias ou biópsias)
- PCR ou deteção de antigénios
- Testes serológicos

Tratamento:
- Varicela em crianças: sem necessidade de tratamento com antiviral, tenta-se evitar que a
criança coce as vesículas para que não haja infeção secundária (alguns geis que se colocam no
banho).

- Aciclovir e análogos aprovados para o tratamento de VZV -> DNA polimerase menos sensível
do que a de HSV

- VZIG: imunoglobulina usada como proteção passiva para pessoas imunodeprimidas que
estiveram em contacto com infetados (prevenir a disseminação do vírus)
- Vacina viva atenuada (estripe OKA): a partir dos 2 anos; não está incluída no PNV; recomendada
para:
o Mulheres não imunes antes da gravidez
o Pais de crianças jovens não imunizadas
o Adultos ou crianças que contactem com doentes imunossuprimidos
o Indivíduos não imunes com ocupações de alto risco (em creches, infatários, professores
e profissionais de saúde)

- Vacinação aos 60 anos para prevenir a zona (Zostavax), igual à vacina anterior mas com
cncentração superior

Vírus de Epstein Barr


EBV

Pertence a outra família, gama de hospedeiros e tropismo restritos.

Infeta linfócitos B de células epiteliais da orofaringe e nasofaringe


Produção linfócitos T citotóxicos em resposta à infeção
Infeção latente em linfócitos B

Transmissão maioritariamente por contacto com a saliva do doente (doença do beijo),


transfussões sanguíneas. Vírus presente na saliva durante meses após infeção, por isso, as
pessoas podem transmitir o vírus de forma intermitente mesmo sem sintomas.

Doenças associadas:

Mononucleose infecciosa:
Resulta da resposta dos linfócitos T citotóxicos aos linfócitos B infetados, que é necessária ao
controlo da replicação viral e morte dos linfócitos B.
A linfocitose (aumento das células mononucleadas) resulta da ativação e proliferação dos
linfócitos T, provocando:
o Inchaço dos órgãos linfóides (fígado, baço e nódulos linfáticos)
o Mal-estar e fadiga (devido a energia necessária para ativar linfócitos T)
Faringo-amigdalite resulta da resposta às células do epitélio e linfócitos B nas amígdalas e
orofaringe (confunde-se com amigdalite causada por Streptococcus pyogenes).
Curso benigno nas crianças, devido a resposta imunitária menos ativa, forma da doença menos
grave.

As células T são essenciais para limitar proliferação de células B infetadas e para o controlo da
doença.
O vírus persiste nas células B e pode ser reativado (por ativação das células B de memória).

Sinais e sintomas:
o Febre
o Faringo-amigdalite
o Linfadenopatia cervical dolorosa
o Fadiga
o Esplenomegalia
o Cefaleias
o Náuseas e vómitos
o Enxantema (reação devido a tratamento errado com
amoxicilina)
o Hepatomegalia
Complicações:
o Rutura do baço
o Obstrução laríngea
o Complicações neurológicas
-Meningoencefalite
-Síndrome de Guillan-Barré (polineuropatia que causa fraqueza muscular)

Outros microorganismos que causam síndromes mononucleósidos:


-CMV, HHV6, HIV, Toxoplasma gondii

Complicações do vírus de Epstein Barr (devido a proliferação desadequada de linfócitos B):


-Carcinoma nasofaríngeo (+ prevalente em regiões da Ásia, interferência de fatores genéticos)
-Linfoma de Burkitt (do maxilar e da face, endémica em crianças de regiões de África onde a
prevalência de malária é elevada, possível co-fator)
-Linfoma de Hodking
-Doença linfoproliferativa (em transplantados e imunocomprometidos)
-Leucoplasia pilosa oral (em doentes com SIDA)

Diagnóstico:
Sintomatologia
Hemograma: linfocitose, trombocitopénia, velocidade de sedimentação alterada, enzimas
hepáticas ligeiramente elevadas
Esfregaço de sangue periférico (com linfócitos atípicos, ativados pelos linfócitos B)

https://webpath.med.utah.edu/

Serologia:
o Produção de anticorpos heterófilos (reativos contra antigénios encontrados em
animais) -> teste rápido monospot (em crianças com muito pouca idade podem não ser
encontrados)
o Anticorpos específicos para EBV (reservados para doentes com sintomas crónicos ou
persistentes)
Na infeção aguda, os doentes têm anticorpos IgM contra a cápside. Semanas depois da infeção,
produzem anticorpos IgG contra antigénios da cápside e nucleares.
Luzuringa K et al, 2010, N Engl J Med:362

Tratamento, prevenção e controlo:


É uma doença para a qual não existe vacina.
No entanto, normalmente, é auto-limitada:
Terapêutica de suporte
Descanso
Evitar esforço físico (desportos com contacto físico para evitar rutura do baço)
Exposição única confere imunidade para a vida
Doença mais benigna em crianças

Citomegalovírus
CMV

É a principal causa de defeitos congénicos devido a infeção primária nas grávidas:


o 15% nados-mortos infetados
o 0,5-2,5% dos recém-nascidos infetados (USA)
o Tamanho pequeno, microcefalia, trombocitopénia, calcificação intracerebral,
icterícia,...
o Surdez e atraso mental

Agente patogénico oportunista em doentes imunocomprometidos, causando:


o pneumnia,
o retinite,
o colite
o esofagite

Eficaz a estabelecer latência em células T.

Transmissão através de transfusão de sangue,


tecidos (transplantes) e secreções (doença
sexualmente transmissível).
Quando um imunocompetente entra em contacto com o vírus pode tornar-se um portador
assintomático ou desenvolver uma mononucleose sem garganta inflamada e com anticorpos
heterófilos negativos.

No caso da infeção congénica, a mãe terá tido infeção primária na gravidez mas pode
acontecer se a mãe for seropositiva. A doença no recém-nascido normalmente resulta de uma
mãe não imune. A doença citomegálica pode acontecer e pode envolver muitos órgãos (fígado,
cérebro e sistema respiratória), pode ser fatal ou provocar sequelas neurológicas.

É muito comum em doentes com SIDA e pode causar muitas doenças nomeadamente do SNC.

Diagnóstico:
- Observação de células infetadas:
As células infetadas com este vírus apresentam uma característica
distinta: célula de tamanho aumentado com inclusão central
basofílica.
Podem ser encontradas em quaisquer tecidos do corpo e rina.
Inclusões visíveis na citologia vaginal com coloração de H&E

- Técnicas moleculares

- Serologia (IgM e IgG específicas para CMV)

Tratamento, prevenção e controlo:


- Medicamento antivirais: ganciclovir, valganciclovir (análogo a aciclovir)
- Prevenção da transmissão sexual
- Sem vacina
HHV6 e HHV7

Associados à roseóla infantil, caracterizada por febres altas e erupções cutâneas, comum em
crianças.
1- Período de incubação de 4-7 dias
2- Início abrupto de febres altas (4 dias)
3- Febre baixa e aparece o rash
4- Recuperação sem complicações

Pode causar síndrome mononucleósido e linfadenopatia em adultos; pode ser cofator na


patogénese da SIDA.

Pode reativar em doentes transplantados

HHV8 (sarcoma de Kaposi)

É uma infeção oportunista associada a SIDA.


Lesão que pode manifestar-se desta ou de outras maneiras.

Poxvírus

Generalidades Poxvírus:
Vírus de grandes dimensões: genoma de DNA, linear, de cadeia dupla
Replicação única em vírus de DNA (ocorre totalmente no citoplasma da célula hospedeira,
codificando todas as enzimas para a síntese de mRNA, DNA e outras atividades)

Após inalação,a replicação dá-se no trato respiratório superior, a disseminação ocorre por via
linfática.
Segue-se uma segunda e mais intensa virémia – erupção cutânea (pocks)

Molusco contagioso: aquisição por contacto direto com lesões

Varíola e molusco contagioso: vírus exclusivamente humano – os hospedeiros para outros


poxvírus incluem animais (vaca, ovelha)

Varíola:
Doença altamente contagiosa, transmissão era feita por via respiratória
Séc XVIII (Inglaterra): 7 a 12% mortes, 1/3 mortes de crianças
Doença para a qual foi feita a primeir vacina viva (1796): mulheres que retiravam leite a vacas
não apanhavam varíola, devido a contacto com cowpox, uma forma mais atenuada desse vírus
mas capaz de induzir resposta imunitária.
Erradicação (1980)

Patogénse:
- Vírus replica-se no trato respiratório
sem causar sintomas.
- De seguida infeta os macrófagos que
entram no sistema linfático e alcançam
os nódulos linfáticos.
- 2ª replicação e virémia: espalha-se para
baço, medula óssea, fígado e pele; causa
lesões adicionais no hospedeiro com
recuperação com/sem sequelas ou
morte

O que contribuiu para a erradicação da varíola?


- Existência de apenas 1 hospedeiro (Homem), sem vetores ou reservatórios animais
- Um único serotipo -> imunização confere proteção
- Manifestação clínica consistente (pústulas visíveis) com identificação das fontes de contágio
(quarentena e vacinação de contactos)
- Vacina: estável, barata, fácil de administrar, cicatriz característica
- Programa da OMS (1967), último caso detetado (1977) e erradicação (1980)

Molusco contagioso:
Período de incubação: 2 a 8 semanas
Transmissão por contacto direto ou fomites
Doença + comum em criança

Os nódulos podem ser removidos por raspagem ou aplicação de


soluções.

Confirmação histológica: inclusões citoplasmáticas em células


epiteliais
Vírus não cresce em cultura ou tecidos animais.
Lesões desaparecem por resposta imunitária.

Importa apenas referir que também existem


outros Poxvírus zoonóticos.
Data Docente
12/11/21 Prof.ª Doutora Ana Friães

Orthomyxovírus

• A família Orthomyxoviridae inclui 4 géneros de vírus


vulgarmente conhecidos como vírus da gripe: Influenza A
(Alphainfluenzavirus), Influenza B (Betainfluenzavirus),
Influenza C (Gamainfluenzavirus) e Influenza D
(Deltainfluenzavirus), sendo que os Influenzas A e o B são
os mais importantes em infeção humana;
• O Infleunza A infeta humanos e outros animais, o B só
infeta humanos, o C infeta humanos e porcos, mas a
infeção em humanos é pouco significativa, e o D não tem
infeções conhecidas no ser humano;
• O vírus Influenza é muito pleomórfico, podendo ter forma
circular, tubular, mais longo, mais curto, etc.

Características estruturais

• Vírus com envelope lipídico


• Genoma segmentado em 8
segmentos de nucleocápside em
que cada um tem uma cadeia de
RNA simples antisense helicoidal
ligada a nucleoproteínas e às 3
componentes da RNA polimerase;
• A proteína de matriz N1 reveste
internamente o invólucro,
enquanto a proteína N2 forma canais de protões de membrana, que são importantes
para o controlo do pH durante o ciclo de replicação;
• Hemaglutinina (HA) e neuraminidase (NA) são os dois antigénios mais importantes, não
só no ciclo do vírus e infeção mas também na epidemiologia.

Hemaglutinina

• É um trímero com forma de espigão que se liga ao ácido


sialico dos recetores das células epiteliais;
• Promove a entrada do vírus;
• Promove a libertação das nucleocápsides através da fusão
do invólucro com a membrana celular a pH ácido;
• Promove a reação de hemaglutinação, uma vez que a sua
ligação aos eritrócitos provoca a aglutinação destes;
• Estimula a resposta humoral;
• É um antigénio com elevada diversidade antigénica devido a mutações ("drift") e
rearranjos ("shift");
Neuraminidase

• É outro antigénio importante do vírus;


• É um tetrâmero;
• Cliva o ácido siálico das proteínas, impedindo a formação de
agregados das partículas virais e facilitando a libertação do vírus;
• Imunogénica;
• Apresenta diversidade antigénica por mutações ("drift") e rearranjos ("shift")

Replicação

• A entrada do vírus tem início na


ligação da hemaglutinina ao ácido
siálico dos recetores;
• O vírus entra na célula por
endocitose e depois ocorre o
processo de acidificação do
endossoma, que promove a fusão
do envelope do vírus com a
membrana do endossoma,
permitindo que sejam libertadas
as nucleocápsides;
• Uma particularidade deste vírus é que a replicação e a transcrição ocorrem dentro do
núcleo da célula: as nucelocápsides entram no núcleo para serem transcritas e
replicadas, os mRNA saem do núcleo para serem traduzidos e a hemaglutinina e
neuraminidase produzidas são processadas no RE, no aparelho de golgi, e são
incorporadas na membrana das células;
• As componentes da polimerase viral e nucleoproteína entram no núcleo para se
associarem às cadeias de RNA recém-formadas, que vão ser transportadas para o
citoplasma e associar-se à hemaglutinina e neuraminidase na membrana para formar os
novos viriões, posteriormente libertados preferencialmente na superfície apical da
célula.

Patogénese

• A infeção do epitélio respiratório superior constitui uma perda de defesas primárias,


visto que as células ciliadas e secretoras de muco são afetadas;
• A clivagem do ácido siálico do muco pela neuraminidase facilita o acesso do vírus aos
tecidos;
• A saída apical do vírus leva à transmissão deste no mesmo sentido, o promove a sua
transmissão e disseminação para o trato respiratório inferior, levando à formação de
lesões no epitélio respiratório, como a descamação, que, por sua vez, promove a
aderência bacteriana, pelo que a gripe é frequentemente seguida por infeções
bacterianas secundárias;
• Os sintomas sistémicos característicos da gripe (febre, mal-estar, cefaleias, mialgias)
devem-se sobretudo à estimulação da produção de citoquinas e interferão.
Sintomas e sinais clínicos

• O vírus da gripe tem um período de incubação muito curto, normalmente 1-2 dias, e
quando não há complicações a recuperação completa ocorre entre 7-10 dias;
• Começa com síndrome gripal caraterizada por mal-estar geral e cefaleias, seguindo-se o
aparecimento súbito de febre e outras sintomatologias sistémicas, como mialgias,
cansaço, fraqueza, anorexia, etc. Normalmente há também sintomatologia respiratória,
como corrimento nasal, tosse normalmente não produtiva e, por vezes, odinofagia;
• Esta sintomatologia varia de acordo com o hospedeiro e estirpe do vírus, podendo ser
mais ou menos intensa;
• Nas crianças com menos de 10 anos a febre é mais elevada e mais frequentemente
envolve o trato respiratório inferior, principalmente com bronquiolite ou
laringotraqueobronquite (crupe) - infeção em que há edema ao nível da traqueia e
laringe, levando a rouquidão, tosse laringea/de cão, e taquipneia, pode ocorrer também
em crianças otite média e alterações gastrointestinais;
• As suas complicações mais frequentes são pneumonias, quer viral primária, quer
bacteriana secundária (mais frequentemente causada por S. pneumoniae, H. influenza
ou S. aureus). Na pneumonia viral há agravamento dos sintomas, enquanto na
bacteriana ocorre um agravamento após um período de melhoria (apresentação
bifásica);
• Pode ainda causar misosite, que é uma complicação autolimitada ao nível dos membros
inferiores que pode ocorrer sobretudo nas crianças, cardite e envolvimento do SNC,
embora raro.

Epidemiolgia

• Este vírus transmite-se por via respiratória, sobretudo através de gotículas e aerossóis
ou por contacto com superfícies contaminadas, em que o vírus pode sobreviver até 48
horas;
• Nos países temperados, os Influenzas A e B só originam surtos ou epidemias durante o
inverno, com uma duração de 4-6 semanas;
• As crianças são as principais fontes de transmissão e uma das populações mais
suscetíveis à doença, juntamente com idosos;
• Outros fatores de risco para a doença são a imunosupressão, que inclui a gravidez,
patologias cardiorespiratórias, fumar e alguns fatores genéticos.

Drift e shift

• O drift e o shift antigénicos são conceitos importantes para a diversidade antigénica do


vírus e a sus epidemiologia;
• O drift origina pequenas alterações antigénicas por acumulação de mutações nos genes
da hemaglutinina e neuraminidase, sendo que estas pequenas alterações antigénicas
são suficientes para que o vírus seja suficientemente diferente do que o nosso sistema
imuntário já conhece, o que permite originar epidemiais sazonais de influenza A ou B;
• O shift origina alterações muito mais radicais, mas pouco frequentes, que só são
possíveis porque o genoma do vírus é segmentado. Quando há múltiplas estirpes do
vírus a infetar o mesmo hospedeiro, podem ocorrer rearranjos, durante o ciclo
replicativo, em que há novos vírus que ficam com alguns segmentos de um vírus e outros
segmentos de um outro vírus, formando-se novas estirpes com propriedades
antigénicas diferentes, por vezes provenientes de outros animais para os quais o ser
humano não tem uma resposta imunitária montada, sendo estas variantes que
normalmente causam as pandemias de gripe. Isto só acontece com o Influenza A porque
o B só infeta humanos e estes grandes rearranjos só ocorrem quando se juntam estirpes
com antigénios que vêm de diferentes animais; como o Influenza A infeta múltiplos
hospedeiros fica sujeito ao fenómeno de shift antigénico.

Nomenclatura das estirpes de Influenza

• A primeira letra designa o tipo de


influenza, A ou B sobretudo;
• Depois vem o local onde foi
isolado originalmente o vírus, não
significa que seja o local onde
surgiu a estirpe, mas sim o local
onde este foi isolado pela 1.ª vez;
• O número da estirpe é atribuído pelo laboratório onde o vírus foi isolado;
• Ano de isolamento;
• No caso do Influenza A faz-se ainda referência aos antigénios H (hemaglutinina) e N
(neuraminidase) devido ao antigénico shift, que faz com que este tenha uma grande
diversidade que lhe permite ser agrupado em subtipos.
• Existem 11 subtipos de neuraminidase e 18 de hemaglutinina;
• Os últimos dois antigénios a serem descritos para ambos H e N só foram encontrados
em morcegos, mas os outros existem em mais animais, principalmente nas aves
selvagens; em humanos e porcos só se encontraram alguns antigénios;
• As aves selvagens, sobretudo migratórias são
consideradas o principal reservatório de
diversidade antigénica do vírus Influenza A e
podem transmitir novas estirpes a diferentes
grupos de animais;
• Ao ser humano chegam novas estirpes através
de animais com que este tem mais contacto,
como os porcos e galináceos, que por sua vez os
adquirem de patos domésticos que os apanham
das aves selvagens.

Pandemias de Influenza

• As pandemias que existiram foram sempre de Influenza A;


• Antes da gripe espanhola não havia certeza nas variantes antigénicas em causa; em 1918
houve a pandemia de gripe espanhola, que foi a mais mortífera dos últimos 100 anos,
tendo sido causada pela estirpe H1N1; em 1957 apareceu a estirpe H2N2 da gripe
asiática; em 1968 apareceu gripe de Hong Kong com a estirpe H3N2, sendo que até hoje
há derivados deste vírus que se mantêm em circulação, constituindo uma das principais
linhagens de gripe; em 1977 apareceu um novo H1N1 diferente do da gripe espanhola,
a gripe russa, que permaneceu em circulação até 2009, altura em que entrou em
circulação outro H1N1 diferente que originou a pandemia de gripe suína , também
conhecida como gripe A de 2009, um vírus que também continua em circulação;
• Todas as pandemias começaram com um período inicial de 1-2 anos e depois o vírus
tornou-se endémico até ser substituído por outra variante;
Gripe espanhola

• Causou mais de 50 milhões de mortes;


• Apresenta analogias com a pandemia de covid-19, visto ter sido recomendado o uso de
máscaras e o lockdown de algumas cidades;
• Ao longo de 2 anos de pandemia ocorreram 3 principais vagas de mortalidade, de forma
semelhante ao que temos observado na covid-19;
• Teve uma mortalidade elevada nos jovens adultos, ao contrário do que costuma
acontecer com a gripe sazonal.

Pandemia de 2009 (Gripe A)

• A/California/7/2009 (H1N1pdm09)
• Envolveu rearranjos antigénicos shift de estipes de Influenza de 3 hospedeiros
diferentes - porcos, aves e humanos -, tendo ocorrido pelo menos dois fenómenos de
rearranjos entre estas estipes e depois mais um antigénico shift entre esta estirpe e
outra estirpe suína, que originou então a estirpe que foi transmitida ao homem;
• Esta estirpe foi bem-sucedida na transmissão homem a homem, daí ter sido pandémica;
• Teve origem no México na primavera de 2009, embora o 1.º isolamento tenha sido na
Califórnia;
• Teve uma mortalidade particularmente elevada nos 22 meses-57 anos, não comparável
à da gripe espanhola nem da covid-19 mas foi superior ao habitual nesta faixa etária. As
pessoas com 60 anos tinham uma melhor resposta imune devido ao contacto com o
vírus H1N1 ainda da gripe espanhola, que era um vírus antigenicamente mais parecido
com este do que o que estava na altura em circulação;
• A vacina ficou disponível e a pandemia foi declarada como terminada em agosto de
2010;
• Esta estirpe foi bem sucedida na transmissão homem a homem, daí ter sido pandémica;
mas isto não acontece frequentemente. Temos como exemplo a estirpe zoonótica, que
teve alguns casos que originaram pequenos surtos na Ásia, onde há promiscuidade
entre vários animais diferentes e entre estes e o homem, como nos mercados de
animais vivos, sendo que alguns destes surtos tiveram mortalidade elevada, mas como
o vírus passava dos animais para o ser humano e depois não se transmitia
eficientemente entre estes, as epidemias ficaram controladas.

Diagnóstico

• O diagnóstico laboratorial da gripe é feito com finalidade epidemiológica a partir de


amostras respiratórias, nomeadamente exsuados nasais e faríngeos;
• O isolamento do vírus é feito em cultura com células de rim de macaco, sendo apenas
feito em laboratórios de referência com equipamentos específicos, morosos, mas de
elevada sensibilidade;
• O método mais utilizado diagnóstico é o RT-PCR, que tem especificidade e sensibilidade
muito elevadas, permitindo um diagnóstico em poucas horas com identificação do tipo
de Influenza A ou B e por vezes até da estirpe, mais do A do que do B porque este último
não tem tanta diversidade antigénica;
• Há painéis de PCR que permitem detetar vários vírus respiratórios;
• Os testes rápidos de antigénio, como os que se usam agora para o SARS-COV-2
permitem detetar e distinguir entre A e B, são rápidos, mas têm sensibilidade bastante
limitada;
• Existem ainda métodos moleculares baseados em amplificação isotérmica, que são
ainda mais rápidos que o RT-PCR mas que têm sensibilidade um pouco menor.

Terapêutica

• A terapêutica da gripe é sobretudo sintomática, isto é, para aliviar sintomas e baixar a


febre, no entanto, existe terapêutica antiviral recomendada aos doentes com maior
risco de desenvolver complicações, sendo que quando é administrada nas primeiras 48
horas alivia os sintomas e reduz a duração da doença; também pode ser usada com
profilaxia pós exposição mas isso tem gerado algumas preocupações com o facto de
poder originar seleção de estirpes resistentes;
• A terapêutica recomendada atualmente é feita com inibidores de neuraminidase, ou
seja, é inibida a morfogénese e a libertação do vírus - oseltamivir (adminitração oral),
zanamivir (inalatória), permivir (intravenoso) - inibidores ativos contra Influenza A e B;
• Já se usou também amantadina e rimantadina, que bloqueiam o canal de protões
formado pela proteína M2, mas só são eficazes contra o Influenza A; atualmente não
estão recomendados porque há muita resistência nas estirpes de Influenza A em
circulação
• No período pré pandemia de 2009 tínhamos
e continuamos a ter em circulação a estirpe
H3N2, que tem uma resistência muito
prevalente a amantadina e rimantadina
(adamantanos). O H1N1 que estava na altura
em circulação não era resistente a estes mas
ao oseltamivir sim, no entanto, depois a
estirpe pandémica veio mudar este cenário,
sendo resistente a amantania e rimantana
mas pouco ao oseltamivir.

Prevenção

• Existem medidas comportamentais importantes, também adotadas com a covid-19,


como a etiqueta respiratória, o distanciamento social, a higiene ou encerramento dos
mercados de animais vivos para evitar a passagem de novas estirpes para o homem,
etc.; mas o mais importante é a vacina;
• A vacina que temos atualmente em Portugal é uma vacina inativada constituída por
estratos de HA e NA purificadas de 3 ou 4 estirpes;
• Todos os anos, a OMS, de acordo com a vigilância epidemiológica, emite recomendações
para a formulação de uma vacina trivalente (2 estipes de A e 1 de B) e outra tetravalente
(2 estirpes de cada), sendo que consoante os dados obtidos inicia-se o processo de
produção que demora 6-8 meses e que começa por recombinar as estirpes com os
antigénios de interesse com uma estirpe de crescimento altamente eficiente em ovos
embrionados de galinha, dando-se então posteriormente a seleção dos recombinantes,
a inativação do vírus e a sua purificação parcial;
• Em Portugal, a DGS recomenda fortemente a vacina da gripe a pessoas com idade acima
dos 65 anos, a doentes crónicos e imunodeprimidos (a partir dos 6 meses de idade), a
grávidas e a profissionais de saúde, sendo também recomendada a pessoas entre os 60-
64 anos.

• Observando os dados
epidemiológicos da prevalência e
incidência da gripe a nível global
verificamos os típicos picos das
epidemias sazonais de gripe, no
entanto, verificamos também que em
2020/2021 a gripe despareceu, o que
se deveu às medidas de restrição
implementada por causa da covid-19;
• Verificamos que ocorre também uma
flutuação na prevalência das várias estirpes em circulação, tendo havida nalguns
períodos prevalência do Influenza A e noutros grande prevalência do B;
• A linhagem Yamagata tem sido menos prevalente nos últimos anos, mas em 2017/2018
aumentou bastante e levou a que vários países passassem a adotar a vacina tetravalente
em vez da trivalente, como foi o caso de Portugal;

Extinção da linhagem B/Yamagata

• A linhagem B/Yamagata parece estar a desaparecer com a pandemia da covid-19, uma


vez que tem havia uma diminuição dos casos de gripe, sendo que em até metade do ano
2021 só se detetaram 31 casos, não tendo sido nenhum sequenciado;
• Esta linhagem pode estar em extinção ou então pode não estar simplesmente a ser
detetada, visto que a maioria dos painéis de PCR que se usam para diagnóstico não faz
distinção entre linhagens de Influenza B;
• Isto poderá ter implicações nas futuras formulação da vacina disponível.

Paramyxovírus

• A familia Paramyxoviridae inclui 4 géneros de vírus de transmissão respiratória:


Morbillivirus - Sarampo
Rubulavirus - Parotidite epidémica e Parainfluenza 2 e 4
Respirovirus - Parainfluenza 2 e 3
Pneumovirus - Vírus respiratório sincicial (RVS) e Metapneumovirus (embora este último
tenha sido recentemente reclassificado numa família à parte - Pneumoviridiae)
Características estruturais

• É um vírus com envelope


lipídico;
• O genoma não é segmentado,
isto é, temos uma cadeia única
de RNA de cadeia simples anti
sense helicoidal e duas
glicoproteínas: uma mais
pequena (F), que promove a
fusão com a membrana das
células hospedeiras, e uma maior, que promove a ligação aos recetores e pode ter
atividade hemaglutinina e neuraminidase (HN), só de hemaglutinina (H) ou não ter
nenhuma destas duas atividades (Proteínas G).

Replicação

• As principais diferenças
relativamente ao ciclo de
replicação do Influenza são
que a fusão dá-se
diretamente com a
membrana celular, ou seja,
não há passagem por
endossomas e a replicação
e transcrição ocorrem
integralmente no citoplasma, não há entrada das nucleocápsides no núcleo;
• Estes vírus promovem a fusão entre as células hospedeiras, o que leva a que se formem
células gigantes multinucleadas, também designadas sincicios.

Vírus do Sarampo (Measles/Rubeola)

Nota: Rubeola em inglês significa Sarampo e não deve ser confundido com a Rubella em
português, que é causada por um vírus de outra família, o Togavírus.

• O sarampo é uma das infeções mais contagiosas que se conhecem, em parte porque o
contágio começa antes do aparecimento dos sintomas;
• O vírus entra por via respiratória mas o alvo primário de infeção são os linfócitos e as
células dendríticas, que levam o vírus para circulação, causando virémia;
• Através dessa virémia, o vírus dissemina-se para vários tecidos onde se pode replicar,
como o trato respiratório, sistema nervoso central, trato urinário, etc.;
• Tem um período de incubação longo, entre 7-13 dias;
• Os sintomas por ser respiratórios (tosse e rinorreia) e são acompanhados por febre alta,
podendo também haver conjuntivite e fotofobia;
• Dois dias depois do início destes sintomas surgem as manchas de Koplik na mucosa oral.
Estas manchas têm a aparência de pequenos grãos de sal rodeados por um halo
vermelho e são muito características deste vírus, permitindo fazer o seu diagnóstico; no
entanto, muitas vezes não chegam a ser observadas porque só duram 24-48 horas;
• Cerca de 12-24 horas depois do aparecimento das manchas de Koplik, aparece o
Exantema maculopapular, que é mais característico do sarampo e que começa
normalmente nas orelhas, estendendo-se depois a todo o corpo entre 1-2 dias, e
desaparecendo posteriormente pela mesma ordem que apareceu. O dia em que
aparece o exantema é o dia mais difícil para o doente (febre mais alta e mais mal-estar
geral);
• É uma infeção que ocorre normalmente na infância com curso benigno, mas pode dar
origem a algumas complicações, como pneumonia (60% das mortes associadas ao vírus
do Sarampo) e encefalite (mais rara mas com mortalidade muito elevada);
• Não há tratamento antiviral específico, mas há uma vacina de vírus atenuado que é
altamente eficaz e faz parte do plano nacional de vacinação há bastante tempo. Esta
vacina já permitiu erradicar o vírus do sarampo em alguns países durante alguns anos,
incluindo Portugal; no entanto, nos últimos anos têm surgido surtos com origem em
pessoas que não foram vacinadas;
• O diagnóstico laboratorial é feito por serologia (IgM) ou RT-PCR em amostras faríngeas
ou urina.

Vírus da parotidite (Mumps)

• O vírus da Parotidite é vulgarmente conhecido como papeira;


• Entra por via respiratória, passa para a circulação, causando virémia, e a partir daí pode
instalar-se em várias glândulas diferentes, embora o principal alvo sejam as parótidas;
• Há envolvimento do SNC em 50% dos casos, mas só uma parte dos doentes manifesta
sintomas de meningoencefalite;
• A infeção pode ser assintomática em 1/3 dos casos, caso contrário há início súbito de
parotidite, caracterizada por dor e inchaço nas parótidas, febre e outros sintomas
sistémicos;
• Pode haver inflamação de outras glândulas em crianças pequenas, orquiepididimite
(inflamação dos testículos que pode causar esterilidade) em adolescentes do sexo
masculino, ou ainda outras complicações raras como meningite e encefalite;
• Não há tratamento antiviral específico, mas existe uma vacina de vírus atenuado muito
eficaz;
• O diagnóstico é feito por serologia e RT-PCR.

Parainfluenza, vírus respiratório sincicial (RSV) e metapneumovírus humano

• São vírus que causam apenas infeção respiratória, ou seja, não causam virémia;
• O Parainfluenza causa constipações ligeiras, otite média aguda, e infeções do trato
respiratório inferior nas crianças, sobretudo laringotraqueobronquite;
• O RSV é a principal causa de mortalidade infantil por infeção respiratória aguda,
infetando a esmagadora maioria das crianças no seu primeiro ano de vida. 25-33% das
infeções nas crianças com menos de 1 ano envolvem o trato respiratório inferior, como
bronquiolite e pneumonia; nas crianças com mais de 1 ano e nos adultos a (re)infeção
limita-se ao trato respiratório superior e otite média aguda; e nos idosos volta a haver
infeções do trato respiratório inferior;
• O Metapneumovirus humano infeta sobretudo crianças até aos 5 anos, tem um espetro
de infeções semelhantes ao RSV mas menor taxa de incidência e menor taxa de infeção
grave;
• O diagnóstico é feito sobretudo através de testes de antigénio e RT-PCR a partir de
secreções respiratórias;
• Para estes vírus não há vacina nem tratamento antiviral específico, podendo apenas ser
considerada a ribavirina em crianças de alto risco infetadas com RSV.
Data Docente
12/11/2021 Prof. Doutor Mário Ramirez

Arbovírus:
• Transmitidos por artrópodes (mosquitos);
• Diversos hospedeiros: normalmente zoonoses, podendo ser vertebrados e
invertebrados;
• Com envelope lipídico;
• RNA;
• Diversas manifestações.

Dentro dos arbovírus, temos o grupo dos Togavirus - Alphavirus:


• ssRNA cadeia positiva;
• Espícula (spike) constituída por duas proteínas, E1 e E2;
• Proteínas de cápside apresentam semelhança antigénica, o que por vezes torna difícil
antigenicamente distinguir ao vários Alphavírus.

O vírus da encefalite equina ocidental parece ser um recombinante relativamente recente entre
um vírus da encefalite equina oriental e um Sindbis. A possível recombinação entre estes vírus
gera diversidade e pode inclusivamente gerar novos vírus, que é o caso da encefalite equina
ocidental.

A entrada do vírus faz-se através do


reconhecimento de recetores específicos, depois
dentro do vacúolo, quando este acidifica vai haver
um budding de um vacúolo diferente e a injeção do
genoma vírico. Estes genomas associam-se a
estruturas membranares onde são produzidos os
genomas e uma única proteína é produzida que
depois é clivada em várias proteínas efetoras. De
seguida, dá-se a montagem das proteínas da
cápside em volta do genoma e finalmente vai ser
na membrana citoplasmática que o vírus adquire o
seu envelope. As proteínas não estruturais são
sintetizadas primeiro e só depois as estruturais.
Flavivirus: (outro grupo de arbovírus)
• ssRNA cadeia positiva;
• Espícula, é um dímero da proteína E1/E2 mais forte;
• Proteínas da cápside com semelhança antigénica;
• Entrada e reconhecimento semelhantes aos alphavirus;
• Proteínas estruturais sintetizadas primeiro e depois as proteínas não estruturais;
• Envelope gerado no retículo endoplasmático;
• Libertação dos viriões por exocitose ou lise.

Os mais importantes são:

Neste caso, a transmissão não é por mosquitos, mas sim por carraças.

Na generalidade dos arbovírus, o mosquito adquire o vírus de um vertebrado com a virémia.


Uma vez dentro do mosquito, o vírus vai infetar as células do epitélio digestivo, logo é essencial
que o vírus seja capaz de se replicar dentro deste. Após esta infeção, o vírus entra na circulação
e infecta as glândulas salivares onde estabelece uma infeção persistente, que muitas vezes tem
a duração de vida do mosquito. Na próxima refeição do mosquito, o regurgitamento da saliva
vai transmitir o vírus a um novo hospedeiro podendo este ser intermédio ou final.
A maioria das infeções não progride para além de uma doença auto-limitada, sendo que se
houveram anticorpos, mesmo com injeção do vírus, pode nem haver progressão para uma
primeira virémia.

Na primeira virémia, os órgãos afetados dependem de vírus


para vírus e muitas vezes o endotélio vascular é afetado (neste
caso os sintomas normalmente são de síndrome gripal), mas
também podem ser os macrófagos, o fígado, o baço ou os
gânglios linfáticos. O aumento da produção de vírus nestes
tecidos e órgãos pode levar a uma segunda virémia mais
elevada, o que faz com que possa haver uma infeção mais
grave noutros órgãos alvo, nomeadamente uma febre
hemorrágica por atingimento do endotélio vascular, uma
hepatite ou encefalites.
A existência de um RNA intermediário em cadeia dupla, devido ao processo de replicação do
RNA, é uma molécula altamente pro-inflamatória que vai estimular a secreção do INF-α e INF-β.
A ativação imunológica causa sintomas inespecíficos, sendo que a resposta adaptativa é muito
importante no controlo da infeção:

• Anticorpos que reconhecem a partícula viral, vão promover quer a sua fagocitose por
macrófagos, quer a sua destruição por neutrófilos;
• Fagocitose de células infetadas por macrófagos ou morte por natural killers;
• Reconhecimento de complexos imunes por células dendríticas vai levar à ativação da
nossa resposta direta contra este vírus.

Se a reposta adaptativa for contra a proteína da espícula vai haver um bloqueio da infeção,
temos uma resposta muto eficaz pois impede a entrada do vírus na célula hospedeira; se for
contra outras proteínas da superfície do vírus, podem proteger contra a infeção.
No entanto, esta resposta imunológica também pode levar à destruição dos tecidos (patogénese
encefalite) e à hipersensibilidade a complexos imunológicos (hemorragias).

Potencialização por ação de anticorpos:


• Aumento da gravidade da doença causada por uma infeção quando os anticorpos contra
o agente – de infeções anteriores, vacinação ou transferência passiva (da mãe para o
feto) – aumentam a sua virulência num mecanismo dependente da ação dos anticorpos.
Há uma maior internalização em leucócitos devido à interação dos anticorpos e FcyR;
• Resposta exacerbada - formação de complexos imunes ou antigénios associados a
células endoteliais, podendo levar à destruição de células endoteliais (hemorragias) ou
permeabilização vascular (mecanismos pouco conhecidos).

Transmissão:
• os seres humanos são os hospedeiros finais, uma vez que a virémia não é suficiente para
infetar os mosquitos;
• os artrópodes vetores são específicos, nem todos podem transmitir a doença, o vírus
tem de se replicar no vetor;
• durante o verão e na época de chuvas, pois é nesta altura que os vetores estão ativos;
no inverno o vírus pode persistir nas larvas/ovos vetores ou em répteis ou anfíbios ou
vão com as aves migratórias e regressam no ano seguinte.

Ciclo silvático do vírus: ciclo que envolve a transmissão entre os mosquitos e as espécies animais
onde o vírus estabelece infeções crónicas.

Prevenção:
• Diminuir picadas dos mosquitos;
• Controlo de vetores no ambiente (campanhas de eliminação);
• Eliminar águas paradas (dentro e fora de habitações);
• Usar calças e mangas compridas;
• Tratamento da roupa (0,5% permetrina);
• Uso de repelentes.

Vírus da encefalite equina ocidental:


• Síndrome gripal;
• Encefalite – semelhante a vírus encefalite equina oriental, S. Louis e outros;
normalmente com resolução espontânea sem sequelas (parálise, cognitivos,
convulsões, morte);
• Diagnóstico etiológico: RT-PCR liquor (LCR) ou por serologia, através da deteção da IgM
no soro/LCR, mas temos de ter atenção às reações cruzadas, podemos ter reações
positivas que são com outros vírus, logo estes testes têm de ser confirmados com testes
de neutralização de placas.

Chikungunya: (em dialecto Makonde “o que dobra as articulações”)


• Síndrome gripal: maioria das infeções são sintomáticas (3-7 dias após mordedura)>75%;
os sintomas são febre e dores articulares;
• Resolução espontânea após 1 semana (em alguns casos pode haver persistência
sintomas durante meses – mulheres e idosos);
• Grupos de risco: recém-nascidos, comorbilidades (diabetes, doença cardíaca), >= 65
anos.
• Epidemiologia: endémico em zonas rurais, epidémico das cidades (Aedes aegypti ou
Aedes albopictus).
• Diagnóstico etiológico: RT-PCR no soro/plasma (até 8 dias após a infeção) ou serologia,
por deteção de IgM e IgG.

Febre amarela:
• Tem um ciclo silvático em primatas não humanos, mas também tem ciclos urbanos em
que a transmissão se faz apenas entre humanos, e tem um ciclo intermédio que
acontece em África, em que há uma transmissão dos Aedes semi-domésticos que vão
manter os mosquitos entre os primatas não humanos;
• Sintomas: 85% infeções assintomáticas ou ligeiras (síndrome gripal) e 15% doença grave,
há um início súbito, hepatite com icterícia, hemorragias (incluindo hemorragias
gastrointestinais – vómito negro) e choque com falência renal e multiorgânica;
• Diagnóstico etiológico: RT-PCR no soro/plasma (até 3 dias após a infeção, muitas vezes
é negativo quando há sintomas) ou por serologia (ELISA), pela deteção de IgM, IgG, mas
atenção às reações cruzadas e vacinação!
• Vacina: viva atenuada (YFV-17D), proteção durante toda a vida (1 dose), vacina do
viajante;

Zika: mosquito em que a transferência entre seres humanos é importante, insuficiente para
manter a doença, pode-se transmitir durante a gravidez por contactos sexuais (pode estar
presente no sémen masculino ou nas secreções vaginais da mulher) ou transfusões de sangue,
e a transmissão ocorre aquando da refeição do mosquito (salivação).
• Dia 1 – ZIKV elevado;
• Dias 2-10 – não detetável (está a replicar-se nos Sugere 10 dias de incubação
tecidos); extrínseca nos mosquitos
• Dia 15 – aumento ZIKV;
• Dias 20-60 – ZIKV elevado.

No recém-nascido é responsável pela Microcefalia podendo resultar em convulsões, atrasos do


desenvolvimento como problemas de fala e outros marcos no desenvolvimento (sentar,
levantar, andar), perdas cognitivas, problemas motores, problemas na alimentação, perdas
auditivas e problemas de visão.

A maioria das infeções pelo Zika são assintomáticas, mas pode haver febre, cefaleias, artralgias
(edema), conjuntivite, rash, sendo que nos casos mais graves, pode gerar o síndrome de Guillan-
Barré, que é uma doença autoimune (afeta os nervos periféricos), causa enfraquecimento da
musculatura, alterações do sistema nervoso autonómico, potencialmente fatal (paragem
respiratória, cardíaca e alterações da pressão arterial); uma complicação da doença é o
síndrome de Miller Fisher (em 5% dos casos de GBS), que causa uma oftalmoplégia, ataxia e
arreflexia, os doentes apresentam diplopia seguidas de descoordenação motora e dificuldades
na marcha.
O diagnostico etiológico faz-se por PCR, com amostras obtidas <10 dias após início de sintomas
ou por serologia (ELISA), Soro, LCR pela deteção de IgM, atenção a reações cruzadas!
A transmissão do Zika tem muitos pontos em aberto, não se sabe se existe um ciclo silvático,
sabe-se que existe um ciclo urbano e que haver transmissão para os animais domésticos, não se
sabe se pode haver transmissão vertical nos mosquitos.
Não há casos de Chikungunya nem Zika em Portugal.

Vírus do Nilo Ocidental:


• Sintomas: 80% assintomáticos; 20% infeções ligeiras: síndrome gripal, rash, 40%
inflamação ocular; 0,5% doença grave: encefalite ou meningite (mortalidade 10%);
• Hospedeiros normais são as aves, podendo estas também morrer, e temos 2
hospedeiros terminais, o cavalo e o ser humano;
• Diagnóstico etiológico: RT-PCR no soro, plasma, LCR e na urina, muito específicos, mas
pouco sensíveis devido à baixa virémia, ou por serologia (ELISA) no soro/LCR pela
deteção de IgM, atenção a reações cruzadas e vacinação;
• Epidemiologia: associado a aves mortes, muito concentrado na América do norte.

Vírus da encefalite japonesa:


• Ciclo silvático semelhante, mas os porcos também são hospedeiros intermédios, pode
haver transmissão aos equídeos e aos seres humanos;
• Sintomas: maioria dos casos assintomáticos (300:1), a doença grave é a encefalite
(mortalidade 20-30%) e 30-50% dos que sobrevivem têm sequelas neurológicas
cognitivas ou psiquiátricas;
• Diagnóstico etiológico por serologia (ELISA) no soro/LCR pela deteção IgM, atenção a
reações cruzadas e vacinação;
• Epidemiologia: sobretudo na Ásia, transmissão regiões rurais (cultivo de arroz);
• Vacinas: inativadas, atenuadas e recombinantes, vacina do imigrante ou viajantes
frequentes.

Vírus do Dengue:
• Vírus dos arbovírus com uma disseminação maior;
• Replicação associada ao retículo endoplasmático;
• Temos expressão de antigénios na superfície das células, que pode contribuir para
alguns processos patogénicos;
• Transmissão: faz-se de Homem a Homem em ciclos urbanos pelo que o mesmo
mosquito pode infetar vários seres humanos, logo o ciclo urbano é suficiente para a
manutenção do vírus (virémia elevada); pode haver transmissão vertical ao feto da mãe
para o filho;
• Sintomas: 75% infeções assintomáticas; maioria das infeções sintomáticas são auto-
limitadas com febre (alta), síndrome gripal, artralgias, vómitos, rash (um rash agudo que
reage à pressão e um rash covalescente característico pela pele estar toda vermelha e
haverem umas ilhas brancas), dores musculares e ósseas agudas; 5% das infeções
sintomáticas desenvolvem uma infeção grave com hemorragias (epistaxe, gengivas,
tubo digestivo), dor na barriga e potencialmente fatal;
• Tem 4 serotipos, e nós produzimos anticorpos contra cada um dos serotipos, sendo que
a maioria dos anticorpos são não neutralizantes (AED – antibody enhanced disease);
temos proteção homotípica duradora (toda a vida) e heterotípica transitória (ao fim de
uns meses vamos ter apenas a prevalência de anticorpos não neutralizantes
heterotípicos e portanto um aumento da doença), isto faz com que a infeção anterior
com um tipo vai “sensibilizar” para a doença mais grave por outro tipo de Dengue (o
Dengue infeta células da linhagem leucocitária);

(Temos uma janela de sensibilidade em bebés nascidos de mães seropositivas)


• Diagnóstico etiológico: RT-PCR =<7 dias no soro, plasma, LCR; deteção de antigénios =<7
dias no soro e serologia também =<7 dias no soro, LCR;
• Epidemiologia: tradicionalmente associado à América Latina e Ásia, mas já tme uma
distribuição mais global; em Portugal temos casos importados de Dengue.

Possibilidade de arbovírus na Europa: os vetores já estão na Europa e há condições para se


expandirem. As mudanças climáticas estão a fazer com que haja um aumento de áreas afetadas.

Rubéola:
• É um flavivírus;
• Transmissão: via aérea, doença da infância;
• Sintomas: 25-50% dos casos são infeções assintomáticas, temos febre baixa, mal estar
geral, rinorreia, tosse, linfadenopatia, rash típico que começa na face e depois alastra
para o corpo; nos adultos a doença é mias sujeita a complicações, conjuntivite (artrite,
sobretudo nas mulheres);
• A doença mantém-se infeciosa enquanto tiver vírus na garganta, mesmo depois de
perder os sintomas; os complexos imunes são responsáveis pelo rash e artralgia; infeção
natural confere imunidade durante toda a vida; anticorpos impedem disseminação para
o feto;
• É teratogénica: pode-se replicar na maioria dos tecidos fetais; apesar do vírus não ser
citolítico interfere com o desenvolvimento embrionário; o vírus pode permanecer no
bebé durante anos após a infeção placentária e ir interferindo com o desenvolvimento
de vários tecidos e órgãos, nomeadamente as cataratas e outros defeitos de visão,
problemas cardíacos, surdez, entre outros;
• Há vacina e é ministrada na infância, faz parte da vacina tríplice: VASPR, vacina contra o
sarampo, parotidite epidémica (papeira) e rubéola; é uma vacina viva atenuada e deve-
se evitar a gravidez se a vacina for tomada em adulto.
Priões:
• Agentes únicos que não têm material genético,
não despoletam resposta imunológica e são
extremamente resistentes ao calor, radiação e
desinfetantes;
• São “scrapie-like prion protein” (PrPSc), ou seja,
são agregados de proteínas do hospedeiro
anormalmente configuradas (PrP), que é uma
glicoproteína de superfície que tem uma
configuração α-hélica no seu estado natural e
que adquire uma configuração em camadas β;
é responsável pelo tremor epizoótico

Conseguimos distinguir as configurações


devido à resistência do tratamento por
proteinase K.

• Julga-se que as estirpes de PrPSc são “quadrispécies” (nuvens diferentes de


conformações), e não são distinguíveis ao nível dos aminoácidos, portanto elas têm
conformações diferentes, mas isso não é determinado pela sequência primária da
proteína;
• A transmissão entre espécies é possível, mas é pouco eficiente;
• As doenças priónicas podem ser autossómicas dominantes, podem ter uma ocorrência
espontânea ou através de exposição ambiental (transmissível!);
• Transmissão por ingestão de produtos contaminados, tem um período de incubação de
anos e depois da declaração dos sintomas leva à morte, o contacto com os priões por
intervenção médica tem um período de incubação mais rápido, e a morte também é
muito rápida; julga-se que o contacto com a pele e vias respiratórias pode também
causar infeção;
• Diagnóstico: encefalopatia espongiforme (post mortem), proteína 14-3-3 (tau) elevada
no LCR, biópsia das amígdalas com identificação PrPSc ou “real-time quaking-induced
conversion” pela identificação do PrPSc em escovagem nasal ou LCR;
• Prevenção: os priões são muito resistentes, faz-se a descontaminação por autoclavagem
a 15 psi durante 1 hora (em vez de 20 minutos), tratamento com solução 5% hipoclorito
ou 1 M hidróxido de sódio, maior monitorização do gado bovido e utilização de gado
para alimentação com <5 anos.
Data Docente
16/11/21 Prof. Doutor Thomas Hänscheid

Os retrovírus não são só HIV, mas dentro deste podemos ter dois tipos o HIV1 e o HIV2, sendo
que não se vai falar tanto do HIV2, apesar deste ter uma certa importância em Portugal.
Há outros retrovírus que já eram conhecidos antes do HIV, nomeadamente o HTLV-1 e HTLV-2.

● Em primeiro lugar, o que é um retrovírus?

Uma característica principal é o facto de ser um vírus de cadeia simples de RNA que depois vai
ser transcrito em cadeia de DNA, e para este processo acontecer, o vírus precisa de uma enzima,
a transcriptase reversa. Seguidamente ocorre replicação do DNA (formação de uma cadeia
complementar), e forma-se uma hélice
normal de DNA como existe nas nossas
células, após isto, o DNA vai ser inserido no
nosso genoma levando a várias
consequências.

Como é um gene, vai ser transcrito, formando


novamente uma cadeia de RNA, que vai
produzir proteínas, ou seja, é um vírus com
uma estratégia diferente, pois o DNA vai se
integrar no nosso genoma, a isto chama-se
um provírus.

Um vírus pode obrigar a célula hospedeira a produzir proteínas e a replicar-se. Como o vírus tem
o DNA integrado, pode ficar escondido, estando latente e passados uns anos pode se reativar e
começar a replicar-se.

Podemos distinguir o retrovírus em exógeno ou endógeno.


● Exógeno - como o nome indica, vem de fora, infeta-nos, e integra o DNA nos nossos
genes logo com a intenção de criar novos vírus que depois vão sair da célula. Não há
uma fase lítica pois a célula não explode, existe uma progressão de novos vírus que vão
infetar outras células.
● Endógeno - o vírus vai se propagar e ficar dentro do núcleo, nos nossos genes, e quando
a célula se replica transmite a informação para novas células, este é o motivo que
justifica que grande parte dos nossos genes que não são transcritos (junk genes) não
fazem sentido nenhum, pois muita desta informação vem de antigos retrovírus que
deixaram estes genes no nosso genoma.

Como exemplo de vírus exógenos temos:


● Onco-retrovírus - entram dentro das nossas células e podem levar a cancro; temos como
exemplo HTLV-1 e HTLV-2;
● Lentivírus - vírus “lento”, por exemplo, o HIV-1 e HIV-2, não causam uma doença
imediata, infetam-nos e causam doenças passados alguns anos quando o sistema
imunitário estiver muito debilitado, vão começar a sofrer doenças infeciosas
oportunistas e chegamos à fase em que chamamos SIDA.
O HTLV pode ser transmitido por via sexual e da mãe para o filho por aleitamento. A principal
doença maligna no HTLV-1 é uma leucémia das células T que aparece no adulto, tendo
manifestações na pele. Tem de se fazer um screening das transfusões sanguíneas, pois pode ser
transmitido da uma pessoa para outras.

● História do HIV

Foi inicialmente descrita uma pneumonia (Pneumocystis) em 5 jovens homossexuais que tinham
também infeções por citomegalovírus, que costuma aparecer mais em doentes com
imunossupressão, e tinham candidíase mucosa.

Na altura, esta doença levantou 3 perguntas:

1- Como é que se chegou ao conhecimento do HIV?


Ser homossexual era um estigma, um tema de que não se falava, era proibido.
Como a doença foi relatada em homossexuais, ficou conhecida como GRID (Gay-Related
Immune Deficiency) e só mais tarde ficou denominada por AIDS (Acquired Immune
Deficiency Syndrome).
Uma radiografia chamava à atenção por se notar uma pneumonia atípica, além disso,
havia outros sinais como candidíase oral e um cancro na pele, o Sarcoma de Kaposi,
causado pelo herpesvírus humano 8.
Nos EUA havia também pneumonia nos toxicodependentes, mas como ninguém queria
saber deles, só mais tarde é que se descobriu que era HIV e que se tinha espalhado
muita nesta população por partilha das seringas.
Em África era conhecido como slim disease, pois as pessoas afetadas emagreciam
bastante e depois morriam de outras doenças infeciosas oportunistas.
Apareceram também muitos hemofílicos infetados, pois eram tratados com fatores de
coagulação que eram tirados de um pool de doadores, que podiam estar contaminados
com HIV.

2- De onde vem o vírus?


As suspeitas caíram sobre África, de que o HIV era uma zoonose, um vírus que causa
uma imunodeficiência numa espécie de macacos, que conseguiu saltar a barreira do
macaco para o humano.

3- Como se espalhou o vírus?


Na África o vírus espalhou-se pela tradição de comer carne selvagem, nomeadamente,
carne de macaco. Depois, houve emigração de pessoas infetadas para os EUA, e devido
à “compra de sexo”, o vírus foi transmitido, atingindo posteriormente uma
disseminação global.
Em africa há várias teorias de transmissão:
- Levarem vacinas para sleeping sickness com seringas de vidro e agulha de metal de uso
único, que foram reutilizados e não esterilizadas;
- Alterações sociais e urbanização;
- Colonialismo;
- Via sexual.

AIDS - doença causada por HIV, um vírus com envelope derivado da membrana da célula
hospedeira com várias glicoproteínas virais como gp120 e gp41, que são inseridas na membrana
conforme o vírus sai da célula. Dentro da cápsula há 2 cópias de cadeia simples de RNA viral e 3
enzimas importantes, a transcriptase reversa, uma protease e uma integrase.
Temos um envelope lipídico e uma cápsula proteica p24, muito importante para o diagnóstico,
pois é constituída por antigénios, e assim sendo podemos procurar anticorpos contra este ou
podemos mesmo procurar o próprio antigénio. As 3 enzimas também são muito importantes,
uma vez que não as temos no nosso organismo, e por isso, o tratamento de HIV é feito por uma
combinação de fármacos que vai inibir estas enzimas.

CICLO DE VIDA DO HIV:

Temos um envelope externo, e no centro temos 2 cópias de RNA e a enzima transcriptase


reversa que vai transformar o RNA em DNA. O vírus com o envelope vai infetar diretamente as
células T helper, pois ao chegar ao pé da superfície destas células vai se ligar aos recetores CD4,
exclusivos destas, levando a uma alteração conformacional, que leva ao aparecimento de um
segundo recetor, o co-receptor quimiocina, CCR5. Este recetor vai agarrar o envelope do vírus e
a reserva protéica do vírus vai atravessar para a célula hospedeira começando a aproximar
ambas as membranas (viral e da célula do hospedeiro) até que haja fusão destas e o material
genético do vírus é injetado na célula e o envelope protéico deixado na superfície da célula.

O vírus tem uma matriz e uma cápsula proteica, que são digeridas quando entram na célula
libertando o RNA viral e as enzimas virais. A transcriptase reversa vai usar os nucleótidos do
hospedeiro para transformar o RNA viral numa simples cadeia de DNA e enquanto faz isto vai
fazendo erros aleatórios, uma vez que tem pouca atividade de proofreading. Este processo
explica o porquê de os vírus do HIV serem muito diferentes entre si e isto torna impossível o
desenvolvimento de uma vacina pois o vírus vai criar mutantes que conseguem escapar.

A cadeia de DNA vai novamente sofrer ação da transcriptase reversa, formando agora uma
cadeia dupla de DNA; aqui vai entrar outra enzima, a integrase, que agarra a cadeia dupla, e vai
transportá-la para o núcleo da célula através de um poro nuclear, onde vai encontrar o DNA do
hospedeiro, a integrase faz um corte no DNA do hospedeiro inserindo o HIV no genoma, temos
assim uma infeção para a vida toda.

A RNA polimerase vai fazer o mRNA que codifica proteínas virais que se associam com
ribossomas na superfície do retículo endoplasmático rugoso. O ribossoma pode produzir
proteínas do envelope que são diretamente transportadas para dentro do retículo
endoplasmático e levadas para a superfície da célula onde ficam embutidas na membrana
celular coalescendo com outras proteínas que foram produzidas, temos um cluster
(aglomerado) de proteínas do envelope na superfície da célula infetada.

Ao mesmo tempo, há outros mRNA’s que estão a ser produzidos e que levam à formação de
outras proteínas virais, que o vírus vai precisar, que são levadas para a superfície onde as
proteínas do envelope estão. Este complexo protéico que é levado para a superfície é também
composto por uma cadeia de RNA assim como algumas enzimas. O complexo vai sair na
superfície da célula, mas ainda não é um vírion maduro porque a sua cadeia poli proteica precisa
de ser digerida nas suas porções constituintes (monómeros). Aqui entra a protease que quebra
a cadeia poli proteica, podendo levar então à forma madura do vírion que pode agora ir infetar
as outras células.
Dentro do vírus existem imensos grupos:

A transmissão pode ser:


- Parentérica;
- Partilha de agudas;
- Transfusão de sangue;
- Via sexual…

Relativamente ao risco, a forma de transmissão mais perigosa é por transfusão sanguínea, sendo
o risco por via sexual não tão grande como se pensa.

Patogénese:

Temos 3 fases:
1. Aguda - quando a pessoa fica infetada;
2. Assintomática - o corpo consegue controlar a infeção;
3. AIDS - parte final, sendo o indicador mais importante as CD4.

O mais importante são os vírus, ou seja, a virémia, e os anticorpos. A virémia mais alta é na fase
aguda, em que os indivíduos afetados são mais infeciosos para os outros, o que explica uma
maior transmissão nesta fase.
Na fase aguda ainda não há anticorpos, estes surgem mais tarde, e como o diagnóstico se baseia
na deteção de anticorpos, temos um problema, pois podem passar 2 ou 3 semanas em que a
pessoa está infetada, mas ainda não se conseguem detetar os anticorpos porque eles não
existem, temos então o período de janela que é muito perigoso, uma vez que é o período mais
infecioso.

Na fase inicial, só começamos a ter os anticorpos IgG a partir da 4ª/5ª semana, antes disso a
deteção de anticorpos não é possível, mas o vírus está a replicar-se, temos uma virémia. Nesta
fase conseguimos detetar o p24, que aparece no sangue, pois vamos ter muito vírus no sangue,
logo muito antigénio. A deteção do p24 associada à deteção de anticorpos já permite fechar a
janela e conseguimos, portanto, fazer o diagnóstico, 2 semanas depois da infeção.

Fazemos testes de anticorpos no sangue, na urina e na saliva, em que procuramos anticorpos


do HIV. Estes testes têm 2 fases:
1. Eliza antibody test (demora 20 min) – sreening test
2. Western blot procedure (confirmação - demora 1 semana) – confirmatory test

O Eliza antibody test é muito sensitivo para os anticorpos, mas em algumas ocasiões pode levar
ao diagnóstico errado. Para verificar a accuracy do teste e erradicar os falsos positivos, com
outra amostra usamos o western blot, e aí, se ambos estiverem positivos, temos o diagnóstico
confirmado.
Além do diagnóstico, temos a monitorização, que se faz por quantificação da carga viral, que é
a quantidade de HIV presente no nosso sangue, permitindo ao médico monitorizar a doença e
começar a terapêutica e ver se esta funciona. Ter uma baixa carga viral diminui o risco de passar
a doença por contato sexual, mas não garante que não a transmitimos a outra pessoa.

O maior reservatório do vírus está no tecido linfático do intestino, mas os clínicos não
conseguem aceder bem ao reservatório, então extrai-se sangue de uma veia, para medir a carga
viral.
Na 1º consulta o médico pede a medição da carga viral para ter uma linha de base, e vai medindo
de 3 a 6 meses para monitorizar a doença, pede também este teste antes e depois de mudar de
terapêutica, para ver alterações.
A medicação da carga viral não é feita macroscopicamente, usa-se PCR; também não se usa esta
medição para diagnóstico, devido à grande possibilidade de haver falsos negativos, por causa da
dificuldade de acesso aos reservatórios

Genotyping - conseguem se detetar vírus que são resistentes a fármacos, deve se fazer
juntamente com a carga viral para se pensar num tratamento, e saber que fármacos vão
funcionar.
Data Docente
17/11/2021 Prof. Doutor João João Mendes

O que são bacteriófagos?

• Bacteriófagos são vírus que consistem num genoma envolvido por uma cápsula proteica
e que infetam exclusivamente bactérias e que, portanto, não interagem com células
eucariotas. Foram descobertos na segunda década do século XX.

Nota: os bacteriófagos também podem ser designados apenas de “fagos”.

• A terapêutica bacteriofágica surgiu pouco tempo após a descoberta dos bacteriófagos,


sendo então definida como a utilização de bacteriófagos com o objetivo de reduzir ou
eliminar bactérias patogénicas. Após o aparecimento dos antibióticos, com a descoberta
da penicilina, este tipo de terapêutica perdeu grande parte do seu interesse, passando
a ser utilizada apenas na Europa de Leste e antiga URSS.

No princípio do século XXI, com a emergência da resistência aos antibióticos, a terapêutica


bacteriofágica voltou a ter alguma importância.

• A classificação taxonómica dos bacteriófagos está a cargo da ICTV ( International


Comitee on Taxonomy of Viruses). A grande maioria dos bacteriófagos (96%) pertencem
à Ordem dos Caudovirales, ou seja, são maioritariamente vírus com cauda, apresentado
um DNA linear de dupla cadeia (dsDNA linear) , sendo estes que são, na sua globalidade,
utilizados na terapêutica bacteriofágica.

Ciclo de vida dos bacteriófagos

Existem basicamente dois tipos de ciclos de vida dos bacteriófagos:


● ciclo lítico, que termina sempre com a lise da célula infetada

● ciclo lisogénico, em que o vírus se consegue integrar no genoma bacteriano, sob a forma
de um profago, pelo que a bactéria se torna lisogenada. Assim, durante o processo de
divisão celular bacteriano, o material genético da célula, juntamente com o material
genético do vírus, que foi incorporado, sofrem duplicação e em seguida são divididos
equitativamente entre as células-filhas. Assim, uma vez infetada, uma bactéria
começará a transmitir o vírus às células filhas, a cada divisão celular.

Este mecanismo é possível através da ação de duas proteínas: a integrase, que permite
a integração do profago no genoma bacteriano e a proteína repressora, que impede a
sua replicação.
Quando ocorre um processo de indução, mediado por exposição a radiação ou durante a
terapêutica antibiótica, ocorre uma “desrepressão”, em que há a produção de uma protease
que cliva a proteína repressora.

● A maioria dos bacteriófagos possui um ciclo de vida lítico (ou virulento), como é o caso
dos fagos líticos estritos.
● Porém existem alguns, como os fagos temperados, que podem ter este ciclo de vida
lítico ou então, como alternativa, ter um ciclo de vida lisogénico.

Processo de infeção

In vitro, podemos ter uma visualização de como ocorre o processo de infeção de uma bactéria
pelo bacteriófago, demonstrado através da “one-step curve”.

● Infeção celular - é um processo altamente específico que envolve recetores


complementares na superfície da célula hospedeira e do bacteriófago infetante e que
compreende 3 passos:

1º passo: adsorção e ligação- ocorre a ligação entre as fibras da cauda dos bacteriófagos e as
proteínas complementares presentes na superfície da bactéria.

2º passo: contração e penetração

3º passo: injeção do genoma do bacteriófago dentro da bactéria

● Biossíntese dos componentes virais (proteínas estruturais e não estruturais) ocorre a


expressão de mRNA e takeover da maquinaria de biossíntese macromolecular

● Maturação: ocorre a junção de todos estes componentes virais sintetizados, num virião
(assemblage das proteínas estruturais do bacteriófago)
● Lise e libertação: As bactérias infetadas vão produzir endolisinas, ocorrendo a lise
celular. Assim, os bacteriófagos que se encontram dentro da bactéria, vão ser libertados
para o exterior.

In vivo, todo este processo é muito mais complicado, uma vez que para que a infeção da bactéria
pelo bacteriófago, é necessário que este a consiga encontrar, no meio extracelular, o que é
bastante complicado.

Um dos fatores que o torna complicado é o facto de grande parte das bactérias, sobretudo, as
que estão em processo de infeção celular, estarem sob a forma de biofilme, que é uma
comunidade complexa e estruturada de microrganismos revestida por uma matriz extracelular
polimérica, aderente a uma superfície ou interface, permitindo aumentar a aderência das
bactérias a superfícies inertes e plásticas, como as próteses, o que é muito comum em infeções
crónicas

• No entanto, os bacteriófagos conseguiram evoluir no sentido de criar mecanismos que


facilitam a procura pelas bactérias no meio extracelular. Um desses mecanismos é a
produção de substâncias, como as depolimerases, que possuem a capacidade de
degradar a matriz extracelular polimérica.

• Porém, a par da evolução dos bacteriófagos, as bactérias também foram evoluindo no


sentido de criar mecanismos de resistência aos bacteriófagos, sendo que estes se
podem agrupar em dois grandes grupos: resistência genética e resistência fenotípica.
Resistência genética

● Um dos mais importantes é o bloqueio da adsorção ( 1º passo da infeção) - ocorre a


alteração das proteínas complementares à superfície da bactéria às quais as fibras da
cauda dos fagos se iam ligar. PRINCIPAL MECANISMO

NOTA: O PROFESSOR NÃO EXPLICOU OS RESTANTES MECANISMOS

● Sistema CRISPR/Cas - sistema que confere uma imunidade adquirida procariótica.


Basicamente é um sistema de enzimas de restrição, que conseguem cortar o DNA viral
em locais novos, com os quais o bacteriófago não tinha tido qualquer contacto
previamente.

Nota: o professor disse que era importante saber, mas não explicou o sistema em detalhe
Bacteriófagos e Biologia Molecular

O modelo de interação entre bacteriófagos e bactérias foi utilizado para inúmeras descobertas,
como a:

● descoberta que o DNA continha a informação genética

● descoberta da organização espacial do material genético na célula bacteriana

● descoberta do controlo genético da síntese enzimática através de proteínas ativadoras


e repressoras

O estudo desta interação também permitiu o desenvolvimento das enzimas de restrição, DNA
ligase, vetores de clonagem e DNA polimerase.

Phage display

É uma técnica de laboratório utilizada para o estudo das interações proteína-proteína e


proteína-DNA, que utiliza bacteriófagos para acoplar proteínas com a informação genética que
as codifica. permite a identificação de grandes bases de dados genéticas, em que temos o
material genético no interior do bacteriófago e, na sua parede, vai ocorre a expressão da
proteína em estudo (que se pretende verificar a sua interação outras proteínas ou com o DNA)

Terapêutica bacteriológica

Os bacteriófagos possuem determinadas propriedades que os tornam ideais para esta


terapêutica contra bactérias:

● São ubíquos na natureza, existindo praticamente um bacteriófago para cada tipo de


bactéria diferente.

● Fácil isolamento, com baixo custo

● Elevada especificidade de ligação; cada bacteriófago infeta especificamente um


determinado tipo de bactéria.

Neste ponto apresentam uma vantagem relativamente à terapêutica antibiótica, pois


atuam apenas na bactéria que se pretende destruir, não destruindo também outras
bactérias pertencentes à microbiota. Porém, dificulta o tratamento empírico, pois não
tem essa ação abrangente contra os vários possíveis agentes etiológicos da doença,
sendo necessária a identificação específica das bactérias causadoras da doença (Ex: na
pneumonia, em que temos inúmeros agentes causadores possíveis)

• Uma outra vantagem será o facto de não provocar resistência cruzada com antibióticos
e ser autodoseável no local da infeção, pelo que atuam apenas enquanto existirem
bactérias nesse local.
• Para além disso, são bastante úteis em infeções provocadas por bactérias produtoras
de biofilme, uma vez que produzem as depolimerases que conseguem penetrar e
destruir esse biofilme.

Porém, também apresenta algumas desvantagens como o risco de transdução de genes de


resistência e o risco de serem inativados pelo sistema imunitário.

• A terapêutica bacteriofágica não é generalizável, sendo desenvolvida de acordo com a


situação de cada pessoa, sendo necessária a identificação da bactéria causadora da
doença nessa pessoa.

Este tipo de terapêutica já foi testada no tratamento de queimaduras e no pé diabético, bem


como para tratamentos de infeções ósseas e articulares de endocardite.

No âmbito da terapêutica bacteriofágica é também possível realizar outros procedimentos:

● Extrair as endolisinas produzidas pelos bacteriófagos e utilizar somente estas


endolisinas para a destruição das bactérias, não sendo necessária a utilização do fago
como um todo.

● Purificação das depolimerases, utilizando-as na destruição de bactérias produtoras de


biofilme

● Modificação genética das bactérias, tornando-as novamente sensíveis aos antibióticos,


através da implantação de genes de sensibilidade aos mesmos, o que é bastante útil no
combate à emergência da resistência bacteriana aos antibióticos.
Relativamente à relação entre a terapêutica bacteriofágica e antibiótica, está demonstrado que
de facto existe uma sinergia entre as duas, sendo esta designada de PAS (Phage- Antibiotic
Synergy), sendo que a utilização de baixas doses de antibióticos Beta lactâmicos aumentam a
replicação bacteriofágica.

Bacteriófagos na saúde e na doença humanas

No Universo, existem inúmeros bacteriófagos, sendo que estes estão em interação intensa e
constante com o Homem.

O microbioma humano compreende a totalidade de microrganismos que estão presentes no


nosso organismo, entre os quais se encontram vírus, bactérias e micróbios eucariotas, bem
como os seus elementos genéticos e as suas interações no corpo humano. Relativamente aos
vírus, o viroma é constituído maioritariamente por bacteriófagos que vivem habitualmente na
nossa pele, intestino, pulmões, cavidade oral, vagina, numa relação de 1:10 com as bactérias
(estão mais presentes no intestino)

Os bacteriófagos são específicos de pessoa para pessoa, apresentando então elevada


variabilidade interindividual, pelo que cada um de nós possui viromas diferentes e são bastante
estáveis ao longo do tempo, atingindo estabilidade completa na idade adulta

Exemplos de Interação entre o viroma e a saúde humana

Os bacteriófagos estão aderidos à parede intestinal, uma vez que se ligam ao muco, produzido
e secretado pelas células epiteliais do intestino, através de proteínas da cápsula, o que permite
a criação de uma barreira antimicrobiana que reduz a fixação e colonização bacteriana do muco,
prevenindo a destruição das células epiteliais.

Porém, apesar de serem protetores, os bacteriófagos em excesso também podem conduzir ao


desenvolvimento de patologias. Por exemplo, se ocorrer disbiose, ou seja, alterações no
equilíbrio do microbioma, há o desenvolvimento de doença, estando identificadas algumas
doenças inflamatórias no intestino resultantes do aumento de bacteriófagos associado a uma
diminuição de bactérias.

Para além disso, a presença de fagos temperados no intestino conduz ao desenvolvimento de


genes de multirresistência, através de mecanismos de transferência horizontal genética, que
podem ser induzidos por pressão antibiótica.

Estes mecanismos compreendem processos de:

● transformação: ocorre lise da célula infetada por bacteriófagos; o seu material genético
é exposto, sendo internalizado numa outra célula, por ação de um bacteriófago. Este
material genético pode compreender genes de resistência ou de virulência que são
assim transferidos para outra célula, tornando-a também resistentes ou mais virulenta.
● transdução: generalizada, em que existe um packing aleatório de DNA que é transferido
para outras células, ou especializada em que há transferência de um packing de
segmentos específicos do DNA para outra célula.

• Algumas doenças humanas são assim associadas a bacteriófagos:

Isto ocorre, pois os bacteriófagos ao infetarem as bactérias provocam transformações


lisogénicas, que levam à codificação de toxinas, bem como de sistemas de secreção para as
mesmas.
Data Docente
19/11/21 Prof. Doutor Thomas Hänscheid

O SARS-CoV-2 é apenas um dos muitos coronavírus que existem. O coronavírus é um vírus


que existe muito no especialmente em animais domesticados tal como os porcos, ruminantes e
aves.

diseases

Há quase 2 tipos de doenças que os coronavírus podem causar: doença gastrointestinal


(porco, pode ser fatal) e doença respiratória (os coronavírus que afetam mais o Homem).
Voltando para o mundo animal: é possível identificar
os coronavírus causadores de doenças respiratórias, pelo
que, a ideia que o SARS-CoV-2 é completamente novo,
que não era conhecido nem se sabia que ia causar
doença grave (pneumonia), não é verdade.
Para além de já se conhecerem as doenças causadas
por infeções por coronavírus nos animais, também já
tinha sido possível observar casos de coronavírus que
saltaram a barreira entre espécies:
• 2003: SARS apareceu na China, afetando
pessoas em Hong Kong. Situação mais complicada do que
agora: o vírus era novo e não se conhecia a estrutura.
Houve um grande surto num hospital no Canadá em que muitos médicos e enfermeiros foram
infetados e acabaram por morrer. Espalhou-se pelo mundo de uma forma parecida ao SARS-
CoV-2 e tinha maior letalidade (10%), mas tinha uma
infecciosidade muito baixa.
• 10 anos mais tarde (2012), Coronavírus na Arábia
Saudita: MERS – Middle East Respiratory Syndrome. Causa uma
pneumonia, mas a letalidade é muito elevada, quase na
dimensão do Ébola.
Quando o SARS-CoV-2 surgiu muitos temiam que este vírus
se pusesse cruzar com outros, adquirindo assim características
mais letais.
Não é a primeira vez que um vírus salta a barreira, o coronavírus era conhecido por poder vir
a causar pandemias ou epidemias. Estes são os novos coronavírus, mas há também velhos
coronavírus.
Estes são coronavírus que já se
adaptaram a nós e, eventualmente, já
saltaram a barreira de espécies há muito
tempo. São causas frequentes de
constipações.
NL63 ( ) – Estudos da
sintomatologia feitos demonstram que
também pode causar pneumonias e, em
certos casos, morte.
Ou seja, vírus que originam
constipações ‘normais’ podem originar
doenças mais graves, pelo que há esperanças que o coronavírus atual se torne num vírus
endémico tal como estes.
Vídeo «Tracing The Origins Of The Coronavirus» https://youtu.be/hG4VQX5ZZyA
• Os morcegos conseguem conviver com muitos vírus sem manifestar doença, mas
estando infetados (ex.: vírus da raiva, os morcegos são os únicos mamíferos que
podem ter este vírus sem adoecer);
• São os únicos mamíferos com a capacidade de voar, o que faz com que consigam
migrar longas distâncias, ao contrário de outros mamíferos;
• Estão distribuídos pelo mundo inteiro e são cerca de 1/5 de todas as espécies de
mamíferos.
Origem do vírus – Zoonose: morcego-hospedeiro intermediário-Humano ou morcego-
laboratório-humano (não há evidências até à data que tenha sido este último)

Vamo-nos agora debruçar sobre o vírus em si: a sua estrutura e as partes mais relevantes.

Spike Glycoprotein – Proteína que o vírus usa para se ligar à célula, logo é a estrutura
mais relevante que o nosso sistema imunitário reconhece. (Vacinas)
Envelope lipídico – Se existe um envelope lipídico pode-se eliminar facilmente com
álcool e água. (Higiene das mãos)
RNA viral – É bastante comprido + Nucleocapsid – Proteína que envolve o RNA. (Num
teste de diagnóstico que pesquisa antigénios pode-se utilizar qual quer um dos presentes no
vírus. Para uma elevada sensibilidade poder-se-ia utilizar a proteína spike mas, como esta é a
mais relevante para o SI não convêm. Utiliza-se então a proteína mais abundante, ou seja a
nucleocapside, mantendo assim também uma elevada sensibilidade)
Vídeo «Animation of SARS-CoV-2 entry into human host-cell» https://youtu.be/Xuc9D4LVJdg
Resumo vídeo:
1. A superfície do vírus contém, entre outras proteínas, a Spike
2. Um indivíduo pode ser infetado por inalação do vírus e este dirige-se para as vias
aéreas, entrando em contacto com as células do epitélio respiratório
3. A Spike reconhece um recetor: ACE2
4. Quando ligada à ACE2 a Spike fica ‘presa’
5. Outra proteína, transmembrane protease serine 2, quebra a spike em locais
específicos fazendo com que porções da proteína Spike que se encontravam
‘escondidas’ sejam expostas
6. Spike sofre mudanças de conformação:
1º. Insere-se na membrana da célula
2º. Dobra-se sobre si mesma
3º. Junta as membranas da célula e do vírus

Transmissão: De longe a via de transmissão mais relevante é a por via aérea.


Em termos de proteção fala-se na máscara, no distanciamento e na lavagem das mãos.
Quando se tosse ou espirra: Droplets (gotas) + aerossóis

Transmissão: «Aerosols vs. Droplets: In Transmiting COVID-19, There’s a Big Difference»


https://youtu.be/YgiQzbTB7-A

Resumo:
Aerosol Droplet (gota)
Tamanho < 5 μm 50-100 μm
Tempo até atingir o chão Horas 10-15 s
Qual é o mais perigoso? – Menos vírus, logo menor
Como é maior abriga mais
Depende: «particle to probabilidade de haver vírus
vírus, logo a probabilidade de
particle basis» infeciosos (- potente)
haver + vírus infeciosos é
maior. Possuem também um
ambiente protetor, pois
demoram + tempo a
evaporar. (+ potente)
Qual é o mais perigoso? – Duram mais no ar – Duram menos. [Vem daqui a ideia
Depende conseguem transmitir a do distanciamento físico. O influenza é
transmitido maioritariamente por
doença ‘para uma pessoa do droplets.]
outro lado da sala’. [O
distanciamento não funciona em casos
de aerossóis – em vez disso: uso de
máscara + ventilação de espaços
fechados]
Papel da Humidade 95% - Excelente para o vírus
80-60% - Mau para o vírus, é inativado rapidamente
50% - Bom para o vírus, é onde a maioria dos edifícios estão
<50% - Excelente para o virus, dura muito tempo e não é
inativado facilmente
[logo ventilação de espaços fechados é uma medida muito importante]
Papel das máscaras N95 ajudam sempre. N95 ajudam sempre.
[máscaras sim, até no século passado Cirúrgicas não protegem. Cirúrgicas protegem (do que
haviam ‘anti-mask meetings’]
poderá vir de fora e quando o
individuo expele)
Effectiveness of public health
measures in reducing the incidence of
covid-19, SARS-CoV-2 transmission, and
covid-19 mortality: systematic review
and meta-analysis. BMJ
https://www.bmj.com/content/375/b
mj-2021-068302
Notas para ajudar na compreensão
do gráfico:
Se o risco é mais do que 1 é
superior.
Se é 1, não há diferença de risco.
Se o risco é menos que 1 é inferior.
Ex.: um risco de 0.5 existe uma redução
de 50%

Como observado acima, a medida mais eficaz é o uso da máscara. O intervalo de confiança é
melhor, ao contrário do que acontece na lavagem das mãos.

Proteína Spike
Cada vírus necessita de um recetor na
célula para se ligar, no caso do SARS-
CoV-2 é o recetor ACE2 (angiotensin-
converting enzyme 2).
ACE2 faz parte do sistema renina-
angiotensina-aldosterona.
Encontra-se em várias partes do
nosso corpo. Tem distribuições
diferentes em cada tecido sendo, por
exemplo, menos abundantes no SNC em
comparação com o pulmão, vasos sanguíneos e intestino.
Consegue-se agora compreender porque é que o SARS-CoV-2 causa pneumonias ou
gastroenterites.

RNA
O HIV também é um vírus de RNA. Este durante a replicação de RNA e transcrição para DNA
comete imensos erros, logo tem muitas mutações, criando muitas variantes.
Os coronavírus são os vírus que possuem o maior RNA por isso, se cometesse tantos erros de
replicação num genoma tão grande, este desaparecia. Muitas mutações não facilitavam a sua
sobrevivência.
Logo os coronavírus não cometem tantos erros como os outros vírus de RNA. Como? Teem
uma maquinaria de proofreading para diminuir a taxa de mutações.
Mas mesmo assim ocorrem erros suficientes para criar variantes.
O 1º vírus que apareceu na China e se alastrou para Itália já não existe.
Hoje, infelizmente, muitas das mutações encontram-se na proteína Spike, pois o vírus tenta
evadir do SI evitando assim uma
resposta.
Problema: Aumento das infeções
(em vacinados e não vacinados). A
eficácia da vacina diminuiu, porquê?
Porque o vírus/configuração da
proteína Spike que foi usado foi
aquela do vírus da China, de Huhan.
Era necessário uma nova vacina, e um
sistema de avaliação como acontece
com o influenza.
Mutações na proteína Spike:
• Nem todas as mutações são importantes,
mas se apanharem o local de ligação ao
ACE2 pode ser dramático.
• (Na última coluna) Avalia-se se a proteína
tem capacidade de evitar o efeito
neutralizante do anticorpo.

Em alguns estudos laboratoriais e clínicos conclui-


se que certas variantes já conseguem evadir o efeito
da vacina (apenas 10-13%, por isso estas continuam
eficazes na sua grande maioria)

Normalmente:
➢ 80% apresentam sintomas ligeiros e recuperam
➢ 20% podem ter agravamento
➢ 5% acabam nos cuidados intensivos
o Este é o grande problema, visto que, estes doentes estão a ocupar camas nas
UCIs. Não é tanto a letalidade pois essa ronda os 2-3%.

Tratamento

Tratamento com anticorpos


monoclonais. Mas estes têm que ser
administrados por via endovenosa logo
no início da doença.

No momento há poucos. O do recetor


da IL-6 e corticoesteróis. Ou seja
tratamento por imunosupressão

Não há estudos clínicos que


demonstrem a eficácia

Há 2 medicamentos retrovirais que estão a ser


estudados: Molnupiravir e Paxlovid.
Molnupiravir – Ao nível dos nucleótidos, reduz
a doença mais ou menos por metade.
Paxlovid – Inibidor da protéase, reduz a
mortalidade de uma forma dramática.
1
2
Vacinação Colheita tem
▪ 24 aprovadas em diversos países que ser feita
▪ Bastantes a serem desenvolvidas corretamente

Diagnóstico 3
1) RT-PCR: deteção de que genes? + sensível (o RNA fica bastante tempo em circulação)
2) Serológicos: deteção de anticorpos para que antigénios?
3) Antigénio (testes rápidos): Deteção de que antigénio? – sensível (50%)
Vídeo não mostrado em aula, mas no ppt do professor: «Understanding Different COVID-19 Tests, Animation» https://youtu.be/4MaJQGkpWrI
Data Docente
24/11/2021 Prof. Doutor Melo Cristino

Durante muitos anos, este tema que vamos falar hoje era chamado “Infeção Hospitalar” ou
“Infeção Nosocomial e, hoje, esse conceito evoluiu para a designação atual que é “Infeção
Associada aos Cuidados de Saúde”.

Do que é que estamos a falar?


Estamos a falar de uma segunda doença que acontece às pessoas porque estas frequentam
unidades de prestação de cuidados de saúde, ou estão internadas nos hospitais, ou, com o
conceito mais alargado agora, mesmo que não estejam internadas, pode acontecer se
frequentam uma unidade de prestação de cuidados de saúde.

Exemplo inventado geral: imaginem uma pessoa que vai na rua e é atropelada. No decurso do
atropelamento, faz uma fratura importante no fémur e é internada no hospital para corrigir essa
fratura. No decurso da sua permanência no hospital, adquire uma infeção na ferida operatória,
ou adquire uma infeção respiratória, pneumonia, qualquer coisa assim. Esta segunda infeção é
que é associada aos cuidados de saúde e é um aspeto muito relevante e muito importante nos
dias de hoje.

Alguns números que não estão muito atuais, mas que mostram a dimensão:
• EUA: nos hospitais de agudos, têm por ano 722000 infeções destas, das quais cerca de
10% conduzem à morte dos doentes.
• Esta situação prolonga muito o internamento hospitalar das pessoas atingidas, com
aumento de custos (não só dinheiro, mas também o custo da morbilidade, ausência do
trabalho, sofrimento, etc.)
• Portugal: o último inquérito a nível nacional foi feito há 11 anos, 2010, e a prevalência
destas infeções nos hospitais do país era perto de 12%. Ou seja, 12% das pessoas
internadas tinham tido ou tinham uma infeção associada ao seu internamento, o que é
um valor muito elevado. Olhando apenas para as unidades de cuidados intensivos, esta
prevalência aumenta muito mais, é cerca de 40%, e isto devido à ventilação mecânica
que os doentes das unidades de cuidados intensivos habitualmente têm e a infeção mais
prevalente era a infeção respiratória
associada ao ventilador.

A frequência varia muito de local para local e


varia consoante as unidades de cuidados de
saúde e a sua vocação para aquilo que tratam.
Por exemplo, imaginem um hospital que não
tem cirurgia. Se não tem cirurgia, não tens
infeções no local cirúrgico.
Estes números são relativos a Portugal:

Nos EUA, os números são muito diferentes


dos nossos:
Custos:
• Custos diretos de hospitalização:
o EUA: 35 000 000 a 45 000 000 $/ano
o Dias que aumentam ao internamento:
▪ Infeção da corrente sanguínea: 10 a 14 dias
▪ Pneumonia: 6 a 9 dias
▪ Infeção do local cirúrgico: o dobro dos dias
▪ Infeção urinária: 1 a 3 dias
• Estas infeções têm muitos custos indiretos

Como é que os doentes adquirem microrganismos quando estão internados ou quando


frequentam locais onde prestam cuidados de saúde?
• O veículo principal é o profissional de saúde que transmite a infeção aos doentes.
o o próprio está doente infetado, ainda que possa estar assintomático, (se
estiver assintomático teoricamente as pessoas não deviam trabalhar, no
entanto, nós sabemos que muitos de nós, às vezes, com uma infeção
respiratória que não é muito grave e que nos permite fazer uma vida mais
ou menos normal, trabalhamos)
o transporte, sobretudo através das mãos, dos microrganismos que podem
causar estas infeções
• Entre doentes: isto também depende muito da mobilidade dos doentes. Se os doentes
tiverem acamados e não saírem das camas, este risco é praticamente inexistente, a
menos que as camas estejam muito próximas umas das outras e que haja possibilidade
de transmissão via aerossol, mas se se mantiverem as distâncias recomendadas entre
camas esta situação não existe. Existe sim quando os doentes se levantam, andam em
ambulatório, conversam uns com os outros, contactam uns com os outros, mexem nas
coisas uns dos outros e aí já há possibilidade.
• Doentes a transmitir ao profissional de saúde, muito raramente. Nós, neste momento,
na pandemia de Covid-19 que estamos a viver, esta via tem acontecido com alguma
regularidade, e acontece, praticamente em exclusividade, nas infeções respiratórias,
mas é uma via que não é muito habitual.
É muito mais habitual do pessoal de saúde → doentes. Também agora, na pandemia,
tem havido vários surtos em que os doentes são atingidos e que o primeiro caso
conhecido é um elemento do pessoal de saúde.

Precauções básicas:
Estas situações têm que ver, sobretudo, com as mãos e há um conjunto de regras que se
chamam “precauções básicas” que se diz que se forem asseguradas, em todas as ocasiões, o
seu cumprimento, diminui substancialmente estas infeções associadas aos cuidados de saúde.
São medidas muito simples e que nós, população em geral, agora, no curso da pandemia,
estamos muito mais alertados.
• Higiene das mãos
o Portanto a medida principal e fulcral aqui é a higiene das mãos.
• Procedimentos com uso de luvas
o Todos os procedimentos que os profissionais de saúde fazem nos doentes
em que manipulam mucosas, fluídos corporais e objetos contaminados que
estiveram dentro do doente, devem ser executados com luvas.
• Procedimentos com uso de máscara e avental
o Nos procedimentos deve haver máscara (hoje em dia todos usamos
máscaras) e também um avental de proteção quando há a manobras que
fazem salpicos, portanto endoscopias, aspirações, etc.
• Contentores para Cortantes e Perfurantes
o Deve haver contentores próprios para pôr cortantes e perfurante, bisturis e
agulhas, para que não sejam deitadas no lixo comum, onde depois as
pessoas se podem picar
• Limpeza com água quente e detergente
o Todas as superfícies devem ser limpas com água quente e detergente. É
uma medida básica essencial.

Story time:
Em relação às agulhas, como sabem, eu já sou velho e, portanto, já trabalho há mais de 40 anos. Para
terem uma ideia, quando eu comecei a trabalhar nos hospitais, o principal acidente de trabalho que
acontecia nos profissionais de saúde era ao pessoal auxiliar, como se chamava na altura, que era quem
recolhia o lixo dos contentores das enfermarias. Estes picavam-se em agulhas que eram deitadas para
o lixo e que as pessoas não sabiam que estavam lá, e quando manipulavam o lixo, picavam-se.
Portanto, hoje em dia, esta situação praticamente não existe, mas era o acidente mais frequente
porque não havia contentores em quantidade suficiente para deitarem as agulhas e também havia
alguma negligência das pessoas deitavam as agulhas para o lixo corrente do hospital.

Higiene das mãos:


As mãos são o principal veículo de transmissão de microrganismos.
Há uma população microbiana própria. [Vocês, no primeiro dia de aula, colocaram os dedos nas
placas de cultura, e viram que todos nós temos muitas bactérias nas mãos]
• Principal medida para reduzir transmissão hospitalar de microrganismos
• Lavagem das mãos e desinfeção das mãos
o Há 2 coisas que nós podemos fazer para proteção: uma é a lavagem das mãos e
outra é aquilo que se chama a desinfeção ou descontaminação das mãos.
Desinfeção é um termo que eu não gosto porque desinfeção é mais para superfícies.
Desinfeta-se o chão, as bancadas, mas a pele, as nossas mãos, a pele dos doentes,
para isso “desinfeção” é um termo que eu acho que é infeliz. O termo melhor será
“descontaminação”.
o Lavagem das mãos: remoção da maioria das impurezas que nós temos nas mãos. É
esta prática que nós fazemos no dia a dia, muitas vezes. Procura remover a quase
totalidade da microbiota transitória.
o Descontaminação das mãos: algo mais exigente. Procura, não só eliminar todos os
microrganismos da microbiota transitória, como diminuir substancialmente os
microrganismos da microbiota residente. Portanto, não é possível nós
descontaminarmos as mãos de maneira a ficarmos sem micróbios, mas podemos
reduzi-los muito.

• Há 2 tipos de microrganismos que existem nas mãos:


o microbiota residente - constituída por aqueles microrganismos que estão
perfeitamente adaptados a viverem na nossa pele, a pele das mãos. Vários tipos de
Staphylococcus, entre outras bactérias que sobrevivem nas nossas mãos.
Felizmente para nós que não têm potencial patogénico muito grande e multiplicam-
se nas nossas mãos. Têm aí seu nicho ecológico normal.
Sobrevivência longa, baixo potência patogénico
o microbiota transitória - não vivem nas nossas mãos, mas que acidentalmente
podem estar a contaminá-las. Têm uma sobrevivência curta e estes microrganismos
integram outros microrganismos que têm um alto potencial patogénico. Os mais
frequentes destes que estão nas nossas mãos são aqueles que vivem no intestino,
na flora intestinal, e que nós, acidentalmente, por manipulação, contaminamo-las.
Sobrevivência curta, alto potência patogénico

• Aderência baixa dos profissionais de saúde


o O problema com a higiene das mãos era, até agora, a adesão muito baixa dos
profissionais de saúde (principalmente pelos médicos). Penso que vai ser um
assunto estudado as práticas depois de termos ultrapassado esta pandemia, que
está entre nós quase há 2 anos e que modificou muito a perceção das pessoas
relativamente à higiene das mãos.
o Causas:
▪ Falta de formação
▪ Falta de exemplo – se nós estamos junto de uma série de colegas, são mais
velhos, mais diferenciados e não lavam as mãos → também não sentimos
essa obrigação
▪ Falta de tempo – elevado volume de trabalho
▪ Falta de lavatórios
▪ Falta de sabão ou substância antisséptica – [no nosso país, rouba-se se
muito destes produtos e, portanto, eles desaparecem muito rapidamente
dos locais]
▪ Falta de normas escritas
▪ Irritação cutânea

Soluções Alcoólicas:
• têm um efeito semelhante à lavagem das mãos, isto é, descontaminam as mãos, destroem
grande parte dos microrganismos
• não causam irritação cutânea nem desidratação substancial
• não é um estudo de lavagem das mãos, mas se a pessoa tiver que, num turno de trabalho,
lavar as mãos 50 a 60 vezes as mãos com esta substância pode reduzir substancialmente
esse número de lavagens, mantendo a eficácia da descontaminação das mãos.
• Atuação rápida
• Espetro antimicrobiano alargado
• Fácil acesso. Não necessitam de lavatório
• Não há aquisição de resistência documentada

Prevenção – Bundles
Bundles: recomendações de prevenção para evitar infeções
Bundles = feixes, mas aqui não fica bem esta tradução.
• Conjunto de intervenções pequenas e curtas, 3 a 5 que quando feitas em simultâneo,
integradamente, promovem melhor resultado do que cada uma delas isoladamente.
• Recomendações que a DGS emitiu baseadas em recomendações internacionais que ajudam
a controlar as infeções associadas aos cuidados de saúde
• Têm graus de evidência diferentes: Categorias de evidência CDC
o I: categoria a principal. Subdividida em 3 grupos.
▪ IA: medidas fortemente recomendadas e estão apoiadas por estudos
epidemiológicos clínicos e experimentais bem desenhados → há evidência
científica inequívoca e documentada de que a medida é altamente eficaz.
▪ IB: há estudos, alguns não têm todos a mesma conclusão, isto é, a evidência
não é tão expressiva como a IA.
▪ IC: medidas que são recomendadas, mas que não tem ainda uma evidência
científica demonstrada.
o II: medidas sugeridas para implementação, apoiadas em estudos epidemiológicos
ou clínicos sugestivos ou numa fundamentação lógica
o Sem recomendação: práticas com insuficiente evidência ou sem consenso sobre a
sua eficácia.

Infeção urinária:
• Infeção mais frequente dos IACS (35%)
• estão intimamente relacionadas com um procedimento médico → responsável pela infeção
• maior tempo de algaliação → maior risco
o introdução de um corpo estranho na bexiga
o admite-se que certa, 10 dias depois de ser algaliado, acaba por ser inevitável a
infeção
• entrada dos microrganismos:
o má assépsia na algaliação (não expectável nos dias de hoje)
o abertura do sistema (nunca se deve fazer devido ao enorme risco de entrada de
microrganismos)
o fluxo retrógrado a partir do saco coletor (por exemplo, se se levantar o saco acima
do nível da bexiga - válvulas do sistema não são 100% eficazes)
o entre meato urinário e algália

Círculo do meio: junção da algália com saco


coletor → não se pode abrir porque se
desadaptar, abre-se sistema.
Círculo da direita entre o meato urinário e a
bexiga investiga
Círculo da esquerda: saco coletor

Por acaso este esquema, é um esquema mal


feito ou mau, porque este setor não tem uma
torneira de despejo da urina.

• Agentes mais frequentes: (aqueles que, habitualmente, vivem no tubo digestivo (cólon)
pela sua proximidade com aparelho urinário)
o Enterobacteriaceae → habituais do tubo digestivo
▪ Escherichia coli
▪ Klebsiella
▪ Proteus
▪ Enterobacter
o Pseudomonas aeruginosa Acinetobacter e Enterococcus
o Acinetobacter • Não colonizam o tubo digestivo
o Enterococcus
• Altamente associadas a IACS
o Staphylococcus aureus
• Muito resistentes a antibióticos
o Staphylococcus epidermidis
o Candida
• Profilaxia
o Algaliação só quando necessário
o Técnica asséptica na algaliação
o Manutenção do sistema fechado
o Manuseamento correto do sistema Todos têm categoria IB
o Higiene diária do meato uretral
o Colheita correta da urina

Infeção do local cirúrgico:


• de uma intervenção cirúrgica que se faz ao doente
• 2 tipos:
o Superficial – pele e tecido celular subcutâneo
o Profunda – no local onde houve manipulação de órgãos
• infeção está muito condicionada por:
o preparação pré-operatória Limpa: num local que habitualmente não tem
o tipo de cirurgia microrganismos (ex.: mastectomia)
o técnica cirúrgica Limpa-contaminada: cirurgia num local que
o fatores de risco do doente tem microbiota própria (ex.: TGI)
• Agentes mais frequentes: Suja/infetada: cirurgia sobre um local onde
o Staphylococcus aureus já há uma infeção (ex.: peritonite, abcessos)
o Pseudomonas aeruginosa
o Enterobacteriaceae
▪ Escherichia coli
▪ Klebsiella
▪ Proteus
▪ Enterobacter
o Enterococcus
o Candida
• Profilaxia:
o Banho com cloro-hexidina a 2% no dia anterior e no dia da cirurgia – Cat. IB (se for
programada)
o Administrar antibiótico para profilaxia antibiótica cirúrgica dentro dos 60 minutos
anteriores à incisão cirúrgica, sempre que indicado – Cat. IA
o Evitar tricotomia (cortar os pelos) e, quando absolutamente necessária, usar
máquina imediatamente antes da intervenção cirúrgica – Cat. IA
o Manter normotermia peri-operatória (temperatura central ≥ 35,5ºC – Cat. IA
o Manter glicémias ≤ 180 mg/dl durante a cirurgia e nas 24h seguintes – Cat. IA

Infeção da corrente sanguínea:


• infeção muito grave
• mortalidade mais relevante - cerca de 25%
• diretamente relacionado com a
manipulação e presença de
cateteres intravasculares
o periféricos: vasos de
menor calibre – risco
baixo
o centrais: vasos de
maior calibre – risco
elevado
o maior tempo de
cateterização → maior
risco de infeção
→ Designações dos locais onde os microrganismos podem entrar. Mais relevantes:
• bactérias da própria pele do doente, que podem entrar na zona do
cateter
• mãos do profissional não estiverem devidamente descontaminadas,
também podem ser um foco.
• Agentes mais frequentes: (sobretudo Gram +, que habitam na nossa pele)
o Staphylococcus epidermidis e outros coagulase -
o Staphylococcus aureus
o Enterococcus
o Candida
o Enterobacteriaceae
▪ Escherichia coli
▪ Klebsiella
▪ …
• Profilaxia:
o Preparação pré-cirúrgica pelos operadores (Cat. IC)
▪ Introdução de um cateter deve ser encarada como se fosse uma
intervenção cirúrgica.
o Assépsia da pele do doente cloro-hexidina a 2% alcoólica na inserção do cateter
(Cat. IA)
o Evitar acesso femoral (Cat. IA) – devido à proximidade com o ânus (acesso é feito
pela virilha)
o Técnica asséptica na realização do penso e manipulação do cateter (Cat. IC)
o Remoção do cateter logo que possível (Cat. IA)

Pneumonia:
• Infeção grave
• Mortalidade atribuível 20 a 30%
• Fator de risco: ventilação mecânica (situação típica de UCI)
o Maior tempo de ventilação mecânica → maior risco de infeção
• >50% das prescrições antibióticas na UCI
• Entrada dos microrganismos:
o Aspiração de bactérias da orofaringe e do trato respiratório superior
▪ Como o doente normalmente está sedado, não tem reflexo da tosse e nem
a tosse é eficaz (porque têm um tubo introduzido até à traqueia), os
microrganismos da nossa cavidade oral e do aparelho respiratório superior
podem escorrer entre o tubo e as paredes da traqueia e terem acesso ao
pulmão, onde causam infeção
▪ Não é o ar que é insuflado pelo aparelho que leva os microrganismos
• Agentes mais frequentes:
o Início precoce (<4 dias): → bactérias que causam pneumonia na comunidade
▪ Streptococcus pneumoniae
▪ Haemophilus influenzae
▪ Staphylococcus aureus
o Início tardio (>4 dias):
▪ Staphylococcus aureus
▪ Pseudomonas aeruginosa
▪ Klebsiella pneumoniae
▪ Enterobacter
▪ Acinetobacter
▪ Candida
• Profilaxia:
o Reduzir ao mínimo a sedação (Cat. IA)
o Extubar precocemente (Cat. IA)
o Elevação da cabeceira do leito ≥30º
▪ Suficiente para que os restos de saliva e algumas escorrências da cavidade
oral passem para o esófago e não para traqueia
o Higiene oral 3x ao dia com cloro-hexidina
o Manter circuitos ventilatórios. Substituir apenas quando sujos ou disfuncional (Cat.
IA)
o Manter pressão do balão do tubo endotraqueal entre 20-30 cmH2O (Cat. IC)

Infeção por Clostridioides difficile:


• Epidemiologia
o Principal agente de diarreia nosocomial (de ligeira a colite pseudo-membranosa –
descamação de partes do cólon)
o Bactéria esporulada, cujos esporos são muito resistentes
o Fatores predisponentes:
▪ Terapêutica antimicrobiana
▪ Idade avançada
▪ Duração de internamento
▪ Gravidade de doenças subjacentes
o Transmissão:
▪ Contacto direto ou indireto (esporos)
▪ O doente ingere os esporos que ficam no tubo digestivo. Os esporos são
resistentes aos antimicrobianos e, nessas condições, germinam dando
origem a bactéria, na forma vegetativa, que produz os toxinas responsáveis
por diarreia que pode ser muito muito grave (podendo levar à morte).
• Diagnóstico: → não se faz coprocultura
o Pesquisa de toxinas em fezes diarreicas
▪ Não repetir pesquisa após uma resposta positiva
▪ Não fazer pesquisa em assintomáticos
▪ Não fazer controlos terapêuticos
o Pesquisar C. difficile em situações específicas (casos graves ou surtos)
• Controlo:
o uso de luvas
o uso de vestuário protetor
o lavagem das mãos com água e sabão (ação física da lavagem é a única que remove
os esporos)
o descontaminação regular ambiental com agentes esporocidas, idealmente
contendo cloro (pelo menos 1000 p.p.m)
▪ camas
▪ colchões
▪ chão
▪ paredes
Data Docente
24/11/2021 Prof. Doutor Miguel Prudêncio

Malária – Resumo

• Doença parasitária (parasitas do género Plasmodium)


• Transmitidos aos seus hospedeiros mamíferos através da picada de mosquitos
• Há 5 espécies de parasitas da malária humana:
1. Plasmodium falciparum Maior mortalidade e
2. Plasmodium vivax morbilidade associadas
3. Plasmodium ovale
4. Plasmodium malariae
5. Plasmodium nowlesi

• Maior mortalidade na África subsariana e em crianças até aos 5 anos


• Também afeta várias partes da ásia e também da américa latina, ou seja, metade da
população está em risco de contrair malaria
• 200 milhões de casos todos os anos e mais de 400.000 mortes por ano, é uma das
doenças infeciosas mais prevalentes em todo o planeta

Doença
1. Benignas – dores de cabeça, anemia, mal-estar, dores musculares, etc
2. Não trada e em pessoas que não tenham nenhuma imunidade contra a malária –
complicações mais graves: stress respiratório, pneumonias, anemias severas, falhas
respiratórias agudas, malária cerebral (dos mais preocupantes), etc

Vetores – mosquitos fémea do género Anopheles (só as fêmeas é que se alimentam de


sangue)

Etapas:
1º. Pre-erythrocytic stage - Parasita injetado pelo mosquito infetado. Nesta fase o parasita
chama-se esporozoíto (forma do parasita da malária que reside nas glândulas salivares
do mosquito). Uma vez na corrente sanguínea os esporozoítos Plasmodium vão para o
fígado, infetando os hepatócitos e multiplicando-se dentro deles (1 parasita – 20 a 30
mil novos). Assintomático. É um ótimo alvo para intervenções profiláticas ou
vacinação.
2º. Erythrocytic stage – Libertados na corrente sanguínea e infeta ciclicamente os glóbulos
vermelhos (invasão – multiplicação – lise). Sintomática, tratamentos dirigidos a esta
fase.
3º. Sporogonic stage – ocorre durante a fase sanguínea. Algumas formas do parasita
diferenciam-se em formas sexuadas, os gametócitos, e estes gametócitos podem ser
ingeridos por um mosquito. Dentro do mosquito dá-se a parte sexuada do ciclo de vida
do parasita.
Medidas para proteção
da transmissão

Eficazes a matar o
parasita no sangue

Uma vacina é um componente crucial para a erradicação da malária. Existem décadas de


investigação, mas não existe uma vacina realmente eficaz disponível hoje em dia. A 1ª vacina
autorizada (RTS,S) tem uma eficácia reduzida (+- 30%).

Voltando ao ciclo de vida do parasita.

Existem 3 locais onde a vacina poderia


atuar:
Ao nível da infeção dos glóbulos
vermelhos – fase sanguínea.
Vacinas com o objetivo de inibir a
transmissão do parasita de um hospedeiro
para outro – vacinas de bloqueio da
transmissão.
Vacinas que atuem ao nível do fígado,
antes dos eritrócitos. Atuam ao nível das
formas do parasita que antecedem as
formas sanguíneas, ou seja, os esporozoítos
e as formas hepáticas – vacinas pré-
eritrocitárias.

Dentro das vacinas pré-eritrocitárias temos vacinas de subunidade e vacinas de organismo


inteiro. As primeiras baseadas num antigénio ou num conjunto reduzido de antigénios do
parasita e as segundas baseadas no organismo infecioso no seu todo.

Vacinas de subunidade
A mais conhecida e mais avançada é a RTS,S. É uma vacina comercializada com o nome
comercial de Mosquirix, desenvolvida pela GSK. Teve opinião positiva por parte da agência
europeia de medicamentos mas a OMS sugeriu a realização de mais ensaios antes de se
pronunciar. Dia 6 de outubro de 2021 a OMS recomendou a utilização da 1ª vacina contra a
malária em crianças. Apesar de ser uma ótima notícia esta vacina apenas reduz os episódios
clínicos de crianças até ais dois anos em 36%. É necessário uma mais eficaz, com pelo menos
75% de eficácia (segundo OMS).
Sendo uma vacina de subunidade
a RTS,S baseia-se num determinado
antigénio do parasita.
Para fazer a RTS,S: tem-se numa
região central uma série de
sequências repetidas da proteína
(região dos repeats ou R) + uma zona
C-terminal onde estão epítopos celulares para resposta das
células T. Tudo isto é fundido com o gene da Hepatite B e é
administrado.
Não há ‘correlates of protection’ identificados e há indicações
de que a vacina funciona sobretudo através de anticorpos,
embora haja uma resposta do tipo celular por células TCD4+.

Vacinas de organismo inteiro (vacinas baseadas no esporozoíto – forma do parasita que


reside nas glândulas salivares do mosquito e que infeta o fígado do hospedeiro)
Podem ser utilizados se devidamente atenuados,
de modo a não causar sintomas.
Eficaz em provocar respostas imunitárias
protetoras contra uma infeção pelo parasita da malária.
Há 3 categorias principais: Vacinas baseadas na atenuação do
parasita por irradiação, por alteração genética e sob atuação do
parasita sem qualquer atenuação, mas sob a capa de um profilático que
mata o parasita no sangue impedindo assim o aparecimento de
sintomas.

1- Vacinas atenuadas por radiação


Esporozoítos que são sujeitos a uma dose fixa de radiação gama que
os torna incapazes de se multiplicar dentro dos hepatócitos.
Causam uma resposta imunitária enquanto estão no fígado e não
chegam a sair para o sangue.
Este tipo de imunização é muito eficaz e funciona sobretudo através
de células CD8+ e células γδ T, com uma contribuição de anticorpos
contra a proteína circumsporozoide (CSP) que está à superfície dos
esporozoítos.
Stephen Hoffman criou uma forma injetável desta vacina (antes era
apenas por picadas de mosquitos) - PfSPZ Vaccine – injeção
intravenosa.

2- Vacinas atenuadas através da supressão de genes específicos do


parasita essenciais para o seu desenvolvimento hepático
Criam-se parasitas knock-out para determinados genes necessários
para que o parasita complete o seu desenvolvimento dentro dos
hepatócitos.
Assim o parasita infeta as células hepáticas, promove uma resposta
imunitária, mas depois não tem capacidade de sair para o fígado e ir
para o sangue causar sintomas.
Foi demonstrado há vários anos em modelos animais e sabe-se que há uma proteção
dependente de células T CD8+. Mais tarde foi criado um parasita ΔslarpΔb9 (tem o gene slarp e
o gene b9 deletados ou removidos). Já foi testado na clínica e mostrou proteção moderada
contra uma infeção subsequente pelo parasita da malária.
Aqui a atenuação tem que ser suficientemente forte para que não haja breakthrough
infections, ou seja, que o parasita não fique completamente retido no fígado e consiga passar
para o sangue onde causará doença.

3- Utilização de parasitas infeciosos sem qualquer atuação, mas


sob a capa de um fármaco de modo a matar os parasitas no sangue
Um exemplo de fármaco é a cloroquina, que não afeta o parasita
no fígado mas é eficaz a matar as formas sanguíneas do parasita.
Esta forma de imunização confere uma proteção com uma
quantidade de parasitas significativamente inferior àquela que é
necessária nos métodos anteriormente explicados.
A resposta imunitária depende de células CD4+ e células γδ T
sendo que aqui, ao contrário do que acontece com os irradiados, as
células CD8+ não desempenham um papel importante.
Demonstrado em humanos por Robert Sauerwein (2009 – 100%
de proteção). Mais tarde o mesmo grupo foi submetido a uma infeção por uma estirpe diferente
do parasita – ensaio heterólogo – e a proteção foi significativamente inferior.

Todas estas abordagens de vacinação de esporozoíto inteiro dependem de esporozoítos de


P. falciparum o que levanta algumas questões de segurança:
• Tem proteção limitada contra estirpes heterólogas do parasita
• Não confere proteção contra o P. vivax
• Cada abordagem tem as suas próprias limitações:
1. É necessário um elevado número de parasitas
2. Breaktroughts podem causar doença
3. São administrados P. falciparum vivos e não atenuados.

Alternativa proposta: ter a eficácia das vacinas de organismo inteiro e não ter tantos
problemas associados.

IMM e a Vacina contra a malária (laboratório)


• A vacina da varíola foi a 1ª vacina que existiu no mundo.
o Varíola humana – Smallpox, Varíola das vacas – Cowpox. As senhoras que
estavam em contacto com a varíola bovina não tinham varíola humana.
o Sir Edward Jenner inoculou o vírus da varíola bovina e injetou em humanos.
(Esta vacina fez com que a varíola fosse erradicada)
• Existiu Cross-Species Immunity

Na malária existem também diferentes parasitas que infetam diferentes tipos de mamífero.
Como por exemplo:
Plasmodium falciparum – principal parasita causador da malária em humanos
Plasmodium berghei – infetam ratos das arvores africanos (roedor)

Plasmodium berghei
Pode ser alterado para expressar antigénios do parasita humano, ou seja, mascarar o parasita
de roedores com o humano, colocando à sua superfície proteínas do parasita humano.
Permite ter respostas celulares cruzadas entre os 2 parasitas (existem epítopos comuns aos
2) e respostas dirigidas àquele antigénio do parasita humano.

Utiliza-se a CSP, pois é a proteína mais abundante à superfície dos esporozoítos e potente
imunogénio, logo um alvo privilegiado da vacinação. Coloca-se então a CSP do P. falciparum à
superfície do P. berghei, criando assim um híbrido chamado PbVAC.

PbVAC expressa a CS endógena e a CS inserida artificialmente. É um pré-candidato a vacina,


um potencial agente de imunização contra a malária humana.

Procedimento pré-clínico e clínico no desenvolvimento desta vacina


Requisitos básicos:
1. Demonstrar que o PbVAC sendo um parasita de roedores conseguia infetar células
hepáticas humanas. A partir de modelos com ratinhos humanizados com hepatócitos
humanos.
2. Demonstrar que o PbVAC não se desenvolve/multiplica no sangue humano. A partir
de ratinhos humanizados com sangue humano.
a. Aqui demonstrou-se que o PbVAC tinha uma capacidade muito baixa de
infetar eritrócitos humanos mas mesmo assim conseguia infetar alguns, mas
mesmo após infeção este não se conseguia replicar.

Durante vários anos fizeram-se ensaios pré-clínicos


em modelos animais, nomeadamente ratinhos,
coelhos e primatas não humanos.
Concluiu-se que o PbVAC leva à produção de
respostas celulares cruzadas P. berghei/P. falciparum e
respostas humorais (produção de anticorpos) contra a
CS do P. falciparum.

Para avançar para a fase clínica havia desafios: não


havia história de administração de parasitas de
roedores em seres humanos (para além de ser um organismo geneticamente modificado) e
apenas é possível a produção de esporozoítos de PbVAC a partir de mosquitos que se alimentam
de sangues de ratinhos infetados.

Então foram feitas demonstrações em modelos animais de modo a concluir que era seguro
administrar PbVAC a humanos. Entre as medidas tomadas estavam:
• Criação de um banco de vacinas
• Sequenciação integral do genoma dos parasitas
• Análise microbiológica de modo a garantir a ausência de contaminantes
• Estudo de biodistribuição para se garantir que o parasita não ia parar a órgãos onde
não era esperado que ele fosse
• Ensaios de sensibilidade a fármacos para garantir que era possível eliminar o parasita
dos seres humanos no caso de algo correr mal
• Ensaio de toxicologia para garantir que não havia preocupações em termos de
reações adversas nas pessoas
Houve então autorização para realizar o ensaio clínico.

Decorreu na Holanda em duas fases. A administração foi por picada de mosquito.


1. Etapa – Segurança: Incremento de dose do mosquito para ver se havia alguns efeitos
adversos. (5 mosquitos – 25 mosquitos – 75mosquitos)
2. Etapa – Eficácia da proteção: O grupo picado por 75 mosquitos foi depois infetado
por mais 3 doses de 75 mosquitos, ou seja, 4 doses de 75 picadas de mosquitos.
Todos os que receberam as picadas foram expostos ao P. falciparum não atenuado.

Resultados:
• Segurança: Não houve passagem do PbVAC do fígado para o sangue, logo não houve
reações adversas sérias (tirando o local de administração da vacina)
• Eficácia: Não houve proteção estéril, ou seja, o bloqueio completo do P. falciparum
nos voluntários vacinados. Mas viu-se que nos voluntários vacinados o tempo que
demorou o P. falciparum passar do fígado para o sangue foi muito superior em
comparação aos não vacinados. Por outro lado, a quantidade de parasita que chegou
ao sangue nos voluntários vacinados foi significativamente inferior à quantidade de
P. falciparum nos não imunizados.
Ou seja: 95% de decréscimo na infeção hepática para o parasita da malária humana.

O que é bom, mas não é perfeito, pois basta 1 parasita passar para o sangue para causar
malária. É necessário bloquear por completo
Nota: Quando foram os ensaios clínicos
a infeção hepática para que o parasita não
para a vacina com os parasitas irradiados
cause doença. Mas desde o início foram
usadas doses sub ótima de vacina, logo é foram precisas 2 a 3 mil picadas de
possível que com uma dose superior mosquitos por voluntário. Hoje em dia estes
consigamos o bloqueio total que ensaios são proibidos por questões éticas.
pretendemos.

Avaliações das respostas imunitárias


• No soro dos voluntários imunizados houve produção de anticorpos capazes de
reconhecer os esporozoítos do P. falciparum.
• Em ensaios in vitro este soro tinha capacidade de inibir a infeção de células hepáticas
pelo P. falciparum.

A vacina despoleta a produção de anticorpos contra o CS do P. falciparum e são estes que


bloqueiam a infeção no fígado. Dependente da quantidade de picadas: quanto maior o
número de picadas de mosquito (dose de vacina) maior a quantidade de anticorpos. Tal também
acontece nas respostas celulares: houve produção de CD8+ e células γδ T (importantes na
imunização), mas não correlaciona com o resultado clínico; nas células NK há correlação com o
outcome clínico.
Estas respostas celulares são funcionais porque quando células imunitárias (linfócitos fetais
e células CD8+) são estimuladas pelos esporozoítos do P. falciparum há resposta – produção de
citocinas.
Resumo:
• A resposta à PbVAC é segura e bem tolerada
• Conseguimos, apesar de não termos tido um bloqueio completo da infeção, um
decréscimo de 95% na infeção hepática dos voluntários imunizados (com uma dose
sub ótima da vacina)
• Vimos que a imunização leva à produção de anticorpos contra a CS do P. falciparum
funcionais, ou seja, capazes de bloquear a infeção das células hepáticas pelo P.
falciparum, bem como respostas do tipo celular dependentes da dose

Perspetiva de futuro
• Aumentar o potencial imunogénico da plataforma de vacinação
o O P. berghei pode expressar outros antigénios tanto pré-eritrocitários como
também de outras fases do ciclo do parasita
o Pode-se inserir no genoma do P. berghei genes do P. vivax
• Aumentar a dose
o Não se fazem ensaios com doses maiores de picadas de mosquitos
o (a trabalhar com a empresa SANARIA) Produção e criopreservação de
esporozoítos de Pb e de PbVAC para um ensaio clínico futuro – por injeção,
pode-se dar maior dose
Data Docente
25/11/2021 Prof. Doutor Mário Ramirez

MÉTODOS MOLECULARES EM MICROBIOLOGIA

Métodos convencionais
→ 1-2 dias p/ crescimento do agente a partir do produto;
→ 1-2 p/ identificação da espécie e testes de suscetibilidade a antibióticos;
→ Tipagem (distinção de estirpes da mesma espécie - algumas semanas))

Nota: Mycobacterium (espécie de crescimento lento) demora muito mais tempo (semanas).

Com os métodos moleculares, estes resultados surgem em horas.

Objetivos:

.Identificar um agente patogénico mais rapidamente ou de díficil cultura (bactérias ou vírus);

.Determinar a suscetibilidade a antimicrobianos (bactérias ou vírus);

.Realizar estudos epidemiológicos.

PCR (polymerase chain reaction)

→ Método mais usado;


→ Permite amplificar especificamente um DNA alvo que existe numa quantidade ínfima até um
limite detectável;

De onde vem a especificidade? Primers.

No entanto, a qualidade do DNA alvo (template) é também determinante, pois:

● existem inibidores de PCR em produtos biológicos


ex.: hemoglobina (transporta ferro, que é um inibidor da reação de PCR)
● Possibilidade de contaminação
● Quantidade de DNA

Se o material genético do agente for RNA, recorremos ao…

RT-PCR (reverse transcription - polymerase chain reaction)

Usa-se uma transcriptase reversa que vai sintetizar as cadeias complementares às cadeias de
RNA do agente em DNA; de seguida podemos proceder ao PCR
REAL TIME PCR

Deteção do produto de PCR por fluorimetria (ao contrário dos anteriores que são feitas em gel
de agarose)

→ Aumenta a sensibilidade (permite detetar menores quantidades de DNA)

→ Permite avaliações quantitativas (permite determinar quantas cópias de DNA tínhamos na


amostra inicial)

→ Permite uma resposta


mais rápida (não precisamos
de fazer o PCR e depois a
fluorimetria, como acontece
no PCR em gel de agarose; a
detecção de produto é
simultânea ao PCR)

Mede-se por CT (ciclo ao qual


as linhas atravessam a linha
basal - a laranja)

Quanto menor o CT, maior a


quantidade de DNA alvo que
tínhamos no produto inicial.

Importância dos controlos:

→ Controlo negativo (sem DNA)


verifica se há contaminação de reagentes

→ Controlo sem RT
verifica se o sinal é de DNA contaminante

→ Controlo positivo
verifica se os iniciadores e reagentes funcionam (+++ importante para dar resultados negativos)

Os resultados negativos são difíceis de gerir (podem estar sujeitos a erros técnicos na execução).

Outras técnicas de amplificação:

LAMP - loop-mediated isothermal amplification

→ Extremamente sensível; Resultados visíveis a olho nu;

SDA - strand displacement amplification

HDA (helicase-dependent amplification); NEAR (nicking enzyme amplification reaction)


PCR e amplificação:

+ Extremamente sensível
+ Especificidade

- Especificade (apenas encontramos o que queremos procurar, perdendo outras


possibilidades)

Nestes casos, as técnicas de cultura são mais abrangentes do que os de amplificação.

Sequenciação (HTS)

Deteção direta a partir de amostras de doentes (sem viés de procura). Dá-nos toda a informação
genética (resistência, virulência, clonalidade).

É possível combinar as técnicas de PCR com a sequenciação; nomeadamente pelo uso de primers
não específicos para um agente.

ex.: primers para zonas conservadas do RNA ribossomal (16S específicos para todas as bactérias
do reino Bacteria)

No diagnóstico, interessa-nos identificar genes ou proteínas específicas, padrões ou sequências


únicas.

ex.: MALDI-TOF (matrix-assisted laser desorption ionization time-of-flight mass spectrometry)

O MALDI-TOF funciona a partir da criação de perfis de proteína com base no seu rácio
massa/carga (m/z). Cria um espetro que permite uma comparação com uma base de dados, o
que nos permite a identificação da espécie.
O procedimento em laboratório depende do tipo de amostra (bactéria, fungo, amostra
diretamente do doente) e da preparação de amostra.

O futuro da microbiologia clínica?

deteção direta molecular do agente;


citometria de fluxo (usado por ex. na
malária);
uso direto de microscopia eletrónica
serologia (testes POC)
sequenciação e espectrometria de
massa

→ Estas tecnologias não estão


disponíveis na maioria dos
laboratórios, portanto hoje em dia a
maioria do diagnóstico
microbiológico ainda é feito por
metodologias convencionais.
Aspetos negativos:
→ Limitações dos testes pouco conhecidas (falta de experiência)
Baixa concentração do agente infeccioso
Inibição
Contaminação
Erros de manipulação
Dificuldades de distinção com base em características moleculares

→ Variabilidade do agente patogénico


Determinação da carga viral (os métodos moleculares podem ser demasiado específicos)

EPIDEMIOLOGIA MOLECULAR

Quando semeamos um produto dum doente, pretendemos distinguir espécies (ou pelo menos,
um taxon - unidade taxonómica, por ex.: género).

Espécie - definida com base em características universalmente aceites

Mas assim, será que todas as


colónias beta-hemolíticas
são da mesma espécie? E se
forem, cada colónia poderá
ser duma estirpe diferente?

A identificação permite-nos
também saber outras
informações importantes.

(Não é obrigatório tratar-se


de transmissão cruzada pois
os doentes podem estar
infetados com organismos da mesma espécie sem se tratar necessariamente duma transmissão
cruzada. No caso de Acinetobacter baumanii existem muito poucos clones de estirpes multi-
resistentes.)

Medidas de controlo de infeção (baseada em factos verídicos):

1. Lavagem das mãos


2. Lavagem das mãos
3. ...drumroll please… lavagem das mãos

Assim, a epidemiologia molecular pretende estabelecer a relação entre duas estirpes utilizando
técnicas moleculares. É importante ter presente o conceito de clone.

CLONE → estirpes que não são distinguidas pelas técnicas e critérios utilizados e que se infere
tiveram um antepassado recente comum

Com a epidemiologia molecular, podemos agora distinguir estirpes diferentes que


anteriormente concluímos tratarem-se do mesmo clone.
Metodologias a usar:

Convencionais/fenotípicas:

→ Antibiograma: perfil de susceptibilidade a um painel arbitrário de antibióticos (estabilidade


e poder discriminatório variáveis);

→ Biótipo: resultados dos testes de um painel de provas bioquímicas, utilizadas frequentemente


para identificar a espécie mas também para distinguir estirpes (galerias API - vimos várias vezes
nas aulas práticas)

→ Aparência: visualização a olho nu das colónias e das suas características.


ex.: mucóides, produção de pigmento, etc...

→ Serotipagem: identificação de epitopos na superfície bacteriana, usando anticorpos


específicos.
ex.: E. coli (antigénios O e H), Streptococcus (antigénios capsulares), etc…

CASOS PARA EXEMPLO (alguns verdadeiros, outros inventados):

Caso I - Seis doentes na unidade de cardiologia estão infetados com MRSA. Será que se trata de
transmissão cruzada?

→ A resistência à meticilina em S. aureus isolados de doentes internados na unidade de


cardiologia é elevada.

→ As estirpes resistentes à meticilina são frequentemente multi-resistentes.

→ Não usamos TSA (vai ser resistente à maioria dos agentes antimicrobianos) e não usamos a
fagotipagem - usada nos anos 80 (as estirpes não são tipáveis).

→ Isolaram-se os plasmídeos.

→ O DNA plasmídico é cortada com uma endonuclease, isolando segmentos de DNA, separados
em gel de agarose. Comparando os perfis plasmídicos (como se fossem códigos de barras).
→ Não aconteceu transmissão cruzada entre estes doentes, ou seja, não pertencem ao mesmo
surto (aumento do n.º de casos num determinado período de tempo, numa determinada região
geográfica).

Perfil plasmídico:

● Só aplicável a estirpes com plasmídeos;


● Pouca reprodutibilidade e díficil standardização entre laboratórios;
● Poder discriminatório muito variável;
● Económico.

CASO II - Um doente de que S. epidermidis é isolado de uma hemocultura é medicado com


antibiótico. Uma semana depois, nova hemocultura revela a mesma espécie que se isolou da
primeira vez.

Trata-se do mesmo organismo ou de nova infeção?

→ S. epidermidis é um comensal da pele

→ As estirpes de SCN são muitas vezes multi-resistentes.

Se isolamos S. epidermidis de duas garrafas de hemocultura trata-se de infeção ou de


contaminação?

→ PCR

→ RAPD (random amplified polymorphic DNA)

São iniciadores pequenos e não específicos (possuem muitos locais alvo), tendo uma reação de
PCR de baixo rigor, ou seja, os iniciadores ligam-se a locais com os quais não são 100% idênticos.

Surgem diversos produtos que formam diferentes perfis, quando as amostras são separadas em
gel de poliacrilamida.
Nota: O perfil ou dendograma de semelhança lê-se, observando o quão semelhantes 2
estirpes são. Por exemplo, as primeiras 2 estirpes são 84% semelhantes entre si e 70%
semelhantes à seguinte.

→ Se os perfis de RAPD forem idênticos, as estirpes obtidas de cada uma das garrafas pertencem
ao mesmo clone; o que nos aponta para ser agente de infeção.

→ Se os perfis de RAPD forem diferentes, neste caso, as estirpes obtidas da primeira amostra
não são relacionadas com a da 2ª amostra, logo provavelmente trata-se duma infeção com uma
estirpe adquirida de novo.

Tecnologias baseadas em PCR:

● Quantidade de material inicial pode ser pequena;


● Aplicável a todos os microrganismos;
● Elevado poder discriminatório;
● Reprodutibilidade boa (AFLP - específica), fraca (RAPD - “ao acaso”).

Caso III - No período de 1 mês, infeções invasivas de Klebsiella pneumoniae, S. epidermidis e S.


hemolyticus foram detetadas na unidade de cuidados intensivos.

Será que se trata de transmissão cruzada?

→ Isolamento de DNA total das estirpes (cromossómico e plasmídico)

→ Corte com apenas uma endonuclease


→ Separação em gel de agarose (PFGE - pulsed field gel electrophoresis): permite separar
fragmentos grandes de DNA
Outras técnicas:

MLST (multi locus sequence typing)


→ PCR com iniciadores específicos para 7 genes codificando funções essenciais
→ determinação da sequência dos fragmentos gerados
→ Comparação dos padrões alélicos com uma base de dados
→ Faz-se uma sequenciação de Sanger

Para cada sequência, é atribuído um número de alelo. O conjunto dos alelos nos 7 loci que
estamos a investigar determina o ST (sequence type).

Vantagens:
● Altamente reprodutível
● Dados facilmente digitalizáveis
● Permite comparar facilmente
dados de diferentes laboratórios
● Facilita estudos internacionais e
com longa duração
● Permite perguntas como
“Existem clones associados a
determinada manifestação
clínica?” ou “Os clones que
colonizam os portadores
assintomáticos são os mesmos
que causam doença?”
● Permite estabelecer relações entre estirpes (a árvore não é assim tão importante no
nosso contexto, para já)
Sequenciação (HTS) → é hoje o gold standard
Não utiliza primers. Pode sequenciar completamente um genoma bacteriano de uma vez só.

É bastante rápido e tem sido usado para sequenciar as diferentes estirpes de SARS-CoV-2.

Permite olhar para todo o genoma do agente patogénico e de forma muito rápida.

→ WGS (whole genome sequence)

- mesmas vantagens do MLST;


- maior poder discriminatório;
- análise por SNPs (single nucleotide polymorphism) ou wgMLST (whole genome MLST);
- permite estudo GWAS (genome wide association studies).

Curiosidade: Foi usada, por exemplo, para identificar as estirpes de Legionella pneumophila do
surto em Vila Franca de Xira. O professor refere depois outros exemplos de aplicação desta
técnica antes do fim da aula.

IMPORTANTE: Os perfis de proteína pelo MALDI-TOF também podem ser diferentes entre
estirpes da mesma espécie, sendo menos discriminatório que o WGS.
Data Docente
26/11/2021 Prof. Doutor Mário Ramirez

PROFILAXIA DAS DOENÇAS INFECIOSAS

A profilaxia das doenças infeciosas passa por 4 pontos chave os quais vamos discutir ao longo
desta aula:
1. Saneamento Básico;
2. Medidas de controlo da infeção;
3. Uso de antimicrobianos;
4. Vacinas;

Contextualização Histórica das doenças infeciosas


Antes de começarmos a falar sobre este tema vamos primeiro fazer uma
contextualização histórica acerca das doenças infeciosas.
John Snow foi o pai da epidemiologia moderna. Viveu em londres durante a grande
epidemia de cólera que aconteceu entre 1853 e 1854.
Na altura ainda não se conhecia o agente responsável pela Cólera e julgava-se ser um “miasmo”,
ou seja, uma espécie de vapor que se transmitia e infetava as pessoas. No entanto, o quadro
clínico de Cólera era já bem conhecido nesta altura e isso permitia-lhes distinguir os casos de
Cólera de outros tipos de gastroenterite.
John Snow a certa altura reparou que na zona onde habitava havia um maior número
de casos à volta de uma das bombas de água da cidade, tendo mandado retirar essa mesma
bomba e assim conseguiu parar a disseminação desta doença.

Com esta contextualização histórica pretendo mostrar-vos a importância do


Saneamento Básico e das Medidas de controlo da infeção.

1.Saneamento Básico
· Garantir água potável;
· Esgotos;
· Condições de habitação (isto é, espaço com o objetivo de ter um menor número de
pessoas agregadas);
· Controlo dos vetores de transmissão;

2.Medidas de Controlo da transmissão


· Higiene pessoal (lavagem das mãos e, uso de máscara);
· Quarentena;
· Profilaxia Antibiótica;

Nota: A especial atenção em relação à lavagem das mãos esteve pela primeira vez com foco
especial em 2009 com a pandemia da gripe A.
A pandemia por Covid-19 veio trazer o hábito e mostrar a importância do uso das máscaras.

3.Profilaxia Antibiótica
A profilaxia antibiótica é importante em casos de:
· Contacto com um caso de infeção (N.Meningitidis, H.Influenza (serotipo B), casos
de tuberculose ativa);
· Maior susceptibilidade à infeção (em casos de indivíduos com próteses cardíacas
que vão fazer intervenções de medicina dentária ou então em indivíduos
imunosuprimidos);
· Em intervenções cirúrgicas;

4.Vacinas
Nesta parte da aula, vamos falar acerca das vacinas e da sua importância, sendo o ponto
que vamos explorar mais destes 4.
As vacinas são uma imunização ativa, ou seja, vamos administrar um ou vários
antigénios ou então material que produza estes antigénios e esperar que o próprio indivíduo
produza anticorpos contra esse antigénio.

Imunização Passiva: Na imunização passiva o que fazemos é administrar diretamente


imunoglobinas, não esperando que seja o próprio indivíduo a produzi-las.
Estas imuniglobinas podem ser:
· Homólogas: vindas de outros seres humanos;
· Heterólogas: vindas de um animal, por exemplo o cavalo.
Agora, quando é que realizamos Imunização Passiva? Podemos recorrer a este tipo de
imunização em várias circunstâncias como:
· Evitar doença após exposição ao agente (Exemplo: Imunoglobulina contra a
Hepatite B após picada acidental com agulha infetada);
· Melhorar a sintomatologia (Exemplo: Imunoglobulina normal humana, retirada de
dadores saudáveis para a doença em causa, administrada em casos de Sarampo,
Hepatite...);
· Proteger indivíduos imunodeprimidos (Exemplo: Imunoglobulina contra
citomegalovírus administrada em doentes imunodeprimidos, particularmente nos
transplanatados.
· Bloquear a ação de toxinas (Exemplo: Imunoglobulina contra o Tétano- a
sintomatologia do Tétano é devida à ação da toxina);

Voltando ao cerne do assunto que é as Vacinas.


Þ O que se pretende com uma Vacina? Ou seja, o que queremos de uma vacina?
Vários são os objetivos de uma vacina:
· Evitar a transmissão da doença;
· Evitar a infeção;
· Evitar a doença;
· Erradicar a doença;

PROPRIEDADES
Þ As Vacinas têm de ter uma ação eficaz, isto é:
· Têm de ter uma resposta adequada ao agente;
· Evitar respostas não adequadas como:
-Resposta apenas humoral à tuberculose quando o seu agente infecioso é intracelular;
-Resposta apenas celular à pneumonia que é uma infeção das mucosas onde os
anticorpos tem um papel fundamental no controlo da infeção;
-Anticorpos só no soro no caso de Poliomielite;
-Ativação da atividade citotóxica no caso da Hepatite porque em doente já infetados,
uma exacerbação da atividade citotóxica faz com que haja uma necrose do fígado com
morte do doente.
Þ A duração da Resposta deve ser longa
· Ou seja, queremos ter memória imunológica, isto é, queremos que a resposta
imunológica, quer em termos de anticorpos quer em termos de células T, seja
duradoura no tempo;

Þ A vacina deve ser segura:


· Deve ter poucos efeitos adversos;
· A vacina deve ser estável, ou seja, deve permitir o seu transporte e
administração de forma fácil;

Þ Custo
· Tem de ter um efeito benéfico em relação ao custo;

TIPOS DE VACINAS

Þ Vacinas Vivas atenuadas


-Nestas vacinas, a replicação do agente no hospedeiro humano está comprometida, são bons
agentes a induzir uma resposta imunológica mas não causam infeção.
-São normalmente:
· Mutantes sensíveis à temperatura;
· Não se replicam em nenhuma célula humana;
· Perdem o tropismo para o local onde habitualmente causam doença;
· Não conseguem escapar à resposta imunitária;
-Geralmente geram excelente resposta pois:
· Têm uma localização apropriada;
· A replicação ocorre in vivo (facilita a exposição combinada ao agente, o que
melhora a resposta imunitária);
-No entanto, têm alguns aspetos negativos:
· Em imunocomprometidos e grávidas;
· Há falhas na segurança, isto é, podem reverter para a forma mais virulenta
do agente;
· Têm maior susceptibilidade à temperatura (o que pode dificultar a
administração da vacina);

Þ Vacinas Inativadas
-O agente está na vacina, mas não vivo, ou então apenas temos algum componente microbiano;
-Dentro destas vacinas temos as vacinas Recombinantes (produzidas num vetor estranho ao
agente infecioso ou introduzimos no ser humano material genético do agente infecioso e os
antigénios são produzidos no ser humano) e as Vacinas Conjugadas (ligamos covalentemente
componentes do agente infecioso);

Þ Vacinas Completas Inativadas


-Há uma “inativação” do microrganismo, por exemplo pelo calor ou de forma química;
-Têm uma menor resposta imunogénica do que as ativadas, no entanto, a segurança pode ser
comprometida se o processo de ativação não for bem realizado.
VACINAS DE COMPONENTES MICROBIANOS

Þ Vacinas Toxoides
-São toxinas inativadas quimicamente ou geneticamente e faz com que as toxinas não sejam
toxicas, mas que mantenham a sua estrutura imunogénica permitindo-nos montar uma resposta
neutralizante dessa toxina.
-Exemplos: Vacinas da Difteria e do Tétano

Þ Polissacáridos Bacterianos
-São muito usados nas vacinas uma vez que, estirpes que produzem cápsulas pois a cápsula é o
alvo primário do nosso sistema imunológico;
-Exemplos: Vacinas Anti-pneumocócica (23-valente), para Haemophilus e para Meningococcos);
-No entanto,a anti-pneumocócica tem alguns problemas:
· Tem apenas 23 serotipos e existem ao todo mais de 100 serotipos diferentes;
· Os Polissacáridos são pouco imunogénicos;
· Ineficaz em crianças com menos de 2 anos (a sua imaturidade do sistema
imunilógico faz com que sejam incapazes de montar respostas contra
polissacáridos);
· Independente de células T (pouca memória);

Þ Ligação a uma proteína

Þ Poteínas Virais
-Exemplo: Hepatites Virais

Þ Vacinas de novas tecnologias


· Vacinas de RNA
· Vacinas de DNA
-Exemplo: Vacina Covid-19

Þ Adjuvantes
-Substâncias que aumentam a resposta imunitária;
-Exemplo: sais de alumínio;

VACINAS DIRECIONADAS A GRUPOS DE RISCO

Þ Vacinas do viajante
-Fazem vacinas contra uma doença com baixa incidência no país de origem mas com alta
incidência no país de destino;
-Exemplos: Hepatite A e B, febre tifóide, febre amarela, cólera...

Þ Vacinas da Grávida
-Exemplos: Vacina da gripe (influenza), vacina para Pneumococcos (23-valente seguida da 13-
valente) e Herpes zóster (protege contra a zona);

Þ Outros grupos
-Vacina da Hepatite a para:
· Homens que praticam sexo anal com outros homens;
· Candidatos a transplante hepático;
· Crianças sob terapêutica com fatores de coagulação derivados do plasma;
VACINAS DO PLANO NACIONAL DE VACINAÇÃO

-A BCG passou a deixar de ser recomendada de forma universal e passou para uma estratégia
de vacinação de grupos de risco apenas (junho de 2016);

-Alterações no plano nacional de Vacinação em 2020:


CONCEITOS ASSOCIADOS A VACINAS

· Imunidade de grupo: A imunidade de grupo é uma proteção extra ao impedir que


alguns microrganismos circulem entre as pessoas (por estarem vacinadas) e
evitando que algumas doenças se espalhem na comunidade, promovendo a sua
erradicação Para além disso a imunidade de grupo permite proteger alguns grupos
que não podem, em algumas situações, ser vacinados (grávidas, crianças que não
têm ainda idade para que lhes sejam administradas determinadas vacinas ou
doentes com o sistema imunitário enfraquecido, devido a algumas doenças).

Nota: A imunidade de grupo só se atinge com vacinas que consigam combater a infeção
assintomática;
Notas de Imunologia – Tronco
Comum II.a)
2021-2022
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Índice
Aula 1 – Perspetivas em Imunologia ............................................................................................. 2
Aula 2 – Apresentação de Antigénios por MHC ............................................................................ 8
Aula 3 – Ativação de Linfócitos T e homeostasia por MHC......................................................... 14
Aulas Pré-Gravadas 1 e 2 – Imunidade Inata .............................................................................. 24
Aula 4 – Imunidade Inata ............................................................................................................ 38
Aula 5 – Tolerância em Infeções ................................................................................................. 47
Aula Pré-Gravada 3 – Imunidade Celular .................................................................................... 51
Aula 6 – Imunidade Celular I ....................................................................................................... 67
Aula 7 – Imunidade Celular II ...................................................................................................... 75
Aula 8 – Imunidade das Mucosas................................................................................................ 82
Aula 9 – Imunidade Humoral ...................................................................................................... 95
Aula 10 – Imunosenescência ..................................................................................................... 106
Aula Pré-Gravada 4 – Tolerância Imunitária ............................................................................. 122
Aula 11 – Tolerância Imunitária ................................................................................................ 131
Aula 12 – Imunodeficiências Primárias ..................................................................................... 137
Aula 13 – Imunopatogénese da Infeção VIH ............................................................................. 144
Aula Pré-Gravada 5 - Vacinas .................................................................................................... 151
Aula 14 - Vacinas ....................................................................................................................... 160

Agradecimentos

Às minhas companheiras nesta


aventura, que nunca me deixam
desacompanhado!

P á g i n a 1 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula 1 – Perspetivas em Imunologia


Data Docente
01/10/2021 Prof. Doutor Luís Graça

Resposta imune a infeções virais

A reposta imune a infeções virais (mas também bacterianas) pode ser dividida em duas fases:
• Fase inicial, de imunidade inata, através de componentes pré-formados, que não vão
gerar memória imunitária, e que não são específicos para um determinado agente
infecioso;
• 2ª Fase, de imunidade adquirida (adaptativa), dependente de linfócitos T e B, que são
os mecanismos específicos para aquele agente infecioso. Dentro da imunidade
adquirida vamos ter a colaboração entre linfócitos T e B. De forma simplista, os linfócitos
T vão matar as células infetadas, através da imunidade celular e da citotoxicidade,
enquanto os linfócitos B vão produzir anticorpos, que por exemplo, no caso dos vírus,
têm o papel de os neutralizar, impedindo a infeção de novas células. No caso das
bactérias os anticorpos facilitam a fagocitose e a eliminação das mesmas.

Resposta imune a infeção com SARS-Cov-2

A resposta imune a infeção com SARS-Cov-2 não é em nada diferente à de qualquer outro agente
infecioso. Um exemplo de um dos primeiros casos descritos de uma paciente com COVID-19
mostrou que ao fim de alguns dias começou a ter Antibody Secreting Cells (ASC, células B que
produzem anticorpos) e células T aumentadas, que estão envolvidas neste processo, e também
células citotóxicas em números aumentados. Note-se que este aumento começa a partir do 7º
dia, dia em que há também melhoras da paciente ao nível clínico, havendo alguns dias depois
uma quebra no número de células existentes. Verifica-se assim que o sistema imunitário vai-se
ligar, expandir e depois vai haver um declínio.

A produção de anticorpos também é bem conhecida. Após a infeção ocorre uma produção de
IgM, seguida de uma produção de IgG (que têm a capacidade de neutralizar o vírus), que depois
vão decair ao longo do tempo, podendo esse tempo de decaimento maior ou menor, e nunca
significando que existe perda da proteção imunitária

Hematopoiese

O sistema imunitário depende de células que provêm do sistema hematopoiético. Na medula


óssea vamos ter a formação de células que vão dar origem aos diferentes componentes do
sistema imunitário. Dentro do sistema imunitário existe a particularidade de as células T,
acabarem a sua maturação no timo, onde existe um papel muito importante na seleção de
células T que vai eliminar aquelas que são autoreativas.

Órgãos do sistema imunitário

O sistema imunitário tem a particularidade de ter vários componentes dispersos por todo o
organismo. Temos células em circulação, mas grande parte da ativação das células ocorre em
órgãos linfoides secundários (baço, amígdalas, gânglios linfáticos), onde existe uma densidade
muito grande de linfócitos de especificidades diferentes, e que funcionam de uma forma

P á g i n a 2 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

expedita para selecionar aqueles linfócitos que são importantes para a resposta imunitária
adequada para um dado microrganismo infetante.

Imunidade inata / Como a imunidade inata identifica ou seus alvos?

Estruturas Anatómicas: - Anatomia: interior vs exterior


• Barreiras epiteliais;
• Muco e péptidos antibacterianos localmente produzidos;
• Cílios (vias respiratórias);
• Fluxo de urina.

Células: - Recetores para padrões de patogéneos (PRR)


• Neutrófilos;
• Macrófagos;
• Eosinófilos;
• Células Natural Killer (NK) – Recetores para MHC do próprio;
• Células T.

Fatores Solúveis:
• Sistema do Complemento – Proteínas reguladoras do complemento;
• Citocinas – IFN – Produzidos por células que respondem a PRR.

Que acontece quando uma bactéria entra no organismo?

Na transição entre imunidade inata e adquirida, existe a necessidade do uso de células


dendríticas para a ativação da imunidade adquirida. Estas capturam antigénios da imunidade
inata e transportam-nos para os gânglios linfáticos onde vão ativar os mecanismos da imunidade
adquirida. Esta imunidade adquirida é aquilo que nos vai dar a especificidade e a memória.

Imunidade adquirida

Está dependente de células T e B, que são as que apresentam recetores (TCR e BCR) que têm
grande especificidade que deriva de uma enorme diversidade e seleção das células para um
dado microrganismo.

P á g i n a 3 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Células Dendríticas: A ponte entre imunidade inata e adquirida

Para haver ativação das células B e T, é necessário existirem células dendríticas, que fazem a
ponte entre o local de infeção e os gânglios linfáticos onde o processo de ativação da imunidade
adquirida acontece, visto que é necessário selecionar as raras células T e B que são específicas
para aqueles antigénios e que se encontram no aglomerado de células localizado nos órgãos
linfoides secundários.

Ativação de linfócitos CD4: a célula dendrítica seleciona o tipo de resposta

A célula dendrítica vai ativar linfócitos e


selecionar o tipo de resposta mais
adequada aqueles linfócitos. Pode existir
por exemplo um tipo de células CD4 mais
específico para fungos ou para parasitas.

Mecanismos efetores da resposta adquirida


• Células B – Anticorpos;
• Células T CD8+ - Citotoxicidade;
• Células T CD4+ - Ação noutras populações de células:
o Tfh – Regulam células B e produção de anticorpos;
o Th1, Th2, Th17 – libertam citocinas com ação em células do sistema imune
inato;
o Treg – regulam a resposta imunitária impedindo autoimunidade.

Linfócitos B reconhecem o antigénio inteiro (superfície); Anticorpos têm diferentes funções

P á g i n a 4 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Por reconhecerem o antigénio inteiro, os anticorpos produzidos pelos linfócitos B, produzidos à


semelhança dos seus recetores, vão ser dirigidos à superfície dos antigénios. Assim os linfócitos
B reconhecem diretamente os antigénios.

Linfócitos T reconhecem fragmentos de proteínas

Tfh cell

Tfh

Os linfócitos T não reconhecem nada na superfície de microrganismos. Só reconhecem


fragmentos de proteínas, apresentados por células apresentadoras de antigénio. Assim os
linfócitos T nunca são capazes de interagir diretamente com o microrganismo

Seleção clonal

Existem muitas células imunitárias, e sempre com especificidades diferentes. Quando existe
necessidade reação do organismo, apenas são amplificadas aquelas cuja especificidade é a
correta face ao invasor.

P á g i n a 5 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Fases da resposta imunitária

Uma resposta imunitária pode ser dividida em várias fases, em que há um reconhecimento do
antigénio, que conduz à expansão clonal, das células específicas para o antigénio. Isto vai
conduzir à formação de células efetoras que vão conduzir (se tudo correr bem) à eliminação do
microrganismo que induziu a resposta imunitária. Segue-se uma fase de contração em que
devido à não presença de estímulo, vai haver uma morte por apoptose de um grande número
destas células que foram produzidas na resposta imunitária. Permanecem células com memória
imunitária, com capacidade de resposta em caso de reexposição ao mesmo antigénio.

Especificidade e memória

A reexposição é habitualmente designada como resposta secundária. Nessa existe uma resposta
de maior intensidade e mais rápida, devido à presença de um número maior de células

P á g i n a 6 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

específicas à partida e da existência de células de memória que podem tornar-se em células


efetoras muito depressa.

Mecanismo de ação

Na presença de um agente patogénico, são ativadas tanto células dendríticas apresentadoras de


antigénio, que por sua vez ativam os linfócitos T, como células B.
As células B internalizam o agente patogénico (total ou parte) através de uma fagocitose
especifica (é mediada por recetores específicos à superfície das células B) e processam os
respetivos antigénios no seu interior.
Daí, as células B passam a expor esses antigénios à sua superfície apresentando-os por
intermédio das moléculas de MHC às células T. Esta interação induz a produção de anticorpos
de alta afinidade por parte das células B.
A rede de células envolvidas nesta cascata de ativação forma os chamados centros germinativos.

Hipersensibilidade – pode ser imediata (tipo I, II ou III) ou retardada (IV). O tipo I depende da
produção de IgE e induz um choque anafilático imediato quando há contacto direto com um
alergénio. O tipo II e III dependem de IgG; no tipo III é comum formarem-se complexos imunes
que depositam (ex: reações medicamentosas, glomerolofolite aguda).

Resumo:
• O sistema imunitário protege o organismo contra patogénios;
• Imunidade inata, disponível de imediato e tem com base mediadores não específicos;
• Imunidade adquirida, requer ativação e baseia-se em seleção clonal, que permite
especificidade e memória.

O ser humano teve de evoluir o sistema imunitário, para combater microrganismos que têm
ciclos de vida curtos e com alta capacidade para adquirirem mutações, num organismo que não
tem a mesma capacidade de se modificar. A solução para a eficácia da imunidade é a
diversidade. Essa diversidade é alcançada através dos processos de recombinação genética que
são efetuados aquando da criação dos recetores das células B e T (recombinação VDJ). Esta
capacidade do ser humano causa um inconveniente: pequenas diferenças em relação à nossa
própria composição, como por exemplo, na transplantação, são identificadas e conduzem à
rejeição.

P á g i n a 7 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula 2 – Apresentação de Antigénios por MHC


Data Docente
01/10/2021 Profª. Doutora Ana Berta Sousa

MHC: Genes, Proteínas e Biologia Celular

As moléculas do Complexo Major de Histocompatibilidade (MHC) são fundamentais para que as


células T possam ter função. Na realidade estas não foram sempre conhecidas por isso, tendo
sido primeiro identificadas como os principais antigénios reconhecidos nas reações de rejeição
aos transplantes.

Nos anos 70 do Século XX, foi quando se começou


a perceber a função do MHC.
Numa experiência para perceber a função do
MHC, injetou-se um ratinho de uma estirpe A, que
foi infetado com o vírus da coriomeningite
linfocítica, de forma a produzir células T
citotóxicas específicas que combatessem esse
vírus. Por outro lado, vamos ter células infetadas
com o mesmo vírus, de ratinhos da estirpe A e de
outra estirpe, B. Se colocarmos em presença das
células T citotóxicas uma célula infetada da
estirpe A, vai haver reconhecimento e destruição
da célula alvo. Já no caso de células da estirpe A
não infetadas e de células da estirpe B infetadas,
não ocorre reconhecimento e destruição. Isto
significa que o nosso sistema imunitário, e no que
diz respeito às células T, só é capaz de
desempenhar a sua função no contexto do self.
São as moléculas do MHC que medeiam esta
limitação.

Ao contrário do Anticorpo/BCR, o TCR não reconhece o antigénio na forma nativa. O TCR


reconhece pequenos péptidos (resultantes do processamento do antigénio pela maquinaria
celular) apresentados na superfície celular por moléculas MHC. O TCR reconhece o conjunto
péptido-MHC.

Existem dois tipos de moléculas MHC: Classe


I e II:
• As moléculas MHC Classe I são
compostas por uma cadeia  e 2m
(Beta 2 Microglobulina);
• As moléculas MHC Classe II são
constituídas por uma cadeia  e uma
cadeia ;

P á g i n a 8 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Estas partilham uma estrutura tridimensional semelhante (visto que esta serve o propósito da
apresentação de antigénio) apesar dos diferentes genes e cadeias peptídicas que as formam. No
entanto, do ponto de vista da sua formação, elas são distintas. Tanto MHC I como II são
glicoproteínas de membrana, tendo uma porção transmembranar. No MHC I existe apenas uma
ancoragem à membrana, feita pela cadeia , enquanto que, na MHC II existem duas, uma feita
pela cadeia  e outra pela cadeia . Em MHC I, a cadeia  vai ter três domínios (1, 2, 3), sendo
a 2m um domínio de suporte. Na MHC II vamos ter duas cadeias, codificadas por dois genes,
cada uma com dois domínios (1, 2, 1, 2). Em qualquer uma das duas vamos ter, dois domínios
mais próximos da membrana (de suporte), e dois domínios mais afastados da membrana, que
são responsáveis pela apresentação do antigénio. Nestes dois últimos, vamos ter duas hélices 
antiparalelas e uma folha  que desenham no seu conjunto um fosso, que serve de região de
ligação ao péptido. Em MHC I a região de ligação ao péptido é composta por 1 e 2, enquanto
que, em MHC II a região de ligação ao péptido é composta por 1 e 1.
O MHC I apresenta as extremidades da região de ligação ao péptido fechadas, o que leva a que
nessa região não consigam caber péptidos maiores que 8-10 aminoácidos, e os mais pequenos
não se conseguem ligar, visto que a ancoragem é feita nas extremidades. Normalmente são
péptidos com uma região carboxi terminal, hidrofóbica ou básica.
No MHC II, as extremidades da região de ligação ao péptido são abertas, permitindo a ligação
de péptidos mais compridos (a partir de 13 aminoácidos até 18-25) porque o péptido pode ficar
a tombar de cada lado da zona de ligação. Os pontos de ancoragem estão mais a meio da região
de ligação ao péptido.

MHC I

As moléculas de MHC I apresentam antigénios de origem intracelular (citoplasma). O que


acontece é que as proteínas intracelulares quando já não são necessárias são naturalmente
marcadas por ubiquitinação para serem degradadas no proteossoma (é no core 20S que se
encontram as subunidades beta, principais responsáveis pela atividade proteolítica).

Depois, os transportadores TAP 1 e 2 são responsáveis por transportar os péptidos resultantes


do citosol para o reticulo endoplasmático, num processo dependente de energia. A molécula
MHC I também é transportada intracelularmente por chaperones para o reticulo
endoplasmático, onde se vai complexar com um dos péptidos. Depois através do complexo de
Golgi, o conjunto MHC + péptido é translocado até à superfície da célula – funciona como um
bilhete de identidade de cada célula.

P á g i n a 9 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

A conjugação do péptido com a molécula


de MHC I é mediada por várias
chaperones: a calnexina une as
subunidades alfa e beta do MHC,
estabilizando-a enquanto esta não está
ligada ao péptido; depois liga-se a
tapasina que coloca em proximidade o
antigénio com o MHC até que, por
ligações estáveis, se forma o complexo.
Quando ocorre a ligação, o complexo
torna-se estável e as chaperones são
libertadas, permitindo que o complexo
migre para a superfície celular.

Normalmente os MHC I estão ocupados com péptidos do self, sendo reconhecidos pelas
restantes células como estando tudo normal.

Se a célula for infetada por um vírus ou estiver num processo de carcinogénese, os péptidos
apresentados passam a ser reconhecidos como citotóxicos, pelo que as células passam a ser
marcadas para destruição (tornam-se um alvo do sistema imune).

Muitas vezes o problema das infeções virais, é que os vírus para sobreviverem no hospedeiro
passam a produzir proteínas especificas para comprometer a defesa imunitária anti-viral do
hospedeiro (inativam o proteossoma, os transportadores TAP, etc).

MHC II

Apresenta antigénios extracelulares (exógenos) que entram


na célula por endocitose/fagocitose e passam a encontrar-se
dentro de endossomas (early, late), local onde se dá a sua
degradação.

Paralelamente o MHC II segue pelo complexo de golgi para


endossomas também, ficando ligado a uma cadeia invariável
que bloqueia o local de ligação e lhe confere estabilidade;
depois acaba por se fundir com o endossoma que tem os
péptidos exógenos e, com recurso a chaperones, a cadeia
invariável é removida para que o péptido se possa ligar.

P á g i n a 10 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

A cadeia variável funciona como um trígono que bloqueia simultaneamente 3 moléculas MHC
II; quando é clivada fica apenas um clip em cada local de ligação que é então posteriormente
removido por chaperones especificas.

A síntese endógena de um antigénio estranho/exógeno por meio de uma transfeção faz com
que a apresentação do antigénio seja reconhecida por MHC I em vez de MHC II. O mesmo
acontece se houver a introdução artificial desse antigénio exógeno no interior da célula (ex:
choque osmótico). Apenas se o antigénio exógeno entrar na célula por endocitose/fagocitose é
que é encaminhado para a vida do MHC II.

Os recetores presentes nas células T definem a polarização em células CD4 ou CD 8 conforme o


sistema MHC com o qual interagem – este fenómeno de restrição determina o tipo de ativação.

• CD 8 liga-se ao domínio alfa-3 da cadeia alfa do MHC I


• CD 4 liga-se ao domínio beta-2 da cadeia beta do MHC II
As células CD 8 são citotóxicas, então reconhecem células infetadas por agentes citosólicos (ex:
vírus) e que passam a expressar péptidos anormais e patogénicos à superfície. Por outro lado,
as células CD 4 não destroem células alvo, mas reconhecem os péptidos apresentados pelo MHC
II na superfície das células apresentadoras de antigénio (APC) – células dendríticas, macrófagos,
etc – e ativam uma cascata imune em resposta àquele antigénio.
P á g i n a 11 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

O MHC I está na superfície de todas as células nucleadas, enquanto o MHC II só se encontra na


superfície de células especializadas na apresentação de antigénios.

Existem cerca de 200 genes responsáveis pela codificação do MHC. Estes encontram-se numa
região com aproximadamente 4 mb presente no cromossoma 6. Os eventos de crossing over
nesta região não são frequentes, normalmente herdamos um haplótipo da mãe e outro do pai
que não se misturam em eventos meióticos.

Podem ser distinguidas 3 regiões: I, II e III

• I – encontram-se 3 genes (A, B e C) que codificam para as cadeias alfa do MHC I


• II – encontram-se 3 genes (DP, DQ e DR) que codificam as cadeias alfa e beta do MHC II

Além dos genes que codificam para cadeias, estas regiões codificam também os transportadores
TAP 1 e 2, assim como algumas subunidades do proteossoma como a LMP2 e LMP7 que o tornam
mais específico nos eventos proteolíticos.

P á g i n a 12 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Todas as células B e T partem de um conjunto finito de genes, mas devido à existência de


recombinação somática, é possível gerar combinações quase infinitas. Isto não acontece no
MHC; não há recombinação, mas existem poligenes e polimorfismos (existem centenas de
alelos diferentes para os genes A, B e C na população); para além disso, a expressão do MHC
representa um caso de codominância (ou seja, cada pessoa expressa 6 genes para cada MHC).
Tudo isto é responsável pela imensa variabilidade na expressão do MHC.

Na verdade, o sistema do MHC é o mais polimórfico que existe – é o que tem mais alelos, maior
divergência entre eles e elevada redundância do código genético (codificado por múltiplas
combinações possíveis de aminoácidos).

As posições hipervariáveis do MHC interagem com o péptido e, se olharmos para o grau de


variabilidade, percebemos que este é efetivamente maior no local de ligação dos péptidos –
assim, conclui-se que diferentes regiões de ligação do MHC ligam-se a diferentes péptidos e
conduzem a diferentes constrangimentos. Isto conduz à existência de diferentes repertórios de
péptidos com implicações funcionais pela existência de diferentes binding grooves; ou seja, ao
haver maior sampling antigénico permite que a população sobreviva a variadas infeções que
possam existir porque existem sempre alguns indivíduos que vão expressar um tipo de MHC
adequado ao patogénio corrente – este é um mecanismo de sobrevivência.

P á g i n a 13 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula 3 – Ativação de Linfócitos T e homeostasia por MHC


Data Docente
04/10/2021 Prof. Doutor Bruno Silva Santos

Quando uma célula T e uma célula


ATC se encontram, existem moléculas que
vão resultar na ativação de um linfócito T,
o que vai depender dos sinais que ativam
estas células T se sobreporem aos sinais
que a tentam inibir. Por outro lado, vai ser
importante inibir as células T para evitar
reações de autoimunidade e inflamação
crónica, sendo que para isso temos um
macanismos de autorregulação do
linfócito T, no qual há sinais negativos (a
vermelho) que tentam controlar os sinais
positivos (verde). É necessário entender a função das moléculas do quadrado amarelo.

É necessário e crítico ativar um linfócito T, pois estes vivem num estado de repouso e
apenas se o antigénio para o qual o seu recetor, o seu TCR específico, entrar no nosso
organismos é que este linfócito necessita de se diferenciar para desenvolver resposta imunitária
celular. Temos duas respostas de linfócitos, os linfócitos T que se transformam em células
efectoras CD4 e CD8, e os linfócitos B que produzem anticorpos e são responsáveis pela unidade
humoral. Em ambos os casos as células encontram-se à partida em proporções ínfimas na nossa
circulação, sendo necessário ativá-las para que se formem colones que possam combater o

P á g i n a 14 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

antigénio. No fim da resposta ao antigénio irão sobreviver as células de memória que irão
garantir uma maior eficácia na reexposição ao mesmo antigénio, caso este entre no nosso
organismo.

Um célula B ou T isoladas não são suficientes para combater um microrganismo, pelo


que é necessário multiplicá-las. É ainda necessário selecionar de entre o dez mil milhões de
linfócitos B e T do nosso organismo, aqueles que são capazes de responder a um dado
microrganismo ou ao antigénio desse microrganismo. Chamamo seleção colonal à expansão de
cada célula específica formando milhares de células idênticas, todas específicas para o antigénio.
Para que isto aconteça é necessário que as células sejam ativadas.

A ativação das células T é o início da resposta imune adaptativa, não inata. As células
dendríticas fazem a ponte entre o agente infecioso e a ativação dos linfócitos T e da resposta
adaptativa como um todo. As células T são importantes para ajudar os linfócitos B a produzir
anticorpos e por isso são as maestras da resposta adaptativa. A célula dendrítica fagocita o
patogénio e apresenta os antigénios do mesmo às células T naïve, que irão estar num órgão
linfoide secundário. Estas células naïve específicas para o antigénio, vão ser ativadas e formar
colones. Nesta reação existem vários recetores envolvidos, nomeadamente o TCR, que tem de
ser ativado ligando-se a algo para “acordar” a célula T.

Em 2011, o prémio nobel da fisiologia por Beutler e Hoggman, descobriram o TLR4


expresso à superfície da célula dendrítica, que tem a capacidade de detetar padrões moleculares
dos patogénicos que vão ativar a célula dendrítica e por sua vez esta fagocita o agente
patogénio.

P á g i n a 15 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Após fagocitar o patogénio a célula processa-o e expressa os antigénios do mesmo


(MHC) à superfície de modo a interagir com as células T (TCR) e ativá-las. A esta ligação
chamamos sinal 1 de ativação da célula T, no entanto, este sinal ocorre ao mesmo tempo que o
sinal 2 para poder desencadear a ativação. O sinal 2 engloba o recetor CD28 que também
encontra o seu ligando à superfície da célula dendrítica depois de ativada, o B7-1/B7-2 ou
CD80/CD86.

O MHC vai fornecer o péptido


bacteriano à célula T e apresenta duas classes
que correspondem aos dois tipos de recetores
dos linfócitos T, CD4 e CD8, sendo a classe I
correspondente aos CD8 e a classe II aos CD4.
Como mnemónica, para não se esquecerem, o
produto dá semore sempre 8 e portanto 4 × 2=8,
8x1=8. A classe I e a classe II são tão importantes
porque vão apresentar péptidos de origem
diferente, ou seja, ou de origem intracelular,
como um vírus que vive no citoplasma
intracelular, ou de origem extracelular, de algo
que é capturado com uma bactéria, que vai ser
então apresentado na classe II. O MHC de classe
I mostra então tipicamente péptidos derivados de proteínas citosólicas virais ou tumorais,
enquanto o MHC classe II mostra à superfície péptidos derivados da via que é endocitada dum
patogénio extracelular. Portanto temos duas vias complementares que ativam células T que
também são elas complementares, porque as CD8 vão matar a célula infetada, enquanto as CD4
vão ajudar as outras células do sistema imunitário a responderem ao tal patogénio que é
extracelular. Assim, não interessa matar a célula infetada, não há uma célula infetada por si, o
patogénio vive fora das células, mas é preciso ativar as células do sistema imunitário que sabem
P á g i n a 16 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

lidar com patogénicos extracelulares, nomeadamente elas próprias capazes de os fagocitarem


e destruírem no seu interior como os macrófagos e os neutrófilos. Isto é diferente então do
vírus, que infecta as células do nosso organismo como o epitélio pulmonar, e que a única forma
de eliminarmos o vírus é sacrificarmos as células epiteliais, que são o reservatório onde o vírus
se vai reproduzir. Portanto, estas duas respostas imunitárias de células T, altamente
complementares, assentam em vias de MHC distintas. Esta correspondência, CD4-classeII e CD8-
classeI, surge desde que as células t são geradas no Timo, pois é no próprio timo que o TCR cada
célula T é testado para a sua afinidade para classe I ou classe II. Para uma célula CD4 ser
selecionada, isto é, para sair do timo para a periferia para popular o nosso organismo, o seu TCR
tem de reconhecer eficazmente a molécula de MHC classe II, esta interação tem de ser produtiva
e esse TCR e respetiva célula T é selecionada. O mesmo acontece para as células CD8, mas o
MHC classe II. Portanto, é o teste de correspondência TCR da célula t com classe I e classe II que
gera a diferenciação da célula em célula CD4 ou CD8, dependendo de qual a molécula MHC
classe I ou classe II, ou qual um dado TCR interage mais eficazmente.

Vai existir uma célula dendrítica que vai apresentar péptidos derivados de um dado
patogénio, quer no complexo classe I, quer no complexo classe II. Por ter os dois MHC’s a célula
dendrítica, ao contrário da maior parte das células do nosso organismo, que só expressam MHC
classe I, a célula dendrítica consegue apresentar os antigénios muito eficazmente nos dois
complexos de MHC a todas as células T, Cd8 e CD4.

P á g i n a 17 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Quando existe uma ligação do TCR, e este é o sinal um, quer dizer que esta ligação do
TCR à superfície vai ter de transmitir um sinal de
intracelular, que em último caso, resulta na
alteração da expressão génica. Uma vez que uma
célula só faz uma coisa diferente, como passar
proliferar ou passar a secretar uma citocina, ou
um veneno para matar outra célula se os
respetivos genes, que codificam então as
proteínas que regulam ou a citotoxicidade, ou as
próprias citosinas, ou ciclo celular, se essas
proteínas porem a de facto expressas. Tudo
começa com a expressão génica no núcleo, e por
isso é ao núcleo que este sinal vai ter que chegar.
Existem vias de sinalização que existir um factor
de crescimento, existem muitas reações
associadas à fosforilação, como as cinases que
vão fosforilar intermediários intracelulares e tudo tem de convergir em fatores de transcrição,
que são os que conseguem regular a expressão gênica, muitas vezes com segundos mensageiros
envolvidos, como por exemplo, cálcio, que é um importante mediador intracelular e pode ser
libertado para ativar proteínas sensíveis à causa.

Na célula T em vez de
termos um factor de crescimento
propriamente dito, temos um
receptor, o TCR, que vai ditar a
ativação da célula T, sendo
primeiro sinal. Este primeiro
sinal, é crítico e por isso sem a
ativação do TCR, podem lá estar
os outros sinais todos, que nada
acontece. Portanto, o sinal 1 é
absolutamente necessário para
que a célula T acorde, ou seja, é
absolutamente necessário e que haja um peptídeo específico para aquele TCR a ser apresentado
e que esse TCR se ligue ao péptido e ao MHC que o apresenta. O TCR é ativado, e inicia a cascata
de fosforilação necessária. A caixas representadas na figura a cor-de-rosa, ITAMs
(Immunoreceptor tyrosine-based activation motif), são segmentos de aminoácidos que são
dominados pelo aminoácido tirosina e que estão presentes em muitos imunoreceptores,
incluindo TCR, com função de ativar a célula T ou outros células imunitárias. No entanto não é
no TCR propriamente dito que estão os ITAMs, estes estão noutras moléculas chamadas CD3
(verde), que estão acopladas ao TCR e vão formar o chamado complexo TCR. Quando se refere
ao TCR, nunca são as cadeias alfa e beta sozinhas porque sozinhas servem apenas para ligar o
péptido MHC, mas não servem para ativar a célula T, uma vez que não têm praticamente cadeia
do lado intracelular. É necessário então que do lado intracelular haja capacidade de sinalização,
que é feita pelas moléculas CD3 que têm várias subunidades, sendo a zetta a mais importante
por ter mais ITAMs. São então as moléculas com os ITAMs que vão ativar a célula T uma vez que
a alteração conformacional do TCR efetua do lado extracelular, é transmitida por causa das
P á g i n a 18 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

moléculas CD3 estarem acopladas. Este complexo todo muda a sua conformação e permite que
as cadeias intercelulares onde estão os ITAMs iniciem a cascata de sinalização.

Existem grupos fosfatos a serem adicionados e trocados entre os vários intermediários


da cascata de sinalização sendo os ITAMs no CD3 que vão permitir que o sinal do TCR siga uma
via intracelular resultante na ativação dos genes alvo no núcleo. Ao nível do núcleo, temos três
fatores de transcrição. É importante perceber que vias intracelulares são ativadas e o papel das
moléculas CD3 para iniciar a cascata. Existem vias como as MAP cinapses, a via do diacilglicerol,
a via que ativa a libertação do cálcio intracelular, sendo um exemplo em particular a forma como
a ativação desta via do cálcio vai levar à ativação da calcineurina. A calcineurina é um alvo
médico muito importante, pois é o alvo de uma molécula essencial que é usada em
transplantação e no tratamento de doenças crónicas inflamatórias, como artrite reumatoide, a
psoríase ou a doença de Crohn, a ciclosporina. Esta é uma molécula com capacidade de inibir os
linfócitos T, sendo o que se pretende quando eles estão sobre ativados em doenças
inflamatórias ou durante a transplantação em que não se pretende medeiem a rejeição do órgão
que é transplantado. Uma forma de impedir que esta cascata de ativação que acorda a célula T
se mantenha ativa e, com isso, conseguir parar as células T é usar ciclosporina, uma vez que é
um inibidor competitivo da calcineurina, impede que a calcineurina seja ativada, e que ative o
factor de transcrição NFAT. Assim, de todas as vias, se houver uma bloqueada é suficiente para
diminuirmos a sobreativação das células T, embora continuem a existir células T parcialmente
ativadas pelas vias alternativas.

O TCR não está sozinho na célula T e na sua interação com a com a célula apresentadora
de antigénio. Quando a antigénio é apresentado aparece uma molécula que é a fosfotirosina
que vai efetuar a fosforilação daqueles resíduos de tirosina que caracterizam os ITAMs. Assim,
quando antigénio é apresentado as tirosinas apresentam-se muito fosforiladas, o que não
aconteceria se não houvesse antigénico, sendo, por isso uma interação específica que depende
do antigénio surgir ou não surgir no evento de fosforilação na chamada sinapse imunológica.

P á g i n a 19 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

A sinapse imunológica é o contacto entre as duas células


que do ponto de vista, designado por SMAC (Supraolecular
Activation Cluster), porque tem várias moléculas organizadas,
estando o TCR com os seus CD3, CD4 e CD8, com receptores e o
CD28 na zona central do SMAC. Numa zona mais a periférica
encontra-se a LFA-1 e por fim, na zona mais distal encontra-se o
CD45.

Relativamente ao LFA-1
é muito fácil de entender o seu
papel, porque é uma integrina,
e o que ela faz é funcionar
como um agrafo entre as duas
células, para estabilizar a
interação entre a célula T e a
célula dendrítica e permitir que
todos os outros recetores e
ligandos se possam encontrar e
iniciar as cascatas de
fosforilação necessárias. Nomeadamente, o recetor de células T (vermelho) interage com o MHC
classe II a apresentar um péptido, e esta interação, vai ser estabilizada pelo facto do LFA-1
encontrar o seu ligando e se agravar ao seu ligando, estabilizando esta interação entre as duas
células. Sem esta interação LFA-1 com o ICAM-1 a interação do TCR com o MHC é demasiado
curta e, por isso, não é possível gerar todos os sinais intracelulares que são necessários para
ativar a célula T.

Por ser tão importante esta interação entre o LFA-1 e o ICAM então é o alvo molecular
de outra molécula usada na clínica, chamada efalizumab. Em doenças crónicas, se quer atenuar
a resposta dos linfócitos T utiliza-se o efalizumab como um meio de impedir que as células t
estejam sobre ativadas, inibindo a sua interação com as células APC e por isso o processo de
ativação.

P á g i n a 20 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Mais uma vez temos o TCR a interagir com o seu complexo MHC, que está a apresentar
um péptido, mas se o CD28 não estiver ligado a algum recetor da APC para ativar a sua própria
via intracelular, a célula T não responde. Então é necessário que a surja um segundo sinal, os
ligandos do CD28, que são a família B7, e esse sinal vai permitir esta ligação adicional, e uma
cascata de fosforilação adicional. Assim, o TCR gera um sinal e o CD28 já era outro sinal, sendo
ambos a superfície da Célula T, e a sinergia das duas cascatas vão levar à ativação cabal dos
genes alvo, em particular de um gene muito importante, a Interleucina 2. Para que o CD28
encontre o seu ligando é necessário que a própria APC seja ativada reconhecendo os tais
padrões moleculares dos micróbios e passa a expressar níveis muito elevados dos ligandos da
família B7. Existe assim uma espécie de estafeta, sendo a APC ativada por aqueles recetores
padrão levando à expressão de sinais para ativar a Célula T e por isso a ativação imunitária é
esta cascata de ativações que intracelularmente corresponde a vias de sinalização baseadas na
fosforilação. Assim, após o sinal um, TCR, ocorre o sinal 2, CD28 e depois a célula teve prolifera,
diferenciando-se e formando células efetoras e mais tarde células de memória, que vão
controlar a infeção.

CD 28 é um recetor que só as células t expressam. Portanto, tal como TCR é específico


de células t, este co-receptor, muito importante para ativação das células T também só é
expresso em células t CD 28. A sua importância conhece-se pois, há cerca de 30 anos atrás, foram
gerados ratinhos knockout depletados geneticamente para a molécula CD28 tendo levado a um
profundo defeito, quer na ativação das células t quer na memória das células t, o que resultou
numa redução em cerca de 70% das células T CD8. O resultado da experiência é de que o ratinho
com o gene deletado acaba por morrer da infeção e enquanto o controlo sobrevive. Assim, o
CD28 é crítico, e por isso, é importante incluir no design de uma vacina a capacidade de
desencadear o segundo sinal que vai levar a ativação das células T, sendo que uma boa vacina
deve levar à sobre expressão dos tais ligantes do CD28, o CD80 e o CD86.

P á g i n a 21 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

O gene da interleucina 2 numa célula em


repouso, à partida, não está a ser expresso, sendo
este o casso de 99% das células do nosso corpo.
Quando vem a ativação do TCR, surgem fatores de
transcrição no promotor do gene interleucina 2, que
induzem na célula passar a este gene, passando a
exister mRNA e proteína. No entanto, a sua
quantidade é demasiado pequena para garantir a
proliferação da célula T, sendo apenas aquando da
co-extimulação, ou seja, um CD28 sinaliza para
dentro da célula T, é que se libertam todos os fatores de transcrição que irão chegar ao núcleo
ativados de modo a gerir a expressão génica da interleucina 2. Neste caso, temos 100 vezes mais
interleucina 2 do que no caso de apenas ter o TCR a ser estimulado e é com estes 100 vezes mais
de interleucina 2 e as células T proliferam. Isto acontece porque interleucina 2 é o fator de
crescimento dos Linfócitos T.

Assim, na verdade, não temos dois mas sim


três sinais para ativação da célula T, uma vez que
os dois primeiros sinais induzem à produção de
Interleucina 2, que vai ser no fundo o sinal 3.
Terceiro sinal porque é interleucina 2, que faz todo
o feedback positivo sobre o clone que está em
proliferação, para que ele se torne um clone tão
grande como termos 1000000 de células
específicas para um dado vírus no nosso
organismo. Ainda, a interleucina como terceiro
sinal, está dependente dos dois primeiros sinais
para ocorrer, pois a célula T não sabe fazer IL-2 por
si se não for ativada, e precisa de receber os sinais
que vêm da célula dendrítica na presença de um
patogénico. Tudo isto só é assim, porque dentro da
célula há vias de sinalização diferentes, com sinais
diferentes, com fosforilações diferentes e que irão
convergir com os seu diferentes fatores de transcrição de modo a levar à expressão do gene da
IL-2.

A rapamicina, também conhecida por sirolimus, é um imunossupressor usado em


situações em que se quer inibir as células T. É importante falar em inibir a ativação das células T
pois esta é bastante forte e existem situações em que o excesso de imflamação pode matar o
hospedeiro, sendo por isso, necessário controlá-la com recetores do sistema imunitário que
inibem o artificialmente na medicina, usando drogas que conseguem inibir as vias de ativação.

Assim, integrando a ciclosporina e a Rapamicina, que tem têm alvos moleculares


distintos. A ciclosporina liga-se a calcineurina na via do TCR e a rapamicina liga-se ao M-Tor na
via que é ativada pelo CD28 e pelo receptor da IL-2. Existem assim dois alvos moleculares
distintios, que ao serem inibidos por estas drogas, vão apaziguar as células T.

Naturalmente, o sistema imunitário tem mecanismos de autorregulação são os


receptores CTLA-4 e pPD-1, que em vez de ativarem as células T, as inibem. No contexto da
infeção são os receptores que levam a que a reação imunológica seja controlada, ou seja, depois
P á g i n a 22 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

de muita expansão de células T, e de muita reação antimicrobiana, haja um controlo desta


reação para não levar então a efeitos secundários, podem até destruir o organismo. Conehce-
se a potência destes receptores, porque quando foram gerados ratinhos nockout para CTLA-4,
estes fulminam-se em 2 a 3 semanas, com doença inflamatória autoimune sistêmica e, portanto,
morrem, por não terem CTLA-4.

A via de sinalização do PD-1 vai fazer


exatamente o oposto do que vimos
anteriormente. Nós antes estivemos a ver
uma série de reações de fosforilação dos
intermediários intracelulares para que os
fatores de transcrição fossem ativados e
chegassem ao núcleo. O que a via do PD-1
faz é roubar estes fosfatos essenciais às vias
de sinalização, levando então a que não haja
sinalização a eficaz a partir dessa cascata a
chegar ao núcleo. O oposto de cinase, uma
proteína que fosforila, é fosfatase, uma
proteína que tira fosfatos, e a via de sinalização do PD-1 está assente em fosfatases que roubam
os fosfatos às reações e que as cinases estão a tentar catalizar para ativar a célula T. Assim,
temos uma competição intracelular entre o TCR e o CD28 que estão a tentar fosforilar e o PD-1
cujas fosfatases estão a tentar tirar os fosfatos e impedir a sinalização para a ativação de todos
estes genes intracelulares essenciais. O CTLA-4 vai ligar-se aos mesmos ligandos da família B-7
do CD28, o vai fazer é roubar, não a via de sinalização, mas os próprios ligandos da membrana
da APC. A isto chama-se trombocitose, processo no qual um recetor na membrana, come os
ligandos de uma célula a qual se liga. Assim, o CTLA- 4 na membrana da célula T vai se ligar aos
B7, CD80 e CD 86, que estão na APC e retirá-los da membrana da APC, isto vai impedir que estas
moléculas se liguem ao co-receptor da ativação e, portanto, a célula T deixa de ter sinal 2. O
CTLA-4 tem 100 vezes mais afinidade para os recetores do que o CD20, e por isso, consegue
roubar-lhe esses ligandos e capturá-los da membrana da APC numa reação altamente
dramática.

P á g i n a 23 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aulas Pré-Gravadas 1 e 2 – Imunidade Inata


Data Docente
- Profª. Doutora Margarida Vigário

A imunidade inata é importante porque nós estamos em permanente contacto com milhares
de microrganismos potencialmente patogénicos e, na verdade, raramente ficamos doentes
porque eles são impedidos de entrar no nosso corpo – temos um conjunto de barreiras
físicas/químicas assim como um conjunto de células e moléculas envolvidas na resposta
imediata (sistema imune inato).

Este sistema imune inato corresponde à primeira linha de defesa (imediata) e assume
mecanismos de proteção inespecífica. Está muito bem desenvolvido nos invertebrados porque
é o único mecanismo de defesa que eles têm. No entanto, os mamíferos assumem também um
sistema imune adaptativo, sendo o responsável por desenvolver uma resposta imune especifica
e pela memória imunológica.

Há uma interação constante entre os dois sistemas – estão envolvidas múltiplas células e
moléculas que se influenciam mutuamente. As células dendríticas são as principais responsáveis
por ativar a resposta adquirida. Da mesma maneira, existe um conjunto de moléculas do sistema
adaptativo que tornam a imunidade inata mais eficiente.

O que difere entre os dois sistema é essencialmente o tempo de resposta e a especificidade. Na


resposta inata temos recetores com elevada diversidade e especificidade baixa (reconhecem
padrões altamente conservados entre os microrganismos).

No caso de uma pessoa que não tem imunidade inata, o crescimento exponencial de
microrganismos é muito maior e torna-se impossível controlar a infeção, mostrando desta forma
o quanto é importante a imunidade inata para a resolução de infeções.

Constituintes da imunidade inata:

• Barreiras físicas e químicas;


• Componentes celulares
o Células fagocíticas (macrófagos, neutrófilos – muito envolvidos na inflamação);
o Células dendríticas (ponte com imunidade adquirida);
o Células NK (ação anti viral e anti tumoral)

P á g i n a 24 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

o Inate like lynfocites (T-gama-delta, células B não convencionais, NKT, innate


lymphoide cells (ILCs)) – estas células conseguem responder muito rapidamente
no início da infeção porque não dependem de uma expansão clonal para atuar.
• Proteínas do plasma – fazem parte do sistema do complemento
• Citocinas –funcionam como mediadores da resposta imune (regulação e coordenação).

Funções da imunidade inata

• Iniciar a resposta imune contra os microrganismos invasores, controlar e se possível


eliminar os microrganismos
• Desencadear a resposta imune adaptativa, influenciando a natureza dessa resposta
através da polarização das células ativadas.
• Reconhecer células danificadas ou mortas, eliminá-las e iniciar o processo de reparação
e restabelecimento da homeostasia (particular relevância dos macrófagos na
recuperação de uma lesão tecidular perante uma invasão microbiana).

Barreiras encontradas pelo patogénico durante a invasão – superfícies epiteliais

• Barreiras anatómicas e fisiológicas – pele e mucosas, movimentos intestinais, oscilação


dos cílios bronco pulmonares, tosse e espirros, etc (dificultam a colonização
microbiana).
• Barreiras químicas – lisozimas nas secreções oro-naso faríngicas e lágrimas, enzimas
digestivas e pH baixo do tubo digestivo, produção de defensinas (péptidos anti-
microbianos), e flora comensal (Ex: a E.Coli produz moléculas com função antibacteriana
como as colicinas).
Quando estas barreiras são quebradas o microrganismo pode conseguir invadir o nosso corpo,
surgindo variadas respostas conforme o agente patogénico.

Nota: opsonização consiste na marcação dos agentes microbianos pelo sistema do


complemento para serem posteriormente fagocitados pelas células fagocíticas do sistema
imune inato.

Células fagocíticas

Macrófagos – são os primeiros a reconhecer as bactérias invasoras. Tem um papel fundamental


na a eliminação dos microrganismos (M1) ou reparação tecidular (M2). São ativados quando:

P á g i n a 25 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

• reconhecem estruturas dos microrganismos ou sinais de “perigo” libertados pelas


células em situações de stress;
• reconhecem opsoninas na superfície dos microrganismos – provenientes do processo
de opsonização);
• entram em contacto com citocinas libertadas por outras células (ex: imunidade
adquirida).
Neutrófilos – são células polimorfonucleadas, tem grânulos citoplasmáticos abundantes
contendo enzimas e outras moléculas microbicidas. Estão sempre em circulação e migram para
o local da infeção quando necessário; são as células mais importantes na destruição das
bactérias e por isso funcionam como excelentes marcadores de que há uma infeção bacteriana
(usa-se frequentemente o termo de neutrofilia).

Resposta inflamatória

Quando há uma invasão microbiana, as células do sistema imune inato libertam citocinas que
tornam o endotélio mais permissivo à passagem de compostos – a citocina mais relevante na
ativação endotelial é o TNF alfa).

Durante a resposta inflamatória são também libertadas quimiocinas que atraem outras
moléculas para o local – neste caso, a mais importante para o recrutamento de neutrófilos e
início da inflamação é a IL-8; outras citocinas como a IL-1 e IL-6 são importantes marcadores da
fase aguda da infeção.

Como é que as células detetam os invasores?

Os recetores da resposta inata estão codificados na linha germinal e então têm uma
especificidade pré-determinada e consequente baixa variabilidade. Assim, um recetor pode
reconhecer vários agentes patogénicos diferentes. Estes recetores chamam-se PRR (pattern
recognition receptor).

Existem moléculas que são comuns a todas as bactérias gram positivas e outras comuns a todas
as gram negativas, e que estão presentes na respetiva parede celular. Por exemplo, o LPS está

P á g i n a 26 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

presente em todas as bactérias gram negativas e é frequentemente um dos fatores de virulência


mais imunogénicos.

Assim, uma célula fagocítica tem vários tipos de recetor e cada recetor reconhece várias
bactérias.

Os PRR (pattern recognition receptors) reconhecem padrões moleculares que:

• existem nos microrganismos (PAMPs – pathogen associated molecular patterns; ou


MAMPs – microbe associated molecular patterns);
• existem no próprio (DAMPs – danger associated molecular patterns) – as células
fagocíticas também podem ser ativadas por sinais endógenos associados a danos nas
células do hospedeiro como resposta ao stress.

PRR

Localização:

• Intracelular – citoplasma ou compartimentos intracelulares. São ativados no caso de


infeções intracelulares, moléculas microbianas ou sinais de danos celulares. Ex: NOD,
RIG ou Toll like receptors.
• Solúveis (secretados pelo fígado) – envolvidos em processos de opsonização e fazem
ativação do sistema do complemento.
P á g i n a 27 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

• Extracelulares – estão presentes na superfície membranar. Ex:


o MR (recetores macrofágicos de manose – importantes para a fagocitose de
bactérias e fungos)
o SR (recetores macrofágicos scavenger – importantes no reconhecimento de LPS,
dsRNA, …
o TLR (toll like receptors)
o Recetor específico para o LPS (CD14)
o CR1 (liga-se ao elemento C3b do complemento e participa na opsonização)
o Recetores Fc (reconhecem microrganismos opsonizados com anticorpos –
implica a ativação prévia da imunidade adquirida).

As proteínas de fase aguda são produzidas pelo fígado muito cedo na infeção, após 1-2 dias da
ativação dos macrófagos.

NLR são muito importantes para a formação do inflamassoma, enquanto que os RLR são mais
relevantes na resposta anti-viral.

P á g i n a 28 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Quando há o reconhecimento dos PAMPs pelos PRR, a célula fagocítica é ativada – resulta na
secreção de citocinas e quimiocinas, induzindo uma resposta inflamatória; e resulta na
internalização do patógeno para ativar mecanismos de “kiling”.

Mecanismo efetor deste processo – envolve a acidificação do fagossoma, seguida da fusão do


fagossoma com o lipossoma (formando o fagolisossoma) e a partir dai tem-se:

1. Síntese de produtos tóxicos derivados do oxigénio (produção de espécies reativas de


oxigénio mediada por exemplo pela NADPH oxidase)
2. Síntese de oxido nítrico
3. Péptidos microbicidas (lisozimas, defensinas, protéases)
A eficiência deste processo pode ser aumentada por produtos resultantes da resposta imune
adquirida.

Este processo é comum nos macrófagos e neutrófilos (estes são muito bons a fazer
reconhecimento de PAMPs para eliminação das bactérias). No entanto, os neutrófilos têm um
outro processo adicional – como assumem um tempo de vida muito curto, após exercerem a
sua função, morrem e libertam todo o seu conteúdo, nomeadamente umas estruturas
designadas por NETS (neutrophil extracelular traps compostas por cromatina associada a
proteínas granulares) e que tem atividade bactericida contribuindo para a destruição das
bactérias. Estas NETS não podem ficar muito tempo no sistema do hospedeiro, pelo que existem
DNAses que vão destruir estas NETS (se não for removido podemos estar a potenciar respostas
autoimunes).

Inflamassoma

Alguns NLR quando ativados levam à formação de complexos multiproteicos (inflamassomas).


Isto ocorre pela ativação da caspase-1, seguida da clivagem de IL-1beta e IL-1B nas suas formas
ativas para que haja o aumento da inflamação.

Existem também recetores importantes presentes não só nas células fagocíticas, mas também
noutras células, nomeadamente nas que reconhecem produtos virais (relevância dos PRR virais).
P á g i n a 29 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Os ácidos nucleicos virais na célula infetada induzem:

• a produção de IFN I que, por sua vez, induz o aumento da expressão de MHC I que
permite que a célula exponha na sua superfície péptidos do vírus que o esta a infetar,
passando a ser reconhecida pelas células T CD8;
• alerta as células vizinhas;
• induz a expressão de enzimas que inibem a replicação viral

As células dendríticas fazem parte de um conjunto designado por células apresentadoras de


antigénio. Estas são células que capturam antigénios e os apresentam aos linfócitos T, emitindo
sinais que os ativam.

As células dendríticas são fenotipicamente heterogéneas, mas podem ser divididas em dois
grandes grupos: as convencionais (são as mais eficientes) e plasmocitóides (têm uma forma
semelhante aos linfócitos B ativados quando estão num estado mais imaturo; são menos
eficientes na apresentação de antigénios, mas melhores no combate à infeção viral).

As células dendríticas fazem a apresentação de antigénios principalmente às células T naive,


ativando-as e iniciando a resposta imune adquirida. No entanto, podem também interagir com
células T previamente ativadas, seguindo uma relação bidirecional.

Os macrófagos e células B
interagem
fundamentalmente com
células T já ativadas de forma
bidirecional – apresentam os
antigénios e em troca
recebem das células T fatores
ativadores para que os
macrófagos funcionem
melhor ou, no caso das
células B, fatores que
induzem a sua diferenciação.

As células dendríticas encontram-se naturalmente a patrulhar os nossos tecidos e têm recetores


que são capazes de reconhecer moléculas expressas na superfície dos agentes patogénicos e
que medeiam a sua internalização. Depois, ao contrário dos macrófagos e células B, elas migram

P á g i n a 30 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

para gânglios linfáticos adjacentes onde vão entrar em contacto com as células T para iniciar a
resposta imune adquirida.

As células dendríticas imaturas nos tecidos apenas têm de ter capacidade de reconhecer e
fagocitar os agentes patogénicos (têm recetores de quimiocinas para se manterem nos locais
necessários). Quando são ativadas via PRR, diferenciam-se e tornam-se em células dendríticas
maduras – aumento a expressão de recetores às quimiocinas que lhes permitem migrar para os
gânglios linfáticos e passam a produzir um perfil de citocinas relevantes para a ativação das
células T.

A expressão de Nf-kB é
importante para a
produção de moléculas co-
estimuladoras e citocinas
(orientam a forma como a
célula T naive se
diferencia).

P á g i n a 31 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

O tipo de PRR ativados na célula dendrítica vai condicionar o tipo de citocinas que a célula
dendrítica vai produzir e que, consequentemente, define o tipo de célula no qual os linfócitos T
se vão diferenciar.

Células dendríticas

• Convencionais (mieloides) – são as mais representadas e mais eficazes no processo de


apresentação antigénica. Têm a capacidade de migrar para tecidos periféricos (ex:
células de Langerhans e células dendríticas intersticiais do tecido conjuntivo). Dentro
deste grupo existem várias subpopulações que diferem entre si pelos PRR expressos,
embora todas as células dendríticas convencionais sejam muito ricas em variados
recetores da imunidade inata.
• Plasmocitóides – encontram-se sobretudo em circulação, mas podem migrar para os
locais de infeção (existem em pequeno número nos órgãos linfoides). Reconhecem
ácidos nucleicos microbianos (TLR7 e TLR9 – envolvidos na produção de endossomas).
Produzem rapidamente grandes quantidades de IFN tipo I (importante na resposta inata
anti-viral). Têm menor atividade imunoestimuladora, mas maior capacidade de induzir
tolerância.

As células dendríticas
expressam muitos TLR, tanto
na membrana celular como
nos endossomas

P á g i n a 32 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Uso das células dendríticas na terapia do cancro – podemos isolar monócitos do sangue
periférico de um paciente e depois podemos induzir a sua diferenciação in vitro em células
dendríticas imaturas através do uso de fatores solúveis adequados. Do mesmo paciente são
removidas células tumorais lisadas de forma a expor os antigénios às células dendríticas
imaturas, conduzido à sua ativação. Uma vez ativadas, ficam prontas para ativar eficazmente os
linfócitos T e consequente resposta imune adaptativa do paciente

Innate like lymphocytes

• Tipo I – semelhantes às células da imunidade adaptativa; têm recetores com


variabilidade limitada e baixa especificidade, sem necessidade expansão clonal –
induzem uma resposta rápida.
• Tipo II – chamam-se ILCs (ex: NK, lymphoide tissue inducers, ILC2, ILC1, etc). Expressam
muitas das citocinas produzidas pelas células T CD4 (helper), mas não expressam TCR e
por isso não respondem de uma forma especifica aos antigénios. Têm um papel
importante na:
o Regulação da homeostasia dos tecidos
o Na formação dos NL durante a embriogénese
o Mediação da resposta imune e inflamação
o Resposta imune precoce contra vírus e tumores (NK)

As células natural killer podem assumir dois modos de ação: ativação dos macrófagos via
produção de INF gama (muito importante para a atuvação dos macrófagos), ou lise das células
alvo. Estão presentes no sangue, baço e figado.

A forma como atuam depende de recetores codificados na sua linha germinal e que estão
presentes à superfície da célula, podendo induzir sinais ativadores ou inibidores – reconhecem
moléculas de MHC independentemente do antigénio.

P á g i n a 33 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

A ativação das células NK resulta do balanço entre sinais ativadores e sinais inibidores. Um dos
ligandos mais importantes para os recetores relacionados com a inibição são as células MHC I –
permite garantir que as células normais não serão alvo das NK. No caso de uma célula infetada
com vírus, os vírus muitas vezes reduzem a expressão de células MHC I na célula hospedeira
como mecanismo para se esconderem da vigilância imunitária – o aumento dos sinais inibidores
induz uma perca de equilíbrio e consequente ativação das células NK. Nas células tumorais pode
haver o aumento dos sinais ativadores, que igualmente ativam as células NK.

Moléculas solúveis – resposta inata humoral

Estas moléculas funcionam por 2 formas:

• Ligação ao microrganismo – como consequência, pode haver opsonização da superfície


do microrganismo (fica sinalizado para ser fagocitado) ou formação de poros na
superfície do microrganismo (leva ao desequilíbrio osmótico e morte do agente
patogénico).
• Promoção da inflamação

Estas moléculas fazem


parte do sistema do
complemento – conjunto
de proteínas plasmáticas
que são produzidas sob a
forma inativa e são
ativadas apos a clivagem.

O fragmento a) é
normalmente mais
pequeno e o b) é maior.

De uma forma geral, o


sistema do complemento
pode ser ativado de formas distintas, mas todos culminam na ativação da C3 convertase que é
capaz de clivar múltiplas moléculas C3.
P á g i n a 34 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Vias de ativação do complemento

A via clássica implica uma previa imunidade adaptativa (tem de haver anticorpos específicos
para esse microrganismo resultantes desse contacto ou contacto prévio).

• Inicia-se pela ligação da molécula complexa C1q a pelo menos 2 regiões constantes dos
anticorpos depositados na superfície do microrganismo alvo;
• é mais fácil ligar-se a anticorpos IgM porque estes assumem uma estrutura pentamérica;
• depois, há um conjunto de reações que levam à sua clivagem e consequente capacidade
de clivar moléculas C4;
• as moléculas C4, por sua vez, passam a clivar moléculas C2.

• a C3 convertase tem a capacidade de clivar moléculas C3 que se encontram em elevada


quantidade no organismo.

P á g i n a 35 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

• As células fagociticas reconhecem as moléculas C3b e as moléculas C3a são libertadas


em solução.

A via da lectina é semelhante, mas não implica a ligação às


zonas constantes dos anticorpos.

• Inicia-se pela ligação da MBL a resíduos de manose


presentes na superfície de muitos microrganismos;
• No fim culmina na ativação da C3 convertase
também.

A via alternativa é mais complexa, mas termina também ao


nível da C3 convertase.

Depois, existe uma


via comum a todas
estas que consiste
na formação da C5
convertase – esta é
capaz de clivar
moléculas C5.

Depois, a via comum segue para


a formação do MAC caso o
microrganismo ainda não tenha
sido fagocitado até ao momento
– este MAC consiste na
formação de um poro composto
por moléculas C9 que vai ser
responsável pela destruição do
alvo.

P á g i n a 36 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Resumo do sistema complemento

Mecanismos de regulação da atividade do complemento

Nos só queremos que o sistema


do complemento funcione em
caso de infeção microbiana por
isso estes mecanismos são de
extrema importância para
limitar/restringir a sua atuação.

P á g i n a 37 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula 4 – Imunidade Inata


Data Docente
06/10/2021 Profª. Doutora Margarida Vigário

A imunidade inata tem 3 funções principais:

• Iniciar a resposta imune contra microrganismos invasores com objetivo de eliminar ou


controlar uma infeção subjacente;
• Desencadear a resposta imune adaptativa – neste caso, as células dendríticas têm
particular influência uma vez que são responsáveis por fazer a ponte para a imunidade
adaptativa; é a forma como interagem com as células T e o tipo de informação que
transmitem que vai influenciar a resposta;
• Reconhecer as células danificadas ou mortas de forma a eliminá-las, iniciando o
processo de reparação tecidular; neste contexto a subpopulação M2 de macrófagos tem
particular influência.
Quando há uma invasão de microrganismos os nossos tecidos, a primeira resposta é
normalmente um processo inflamatório – consiste na resposta a uma infeção ou um dano
tecidular (pode tratar-se, neste caso, de uma inflamação assética) que se caracteriza pela
extravasão para o local lesado de moléculas solúveis e leucócitos a partir do sangue, culminando
(idealmente) no restabelecimento da homeostasia do tecido.

Os macrófagos são células imunes relevantes no processo de imunidade inata que expressam
PRR responsáveis por reconhecer padrões dos microrganismos e induzir a sua fagocitose. Da
ativação dos macrófagos resulta a libertação de citocinas e quimiocinas que levam à ativação do
endotélio adjacente; uma vez ativado, o endotélio torna-se permeável a uma série de moléculas
e aumenta a expressão intrínseca de moléculas de ligação como seletinas que, por sua vez,
ajudam na extravasão e migração de leucócitos para o local de inflamação.

P á g i n a 38 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

As citocinas libertadas, particularmente pelos macrófagos, podem atuar localmente ou de


forma sistémica. A nível sistémico podemos distinguir múltiplos efeitos protetores:

• Ação ao nível do hipotálamo (responsável pelo aparecimento da febre), no fígado


(importante para a produção de proteínas de fase aguda que são relevantes para a
ativação do complemento) e ao nível da medula (induz a produção de leucócitos e
outras células imunes como neutrófilos).
No entanto, os efeitos sistémicos podem não ser sempre protetores e podem ser patológicos
(abordado na aula 5).

Durante o processo inflamatório, existem uma serie de sinais (calor, rubor, tumor, dor, perda de
função) que refletem os acontecimentos subjacentes: há uma entrada de líquido para a zona
lesada e consequente formação de edema; depois ocorre a migração de um grande número de
neutrófilos que, como têm vida curta e acabam por morrer rapidamente; e por fim migram
células com função de reparar os tecidos para que ocorra a resolução do processo inflamatório.

P á g i n a 39 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Macrófagos

São uma população heterogénea, mas de forma geral podem ser classificados em 2 grupos
dependendo da forma como são ativados:

• Ativação clássica – na presença de um determinado microrganismo os respetivos PRR


são ativados, polarizando os macrófagos para um fenótipo pró inflamatório; neste caso,
passam a libertar citocinas. São também importantes na supressão de tumores.
• Ativação alternativa – neste caso os macrófagos são ativados por células apoptóticas,
levando à produção de citocinas anti-inflamatórias que ajudam na resolução, produção
da matriz extracelular, angiogénese, etc. No entanto, sabe-se que este fenótipo anti-
inflamatório tem uma influência positiva na progressão do tumor.

A inflamação pode ser gerada por infeção e não só (danos tecidulares, etc); dependendo do que
causou a inflamação a resposta é também diferente, podendo passar pelo combate a
microrganismos, reparação de tecidos ou adaptação e restauração do equilíbrio.

P á g i n a 40 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

A imunidade inata é caracterizada pela rapidez da resposta que só é possível porque existe uma
panóplia de recetores (intra-, extracelulares ou solúveis) de baixa variabilidade e baixa
especificidade (PRR) que não dependem de uma expansão clonal para atuar. Enquanto os TCR
(recetores envolvidos na imunidade adaptativa) não são codificados na linha germinal e
dependem de mecanismos de recombinação, os PPR estão codificados na linha germinal e são
específicos para regiões comuns a diferentes microrganismos (é mais inespecífico).

PRR solúveis

PRR intra e extracelulares

Os PRR intracelulares são importantes para a ligação a ácidos nucleicos de vírus por exemplo ou
de bactérias que atingem o citosol das células.

• Um dos mais típicos são os TLR (toll like-receptor) que estão nos endossomas e
reconhecem material genético viral, os NLR (node like-receptores) que reconhecem
lípidos presentes na parede bacteriana, e os RLR (RIG like-receptors) que são
importantes no reconhecimento do RNA viral.
Entre os recetores extracelulares distinguem-se os abrangentes TLR (são diferentes dos
endossomais porque apenas reconhecem bactérias) e a lectina que é importante no
reconhecimento de fungos.

P á g i n a 41 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Os PRR ligam-se aos PAMPS ou DAMPS e induzem um sinal para a célula:

• Sinal Endocítico – estes PRR são muito importantes nas células fagocíticas;
• Sinalizadores – levam a uma cascata de sinalização que culmina na ativação de fatores
de transcrição.

P á g i n a 42 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Para que uma célula dendrítica seja capaz de ativar uma célula T naive, é necessário que sejam
transmitidos 3 sinais:

• Sinal 1 – a célula dendrítica tem de reconhecer, capturar e internalizar através de PRR


endocítico um determinado microrganismo para depois o processar e apresentar os
péptidos respetivos através do MHC II (sinal 1);
• Sinal 2 e 3 – os TLR na superfície da célula dendrítica quando ativados vão estimular a
produção de NF-KB que induze a produção de moléculas co estimuladoras (sinal 2 –
depende do CD80/86) e de citocinas (sinal 3), incluindo a interleucina-2 (sinal para as
células T começarem a proliferar) e outras que definem a polarização das células T.

São, então, as células dendríticas as maiores responsáveis pela ponte entre o sistema inato e
adaptativo.

Quando se dá a ligação do patogénio ao TLR há recrutamento de proteínas adaptadoras que,


por sua vez, vão ativar 2
grupos de fatores de
transcrição:

• Nfkb – leva à
transcrição de
moléculas
importantes para o
processo inflamatório
(citocinas,
quimiocinas,
moléculas co
estimuladoras) que
contribuem para a
resposta inflamatória
aguda e ativação da resposta adaptativa.

• IRF – a sua expressão é particularmente importante na resposta viral: reconhece


compostos virais através dos seus PRR citosólicos, induzindo a produção e libertação de
P á g i n a 43 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

citocinas que se ligam a recetores de células vizinhas ou na própria célula produtora e


levam à produção de moléculas importantes no combate à infeção viral. Por outro lado,
induz também o aumento da expressão das moléculas de MHC I.

Interferão tipo I também


consegue ativar células NK para
que produzam INF gama
(responsável por ativar
macrófagos para que fagocitem
as partículas virais).

P á g i n a 44 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Innate like linfocytes – podem ter recetores idênticos aos dos linfócitos, mas devido à sua baixa
variabilidade, são apenas capazes de reconhecer estruturas conservadas em múltiplos
microrganismos; ou podem ser fenotipicamente semelhantes aos linfócitos T, mas não
expressarem TCR (ainda que a estimulação dos seus recetores intrínsecos gere uma resposta
semelhante – chamam-se ILCs). As células NK são as ILCs mais antigas que se conhecem.

A sua classificação é feita de acordo com o fenótipo, função e fatores de transcrição ativados.

P á g i n a 45 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

As células T depois de ativadas, se forem CD4, podem posteriormente polarizar-se em Th1, Th17,
Th2 ou TCD8 – o que ativa estas células não são os TCR, mas sim o tipo de citocinas às quais
ficam sujeitas.

As células linfoides da imunidade inata (ILCs) são as primeiras a reconhecer a invasão


patogénica, e começam a produzir múltiplas citocinas (IL-15, IL-12 ou IL-18) que vão ativar
células como as NK, fazendo com que estas passem a produzir outro tipo de citocinas; neste
caso das NK por exemplo, tornam-se citotóxicas ou passam a produzir INF gama que depois terá
ação direta na resolução da inflamação.

P á g i n a 46 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula 5 – Tolerância em Infeções


Data Docente
06/10/2021 Professor Miguel Soares

Quando os microrganismos invadem um hospedeiro e atravessam as barreiras epiteliais, o


principal objetivo é arranjar nutrientes para manterem o seu metabolismo e, para isso, têm de
competir com o hospedeiro.

A infeção, lesão tecidular ou stress/mal função sequente à invasão microbiana pode induzir a
disrupção da homeostasia. No entanto, o ser humano está programado para responder através
de uma resposta inflamatória e/ou imune de forma recuperar o equilíbrio. Esta é uma resposta
absolutamente essencial, mas se não for regulada pode levar a uma disfunção metabólica, lesão
de tecidos ou mesmo à morte.

As defesas contra a invasão de um microrganismo que limitam a sua virulência podem ser
divididas em 2 componentes:

• Resistência – limita o impacto negativo da invasão microbiana no hospedeiro ao reduzir


a carga patogénica. A resistência é uma função do sistema imune que funciona através
da deteção, neutralização, destruição e/ou expulsão do patogénio. Tanto o sistema de
imunidade inata como adaptativa contribuem para a resistência do hospedeiro a
infeções.
• Tolerância – limita o impacto negativo da infeção no hospedeiro, mas contrariamente
aos mecanismos de resistência, não afeta diretamente o agente patogénico. Em vez
disso os mecanismos de tolerância diminuem a suscetibilidade do hospedeiro à lesão
tecidual ou a outros danos causadas pelo patogénio em si ou pela resposta imune
gerada contra ele.
A tolerância traduz assim um conjunto de propriedades da imunidade que permite aguentar ou
tolerar uma infeção – é um mecanismo de resiliência que permite que em vez de eliminarmos
diretamente o microrganismo, possamos aprender a viver com ele e a tolerá-lo sem
consequências major no sistema.

Sabe-se que os mecanismos envolvidos na resposta


imune podem ser eles próprios causadores de
doença. Neste caso existem os chamados
mecanismos de controlo da lesão tecidular (tissue
damage control) que embora não tenham ação
direta sobre o patogénio limitam os danos causados
tanto pela carga patogénica como pelos mecanismos
de resistência gerados pelo hospedeiro – são estes
mecanismos que estão na base da tolerância
imunitária.

P á g i n a 47 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Para o sucesso da resposta imunitária e consequente resistência à infeção é necessário que


exista interação e sobreposição destes 3 sistemas: imunidade inata, imunidade adaptativa e
controlo da lesão tecidular.

Trajetórias da doença

Nos gráficos abaixo compara-se os a saúde vs a carga patogénica, permitindo analisar a trajetória
seguida pela doença e, consequentemente, estimar as variações individuais na resistência e
tolerância de cada individuo.

Quando os mecanismos de imunidade inata e adaptativa conseguem diminuir a carga do


patógeno pode ainda assim existir uma trajetória da doença que aproxime o hospedeiro da
morte do individuo; para recuperar tem de existir uma fase de recuperação. É importante neste
caso compreender o fundamento genético que
permite estes mecanismos, particularmente
associados ao desenvolvimento de resistência e
tolerância.

Os mecanismos de resistência podem ser


operacionais sem ter qualquer efeito na
recuperação; para que tal aconteça é necessário
ativar mecanismos de tolerância (estes sim
aumentam a saúde do individuo).

Assim, de forma resumida, uma elevada resistência à infeção traduz-se pela capacidade de
reduzir a carga patogénica e consequentemente superar a doença; caso contrário o individuo
tem dificuldade em eliminar o patogénio, podendo inclusive morrer como consequência disso.

Por outro lado, uma elevada tolerância faz com que um individuo embora consiga ter uma
elevada carga de patogénio, não desenvolva a doença; assim, mesmo que nem seja gerada uma
resposta imune forte, existe uma enorme resiliência face à presença do patogénio dependente
de mecanismos de controlo do dano tecidular. Na ausência de mecanismos de tolerância, o
individuo acaba por morrer porque não consegue tolerar a elevada carga patogénica. Isto explica
P á g i n a 48 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

porque é que muitas vezes perante a mesma carga patogénica as pessoas reagem de forma
diferente e de acordo com os seus mecanismos de tolerância pode ou não ser gerada doença
(exemplo do covid-19).

A tolerância funciona como uma estratégia de defesa do hospedeiro conservada a nível


evolutivo, tanto nas plantas como nos animais. Várias relações de simbiose têm sido descritas
no aumento da tolerância a uma determinada invasão microbiana (Ex: presença da bactéria
Wolbachia). No entanto, a variação genética continua a ser uma das principais explicações para
o desenvolvimento de tolerância apenas por alguns indivíduos.

Quando um microrganismo invade o hospedeiro, é a expressão de fatores de virulência que é


responsável por ativar uma resposta imunitária. Se isto não for regulado pode induzir danos no

P á g i n a 49 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

hospedeiro, danos esses que são limitados por mecanismos de controlo de dano tecidular. Estes,
por sua vez, são regulados por uma rede genética que envolve de 18 fatores de transcrição.

Cada um destes fatores de transcrição responde a diferentes tipos de stress (hipoxia, stress
oxidativo, variações de osmolaridade, etc); alguns destes fatores de transcrição são capazes de
ativar dezenas de genes; por outro lado, e de forma redundante, existem genes que respondem
a mais de 7 fatores de transcrição e, assim, conseguem responder a quase todo o tipo de stress
induzido – este core génico é assim absolutamente essencial para o desenvolvimento de
tolerância.

O fator de transcrição NRF2 é particularmente importante no desenvolvimento de tolerância ao


choque séptico.

Em suma, a tolerância à doença é um mecanismo de defesa conservado do ponto de vista


evolutivo baseado na expressão genes responsivos ao dano e stress fornecendo controlo da
lesão tecidular e limitando a severidade da doença no hospedeiro independentemente da carga
patogénica. Estas vias responsivas ao stress e dano foram provavelmente selecionadas ao longo
da evolução humana como mecanismo de sobrevivência da espécie.

P á g i n a 50 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula Pré-Gravada 3 – Imunidade Celular


Data Docente
- Prof. Doutor Bruno Silva Santos

Imunidade Celular

Imunidade celular são as respostas imunitárias montadas por linfócitos T e caraterizam-se pela
produção de citocinas e citoxicidade (isto é, a capacidade de matar outras células, que, neste
contexto, seriam células infetadas ou tumorais).

Tipos de Linfócitos T

Existem linfócitos T convencionais e não convencionais.

Os linfócitos T convencionais são CD4+ ou


CD8+, a sua ativação e resposta é
dependente do reconhecimento do
antigénio pelos MHC (complexo maior de
histocompatibilidade) uma vez que os
seus recetores, TCR (T-cell recetor),
reconhecem péptidos apresentados pelo
MHC das APC (células apresentadoras de
antigénios).

Os linfócitos T não convencionais


(linfócitos T  e linfócitos T Natural Killer
[NKT]) pertencem à imunidade inata e
são menos abundantes.

P á g i n a 51 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Ativação dos Linfócitos T

A ativação dos linfócitos ocorre nos gânglios linfáticos ou nódulos linfáticos que drenam o local
de infeção e é consequência da interação direta entre os linfócitos T e as células APC, que,
molecularmente, corresponde, de uma forma muitíssimo simplista, ao reconhecimento, por
parte do TCR, dos antigénios apresentados pela MHC.

A localização das APC e das células T naïve (células T não ativadas) no gânglio linfático depende
de um gradiente de quimiocinas e de recetores de quimiocinas, como o CCR7 (presentes nas
membranas celulares das APC e células T), que vão atrai-las para o nódulo do linfático, onde se
vão co-localizar e, assim, permitir que a interação entre ambas ocorra.

As células T estão naturalmente em repouso uma vez que nós precisamos que os nossos milhões
de células T não estejam a montar respostas imunitárias contra aquilo que ou não nos infetou
ou pertence ao nosso corpo (e contra o qual não queremos reagir). Portanto, o estado de
repouso é o estado fundamental e mais importante para a vida da célula T.

Este estado de repouso termina a partir do momento em que são ativadas pela sua interação
com as APC (infeção → ativação das células APC → migração → co-localização das APC e células
T no gânglio linfático → interação e ativação dos linfócitos T).

Molecularmente, a ativação dos linfócitos T, agora de uma forma apenas simplista (o muitíssimo
foi perdido), corresponde à integração de 3 sinais:
1. Interação entre TCR e o complexo MHC+antigénio
2. Co-estimulação pelo CD28;
3. Citocinas (IL2).

A interação entre TCR e o complexo MHC + antigénio é essencial, mas não é suficiente para que
a célula T prolifere e diferencie em níveis eficazes. Para que isso aconteça são necessários os
outros dois sinais.

A co-estimulação, sendo o co-estimulador mais famoso é o CD28, porém existem outros como
o CD27, ICOS e OX40.

As citocinas, nomeadamente a IL2, vão enfatizar (isto é, aumentar) a expansão clonal das células
T.

P á g i n a 52 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Resposta dos Linfócitos T Convencionais

Inicialmente existem muito poucas células T especificas para um dado antigénio (apenas
1/1milhão de células T serão capazes de reconhecer especificamente um determinado
antigénio), uma vez que face à grande diversidade (1012 TCRs) não seria possível, prático, nem
benéfico ter uma grande quantidade de células especificas para um mesmo antigénio em
particular.

Após a sua ativação, ocorrerá, entre a grande diversidade de células T diferentes, uma seleção
daquelas que são especificas para o antigénio em questão, havendo uma expansão clonal das
mesmas.

Para além da expansão clonal e em simultâneo com esta, também ocorrerá uma diferenciação
(isto é, alterações nas propriedades celulares de forma que a célula adquira novas funções). A
célula T naïve (ainda não diferenciada) não é capaz de responder eficazmente à infeção uma vez
que, principalmente, não produz as citocinas e os recetores corretos.

O resultado será um elevado número de clones das células T especificas para aquele antigénio
capazes de produzir uma resposta eficaz e a produção de células de memória.

Conceitos Básicos:

Citosina indutora: a citocina que é libertada pela célula APC e que irá induzir a diferenciação
do linfócito T num determinado subtipo de linfócito T.

Citosina efetora: é a citocina que é libertada pelo linfócito T e que irá induzir a ativação e
proliferação de outras células do sistema imunitário.

Células ThO: são linfócitos CD4+ que ainda não se comprometeram na diferenciação de um
determinado subtipo (são indiferenciados).

Subtipos e Funções Efetoras dos Linfócitos T Convencionais

Vírus
Linfócito T CD8+ Bactérias Intracelulares
Células transformadas (tumorais)
Vírus
Th1
Bactérias Intracelulares
Th2 Parasitas Intracelulares (Ex: Helmintes)
Linfócito T CD4+
Bactérias extracelulares
Th17
Fungos
Tfh Auxiliam os linfócitos B ao nível dos folículos linfáticos

Linfócitos T CD8+

Os linfócitos T CD8+ são citotóxicas, isto é, têm a capacidade de matar outras células. Estas
reconhecem células infetadas (com microrganismos intracelulares – vírus ou bactérias
intracelulares) ou tumorais e irão causar diretamente a apoptose das mesmas.

P á g i n a 53 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Linfócitos T CD4+

Existem vários subtipos de linfócitos T


convencionais CD4+. Cada subtipo
expressa recetores, citocinas e fatores
de transcrição diferentes, o que fará
com que a função e as situações em que
são ativados também variem. Estes
linfócitos têm a capacidade de auxiliar a
ativação de outras células do sistema
imunitário (macrófagos, linfócitos B,
linfócitos T CD8+, etc.) através da
secreção de citocinas e interações
ligando-recetor.

Consoante o antigénio pelas quais são


estimuladas, as APC irão secretar
citocinas indutoras diferentes, as quais
se irão ligar a recetores
transmembranares diferentes ao nível
das células T naïve, ativando diferentes
cascatas de transdução de sinal que vão culminar na ativação de determinados fatores de
transcrição, os quais irão induzir a transcrição dos genes das citocinas efetoras daquele subtipo
e inibir a transcrição dos genes das citocinas efetoras de outros subtipos. As citocinas efetoras
irão mobilizar as células do sistema imune mais apropriadas para combater essa determinada
ameaça.

Linfócitos Th1

Os linfócitos Th1 são os responsáveis pela resposta celular a vírus e bactérias intracelulares.

As APC irão produzir IL-12 (citocina indutora), que irá ativar os IL-12 receptor (IL- 12R). A cadeia
de transdução de sinal proveniente da ativação do IL-12R irá ativar STAT-4 (Signal transducer
and activator of transcription). A STAT-4 vai-se ligar ao promotor dos genes IFN-  (interferão
gama) e provocar a transcrição deste gene. O IFN- é a citocina efetora mais importante das Th1,
além desta existem outras citocinas efetoras como IL-2 e TNF (não precisam de saber estas duas
menos importantes).

O IFN- vai-se ligar ao seu recetor presente nas Th1 e irá ativar um mecanismo de feedback
positivo, em que a estimulação das Th1 pelo IFN- irá reforçar e garantir que as células
continuam como Th1, através do aumento da expressão do gene IFN- e T-bet.
P á g i n a 54 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Uma vez produzida e


secretada, a citocina efetora
IFN- irá interagir com 4
elementos do sistema
imunitário:
1. Linfócitos B;
2. Linfócitos T CD8+;
3. Células NK;
4. Macrófagos.

Devido à sua ligação com os recetores presentes nas células B, IFN- irá causar uma mudança de
classe dos anticorpos para classes que serão mais eficazes para neutralizar a ameaça em causa
(exemplo: a mudança para as classes IgG1 ou IgG3).

Os linfócitos T CD8+ e as células NK são células citotóxicas. O IFN-Y irá ativa-las e maximizar as
suas funções citotóxicas. Portanto, IFN- é importante para ativar o braço citotóxico da resposta
imunitária.

IFN- irá ainda ativar


macrófagos, mais
especificamente, irá aumentar
a capacidade de lisar as
bactérias dentro dos
fagolisossomas e irá causar a
secreção de outras citocinas
inflamatórias e quimiocinas
para recrutar outros elementos
do sistema imunitário.

P á g i n a 55 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Linfócitos Th1 e Mycobacterium Tuberculosis

O IFN- e, portanto, as células Th1 são essenciais na resposta imunitária à tuberculose. Esta
descoberta partiu de um estudo nos coitadinhos dos ratinhos que mostrou que ratinhos
geneticamente modificados para não ter IFN- eram altamente suscetíveis à infeção por
tuberculose e morriam muito rapidamente.

Como já deviam saber, a Mycobacterium tuberculosis será fagocitada por macrófagos


alveolares, mas, devido à sua capacidade de impedir que a fusão entre o lisossoma e fagossoma,
não são lisadas.

Portanto, a ativação dos macrófagos mediada por IFN- vai ser crucial para ocorrer a fusão entre
lisossomas e fagossomas e, consequentemente, para a morte do agente patogénico.

E é por esta mesma razão que os doentes com mutações no IFN- ou no seu recetor são mais
suscetíveis à tuberculose.

Linfócitos Th2

As Th2 serão responsáveis pela resposta celular a grandes parasitas extracelulares, como os
helmintes.

No caso das Th2, a citocina indutora será IL-4. Esta irá ligar-se ao seu recetor nas células ThO e
provocar uma cascata de transdução de sinal que culminará na ativação do fator de transcrição
GATA-3. Este fator irá induzir a expressão dos genes das 3 principais citocinas efetoras: IL-4, IL-
5 e IL-13.

Como deviam ter visto, IL-4 é tanto citocina indutora quanto efetora. Esta será responsável por
um mecanismo de feedback positivo, em que a própria IL-4 secretada pela Th2 irá causar, para
além das suas funções efetoras, outras ThO a diferenciarem-se em Th2. Este mecanismo de
feedback positivo reforça a resposta Th2, permitindo uma resposta mais eficaz contra os
organismos.

P á g i n a 56 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

As citocinas efetoras dos Th2 irão ativar mastócitos e eosinófilos. Estes dois elementos do
sistema imune inato são capazes de lidar com os helmintes outros parasitas. Os eosinófilos serão
ativados pela IL-5 e são capazes de romper a membrana dos parasitas, levando à sua eliminação.

Os mastócitos vão ser ativados pelo IgE. A IL-4 irá causar uma mudança de classe dos anticorpos,
provocando a libertação de IgE. Esta IgE vai-se ligar a recetores Fc- expressos pelos mastócitos
levando à desgranulação dos mesmos e a consequente libertação do seu conteúdo rico em
moléculas reativas como a histamina, um agente vasodilatador e pró-inflamatório.

Alergia – Resposta Nociva Tipo Th2

As alergias são despoletadas e promovidas pela libertação de histamina, causada pela


estimulação das células Th2. As Th2 são ativadas, libertam IL-4 que irá causar uma mudança de
classe dos anticorpos para IgE, IgE esse que irá causar a desgranulação dos mastócitos e a
consequente libertação de histamina.

Portanto, as Th2, além de nos proteger de parasitas e venenos, terão também este downside
que é serem as responsáveis pelas reações alérgicas

P á g i n a 57 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Linfócitos Th17

São as responsáveis pela imunidade celular a bactérias extracelulares e fungos. As citocinas


indutoras são: TGF-β, IL-1 e IL-6. Neste caso não teremos só uma citocina indutora, mas sim uma
conjugação de várias citocinas que vão reforçar a diferenciação Th17. Só com IL-1 é possível já
ter diferenciação em Th17, mas só com a combinação das 3 é que teremos uma resposta maciça
de diferenciação
devido a um efeito
sinérgico entre as
mesmas.

Estas citocinas
indutoras irão
provocar uma
cascata de
transdução de sinal
que culminará na
ativação do fator de
transcrição RORt.
Este vai-se ligar ao
promotor do gene IL-
17, provocando a sua
expressão.

Como as outras células, Th17 também terá um mecanismo de feedback positivo, desencadeado
pela IL-21. A IL-21 é produzida pela Th17 ativada, e irá provocar um aumento da expressão do
gene IL-17, o que reforça e garante que as células continuam como Th17.

As Th17 produzem duas grandes citocinas


efetoras: IL-17 e IL-22. Estas vão atuar ao
nível dos epitélios e outros tecidos, levando
à libertação de péptidos antimicrobianos
muito importantes para combater as
infeções, particularmente por bactérias
extracelulares.

Além dessa ação, a IL-17 irá ainda recrutar


neutrófilos. Como certamente já sabem e se
não sabem deviam-se preocupar, os
neutrófilos são células muito fagocíticas e
são melhores do que os macrófagos a tratar
de infeções fúngicas (é por isso que a
resposta antifúngica é mediada por Th17 e
não Th1).

Portanto e logicamente, na ausência de IL-17


(por doenças genéticas, por exemplo) há um
aumento das infeções bacterianas
extracelulares e fúngicas.

P á g i n a 58 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Respostas Th17 Nocivas

As Th17 são as mediadoras das respostas autoimunes. Um exemplo disso é a esclerose múltipla,
nas quais os linfócitos Th17 altamente reativas atacarão as bainhas de mielina dos neurónios,
provocando a sua desmielinização.

A esclerose múltipla, e, portanto, todas as doenças autoimunes no geral, é altamente


dependente de IL-17. E como tudo na ciência isso foi descoberto torturando e depois
assassinando ratinhos. Criaram-se 2 modelos animais de esclerose múltipla e num deles fez-se
knock out à IL-17 (isto é, impedimos a sua expressão). Após várias torturas diárias a ambos so
ratinhos, concluiu-se que os ratinhos knock out pra IL-17 apresentavam uma doença transitória
e com um menor score de gravidade.

Em suma, a resposta autoimune é mediada por Th17 e a IL-17 é essencial para a mesma.

Linfócitos Tfh

As células Tfh (células T foliculares) são células helper que vão ajudar as células B a fazer a
maturação dos seus anticorpos, ao nível dos folículos linfáticos.

A citocina indutora será a IL-6, que provocará uma cadeia de transdução de sinal que culminará
na ativação do fator de transcrição Bcl-6, o qual irá garantir a diferenciação Tfh, ao impedir a
expressão dos fatores de transcrição que
controlam Th1, Th2 e Th17, garantindo um
destino diferente para estas células.

A indução por IL-6 ainda levará à expressão


de CXCR5 (um recetor transmembranar de
quimiocinas), o qual reconhecerá a
quimiocina CXCL13. É este reconhecimento
que provocará a migração pros locais
privilegiados do folículo, onde entrarão em
contato com os linfócitos B.

Como acontece nas restantes células, haverá um mecanismo de feedback positivo mediado por
IL-21.

P á g i n a 59 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Interação com Linfócitos B

A interação entre células Tfh e B ocorre nos centros germinativos dos folículos linfáticos e faz-
se através de um grande numero de complexos ligando-recetor e de citocinas, sendo os mais
importantes o complexo CD40L-CD40 e a citocina efetora IL-21.

A IL-21 é produzida pelas Tfh e vai-se ligar a


recetores específicos ao nível da membrana do
linfócito B. As células Tfh também vão apresentar o
ligando CD40 (CD40L) que se ligará ao seu recetor
(CD40) ao nível do linfócito B. Estes dois estímulos
levarão à ativação dos linfócitos B e à maturação
dos seus anticorpos, produzindo, no final, células
produtoras de anticorpos e células de memoria.

Linfócitos CD8+

Este tipo de linfócito T convencional produz uma serie de mediadores que permite matar a célula
alvo, citocinas e quimiocinas. Também podem ser chamadas de CTL (cytotoxic T-Lymphocyte).
Os mediadores citotóxicos mais importantes são o sistema das granzimas e perforinas e o
ligando Fas (FasL).

As citocinas são análogas às produzidas por Th1: a TNF -  e o IFN-  e irão favorecer a resposta
citotóxica.

As quimiocinas atraem outros membros do sistema imunitário para o local da infeção.

P á g i n a 60 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Resposta Citotóxica dos Linfócitos CD8+

Os linfócitos T CD8+ possuem grânulos


cheios de enzimas, nomeadamente
granzimas e perforinas. Quando a célula
CD8 interage com uma célula tumoral ou
infetada por vírus, estes grânulos serão
mobilizados pra sinapse imunológica (local
de interação entre a célula CD8 e a célula
alvo) e ocorrerá a desgranulação.

A perforina vai criar poros na membrana da


célula alvo e será através desses poros que
a granzima entrará para o citosol da célula alvo. As granzimas vão ativar o sistema das caspases
intracelulares, causando a apoptose da célula alvo.

O FASL é o ligante do recetor FAS, o recetor da morte. Este recetor é expresso por todas as
nossas células e quando estimulados pelo seu ligando, que está presente nos linfócitos CD8,
provocam a apoptose celular. Este mecanismo é dependente do reconhecimento de antigénios
de transformação (isto é, antigénios virais ou tumorais), mostrados pelo MHC1 ao linfócito B, e,
assim, não será ativado contra células saudáveis.

Importância dos Linfócitos T CD8+ na Eliminação Viral

Os linfócitos T CD8 terão o seu pico de ação 1 semana após a ocorrência da infeção. Esta resposta
lenta, típica do sistema adaptativo, é altamente especifica e, portanto, é a resposta mais eficaz
para erradicar o vírus. Se repararem no gráfico o vírus só desaparece após a ativação das células
CD8.

P á g i n a 61 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Mas além desta resposta essencial dos linfócitos T CD8, temos outras respostas inatas que são
fundamentais para controlar a carga viral e não permitir que o individuo morra no período de
tempo em que a imunidade mediada por CD8 ainda não está funcional. Esta resposta inata inicial
será mediada por células NK.

Celulas Natural Killer (NK)

Nota Explicativa:
• Linfócitos T Natural Killer (NKT) não são o mesmo que Células Natural Killer (NK);
• Ambos são linfócitos;
• Linfócitos T Natural Killer (NKT) têm TCR (T-Cell Receptor);
• Células NK não têm TCR;
• NKT são innate-like lymphocytes tipo 1;
• NK são innate-like lymphocytes tipo 2;
• A descrição seguinte aplica.se a Células Natural Killer (NK).

Os linfócitos NK, tal como as CD8, são citotóxicas e constituem 10% dos linfócitos.

Estas pertencem à imunidade inata uma vez que reconhecem padrões antigénicos inespecíficos
em vez de expressar recetores específicos e fazer recombinação somática.

Ativação das NK

A sua ativação é demasiado complexa e envolve a


conjugação de vários estímulos provocados por muitos
complexos recetor-ligando diferentes. Destes todos
apenas iremos falar de um, que é a “missing self”
hipothesis.

A missing self hipothesis diz que existe uma resposta


mediada por NK quando as células-alvo não têm MHC1
à sua superfície.

P á g i n a 62 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Normalmente, todas as células expressam fragmentos dos péptidos expressados na célula à sua
superfície através das moléculas MHC1 que serão depois reconhecidos pelos linfócitos T CD8.
No caso das células tumorais ou infetadas pode haver uma seleção das células que não
expressam MHC1 (e, portanto, não são reconhecidas pelos CD8), fugindo assim à imunidade
celular mediada por CTLs. As NK evitam que isto aconteça.

As NK possuem à sua superfície os recetores KIR (killing inibition receptor) que irão reconhecer
o MHC1 e emitir sinais inibitórios. Quando esta ligação não acontece (devido à falta de MHC1),
apenas sinais ativatórios são integrados e a NK é ativada.

Nesta figura estão representados vários estímulos que, quando conjugados, ditam a ativação ou
não de uma NK.

Ativação e Funções das NK

As células virais ou tumorais que expressem MHC1 irão apresentar péptidos à sua superfície que
serão reconhecidos por anticorpos, ocorrendo opsonização da célula.

As NK irão se ligar às regiões constantes desse anticorpo, o que vai provocar a sua ativação.
Portanto, NK apresentam uma citotoxicidade dependente de anticorpos (ADCC – antibody-
dependent cell-mediated cytotoxicity).

A ligação entre o anticorpo e a NK é devida a presença


de um tipo de recetores, os recetores FC Y, em
particular o CD16, que irá reconhecer as tais regiões
constantes dos anticorpos IgG1 e IgG3.

P á g i n a 63 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Após esta ativação, o mecanismo de morte celular é muito semelhante aos CD8. As NK possuem
grânulos com granzimas e perforinas que irão ser libertados para a sinapse imunológica aquando
da ativação da NK. As perforinas criam poros na membrana da célula- alvo, o que permite que
as granzimas migrem para o citosol e ativem as caspases, que provocarão apoptose.

Portanto vai haver entre uma ligação entre imunidade adaptativa (anticorpos altamente
específicos contra o antigénio) e inata (NK), uma vez que as NK irão matar as células que foram
reconhecidas anteriormente pelos anticorpos.

Resposta dos Linfócitos T Convencionais

A resposta primária consiste na resposta consequente da primeira interação daquele agente


patogénico com o nosso organismo. Esta começará num reconhecimento do antigénio, seguida
de uma expansão clonal e diferenciação e por fim uma contração e formação de células de
memoria.

Vão ser estas células de memoria que permitirão que a resposta secundária (isto é, uma resposta
a um agente patogénico que já nos tinha infetado anteriormente) seja mais eficaz e mais rápida.

As células de memoria também são a base da vacinação, em que colocamos o nosso organismo
em contato com um determinado antigénio, para criarmos uma resposta imunológica com a
formação de células de memória. A resposta recorrente de um contacto posterior com um
agente patogénico com o mesmo antigénio para o qual fomos vacinados resultará numa
resposta muito mais eficaz e rápida do que se não tivéssemos vacinado (Nota: as células de
memória não causam autismo).

P á g i n a 64 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Diferenças Entre Resposta Primária e Secundária

A resposta secundária, causada pela presença de células de memória, distingue-se da resposta


primária pois:
• Existe uma maior frequência de células especificas;
• As células especificas existentes são mais capazes de lidar com o agente patogénico.

Enquanto que numa resposta primária nós temos cerca de 1/1milhão de células T especificas
para um dado antigénio, a frequência das células de memória é de 1/10.000.

As células de memória são ainda mais duradoras (duram durante anos) que as células T naïve
(uma célula T efetora [já ativada] dura dias), têm um ciclo celular mais rápido e a sua resposta é
independente de citocinas indutoras.

A resposta mediada por células de memória (resposta secundária) é muito mais rápida que a
resposta primária uma vez que as células de memória não necessitam de sofrer maturação (já
sofrerem aquando do 1º contacto com o agente patogénico e guardam essas informações a nível
epigenético).

E é por já terem sofrido essa maturação e guardado a informação a nível epigenético, que a
resposta induzida pelas células de memória será mais eficaz (isto é, eliminam melhor o agente
patogénico) que aquela induzida por células naïve.

Células T de Memória

A ativação das células T de memoria levará à


formação de 2 tipos de células de memória:
• Células de memoria efetoras;
• Células de memoria centrais;
As células de memoria efetoras estão nos
tecidos periféricos e prontas a reagir.
As células de memoria centrais estão nos
tecidos linfoides à espera de reagir a segunda
vez perante a infeção.

P á g i n a 65 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Memória Imunitária

A memoria imunitária resume-se a padrões epigenéticos. Os genes que foram utilizados na


resposta a determinado agente patogénico (por exemplo das citocinas efetoras) estarão
guardados em eucromatina (zona de cromatina descompactada) e, portanto, acessíveis aos
fatores de transcrição e a toda a outra maquinaria responsável pela transcrição. Enquanto que,
nas células naïve, todos os genes efetores estão em heterocromatina (zona de cromatina
compactada) e, portanto, inacessíveis.

Células T Reguladoras

A sua função será regular e garantir a homeostasia do sistema imunitário.

P á g i n a 66 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula 6 – Imunidade Celular I


Data Docente
11/10/2021 Prof. Doutor Bruno Silva Santos

Immune responses to viruses: NK cells and cytotoxic T cells

Os vírus que podem infetar o nosso organismo podem ser de vários tipos:

Citopáticos

• Interferem com os mecanismos celulares vitais


• Provocam a morte do hospedeiro na ausência de uma resposta imunitária rápida e
eficiente
• Exemplos: poliovírus, rabies vírus, variola vírus, influenza, SARS-CoV-2

Não citopáticos

• Replicam dentro da célula hospedeira sem interferir com os mecanismos vitais


• Estabelecem infeções crónicas
• A doença é provocada pela resposta imunitária do hospedeiro (CD8 e NK eliminam as
células infetadas) e pela ativação crónica
• Exemplos: hepatite B/C, HIV

Intermitentemente citopáticos

• Exemplos: herpes simplex, citomegalovírus, Epstein-barr

Uma infeção viral pode causar graves consequências em indivíduos imunosuprimidos. Embora
existam múltiplas barreiras físicas (pele, mucosas), os vírus conseguem entrar muitas vezes no
organismo sendo essencial montar uma resposta imune, baseada em elementos inatos
(resposta imediata e não especifica) e adaptativos
(resposta celular/humoral, tardia, especifica e
geradora de memória contra infeções secundárias).

As células dendríticas e os macrófagos são os


principais responsáveis pela primeira resposta inata
(atuam nas primeiras horas); segue-se uma segunda
onda de resposta mediada por células NK (são um tipo
de linfócitos). Nos seguintes ~7dias de infeção,
predomina a ação dos linfócitos T e B. De forma geral,
são estas as principais células efetoras numa resposta
imune.

Podemos ver no gráfico ao lado a integração dos


mecanismos da imunidade inata e adaptativa ao longo
do tempo.
P á g i n a 67 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Imunidade inata contra vírus

A resposta imune inata envolve a produção e secreção de vários interferões por células
dendríticas/macrófagos. Os interferões têm como função inibir a replicação viral. Por vezes, esta
ação primordial é suficiente para controlar a infeção; no entanto, frequentemente esta barreira
inata não é suficiente e é necessário montar uma resposta adaptativa. A verdade é que os vírus
representam os microrganismos mais capazes de subverter a resposta imune do hospedeiro.

O interferão alfa e beta são exemplos dos interferões mais relevantes que, para além de
amplificarem a ativação das células dendríticas, estimulam também os níveis de resposta
seguintes, nomeadamente a ação das células NK e a própria resposta adaptativa – melhoram a
resposta inata e fazem a ponte para a resposta adaptativa.

Células NK

Têm origem hematopoiética na linhagem linfoide


e representam cerca de 10% dos linfócitos do
sangue. Respondem de forma muito rápida e não
especifica. Como não expressam RAG não são
capazes de fazer recombinação somática e,
consequentemente, não expressam recetores
específicos de antigénios (TCR ou BCR). Têm
ainda a capacidade de receber sinais inibitórios
pelo MHC I (explicado mais à frente)

Estas células encontram-se amplamente


distribuídas pelo corpo, nomeadamente no sangue, medula óssea, baço, fígado, gânglios
linfáticos, pulmões e útero.

P á g i n a 68 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

• Por existirem no útero é muito importante que as NK reconheçam o feto como self; o
reconhecimento do feto como estranho pelas NK (devido à presença de antigénios do
pai) pode induzir um aborto espontâneo – tem de haver tolerância por parte das NK.

As células NK distinguem muito bem entre saudável e anormal – detetam qualquer alteração
decorrente de uma infeção viral, embora respondam também muito bem a alterações tumorais
ou stress celular. Para isso, as células NK usufruem de um conjunto de recetores de superfície
que controlam a sua ativação, proliferação e função efetora.

O que as distingue estas células dos linfócitos T foi inicialmente exposto na hipótese das missing
cells. As moléculas de MHC I são expressas em todas as células nucleadas do organismo, sendo
importantes para apresentar às células T CD8+ o que esta dentro das nossas células. De acordo
com esta hipótese, o MHC I não ativa as NK, mas sim inibe-as de forma a evitar que estas
ataquem o self.

Os recetores inibitórios existentes à superfície das células NK reconhecem o MHC I do próprio e


desencadeia uma resposta de “no killing” mediada por recetores KIR (killer inibitory receptors).
Se uma célula estiver infetada por um
vírus, muitas vezes há perda de MHC I à
superfície; assim estas células tornam-se
mais suscetíveis à destruição pelas NK
porque deixa de haver um sinal inibitório.
Esta hipótese foi a primeira tentativa de
explicar o funcionamento das NK.

P á g i n a 69 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Nota: os eritrócitos, sendo as únicas células do corpo que não expressam MHC I, apresentam
uma molécula de substituição de forma a travar o ataque das NK. Só se os eritrócitos estiverem
infetados por malária é que é preciso a expressão do ligando do AR (activating receptor) para
ativar as NK.

No entanto, isto não é suficiente – não basta deixar de haver o sinal inibitório para as NK
atuarem. A interação entre a célula NK e a célula alvo é altamente complexa, envolvendo
múltiplos recetores como vemos abaixo, alem do KIR que se liga ao MHC I.

Assim, além da inibição das NK mediada por KIRs, existem recetores que medeiam a
citotoxicidade das NK através de sinais positivos emitidos pela ativação de NCRs (natural
citotoxicity receptors), sendo um dos principais recetores o NKG2D. É o balanço e integração
destes sinais de inibição e ativação na superfície da célula NK que define se esta vai ou não
atuar.

P á g i n a 70 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Imunoevasão das células NK pelo citomegalovírus


(HCMV)

O recetor NKG2D tem ligandos específicos de 2


subfamílias, MIC e ULBP. A sua ação é crucial para a
ativação das NK. Mas o citomegalovírus consegue
codificar proteínas e microRNAs que interferem com a
expressão dos ligandos do NKG2D nas células que
infeta, impedindo que a célula infetada seja
reconhecida pelas NK. Por isso, as infeções virais
conseguem passar frequentemente por cima da nossa
resposta imune inata.

Mecanismos de citotoxicidade das NK

• Citotoxicicidade natual (através dos NCRs – via da imunidade inata das NK descrita
acima)
• ADCC (antibody dependente cell-mediated citotoxicity) – via extra que é dependente de
anticorpos (pressupõe a pré-ativação de mecanismos de imunidade adaptativa). Neste
caso, os anticorpos ligam-se a proteínas virais expressas à superfície da célula infetada;
as células NK têm recetores que se ligam aos anticorpos, e perante este
reconhecimento disparam contra a célula infetada. Assim, as células NK podem ajudar
a matar células infetadas mesmo durante a imunidade adaptativa se for necessário.

O recetor das NK que lhes permite a ligação aos anticorpos chama-se CD16 – liga-se à
parte constante dos anticorpos (não tem especificidade). Assim, as células NK não têm
mecanismos específicos para reconhecer uma célula infetada, mas são altamente
sensíveis à presença destes anticorpos. Neste caso, as células NK libertam grânulos com
granzimas e perforinas quando se ligam aos anticorpos. Quando os grânulos se fundem
com a célula infetada, há a expulsão do seu conteúdo na célula infetada. As perfoninas
complexam-se para formar um poro, e é através deste poro que as granzimas são

P á g i n a 71 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

injetadas na célula infetada. As granzimas processam as capasses e desta forma ativam


a apoptose da célula alvo. Esta via chama-se via da exocitose de grânulos.
Paralelamente pode ser ativada também a via do ligando do Faz que culmina na
ativação da mesma via de morte celular (mas não vamos abordar).

Produção de citocinas

As células NK não matam apenas, libertam também citocinas. O interferão gama é o principal
mediador da sua própria atividade (este é expresso por vários tipos de linfócitos, NK, CD4, CD8,
etc).

O interferão gama atua sobre várias células e mecanismos:

Depois da ação das NK, se o vírus se mantiver, será necessária uma terceira onda de resposta
mediada pelas células CD8 (resposta citotóxica).

P á g i n a 72 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Ativação dos linfócitos CD8

A ativação destes linfócitos CD8 depende dos 3 sinais de ativação referidos na aula anterior
(apresentação do antigénio via MHC, moléculas co-estimuladoras e libertação de citocinas).
Estes sinais são fornecidos sobretudo pelas células APC, no entanto as células CD4 são altamente
relevantes para ajudar as APC na ativação das CD8.

As CD4 são a maior fonte de IL-2 e, sendo este o fator de crescimento de todas as células T, vai
permitir expandir as células CD8 – mecanismo de priming das CD8.

Por outro lado, as CD4 ajudam a ativar as células dendríticas (inclui coestimulação) – mecanismo
chamado de licenciamento das APCs. É este mecanismo que diz para as células dendríticas
ativarem ainda mais as células T CD8.

Este mecanismo é mediado pelo recetor CD40; na sua ausência, há uma falha na resposta das
células CD8 (passam a ter um tempo de vida muito curto e não desenvolvem memória).

Os mecanismos efetores das células CD8 são idênticos aos das células NK, expressando
exatamente os mesmos elementos; a diferença é que as NK atuam sobretudo na resposta inata,
enquanto as CD8 dominam o ataque durante a fase adaptativa. As CD8 distinguem-se das CD4

P á g i n a 73 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

porque estas últimas não são responsáveis por matar, mas ajudam as restantes células a atuar
na resposta imune.

O que as CD8 fazem que as NK não fazem, é a produção de memória imunitária. As CD8, depois
da sua resposta e eliminação do vírus, mantêm em circulação um pool de linfócitos de memória
para que se o mesmo vírus voltar a entrar no organismo, as células possam responder de forma
rápida e muito mais eficaz (passam a ser especificas para um dado antigénio viral). No gráfico
podemos ver que passa a haver 100x mais células T especificas para aquele vírus após a primeira
infeção. Isto permite que a carga viral passe a
ser menor e, consequentemente, a
transmissibilidade diminua também – este é o
princípio da vacinação.

P á g i n a 74 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula 7 – Imunidade Celular II


Data Docente
11/10/2021 Prof. Doutor Marc Veldhoen

Células T CD4 são também designadas por linfócitos T helper (Th), e podem ser polarizadas em
diferentes fenótipos conforme a necessidade:

Diferenciação dos linfócitos T CD4

Após a ativação induzida por péptidos reconhecidos por moléculas MHC II presentes nas APC,
os linfócitos CD4 naive entram num programa de diferenciação que pode levar à formação de
vários tipos de linfócitos. O programa de diferenciação é ativado pelas células dendríticas,
sendo o processo influenciado por fatores genéticos e ambientais, nomeadamente o
microambiente citocínico.

No entanto, o programa de diferenciação


ativado poderá ser influenciado por outros
fatores como as células dendríticas em si,
força da interação entre o TCR e o
MHC:péptido e a presença de co-
estimuladores. Em qualquer caso, a
agregação de recetores presentes no
linfócito T CD4 naive, quer por ligandos
presentes na célula dendrítica quer por
citocinas presentes no microambiente
onde o linfócito T é ativado, inicia uma
série de sinais intracelulares que
culminam na ativação de fatores de
transcrição que irão regular a transcrição
de genes para citocinas e outros fatores
reguladores. Porém é importante salientar que o programa de diferenciação dos linfócitos T CD4

P á g i n a 75 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

não é linear; ou seja, pode resultar na ativação de várias células T CD4, em que uma delas será
predominante.

Devido ao reconhecimento de padrões, as células dendríticas ficam a saber que tipo de infeção
se trata para poderem adequar a resposta imune.

Assim, múltiplas pistas resultantes da especificidade dos antigénios microbianos determinam a


diferenciação das células CD4. É a conjugação dos 3 sinais (MHC, moléculas co-estimuladoras e
citocinas) que induz não só a sua ativação, proliferação e sobrevivência, mas também a sua
diferenciação.

De forma geral pode dizer-se que as células T efetoras CD4+ ligam o reconhecimento específico
de microrganismos (pelas células dendríticas) ao recrutamento e ativação de outros leucócitos
para a destruição do agente infecioso. Cada tipo de
leucócito está especialmente adaptado para destruir
certas categorias de microrganismos, por isso, a natureza
dos leucócitos recrutados e ativados, tem de ser
determinada pela subcategoria de célula T CD4+ efetora

que é induzida na resposta imune, o que depende do


microrganismo invasor.

P á g i n a 76 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Em geral, células TH1 ativam macrófagos, células TH2 recrutam e ativam eosinófilos, e as
respostas induzidas por células TH17 são dominadas por neutrófilos (e um número variável de
macrófagos).

Esta cooperação entre linfócitos T e outros leucócitos reforça um elo importante entre as
imunidades adaptativa e inata: através da secreção de citocinas, as células T CD4 estimulam e
focam a atividade de células efetoras da imunidade inata (como os fagócitos), convertendo
assim estas células em agentes da imunidade adaptativa.

Linfócitos Th1 – são caracterizados pela produção de IL2, IFN-gama e TNF-beta, as duas últimas
com propriedades inflamatórias, e pela expressão do recetor CD28.

• A sua diferenciação ocorre na presença de IL-12 (libertada pela célula dendrítica com os
fatores de transcrição STAT-4 e STAT-1 ativados) e requer a ativação do fator de
transcrição Tbet nas células Th1;

P á g i n a 77 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

• São responsáveis por potenciar respostas contra bactérias intracelulares e vírus,


mediadas por outro tipo de linfócitos (CD8, NK), estando assim envolvidos na regulação
de respostas celulares (as Th1 não atuam sozinhas nunca contra a infeção
viral/bacteriana, não é suficiente; ajudam na verdade as CD8)
• São também eficazes a lidar com células tumorais.
• Atuam através da ativação de macrófagos; além disso, quando um macrófago está
infetado por exemplo, pode precisar da ajuda de células Th1 – estas informam o
macrófago sobre a gravidade da situação e induzem a fagocitose dos antigénios
microbianos pelo próprio macrófago.
• A sua ação exacerbada pode estar na base de alguns problemas de autoimunidade.

Linfócitos Th2 – são caracterizados pela produção de IL4, IL5, IL9, IL10 e IL13, e por expressar o
recetor CD28.

• A sua diferenciação ocorre na presença de IL-4 (libertada pela célula dendrítica com o
fator de transcrição STAT-6 ativado) e requer a ativação do fator de transcrição Gata-3
nas células Th2;
• São responsáveis por regular respostas mediadas por anticorpos produzidos pelos
linfócitos B contra agentes patogénicos extracelulares (ex: helmintas) e alergénios,
estando envolvidos na regulação de respostas humorais.
• Respostas exacerbadas podem estar envolvidas em reações alérgicas (ex: asma).
• Atua através do recrutamento de eosinófilos e mastócitos (induzem a libertação de
histamina por estas células), da produção de muco (ajuda a manter os microrganismos
longe das barreiras epiteliais) e da via ADCC (antibody dependent cell-mediated
citotoxicity). As células recrutadas dependem das citocinas libertadas.

Nota: Th2 atua apenas contra parasitas extracelulares; se forem intracelulares, a sua
eliminação vai depender de uma resposta Th1.

P á g i n a 78 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Linfócitos Treg – limita a resposta evitando respostas imunes exageradas. Consequência: pode
bloquear/diminuir a resposta anti-tumor ou o efeito das vacinas.

• São células CD25+, permitem manter a tolerância do self, fazem down-regulation da


resposta imune e suprimem as células T autoreativas que escaparam a seleção negativa
no timo.
• As citocinas efetoras são IL10, TGF-beta1 e IL35 (são importantes para regular a ação
dos linfócitos CD8). Requer a ativação do fator de transcrição Foxp3 – a mutação no
gene que codifica para o Foxp3 está associada ao desenvolvimento de autoimunidade
pelo fenótipo defetivo das células Treg.

P á g i n a 79 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Linfócitos Tfh – gerem e comandam a imunidade mediada por células B; como consequência
pode afetar mecanismos de autoimunidade.

• A sua ação é ainda pouco compreendida e subestimada.

• Células Tfh libertam sinais de sobrevivência que ajudam na maturação dos anticorpos
produzidos, assim como na produção de linfócitos B de memória e plasmócitos com
grande tempo de semi-vida.
• A sua ação depende da sua localização folicular, mas de forma geral interagem com os
linfócitos B nos centros germinativos – esta interação é bidirecional.
• Requerem a expressão do fator de transcrição BCL6
• Libertam IL21
• Podem existir vários tipos de Tfh, que podem ser um
bocadinho de outros Th (1, 2, 17…) de forma a
instruir as células B sobre quais os anticorpos que
deve produzir.
• As células Tfr funcionam como reguladores negativos
das Tfh.
• Podem estar envolvidas na produção excessiva de
anticorpos

P á g i n a 80 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Linfócitos Th17 – são caracterizados pela produção quase


exclusiva de IL17 e por expressarem o recetor CD28.

• A sua diferenciação precisa de IL6 e TGFbeta (fator


de transcrição STAT-3) – estas citocinas são
reconhecidas por recetores de superfície em células
CD4 naive. Requerem a expressão do fator de
transcrição RORgama-t nas células Th17.
• São responsáveis também por produzir grandes
quantidades de IL22.
• Os linfócitos Th17 são células altamente
inflamatórias, responsáveis por promover respostas
imunológicas contra bactérias extracelulares e
fungos, através do recrutamento de monócitos e
neutrófilos.
• Estão envolvidas em algumas reações de
autoimunidade (ex. doenças autoimunes como a
psoríase, artrite reumatoide e esclerose múltipla –
para estas duas últimas o cenário é mais complexo
então ainda não há terapia eficaz como para a
psoríase).

Em suma:

P á g i n a 81 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula 8 – Imunidade das Mucosas


Data Docente
15/10/2021 Prof. Doutor Marc Veldhoen

Uma componente muito importante do sistema imunitário são as barreiras externas: são estas
as primeiras barreiras/defesas físicas do organismo humano aos agentes patogênicos.

Esta barreira compreende uma série de tecidos especializados tais como: a pele, as amigdalas e
outros nódulos linfáticos, órgãos do trato respiratório, órgãos do sistema reprodutor e do trato
gastrointestinal.

P á g i n a 82 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Estes locais representam importantes portas de entrada do organismo humano para qualquer
agente patógenico; são por isso locais onde se inicia a infeção, estão mais expostos
(acessibilidade). É importante considerar que as infeções não ocorrem espontaneamente: há
sempre envolvimento desta barreira.
Podemos também pensar no contacto físico com o agente infeccioso, que só se torna patogênico
em casos de imunidade debilitada: feridas e picadas de mosquitos.

P á g i n a 83 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Deste ponto de vista, é interessante analisar as doenças infeciosas que mais contribuem o
número de mortes:

Os agentes infecciosos podem ter diferentes formas de atuação: podem produzir exotoxinas,
endotoxinas ou ainda ter efeitos citotóxicos diretos que inviabilizam a célula. Contudo o
sistema imune também pode comprometido.

P á g i n a 84 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Nos órgãos/sistemas barreira do organismo existem várias estratégias pata assegurar a função
protetora: função mais mecânica (relacionada com a anatomia destes órgãos), função efetora
(relacionada com células T, B e anticorpos) ou ainda imunoreguladora

P á g i n a 85 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

A resposta imunitária compreende várias fases: aderência ao epitélio, penetração no mesmo e


infeção propriamente dita. Depois da infeção estabelecida, o organismo recorre aos
mecanismos de imunidade adquirida para combater a infeção.

Esses órgãos/regiões estão altamente colonizados, mas um aspecto relevante é que as espécies
colonizadoras são bastante seletivas.
Em particular, esta colonização depende dos nutrientes existentes e percebemos que existem
uma grande colonização do trato gastrointestinal, que se inicia logo no estomago (com a infeção
por helicobacter). Este número de bactérias colonizantes vai aumentado progressivamente ao
longo do trato gastrointestinal (duodeno, jejuno, ileum e colon)

P á g i n a 86 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

O organismo humano também se adaptou a esta colonização diferencial do trato


gastrointestinal. A camada de muco cresce exponencialmente no íleum e no colon para proteger
o organismo humano da colonização por bactérias nestes locais, mantendo-as afastadas do
epitélio intestinal.

P á g i n a 87 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Uma das coisas que mais contribui para a diversidade do microbiota intestinal é a alimentação.
De referir, que a microbiota do organismo começa a ser desenvolvida logo na altura do
nascimento através de barreira placentária.

Teorias mais recentes apontam que o estilo de vida atual (dieta pobre em nutrientes e
diminuição de exercício físico) podem estar a contribuir para que diversas bactérias benéficas
estejam a ser eliminadas do organismo, o que nos torna ainda menos saudáveis. É assim um
ciclo vicioso.
Se por um lado, a vacinação erradicou ou quase erradicou muitas doenças, observa-se agora um
aumento de doenças autoimunes e alergias.

Entrando em maior detalhe no tema é importante referir que estas barreiras têm uma
componente anatômica (relativo à layer de células epiteliais) e uma componente fisiológica (pH,
saliva, muco, fatores solúveis (interferões, lisozimas, peptídos) e a própria microbiota.

P á g i n a 88 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Em mais detalhe, o papel da microbiota intestinal pode ser dividido em:


1) Funções metabólicas (produção de vitamina k e metabolização dos produtos ainda não
metabolizados, absorção de água)
2) Proteção contra outras bactérias patogénicas (se a microbiota for saudável pode
prevenir a proliferação de bactérias patogênicas; se por outro lado houver um
desiquilíbrio da mesma a infeção fica facilitada; foi dado o exemplo do clostridium
difficile

3) Produção de muco
4) Constituem alguns tecidos/estruturas linfoides (placas de payer)
5) Contribuem para a maturação/desenvolvimento da mucosa e estruturas do sistema
imune.

Todas as células são importantes para o estabelecimento de imunidade (neutrófilos, macrofilos,


lifocitos T e B) mas de realçar o papel importante das células epiteliais (expressam MHCII). Em
especial expressam toll like recepors, que conferem uma especialização importante para o
reconhecimento de patogénios.

P á g i n a 89 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

No esquema anterior podemos perceber que as M cell, ao reconhecerem o agente infecioso


transmitem sinal a globet cells vizinhas de modo a produzirem muco. Este é assim o primeiro
mecanismo de defesa para que as bactérias se mantenham afastadas da barreira epitelial. As
células M também enviam sinais para as paneth cells que produzem proteínas anti-microbiais
(esta indução por parte das células M é proporcional às bactérias com que contactam).
Anatomicamente, quase todos os sistema barreira são estratificados.
Podemos pensar no caso da pele, constituída por derme e epiderme, o que permite que em caso
se infeção, a epiderme possa ser considerada descartável, e se torne difícil atingir de derme

Se considerarmos o intestino, conseguimos perceber uma estrutura de defesa anatômico-


funcional menos evidente. Na região da lâmina própria existem células de defesa (macrófagos,
células T...). Contudo, na layer de células epiteliais existem células integradas e especializadas:
linfócitos intraepiteliais

P á g i n a 90 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Desconhece-se ainda a função destes linfócitos intraepiteliais, mas especula-se que quando uma
célula epitelial é infectada, estes linfócitos já estejam presentes nesta layer de células e que não
precisem de ser ativados por célula dendrítica o que poderia ser demasiado demorado. Desta
forma, é um mecanismo de defesa momentâneo/mais rápido uma vez que não necessitam de
ser ativados pata expressar granzimas e perforinas.

De referir que, uma vez que estas celulas se mantem na layer epitelial, quando entram em
contacto com determinado antigenio vao promover a expressao de determinados receptores
nas celulas epiteliais vizinhas.

P á g i n a 91 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Sobre o intestino preciso referir estruturas linfoides especializadas, que têm uma ação imune
localizada (e por isso mais rápida): placas de Peyer e fólicos linfoides isolados (ainda mais
pequenos)

Apesar disto, é ainda preciso considerar outros mecanismos/células de defesa:


1) Células dendríticas
2) IgA (capazes de neutralizar a bactérias patogênicas; por transcitose são deslocam-se do
polo apical para o polo basal da célula sem desencadear uma forte resposta imune; sem
resposta inflamatória exagerada).
3) Apoptose
4) Prolongamentos (dendrites) das células dentriticas que se projectam entre células
epiteliais

P á g i n a 92 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Relembrando apenas que as células dendríticas tem um papel regulatório do sistema imune. Por
um lado, são ativadoras de linfócitos T efetores e por outro, em situações onde não se pretende
uma resposta imunitária tão inflamatória vão polarizar células T naif no sentido Treg (células T
reguladoras).

Numa tentativa de concluir sobre esta interação entre as células M e ativação de células
dendríticas, apenas ter em consideração que a células M têm localização uma preferencial.
Células M estão localizadas no topo de estruturas linfoides (placas de Peyer e folículos linfoides
isolados).

As amigdalas correspondem a estruturas inicias do sistema gastro-intestinal e que se aproximam


funcionalmente às placas de Peyer

O sistema imune vai-se desenvolvendo ao longo da vida. E é extremamente importante


relacionar o papel/interação do IgA com as células epiteliais. As células epiteliais conseguem
captar IgA’s a partir da sua face basolateral, por transcitose esta imunogina é transporta no
interior da célula e é depois libertada na sua face apical. Esta secreção de imunoglobulinas é
dependente da microbiota intestinal (microbiotota ativa células dendríticas que por sua vez vão
ativar células T helper especificas que por sua vez irão ativar células B especificas, modulando
assim a expressão de células B).
P á g i n a 93 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Estes anticorpos não se ligam apenas a agentes patogicos (bactérias propriamente dito) mas
também têm um papel importante na neutralização de toxinas. Relativamente a toxinas, a
produção de anticorpos é a única forma de defesa do organismo e foi dado como exemplo o
tetanus.

De referir que 1 em cada 500 pessoas não produz IgA’s, ficando mais susceptíveis a infeções
intestinais, dos pulmões ou cutâneas.

P á g i n a 94 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula 9 – Imunidade Humoral


Data Docente
19/10/2021 Profª. Doutora Leonor Sarmento

Imunidade humoral envolve todas as respostas mediadas pelos linfócitos B e anticorpos. Diz-se
humoral porque os mediadores são substâncias encontradas nos fluidos corporais, designadas
primordialmente por humores.
Anticorpo – é uma proteína da superfamília
das imunoglobulinas e existe em 2 formas:
• Forma secretada
• Forma ancorada à membrana das
células B através dos BCR.

Se houver um tumor num determinado grupo de células secretoras de anticorpos, um dos tipos
de globulinas pode tornar-se dominante, alterando o padrão de expressão.

Do ponto de vista funcional, a molécula do anticorpo divide-se em duas regiões:


• Região F(ab) – corresponde à porção variável (V) das imunoglobulinas (região mais
periférica do anticorpo, em V) que contêm os locais de ligação dos antigénios
o Região diversa – há recombinação VDJ
o Passível de regulação pelos mecanismos de tolerância
o Estabelece a especificidade entre o antigénio e a reatividade das células B
o Estimula a expansão clonal das células B durante a resposta imune
o É alvo de um processo de maturação de afinidade durante a resposta humoral

• Região Fc (cadeia pesada) – é a porção constante (C), responsável pelo recrutamento


de funções efetoras que visam a eliminação do antigénio reconhecido pela região F(ab).
Isto é feito através da interação da região constante com elementos da imunidade inata
como as moléculas do complemento ou as células com recetores Fc
o Existem diferentes tipos de regiões constantes que medeiam diferentes tipos
de funções de destruição ou funções efetoras.

P á g i n a 95 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

A região variável do anticorpo tem várias regiões hipervariáveis; todas elas se centram na
porção rearranjada do gene VDJ, tanto da cadeia pesada como leve. Podemos distinguir 3
regiões:
• Região de complementaridade 3 (CDR3) – constituída pela própria junção do rearranjo
VDJ,
• Região de complementaridade 1 (CDR1) E 2 (CDR2) – centradas em porções do
segmento V que tem variabilidade intrínseca e que durante a resposta imune são alvos
de mutações que alteram a afinidade dos anticorpos.

Se a região variável, apesar de incorporar múltiplos aspetos da imunidade adaptativa, também


falha em alguns aspetos em cerca de 1% das vezes:
• Fenómenos de reatividade cruzada (exemplo: está na base da patologia da febre
reumática por infeção de Streptococcus pyogenes, onde ocorre por reação cruzada a
destruição do tecido valvular cardíaco)
• Formação de neo-antigénios (desenvolvimento de trombocitopenia pela presença de
heparina – induz a formação de um neo-antigénio à superfície das plaquetas)

Os anticorpos podem apresentar


diferentes isótipos (variantes) das cadeias
leves e pesadas:
• Nas cadeias leves, os 2 isótipos
que existem correspondem aos 2
genes capazes de dar origem às cadeias leves: K (~60% dos anticorpos circulantes) e
lambda (~40% dos anticorpos circulantes) – estes genes são rearranjadados durante o
rearranjo VDJ que ocorre na diferenciação hematopoiética dos linfócitos na medula
óssea.

Nota: quando esta proporção 60-40 se altera, existe uma evidência de patologia clonal de
linfócitos B secretores de anticorpos (ex: mieloma múltiplo)

P á g i n a 96 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

• Os isótipos de cadeia pesada (IgM, IgG, IgA, IgE) não correspondem a genes diferentes,
mas sim a segmentos génicos diferentes do gene que codifica a cadeia pesada. Quando
na medula durante a recombinação VDJ se rearranja a região génica que codifica para a
porção variável, o que acontece devido ao splicing alternativo é que à região VDJ é
acoplado o segmento que codifica a IgM ou IgG. Assim passamos a ter células B com
BCR específicos de cada um destes 2 tipos de isótipos. Mais tarde durante a resposta
imune, quando as células B são estimuladas pelo antigénio, acontecem outras trocas e
recombinações que vão diversificar a
resposta da região constante
relativamente à eliminação do
antigénio/microrganismo.

BCR (B-cell receptor)


A recombinação VDJ e o splicing alternativo que dá origem ao BCR tipo IgM são fenómenos que
acontecem durante o desenvolvimento hematopoiético dos linfócitos na medula. Mas depois
esses linfócitos, que são maduros do ponto de vista do desenvolvimento, mas que nunca viram
nenhum antigénio (naïves do ponto de vista imune), vão para o sistema linfoide periférico
(gânglios, rede linfática, baço e para as portas de entrada que fazem a interface com o exterior
– pele, mucosas) e é a este nível que a resposta imune efetora vai acontecer.

Tipos de células B e respostas


A diversidade, especificidade, expansão clonal, a tolerância e memória são aspetos importantes
da resposta imune adaptativa (depende primordialmente dos linfócitos B e T).

P á g i n a 97 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

As células B que por


excelência executam
este tipo de resposta
adaptativa são
designadas por B2 ou
célula B folicular – são
as células que existem
nos folículos linfoides
do baço e gânglios
linfáticos.
Mas existem outras
células que embora
tenham a capacidade
de exercer os seus
mecanismos de defesa através da secreção de anticorpos, a forma como atuam, o grau de
maturação e a falta de mecanismos de memória, se traduz numa resposta rápida e que não é
adaptativa. Estamos neste caso a falar dos innate-like B lymphocytes. Exemplos:
• B1 – existem nas cavidades primitivas (peritoneal e pleural) ao nível das serosas
• MZB – células B da zona marginal que só existem no baço, na região periférica do folículo
linfoide

A resposta adaptativa das células B2 que produz células de memória, permite maturação de
afinidade e trocas de isótipo é uma resposta T dependente. Como só as estruturas proteicas são
capazes de estimular o recetor das células T, e como a resposta B depende de sinais de ativação
destas células T, então esta só pode existir também no contexto de antigénios proteicos.
Por outro lado, as innate-like B lymphocytes atuam de forma independente da estimulação pelas
células T. Na verdade, a sua resposta é baseada numa série de antigénios que podem ou não ser
dependentes da sinalização dos recetores das células B

P á g i n a 98 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Respostas T independente Resposta dependente de


com antigénios tipo 1 e 2 antigénios proteicos e células T

Os antigénios 1 nas respostas T independentes não estimulam os BCR; as células B são ativadas
através de sinais da imunidade inata (linfócitos B também expressam à superfície recetores do
tipo Toll). Estes antigénios representam, por exemplo, lipopolissacáridos presentes na parede
celular de bactérias. Naturalmente, esta trata-se de uma resposta policlonal porque são ativadas
várias células B de forma inespecífica.

De forma semelhante, os antigénios tipo 2 são também proteínas de padrão repetitivo


parecidas aos ligandos dos recetores do tipo Toll, mas na verdade estimulam também os BCR,
mas de uma forma muito particular – o que é reconhecido em tandem pelos vários recetores
presentes na superfície das células B são os padrões repetitivos de moléculas de açucares ou
lípidos. O sinal é de baixa afinidade, mas a avidez é alta porque estes antigénios (esqueleto
proteico com várias moléculas de açúcar) são capazes de ativar muitos BCR, produzindo um sinal
forte que ativa a célula B. Isto acontece muitas vezes com as proteínas poliméricas repetitivas e
modificadas por polissacáridos que existem na parede celular de muitas bactérias.

A resposta B dependente das células T, engloba na verdade a dependência de 3 sinais:


• Reconhecimento do antigénio pelo BCR
o A sinalização do BCR (Myc, Fos) estimula a proliferação do clone B certo
o Aumenta a expressão de moléculas co-estimuladoras
• Contacto entre célula B e T (esta última tem de estar a ser estimulada pelo mesmo
antigénio) – adesão e co-estimulação
o Par MHC II (B) – TCR (tfh)
o Par CD40L (Tfh) – CD40 (B), induz a ativação de vários genes que definem o
fenótipo de memoria/plasmócito (IL21), hipermutação somática para a
maturação de afinidade e a troca de isótipos de cadeia pesada (gene AID).
o Par B7 (B) – CD28 (T), esta co-estimulação consolida o final da resposta, que se
traduz num perfil citocínico particular das células T
• Citocinas libertadas pelas células T (CD4+) – definem o tipo de resposta B através da
escolha do isotipo de cadeia pesada das células B.

P á g i n a 99 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Sinais de ativação das células B

A co-estimulação através do par CD40L (Tfh) – CD40 (B) induz a ativação da enzima AID
(ativation-induced cystidine deaminase). Esta enzima é uma nucleasse que permite fenómenos
de alteração dos genes das imunoglobulinas (semelhante ao que acontece na medula) quando
há ativação das células B nos folículos linfoides e centros germinativos induzindo 2 fenómenos:
• Hipermutação somática – corresponde a um fenómeno em que várias mutações são
introduzidas pela AID nas regiões CDR1 ou 2 da região variável dos anticorpos por cada vez
que a célula B se divide durante a expansão clonal. Estas mutações traduzem-se no seguinte
acontecimento: as células que têm o BCR que reage especificamente com o antigénio de
interesse são as que vão ser estimuladas a proliferar, mas cada vez que se dividem são
originados novos BCR à superfície do clone devido à hipermutação somática (todas as novas
células B são diferentes entre si embora que originadas a partir do mesmo clone); entre estes
novos BCR, uns vão ter menor, outros igual e outros maior afinidade para o antigénio; é então
a maior afinidade de um dado BCR que vai promover a seleção da respetiva célula,
traduzindo-se em mais proliferação e sobrevivência. Este fenómeno designa-se então por
maturação da afinidade. São estas células finais que se vão diferenciar em células de
memória e em plasmócitos que passarão a produzir anticorpos e BCRs com maior afinidade
e, portanto, no futuro serão capazes de montar respostas mais eficazes e rápidas.

P á g i n a 100 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

• Troca de isótipo de cadeia pesada – é dependente de modificações de nucleóticos que a AID


introduz, mas não na mesma região do gene. O gene da cadeia pesada das imunoglulinas nos
linfócitos que estão nos gânglios e baço, tem o rearranjo VDJ feito e, por splicing alternativo,
expressam uma cadeia pesada em que a região produzida pela região VDJ está ligada a uma
região constante M ou G; isto corresponde a diferentes segmentos que existem e codificam
diferentes cadeias pesadas (IgG1, IgA, IgE etc). Durante a resposta imune, quando AID é
expressa, e de acordo com as citocinas produzidas pelas células T, a região constante
expressa juntamente com a VDJ e que codifica a IgM é cortada. Forma-se um loop em que a
parte intercalar é excisada, e o segmento que codifica para a região constante de IgG1 cola-
se à porção codificante da região variável do anticorpo. Assim, o anticorpo passa a ser IgG1
em vez de IgM. Como é que a célula B sabe qual é o rearranjo a fazer (IgG1, IgE ou IgA)?
Depende do sinal que vem do recetor das citocinas e que alteram a expressão transcricional
e ativam um
pequeno
transcrito; se a
citocina vier de
uma célula Th2 e
for Il-4, o
rearranjo seria
para a IgE por
exemplo.

Estes dois mecanismos são centrais para a qualidade da resposta adaptativa e desenvolvimento
de memória.

P á g i n a 101 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Esta tabela sumariza a relação das citocinas expressas pelas células T e que condicionam a troca
de isótipo das cadeias pesadas. Assim, uma citocina IL-4 leva as células B a expressar a mesma
região variável, mas colada a uma IgE; nas respostas Th1 a citocina efetora é o interferão gama
e este leva uma troca de isótipo para IgG2/3; nas mucosas, sob ação de TGF-beta e IL-10 há uma
troca de isótipo preferencialmente para IgA.

É no centro germinativo que as células são selecionadas positivamente para serem células de
memória (a partir da diferenciação de células B com recetores de maior afinidade) ou
plasmócitos. As células B de memoria vão responder de forma rápida e eficaz que, para além de
ser ativada com quantidades mínimas de antigénio, são excelentes células apresentadoras. Os
plasmócitos de vida longa recirculam entre a medula óssea (onde estão as suas citocinas de
suporte) e a circulação nos órgãos, e são células dedicadas à secreção de anticorpos específicos;
quando bem diferenciadas vivem na medula e recirculam quando são necessários para um 2º
contexto imune, prolongando a memória.

Mecanismos de ação dos anticorpos


As células B reconhecem antigénios específicos, são estimuladas em conjugação com as células
T e secretam anticorpos como mecanismo efetor. Mas como é que esta secreção culmina na
eliminação dos microrganismos? Através dos diferentes isótipos de cadeia pesada, que têm
diferentes estruturas proteicas e diferentes localizações preferenciais no nosso corpo.
Os anticorpos por si só
não são capazes de
eliminar um
microrganismo; apenas
são capazes de forma
independente de
neutralizar – este
mecanismo limita a
penetração do
microrganismo nas
nossas células e
perpetuação da
invasão microbiana,
assim como impede
toxinas produzidas pelos microrganismos de interagirem com os alvos no nosso corpo (isto é a
base de algumas vacinas, como por exemplo a vacina do tétano).

P á g i n a 102 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

As funções que na verdade destroem os microrganimos são executadas por proteínas do


complemento ou através de células recrutadas pelos próprios anticorpos (macrófagos, células
NK, etc). Estas células capazes de destruir os microrganismos expressam à superfície recetores
Fc que reconhecem especificamente a porção constante dos anticorpos, que por sua vez estão
ligados na porção variável ao antigénio do microrganismo invasor.
• Opsonização e fagocitose – os anticorpos (principalmente IgM) rodeiam o
microrganismo e marcam-no; depois através da sua porção constante recrutam
macrófagos (ligam-se pelo recetor Fc), induzindo assim a fagocitose. Este mecanismo é
particularmente eficaz contra bactérias.

• Opsonização e desgranulação – para destruir alguns parasitas maiores que as bactérias,


nomeadamente parasitas helmintas, a fagocitose não é eficaz. Neste caso, as IgE
reconhecem os antigénios do parasita, opsonizam-no e ativam os eosinófilos e
mastócitos através dos recetores Fc para desgranularem o seu conteúdo, culminando
na destruição do parasita.

• Citotoxicidade celular dependente de anticorpos – células infetadas por vírus


expressam à superfície proteínas virais que são reconhecidas pelos anticorpos; estes,
através da sua região constante, recrutam células natural killer (com recetores Fc) que,
uma vez ativadas, desgranulam e causam a destruição das células infetadas.

P á g i n a 103 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

• Ativação do complemento – ativação pela via clássica (dependente de anticorpos)


decorre de forma semelhante à opsonização. Uma bactéria rodeada por IgM ou IgG é
capaz de recrutar a molécula inicial do complemento (C1q), ativando uma cascata
proteolítica. O complemento representa um conjunto de proteínas produzidas pelo
fígado e que estão em circulação e que, uma vez ativadas, vão clivando as proteínas
subsequentes em fragmentos mais pequenos – são estes que vão atuar de forma
efetora.

P á g i n a 104 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Destruição mediada pelo complemento

• Os fragmentos do complemento podem funcionar como anafilotoxinas: chamam


células inflamatórias para o local onde o complemento está a ser ativado; chamam
células efetoras da imunidade inata e aumentam a capacidade dessas células serem
recrutadas pelos anticorpos para destruírem os microrganismos
• Podem funcionar também como opsoninas – fragmentos do complemento rodeiam as
bactérias e ativam a fagocitose por parte dos macrófagos.
• Os últimos elementos da cascata do complemento formam um poro (MAC) à superfície
das células infetadas, induzindo a rutura e destruição das células.

Nota: é preciso proteger as nossas células da ação do complemento; existe a lipoproteína CD59
à superfície dos eritrócitos que impede a montagem do poro (MAC) e a consequente lise. A
ausência desta proteína pode induzir a
presença de anemia hemolítica.

IgA – é uma imunoglobulina produzida


na submucosa que é transportada pela
barreira epitelial para o exterior do
tubo digestivo (mucosas). É secretada
no leite materno e transfere imunidade
para o bebe.

IgG – tem um recetor que é


capaz de transportar estes
anticorpos através da
placenta, protegendo o
bebé ainda em útero.

P á g i n a 105 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula 10 – Imunosenescência
Data Docente
21/10/2021 Profª. Ana Faria Caetano

Porque envelhecemos?

Nem todos os organismos envelhecem. As bactérias dividem-se por fissão em dois organismos
novos.

A senescência celular surge juntamente com a reprodução sexuada (há 1000 milhões de anosa
atrás) que separa o “soma” (o corpo) das células reprodutoras e do novo ser vivo.

Alguns organismos que têm reprodução sexuada, como a hidra, têm capacidade ilimitada de
regeneração e não envelhecem.

Assim as teorias que melhor explicam o porquê das células envelhecerem são:
• Teoria do Antagonismo Pleiotrópico (George Williams) – Genes cuja expressão seria
benéfica precocemente na vida se tornam deletérios mais tarde, no envelhecimento;
• Teoria do Soma Descartável (Thomas Kirkwood) – Um organismo tem a capacidade de
alocar as suas reservas de manutenção do seu soma para a reprodução.

A senescência seria o efeito deletério de genes


que foram vantajosos em períodos precoces da
vida (Franceschi, 2000). Até cerca dos 40 anos,
esses genes seriam muito importantes e estariam associados aos processos inflamatórios, por
exemplo. Após esse período, que seria coincidente com a fase reprodutiva do ser humano, esses
genes começariam a ser deletérios. A longevidade que temos alcançado ao longo do tempo,
acarreta um preço: a senescência.

Quando procuramos os mecanismos que levam à senescência celular, verificamos que todos
estão associados à manutenção da vida. Um dos principais mecanismos que leva à senescência
celular é o mecanismo da respiração celular, que ocorre nas mitocôndrias, com a produção de
ATP, através do uso do piruvato. Durante a respiração celular ocorre a produção de moléculas
parcialmente reduzidas muito reativas, os radicais livres (O2-, H2O2, OH) do oxigénio, que
danificam a mitocôndria.

P á g i n a 106 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

A senescência também pode estar associada a disfunção mitocondrial, que ocorre pela
acumulação de danos produzidos pelos radicais livres e mutações no mtDNA levando à redução
na produção de ATP. Alterações na dinâmica de fusão e fissão mitocondrial e redução da
mitofagia, levam à acumulação de mitocôndrias disfuncionais.

Metabolismo e Proliferação

Um outro mecanismo diretamente


relacionado com a vida da célula é o
metabolismo. Um dos principais
elementos do metabolismo é a quinase
mTOR, que é ativada pela insulina e pelos
aminoácidos. Esta quinase é responsável
pela proliferação celular, um dos
mecanismos que faz as células sobreviver
e proliferar. mTOR é também um ativador
da senescência, porque vai diminuir a autofagia (capacidade da célula tem de renovar os seus
componentes). Células senescentes são maiores e apresentam metabolismo elevado. Existem
algumas terapias que inibem a ação do mTOR, diminuindo o risco da senescência, são o caso da
metformina, rapamicina e resveratol. A restrição calórica, ao diminuir o aporte de proteínas e
aminoácidos, pode contribuir para o prolongamento da vida e redução da senescência. Já foram
efetuados estudos sobre esta matéria.

P á g i n a 107 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Encurtamento dos Telómeros

Em geral, as células somáticas


normais sofrem um número
limitado de divisões celulares antes
de atingirem a senescência
replicativa (Hayflick, 1965). O que
marca o limite da divisão é a perda
dos telómeros, que são o “relógio
replicativo” que regula o número de
divisões possíveis para uma célula. A
perda dos telómeros ativa o
programa de senescência celular.
Algumas células no corpo como as
células germinativas e estaminais,
possuem a enzima telomerase que repõe os
telómeros.

Quando os telómeros ficam muito curtos, são


reconhecidos como dano ao DNA. Isto leva à ativação
de p53 e indução da pausa replicativa e senescência
celular pela repressão de RB

A senescência envolve a deterioração do sistema de


reparação de DNA permitindo que os danos ao DNA
se acumulem, causando instabilidade genómica e o
mau funcionamento das células senescentes.

P á g i n a 108 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Modificações Epigenéticas – Metilação do DNA

A metilação é a introdução de um radical metilo nos dinucleótidos citosina-fofato-guanina


(CpG). Quando essa metilação ocorre num local promotor de um gene, a transcrição é inibida.

Relógio Epigenético de Horvath (2011) - A metilação do DNA mede o efeito cumulativo de um


Sistema epigenético de manutenção. Horvath caracterizou 353 sítios de CpG que juntos formam
um relógio do envelhecimento em termos de estados da cromatina. A hipermetilação do DNA é
observada em todos os mamíferos.

Fatores como encurtamento de


telómeros, metilação do DNA, danos no
DNA e disfunção mitocondrial são os
principais indutores de senescência
celular. Disfunção proteostática e de
sinalização pelos nutrientes também
podem causar senescência celular.
Células senescentes levam à exaustão
das células tronco e à inflamação
sistêmica.

Senescência Replicativa

As células quando chegam ao seu limite de


replicação, ainda são metabolicamente muito
ativas, produzindo uma série de mediadores,
grande parte deles inflamatórios. Adquire assim
um fenótipo que é chamado de SASP (Secretor
Associado à Senescência).

O SASP medeia muitas funções da célula


senescente. Ele reforça a inibição na proliferação
celular via uma alça autócrina e recruta células
imunes como macrófagos, neutrófilos e NK para
fagocitar e eliminar as células senescentes. VEGF
e MMPs remodelam o tecido induzindo
angiogénese e reduzindo a fibrose. TGF-beta
espalha o fenótipo senescente de forma
parácrina.

Assim a senescência celular é uma contradição.


Por um lado, sempre que a célula entra num stress
crónico que leva a danos no DNA, a célula pode:
• Reparar os danos;
• Progredir para tumor;
• Entrar em apoptose;
• Entrar em senescência
P á g i n a 109 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

A senescência celular pode ser acompanhada de inflamação, exaustão das células tronco e
progeria, mas também ela evita a progressão para o cancro e aumenta a capacidade de
reparação tecidular.

Fatores conservados evolutivamente que protegem contra os processos do envelhecimento:


• Enzimas anti-oxidantes como Cu/Zn superóxido dismutase (SOD) e de catalase (CAT);
• Heat shock proteins (hsp);
• Genes de reparação de DNA;
• Proto-oncongenes (como Ras);
• Telomerase.
Desatinib
Terapias Anti-senescência +
Quercetin

Moduladores do Metabolismo
(redução do stress oxidativo e ativação
de mTOR)
• Restrição calórica (30%);
• Metformina;
• Rapamicina;
• Resveratol.

Senomórficos (interferem na inflamação)


• Probióticos;
• Pós-bióticos;
• Anti-inflamatórios naturais (3, vitaminas E e C)

Senolíticos (eliminam as células senescentes pela inibição das SCAPs, inibindo os mecanismos
anti-apoptóticos das células, levando as células à apoptose)

P á g i n a 110 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Longevidade e Senescência

Longevidade mede a extenção da vida dos indivíduos. A sua medida incorpora o impacto do
envelhecimento, mas os determinantes da longevidade não são os mesmos que influenciam o
ritmo do envelhecimento.

Senescência refere-se à acumulação de modificações celulares, nos órgãos e tecidos que


impactam a função dos sistemas biológicos.

Há várias maneiras de medir a senescência:


• Encurtamento dos telómeros;
• Metilação do DNA;
• Composição das proteínas do plasma;
• Morfologia facial;
• Índice inflamatório.

Ritmos de Envelhecimento nos Diferentes Órgãos e Tecidos

A senescência ocorre nos órgãos e tecidos em ritmos muito diferentes. Alguns órgãos entram
em senescência muito antes de outros como é o caso do timo, por exemplo, que entra em
senescência muito antes do baço ou do tecido adiposo. O fígado e o coração têm uma
senescência mais tardia.

Além disso, mesmo dentro do mesmo tecido, as células não entram todas em senescência ao
mesmo tempo, podendo haver células que entrem em senescência antes de outras.

A entrada das células em senescência também é condicionada pelo contexto em que as células
se encontram. Vários tipos de stresses podem induzir senescência celular e cada tipo celular
responde de forma distinta. O próprio SASP também varia. Existe assim, heterogeneidade na
senescência celular.

P á g i n a 111 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Longevidade como integração de ritmos distintos de envelhecimento

O stress celular resulta em distintos estados digitais de homeostasia celular que levam a estados
funcionais diferentes entre órgãos e tecidos e entre indivíduos.

Definição clássica: O envelhecimento é um processo contínuo definido como as mudanças


relativas ao tempo e que são universais, intrínsecas, progressivas e deletérias (Strehler, 1962)

Definição recente: O envelhecimento é um processo complexo que afeta os tecidos e órgãos


em diferentes ritmos. Os indivíduos envelhecem também de maneiras diferentes.

Imunossenescência

O sistema imune é um dos sistemas mais afetados pelo envelhecimento e as alterações


imunológicas são extremamente relevantes para a senescência do organismo.

Medula óssea e as células tronco hematopoiéticas (HSC)

• Redução do tecido estromal e da produção de IL-7;


• Reposição por tecido adiposo;
• Senescência das HSCs (redução dos telómeros e da capacidade replicativa)
• Diminuição da linfopoiese sem afetar a mielopoiese
• Aumento de fatores inflamatórios
• Redução de fatores que controlam a inflamação na MO (miR-146a)
• Risco maior para os cancros como as síndromes mielodisplásicas (MDS) e a leucemia
mieloide aguda (AML).

P á g i n a 112 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

O Timo durante o envelhecimento

A atrofia tímica é provavelmente o evento mais importante no sistema imunitário relacionado


com a imunosenescência. Esta ocorre na maioria dos vertebrados.

A atrofia tímica inicia-se em períodos precoces (pré-puberdade), com um ritmo de


envelhecimento de 3% por ano até aos 50 anos e de 1% a partir daí. Com 50 anos o timo já se
encontra bastante alterado.

Alterações tímicas durante o envelhecimento:


• Substituição do estroma do córtex e da medula por tecido adiposo (que produz
citocinas);
• Declínio da timopoese;
• Redução no número e na atividade das ETP (early thymic precursors);
• Acúmulo da população de células DN CD44+CD25-CD3+;
• Declínio na expressão de CD3 em timócitos DN e DP (proliferação reduzida);
• Redução no número e na imunocompetência (na maturação e proliferação) das RTE
(recent thymic emigrants);
• Redução na produção de IL-7 pelas células do epitélio tímico (TEC);
• Redução da expressão de Foxn1 (essencial para o desenvolvimento das TEC);
• Redução na produção de linfócitos T naive.

As consequências da perda, tanto da atividade da medula óssea como do timo são a perda de
produção de linfócitos T naive, reduzindo assim a diversidade de linfócitos T produzidos e o
aumento do número de células de memória.
P á g i n a 113 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Ativação e Diferenciação de Linfócitos T

Os linfócitos T quando se dirigem para a periferia diferenciam-se em células de memória,


responsáveis por manter a memória imunitária. A experiência cumulativa de contatos
antigénicos leva ao acumular de células diferenciadas e também de células cronicamente
ativadas e senescentes, com uma capacidade muito limitada de ação.

P á g i n a 114 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Desenvolvimento de Linfócitos T

Diferenciação e Senescência de Linfócitos T

Alterações no desenvolvimento e atividade dos linfócitos T durante o envelhecimento:


• Redução no número de linfócitos naive;
• Acumulação de linfócitos ativados e de memória;
• Defeitos funcionais (redução da produção de IL-2, defeitos na sinalização, redução na
expressão de moléculas de co-estimulação);
• Linfócitos T efetores CD8+CD28- senescentes têm baixa atividade (biomarcador de
imunofragilidade);
• Linfócitos T CD4+CD28-CD40L- têm baixa capacidade para auxiliar linfócitos B na troca
de isotipos e produção de Ig;
P á g i n a 115 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

• Repertório dos linfócitos T muito reduzido;


• 30% dos idosos saudáveis possuem CD8+CD45ROCD25+ com repertório variado e
capazes de responder a infecções – Biomarcador de imunocompetência.

A redução da diversidade de repertório também afeta os linfócitos B

Alterações no desenvolvimento e atividade dos linfócitos B durante o envelhecimento:


• Redução na linfopoese de B2 na medula óssea (na transição de pró-B para pré-B);
• Defeito no rearranjo da cadeia pesada (redução dos fatores de transcrição que atuam
no rearranjo – E2A, E12 e E47);
• Redução da produção de IL-7 pelo estroma da medula;
• Redução dos plasmócitos de vida longa na medula (redução de CXCL12);
• Redução da atividade dos centros germinativos;
• Defeitos nos linfócitos T e B que reduzem a troca de isotipos (expressão de CD40
diminuída);
• Redução dos linfócitos B naive (CD27-) e aumento dos linfócitos B de memória;
• Aumento da suscetibilidade dos linfócitos à apoptose;
• Aumento nos níveis de anticorpos IgG, defeitos nos centros germinativos e perda da
diversidade clonal.

P á g i n a 116 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Múltiplos Efeitos nos Órgãos Linfoides Durante o Envelhecimento

Redução da atividade dos centros germinativos nos gânglios linfáticos, locais onde ocorre a
diferenciação dos plasmócitos.
Baixa FRC
Baixa Tfh
Baixa Foxp3+Tfr

Dinâmica de Populações de Células

P á g i n a 117 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Alterações na Imunidade Inata Durante o Envelhecimento

Redução da Fagocitose e Aumento das Citocinas Inflamatórias

Imunossenescência e Infeções

• Aumento da suscetibilidade a infeções;


• Reduzida capacidade de vacinação;
• As infeções crônicas por vírus (por exemplo da família herpes vírus tais como HSV
(Herpes Simplex Virus), EBV (Epstein-Barr Virus) e CMV (Citomegalovirus)) pioram o
fenótipo da imunossenesência e agravam a oligoclonalidade do repertório;
• CMV: 25% do total dos linfócitos T CD8+ são específicos;
• 60-100% dos idosos estão infetados com CMV (dados de coortes europeias).

P á g i n a 118 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Inflammaging

O envelhecimento é caracterizado por um estado inflamatório crónico de baixa intensidade


(subclínico) provavelmente resultante do impacto da interação do sistema imune com
antigénios e outros estímulos stressantes ao longo da via.

Senescência, doenças inflamatórias e degenerativas

A senescência celular e o inflammaging podem estar relacionados ao desenvolvimento de várias


doenças inflamatórias e degenerativas.

P á g i n a 119 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Remodelação e Envelhecimento Saudável

Estudos em centenários mostraram que o envelhecimento não está necessariamente associado


ao declínio progressivo de todas as funções imunológicas.
O envelhecimento saudável está associado a mecanismos compensatórios de remodelação do
sistema imune

Um novo paradigma para o papel do inflammaging e da imuno-adpatação/remodelação no


processo de envelhecimento.
Otimização: todos os 3 processos aumentos em concerto.
Deterioração: o inflammaging aumenta é não é equilibrado pelo anti-inflammaging e outros
processos de remodelação.

Remodelação Imunológica durante o envelhecimento

• Números aumentados de células NK com alta capacidade citotóxica em idosos saudáveis


(CD16+CD56lowCD57-) (Solana et al, 2014);

P á g i n a 120 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

• Produção aumentada de anticorpos apesar da redução na saída de linfócitos B da


medula óssea (Weksler and Szabo, 2015);
• Acumulação de linfócitos CD8+CD28-CD45RAlow T cells (com telómeros curtos)
produtores de IFN-g, IL-4 and IL-10 (Pawlec et al, 2016);
• Proliferação homeostática de células T e B naïve cells pela estimulação de IL-7 (Pawelec,
2017);
• Células T com capacidade de células tronco na periferia substituindo a função do timo
(Gattionini et al, 2017);
• Memória virtual (uso de células T de memória para responder a novos antigénios)
(Lanzer et al, 2018).

As células mais importantes na remodelação seriam a as células T reguladoras (Treg), que são
muito preservadas durante o envelhecimento e as células NK, que de alguma maneira
substituem a função dos linfócitos T. Normalmente as células NK mais preservadas são já
maduras e citotóxicas.

A frequência de células NK maduras aumenta com o envelhecimento e aumenta também em


idosos saudáveis.

O envelhecimento não é linear - Ritmos de alterações durante o envelhecimento

Estudo sueco com 845 indivíduos mostra que o envelhecimento não é monótono, mas apresenta
picos de aceleração. No caso das células do sangue, ocorrem transições entre as idades 40 e 70-
75 anos.

Estudo no Brasil:
• Ocorrem mudanças nas frequências de linfócitos T e B marcadamente nas idades 40 e
acima de 75 anos;
• A inversão da razão CD4/CD8 e o aumento dos linfócitos T CD8+ CD28-, dois
biomarcadores de imunossenescência, ocorrem depois de 75 anos;
• A frequência de linfócitos B1 está reduzida após a puberdade e não se altera mais ao
longo da vida;
• A produção e diversidade dos anticorpos produzidos por linfócitos B1 estão reduzidas
com o envelhecimento.

P á g i n a 121 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula Pré-Gravada 4 – Tolerância Imunitária


Data Docente
- Prof. Doutor Luís Graça

Nos últimos anos, tem havido um aumento muito grande da incidência de doenças auto-imunes
(diabetes tipo I ou insulina dependente, doenças alérgicas, como a asma, doença inflamatória
do intestino ou esclerose múltipla), enquanto que doenças infeciosas, por exemplo, têm vindo
a diminuir.

O que é a Tolerância Imunitária?

A tolerância imunitária é a capacidade do sistema imunitário responder contra aquilo que é


externo ao organismo (infeções, transplantes…), mas que não vai responder àquilo que é do
próprio, no caso estejamos perante um sistema imunocompetente.

A ausência de uma resposta imunitária agressiva a um antigénio (self ou não) num sistema
imunitário imunocompetente é chamado de tolerância imunitária. Não é exclusivamente contra
antigénios do próprio, mas também contra antigénios exógenos (associados a doenças alérgicas
– alergia pode ser falha de mecanismos de tolerância contra antigénios de alergénios).

A autoimunidade é, por seu lado, o resultado de uma ação do sistema imunitário contra
antigénios que fazem parte do organismo. Isto é habitualmente uma manifestação de quebra
dos mecanismos que mantêm a tolerância imunitária.

Por outro lado, existe uma necessidade crescente de criar barreiras imunitárias como estratégias
terapêuticas, como por exemplo: para a transplantação (na substituição do órgão, existe uma
resposta imunitária contra antigénios do dador que conduzem à rejeição do transplante; existe
pois necessidade de criar tolerância a estes antigénios para permitir que o transplante não seja
rejeitado, o que passa, hoje em dia, pela imunossupressão – conseguida através de
medicamentos que reduzem a ação do sistema imunitário como um todo, evitando a rejeição,
levando, no entanto, a que o organismo fique mais suscetível a infeções – e não pela indução de
tolerância.

Outro exemplo na importância da indução imunitária é o caso da terapia genética: uma forma
de tratar a hemofilia poderá ser a introdução do gene em falta ou administração da proteína
produzida pelo gene, neste caso um fator de coagulação; no entanto, esta proteína é estranha
ao organismo. Assim, um dos principais problemas na terapêutica é a resposta imunitária contra
o fator de coagulação, afetando a eficácia da mesma. De modo semelhante, se for realizada
terapia genética (introdução do gene nas células), as células que apresentam esse gene
introduzido serão também alvo de resposta imunitária, pois têm antigénios estranhos. Assim, a
indução de tolerância poderá ser uma forma de aumentar a eficácia dos tratamentos.

Mecanismos

Os mecanismos que mantêm a tolerância imunitária são de natureza diversa:


• Mecanismos celulares: existe um balanço entre células efetoras, que induzem respostas
efetoras, e células reguladoras, que suprimem estas respostas imunitárias e contribuem
para a tolerância. É o equilíbrio destes tipos celulares que permite que haja um balanço

P á g i n a 122 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

entre respostas contra alguns agentes infeciosos e ao mesmo tempo supressão e


proteção de respostas imunitárias desadequadas.
• Mecanismos moleculares: resultam dum balanço de mecanismos que estimulam a
resposta imunitária contra uma infeção e outros mecanismos moleculares que evitam
uma resposta imunitária excessiva.

Tipo de Células Envolvidas em Respostas Imunitárias que Conduzem a Doenças Auto-imunes

Quase todas ou mesmo todas as células


podem estar envolvidas em respostas
imunes patológicas que conduzem à
auto-imunidade.

Exemplos: células citotóxicas (diabetes


insulina-dependente/tipo I), células TH-
17 (esclerose múltipla ou artrite
reumatoide), linfócitos B (várias doenças
mediadas por anticorpos).

Resposta Auto-imune por Produção de Anticorpos por Células B

Esta resposta é importante pois, à 1ª


vista, poderíamos pensar que a
produção de anticorpos por células B
seria independente de células T. No
entanto, recordando a aula de
imunidade humoral, uma célula B, para
fazer o switch do isótipo que leva à
produção de um anticorpo de classe
diferente, precisa da interação com
uma célula-T CD4+ (helper folicular).
Indivíduos que apresentem mutações
na molécula CD-40, essencial nesta
interação, vão ser incapazes de formar
centros germinais, de fazer o switch do isótopo e, por isso, de produzir anticorpos.

Ativação de Células T

Para uma célula T ser ativada, não é suficiente que reconheça o antigénio para o qual é
especifica, embora seja essencial. É também necessário que haja, simultaneamente com este
reconhecimento do antigénio, a interação com várias moléculas envolvidas na co-estimulação:
• O CD-28 (importante na célula T, que vai relacionar-se com o CD-80 e 86 nas células
apresentadoras de antigénio);
• As citocinas, presentes no momento da interação da célula T com a célula apresentadora
de antigénios. O melhor exemplo é a Interleucina-2 (IL-2), porque alguns dos
medicamentos imunossupressores mais eficazes atuam na sinalização proveniente da
ligação da IL-2 aos seus recetores na superfície das células T, evitando que a célula T
receba sinais das citocinas presentes no momento da ativação, e que haja uma ativação
das células T ou uma resposta imunitária. As citocinas são, ainda, essenciais para definir
qual a função que a célula T vai adquirir. (Aula sobre tipos de células T – slide) De entre
os vários tipos de células T efetoras representados (Th1, Th2 – importantes em doenças
P á g i n a 123 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

alérgicas; Th17 – importantes em respostas imunitárias contra fungos e envolvidas


nalgumas doenças auto-imunes), as T- reguladoras desempenham um papel muito
importante na regulação de respostas imunitárias e na manutenção de um estado de
tolerância imunitária.

A ativação de células T efetoras tem de ser bem controlada. Da mesma maneira que temos
células T efetoras e reguladoras, que são um contraponto a uma excessiva ativação do sistema
imunitário, também temos moléculas importantes para a co- estimulação, como é o caso do CD-
28, e outras moléculas que estão especializadas em contrariar uma ativação excessiva das
células T. Isto acontece com a molécula CTLA-4, habitualmente expressa por células ativadas,
algum tempo após a sua ativação. Ou seja, quando uma célula T ativada começa por ter na sua
superfície CD- 28 que se liga ao CD-80 e 86 nas células apresentadoras de antigénio, sendo esta
ligação essencial para que a célula T seja eficazmente ativada, prolifere e se diferencie numa
célula com funções efetoras. Contudo, ao fim de alguns dias, esta célula T começa a expressar à
sua superfície CTLA-4. O CTLA-4 tem a capacidade de se ligar aos mesmos recetores que o CD-
28, competindo ambas entre si. No entanto, o CTLA-4 tem vantagem por ter uma afinidade cerca
de 100x superior para o recetor que o CD-28. Assim, a partir do momento em que a célula
expressa o CTLA-4, a célula vai ligar-se quase sempre aos recetores devido à sua vantagem
competitiva. Como resultado, a célula deixa de receber os sinais positivos que o CD-28 transmite
e o seu processo de ativação é inibido.

Outras moléculas que contrariam a co-estimulação são, por exemplo, o PD-1 (que começa a ter
aplicação terapêutica), que se liga ao PDL-1 presente em macrófagos e células tumorais.

Um dos avanços na terapia oncológica consiste no desenvolvimento de fármacos chamados


“checkpoint inhibitors” (por exemplo, anticorpos que bloqueiam o CTLA-4), tendo as suas
interações ficado conhecidas como “checkpoints imunes” Estes vão impedir que a célula T seja
“desligada” pelo CTLA-4. Assim, o CD-28 pode continuar a ligar-se ao CD-80 e CD-86 e a célula T
a receber sinais positivos para a sua ativação.

Da mesma forma, existem fármacos que atuam no PD-1 ou PDL-1 que impedem que a célula T
receba os sinais inibitórios e que, desta forma, fique exclusivamente a receber os sinais do CD-
28, mantendo o seu estado de ativação. Esta terapia mostrou-se eficaz no tratamento de alguns
tumores, como o melanoma maligno e o cancro do pulmão.

A Importância do Timo para Tolerância Imunitária

Um dos órgãos essenciais para a manutenção do estado de tolerância e para a sua indução é o
timo. Nele, são produzidos linfócitos. A sua importância ficou demonstrada em experiências
realizadas por Nicole Le Douarin. Estas baseavam-se na capacidade de transplantar tecidos entre
embriões de aves durante a fase embrionária, antes do sistema imunitário se começar a
desenvolver. O objetivo da experiência era perceber se, introduzindo um tecido num embrião
antes do sistema imunitário se começar a desenvolver, havia tolerância para este tecido.

Pegou-se num embrião de codorniz e transplantou-se o precursor da asa para um embrião de


galinha. O embrião de galinha passou a desenvolver-se com as células que vão dar origem às
asas da codorniz. O que se verificou foi que, nestas condições, o pinto nasce com uma asa de
codorniz e, cerca de 2 semanas depois, ela começa a ser rejeitada: apesar de ela estar no
organismo antes do sistema imunitário se ter formado, não é suficiente para que haja uma
indução de tolerância às células de codorniz pelo sistema imunitário da galinha.

P á g i n a 124 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

No entanto, se além da asa de codorniz se transplantarem precursores do timo da codorniz, o


pinto ao nascer não terá só a asa de codorniz, que não foi rejeitada, como também o timo de
galinha e o timo de codorniz. Foi assim possível o desenvolvimento de uma galinha adulta com
células de codorniz que são toleradas pelo sistema imunitário da galinha.

Mais recentemente, foi descoberto que no timo existe a expressão de um fator de transcrição
chamado AIRE, que tem a capacidade de induzir nas células do epitélio tímico a expressão de
genes característicos de outros tecidos do organismo. Por exemplo, a insulina, que é produzida
no pâncreas (slide - indução da produção de insulina no timo pelo AIRE), ou a mielina, que
reveste alguns axónios e que é produzida por oligodendrócitos.

Esse mecanismo faz com que as células do timo possam produzir essas proteínas expressas em
determinados órgãos, o que é importante para a manutenção da tolerância imunitária. Uma
insuficiência na expressão do género AIRE provoca uma síndrome auto- imune com uma
resposta imune desadequada, destruindo principalmente as células produtoras de insulina.

A presença de antígenos periféricos do próprio no timo (como a


insulina) vai influenciar a eliminação clonal de linfócitos capazes
de reconhecer esses antigénios. A eliminação clonal é o processo
em que as células capazes de reconhecer antigénios do próprio
indivíduo vão sendo eliminadas durante o seu desenvolvimento
no timo. Assim, as células que saem do timo são
predominantemente especificas para antígenos que não são do
próprio. No entanto, este processo nem sempre é eficaz: algumas
células conseguem “escapar” a esse processo, razão pela qual são
necessários outros mecanismos que induzam tolerância nessas células.

Estes outros processos necessários incluem a ação de células T reguladoras, a existência de locais
imuno-previligiados, a ignorância imunitária ou “danger model”, a anergia e o desvio imunitário.
Os mais importantes serão abordados em mais detalhe (ação de células T reguladoras e a
existência de locais imuno-previligiados), ao contrário dos restantes, como os dois últimos, que
já não são muito aceites atualmente.

Ignorância Imunitária

O modelo da ignorância imunitária baseia-se no facto de


que o que acontece nos tecidos é frequentemente ignorado
pelo sistema imunitário. Para a célula T ser ativada, é
necessária uma célula dendrítica capaz de apresentar um
antigénio, simultaneamente com co- estimulação, produção
de citocinas, que faça com que se inicie uma resposta
imunitária. No pâncreas não existem Particle Recognition
Receptors (PRR) ativados, ou seja, não existe células
dendríticas activadas que apresentem insulina ao sistema
imunitário. Por isso, o sistema imunitário pode ter células
especificas para isso, que não vão ser ativadas e, por isso,
não vai haver reação contra a insulina.

Zinkernagel, que propôs este modelo, comprovou isso a


partir de experiências nas quais infetando células
pancreáticas, se demonstrou que havia inflamação: as
P á g i n a 125 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

células dendríticas passavam a apresentar insulina, havendo maior probabilidade de resposta


imunitária contra a insulina e de desenvolver diabetes devido à quebra da tolerância imunitária
por quebra da ignorância imunitária.

Este modelo foi modificado por Matzinger, propondo o


“danger model”.

Basicamente, o Danger model propõe que o mecanismo não


tem tanto a ver com ignorância, mas sim com o facto do
sistema imunitário estar desenhado para responder àquilo
que é perigoso. Quando existe inflamação e destruição de
tecidos, vai haver uma resposta imunitária que responde
também aos antigénios que possam estar representados
nesses tecidos. Na ausência de inflamação ou destruição de
tecidos, não vai haver células dendríticas ativadas, apresentação de antigénios com co-
estimulação e, como tal, não vai haver ativação de linfócitos-T - não haverá resposta imunitária.

No entanto, este modelo não explica como células reguladoras podem impedir resposta
imunitária, mesmo na presença de inflamação, embora grande parte do modelo esteja correto
- a resposta imunitária eficaz necessita de inflamação, estando o desenvolvimento de doenças
auto-imunes relacionado com processos inflamatórios que causem uma ativação de células
autorreativas.

Privilégio Imune

Outro aspeto essencial é a forma como alguns tecidos se podem proteger a si mesmos. Como é
o exemplo da placenta e do globo ocular.

No feto, metade dos cromossomas são herdados do pai e, portanto diferentes dos da mãe e
reconhecidos como tal pelo organismo. Se a mãe necessitar de transplante do filho após o
nascimento, muito provavelmente este será rejeitado pelo organismo da mãe. Porém, durante
9 meses, o filho esteve no útero materno sem ser rejeitado, existindo vários mecanismos para
explicar a ausência de resposta imunitária que conduza à rejeição do feto:
• A placenta oferece uma barreira (apesar de não ser 100% completa e de nela existir
alguma interação de células do feto com o sistema imunitário materno);
• Existem ainda outros mecanismos celulares e moleculares que tornam o local
normalmente livre de respostas imunitárias:
o Muito pouca produção de moléculas de MHC, essenciais para a ativação do
sistema imunitário. Na ausência de MHC, as células Natural Killer (NK) podem
habitualmente destruir células que deixem de apresentar MHC e, por isso, na
placenta existe produção de moléculas MHC não convencionais, que não
apresentam antigénios as células T, mas que inibem as células NK.
o Existência de enzimas que degradam fatores importantes para a ativação dos
linfócitos, como é o caso do IDO (indoleamina 2,3 dioxigenase), que degrada o
triptofano, um aminoácido essencial para ativação linfocitária, impedindo-a
assim. Neutralizando o IDO em ratinhos, deixam de conseguir ter uma gravidez
de termo já que vão rejeitar os embriões.
o Outros mecanismos: TGF beta, que vai determinar que as respostas imunitárias
neste local não sejam produtivas.

P á g i n a 126 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Alguns tumores também apresentam estes mesmos mecanismos, aumentando a dificuldade do


sistema imunitário combater as células tumorais. Nos casos de tumores, é ainda importante a
expressão de PD-L1, que se liga ao PD-1 das células T e inibe a integração dos sinais co-
estimulatórios da célula T e que desta forma inibe a resposta imunitária eficaz.

Anergia

Quando uma célula T reconhece o antigénio sem existir co-estimulação, esta vai integrar estes
sinais que provêm do reconhecimento do antigénio. No entanto, não tendo uma ativação eficaz
na ausência da co-estimulação, em vez de se tornar uma célula efetora, vai tornar-se numa
célula que persiste no organismo e se torna
refratária a novas estimulações.

A célula T, não tendo co- estimulação, se, mais


tarde, interagir com uma célula apresentadora
de antigénio que fornece o antígeno na
presença de co-estimulação, ela deixa de ser
capaz de responder e ser ativada mesmo em
condições ótimas. Ou seja, esta primeira
interação com o antigénio na ausência de co-
estimulação vai tornar esta célula
funcionalmente inativa e vai permancer inativa
e incapaz de ser ativada mais tarde mesmo em
condições ótimas. Designa-se isto por anergia.

Immune Deviation

Um outro processo que sobretudo nos anos 90 era tido como um dos principais mecanismos
que explicava a tolerância imunitária baseia-se no Desvio imunitário.

Nos anos 90, os tipos funcionais de células TCD4 que se conheciam, eram as Th1, que produzem
interferão-gama (IFN- ), e Th2, que produzem interleucina-4 (IL-4).

O interferão gama contraria esta capacidade de diferenciação de células T em células Th2 e a IL-
4 evita que as células T se polarizem para Th1: há uma inibição recíproca.

No caso das doenças alérgicas associadas a uma resposta Th2, existia a ideia de que o que
acontecia era que o sistema imunitário estava desviado no sentido Th2 e a forma correta de
repor o estado de tolerância seria estimular respostas Th1, que através do IFN-􏰂􏰂 iriam inibir a
diferenciação para o lado Th2, repondo o equilíbrio entre estas componentes do sistema
P á g i n a 127 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

imunitário. Esta visão do sistema imunitário


como um balanço Th1/Th2 deixou de ter
tanto peso a partir do momento em que se
identificaram muitos outros tipos de células
funcionais T, passando a ser difícil conciliar
esta visão mais generalizada da diversidade
de mecanismos editores T com esta regulação
baseada em desvio imunitário, sobretudo a
partir do momento em que verificou que
existiam células T reguladoras com uma
grande importância na supressão, tanto de
respostas Th1, como Th2, e que têm um papel
essencial para a manutenção da tolerância imunitária.

Células T Reguladoras

Existem vários tipos de células T reguladoras: CD4+, CD25+ e Foxp3+ (mais conhecidas).

Foxp3+ é um fator de transcrição essencial para desenvolvimento de células reguladoras.


Mutações do gene Foxp3 em células humanas provocam uma doença auto-imune fulminante
que se inicia, por vezes, antes do nascimento, e que, na ausência de um transplante de medula
que forneça células que expressem Foxp3, normalmente, é fatal. Este gene controla ainda a
expressão de características das células T reguladoras e permite que estas consigam suprimir as
células efetoras.

Além destas, temos outros tipos de células T reguladoras: as TR1 (produzem Il-10, uma citocina
anti-inflamatória,), que são induzidas na periferia e não expressam Foxp3.

Um grande número de células reguladoras é também


formado no timo apesar de algumas poderem ser
formadas na periferia a partir de células T naive. Por essa
razão, o timo tem 2 funções na tolerância imunitária: por
um lado, a eliminação clonal, (gene AIRE) e por outro
lado, existem alguns antígenos do próprio no timo que
são reconhecidos por timócitos que se estão a
desenvolver e que faz com que estes timócitos
expressem Foxp3 e se tornem células T-reguladoras com
uma especificidade para estes antigénios. Por um lado,
elimina muitas células especificas para antígenos do
próprio e, por outro, faz com que algumas células
especificas para antígenos do próprio se tornem células
reguladoras Foxp3+.

A diferenciação faz com que mesmo que algumas células consigam escapar para a periferia e
tornar-se potencialmente agressivas por reagirem contra antigénios do próprio, existam
algumas células que também são especificas para antigénios do corpo mas que são reguladoras,
conseguindo evitar que essas primeiras células provoquem uma doença auto-imune. Desta
forma, pode dizer-se que existe um balanço entre mecanismos efetores que conduzem à ação
do sistema imunitário e mecanismos reguladores que impedem uma excessiva ativação do
sistema imunitário.

P á g i n a 128 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Atividade Supressora das Células Reguladoras

As células reguladoras exercem a sua atividade supressora através de vários mecanismos


diferentes.

Por um lado, estas células reguladoras conseguem produzir citocinas inibitórias (IL-10, IL-35 e
TGF-β – essenciais para que as células T naive da periferia se tornarem células T reguladoras).

Por outro lado, podem modificar a função das células


dendríticas, tornando-as menos imunogénicas e
levando-as à adoção de características que favorecem
mais a tolerância imunitária, nomeadamente através
da expressão de IDO (degrada o triptofano) que
impede que as células T efetoras se diferenciem.

Outra das características é a produção de CD25, uma


cadeia do recetor da IL-2, que faz com que este tenha
uma elevada afinidade para IL-2, fazendo com que as
células reguladoras consigam competir com as
efetoras por IL-2 e captar grande quantidade desta,
essencial para a ativação das células T.

Existem ainda algumas moléculas que contribuem para alterar o metabolismo de certos
mediadores, nomeadamente a adenosina que faz com que as células T não sejam activadas de
forma eficaz.

Finalmente, tem sido mostrado que em algumas situações as células T reguladoras conseguem
induzir a apoptose de células-alvo através da produção de granzimas.

Estes diferentes mecanismos associados a células T reguladoras não funcionam


simultaneamente. Em diferentes situações, existe o predomínio de diferentes mecanismos,
P á g i n a 129 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

podendo o mesmo ser aplicado em relação aos mecanismos gerais do sistema imunitário,
porque provavelmente em termos de evolução, o desenvolvimento de mecanismos de
tolerância imunitária deve ter sido um dos fatores essenciais que permite o sucesso reprodutivo,
ou seja, a inexistência de tolerância imunitária que seja eficaz, por exemplo, contra o feto ou os
próprios órgãos onde são produzidos os gametas, poderá ter feito com que se tenham
desenvolvido vários mecanismos redundantes que mantenham este grau de tolerância
imunitária. No que diz respeito a como se desenvolve e mantém a tolerância imunitária, existe
uma integração de vários mecanismos distintos, que no seu conjunto vão favorecer o
desenvolvimento de tolerância.

Temos como mecanismos a eliminação clonal no timo, o desenvolvimento de células


reguladoras e os locais imunoprivilegiados. Em determinadas localizações anatómicas, existem
fatores mais importantes (placenta - mecanismos de imunoprivilégio; inflamação intestinal - IL-
10 e células reguladoras), mas é através da sua conjugação que se mantém a tolerância
imunitária e se evita que haja o surgimento de auto- imunidade.

P á g i n a 130 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula 11 – Tolerância Imunitária


Data Docente
22/10/2021 Prof. Doutor Luís Graça

O problema da tolerância imunitária deriva da forma como o sistema imunitário está desenhado
para conseguir combater as infeções que nos rodeiam e ao mesmo tempo não ser causador de
dano às nossas células. Temos imensos recetores de células B e T que são capazes de reconhecer
o que nos é estranho, mas que também podem reconhecer o que é próprio. O nosso sistema
imunitário consegue proteger-nos de qualquer microrganismo existente, mesmo que estes
estejam em constante mutação, sendo um exemplo, o vírus Influenza (causador da gripe), que
é diferente todos os anos.

Ao mesmo tempo, estas células conseguem identificar tudo o que é estranho a nós, o que pode
apresentar alguns problemas, como em casos em que existe a necessidade de transplantes, em
que mesmo em casos de 99% de partilha de antigénios entre dador e recipiente, estes antigénios
são imediatamente identificados pelo sistema imunitário e vão conduzir à rejeição do
transplante. Existe assim a necessidade de tratamento com imunossupressores em pacientes
transplantados, de forma a diminuir a resposta imunitária contra o órgão transplantado. Outro
problema é nos casos de pessoas que necessitem de terapia génica, como no caso dos doentes
com hemofilia A, em que o fator 8 é inexistente e precisa de ser administrado (fator 8
recombinante). Nesses casos o organismo vai tratar o fator 8 recombinante como estranho e
reagir contra ele.

A tolerância imunitária é mais importante do que apenas a ausência de resposta contra as


células do nosso organismo. As alergias também são respostas inadequadas do organismo a
antigénios que em princípio deveriam ser tolerados. Assim a tolerância imunitária deve ter em
conta para além da ausência de resposta ao self, mas também a ausência de respostas
inadequadas a antigénios que não causam dano ao organismo.

A diversidade do sistema imunitário permite verificar pequenas alterações à nossa composição,


mas no cancro, está estudado, que em diferentes tumores, ocorrem mutações que fazem com
que haja antigénios novos associados ao tumor que não existem numa pessoa normal. Poder-se
ia assim pensar que tumores com mais mutações, seriam mais facilmente eliminados pelo
sistema imunitário. Mas isso não acontece, devido a vários fatores que estão envolvidos na
regulação imunitária.

Regulação Imunitária

Na regulação imunitária existem células, recetores (nas células), moléculas solúveis (citocinas),
e ocorre a todos os níveis um balanço entre respostas agressivas (pró-inflamatórias) e respostas
reguladoras que evitam as respostas agressivas. Para termos um sistema imunitário que é capaz
de responder a muitas infeções, mas ao mesmo tempo não causar autoimunidade,
desenvolvemos a capacidade de ter múltiplos mecanismos que regulam a ação do sistema
imunitário.

Um exemplo disto, tirado da transplantação: Se colocarmos um transplante de pele de um


ratinho macho num ratinho fêmea (espécie Black Six, B6), sendo estes ratinhos todos
geneticamente idênticos (por via de cruzamentos constantes), o ratinho fêmea rejeita a pele do
ratinho macho visto que ratinhos macho têm alguns genes não existentes no ratinho fêmea,
nomeadamente 3 no cromossoma Y, que são alvo do sistema imunitário. Se fizermos a
P á g i n a 131 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

experiência ao contrário, e colocarmos pele de um ratinho fêmea num ratinho macho, essa não
é rejeitada porque não existe nenhum gene no ratinho fêmea que não esteja no ratinho macho.
Se repetirmos a mesma experiência com outra estirpe de animais (ratinhos CBA), todos
geneticamente idênticos, o que acontece é que mesmo a pele de macho no ratinho fêmea não
é rejeitada. Isto acontece porque existem mecanismos reguladores que evitam esta rejeição. Se
retirarmos as células T reguladoras (Treg) a estes animais, aí, existirá rejeição.

Esta demostração mostra que, existindo células reguladoras, estas vão conseguir regular a
reposta contra antigénios (neste caso os 3 genes presentes no cromossoma Y) que não existiam
no ratinho fêmea. Assim pode-se pensar que nos tumores, pode existir um sistema regulador,
que evite que o tumor seja eliminado.

O timo é crítico para a tolerância imunitária

Um órgão crítico para a tolerância imunitária é o timo. O timo é o local onde são formados os
linfócitos T. Uma das primeiras ideias postuladas, foi que o timo, formando-se ainda no
desenvolvimento embrionário, antes de sermos expostos a infeções, provavelmente seria uma
boa forma de induzir tolerância, ou seja, todos os linfócitos que se estivessem a formar no timo,
se reconhecessem antigénios do próprio, seriam eliminados, enquanto os outros que não
reconheciam antigénios do próprio, poderiam seriam ser exportados para a periferia,
protegendo-nos assim contra microrganismos.

Existe algum problema em relação a este conceito. Por exemplo, existem alguns antigénios que
nos seres humanos só começam a ser produzidos depois da puberdade. Outro problema depara-
se com o facto de muitos antigénios só serem produzidos em determinados órgãos, como o caso
da mielina que só é produzida no SNC, sendo assim impossível existir tolerância contra esta,
visto não existir contacto.

Há vários fatores que facilitam este processo. Um deles mostrava a capacidade do timo de
induzir tolerância de tecidos para fora do timo, primeiro demonstrado com experiências de
transplante entre embriões de codornizes e galinhas, em que se houvesse apenas transplante
de um percursor (por exemplo da asa) de um embrião de codorniz para um de galinha, ocorria
rejeição, mas se esse transplante fosse feito juntamente com o transplante de células do
percursor tímico, a rejeição não ocorria. Mais recentemente, identificou-se um gene, AIRE, que
é expresso nas células epiteliais do timo que induz a produção de genes no timo que são
específicos de outros tecidos, promovendo assim a indução de tolerância a esses tecidos.
Pessoas com mutação no gene AIRE, desenvolvem uma síndrome (APCED, APS-1) que se
caracteriza por uma doença autoimune.

No timo, o que acontece é que se há um reconhecimento de um antigénio do próprio, as células


são eliminadas, contudo não é o suficiente. Há também a formação de células reguladoras a
partir do reconhecimento, no timo, de células do próprio, ou seja, grande parte da tolerância
para as células do pâncreas que produzem insulina, por exemplo, tem dois componentes: por
um lado a eliminação de células específicas para o pâncreas, mas como não se pode ter certeza
de 100% eficácia, ocorre a formação de células reguladoras a partir de células que são
específicas, por exemplo, para a insulina, e que mesmo que haja algumas células que não foram
eliminadas e que vão tentar fazer autoimunidade, as células reguladoras vão exercer controlo
sobre as outras.

P á g i n a 132 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

No caso de um tumor, por exemplo da pele, temos novos antigénios e células que são
potencialmente capazes de eliminar o tumor (que têm aqueles antigénios novos), contudo,
também temos uma grande quantidade de células reguladoras que são específicas para
antigénios do próprio que estão nessas células e que estão a tentar evitar que haja algumas
células que escaparam à eliminação, e que vão causar autoimunidade.

Por isso existe um balanço em que numas situações (por exemplo na transplantação clínica) as
diferenças são tão grandes que as células reguladoras não têm hipótese e vai haver sempre
rejeição como resultado, a menos que haja imunossupressão, e outras situações em que existe
mais equilíbrio, como no caso de um tumor, pode haver menos células efetoras e mais células
reguladoras, fazendo com que a rejeição do tumor, não seja um processo que aconteça com a
mesma intensidade.

Ativação de Células T

Os checkpoint inhibitors estão muito ligados à ativação das células T. A ativação das células T é
um ponto crítico na regulação do sistema imunitário. Para uma célula T ser ativada precisa de
reconhecer o antigénio, apresentado por moléculas MHC, através do seu TCR, mas isto não é
suficiente. Para a célula ser ativada, precisa de para além de ter este reconhecimento, precisa
de co-estimulação, e esta depende muito de CD28, que se liga ao CD80/86 das células
dendríticas. A partir de um certo momento, a célula vai passar a ter CTLA4, que se liga a CD80/86,
mas com uma afinidade muito superior (100 vezes mais afinidade), o que significa que assim que
surge CTLA4 na membrana da célula, o CD28 não continua ligado, impedindo assim a
continuidade da emissão de sinais de co-estimulação, parando assim a ativação.

Existem outros como o PD1 que também emite um sinal negativo tentando limitar uma ativação
excessiva das células.

P á g i n a 133 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Mais uma vez existe um balanço, neste caso, entre moléculas estimuladoras (como CD28) e
moléculas que contrariam a estimulação (como CDLA4 e PD1). Podemos tirar vantagem disto
terapeuticamente, usando fármacos para bloquear os checkpoints imunes. Estes fármacos,
chamados de checkpoint inhibitors, são usados para o tratamento do cancro. O Ipilimumab
bloqueia o CTLA4 fazendo com que a célula, mesmo que tenha CTLA4, este não vai conseguir
competir com CD28, podendo este continuar a receber sinais positivos. Outros checkpoint
inhibitors são o Nivolumab e o Pembrolizumab, bloqueiam a interação entra PD1 e PDL1,
impedindo a receção desse sinal negativo. O resultado destes tratamentos é que as células que
estão envolvidas na reposta contra os tumores, vão continuar a receber estes sinais
estimuladores e vão continuar ativas e a participar na rejeição desse tumor.

P á g i n a 134 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Um efeito adverso esperado deste tipo de tratamento é o risco de doenças inflamatórias e


autoimunes aumentados, visto estarmos a favorecer a ativação mais permanente das células.
Tratamento de Autoimunidade

Para tratar a autoimunidade podemos também atuar no balanço de estimuladores / não


estimuladores, existindo moléculas que bloqueiam a estimulação do CD28, impedindo a
autoimunidade , como o Abatacept e o Belatacept.

Ativação de Células T

Outro processo de ocorre na ativação das células T é a influencia das citocinas que estão no
ambiente celular. As citocinas são muito importantes para a fazer com que as células T adquiram
uma especialização para determinadas funções.

P á g i n a 135 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Uma dessas especializações são as células T


reguladoras (Treg), cuja função não é
participar na inflamação e combater
micróbios, mas sim o contrário, ou seja,
suprimir estas respostas imunitárias,
evitando que exista excesso de resposta
imunitária e lesão autoimune.

Células T Reguladoras

As células Treg são caracterizadas por


terem o gene Foxp3 e por CD4, CD25
(cadeia  do recetor da IL-2) e CTLA4 na sua
superfície.

Função das Células T Reguladoras

Sumário

A tolerância imunitária é tão importante que existem vários mecanismos redundantes para
permitir que esta exista. Na ausência de tolerância imunitária rapidamente teríamos
autoimunidade, o que iria comprometer a reprodução do ser vivo, visto as doenças autoimunes
aparecem frequentemente em idade jovem.

• O Sistema imunitário evoluiu para reconhecer antigénios diferentes;


• Discrimina o “próprio” do “não próprio” - barreira para terapia génica;
• Existem vários mecanismos para prevenir autoimunidade e, como consequência,
previnem eliminação de tumores:
o Mecanismos celulares: Balanço entre células T reguladoras (Treg) e efetoras;
o Mecanismos moleculares: Balanço entre moléculas estimuladoras e inibitórias.
• Estes mecanismos oferecem oportunidades terapêuticas:
o Para diminuir respostas indesejáveis autoimunidade, transplantação;
o Para aumentar respostas insuficientes vacinação, cancro.

P á g i n a 136 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula 12 – Imunodeficiências Primárias


Data Docente
26/10/2021 Profª. Doutora Ana Berta Sousa

Sinais de Aviso para Imunodeficiências Primárias

A esmagadora maioria destes sinais está concentrada em ter infeções que são extraordinárias
em número, gravidade, necessidade de terapêutica mais intensiva / endovenosa do que o que
seria suposto. Por outro lado, e nas crianças, deve ter-se em atenção o facto de a criança não
crescer como seria suposto (não ganha peso, não cresce normalmente). A existência de história
familiar é também um ponto a ser considerado.

Imunodeficiências:
• Defeito num ou mais componentes do Sistema Imunitário com compromisso da
resposta imunitária;
• Podem ser:
o Primárias: Defeitos genéticos ou do desenvolvimento do Sistema Imunitário;
estão já presentes no recém-nascido mesmo que só se manifestem mais tarde;
o Secundárias: Perdas (adquiridas) de função imunitária. Podem contribuir para
estas, vírus, iatrogenia, doença crónica, neoplasias, fome, etc.

P á g i n a 137 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Imunodeficiências Primárias:
• A primeira foi descrita em 1952. Desde então foram já reconhecidas mais de 400
entidades clínicas diferentes;
• Embora individualmente raras, no conjunto são uma causa importante de morbilidade,
afetando 1:1000 a 5000 indivíduos;
• Podem envolver apenas um ou vários componentes da resposta imunitária e /ou
adaptativa. As consequências dependem do número e tipo de componentes afetados;
• Manifestam-se frequentemente por suscetibilidade a infeções. O perfil insidioso
fornece uma pista sobre qual o componente defeituoso;
• Podem associar autoimunidade, doença autoinflamatória, atopia, granulomatose,
linfoproliferação e neoplasia, resultantes de imunodesregulação. Estes sinais e sintomas
podem ser os primeiros e / ou os predominantes;
• As mais prevalentes ocorrem em rapazes, tendo uma hereditariedade ligada ao X
recessiva (a maior parte dos genes importantes não estão no cromossoma X, apenas
quer dizer que para um rapaz doente é preciso ter um único defeito, acaba por ser mais
fácil essa ocorrência, do que uma doença autossómica recessiva em que precisamos de
dois defeitos);
• Já foram identificadas > 400 defeitos monogénicos causais;
• Uma determinada entidade clínica pode ser causada por variantes em diferentes genes;
• Um gene pode ser causal para várias entidades clínicas (segundos diferentes modelos
de doença – GoF (Gain of Function), LoF (Loss of Function), dominante negativo,
haploinsuficiência; e de hereditariedade – AD, AR);
• A maioria dos defeitos genéticos foi identificada nos últimos anos, com a aplicação de
técnicas de NGS (Nova Geração de Sequenciação);
• Medicina de precisão.

As imunodeficiências primárias correspondem maioritariamente a defeitos monogénicos que


afetam proteínas essenciais para o desenvolvimento e /ou função de um ou mais componentes
do sistema imunitário.

P á g i n a 138 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Há uma enorme
interdependência entre as células
do sistema imunitário, de forma a
estas poderem funcionar
corretamente.
Um defeito em CD40L, por
exemplo, que pertence célula T,
vai também interferir na ativação
da célula B, visto que este é
essencial na sinalização.
Mostra-se assim que um defeito
numa célula em particular pode
afetar muitos outros
componentes, aumentando a
complexidade das doenças.

As imunodeficiências primárias podem ser classificadas de duas formas (Segundo o IUIS –


International Union of Immunological Societies):
• Classificação por categorias de Imunodeficiências Primárias (2019):
i. Immunodeficiencies affecting cellular and humoral immunity:
a. Severe combined immunodeficiencies (SCID), defined by CD3 cell
lymphopenia;
b. Combined immunodeficiencies (CID), generally less profound than SCID.
ii. Combined immunodeficiencies with associated syndromic features;
iii. Predominantly antibody deficiencies;
iv. Diseases of immune dysregulation:
a. Hemophagocytic lymphohistiocytosis: HLH & EBV susceptibility;
b. Syndromes with autoimmunity and others;
v. Congenital defects of phagocyte number or function;
vi. Defects in intrinsic and innate immunity:
a. Bacterial and parasitic infections;
b. MSMD and viral infection.
vii. Autoinflammatory disorders;
viii. Complement deficiencies;
ix. Bone marrow failure;
x. Phenocopies of inborn errors of immunity.
• Classificação fenotípica
o Mais fácil de usar em prática clínica.

Défice de Anticorpos:
• Defeitos isolados no desenvolvimento ou ativação de Linfócitos B;
• Infeções bacterianas recorrentes a partir da segunda metade do primeiro ano de vida,
altura em que desaparecem as IgG maternas que atravessaram a placenta;
• Suscetibilidade a bactérias extracelulares, sobretudo algumas espécies piogénicas como
Streptococci, Haemophylus e Staphylococci (porque, na ausência de opsonização, têm
cápsulas polisacarídicas resistentes à destruição pelos fagócitos);
• Terapêutica: Antibióticos + Ig humana iv/sc;
• Relativamente bom prognóstico se evitadas lesões de órgãos alvo.

P á g i n a 139 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Avaliação laboratorial da imunidade humoral:


• Hemograma com contagem diferencial;
• Quantificação das imunoglobulinas sérias:
o Total, classes e subclasses;
o Isohemaglutininas séricas anti-A e / ou anti-B em doentes com grupo sanguíneo
não AB.
• Quantificação de linfócitos B circulantes:
o Citometria de fluxo com anticorpos monoclonais CD19 e / ou CD20.
• Resposta à vacinação:
o Tetanus and Diphtheria toxoids, Hib polysaccharide antigen;
o Presença de anticorpos específicos;
o Histologia dos gânglios linfáticos.
• Estudos funcionais:
o Resposta proliferativa e maturativa a mitogénios;
o Secreção de imunoglobulinas in vivo.

Os linfócitos B vão ter uma fase do seu desenvolvimento na medula óssea, e uma fase na
periferia. Vamos ter diferentes defeitos, que vão atuar em diferentes estádios de
desenvolvimento das células B, podendo assim ter defeitos antes da saída dos linfócitos da
medula óssea, o que se vai traduzir numa linfopenia B (não vai haver linfócitos a sair da medula,
não sendo possível encontrá-los na periferia), ou defeitos gerados na periferia, já na resposta
imunitária, em que vão acontecer problemas. O nível a que ocorre o defeito, vai ter grande
influência no fenótipo demonstrado.

Agamaglobulinémia ligada ao X (Doença de Bruton)


• A tirosina cinase Btk (Bruton’s Tyrosine Kinase) é necessária
para a transdução de sinal a partir do pré-BCR (e BCR);
• Mutações no gene Btk, localizado no cromossoma X,
bloqueiam o desenvolvimento dos linfócitos B;
• Há células pré-B na medula, mas ausência de linfócitos B em
circulação;
• Não há produção de imunoglobulinas.

P á g i n a 140 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Síndrome de hiper IgM

O desenvolvimento dos linfócitos B e T nos órgãos linfoides primários é normal, mas não há
maturação da resposta (antigénio-dependente) nos órgãos linfoides secundários, isto é,
mudança de isótipo e hipermutação somática.

Forma ligada ao X:
• Mutações no ligando de CD40 (CD40L),
presente na superfície dos linfócitos T
CD4+;
• Não ocorre ativação dos linfócitos B,
que depende da ajuda de linfócitos T
CD4+, mediada pela interação CD40 /
CD40L.

A síndrome de híper IgM tem uma expressão variável e pode ser uma doença só de resposta B,
quando a única coisa que está afetada é a maturação das células B, e isso é quando temos
defeitos específicos ao nível dos processos que decorrem desta ativação das células B (mudança
de isótipo e hipermutação somática), por exemplo defeitos em AID.

(S)CID – (Severe) Combined Immunodeficiencies:


• Defeitos no desenvolvimento dos linfócitos T (por vezes também linfócitos B), com
compromisso da imunidade celular e da imunidade humoral T-dependente;
• Suscetibilidade a patogénios intra e extracelulares (bactérias, vírus e fungos) e infeções
oportunistas;
• Infeções respiratórias, fungos mucocutâneos, diarreia e má progressão ponderal desde
pouco após o nascimento.
• Letais. Exceto se:
o Viver constantemente em ambiente estéril (bubble boy);
o Transplante de células estaminais hematopoiéticas;
o Terapia génica.

P á g i n a 141 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Múltiplos defeitos diferentes podem ter uma tradução muito similar, havendo assim várias
formas diferentes de um doente apresentar uma SCID.

Defeitos na transdução de sinal

SCID ligada ao X (transdução de sinais


mediados por citocinas):
• Mais frequente das SCID;
• Mutação no gene da cadeia gama
comum aos recetores das IL-2, IL-
4, IL-7, IL-15 e IL-21 (Fenótipo T- /
B+ / NK-);
• Formas recessivas com fenótipo
semelhante associam-se a Jak3.

Outro defeito na transdução de sinal


são os defeitos ao nível do recetor de
células T (TCR):
• Defeitos em CD3 (Fenótipo T- /
B+), onde não temos células T e ZAP-
70 (Fenótipo T+ / B+), onde temos
células T, mas estas não são
funcionais por incapacidade de
transdução de sinal.

Defeitos no Metabolismo dos Nucleótidos

Deficiência em ADA (adenosine deaminase) (mais conhecida)


Deficiência em PNP (purine nucleotide phosphorylase)

Enzimas importantes no metabolismo dos nucleótidos, cujo defeito conduz à acumulação de


metabolitos tóxicos para o desenvolvimento de linfócitos (Fenótipo T- / B- / NK-).

P á g i n a 142 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Defeitos na Recombinação Somática

Mutações em RAG1 e RAG2:


• Bloqueio na diferenciação de células pré-B e pré-T (Fenótipo T- / B- / NK+)

Síndrome de Omenn: o defeito de RAG1 e RAG2 é incompleto. Aspetos clínicos reminiscentes


de GVHD (eritrodermia, eosinofilia, diarreia, adenomegálias); os poucos linfócitos T produzidos
constituem um repertório muito pouco diversificado e provavelmente auto-reativo.

Mutações em DNA-PKCS:
• Envolvida na abertura dos hairpin e
reparação das quebras de DNA (por
NHEJ) após clivagem pelas RAGs.
Esta anomalia associa-se a um
aumento da sensibilidade às
radiações ionizantes (risco tumoral
nesse contexto);
• Ratinho SCID (Fenótipo T- / B- / NK+);
• Mutações em Artemis têm um
fenótipo semelhante.

Defeitos no Desenvolvimento Embrionário

Mutações em WHN (Winged-helix Nude)


• WHN / FOXN1 é um fator de transcrição importante para o desenvolvimento do epitélio
tímico e pele;
• Ausência do timo, com ausência de linfopoiese T (mas algumas células gama / delta que
se acumulam com a idade) – SCID + Ausência de pelos;
• Ratinho nude – human nude (Fenótipo T- / B+ / NK+).

Síndrome de DiGeorge
• Anomalia cromossómica (perda de uma porção do cromossoma 22), deleção 22q11,
com cerca de 3 megabases (3 milhões de pares de bases);
• Alterações da imunidade celular e / ou aplasia / hipoplasia do timo;
• Hipocalcemia sintomática e / ou defeitos anatómicos das paratiróideias;
• Cardiopatias congénitas.

P á g i n a 143 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula 13 – Imunopatogénese da Infeção VIH


Data Docente
16/11/2021 Profª. Doutora Ana Espada Sousa

O HIV é uma epidemia que tem um grande impacto, sendo que cerca de 75,7 milhões
de pessoas foram infetadas, tendo morrido 32,7 milhões. Atualmente 38 milhões de pessoas
estão infetadas e apenas 25,4 milhões tem acesso a terapêutica, que permite ter uma esperança
média de vida semelhante à das pessoas não infetadas. Em 2019 cerca de surgiram cerca de 1.7
milhões de novas infeções e morreram 690000 pessoas.

Esta epidemia está associada a muitos estigmas e preconceitos, sendo um eles que a
mulheres não são tão infetadas, o que não é de todo verdade. Na África Subsariana estudos
mostram que existe um risco de uma mulher estar infetada duas vezes superior aos homens e
cinco em cada seis infeções são em mulheres.

Em Portugal esta epidemia começou mais tarde, no entanto, enquanto noutros países
ao surgirem as novas terapêuticas antirretrovirais detetou-se um decréscimo acentuado dos
casos, não foi o caso do nosso país, apresentando um plateau no número de novos casos por
ano. Assim, é um dos países europeus com maior prevalência de HIV. Portugal destaca-se ainda
por uma alta prevalência de HIV na população com idade superior a 50 anos.

O HIV é um reto-vírus, sendo por isso um vírus de RNA que apresenta uma transcriptase
reversa que transforma o RNA em cDNA que se
intercala com o DNA do hospedeiro. É ainda
constituído por uma cápside, composta por uma
proteína p24. É envolvido por um envelope feito à
custa da membrana da célula que o vírus infeta, sendo
que este possui umas proteínas de superfície, gp120 e
gp41, que são importantes para a interação do vírus
com as células do hospedeiros. O vírus infeta as células
do hospedeiro por ligação da proteína gp120 com a
molécula CD4 e necessita de um coreceptor, da família
das quimiocinas, para realmente se fundir com a membrana da célula e entrar dentro da mesma.

Após o vírus entrar na


célula, a transcriptase reversa
transforma do RNA em cDNA
que integra o DNA da célula e
utiliza toda a maquinaria da
mesma para produzir novo
RNA e gerar novas proteínas
virais que constituem a
cápside e com a membrana da
célula geram novo envelope
do vírus, criando assim novos
viriões.

P á g i n a 144 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

A infeção inicia-se através de


mucosas sexuais, quer vaginal, quer
retal, ou por via sanguínea, sendo
mais frequente pela primeira via. As
células dendríticas captam o vírus e
levam-no até ao sistema imunitário
para ser processado. As células CD8 e
CD4 vão ser infetadas e por isso vão
disseminar o vírus pelo organismo.

Após este acontecimento é


montada a resposta imunitária, sendo
a principal assente nas células CD8
citotóxicas, que detetam as células
infetadas e as destroem.

A as células CD8
citotóxicas, quer pela via da destruição
das células afetadas, quer pela via da
libertação de citocinas que limitam a
replicação viral, vão fazer com que haja
uma diminuição da carga viral no
sangue, ou virémia. Sendo esta a
resposta durante a infeção aguda.

Em paralelo com estas


reposta existe a resposta das células
B, responsáveis pela resposta
humoral. Havendo muito tipos de
anticorpos que bloqueiam o vírus, que
iduzem a citotoxicidade, ou mesmo a
formação de imunocomplexos que
retêm o vírus no tecidos ganglionares.
Levando a diminuição da virémia
também.

P á g i n a 145 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

O gráfico mostra a história natural


da infeção por HIV se não for tratada.
Assim, pode ver-se nas primeiras semanas
existe uma disseminação do vírus no
organismo que se traduz no aumento da
carga viral do sangue, ou virémia. Quando
se iniciam as repostas imunitárias com as
células CD8 e células B, podem detetar-se
anticorpos contra o vírus no sangue,
chamando-se a esta fase a seroconversão.

Esta fase associa-se a uma


diminuição da carga viral, estabelecendo-
se uma equilíbrio entre o vírus e o
hospedeiro, entrando a doença na fase
crónica, uma vez que se sabe que este equilíbrio do organismo nunca foi capaz de eliminar o
vírus. Esta fase pode ser assintomática e por isso progredir sem consciência do indivíduo
infetado, dando-se uma replicação viral constante, bem como replicação de células do sistema
imunitário, o que causa um desgaste do mesmo. A determinada altura, quando a deterioração
passa a ser demasiado marcada o sistema imunitário não consegue montar respostas
imunitárias, levando à instalação de infeções ou tumores oportunistas, que definem a SIDA.
Assim, a SIDA é a conjugação da instalação de infeções oportunistas e da taxa de células CD4
muito baixas. Nesta fase avançada da doença leva inevitavelmente à morte, sendo por isso
fulcral que os doentes descubram a infeção na fase anterior, para que se possam aplicar
antirretrovirais.

Para os mesmos livéis de células CD4, ter muita ou pouca carga viral estabelece a
diferença da progressão da infeção.

Os linfócitos CD4 são infetados pelo HIV, sendo que isto leva a que à destruição dos
mesmos. Os primeiros antirretrovirais eficientes, inibidores da protease, levaram a uma descida
abrupta da virémia nos doentes, e um aumento do número de linfócitos CD4. Colocou-se assim
a hipótese de que o vírus destruía as células CD4 na ordem dos milhões todos os dias. No
entanto, descobriu-se que o número de células infetadas representa um número muito mais
P á g i n a 146 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

pequeno, havendo outras teorias que poderiam explicar o mecanismo do HIV. Sabia-se que nos
símios esta infeção produzia uma carga viral muito elevado, mas sem perda de células CD4. Os
modelos criados não estavam a ter em conta a ativação imunitária, ou seja, as células exprimem
moléculas de ativação, que estão muito aumentadas na infeção de HIV, e diminuem
abruptamente quando os doentes são tratados. Assim a subida dos CD4 em doentes tratados
no sangue pode ser explicada pela saída destes dos gânglios quando os doentes são tratados.

O vírus para infetar as células necessita de CCR5, uma molécula de ativação, e da


maquinaria da célula.

O vírus induz a ativação celular para induzir replicação do DNA.

A maior parte das células que


produzem viriões são células em
replicação celular.

De cada vez que é montada uma


resposta imunitária existe uma
expansão colonal das células de
resposta, sendo estas a maior parte
das células infetadas por HIV. A
maioria das células de reposta
morrem por apoptose, sendo que
para haver uma imunodeficiência é
necessário haver impacto na
células de memória e das células
naive.

P á g i n a 147 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Sabe-se então que os


linfócitos são formados na medula
óssea, vão para ótimo para formar
linfócitos T e acabam a circular no
sangue, assim o HIV vai influenciar
cada um destes compartimentos.
Assim o vírus provoca uma disrupção
da medula óssea, causa inflamação do
timo e dos gânglios linfáticos. Assim a
perda de CD4 é consequência da
destruição dos linfócitos por apoptose
pela infeção do vírus diretamente,
mas também pela influência do
mesmo nos vários compartimentos.

Sabe-se hoje, que o determina a progressão para SIDA é um conjunto de fatores, mais
determinados pelos processos inflamatórios, do que pela destruição das células CD4 em si. A
inflamação contribui para aumentar a proliferação viral e induz alterações nas células por
produção de moléculas de ativação e alterações funcionais que fazem com estas deixem de
executar as suas funções, levando a uma progressiva deterioração dos tecidos linfoides por
deposição de colagénio, e à perda de células naïves, de memória, CD4, CD8 e mesmo células
apresentadoras de antigénio. Estes fatores todos contribuem para uma imunodeficiência e para
a patogénese do HIV.

Em suma, o vírus infecta as células CD4,


ocorre uma libertação para o sangue de
viriões que são quantificáveis por PCR, e
assim instala-se a viriémia.

A destruição das células infetadas


contribui para a linfopenia, mas
simultaneamente, a replicação viral induz
uma ativação imunitária que é mais
perpetuada pelas moléculas do vírus que
favorecem essa ativação. Isto acontece,
uma vez que o vírus depende da ativação
celular para se replicar. Apesar da resposta imunitária por si só bloquear em parte a replicação
viral.

Por outro lado, a ativação persistente pode


levar à destruição das células e por isso, contribuir
para a linfopenia. O Vírus pode ainda afetar os locais
onde os linfócitos são produzidos, como a medula
óssea, o timo e os gânglios linfáticos.

Os linfócitos presentes nas mucosas são os


mais abundantes, além de apresentarem as
moléculas de ativação presentes e por isso são o locar
preferencial de infeção por HIV. Assim as mucosas são
permanentemente degradadas pela infeção.
P á g i n a 148 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Os estudos feitos sobre HIV foram feitos maioritariamente em doentes e sobre o que
acontece com estes doentes, uma vez que é uma infeção sobre a qual não se consegue fazer um
modelo.

No fim da fase aguda estabelece-se um equilíbrio entre o vírus e o hospedeiro, que é


muito importante para determinar o curso posterior da doença. Por ter uma transcriptase
reversa este vírus tem uma taxa mutacional muito elevada, por isso é necessário montar uma
resposta imunitária com células citotóxicas muito eficientes que suprimam completamente a
replicação viral. Caso a replicação viral não seja totalmente suprimindo podem surgir mutações
que permitem a emergência de escapes virais. Os antirretrovirais se não forem eficazes podem
causar o mesmo problema.

Existem alguns indivíduos que não se infetam, apesar do contacto com o vírus. Isto
levanta a questão da possibilidade de uma vacina, no entanto, sabe-se que não existe vacina
eficaz contra este vírus devido à sua elevada taxa de mutação. Existem assim várias estirpes e
mesmo dentro de cada estirpe existe uma enorme diversidade do vírus.

Estudos aponta ainda, para a ocorrência de alguns indivíduos que embora sejam
infetados nunca chegam a evoluir para SIDA, o que pode envolver vários fatores, quer do vírus,
quer do hospedeiros. Um dos fatores mais importantes é a mutação da CCR5, o coreceptor que
permite a entrada do vírus nas células. Quando esta mutação ocorre o indivíduo fica protegido
da infeção, e ainda, caso o hospedeiro seja heterozigótico para esta mutação, apresenta uma
evolução da doença mais lenta.

Hoje em dias usam-se cerca de 30 antirretrovirais para o HIV, que atuam em diferente
níveis do vírus, sendo que foram desenvolvidos para que os seus alvos sejam a transcriptase
reversa, a integrase ou a portease, e desenvolveu-se ainda um grupo especializado em inibir a
entrada do vírus nas células. Ainda se estão a tentar desenvolver outros antirretrovirais. Como
o vírus muta muito, por norma faz-se uma combinação de diferentes fármacos para atingir nas
diferentes vias.

A adesão à terapêutica é fulcral, uma vez que se o doente não aderir corretamente pode
levar a uma ligeira replicação do vírus a assim emergência da doença. A terapêutica teve um
impacto muito grande, sendo exemplo um estudo dos Estado Unidos, que mostra que em 1994
a maior causa de doença em adultos dos 25 aos 44 anos eram a infeção por HIV, no entanto,
após a implementação dos antirretrovirais, em dois anos a infeção por HIV passou a encontrar-
se abaixo do homicídio como causa de morte. A esperança média de vida de um indivíduo
infetado é idêntica à de um indivíduo saudável desde que a terapêutica seja implementada.

Quando a terapêutica é implementada inicialmente observa-se uma redistribuição dos


linfócitos CD4 para o sangue, deixando de estar sequestrados nos orgãos linfoides. Numa
segunda fase regista-se um aumento da capacidade proliferativa das células, que atingem a
homeostasia. E por fim, numa última fase, procura-se uma recuperação do timo, permitindo
novamente a produção de células T e assim recuperação do estado normal do sistema
imunitário.

Na maioria dos casos consegue-se levar a carga viral a valores quase indetetáveis, no
entanto nunca leva a irradicação, uma vez que o vírus está integrado no genoma das células,
sendo por isso, que se a terapêutica for interrompida pode levar a reemergência da doença,
causando o que se chamam de “blips”. O vírus integra-se no genoma das células, permanecendo
num reservatório latente em células que não são detetáveis pelos antirretrovirais.
P á g i n a 149 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Mantém-se também alguma inflamação persistente tanto pela incapacidade total de


reconstituição da mucosa, como por alterações do sistema imunitário que não foram totalmente
recuperadas, por alguma replicação viral que possa persistir, por toxicidade dos próprios
fármacos ou mesmo por infeção através de microrganismos oportunistas. A inflamação é o fator
apresentado nas manifestações clínicas atuais, levando a aterosclerose mais acentuada,
enfartes do miocárdio, maior risco de cancro, osteoporose, entre outras.

Existe um vírus diferente, o HIV2, que apesar de ser muito parecido com o HIV1, os
doentes apresentam uma carga viral muito baixa e por isso o vírus transmite-se poucos. Assim
manteve-se num nicho pequeno em países africanos, sendo Portugal o único país não africano
que apresenta infeções por HIV2 devido aos contactos que mantém com estes países. Este vírus
apresenta uma progressão muito mais lenta, o que leva a que a progressão para SIDA leva cerca
de 20 anos e por isso não teve grande impacto na mortalidade.

Para resumir, podemos previr infeção por HIV por testagem e procurando desenvolver
uma vacina. Podemos ainda procurar tratar precocemente os indivíduos infetados para poder
controlar os reservatórios virais, no entanto não se consegue erradicar o vírus. Até existir uma
cura é necessário controlar a infeção para reduzir a comorbilidades que os indivíduos infetados
apresentam.

P á g i n a 150 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula Pré-Gravada 5 - Vacinas


Data Docente
- Prof. Doutor Luís Graça

As vacinas foram um avanço médico, da imunologia, que teve um impacto extraordinário na


quantidade de vida das pessoas do mundo inteiro, que hoje beneficiam. Atualmente, a nossa
esperança média de vida ao nascer, é cerca de o dobro da do no início do século XX, sendo que
grande parte desse aumento da esperança média de vida se deve, ao sucesso da vacinação na
prevenção de doenças infeciosas.

O princípio básico da vacinação consiste em


induzir uma resposta de memória contra agentes
infeciosos que estão no nosso organismo, sendo
que essa memória imunitária não depende
apenas de células de memória que respondem
mais rapidamente ao organismo mas também da
produção de anticorpos. Estes podem, estando a
níveis neutralizantes, evitar que o microrganismo
cause doença ao entrar no organismo, sendo
imediatamente neutralizado por estes anticorpos
pré-existentes.

A Descoberta da Vacinação

A vacinação surgiu a partir do conhecimento de muitas centenas de anos, de tradição, que se


começou a perceber que indivíduos que tem uma determinada doença ficam protegidas para
essa doença, uma segunda vez. Um exemplo reside em pessoas que têm papeira, varicela, entre
outras doenças, essas mesmas pessoas, nunca mais/ficam imunes para o resto da vida para essas
doenças.

E, o que já na China se verificava era que pessoas conseguiam sobreviver à varíola, uma doença
perigosa e mortal, ficavam protegidas de um segundo episódio de varíola para o resto da sua
vida. Começa então uma prática que se designa de variolação (diferente de vacinação), que
consistia em expor pessoas saudáveis a pequenas pústulas de varíola. Assim, contraíam uma
P á g i n a 151 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

forma atenuada da doença e ficavam protegidas de uma doença mais grave, não controlada.
Este contágio por variolação tinha, por vezes, consequências muito graves.

O princípio da vacinação é diferente: o que se utiliza não é o próprio agente da doença na sua
forma pura e patogénica, mas um agente de certa forma modificado, de maneira que consiga
conferir proteção em relação ao agente, mas que esta forma inativada não seja ela perigosa, ou
pelo menos tão perigosa, quanto o agente.

A primeira vacina foi desenvolvida por Edward Jenner, no Reino Unido que observou que as
senhoras que recolhiam o leite das vacas, sendo que as vacas tinham infeções muito
semelhantes á varíola, essas mulheres nunca contraiam varíola. Então, resolveu inocular o
agente da vaca, um vírus designado de vaccinia em seres humanos, e verificou que esses
mesmos seres humanos ficavam protegidos para essa mesma doença humana.

O termo vacinação foi mencionado por Louis Pasteur, que criou a vacina contra a raiva.

Um episodio curioso é que alguns anos antes de Jenner, outra pessoa também no Reino Unido
chamado de Benjin Jesty fez observações exatamente idênticas às de Jenner. Inoculou também
ele o vírus vaccinia na mulher e nos seus filhos, que assim ficaram protegidos da varíola. No
entanto ao contrário de Jenner que publicou e difundiu os seus resultados, os de Benjin não
foram difundidos, nem tiveram mesmo impacto. Isto funciona também como uma lição para a
importância de dar a conhecer e publicar os avanços científicos para o benefício da comunidade
em geral.

Resistência Social à Vacinação

Tanto naquela altura como hoje, sempre existiu alguma resistência à vacinação. Naquela altura,
a principal resistência advinha de grupos religiosos, que consideravam que era contra os
princípios divinos, contra a vontade de Deus, introduzir-se material de vaca no organismo,
violando assim a integridade humana. Hoje em dia, por razões diferentes, ainda existem alguns
grupos da sociedade que resistem, e importa ter em mente os benefícios vastos da vacinação.

No gráfico observamos dados do CDC para os EUA, que comparam o número de casos de
algumas doenças para as quais existem vacinas, antes da entrada em vigor de planos de
vacinação e após vacinação.

Nos últimos anos, têm surgido novos casos nomeadamente de sarampo (measles), que estão
associados sobretudo a grupos de pessoas que recusam vacinar os seus filhos. Isto conduz a uma
P á g i n a 152 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

preocupação acrescida em termos de saúde publica, porque muitas destas doenças têm
problemas significativos associados.

A Necessidade de Vacinação

Podemos definir a necessidade de vacinação pela relação do nosso organismo, que tem ciclos
de vida longos, com organismos que evoluem rapidamente e que se conseguem adaptar
rapidamente às defesas do nosso organismo (20 min vs. 20 dias).

Todos os agentes patogénicos possuem mecanismos de evasão do sistema imunitário, tentam


escapar à deteção do sistema imunitário e o nosso organismo desenvolve mecanismos
imunitários que tentam contrariar estes mecanismos de evasão para detetar e destruir os
agentes patogénicos. A vacinação permite ultrapassar alguns destes mecanismos de evasão de
certos agentes infeciosos, impedindo por exemplo que alguns agentes nos possam colonizar ou
que possam produzir toxinas.

A nível evolutivo temos seres vivos com diferentes complexidades, começando com organismos
unicelulares, que possuem mecanismos citoprotetores que os protegem em relação ao
ambiente.

Existem organismos invertebrados, que não tem um sistema imunitário adaptativo, baseiam-se
assim no sistema imunitário inato, com recetores de reconhecimento de padrões (PRR´s). Estes
recetores de reconhecimento de padrões reconhecem moléculas que são comuns a muitas
bactérias, fungos, entre outros, possuindo assim uma resposta pouco diversificada em relação
aos agentes que os possam infetar. A diversidade de recetores é relativamente restrita e a
diversidade de respostas efetoras é também pequena.

Pelo contrário, os vertebrados possuem um sistema imunitário adaptativo mais complexo, com
uma diversidade muito grande de recetores que conseguem reconhecer potencialmente
qualquer molécula que estes microrganismos possam ter, para além de um sistema inato
semelhante ao dos invertebrados, essencial nos primeiros momentos da infeção. O que
acontece neste sistema imunitário mais complexo é que existe uma grande diversidade de
mecanismos efetores e uma especialização desses mecanismos para determinados tipos de
agente patogénicos (intracelulares, extracelulares...). Portanto, a resposta imunitária precisa
não só de reconhecer estes antigénios mas também de selecionar o tipo de resposta imunitária
mais adequada para estes microrganismos. Tudo isto é de extrema importância na vacinação.

Quando pensamos numa vacina também temos de pensar que essa vacina tem de selecionar o
tipo de resposta imunitária mais adequada para combater um determinado tipo de infeção, para
o qual queremos induzir uma proteção.

P á g i n a 153 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Por essa razão, é necessário conhecer os microrganismos que queremos combater, aos quais
queremos induzir proteção. Microrganismos diferentes têm também características muito
diversas. Nesta tabela, em que estão representados vírus, bactérias, fungos, protozoários e
parasitas, é evidente que para termos uma proteção para um parasita multicelular, os
mecanismos terão de ser totalmente diferentes contra bactérias unicelulares.

Existem diferentes mecanismos de imunidade inata:


• Complemento;
• Inflamação;
• Interferão;
• Apoptose;
• Fagócitos;

Certos tipos de mecanismos de imunidade inata são mais adequados para determinados tipos
de microrganismos. Dando como exemplo, o complemento é muito útil para combater bactérias
que ainda estão numa fase extracelular e não intracelular, não sendo muito útil para combater
infeções virais.

Objetivo da Vacinação

Os objetivos da vacinação consistem em estimular uma memória


protetora do sistema imunitário, com células de memória que se
ativam rapidamente aquando da entrada do microrganismo, que
leva a uma defesa prolongada ao longo do tempo, permitindo
uma proteção duradoura, e não pontual.

Para isso são necessárias células de memoria, e também é


fundamental a imunidade humoral, porque a existência de
anticorpos neutralizadores, anticorpos esses que são capazes de reconhecer e ligarem-se a
proteínas fixas do agente infecioso, pode inclusivamente evitar que a infeção se inicie. Se um
vírus, por exemplo necessita, para infetar células humanas, da interação de moléculas virais com
moléculas humanas, se tivermos anticorpos que neutralizem estas moléculas, o vírus nunca vai
conseguir ligar-se às células humanas e não vai conseguir sequer infetar a primeira célula para
conseguir estabelecer a infeção no organismo. Portanto, os anticorpos neutralizadores são
essenciais para a proteção de muitas infeções.

Vacinas

As vacinas têm assim uma importância muito significativa, são o método mais eficaz de proteção
para infeções, sendo que em muitos casos permite que a infeção nem se estabeleça/inicie. Por
outro lado quando há uma preocupação crescente com o desenvolvimento das resistências a
P á g i n a 154 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

antibióticos, as vacinas oferecem a possibilidade de evitar este problema a montante, ou seja,


ainda antes da infeção, ainda antes de ser necessário a utilização de um antibiótico, e evitar
através do sistema imunitário que a infeção se estabeleça.

Na vacinação, encontramos um grande número de sucessos e simultaneamente uma grande


dificuldade na obtenção de vacinas para determinados agentes infeciosos, sobretudo agentes
infeciosos associados a doenças crónicas (exemplo: o vírus do HIV, malária).

O desenvolvimento das vacinas é um processo muito complexo, em que é necessária uma


coordenação entre investigadores, indústria e entidades que gerem a saúde publica,
enfrentando sempre grandes dificuldades.

Tipos de Vacina

Habitualmente podem considerar-se 3 tipos de vacinas:


• Vacinas preventivas/convencionais: aquelas que todos nós associamos à vacinação;
• Vacinas terapêuticas: Nos últimos anos tem havido um interesse crescente por este tipo
de vacinas, essencialmente por vacinas terapêuticas para infeções cronicas (ex:
combater a infeção por HIV), mas também vacinas terapêuticas para combater o cancro.
Estas vacinas associadas a doenças oncológicas pretendem desencadear respostas
imunitárias já depois da doença surgir, para estimular o sistema imunitário a conseguir
eliminar as células malignas. Em suma, nas vacinas terapêuticas o objetivo não passa
pela prevenção, mas pelo aumento da eficácia do sistema imunitário contra a doença
instalada;
• Vacinas reguladoras, são utilizadas não com o objetivo de estimular a resposta
imunitária, mas sim de diminuir a resposta imunitária. O exemplo mais claro deste tipo
de vacinas, são as vacinas que são utilizadas para prevenir doenças alérgicas, mas existe
um grande interesse no desenvolvimento deste tipo de vacinas para a prevenção de
doenças auto-imunes;

Vacinas Preventivas

Têm como objetivo evitar induzir um período de proteção prolongado, através da geração da
imunidade humoral, produção de anticorpos ou da indução de células de memória.

Existem várias formas de atingir este objetivo através destas vacinas convencionais:
• Utilização de microrganismos ou toxinas inativadas;
• Vacinas ativas, com microrganismos vivos atenuados;
• Vacinas de subunidades de microrganismos, em que não se utiliza o microrganismo em
si mas proteínas desse mesmo microrganismo, tendo nos últimos anos uma utilização
crescente;
• Vetores recombinantes no desenvolvimento de vacinas para agentes para os quais os
métodos acima descritos não se têm mostrado muito eficazes.

Vacinas Inativadas

Quanto às vacinas inativadas são vacinas muito seguras e estáveis, porque estamos perante
material morto e não um organismo vivo que é utilizado. Existe um risco da inativação poder
não ser 100 % eficiente, sendo necessário um bom controlo de qualidade para garantir que essa
inativação acontece. O grande problema reside em serem fracamente imunogénicas e não

P á g i n a 155 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

serem muito boas a induzir uma resposta celular. São vacinas excelentes como resposta
humoral, mas não para indução de células citotóxicas.

Exemplos: tosse convulsa, poliomielite, raiva....

Vacinas Vivas Atenuadas

As vacinas vivas atenuadas são vacinas de agente vivo, como tal muito mais imunogénicas que
as vacinas anteriormente referidas. Conseguem induzir a produção de anticorpos, através da
imunidade humoral, mas também induzir a imunidade celular através de células citotóxicas. Este
tipo de vacinas habitualmente consegue induzir um período maior de proteção, sendo que a
necessidade de reforços é menor que nas vacinas inativadas.

Exemplos : varicela, BCG...

Vacinas de Subunidade

As vacinas de subunidade, ou seja, vacinas em que se utilizam proteínas que fazem parte do
organismo têm como objetivo induzir uma boa resposta humoral com uma boa produção de
anticorpos que consigam neutralizar a capacidade de infeção destes agentes. Ao utilizarmos
apenas proteínas não vamos conseguir induzir uma resposta celular citotóxica muito eficaz mas
conseguimos induzir uma boa produção de anticorpos neutralizadores.

Exemplos: hepatite B, gripe sazonal...

Vetores Virais

Relativamente aos vetores virais, um bom exemplo é um projeto de investigação aqui do IMM.
Um projeto na área da malária, em que se pretende utilizar um plasmódio que não causa doença
em seres humanos (plasmódio esse que causa doença em ratinhos) e introduzir nesse
plasmódio, proteínas críticas dos plasmódios que causam doenças nos seres humanos. Ao
utilizarmos esta estratégia, vamos conseguir introduzir nos seres humanos o agente vivo, não
patogénico mas que carrega em si material genético do agente que causa doença nos seres
humanos e para os quais vai conseguir induzir uma resposta imunitária eficaz, de modo a
proteger o nosso organismo se mais tarde entramos em contacto com este mesmo agente
humano.

Vacinas de DNA

Um projeto semelhante é a produção de vacinas de DNA, nas quais se introduz em células do


próprio organismo, material genético que codifica proteínas críticas do agente infecioso para
tentar desta forma induzir uma resposta imunitária contra esse mesmo agente infecioso.

Vacinas Terapêuticas

As vacinas terapêuticas são conceptualmente muito diferentes das anteriormente descritas.


Estas vacinas têm como objetivo não a indução da proteção contra uma determinada doença
mas sim a estimulação do sistema imunitário para conseguir combater essa doença de uma
forma eficaz. Isto pode acontecer num caso de uma infeção viral crónica, como no caso de
doentes infetados por HIV, em que há uma constante procura de estratégias para estimular as
respostas imunitárias contra o HIV, permitindo assim eliminar o vírus.
P á g i n a 156 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Nas doenças oncológicas, em algumas formas de cancro, tem-se procurado também


desenvolver vacinas para levar o sistema imunitário a identificar/responder e a combater de
forma mais eficaz as células cancerígenas, levando assim à erradicação do tumor. Um dos
exemplos, é a utilização de células dendríticas, nas quais se introduz antigénios tumorais e se
estimula uma resposta imunitária vigorosa contra estas células tumorais.

O entusiamo destas estratégias de vacinação contra tumores tem sido contrariado pelo facto de
estas células tumorais terem uma grande pressão seletiva e quando estimulamos a resposta
imunitária contra um determinado conjunto de antígenos, algumas dessas células tumorais
deixam de expressar esses antigénios, deixam de ser alvo de resposta imunitária e por isso surge
uma expansão de células tumorais resistentes á resposta imunitária que foi induzida com essa
estratégia de vacinação. A maioria das estratégias de vacinação contra tumores têm conseguido
induzir alguns períodos relativamente curtos de melhoria clínica, mas invariavelmente há uma
recidiva tumoral com escape ao sistema imunitário, que este não consegue controlar.

Vacinas Reguladoras

Um dos melhores exemplos onde se utilizam vacinas reguladoras para reduzir/alterar a


atividade do sistema imunitário, é em doenças alérgicas. Estas vacinas não são preventivas, não
servem para prevenir o surgimento de uma doença, mas sim para tratar uma doença que já está
estabelecida. Habitualmente a imunoterapia consiste na introdução controlada dos alergénios
sem adjuvantes, que com doses crescentes que vão modificar a resposta imunitária contra esses
alergénios, levando a uma diminuição da produção de IgE, com o aumento da produção de
outras imunoglobulinas, como por exemplo a IgG4, que em nada estão associadas á doença
alérgica. Levam também a um aumento da produção de citocinas anti-inflamatórias, como por
exemplo, a IL-10 e a uma melhoria clínica que demora algum tempo a ser atingida. Isto são
processos demorados que nem sempre são eficazes e que são bastante dispendiosos.

Para alem destas vacinas contra as doenças alérgicas tem havido uma tentativa de desenvolver
estratégias para prevenir o surgimento de doenças alérgicas em pessoas que ainda não possuem
alergia, nomeadamente através da administração oral de alguns alergénios. Estes estudos ainda
estão em curso, sem perspetiva final para os resultados.

Estes métodos também têm sido utilizados para prevenir/tratar doenças auto-imunes, tentando
introduzir de forma controlada antigénios que estão associados á resposta imunitária,
relacionada com uma doença auto-imune. O objetivo é tentar evitar que haja uma resposta
imunitária contra esses antigénios, tentando estimular o surgimento de células reguladoras e
uma diminuição da resposta imunitária contra esses antigénios.

Todas estas situações são experimentais e que ainda não estão comprovadas, não sendo por
isso utilizadas na clínica (exceto as vacinas contra as alergias; a imunoterapia especifica para os
alergénios tem eficácia comprovada, sendo usada regularmente).

Como Fazer uma Vacina?

Existem dois princípios básicos que estão por detrás do desenho de uma vacina: por um lado o
estudo da Imunologia, por outro lado o estudo e o conhecimento dos agentes infeciosos.

Relativamente à Imunologia é indispensável o conhecimento, pois torna- se necessário saber


que para diferentes agentes, há diferentes respostas imunitárias que são importantes, e daí
perceber qual a resposta mais adequada para o agente para o qual queremos ter uma vacina
P á g i n a 157 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

protetora. Dando um exemplo, no caso de bactérias intracelulares, a resposta imunitária mais


adequada baseia-se em células Th1, por outro lado para bactérias extracelulares ou para fungos,
a resposta mais eficaz poderá ser a resposta Th17, enquanto para parasitas como helmintas, a
resposta mais adequada passa por Th2, sendo que neste caso uma resposta Th1 será pouco
eficaz. Daí a importância de sabermos que tipo de resposta é mais adequada para cada agente
e o que é necessário para induzir uma resposta de um tipo versus uma resposta de outro tipo.

O aspeto essencial é saber o que acontece nas respostas imunitárias contra agentes
intracelulares e agentes extracelulares, sendo em muitos casos a utilização de anticorpos ou de
células citotóxicas torna-se útil para um tipo de agentes, mas não para o outro tipo.

Em segundo lugar é necessário conhecer o organismo. Precisamos de saber exatamente qual é


a biologia do organismo para saber quais são os alvos adequados para uma vacina eficaz, ou
seja, necessitamos de saber as proteínas que estão associadas à patogenicidade do
microrganismo, como por exemplo quais as proteínas necessárias para um vírus se ligar e infetar
células humanas. Todo o conhecimento destas proteínas é essencial para percebermos o que
introduzir na vacina e assim conseguir induzir uma resposta imunitária contra aquilo que é útil
e não contra alguma proteína das bactérias/vírus que não estão envolvidas na patogenicidade
destes microrganismos.

Adjuvante

Finalmente, o outro aspeto fundamental nas vacinas, algo que tem sido muito discutido porque
tem uma importância incontornável é a presença de adjuvante, ou seja, quando temos uma
vacina, precisamos de ter os antigénios do microrganismo, mas para além disso, precisamos de
ter algo que induza uma resposta imunitária vigorosa.

Uma figura muito importante da imunologia da segunda metade do seculo XX foi Charles
Janeway, um impulsionador da importância da imunidade inata para o início da resposta
adquirida. Charles Janeway dizia que adjuvantes eram o “pequeno truque sujo dos
imunologistas”, porque a maior parte dos imunologistas falava em respostas imunitárias,
imunizar com a proteínas A, ou B, ou C mas na verdade se introduzirmos uma proteína no
organismo as respostas imunitárias que temos, mesmo sendo uma proteínas estranha, são
relativamente pequenas.

Por isso nas vacinas humanas é sempre necessário utilizar um adjuvante para potenciar a
resposta imunitária contra os antigénios que estão presentes nesta vacina. O adjuvante que era
utilizado classicamente na maioria das vacinas era o hidróxido de alumínio, muito eficaz e
seguro. Recentemente tem estado em desenvolvimento outros adjuvantes que já são utilizados
correntemente noutros tipos de vacinas.

Problemas Sem Fim

No entanto, esta área científica permanece de grande interesse porque ainda existem alguns
problemas sem solução. Existem infeções crónicas para as quais não existe uma vacina eficaz,
como o caso do HIV, malária e tuberculose.

O cancro e as vacinas terapêuticas para o cancro ainda não conseguiram resultados que sejam
muito positivos, apesar de avanços promissores. Existe ainda uma grande área para explorar na
indução de respostas imunitárias contra o cancro.

P á g i n a 158 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Finalmente, uma área de grande pesquisa é de que forma é que podemos utilizar vacinas para
diminuir a resposta imunitária no caso, por exemplo, de doenças alérgicas ou de doenças auto-
imunes, sendo este um grande campo para avanços científicos, para novas descobertas para
tentar desenvolver novas fórmulas terapêuticas para evitar estas respostas imunitárias que são
e que estão a causar a doença.

P á g i n a 159 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Aula 14 - Vacinas
Data Docente
24/11/2021 Prof. Doutor Luís Graça

Esclarecimento de dúvidas dos alunos (1ª Metade da Aula)

As vacinas reguladoras baseiam-se em antigénios? Se introduzirmos uma proteína no organismo


isto é suficiente para fazer uma boa vacina? Por exemplo podemos injetar a proteína SPIKE do
SARS-CoV-2 e seria isto suficiente para ter uma boa vacina?

Precisa de um adjuvante. O que faz o adjuvante? O adjuvante serve para estimular a imunidade
inata para que os antigénios da vacina sejam bem apresentados às células T e conduzam a uma
ativação eficaz destas. A consequência para essa ativação eficaz é que tem de existir co-
estimulação, porque se não houver co-estimulação as células T não serão ativadas. A co-
estimulação é fornecida pelas células dendríticas. Mas para estas células dendríticas poderem
apresentar o antigénio eficazmente, com co-estimulação, com libertação de citocinas que
potenciam a resposta imunitária e a ativação das células T, é necessária a ativação das células
dendríticas. Os PRR, como os TLR, são um bom exemplo de PRR que vão servir de adjuvantes
para ativar as células dendríticas.

Para as vacinas que estão a ser utilizadas contra o SARS-CoV-2, temos vacinas diferentes. Todas
têm em comum que o antigénio é a proteína SPIKE (que o vírus utiliza para infetar as nossas
células). A Novavax, em aprovação pela FDA atualmente, contém para alem da SPIKE, uma
proteína adjuvante para induzir a resposta imunitária. As vacinas chinesas, utilizadas em outros
países (brasil, por exemplo) usam vírus inativado. As vacinas que usamos atualmente na Europa,
têm ou um vetor viral que traz consigo material genético que codifica a proteína do vírus
(AstraZeneca, Janssen) ou vacinas que têm partículas com o mRNA do vírus (Moderna, Pfizer).
Nestes últimos dois exemplos, o mRNA e o vetor viral acabam por servir como adjuvantes, não
necessitando de um adjuvante específico.

O adjuvante não é o alvo da resposta imunitária, mas sim produtos que vão facilitar a ativação
das células apresentadoras de antigénio permitindo que se gere uma resposta imunitária.
P á g i n a 160 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Frequentemente no nosso conceito de vacina, temos a ideia que as vacinas servem para induzir
depois uma resposta de memória. Quando fazemos uma vacina, naturalmente queremos que
haja uma resposta de memória, e respostas secundárias acabam por ser benéficas, mas também
queremos que haja imediatamente a formação de células efetoras. Por exemplo, nas vacinas da
hepatite B, ou do HPV, o que vamos fazer é que haja a formação de uma grande quantidade de
anticorpos neutralizantes, que conseguem neutralizar o vírus, assim que este entra no
organismo. Assim o objetivo desta vacina não é tanto gerar uma resposta de memória (que
existe), mas sim gerar anticorpos neutralizantes que entrem em circulação, para permitir uma
resposta imediata após contacto com o vírus.

Existem vacinas de vários tipos, um desses tipos são as vacinas vivas atenuadas. São exemplos
desse tipo:

As vacinas atenuadas, vão utilizar o agente patogénico, que é alterado de maneira a que fique
atenuado, ou seja mantendo uma capacidade de replicação, mas não sendo patogénico. Isto é
importante porque, este tipo de vacinas é o único que causa preocupações em, por exemplo,
pacientes com imunossupressão, porque este agente atenuado, como é vivo ainda tem algum
potencial patogénico em pessoas que têm uma imunidade diminuída.
P á g i n a 161 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Isto não acontece com outros tipos de


vacinas, como por exemplo as vacinas
inativadas, em que, através da
inativação, o vírus mantêm os antigénios,
mas não tem capacidade de se replicar.
Como tal, mesmo que a pessoa não tenha
sistema imunitário, em princípio não vai
ser capaz de provocar doença.

O mesmo acontece com as vacinas que são os toxoides, como é o caso das vacinas da Difteria e
do Tétano.

As vacinas de polissacáridos conjugados, como caso da vacina da meningite, conjugam os


antigénios da cápsula com polissacarídeos de forma a induzir uma resposta imunitária.

P á g i n a 162 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Nas vacinas recombinantes, são utilizados fragmentos de proteínas.

Tipos de Vacinas – Resumo

As vacinas com material genético (como as contra a COVID-19) sejam pelo uso de adenovírus ou
de mRNA, não causam doença em pessoas imunosuprimidas.

Assim tem de existir uma grande diferenciação entre vacinas que sejam replicativas (que podem
causar problemas em pessoas imunosuprimidas) e não replicativas (não causam problemas em
pessoas imunosuprimidas.

Vacinas vivas atenuadas vs vacinas não replicativas

Vacinas vivas (atenuadas):


• Vantagens:
o Produzem imunidade humoral e celular (células citotóxicas – CTLs);
o Melhor memória imunitária (frequentemente dose única);
o Conjunto maior de antigénios (pode permitir maior proteção).
• Desvantagens:
o Menos estáveis (necessidade de refrigeração);
o Virulência residual (imunocomprometidos / grávidas);
o Risco de reverter para forma patogénica.

P á g i n a 163 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Vacinas não replicativas:


• Vantagens:
o Seguras (inativação é irreversível);
o Estáveis.
• Desvantagens:
o Inativação pode não ser 100% eficiente (necessário bom controlo qualidade);
o Não induzem células citotóxicas de memória (melhor para imunidade humoral);
o Proteção de curto prazo (necessidade de reforços);
o Imunização relativamente fraca - Necessidade de adjuvantes.

Adjuvantes

P á g i n a 164 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

P á g i n a 165 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Novas estratégias no desenvolvimento de vacinas

P á g i n a 166 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

P á g i n a 167 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Novas Estratégias para o desenvolvimento de vacinas:


• Identificar os mecanismos imunitários que conferem proteção e os alvos contra os quais
se devem dirigir:
o Estudos de interação entre o agente infecioso e o hospedeiro:
▪ Ex: identificação de recetores, fatores de virulência, etc.
o Identificação de correlativos de protecção:
▪ Estudo de indivíduos protegidos vs susceptíveis após infecção natural
ou vacinação.

P á g i n a 168 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

• Saber como induzir os mecanismos imunitários protetores;


o Para adequar o tipo de resposta a cada agente patogénico:
▪ Como programar o tipo de resposta Th?
▪ Como induzir citotoxicidade celular (CTL)?

Programação do tipo de resposta Th por ativação de recetores de imunidade inata:

Os sinais transmitidos pelas APCs (ex.


citocinas) tem um papel determinante na
definição do destino das células T.

Como atuar na APC ou no microambiente


envolvente para programar o destino de
diferenciação de uma célula naife?

Os diferentes ligandos de PRRs ativam


diferentes vias de sinalização
intracelular:
• Induzem diferentes sinais
polarizadores (citocinas,
moléculas de superfície).

Diferentes ligandos de PRRs, ou combinações de ligandos, podem ser usados para induzir
diferentes tipos de resposta.

Indução de Respostas por células T CD8+ citotóxicas:

A proteção contra alguns agentes patogénicos (ex. de vírus, parasitas e bactérias intracelulares)
requer a indução de CTL.

A indução de CTL necessita da apresentação de péptidos em MHC classe I.

P á g i n a 169 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

As vacinas não replicativas habitualmente não induzem CTL por não originarem apresentação
em MHC classe I.

Estratégias para induzir CTL por expressão intracelular de antigénios:

P á g i n a 170 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Vacinas Terapêuticas:
• Estimular resposta imunitária contra infeção persistente ou contra microorganismos
continuamente em replicação:
o É necessário ativar mecanismos diferente das vacinas preventivas;
o Aqui não é tanto gerar anticorpos neutralizantes ou células de memória, mas
antes gerar mecanismos efectores adequados.
• Infeções crónicas e tumores frequentemente não induzem boas respostas imunitárias;
• Uma promessa em imunoterapia do cancro.

Vacinas Reguladoras:
• Para reduzir a resposta imunitária;
• Por exemplo imunoterapia específica para as doenças alérgicas:
o Administração de quantidades crescentes de antigénio, sem adjuvantes pro
inflamatórios;
o Levam a indução de células reguladoras (IL-10);
o Levam à produção de IgG4 (em vez de IgE);
o Infelizmente é um processo dispendioso, demorado (>1 2 anos), com riscos
(anafiláxia), e frequentemente ineficaz (alguns alergénios têm maior eficácia
que outros).
• Autoimunidade, patologia inflamatória, transplantação… ainda sem resposta adequada.

P á g i n a 171 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

O objetivo das vacinas reguladoras é precisamente o contrário das outras, sendo que nestas
pretendemos uma diminuição da resposta imunitária, enquanto nas vacinas terapêuticas
pretendemos que essa resposta seja aumentada. A administração de quantidades crescentes de
antigénio tem de ser feita sem adjuvantes pró-inflamatórios, de forma a que não existam fatores
que favoreçam que as células dendríticas sejam estimuladas e que apresentem os antigénios de
uma forma pró-inflamatória. Se esta dose de antigénio for uma dose muito elevada, a própria
distribuição deste antigénio pelas células dendríticas pode ultrapassar este efeito e fazer com
que haja uma estimulação no contexto pró-inflamatório. Daí que seja necessário que haja esta
quantidade crescente de antigénio a ser administrado, que vai fazer com que sejam
apresentados sem que haja indução de uma resposta pró-inflamatória.

Pelo contrário, o que acontece é que são estimulados mecanismos que existem no nosso
organismo para induzir tolerância imunitária, de forma a induzir tolerância contra antigénios
externos.

No caso da alergia, existe produção de anticorpos de classe IgG4 que têm uma afinidade elevada
para o antigénio (neste caso o alergénio) usado nas vacinas de dessensibilização. Este IgG4 acaba
por competir com o IgE. Se pessoas alérgicas deixarem de ter IgE contra o alergénio, e passarem
a ter IgG4, passam a ter menor probabilidade de surgir uma resposta alérgica aquele alergénio.

Um Overview sobre Vacinas COVID-19 (2ª metade da Aula)

O professor diz que esta parte “não vai necessariamente sair no exame” (SIC), mas, pelo sim
pelo não, fica aqui a informação mais importante.

Temos que considerar que as respostas imunitárias induzem respostas primárias e secundárias.
Aquilo que pretendemos de uma vacina é passar de uma resposta primária, para uma resposta
secundária (caso haja exposição ao vírus) e para além disso ter um a produção de um conjunto
de mecanismos efetores, sejam eles células efetoras como as CTl, sejam eles anticorpos que nos
permitem ter logo um nível de proteção quando formos novamente expostos ao mesmo
antigénio.

As pessoas que recuperaram da infeção acabam por ter uma boa resposta imunitária. Em
Portugal só fizemos 1 dose em recuperados, porque a infeção acaba por ser como uma dose da
vacina. Aliás a proteção conferida acaba por ser melhor nesses infetados, do que em pessoas
que levaram duas doses da vacina. Na recuperação para a infeção natural, a pessoa é exposta
não só a SPIKE, mas também a outros antigénios do vírus, o que faz uma resposta mais robusta
para outras variantes (visto que as variantes aparentam apresentar mutações em SPIKE). A
proteção celular dirigida a outros antigénios acaba também por ser positiva contra formas
graves da doença.

Foi decidido atrasar a vacinação dos recuperados em 6 meses, para poderem existir mais vacinas
para pessoas vulneráveis e também porque o intervalo entre infeção e vacinação ou entre duas
doses da vacina, acaba por ter uma resposta mais duradoura. Quando queremos fazer o reforço
vacinal, precisamos que haja uma resposta primária que termine, para depois haver uma
resposta secundária. Isto porque temos de dar tempo que os centros germinais onde estão a ser
feitos os anticorpos e a ativação celular acabe por terminar, para termos a capacidade de atuar
nessas células de memória que ficaram e dar-lhes um boost para uma resposta secundária.

O risco contra reinfeção é baixo, em pacientes que já tiveram infeção. Pacientes que foram
vacinados têm maior risco de infeção que os que já foram infetados previamente.
P á g i n a 172 | 173
Notas de Imunologia – Tronco Comum II.a)

Depois da primeira dose da vacina, a quantidade de anticorpos existente é semelhante aquela


de pessoas recuperadas da infeção. Ao fim da segunda dose, o nível de anticorpos aumenta
acima da de um recuperado. Os anticorpos neutralizantes, após a primeira dose, são formados,
mas em comparação com uma pessoa recuperada da infeção são muito menos. Contudo após a
segunda dose a quantidade de anticorpos neutralizantes é ligeiramente superior à média dos
recuperados. Assim a quantidade de anticorpos existente não apresenta uma importância tão
grande como a afinidade dos anticorpos, ou seja, a capacidade de neutralização dos anticorpos.
Isto também mostra a importância da segunda dose para a eficácia das vacinas, pela melhoria
da quantidade de anticorpos.

As pessoas que formam infetados e fizerem uma dose da vacina têm mais anticorpos
neutralizantes do que quem fez as duas doses da vacina.

Quer a infeção tenha sido sintomática ou assintomática, o título de anticorpos aumenta muito
mais rapidamente após vacinação (7 dias) face a um paciente que não foi infetado (14 dias), o
que também indicia uma resposta secundária à vacinação nos recuperados.

A resposta quer celular, quer humoral, de um paciente recuperado da doença e vacinado com
uma dose é muito semelhante à de um vacinado com as duas doses, que nunca foi contaminado
previamente.

Os anticorpos têm uma maior capacidade


de perder a sua capacidade protetora do
que outras células imunitárias, porque
são vais específicos para uma
determinada variante do vírus.

A efetividade da vacina vai-se diminuindo, mas não é abrupta, é um processo gradual, ao longo
do tempo.

A efetividade da vacina não pode ser medida através do título de anticorpos. Além disso não são
só os anticorpos a fornecer proteção, mas também as outras células do sistema imunitário.

As pessoas vacinadas podem ser infetadas, contudo, há uma redução muito grande do grau de
infeção.

P á g i n a 173 | 173
Notas de Infeciologia – Tronco
Comum II.a)
2021-2022
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Índice
Aula 2 – Doenças Infeciosas “Comuns”......................................................................................... 2
Aula 3 – O Infeciologista e o Laboratório de Microbiologia........................................................ 10
Aula 4 – Doenças Infeciosas e Emergência de Novas Doenças ................................................... 20
Aula 5 – Tuberculose ................................................................................................................... 22
Aula 6 – Infeções do Trato Respiratório...................................................................................... 26
Aula 7 – Infeções Sexualmente Transmitidas ............................................................................. 36
Aula 8 – Sépsis ............................................................................................................................. 43
Aula 9 – Sintomas e Sinais nas Doenças Infeciosas..................................................................... 50
Aula 10 – Malária ........................................................................................................................ 55
Aula 11 – Hepatites Víricas.......................................................................................................... 64
Aula 12 – Zoonoses ..................................................................................................................... 81
Aula 13 – Infeção por VIH............................................................................................................ 89
Aula 14 – Infeções do SNC......................................................................................................... 102
Aula 15 - Antibióticos ................................................................................................................ 111
Aula 16 – Resistência aos Antibióticos ...................................................................................... 126
Aula 17 – Infeções Nosocomiais................................................................................................ 133
Aula 18 – Medicina do Viajante ................................................................................................ 139

Agradecimentos

Às minhas companheiras nesta


aventura, que nunca me deixam
desacompanhado!

P á g i n a 1 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 2 – Doenças Infeciosas “Comuns”


Data Docente
07/10/2021 Drª. Inês Leitão

Perspetiva Histórica

Definições:
• Esporádica – Existem casos isolados, esporadicamente;
• Endémica – Patologias características de uma determinada população ao longo do
tempo, nesse contexto;
• Hiperendémica – Transmissão e incidência muito elevada naquela população / região
geográfica;
• Surto / cluster – Circunstância em que numa zona circunscrita existe um pico de
incidência de uma determinada patologia;
• Epidemia – Picos de atividade de uma patologia mais generalizadas no espaço;
• Pandemia – Atividade de uma doença que se espalha pela maioria do planeta.

Porque surgem epidemias:


• Aumento da circulação na comunidade e / ou virulência do agente;
• Introdução do agente num novo contexto: área geográfica, população, etc...;
• Nova via ou modo de transmissão mais eficaz;
• Alteração na suscetibilidade do hospedeiro e / ou da sua resposta ao agente;
• Novas portas de entrada ou aumento da exposição do hospedeiro ao agente.

Infeções epidémicas / pandémicas:


• Vírus Respiratórios: Influenza (!!), SARS, MERS;
• Doenças Exantemáticas: Sarampo, Varíola;
• Febres Hemorrágicas: Ébola / Marburg, Lassa, Crimeia-Congo, Hantavírus, F. Amarela,
Dengue, Zika, Chikungunya;
• Agentes Entéricos: Peste bubónica (Y. pestis), Febre Tifóide (S. typhi), outras
Salmoneloses, Cólera;
• Doenças Transmitidas por Pulgas / Carraças: Tularemia, Tifo e outras Rickettsioses;
• Outros: VIH / SIDA, Malária, Tuberculose.

Infeções do Trato Respiratório Superior

Faringite / Amigdalite:
• Uma das infeções mais frequentes na prática clínica, em especial nos cuidados de saúde
primários;
• A etiologia vírica é de longe a mais frequente:
o Rinovírus;
o Coronavírus;
o Adenovírus e Coxsackievírus A;
o Influenza e Parainfluenza;
o Herpesvírus (HSV-1 e 2, EBV, CMV);
o Vírus da Imunodeficiência humana.
• Etiologia:
o Causas bacterianas:

P á g i n a 2 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

▪ Mais frequente – Streptococcus do grupo A (S. pyogenes) - 50% das


infeções em crianças, 10% nos adultos;
▪ Outros Streptococcus dos grupos B e G;
▪ Anaeróbios da flora da orofaringe – quadro grave com extensão às
partes moles do pescoço (Angina de Vincent);
▪ Difteria (Corynebacterium diphteriae) – Diminuição franca com a
vacinação, mas casos esporádicos em idosos e não vacinados, aspeto
característico com pseudomembranas acinzentadas aderentes às
paredes da faringe;
▪ Neisseria gonorrhoeae e Treponema pallidum – infeções de transmissão
sexual com possível manifestação como faringire em contexto de
relações sexuais orais;
▪ Mycoplasma spp. e Chlamydia spp. – pneumonia concomitante;
▪ Fusobacterium necrophorum – fungo colonizador da orofaringe em
adolescentes em algumas regiões do mundo, associado a embolização
séptica e trombose séptica da veia jugular (Síndrome de Lemierre).
• Clínica:
o Febre;
o Mal-estar geral / astenia e mialgias;
o Odinofagia / disfagia;
o Adenopatias locoregionais dolorosas;
o Exsudado faríngeo / amigdalino.
Se:
o Odinofagia muito intensa / disfagia;
o Assimetria da orofaringe / cevical;
o Trismus / torcicolo;
o Otalgia; Suspeitar de Abcesso
o Abaulamento do véu do palato; Periamigdalino!
o Desvio da úvula;
o Sialorreia; Se atraso no diagnostico e
o “Hot Potato Voice”. intervenção cirúrgica - risco de
extensão ao espaço retrofaríngeo e
mediastino!

• Diagnóstico:
o Teste rápido antigénio SGA;
o Cultura de exsudado faríngeo;
o Se suspeita de abcesso – TC cervical com contraste urgente.
• Tratamento:
o 1ª Linha – Penicilina G IM em administração única;
o Se alergia a penicilina – Macrólido;
o Abcesso periamigdalino – Amoxicilina / Ácido Clavulânico ou Clindamicina;
o O tratamento diminui o tempo de duração dos sintomas e previne complicações
supurativas e não supurativas (glomerulonefrite pós-estreptocócica e febre
reumática).

Epiglotite:
• Etiologia:
o Maioritariamente infeção por Haemophilus influenzae (outros – S. pneumoniae,
S. aureus, etc);
P á g i n a 3 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

o Classicamente mais frequente nas crianças, atualmente rara com o advento da


vacinação anti- H. influenzae B;
• Clínica:
o Odinofagia com disfagia, sialorreia e dificuldade respiratória de agravamento
rápido e progressivo com estridor e risco elevado de obstrução da via aérea com
necessidade frequente de entubação.
• Diagnóstico: clínico e por laringoscopia;
• Tratamento: Cefalosporina 3ª Geração durante 7-10 dias.

Otite Externa:
• Infeção do canal auditivo externo (CAE);
• Associada a natação, irrigação do CAE para remoção de cerúmen ou dispositivos que
ocluem o mesmo (headphones ou aparelhos auditivos);
• Clínica:
o Edema, calor, dor e prurido;
• Principais agentes etiológicos: Pseudomonas aeruginosa (+++), Staphylococcus
coagulase negativo, S. aureus, anaeróbios, otomicose por Candida spp. ou Aspergillus
spp.;
• Tratamento: antibiótico com cobertura anti-Pseudomonas (neomicina ou
ciprofloxacina) e corticóide tópicos; clotrimazol tópico + desbridamento cirúrgico se
infeção fúngica.
• Otite Externa Maligna:
o Diabéticos e imunodeprimidos (neutropenia);
o Infeção necrotizante grave com risco de extensão aos tecidos adjacentes (ATM,
cartilagem, osso, base do crânio, meninges, pares cranianos e tecido cerebral);
o Etiologia – quase exclusivamente por P. aeruginosa;
o Diagnóstico por TC, RMN ou cintigrafia com gálio;
o Tratamento – conjugação de antibioterapia sistémica com cefalosporina anti-
Pseudomonas (ceftazidima ou cefepime) durante 6 semanas + desbridamento
cirúrgico.

Otite Média:
• Mais comum nas crianças – aos 3 anos, 2/3 das crianças já tiveram pelo menos um
episódio;
• Obstrução da trompa de Eustáquio → Preenchimento do ouvido médio por líquido
seroso → Infeção das vias respiratórias altas → Infeção do ouvido médio por flora da
orofaringe;
• Clínica:
o Otalgia;
o Otorreia;
o Diminuição da acuidade auditiva;
o Febre;
o Vertigem / zumbido;
o Nistagmo;
o Abaulamento, hiperemia, nível de ar / líquido e perda de mobilidade da
membrana timpânica.
• Etiologia:
o S. pneumoniae; H. influenzae; Moraxella catarrhalis; S. pyogenes; S. aureus.
• O diagnostico é clínico por otoscopia:
o Punção aspirativa da membrana timpânica para cultura em imunodeprimidos
para diagnóstico etiológico.
P á g i n a 4 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

• Tratamento: Amoxicilina ou amoxicilina / ácido clavulânico (estirpes produtoras de


beta-lactamases) durante 7 a 10 dias.

Mastoidite:
• Complicação rara mas potencialmente grave de otite média aguda;
• Disseminação da infeção para as células de ar da mastóide – edema, calor, rubor e dor
local;
• Mastoidite crónica – disseminação para o temporal, trombose séptica do seio lateral e
sigmoideu e abcesso cerebral;
• O tratamento é semelhante ao da otite média, mas mais prolongado (3-4 semanas);
• Se abcesso mastoideu ou extensão a outros tecidos – mastoidectomia e drenagem
cirúrgica!

Sinusite:
• Infeção de um ou mais seios perinasais;
• Sinusite viral → Inflamação e produção de líquido seroso → Sinusite bacteriana (0,5 a
1% dos casos).
• Fatores predisponentes:
o Obstrução anatómica – defeito do septo, pólipos nasais, corpo estranho,
adenoidite crónica, neoplasias, sondas/tubos nasais;
o Alergia e inflamação crónica;
o Abcesso dentário;
o Fibrose quística e síndrome de Kartagener.
• Etiologia: viral vs bacteriana:
o S. pneumoniae e H. influenzae são os mais frequentes;
o Outros Streptococcus (p.e. pyogenes e viridans);
o M. catarrhalis;
o S. aureus;
o Anaeróbios;
o Bacilos Gram negativo – sinusite crónica;
o P. aeruginosa – imunodeprimidos;
o Fungos (Aspergillus spp.) – neutropénicos.
• Clínica:
o Febre elevada;
o Rinorreia purulenta;
o Dor facial intensa;
o Cefaleia intensa localizada;
o Irritação de pares cranianos;
o Disósmia;
o Hipo ou hiperestesia;
o Tosse persistente;
o Dor à palpação dos seios perinasais.
• Diagnóstico:
o Zaragatoa da nasofaringe não tem utilidade;
o Colheita direta por nasofibroscopia ou punção aspirativa para exame cultural;
o TC ou RMN se suspeita de complicação – verificar extensão da infeção,
disseminação para outros tecidos, formação de abcessos,etc.
• Complicações:
o Sinusite etmoidal – celulite orbitária e periorbitária, abcesso da órbita,
trombose do seio cavernoso e meningite;

P á g i n a 5 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

o Sinusite frontal – “Pott’s puffy tumor”, abcesso cerebral (cefaleia intensa e


convulsões!);
o Sinusite esfenoidal – trombose séptica do seio cavernoso, lesões do III, IV, V e
VI pares com oftalmoplegia, proptose, quemose e hipo ou hiperestesia.
• Tratamento:
o 1ª linha – amoxicilina / ácido clavulânico ou quinolona durante 5 a 7 dias no
adulto, 10 a 14 dias na criança;
o 2ª linha - doxiciclina, cefalosporinas 2ª ou 3ª geração;
o Casos graves – associação de penicilina resistente às penicilinases
(flucloxacilina) + cefalosporina 3ª geração (ceftriaxone, ceftazidima ou
cefotaxime) + metronidazol!
o Abordagem cirúrgica;
o Irrigação com solução salina;
o Corticoide nasal se desencadeante alérgico.

Infeções do Trato Urinário

• As infeções mais comuns na prática clínica de ambulatório;


• Diferentes tipos:
o Cistite aguda;
o Pielonefrite;
o Prostatite.
• Bacteriúria assintomática.

Patogénese:

Etiologia:
• Escherichia coli é de longe o agente mais frequente;
• Outras Enterobacteriaceae: K. pneumoniae, P. mirabilis;
• S. saprophyticus;
• Alteração anatómica, infeções recorrentes ou instrumentação urológica: Enterobacter
spp., Serratia spp., Pseudomonas aeruginosa, Enterococcus spp.;
• Nosocomiais: Candida spp., S. aureus, S. epidermidis, Corynebacterium grupo D2.
Clínica:

P á g i n a 6 | 146
Infeções do trato urinário Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Clínica Cistite Pielonefrite Prostatite

Disúria Sintomas de Disúria


Polaquiúria cistite Polaquiúria
Tenesmo urinário Febre com calafrio Febre com calafrio
Dor supra-púbica Náuseas/vómitos Dor supra-púbica/
Dor lombar perineal
DDx com uretrite e Hipotensão Toque rectal
vaginite! Confusão doloroso

Fatores de risco:
- Idade avançada;
- Diabetes mellitus;
- Gravidez;
- Sintomas arrastados.

Diagnóstico:
• Exame sumário de urina:
o Leucocitúria > 10/mm3;
o Esterase leucocitária;
o Cilindros leucocitários → sugere pielonefrite;
o Proteinúria.
• Urocultura (Colheita obrigatória em todos os casos exceto cistite não complicada na
mulher; Só deve ser repetida na recorrência):
o Coloração de Gram;
o Exame cultural.
• Hemoculturas!
• Exame de imagem:
o Ecografia – crianças e homens, suspeita ou história de alteração
estrutural/obstrução, ausência de resposta à terapêutica, recorrência –
exclusão de complicação;
o TC com contraste – exclusão de abcesso.

Tratamento:
• Cistite não complicada na mulher:
o Esquema curto com cotrimoxazol, nitrofurantoína, fosfomicina ou
pivmecilinam;
• Cistite complicada (homens, idosos e diabéticos, infeção recorrente) e pielonefrite não
complicada:
o Esquema de 7 a 14 dias com quinolona, cotrimoxazol, amoxicilina/ ácido
clavulânico ou cefuroxime;
• Prostatite:
o Esquema de 4 a 6 semanas (aguda) ou 6 a 12 semanas (crónica) com quinolona
ou cotrimoxazol.
• Meio hospitalar:
o Cefalosporina 3ª Geração, aminoglicosídeo ou quinolona EV;
• Choque séptico:
o Associação de beta-lactâmico com aminoglicosídeo.

P á g i n a 7 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Prevenção:
• Cotrimoxazol pós-coital nas mulheres com infeções recorrentes;
• Cotrimoxazol ou nitrofurantoína diários nos doentes com alterações anatómicas;
• Remoção de cateteres urinários.

Bacteriúria Assintomática:
• Bacteriúria identificável com ou sem piúria e sem sintomatologia.
• Racional para rastreio e tratamento:
o Apenas recomendado em três grupos de elevado risco para desenvolvimento
de ITU e outcome adverso:
▪ Grávidas;
▪ Doentes que vão ser submetidos a intervenção urológica;
▪ Transplantados renais?

Infeções da Pele e Tecidos Moles

• Classificadas de acordo com a afeção das diferentes camadas e estruturas da pele;


• Agentes etiológicos mais frequentes são os microrganismos comensais da flora cutânea
potencialmente mais virulentos:
o Streptococcus beta-hemolíticos dos grupos A, B, C, F e G;
o Staphylococcus aureus.

Impetigo:
• Infeção da camada mais superficial – epiderme;
• Clínica: lesões vesicopustulosas dolorosas de base eritematosa em áreas expostas da
face e extremidades com evolução posterior para lesões ulceradas e com crosta, por
vezes com linfadenopatia locoregional;
• Mais frequente nas crianças, em climas quentes e húmidos e más condições de higiene;
• Principais agentes: Streptococcus do grupo A e S. aureus;
• Tratamento: tópico – mupirocina – ou sistémico (lesões múltiplas) – amoxicilina / ácido
clavulânico, cefazolina ou flucloxacilina.

Foliculite:
• Piodermite localizada aos folículos pilosos:
o Lesões múltiplas, pequenas, pustulosas e com base eritematosa;
• Epidemiologia e etiologia:
o Colonização nasal por S. aureus ou contaminação por P. aeruginosa em piscinas,
banhos de hidromassagem e jacuzzis;
o Infeção por Candida spp. em doentes com predisposição (antibioterapia prévia
e imunossupressão/corticoterapia);
• Tratamento: antibiótico ou antifúngico tópico; descolonização S. aureus com
mupirocina intranasal e banhos com clorohexidina.

Furunculose e Carbúnculo:
• Furúnculo: Nódulo circundante a um folículo piloso;
• Carbúnculo: Abcesso subcutâneo com drenagem para folículo piloso;
• Principal agente: S. aureus;
• Fatores de risco: obesidade, corticoterapia, defeitos da imunidade inata (função
neutrófilos);

P á g i n a 8 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

• Lesões mais frequentes em zonas de fricção e com maior sudorese; sintomas sistémicos
são raros → sinal de infeção mais profunda ou complicação;
• Tratamento: drenagem cirúrgica + antibioterapia sistémica + descolonização.
o MSSA: Flucloxacilina, cefazolina, clindamicina, cotrimoxazol;
o MRSA: Vancomicina, ceftarolina, linezolide, daptomicina.

Celulite:
• Afeção da pele e tecido celular subcutâneo, mais frequente nas extremidades;
• Muito frequente e muito associada a recorrências;
• Fatores de risco:
o Compromisso da circulação venosa/linfática – tromboflebite, cirurgia prévia,
trauma, insuficiência cardíaca;
o Diabetes mellitus – imunossupressão, neuropatia periférica e vasculopatia;
o Alcoolismo – imunossupressão, trauma, más condições de higiene;
o Trauma penetrante;
o Outra patologia cutânea – infeção fúngica, eczema, psoríase, etc.
• Clínica:
o Edema;
o Eritema;
o Dor local;
o Aumento da temperatura;

Celulite o Linfangite e linfadenopatia;


o Sintomas sistémicos: fébre com calafrio, mialgias – Sinal de gravidade!

Celulite por
Celulite por
Erisipela Clostridium
anaeróbios
perfringens
Streptococcus do Infeção superficial; Infeção mista por
grupo A; Associada a trauma ou aeróbios e anaeróbios;
Forma superficial de cirurgia recente; Frequente em doentes
celulite face e Formação de bolhas com diabetes mellitus;
extremidades; de gás na pele; Odor fétido
Área de eritema Normalmente poupa característico;
vermelho vivo, mas pode invadir a Pode progredir com
elevada, dolorosa, de fáscia e o músculo - envolvimento muscular
bordos bem definidos; exame de imagem e e da fáscia com
Envolvimento linfático. doseamento de CK necessidade de
para exclusão! desbridamento
cirúrgico.

• Etiologia: Streptococcus beta-hemolíticos em ~70% dos casos ou S. aureus;


• Diagnóstico diferencial com trombose venosa profunda e dermatite rádica!
• Tratamento:
o Infeções não graves – penicilina;
o Infeção estafilocócica – flucloxacilina ou cefazolina;
o Alergia a beta-lactâmicos ou fatores de risco para MRSA – vancomicina,
ceftarolina, linezolide ou daptomicina;
o Imobilização, elevação, cuidados de penso.

P á g i n a 9 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 3 – O Infeciologista e o Laboratório de Microbiologia


Data Docente
14/10/2021 Drª. Maria José Manata

Identificação de Agentes Infeciosos no Laboratório de Microbiologia


• Bactérias:
o Micobactérias.
• Fungos;
• Vírus;
• Parasitas.

Métodos de Deteção de Agentes Infeciosos:


• Microscopia;
• Cultura;
• Deteção de antigénios;
• Testes baseados em ácidos nucleicos;
• Serologia.

Responsabilidades do Microbiologista:
• Fornecer uma lista de testes apropriados às necessidades do clínico;
• Estabelecer relação com um laboratório externo para a realização de testes que não
podem ser efetuados no laboratório hospitalar;
• Informar sobre os tempos necessários para o processamento das amostras;
• Definir tempos para o envio dos resultados dos testes;
• Fornecer orientações para a colheita e transporte das amostras biológicas;
• Manter um sistema computorizado efetivo para introduzir informação atualizada sobre
a receção dos produtos, seu processamento e resultados das análises:
o Possibilidade de notificar imediatamente o clínico sobre resultados importantes
/ críticos
• Garantir a existência de um sistema de armazenamento das amostras biológicas para
facilitar a realização de testes adicionais:
o De curta duração para todos os isolados;
o De longa duração para isolados importantes.
• Publicação periódica dos resultados sobre os padrões de suscetibilidade aos
antimicrobianos para as bactérias mais frequentemente isoladas no hospital /
instituição;
• Garantir que o funcionamento do Laboratório está de acordo com os padrões
regulamentares.

Responsabilidades do Clínico:
• Conhecimento atualizado:
o Da lista de testes microbiológicos disponíveis no laboratório;
o Das orientações sobre as regras de colheita e transporte das amostras.
• Informar o laboratório quando existe suspeita de um microrganismo específico (p. ex.
microrganismo altamente patogénico ou resistente ao antimicrobianos)
• Priorizar o pedido de testes quando a quantidade de amostra que pode ser colhida é
limitada;
• Estabelecer uma linha de comunicação aberta com o responsável do Laboratório
quando:
P á g i n a 10 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

o São necessários testes adicionais que não constam na lista do laboratório;


o Há necessidades específicas para o processamento de uma amostra.

Colheita de Amostras Biológicas para Exame Microbiológico

Aspirate of pus or fluid in anaerobic


transport vial is preferred;
Swabs usually have insufficient
material for stains and culture;
Specimen sent immediately in
capped syringe after the air is
Clean surface of closed abscess with
excluded is also acceptable;
70% alcohol;
Abscess
Specify location of abscess for
Collect specimens at margins of
optimal processing; provide all other
abscess;
pertinent information (e.g., surgical
infection, trauma, bite wound).
Aspirates in anaerobic transport tubes
are acceptable for aerobic and
anaerobic bacterial, fungal, and
mycobacterial cultures.
Disinfect bottle tops with 70%
isopropyl alcohol;

Disinfect phlebotomy site with alcohol,


followed by tincture of iodine or Optimal recovery of bacteria from
chlorhexidine; patients receiving antibiotics requires
Blood for
use of broths supplemented with
Culture
Allow the disinfectants to dry; resins designed to inactivate
Routine
antibiotics;
aerobic and
Collect 10-20 mL/adults and 1-3
anaerobic
mL/child for each blood culture; divide All blood cultures should be
bacteria
blood into two blood culture bottles, transported immediately to start
preferably an aerobic and an anaerobic incubation or processing.
bottle;

Collect two to three cultures per 24- hr


period.
Obtain for Histoplasma,
Collect 1-2 mL aseptically; mycobacteria, Brucella, Salmonella
enterica serotype Typhi;
Bone Marrow
Inoculate into blood culture bottle or
1.5-mL lysis- centrifugation tube. Aspiration of more than 2 mL will
dilute marrow with peripheral blood.

Amostras do Aparelho Respiratório:


• Superior:
o Nariz;
o Nasofaringe;
o Seios Perinasais;
o Orofaringe.

P á g i n a 11 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Insert premoistened swab 1-2 cm into Generally used to detect carriage of


Nose nares and rotate against nasal mucosa. Staphylococcus aureus; specify for
laboratory.
Nasopharyngeal washings and swabs
appropriate for Bordetella pertussis, Notify laboratory if a fastidious
Nasopharynx
Corynebacterium diphtheriae, Neisseria bacterial pathogen is considered.
gonorrhoeae, Neisseria meningitidis.
Collect by aspiration; if bacteria are Aerobic and anaerobic bacterial
suspected, submit in anaerobic cultures should be performed if
Paranasal
transport system. bacterial etiology is suspected; fungal
Sinuses
stain and culture should be performed
if fungal infection is suspected.
Swab the posterior pharynx, avoiding
saliva, for the recovery of
Streptococcus pyogenes; appropriate
for B. pertussis, C. diphtheriae, N.
Throat or Notify the laboratory if a fastidious
gonorrhoeae, N. meningitidis.
Pharynx bacterial pathogen is considered.
Detection of yeast is generally
restricted to microscopy (e.g., Gram
stain, calcofluor white stain).

• Inferior:
o Lavado bronco-alveolar;
o Escovado brônquico ou biópsia brônquica;
o Expetoração induzida;
o Aspirado traqueal;

Amostras do Ouvido:
• Interno (aspiração de pus ou outro fluído);
• Externo (raspado ou colheita por zaragatoa);

Amostras do Olho:
• Conjuntiva;
• Córnea;
• Fluídos da câmara anterior ou do vítreo (aspiração).

Amostras de Urina:
Instruct women to hold labia apart, discard
the first portion of voided urine, and collect a
midstream portion in a sterile container.
Instruct men to retract the foreskin, discard Cleansing before voiding does not
the first portion of voided urine, and collect a consistently improve the quality
midstream portion in a sterile container. of the specimen; however, if the
Midstream Collect first-voided urine for C. trachomatis patient is unable to provide a
and N. gonorrhoeae tests. proper specimen, cleansing and
supervised collection may be
Keep refrigerated and transport to laboratory necessary.
promptly, or submit in urine tube with boric
acid to prevent overgrowth of contaminating
organisms.

P á g i n a 12 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Discard the first portion of urine, which is


likely to be contaminated with urethral flora Catheterization may result in an
Catheterized or organisms that have colonized an iatrogenic urinary tract
indwelling catheter. Transport as for a infection.
midstream specimen.
Transport aspirated urine promptly to the This is the only urine specimen
laboratory. acceptable for anaerobic
Suprapubic culture. Urine is generally
aspirate sterile, although transient
colonization of the bladder may
occur.

Amostras de Fezes:

Collect specimen directly in a Do not process for bacterial pathogens if patient has
sterile container and deliver been hospitalized for more than 3 days unless
immediately to laboratory; approved by laboratory director; consider
transport in Cary-Blair holding Clostridium difficile for hospitalized patients with
medium if delayed in transport. diarrhea; multiple specimens per day are not
Feces
indicated.

Notify laboratory if specific pathogen is suspected


(e.g., Vibrio, Yersinia, Aeromonas,
enterohemorrhagic Escherichia coli).

Amostras de Outros Fluídos Orgânicos:


• Pericárdico, pleural, peritoneal, sinovial
• Líquido cefalorraquidiano

Send at least 2-5 mL for If sufficient material can be collected,


Pericardial, bacteria, >10 mL for fungi inoculate aerobic and anaerobic blood
peritoneal, and/or mycobacteria; culture bottles for bacterial and yeast
pleural, synovial transport in an anaerobic cultures unless Neisseria is suspected
collection system. (inhibited by anticoagulant in bottles).
1-2 mL for bacteria, 5-10 mL Send immediately; notify laboratory if
optimum for mycobacteria or anaerobic culture or acid-fast stains are
Cerebrospinal
fungi; more for chronic disease needed. Do not inoculate blood culture
bottles.

Amostras do Aparelho Genital:


• Colo útero e uretra;
• Vagina;
• Úlceras.

Amostras de Tecidos e Biópsias:


• Culturas para bactérias aeróbias e anaeróbias, micobactérias e fungos.

Keep specimen moist and transport rapidly to Always specify the type of tissue,
Tissues laboratory. Do not use bacteriostatic saline or and indicate the specific
and formalin. Biopsies are suitable specimens for pathogen sought (e.g., Nocardia,
Biopsies routine, fungal, mycobacterial, and anaerobic Bartonella, Histoplasma) if other
cultures, depending on site of biopsy. than routine bacteria.

P á g i n a 13 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Amostras de Lesões Cutâneas:


• Raspado e biópsias de lesões.

Scrape skin at active edge of lesion; Transport swabs in transport media to prevent
Skin avoid blood. Place in sterile Petri drying out; specify specific organism if one is
Lesion dish; biopsy may be more definitive suspected (e.g., dermatophyte, Sporothrix,
than swabs of lesion. Mycobacterium, etc.).

Amostras de Unhas e Cabelo:


• Culturas para leveduras e dermatófitos.

Nails and Clip affected areas; transport to laboratory in Culture for yeasts and
Hair envelope or dry, sterile container. dermatophytes.

Amostra de Cateter Intravascular:

Remove aseptically, cut at least a 2-inch segment from Transport rapidly to


Intravascular
tip, and place segment in sterile container. prevent drying out.

Diagnóstico Microbiológico de Infeções Bacterianas

Métodos de identificação para bactérias:


• Métodos bioquímicos;
• Utilização de anti-soro específico;
• Utilização de técnicas genómicas;
• Utilização de métodos proteómicos.

Realização de testes de sensibilidade aos antimicrobianos:


• Métodos de diluição;
• Métodos de difusão em agar;
• Métodos especiais.

Amostras biológicas para diagnóstico de infeções bacterianas:


• Abcessos (pus ou outro fluído);
• Sangue para cultura;
• Sangue para observação microscópica – Sangue medular;
• Outros líquidos biológicos – Pleural, pericárdico, sinovial – LCR;
• Tecidos e biópsias;

Micobactérias

Questões de segurança:
• Práticas de biossegurança nível 2 e cabine de segurança biológica para procedimentos
não produtores de aerossóis:
o Ex: manipulação de amostras para preparação de esfregaços.
• Práticas de biossegurança nível 3 para procedimentos com potencial para gerar
aerossóis:
o Laboratório com pressão negativa;
o Uso de material de proteção individual (avental, luvas, máscara);
o Acesso restrito.
Métodos de Diagnóstico Microbiológico:
P á g i n a 14 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

• Exame direto: Bacilos álcool-ácido resistentes:


o Coloração de Ziehl-Neelsen;
o Coloração de Kinyoun.
• Deteção de Ácidos Nucleicos:
o Teste de amplificação de ácidos nucleicos específico para Mycobacterium
tuberculosis.
• Cultura:
o Meio líquido:
▪ Aumento da sensibilidade da cultura;
▪ Aumento da rapidez da deteção do microorganismo;
▪ Crescimento de Mycobacterium tuberculosis em 2 semanas.
o Meio sólido.

Micobactérias:
• Avaliação do significado patogénico de um isolamento de micobactéria:
o Colonização;
o Contaminação;
o Doença ativa.
• Identificação da espécie de micobactérias:
o Testes bioquímicos;
o Métodos de identificação molecular.
• Teste de sensibilidade aos antimicrobianos.
• Diagnóstico de Tuberculose Latente:
o Teste de tuberculina (Mantoux);
o Teste de libertação de interferão gama INF- release assay (IGRA).

Diagnóstico Microbiológico de Infeções Fúngicas

Colheita, transporte e processamento de amostras:


• Mesmos procedimentos que para as culturas bacterianas;
• Pode haver necessidade de utilização de meios específicos para aumentar a
probabilidade de isolamento de fungos e suprimir bactérias e leveduras associadas;
• Assegurar um volume adequado da amostra:
o Por exemplo: pelo menos 5mL de LCR, 30mL na meningite crónica.
• Material aspirado pode ser enviado em meio de transporte para anaeróbios;
• Culturas para fungos são geralmente incubadas a 30ºC;
• Na suspeita de espécie fúngica de crescimento lento (p.ex., Histoplasma capsulatum) o
clínico deve informar o laboratório.

Deteção direta dos fungos nas amostras:


• Visualização direta do organismo:
o Coloração Gram, meio líquido de HOK;
o Colorações específicas em amostras de células (citologia) ou tecido de biópsia
(histologia) – Por exemplo: colorações prata metenamina e Papanicolau.
• Deteção de substâncias produzidas ou contidas no organismo:
o Antigénios específicos:
▪ Cryptococcus neoformans, Histoplasma capsulatum.
o Galactomanano no sangue e LBA;
o -D-Glucano.
• Deteção direta por métodos de biologia molecular:

P á g i n a 15 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

o Por exemplo: PCR para diagnóstico de pneumonia por Pneumocystis jirovecii.

Serologia:
• Testes de pesquisa de anticorpos para:
o Coccidioidomicose;
o Histoplasmose;
o Paracoccidioimicose.

Diagnóstico Microbiológico de Infeções Víricas

Métodos para deteção e identificação de vírus:


• Microscopia:
o Pesquisa de inclusões víricas em tecidos através de exame histológico (VHS,
VVZ, CMY, vírus da raiva);
o Visualização de células gigantes multinucleadas em vesículas de pele coradas
por Wright-Giemsa – Preparação Tzanck (VHS, VVZ);
o Técnicas de coloração que utilizam anticorpos específicos marcados com
fluoresceína.
• Cultura de células:
o Considerado como teste suplementar no diagnóstico virológico.
• Deteção de antigénios específicos:
o Testes comerciais, ELISA, EIA, aglutinação.
• Deteção de ácidos nucleicos:
o Testes diagnóstico de escolha para muitos vírus (VIH, VHA, VHB, VHC, HPV,
CMV, VHS no LCR);
o Testes qualitativos e quantitativos
• Deteção de anticorpos (serologia).

Classificação dos vírus:


DNA Viruses RNA Viruses
Single-Stranded Double-Stranded Single-Stranded Double-Stranded
Negative-Strand RNA
Arenaviridae
Bornaviridae
Bunyaviridae
Deltaviridae
Filoviridae
Orthomyxoviridae
Adenoviridae Paramyxoviridae
Hepadnaviridae Rhabdoviridae
Anelloviridae Herpesviridae Picobirnaviridae
Parvoviridae Papillomaviridae Reoviridae
Polyomaviridae Positive-Strand RNA
Poxviridae Astroviridae
Caliciviridae
Coronaviridae
Flaviviridae
Hepeviridae
Picornaviridae
Retroviridae
Togaviridae

P á g i n a 16 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Colheita, transporte e processamento das amostras:


• Determinados por:
o Agente patogénico;
o Local da infeção;
o Tempo decorrido desde o início da doença;
o Teste específico de diagnóstico.

• Sangue para diagnóstico serológico:


o Demonstração da seroconversão por comparação dos títulos de anticorpos no
início da doença e 2 a 4 semanas após.
• Amostras com células infetadas para diagnóstico microscópico;
• Pesquisa de antigénios e de ácidos nucleicos pode ser efetuada em amostras com vírus
livres de células;
• Culturas podem ser efetuadas a partir de amostras colhidas:
o No local de doença ativa;
o No local de replicação inicial (por exemplo, trato respiratório superior) ou no
local de colonização secundária (por exemplo, urina ou fezes).

Body Sites Potential Viruses Specimen Collection


Amniotic CMV, HIV, HSV, parvovirus B19, rubella Collect by amniocentesis and transport
Fluid virus in sterile container without VTM
Collect blood for culture in sterile
Arbovirus, adenovirus, arenavirus, BK
vacuum tube or EDTA tube; avoid using
virus, coronavirus, CMV, enterovirus,
tube with heparin; blood for serology
EBV, filovirus, hepatitis virus (A, B, C, D,
Blood should be collected at onset of
E), HSV, HHV-6, HHV-7, HHV-8, LCM,
symptoms and 2-4 wk later; consult
measles virus, parvovirus B19, rabies,
laboratory for use of whole blood or
retroviruses, rubella virus, VZV
plasma for NAA tests
Bone CMV, EBV, HHV-6, parvovirus B19, Aspirate transferred to EDTA tube and
Marow rubella, VZV transported to laboratory
Adenovirus, arboviruses, arenavirus, Collect CSF and tissue in sterile
CMV, coxsackie A virus, enterovirus, leakproof container; do not dilute in
CSF, Brain EBV, HHV-6, HSV, JC virus, LCM, VTM
Tissue measles virus, mumps virus,
parechovirus, prions, rabies virus,
retroviruses, VZV
Conjunctival swab collect on Dacron or
rayon swab moistened with saline and
Adenovirus, enterovirus, coxsackie A
Eye place in VTM; aqueous and vitreous
virus, CMV, HSV, VZV
fluid placed in sterile container without
VTM
Adenovirus, astrovirus, coronavirus, Fecal specimens (preferred) in
Feces CMV, enterovirus, Norovirus, rotavirus, leakproof container; fecal swabs in VTM
sapovirus
Adenovirus, CMV, HSV, papillomavirus, Collect on swabs and transport in VTM
Genital
retrovirus
Adenovirus, arenavirus, coronavirus, Nasopharyngeal aspirates (NPA) are
filovirus, hantavirus, CMV, HSV, specimen of choice from children; NPA
influenza virus, parainfluenza virus, or nasopharyngeal swabs collected
Respiratory
metapneumovirus, measles virus, from adults; bronchoalveolar lavage for
parechovirus, rhinovirus, RSV, rubella diagnosis of lower respiratory tract
virus, VZV infections

P á g i n a 17 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Enterovirus, HHV-8, HSV, measles virus, Swab or aspirate fluid in vesicle and
Skin parvovirus B19, poxvirus, rubella virus, scrape cells at base of lesion; place fluid
VZV in VTM
Adenovirus, CMV, HSV, many other Place in VTM
Tissue
viruses
Adenovirus, BK virus, CMV, filovirus, Collect midstream specimen in sterile
Urine HSV, enterovirus, measles virus, mumps container; VTM not necessary
virus, rubella virus

• Momento para colheita de amostras é determinado pelas propriedades do vírus e do


hospedeiro:
o Na maioria dos casos no início dos sintomas;
o Para testes serológicos é necessária uma segunda amostra de soro na fase de
convalescença.
• Para a maioria das infeções a presença do vírus começa imediatamente antes do início
dos sintomas, diminuindo progressivamente depois:
o – Gripe, sarampo, parotidite epidémica, rinovírus.
• No caso de infeções crónicas, a presença do vírus pode ser prolongada mesmo quando
o doente está assintomático:
o Hepatite B, Hepatite C, CMV, VIH.
• Para uma determinada doença vírica, a presença do vírus pode ser de curta duração
num imunocompetente e de longa duração no imunocomprometido (por exemplo,
CMV, VSR).

Diagnóstico Microbiológico de Infeções por Parasitas

Colheita, transporte e processamento de amostras:


• Sangue;
• Fezes;
• Outros:
o Fluídos orgânicos estéreis (Líquido amniótico, LCR);
o Tecidos obtidos por biópsia (Medula óssea, fígado, baço, músculo, pele).

Métodos para deteção e identificação de parasitas:


• Microscopia:
o Procedimento primário de deteção e identificação para a maioria dos
parasitas;
o Exame direto da amostra ou após coloração com iodine;
o Exame após colorações específicas;
• Cultura:
o Realizada sobretudo em laboratórios de investigação – Excepção: Trichomonas
vaginalis.
• Deteção de antigénios:
o Disponíveis comercialmente;
o Mais sensíveis e menos subjectivos que os testes microscópicos;
o Entamoeba histolytica,Cryptosporidium spp.,Giardia lamblia, Plasmodium spp.,
Trichomonas vaginalis.
• Deteção de ácidos nucleicos:
o Componentes de testes multiplex para o diagnóstico de patogéneos entéricos.

P á g i n a 18 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

• Deteção de anticorpos (serologia):


o Útil em populações onde as infeções endémicas são raras – Necessidade de
demonstração de seroconversão recente

Parceria entre o Infeciologista e o Microbiologista

O clínico e o microbiologista devem trabalhar em conjunto para maximizar o valor diagnóstico


dos testes microbiológicos.

P á g i n a 19 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 4 – Doenças Infeciosas e Emergência de Novas Doenças


Data Docente
19/10/2021 Profª. Doutora Emília Valadas

Doenças infeciosas emergentes são aquelas que surgem de novo e não existiam antes,
enquanto as reemergentes são aquelas que reaparecem após um período com menos casos. As
máscaras são o elemento mais usado para controlar as doenças infeciosas.
Na altura da gripe espanhola a maior causa de gripe foram as pneumonias bacterianas
após a pneumonia viral. Relativamente à atual pandemia aprendeu-se muito desde a gripe
espanhola. A seguir à segunda guerra mundial pensou-se que já tinham sido resolvidas todas as
doenças infeciosas e era necessário pensar nas doenças crónicas. No entanto, sabe-se hoje que
isso não é totalmente verdade.
Até ao aparecimento da SIDA pensava-se que cada pessoa tinha uma doença infeciosa,
no entanto percebeu-se com a SIDA que isso não é verdade, e que cada pessoa pode ter uma ou
mais doenças deste tipo.
Outras doenças infeciosas emergentes são as febres hemorrágicas, como o ébola, a
febre amarela entre outros. Por serem doenças que matam muito rapidamente, perdem a
capacidade de se propagarem facilmente.
Não é possível prever os próximos agentes infeciosos que poderão aparecer, apenas
podemos ter a certeza de que irão aparecer.

Fatores envolvidos na emergência das doenças infeciosas:


• Alterações demográficas;
• Alterações sociais;
• Alterações genéticas nos agentes infeciosos;
• Decisões políticas;
• Infraestruturas de Saúde Pública;
• Alterações climáticas.

P á g i n a 20 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

A emergência de grandes cidades trona mais difícil o controle das doenças infeciosas.
Por outro lado, o aumento do turismo e a diminuição do tempo para deslocações também
contribui para o aumento de doenças infeciosas.
Relativamente às doenças infeciosas que mais matam, é diferente falar-se de crianças
ou de adultos. Nas crianças são as doenças respiratórias, as que provocam diarreias, a malária e
o sarampo. Nos adultos são as doenças respiratórias na mesma, mas a seguir é a SIDA e a
tuberculose, sendo esta última a doença infeciosa que mais mata no mundo.
Verifica-se que nos países menos desenvolvidos a esperança média de vida é muito
inferior muito devido às doenças infeciosas.
O ser humano alimenta-se cada vez mais e está cada vez com mais peso, o que leva a
uma maior necessidade de criação de alimento com maior velocidade. Os animais criados para
este fim, de modo a não transmitirem doenças, são alimentados com antibióticos, pelo que o
ser humano ingira esses antibióticos. Já existem países que proíbem este uso de antibióticos
indiscriminado em animais, a menos que este se encontre doente com um microrganismo que
seja tratado com antibiótico.
Atualmente as doenças infeciosas são a maior causa de morte no mundo, sendo por isso
que serão uma constante nas nossas vidas.
Muitas marcas de produtos de limpeza publicitam conter ingredientes que são
antibacterianos, no entanto ou estes não funcionam, ou se funcionam não fazem falta uma vez
que a roupa e o chão não necessitam de ser estéreis. Sabe-se que o contacto com bactérias e
parasitas na infância torna o sistema imunitário mais robusto na fase adulta.
Existem doenças cuja causa não se conhece, sendo que se considera que nestes casos
se considera que possa ser infeciosa. Existem algumas doenças psiquiátricas que se pensam que
possam ser causadas nalguns casos por microrganismos…
A única doença infeciosa que foi eliminada foi a varíola. Sendo que existem muitas
outras que se tentam erradicar. A poliomielite, ainda não foi erradicada devido a algumas
comunidades não acreditarem na vacina.

P á g i n a 21 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 5 – Tuberculose
Data Docente
20/10/2021 Profª. Doutora Emília Valadas

A transmissão da tuberculose é por via aérea principalmente. Cerca de 1/3 da população do


mundo está infetado com Mycobacterium tuberculosis – falamos aqui de infeção latente.
Muitas vezes as pessoas são infetadas durante a infância/adolescência, e depois a bactéria pode
permanecer adormecida durante toda a nossa vida ou a infeção pode ser reativada se ficarmos
imunodeprimidos (ex: sida, diabetes, quimioterapia, transplante) podendo, neste caso, causar
doença (tuberculose).

A descoberta de infeção latente pode ser feita com recurso ao teste da tuberculina (teste de
mantum) ou com os testes IGRAS (intererao gama release assay) – estes últimos são testes mais
recentes e com maior eficácia no diagnostico da presença de mycobacterium tuberculosis. Estes
testes permitem ver se há presença da bactéria, mas só a conjugação com o quadro clínico
permite definir se existe tuberculose ou infeção latente.
Assim, podemos ter tuberculose primária ou pós-primária, sendo a classificação baseada no
tempo de reativação. Podemos ter reativação de uma infeção latente ou podemos ser
reinfectados.

A tuberculose clássica baseia-se sobretudo a nível pulmonar. No entanto, existem muitos casos
extra-pulmonares que são mais difíceis de diagnosticar e a doença é também mais prolongada.
Quanto mais imunodeprimida a pessoa estiver, mais variantes da doença podem surgir (ex:
tuberculose óssea com queixa de lombalgia). Neste contexto, o aparecimento da SIDA veio
potenciar o aparecimento de quadros clínicos de tuberculose muito variados e disparares da
tuberculose clássica.

Os sinais típicos da tuberculose clássica são: tosse de novo (há mais de 15 dias), emagrecimento
acentuado (superior a 10% do corpo corporal), sudorese noturna, hemoptises (sangue na
expetoração – significa que há compromisso de um brônquio, levantando a suspeita de curso
prolongado da doença; é bastante raro atualmente), e nas crianças a falta de atenção e
sonolência diurna.

A tuberculose é chamada a doença imitadora, porque pode imitar quase todas as doenças. O
quadro clínico da tuberculose é muito variado e pode-nos fazer pensar em várias doenças
conforme a localização. De forma geral classificamos a tuberculose em:
• Clássica (pulmonar) – mais fácil de diagnosticar devido às queixas típicas; a radiografia
de tórax é muito típica (bilateralidade das lesões, com cavernas); o exame cultural da
expetoração é também muito usado no diagnostico. Estes casos são os mais
importantes de diagnosticar rapidamente porque são estes os casos infeciosos.
• Extra-pulmonar – o seu diagnostico é mais difícil porque depende da localização e do
grau de suspeição. Engloba toda a tuberculose fora do pulmão, inclusive quando afeta
as pleuras. Não é infeciosa para os outros. Pode localizar-se em todos os sítios (aparelho
digestivo, olhos, ossos, pele, sistema reprodutor, rins, etc). Por exemplo, uma
tuberculose na coluna vertebral pode evoluir para uma meningite tuberculosa e, assim,
gerar compromisso do sistema nervoso central (sintomas como alteração do humor,
agressividade, crise epilética, etc).

P á g i n a 22 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Onde raramente existe tuberculose é no miocárdio – nos podemos ter endocardite/pericardite


tuberculosa, mas no miocárdio geralmente não há.

As adenopatias tuberculosas localizadas (ex: nos gânglios do pescoço) drenam


espontaneamente de forma frequente (o conteúdo chama-se casium, parece queijo fresco).
Outra característica destas adenopatias é que são muito dolorosas ao toque e exibem os sinais
de inflamação clínicos (dor, rubor, tumor, edema). Estes sinais inflamatórios também podem ser
avaliados laboratorialmente através da análise da proteína C reativa ou da velocidade de
sedimentação (velocidade alta ~120 h-1, dá suspeita de inflamação – há poucas doenças que
cursam com tão elevada velocidade de sedimentação, por isso é provável que se trate de
tuberculose).

Fora da Ásia, quem tem adenopatias tuberculosas são as crianças ou pessoas imunodeprimidas;
pelo contrário, na Ásia quem exibe este tipo de adenopatias são adultos saudáveis. Existe,
portanto, uma grande componente genética ainda por explicar.

No mundo existem muitos casos e novas infeções por ano, culminando em ~2 milhões de
mortes/ano. A tuberculose está muito associada à multirresistência a antibióticos e a frequente
coinfecção por HIV tem dificultado a
eficácia terapêutica. A grande maioria dos
casos de tuberculose no mundo ocorre em
África devido à falta de condições.
Este gráfico mostra que a tuberculose
continua a ser a 1ª causa de morte por
doença infeciosa no mundo. No entanto, a
tuberculose tem uma causa conhecida, é
facilmente tratável, é barato o tratamento,
e, no entanto, isto ainda é a realidade.

Em Portugal existem cerca de 20 casos por 100 mil habitantes. Mas durante muitos anos,
existiam muitos casos em Portugal (linha vermelha no gráfico). Alias, apesar de ter baixado
muito, ainda somos o país com maior número de casos por 100 mil habitantes. Mesmo
comparando com a Espanha (linha azul), que somos geneticamente mais parecidos, existe uma
grande diferença de valores. Portugal, contrariamente aos outros países da Europa, faz a
notificação obrigatória das doenças infeciosas (~99%) – antigamente as pessoas diagnosticadas
tinham regalias sociais como baixa, ordenado pago por inteiro, etc. Talvez a discrepância dos
valores resulte da eficácia na notificação dos casos.

P á g i n a 23 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Em África existe uma elevada prevalência de coinfecção de sida e tuberculose. Na verdade, a


tuberculose é a primeira causa de morte nas pessoas infetadas por HIV e cerca de 50% dos
infetados por HIV desenvolvem tuberculose.

A tuberculose foi considerada uma doença emergente pela OMG. No entanto, só continua a
existir por falta de cuidados de saúde nos sítios de maior foco. Na verdade, a tuberculose podia
ser eliminada porque sabemos tudo: causa, transmissão, tratamento e prevenção.

Diagnóstico de M. tuberculosis
A amostra (expetoração, pus, urina, biopsia, sangue) depende muito da localização da suspeita.
É muito importante para o diagnostico ter amostras de qualidade. A amostra é então analisada
por:

A cultura pode demorar


até 6-8 semanas!

A tuberculose multirresistente tem sido o maior e mais recente problema – este conceito traduz
uma infeção por M. tuberculosis resistente aos dois antibióticos mais eficazes, a isoniazida e a
rifampicina. Pode também ser resistente a mais antibióticos.

Embora pouco
prevalente, o
prognóstico pode ser
muito grave. O maior
problema centra-se a
nível da ex união
soviética que, por
razoes variáveis,
assume baixo controlo
na administração de
medicamentos.

No HSM existiram muitos casos de tuberculose multirresistente numa altura que também havia
muitas pessoas internadas com HIV (já não existem atualmente). Os padrões de resistência
idênticos que foram avaliados sugerem uma transmissão nosocomial da tuberculose.

P á g i n a 24 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

A tuberculose multirresistente
não é facilmente diagnosticada
(quanto mais resistente a bactéria
for, menos capacidade tem de
provocar doença que se
manifeste clinicamente – induz
um percurso clínico muito mais
prolongado).

Os dois primeiros são os que por definição


traduzem a multirresistência. Se só forem
resistentes a um destes dois fala-se em
monoresistência.
A terapêutica normalmente é feita nos
primeiros 2 meses com os 4 primeiros anti-
bacilares, e depois 4 meses com 2 anti-
bacilares (os 2 primeiros). A estreptomicina é
muito pouco usada. Quando há lesões do SNC ou ósseas o tratamento é mais prolongado
podendo chegar aos 18 meses. Existem outros antibacilares, mas são menos eficazes e assumem
administração mais prolongada e com mais efeitos tóxicos (por isso são muito pouco usados).
A vacina BCG é a vacina mais administrada no mundo. Protege contra a doença grave nas
crianças (meningite). A meningite pode ser muito grave nas crianças novas, deixando muitas
sequelas para toda a vida. No entanto, quando uma criança nasce, se a mãe tiver infetada com
HIV e passar o vírus para a criança, ao tomar a vacina (é uma vacina viva, atenuada) podemos
estar a infetar a criança com uma bactéria que causa uma doença generalizada chamada em
calão bcgite; então pensou-se em suspender a vacina em Portugal.
A eficácia da BCG pode variar muito – por exemplo, nas crianças na India verificou-se que a
eficácia era ~0% vs. Crianças inglesas (>80%). Também aqui, a genética influencia imenso.

P á g i n a 25 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 6 – Infeções do Trato Respiratório


Data Docente
21/10/2021 Drª. Joana Fernandes

As infeções do trato respiratório são a doença aguda mais


frequentemente observada em doentes em ambulatório.
Apresentam gravidade clínica variável, sendo maioritariamente
virais. Quando ocorrem infeções bacterianas primárias ou sobre-
infeções pode ser necessário recorrer a terapêutica dirigida.
As infeções podem surgir em qualquer local do trato
respiratório, pelo que se falará nesta aula nos mais importantes.

Infeções do trato respiratório superior

Rinite
Inflamação e irritação da mucosa do nariz. Por norma é aguda, podendo ser crónica
nalguns doentes, nomeadamente as rinites alérgicas. As rinites virais são mais frequentemente
causadas por adenovírus.
Sintomas: prurido nasal e ocular, olhos vermelhos, rinorreia aquosa, espirros e prurido
na garganta.
Tratamento: sintomático com anti-histamínicos, corticoides ou em casos mais graves
inibidores leucotrienos.
Diagnóstico: clínico
Não apresenta grandes complicações.

Sinusite
Inflamação dos seios peri-nasais
que pode ser provocada por bloqueio dos
canais que drenam para as fossas nasais.

Sintomas: dor/sensação de
pressão, cefaleias, obstrução nasal com drenagem esporádica de rinorreia purulenta com mau
odor e sabor, tosse recorrente, disfonia crónica, diminuição do olfato e paladar, febre e
inflamação do V par craniano. Os últimos dois são raros.
Diagnóstico: clínico posteriormente confirmado por RX.
Complicações: inflamação dos tecidos envolventes
• Sinusite etmoidal: inflamação da pele orbitária e por
vezes trombose do seio cavernoso.
• Sinusite frontal: falso tumor na teste chamado de
pott’s puffy tumor. Em caso de ser mais posterior pode
originar um abcesso cerebral.
• Sinusite esfenoidal: trombose séptica do seio
cavernoso.
Agentes: S. pneumoniae e H. influenza (50-70%9, S. aureus, angentes
da cavidade oral e anaeróbios, fungos em doentes neutropénicos (baixos neutrófilos).

P á g i n a 26 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Tratamento: amixixilina com ácido clavulânico, cefuroxime. Por vezes trata-se com
tratamento endovenoso uma vez que é difícil fazer chegar os fármacos aos seios peri-nasais.

Faringite
Irritação, inflamação ou infeção da faringe, nomeadamente do tecido linfoide, os
adenoides e as amígdalas. Sendo que quando estes não existem pode ser inflamada a mucosa
da faringe. Maioritariamente causada por vírus e bactérias.
Os agentes virais são rhinovirus, coronavírus, adenovírus, influenza, EBV
(mononucleose), herpes, cockksacki A.
Os agentes bacterianos são o S. pyogenes, Streptococcus grupo B e C, agentes
anaeróbios, corynabacterium diphteriae, neisseria gonorrhoea e Treponema pallidum,
mycoplasma e chlamydia.
Sintomas: Febre, hiperímia orofaringe, exsudado amigdalino, odinofagia e adenopatias
cervicais. Quando falamos de adenoidite os sintomas são respiração pela boca, otalgia,
obstrução nasal, roncopatia, mau
hálito, corizas frequentes e bronquite.
Pode evoluir para otite média. Em
relação à amigdalite os sintomas são
odinofagia, febre, disfonia e disfagia.
Por norma as bacterianas
apresentam placas de pus e as virais
não, no entanto não é universal, pois
algumas amigdalites virais podem
apresentar essas placas.
Critérios clínicos de decisão:
exsudado amigdalinos, adenopatias
cervicais anteriores, febres e ausência
de tosse. Quando o doente apresenta menos de dois critérios apresenta 80% de probabilidade
de ser viral, de 3 a 4 critérios apresenta uma probabilidade de 40% a 60% de ser bacteriana.
Pode pedir-se um teste rápido de antigénio streptocócico e pede-se uma cultura de células.
Dentro das faringites existe a escarlatina, que se caracteriza por um início súbito com
sintomas de odinofagia e apresenta um eritema típico nas pregas cutâneas e na face, petéquias
(pequenas hemorragias capilares) no palato, úvula edemaciada e eritematosa e língua de
framboesa.

P á g i n a 27 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Outros tipos de faringite são a


herpangina e a difteria.

Complicações: podem ser supurativas como a sinusite, abcesso peri-amigdalino e


abcesso retro-faríngeo. Ou podem ser não-supurativas como a febre reumática, a
glomerulonefrite pós-streptocócica, a escarlatina e o choque tóxico.
Tratamento: se for viral é sintomático, se for bacteriana é feito com antimicrobiano
como a penicilina e a amoxicilina. Em 50% dos casos de amigdalite viral são prescritos
antibióticos uma vez que existem alguns benefícios pois previne a febre reumática, reduz os
sintomas, previne as complicações supurativas. No entanto não previne a evolução da
glomerulonefrite pós-streptocócica.

Laringite
Inflamação ou irritação do aparelho vocal/laringe que pode provocar
estreitamento das cias respiratórias. É maioritariamente viral.
Sintomas: disfonia que pode originar afonia, tosse e dificuldade
respiratória.
Tratamento: sintomático

Epiglotite
Mais frequente em crianças, provocada maioritariamente
por H. influenza.
Sintomas: odinofagia, disfonia, dificuldade em deglutir,
sialorreia (muita saliva), estridor inspiratório e pode levar a paragem
respiratória.
Diagnóstico: laringoscopia indireta.
Tratamento: antibiótico de largo espectro.

Caso clínico
Sexo masculino, 36 anos, saudável, fumador e ligeiramente ansioso. Apresentava dores
de garganta, mialgias e febres. Foi-lhe receitado penicilina e mais um antibiótico para agente
anaeróbios, a clindamicina. Dois dias vai ao hospital com vómitos e lombalgia bilateral,
apresentando temperatura normal devido ao efeito do antipirético, tensão arterial e frequência
cardíaca normais, mas apresentava uma tumefação cervical esquerda dolorosa, sinal de Murphy
renal duvidoso, mas sem alterações cutâneas. Nas análise apresentava leucócitos aumentados,
nomeadamente neutrófilos, PCR aumentada, creatinina aumentada, bilirrubina aumentada e
leucócitos na urina. Apresentava ainda na gasometria os lactatos aumentados, o que indica que
o oxigénio não está a chegar corretamente às regiões periféricas. O raio-X parece apresentar

P á g i n a 28 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

infiltração pulmonar. O doente foi internado no serviço de


medicina, com um diagnóstico de urossépsis além da
amigdalite agude. Após re-observação, apresentava
alterações na auscultação, amigdalite aguda purulenta e
com eritema sem evidência de infeção dos tecidos
adjacentes. As análises pioraram, tendo os leucócitos e as
plaquetas descido drasticamente. Tendo sido receitado
um antibiótico de largo espectro.
A TAC apresentava uma coleção adjacente à
amígdala esquerda que se prolongava para a região peri-
faríngea e espaço retro-faríngeo até à região do mediastino superior, com múltipla adenopatias,
parênquima pulmonar com densificação de e bases condensadas. Apresentava ainda derrame
pleural. Isto leva à conclusão que a infeção das amígdalas desceu pelo espaço retro-faríngeo até
ao mediastino. Foi operado pelo otorrino, tendo-se colocado drenos reto-fraríngeos e entubado
o doente. Permaneceu na unidade de isolamento
respiratório. Foi aumentado o antibiótico devido à
mortalidade de um quadro destes. Após nova TAC
apresenta diminuição da coleção, no entanto o derrame
pleural tinha aumentado, principalmente à direita. Após
novo aumento de antibióticos, fez-se uma drenagem
pleural com um total de 3 litros. Novo raio-X mostra uma
melhoria no espaço polmunar.
O doente começa a recuperar, tendo saído pus por
um dos orifícios dos drenos expontaneamente. Embora as
análises demonstrassem os parâmetros de fase aguda
elevados, o rim apresentava melhorias. A TAC mostrava a
coleção e o derrame a organizar-se, ou seja os tecidos começam a fibrosar. Fez nova drenagem
do abcesso cervico-mediastínico, toracotomia e descorticação polmunar para impedir a
fibrosação. TAC’s posteriores mostram melhorias lentas. Acaba por se infetar com uma bactéria
hospitalar que é tratada com antibióticos mais específicos.
No fim, acabou por recuperar e fazer cinesiterapia respiratória.

Infeções do trato respiratório inferior

Traqueobronquite
Inflamação das membranas mucosas da traqueia e brônquios até à terceira ordem.
Geralmente secundária a infeção do trato respiratório superior. Maioritariamente é causada por
Rhinovirus e vírus Influenza.
Sintomas: dor retroesternal, febre, cefaleias, dispneia, secreções purulentas, secreções
raiadas de sangue.

Bronquiolite
Inflamação dos bronquíolos que provoca estreitamento ou obstrução das vias aéreas,
caracterizada pela hipersecreção de muco.
Sintomas: tosse, expetoração mucosa, dispneia, sibilos, cianose, febre, astenia e
anorexia.

Pneumonia
Fazem parte das três primeiras casa por internamento em Portugal e apresenta alguma
mortalidade associada.

P á g i n a 29 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Podem ser contraídas por via respiratória ou via hematogénea, embora a segunda seja
mais rara. Por via respiratória os microrganismos são inalados, como bactérias, vírus ou fungos,
chegando aos pulmões. A via hematogénea ocorre pela invasão do pulmão por agentes
circulantes na corrente sanguínea podendo provocar embolia séptica (endocardite da válvula
tricúspide).
Cerca de 50% das pneumonias fica sem diagnóstico porque não se identifica o agente
infeccioso. Dividem-se em pneumonias típicas e atípicas. As típicas são relacionadas com o S.
pneumoniae, H. influenzae, bactérias Gram- e S. aureus. As atípicas são relacionadas com M.
pneumoniae, C. pneumoniar, Legionella spp., vírus.
Sintomas Típica: febre, calafrio, dor pleurítica, tosse produtiva com expectoração
ferruginosa ou pururlenta, dispneia, mal-estar, prostração. Em casos extremos pode levar a
alteração progressiva do estado de consciência e recusa alimentar.
Observação Típica: frequência respiratória aumentada, tiragem intercostal e supra-
clavicular, macissez pulmonar à percussão, aumento da transmissão das vibrações vocais,
pervores crepitantes, egofonia, sopros pulmonares, sépsis.
Sintomas Atípica: febre variável, não apresenta as observações da típica, mas pode
apresentar mialgias, conjuntivite, exantema, diarreia, alteração do estado de consciência. Não
apresenta leucocitose, mas apresenta toque hepático. Está associada a um contexto epidémico
normalmente.

Agentes etiológicos da pneumonia Steptococcus pneumoniae


• Colonização da Nasofaringe:
o 5 – 10% em adultos saudáveis;
o 30 – 40% em crianças saudáveis a partir dos 6 meses;
o Pico de colonização no meio do inverno.
• Doença pneumocócica invasiva:
o 15/100000 adultos;
o Aumento da incidência com a idade.

Os adultos têm menos infeção pois mantêm mais distância uns dos outros que as
crianças.

Fatores de risco para infeção por Streptococcus pneumoniae: major - tabagismo ativo,
insuficiência cardíaca, doença neurológica, estadia em instituição, doença pulmonar crónica,
doença imunossupressora. Possíveis – neoplasia do pulmão, corticoterapia, alcoolismo.

Resumo da Epidemiologia da PAC em Portugal:


• Streptococcus pneumoniae:
o 99% suscetível à penicilina;
o Resistência a macrólidos de ± 20% (± 80% não contornável pela dose).
• Haemophilus influenzae:
o Resistência a ampicilina 23%;
o Resistência a amoxi/clav 10% (a aumentar), resistência a macrólidos 0%.
• Staphylococcus aureus:
o CA MRSA ± 3%;
o MSSA – apenas pós-gripal.
• Moraxella catarrhalis:
o Resistente à ampicilina por betalactamases > 90%;
o Resistente a macrólidos 0%;
P á g i n a 30 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

• Bacilos Gram Negativos Entéricos:


o % de resistência ao amoxiclavulanato / BLEA em ambulatório;
o K. pneumoniae intrinsecamente resistente à ampicilina

Agentes etiológicos da pneumonia atípica:


• Mycoplasma penumoniae:
o Adolescentes e adultos jovens;
o Surtos epidémicos característicos, geralmente familiares:
▪ Taxa elevada de casos secundários / caso índice.
o Início arrastado, insidioso;
o Faringite inicial, meringite bolhosa;
o Anemia imunohemolítica aguda a frio (ac anti-l), acrocianose;
o Envolvimento do SNC, rim, Stevens Johnson, EN (mais raro).
• Clamydophila pneumoniae:
o Predomínio em idosos (> 60 anos);
o Evolução arrastada e insidiosa;
o Rouquidão, associação com sinusopatia.
• Legionella penumophila:
o Agente da Doença do Legionário;
o Sintomas:
▪ Alteração do estado de consciência, estado confusional;
▪ Dores abdominais e diarreia;
▪ Cefaleias;
▪ Alteração das enzimas hepáticas;
▪ Hiponatrémia, elevação da CK e LDH, IRA e hematúria.
• Coxiella burneti:
o Agente da febre Q;
o Sintomas:
▪ Mialgias intensas, cefaleias;
▪ Exantema morbiliforme (20%);
▪ Elevação da enzimas hepáticas e presença de citopenias

Pneumonia: Diagnóstico, Patologia Clínica


• Pneumonia lobar:
o Leucocitose (> 15000) ou leucopenia (< 4000);
o Elevação da PCR (> 10 mg/dl);
o Exame bacteriológico da expetoração: pouco útil;
o Hemoculturas: em doentes internados;
o Antigénios urinários:
▪ Pneumococo: limitações ?;
▪ Legionela: quando se suspeite da etiologia.
• Clamydophila, micoplasma, legionela, febre Q:
o Serologias emparelhadas.
• Outros exames a considerar:
o Gasimetria arterial, lactacidemia;
o Serologia par VIH;
o Zaragatoa para gripe;
o Exame direto para bacilos ácido-álcool resistentes.

P á g i n a 31 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Como diagnóstico complementar pode pedir-se Raio-X de tórax em caso de dúvida,


doentes com patologias prévias ou evolução do tratamento desfavorável.

P á g i n a 32 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Terapêutica empírica PAC:


• Amoxicilina;
• Amoxicilina /
Ácido clavulânico;
• Macrólidos;
• Doxiciclina;
• Cefalosporinas;
• Fluoroquinolonas.

P á g i n a 33 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Pneumonia viral:
• Febre súbita e alta, calafrios, tosse não produtiva,
artralgias, mialgias e rinorreia;
• Agentes:
o Vírus influenza A e B;
o Vírus parainfluenza;
o Adenovírus;
o VSR;
o Coronavírus;
o Vírus varicela-zoster.
• Vacinação essencial para grupos de risco (crianças <
5 anos e idosos > 65 anos, grávidas).

Pneumonia por Fungos:


• Agentes:
o Pneumocystis jiroveci;
o Aspergillus;
o Cryptococcus neoformans;
o Histoplasma capsulatum;
o Coccidioides immits;
o Blastomyces dermatidis.
• Viagem recente como fator de risco;
• Doentes imunodeprimidos:
o Início insidioso, tosse escassa e seca;
• Febre ausente ou baixa;
• Escassa repercussão sobre o estado geral;
• Dispneia de esforço de agravamento
progressivo;
• Auscultação pulmonar muitas vezes normal:
o Crepitações disseminadas na doença avançada;
o Derrame ou pneumotórax – raro mas possível;
o LDH elevado;
o Hipoxemia que pode ser grave (saturação O2 < 65%).
P á g i n a 34 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Outras etiologias:
• Mycobacterium tuberculosis:
o Imunodepressão, primária ou secundária;
o Contexto epidemiológico e geográfico;
o Apresentação sub-aguda / crónica, raramente aguda;
o Febre moderada ou muito alta de predomínio vespertino e noturno;
o Sintomas B;
o Hemoptise possível;
o Degradação do estado geral.

Pneumonia Nosocomial (ou adquirida no hospital):


• Ocorre após ≥ 48 horas de internamento;
• Não estava em incubação à altura da admissão;
Ou
• Internamento num hospital de agudos por 2 ou mais dias, nos 90 dias prévios.

Pneumonia Associada ao Ventilador:


• Epidemiologia:
o MRSA;
o Bacilos gram-negativos não fermentadores:
▪ Pseudomonas aeruginosa;
▪ Acinetobacter baumannii.
o Maior risco de Enterobacteriaceae MDR;
o Investimento no diagnóstico:
▪ Hemoculturas;
▪ Colheita de expectoração;
▪ Broncofibroscopia;
▪ Lavado broncoalveolar.
o Antibioterapia empírica:
▪ Cobertura gram-negativos MR de acordo com epidemiologia local;
▪ Cobertura de MRSA.

P á g i n a 35 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 7 – Infeções Sexualmente Transmitidas


Data Docente
27/10/2021 Profª. Doutora Emília Valadas

Usa-se o termo infeções sexualmente transmissíveis e não doenças porque muitas vezes as
infeções não chegam a tornar-se doenças, sendo frequentemente assintomáticas.

Sintomas
frequentemente
confundidos com
infeções urinárias

Por exemplo, a infeção por HIV pode-se manter assintomática durante muito tempo (> 10 anos),
período durante o qual pode continuar a transmitir a outras pessoas.

Uma úlcera indolor pode indiciar sífilis, se for dolorosa poderemos pensar noutros quadros
clínicos.

Estas 4 podem ser


tratáveis ou
evitáveis com
vacinas (nos países
ricos)

Nos países em desenvolvimento a hepatite B continua a ser um grave problema, enquanto nos
países desenvolvidos a vacina tem vindo a desconstruir a sua prevalência. As consequências mais
graves do HPV é o cancro do colo do útero e do canal retal.

O vírus da hepatite B é muito infecioso (muito mais do que o HIV) e a transmissão via sangue é
bastante prevalente.

P á g i n a 36 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

A transmissão durante o parto continua também a ser muito prevalente em países em


desenvolvimento.

A existência de múltiplas infeções sexualmente transmissíveis no mesmo individuo é também


comum – quem tem HIV pode ser sífilis ou gonorreia, e vice-versa, e isso não deve ser esquecido
na abordagem preventiva durante a gravidez/parto por exemplo (porque todas estas infeções
podem ser transmitidas ao filho), nem na abordagem terapêutica.

Quando uma pessoa dá positivo para uma infeção sexualmente transmissível após um contacto
sexual desprotegido deve ser pedida a análise a todas as outras infeções porque existe uma
elevada probabilidade de coexistirem.

Trata-se com
penicilina

A prevalência do HPV tem vindo a diminuir muito devido à existência da vacina.

Isto acontece porque o herpes provoca lesões que podem ser feridas (soluções de continuidade
das mucosas), e a sífilis também provoca úlceras; assim, facilita a entrada do vírus HIV.

P á g i n a 37 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

A PrEP no HIV representa a prevenção antes da infeção ocorrer; faz-se nas pessoas com risco
aumentado (por exemplo, existe medicação para pessoas que tenham exposição a contactos
sexuais desprotegidos com frequência).

A prevenção passa também, obviamente, pelo uso de preservativo.

Daí a
importância de
manter a
existência de
rastreios

Os testes rápidos têm sempre de ser confirmados por testes de maior fiabilidade, mas permitem
testar grandes quantidades de pessoas e fazer uma triagem de suspeita.

P á g i n a 38 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Nas infeções bacterianas e parasitarias usa-se muitas vezes dose única (oral ou injetável); no
caso da sífilis é fácil, é sempre com penicilina (injeção intramuscular).

A DGS assume uma lista de doenças bastante extensa (sífilis, HIV, tuberculose, malaria, febre
tifoide, algumas diarreias, doença de Lyme, …) de declaração obrigatória.

Esta lista é alterada conforme a epidemiologia local.

Esta declaração é importante para que sejam delineadas estratégias para encontrar os parceiros
em caso de infeção e, deste modo, controlar a transmissão.

Estas infeções são tratáveis se diagnosticadas a tempo, por isso não se prevê que seja liberada
uma vacina tao cedo.

P á g i n a 39 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Sífilis

Caracteriza-se pela existência de lesões indolores e pequenas nos genitais que passam
despercebidas durante algum tempo e depois evoluem frequente- e rapidamente para úlceras.
A sífilis surge em 3 fases – entre a fase primária e terciária podem passar 20 ou 30 anos. A sífilis
primária é caracterizada por úlceras genitais indolores e com bordos bem delimitados (fotos
abaixo); nesta fase, trata-se com penicilina com uma única injeção intramuscular (se necessário
podem fazer-se mais injeções).

É importante observar a
boca e palato quando há
suspeita de infeções
sexualmente transmissíveis.

Manchas não pruriginosas nem dolorosas nas palmas das mãos e pés é típico de sífilis
secundária. Normalmente acompanha com manchas no tronco (podem infetar devido à
coceira).

P á g i n a 40 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Se a sífilis primária/secundária não for tratada, pode evoluir 20 ou 30 anos depois para sífilis
terciária. A sífilis terciaria caracteriza-se pelo compromisso do sistema nervoso central e, neste
caso, a penicilina não vai ser eficaz no tratamento porque não atravessa a barreira
hematoencefálica (neste caso, o mesmo antibiótico deverá ser dado via endovenosa).

A sífilis terciária não tratada, pelo compromisso do sistema nervoso central, pode evoluir para
quadros de esquizofrenia ou quadros demenciais.

Lesões de herpes tipo 1 são muito dolorosas e funcionam como excelentes portas de entrada
para variados tipos de microrganismos, nomeadamente HIV.

O que preocupa mais no caso da


infeção por HPV são as consequências
neoplásicas a longo prazo nas pessoas
não vacinadas (carcinoma do colo do
útero e do canal anal).

P á g i n a 41 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

É causada pela bactéria Neisseria gonorrhoeae; dá tipicamente um corrimento esbranquiçado


na glande ou corrimento vaginal. Pode não dar mais sintomas, mas pode gerar ardor miccional,
desconforto, prurido. Pode também afetar outros órgãos à distância e pode causar artrite
quando não diagnosticada e tratada.

P á g i n a 42 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 8 – Sépsis
Data Docente
28/10/2021 Drª. Joana Fernandes

Definição

Sepsis – Doença de disfunção orgânica com risco de vida, causada pela resposta desadequada /
exacerbada do hospedeiro a uma infeção (“Life threatening organ dysfunction caused by
dysregulated host response to infection”).

Choque Séptico – Consequência da Sepsis em que há alterações celulares, metabólicas e


circulatórias tão graves que levam a uma mortalidade aumentada (“Subset of sepsis in which
underlying circulatory and celular / metabolic abnormalities are profound enough to
substancially increase mortality”).

Mortalidade

É sobretudo nos doentes a


partir dos 45 anos que ocorre
uma maior percentagem de
mortalidade por sepsis, sendo
o pico da mortalidade nos
pacientes entre 65 e 84 anos.
Quando não detetada
precocemente a mortalidade
por sepsis é maior.

P á g i n a 43 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

O SOFA, é um sistema de score para classificar se o doente se encontra ou não num quadro
séptico. Valores de SOFA superiores ou iguais a 2 pontos, mostram que o doente está num
quadro séptico. Envolve vários sistemas, mas não é fácil de utilizar, visto que as medições
necessárias são demoradas. É um score mais usado na unidade de cuidados intensivos e que é
feito diariamente para verificar a evolução do doente.

Face a isto foi necessário criar um sistema de uso mais


prático para uma primeira abordagem ao doente. O
sistema criado para isso foi o qSOFA (Quick SOFA).
Este baseia-se sobretudo na alteração da consciência,
da pressão sistólica e da frequência respiratória.

Os doentes com choque séptico são identificados pela hipotensão que persiste mesmo após
medidas para a contrariar, havendo também sinais de hipoperfusão periférica, que é avaliado
pelo valor dos lactatos no sangue arterial, que nos indicam que o metabolismo periférico não
está a ser feito corretamente. Há assim uma dificuldade circulatória, que limita a chegada de
nutrientes à periferia e que mesmo após algumas
medidas (hidratação forçada, fármacos como
aminas, que fazem vasoconstrição) não
conseguem fazer subir a pressão arterial.

Quick SOFA

Os 3 principais parâmetros: Observar o doente


para avaliar Frequência respiratória, Pressão
Arterial e Escala de Coma de Glasgow, que
consiste na capacidade do doente abrir os olhos à
resposta, responder verbalmente, responder
motoramente, sendo depois atribuído um score,
sendo 15 a melhor resposta, e 3 um doente
completamente sem resposta.
Árvore Decisão para aplicação do qSOFA e SOFA

P á g i n a 44 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Abordagem

A primeira coisa a fazer é uma Gasometria (Gasimetria). O sangue é removido ao doente e


enviado diretamente a um equipamento de gasimetria que faz a análise. A colheita é feita com
uma agulha e seringa que vêm preparadas e a colheita é feita numa artéria de menor calibre,
fazendo a punção e deixando que o sangue entre na seringa pela própria pressão arterial.

A análise da gasimetria dá-nos os valores do pH, o valor pCO2, pO2 HCO3-, e o excesso de bases
no sangue. Pode ainda dar valores de alguns iões (K, Ca) e o valor dos lactatos. Lactatos
aumentados são indicativos de disfunção orgânica e hipoperfusão periférica.

Definir Objetivos:
• PAM (Pressão Arterial Média) > 75mmHg;
• Diurese > 0,5 ml / Kg / h;
• PVC (Pressão Venosa Central) 8-12 mmHg (Determinada diretamente na Veia Cava);
• Saturação venosa central >70%;
• Normalização de lactatos;

P á g i n a 45 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Colheita de Sangue Venoso para Análises:


• Hemograma;
• Bioquímica;
• Coagulação.

Exames complementares (devem ser feitos rapidamente):


• Radiografia.

Fluid Challenge

Fazemos subir a tensão ao doente via hidratação, de forma a expandir o volume intravascular.
Feito através de soros, sendo os mais utilizados os cristaloides (soro fisiológico, por exemplo)
com uma hidratação rápida:
• 30 ml / kg de cristaloides em 30 min:
o 60 kg – 1800 cc
o 80 kg – 2400 cc
Colóides (gelatinas), mais espessos também podem ser utilizados para hidratação, têm um
expansor de volume. 500 cc de coloide, expande mais que 500 cc de soro fisiológico. Pode
provocar desequilíbrios de coagulação, por isso devem ser usados com atenção.
Tanto a albumina como o concentrado de eritrócitos não se demonstram eficazes, sendo o
concentrado de eritrócitos apenas útil em doentes com perdas hemorrágicas associadas.
Devemos ter também atenção a doentes com má função cardíaca ou insuficiência renal, visto
que estra hidratação pode criar sobrecarga nestes dois sistemas, criando por exemplo
transudado no pulmão, criando dificuldades respiratórias.

Registo da Diurese

O doente é algaliado, de forma a poder-se fazer a monitorização da diurese. Esta algaliação não
é feita apenas para saco coletor, mas também para um micrómetro de forma a permitir a
avaliação precisa da diurese.

Diagnóstico:
• Não deve atrasar o início de antibióticos;
• Pelo menos duas hemoculturas;
• Outras culturas (urocultura);
• Exames complementares de imagem.

Antibioterapia:
• Até 1h após diagnóstico de sepsis;
• Atividade e penetração;
• Largo espetro / combinação;
• Após 3-5 dias: Descalação;
• Duração 7-10 dias;
• Família de ATB:
o Beta-lactâmico de largo espetro;
o Beta-lactâmico de largo espetro + aminoglicosideo;
o Vancomicina se suspeita de agente Gram +.

P á g i n a 46 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Controlo de Foco:

Se houver um foco infecioso, nenhum ATB vai ter uma boa penetração. Deve este assim ser
controlado rapidamente (12 horas), devendo a drenagem do mesmo ser o menos invasiva
possível.

No entanto, se a PAM persiste baixa e os lactatos não normalizam, é necessário tomar medidas
adicionais:
• Iniciar aminas vasoativas (Noradrenalina, (Dopamina, cada vez menos usada)), fazem
vasoconstrição e aumentam a pressão arterial;
• Se iniciar aminas em vasos onde o fluxo sanguíneo é fraco naquele momento, estes
podem colapsar. Assim é necessário que a administração seja feita por um cateter
venoso central (jugular, subclávio, femoral (menos frequente)). Este cateter para além
de permitir a administração das aminas, permite também a avaliação da pressão venosa
central;
• Aminas não devem ser dadas por vasos periféricos, pelo risco de a vasoconstrição, que
é feita no momento da administração, poder causar necrose nas veias.

De seguida pode ser feita a colocação de uma linha arterial (radial, cubital) de forma a se poder
proceder à monitorização da pressão arterial e a colheitas de sangue.

Noradrenalina
• Diluição:
o 10 mg / 50 cc;
o 30 mg / 50 cc.
• Perfusão:
o 2-4 ml /h (6-12 g
/ min), para a
primeira diluição;
o 2-4 ml / h (20-40
g / min), para a
segunda diluição.

P á g i n a 47 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Dopamina
• Diluição: 400 mg / 50 cc;
• Pode ser utilizada num acesso periférico;
• Não utilizar doses abaixo de 5 g / kg / min;
• Dose inicial – 7,5 g / kg / min:
o 60 kg – 3,4 cc / h;
o 80 kg – 4,5 cc / h.

Dobutamina
• Provoca uma reação inotrópica positiva. Existe necessidade de avaliar a função cardíaca:
o Ecocardiograma;
o Saturação venosa central (> 70%);
▪ Hb > 8 e PVC >8.
• Diluição: 500 mg / 50 cc;
• Dose inicial: 5 g / kg / min
o 60 kg – 1,8 cc / h;
o 80 kg – 2,4 cc / h.

Após estabilização o paciente é transferido para UCI. Na unidade de cuidados intensivos o


paciente:
• Vai receber corticoides (Hidrocortisona 50mg 6 / 6 h), devido a falência da suprarrenal,
associada ao choque séptico;

• Para expulsar o CO2, devido à acidémia, o doente fica polipneico, mas não consegue
aguentar o esforço exigido, o que pode levar a necessidade de ventilação mecânica, com
colocação de tubo orotraqueal ligado a um ventilador;
• Também os rins começam a falhar já que não existe boa perfusão renal, impedindo a
filtração. Existe necessidade de técnicas de substituição renal (hemodiafiltração
venovenosa contínua) que vão efetuar uma filtração contínua do sangue;
• Com tudo isto, existe a necessidade de sedação do doente, usando midazolam ou
propofol é usada a dose mínima necessária para que o doente esteja sedado, sem
provocar alterações de TA que estes fármacos podem provocar;
P á g i n a 48 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

• A glicemia responde ao stress aumentando a glicose em circulação, podendo haver


necessidade de controlar a glicemia, usando Insulina rápida, de acordo com as
necessidades apresentadas pelo doente;

• A alimentação é feita por via entérica, através de tubo orogástrico (não se coloca tubo
nasogástrico para não impedir a drenagem dos seios perinasais). Devido à possível
ocorrência de úlceras de stress, a nível gástrico. Faz-se a administração de um protetor
gástrico IV como a ranitidina ou o omeprazol;
• Por estarem imóveis deve-se fazer a prevenção da trombose venosa profunda (TVP) dos
membros inferiores (formação de coágulos nas veias das pernas, que podem embolizar
e chegar ao pulmão), com o uso de uma heparina de baixo peso molecular, ou com uso
de meias de compressão.

P á g i n a 49 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 9 – Sintomas e Sinais nas Doenças Infeciosas


Data Docente
02/11/2021 Dr. Tiago Marques

• Doenças infeciosas – grande leque de apresentações, podendo envolver todos os órgãos


e sistemas ...;
• Diagnostico diferencial alargado;
• “Síndrome do segundo melhor especialista”;
• Exames confirmatórios por vezes morosos ... em pacientes que por vezes não pode
esperar ...;
• Epidemiologia / contexto.

Caso 1:
• Doente de 39 anos;
• Vem ao SUC por hemorroida exteriorizada;
• Após questionado – sensação de febre e prostração;

O Doente é apenas da cirurgia? Depende do seu contexto de doença anterior...

Contexto:

Sépsis neutropénica
• HIV +, linfoma não Hodgkin difuso de grandes células B, estadio IV-B;
• Em dia 8 RCHOP2 (Quimioterapia) (!!!).

E agora? Exames a pedir? Hemograma

Sepsis Neutropénica: Pode acontecer na Quimioterapia, ao fim de 8 dias deixar de existir


neutrófilos. Por outro lado a entrada de bactérias pode estar facilitada, levando o doente a
entrar em Sépsis.

P á g i n a 50 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Exames Realizados:
• Hemograma – leucócitos 300, neutrófilos 0;
• Plaquetas 44.000 PCR 26;
• Hemoculturas – Pseudomonas aeruginosa não multirresistente;
• Internado, cumpriu 10 dias de meropenem;
• RCHOP3 a 25/9, até agora sem intercorrências;

História Clínica:
• É o “exame” fundamental ...embora o mais descurado...;
• Tentar relacionar os eventos criticamente;
• Inter-relação com epidemiologia e exame objetivo tentando orientar para um
diagnóstico...

Caso 2:
• 54 anos, raça branca;
• Febre com calafrios há 2 dias;
• Odinofagia há 5 dias, já fez penicilina sem resposta;
• Lesões cutâneas há < 24 horas, dolorosas.

O que espera encontrar nos achados laboratoriais: Neutropénia

Laboratório:
• Hemoglobina 11,6 g/dL;
• Glóbulos Brancos 100 neutrófilos 0;
• Plaquetas 340.000;
• VS 120 PCR 43;
• Hemocultura: positiva para P aeruginosa.

E agora, o que perguntamos? Medicação que tenha feito anteriormente.

Uma semana antes do quadro...


• Ciatalgia refractária medicada com metamizol.

Diagnóstico: Agranulocitose ao metamizol (Nolotil – Muito usado nos países latinos, proibido
em alguns países como os EUA e países do Norte Europeu)

Tratada com GCSF e cefepima + amicacina com resolução

Exame Objetivo:
• Juntamente com a história clínica é peça chave no diagnóstico
• Alguns achados podem ser patognomónicos, e outros muito orientadores...

Caso 3:
• Homem de 43 anos;
• Valvulopatia reumática não corrigida;
• Febre ondulante há 3 meses, poliartralgias;
• LAB do exterior: anemia, hipergama com banda IgGK, consumo dos complementos;
• Doença autoimune? Hematológica? Ou outra?

P á g i n a 51 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Doente apresenta nas palmas das mãos lesões consistentes com Nódulos de Osler e hemorragias
em lasca debaixo das unhas (ambos sinais de endocardite bacteriana)

Exames:
• ACP rodado mitral + sopro de insuficiência;
• Esplenomegalia 2 cm;
• Hemoculturas positivas para Streptococcus bovis 1 (gallolyticus);
• Iniciou penicilina e gentamicina com melhoria.

O que falta fazer ainda? Colonoscopia, visto S. Gallolyticus vir do trato GI. Não tinha Neoplasia,
mas lesão pré-maligna que foi retirada.

Caso 4:
• Doente de 47 anos;
• Odinofagia intensa com adenopatias cervicais;
• Febre com calafrios;
• Poliartralgias e artrite dos pulsos e tornozelos;
• Portadora de analises leucocitose 22.000 com neutrofilia 94% PCR 18 , VS 120, TGO e
TGP 3XLSN.

Cumpriu antibioterapia em ambulatório


• Penicilina (3 tomas) - sem resposta !!!!;
• Amoxiclav - sem resposta !!!!;
• Levofloxacina - sem resposta !!!!;

Paciente chega a consulta com rash, que aparece à noite, quando a febre está mais alta e
desaparece durante a manhã, com coloração “cor de salmão”.

Escarlatina – Rash cor vermelho escarlate, parece queimadura solar, língua de framboesa e linha
de Beau na fase de cura, com escamação de palmas e possivelmente plantas.

Sarampo – Para além do Rash tem pontos de Koplik na cavidade oral.

Mononucleose – Amigdalite, com membranas, alterações no hemograma, rash (quando tomam


amoxicilina) e adenopatias.

Eritema Infecioso – Rash na face (parece que levou uma estalada)

Depois de despistados todas as possíveis patologias, chegou-se a conclusão que não era doença
infeciosa, mas sim doença de Still do Adulto (aparenta ser tempestade de citocinas induzida por
infeção):
• Ferritina 14390 ng/dL;
P á g i n a 52 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

• Cumpria 4 +3 critérios de Yamaguchi;


• Exclusão de outros diagnósticos;
• Boa resposta a indometacina que entretanto já suspendeu;
• Moral da história …antibioterapia inadequada.

Orientação pela Gravidade:


• Algumas patologias, por vezes mais raras, são graves e têm terapêutica específica;
• Outras põem em risco a saúde publica;
• “O que não querem perder …”;
• Pensar no diagnóstico cedo é a chave da situação…

Caso 5:
• Criança, 6 anos;
• Febre com calafrio há 12 horas;
• Prostração intensa, vómitos;
• Hipotensão, febril (40,6ºC).

Apresenta lesões características de Meningococcemia.

Sinais Meníngeos:
• Rigidez nuca;
• Kernig e Brudzisky.

E o nosso doente? Porque não os tem? Porque tem meningococo no sangue e não no líquor.

• Hemoculturas positivas para Neisseria meningitidis;


• Iniciou ceftriaxona e depois penicilina com boa resposta.

Caso 6:
• Jovem de 24 anos;
• Recorre ao SUC (em Agosto) por febre de 40º, vómitos, calafrios e mialgias;
• Alta com diclofenac;
• 2 dias depois recorre por manter febre.

O que não queremos perder? Doente era caçador e tinha um grande


número de cães, apresentava lesões que indicavam Febre
Escaronodular (da Carraça) – Lesão negra (Tache Noire) no local da
picada da carraça + erupção purpúrica nas palmas das mãos (no
limite pode ocorrer em todo o corpo)

• Diagnóstico de febre escaronodular;


• Iniciou doxiciclina com boa resposta;
• Serologia confirmou posteriormente este diagnóstico.

Caso 7:
• Homem, 25 anos, não fumador;
• Tosse pouco produtiva com 1 mês de evolução, após rinofaringite;
• Sensação de febre, sudação noturna;
• Noção de perda de peso;
• Exame objetivo normal.
P á g i n a 53 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Diagnóstico: Tuberculose Pulmonar Bacilífera. Primeira coisa a fazer, colocar máscara ao doente;
segunda coisa a fazer, RX tórax. Se possível isolar o doente numa sala sozinho.

Caso 8:
• Homem de 32 anos, militar no ativo;
• AP favismo;
• Há 1 semana febre não quantificada, petéquias, gengivorragias, hematomas;
• Alteração do estado de consciência;
• LAB do exterior Hb 7.8 g/ dL, GB 10.000, N 60%, Eo 30%, Plaq 31.000, PCR 10, PTT 56/29,
INR 4, Fib 35, LDH 1000.

Esfregaço de Sangue Periférico:


• Observam se numerosos promielócitos atípicos (95% da celularidade total);
• Células em espelho de mão, abundantes corpos de Auer , corpos de Phi;
• Neutrófilos 400 células / mm3;
• t(15 17) (q22 ; q 21.1) PML/RARA positiva em 100% das metáfases.

Diagnóstico: Leucemia aguda promielocítica (LMA 3)

Em resumo:
• Patologia infeciosa multiplicidade de apresentações (incluindo as que não parecem
infeciosas…);
• Patologia não infeciosa pode também imitar patologia infeciosa…;
• Importância da história e exame objetivo;
• Tentar colocar hipóteses e depois confirmá-las (sabendo quando não podemos esperar
para tratar o doente).

P á g i n a 54 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 10 – Malária
Data Docente
05/11/2021 Drª. Aida Pereira

A malária é uma doença infecciosa com uma grande impacto global na incidência e na
mortalidade, devido a vários fatores, como a globalização, alterações climática, resistência à
terapêutica e inseticidas. Esta doença é causada por um parasita protozoários intracelular
obrigatório, do género Plasmodium sp. Sendo este transmitido pela picada do mosquito fêmea
do género Anopheles, o vetor e reservatório, aquando da alimentação do mesmo do sangue do
hospedeiro entre o entardecer e a madrugada. É uma doença exclusiva do Homem, evitável e
curável. Excecionalmente pode ser transmitida por transfusão sanguínea, transplantes, partilha
de agulhas contaminadas e de modo congénito.

A malária é provocada por cinco espécies de plasmódios: P. falciparum, P. vivax, P. ovale,


P. malarie, P. knowlesi (transmitido do macaco ao Homem, mas sem transmissão inter-humana
consistente). Os grupos de risco são as crianças de idade inferior a 5 anos, grávidas, viajantes e
imunodeprimidos.

Em 2018, segundo a OMS, nos países africanos da África Subsariana com transmissão
moderada a elevada apresentavam cerca de 11 milhões de grávidas que foram expostas a
infeção de malária. A prevalência de malária na gravidez foi de 35% na África Ocidental e Central,
e de 20% na África Oriental e do Sul. 39% da exposição foi na República Democrática do Congo
e na Nigéria. Este 11 milhões de grávidas originaram 87200 crianças com baixo peso à nascença,
sendo 16% do total de crianças com baixo peso à nascença, apresentando África Ocidental a
maior prevalência.

Historicamente em 1880 o parasita da malária foi identificado pela primeira vez por
Charles Alphonse, tendo lhe dado o nome de Plasmodium, e em 1890, Ronald Ross e Battista
Grassi demonstraram que a doença era transmitida ao homem pela picada do mosquito
Anopheles gambiae. A designação de paludismo surgiu no século XIX, do latim paul, palude.
Malária é um termo de origem italiana, uma vez que Giovabbi Maria Lancisi, em 1717, notou
que os habitantes dos pântanos sofriam mais com a doença e deu-lhe o nome de malária que é
a junção de ‘mal’ e ‘aria’ (mau e ar). O termo médico tradicional era sezonismo ou sezão, desde
o século XIII, entre outras designações.

P á g i n a 55 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Observou-se uma redução de 200 para 2015 dos casos de malária, passando de 107
países para 97.

Os países com maior percentagem são a Nigéria e a República Democrática do Congo. A


incidência de malária nas crianças tem um grande impacto.

P á g i n a 56 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Em 2019 houve um abrandamento destas medidas o que pode pôr em causa estes
objetivos. Para os atingir é necessária uma abordagem integrada na prevenção (controlo
vetorial) através da utilização de redes mosquiteiras impregnadas de inseticidas de ação
prolongada, pulverização intra-domiciliária com inseticidas, drenagem de águas paradas onde
os mosquitos depositam os seus ovos. Por outro lado a abordagem inclui o tratamento
combinado com derivados de artemisinina e o tratamento intermitente preventivo em mulheres
grávias.

Portugal já foi um país endémico para a


Malária, nomeadamente nas regiões
assinaladas, até aos anos 60. No entanto não
existem casos reportados desde 1967, tendo-
se declarado doença autóctone em 1973.

A malária é uma doença de registo e


comunicação obrigatório, havendo ainda
alguns casos de doença importada, sendo por
isso associada principalmente à população
ativa, que se desloca mais tanto em turismo
como em trabalho.

P á g i n a 57 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

O P. falciparum tem uma distribuição mundial, mais concentrada nas regiões


assinaladas, e é responsável por cerca de 90% dos casos de malária. O P. vivax provoca doença
debilitante e recorrente.

P á g i n a 58 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

O parasita da malária apresenta três estadios de evolução, um primeiro sexuado que


ocorre no parasita e os outros dois assexuados que ocorrem no hospedeiro definitivo (o
Hoemem). O mosquito fêmea inocula os esporozoítos na corrente sanguínea e ocorre a primeira
fase assexuada de desenvolvimento no fígado, onde o parasita infeta as células hepáticas e se
multiplica e diferencia de modo a formar o esquizontes hepáticos e diferencia-se em merozoitos.
Estes vão ser libertados na corrente sanguínea e infetar os eritrócitos. O segundo ciclo de
desenvolvimento assexuado é o ciclo eritrocitário. Nas espécies P. ovale e P.vivax, algumas
células podem permanecer no fígado em modo quiescente, os hipnozoítos, que podem causar
infeção mais tarde. O merozoitos diferenciam-se em trofozoítos formando os esquizontes
eritrocitários que libertam merozoitos que podem manter o ciclo repetitivo de infeção. Por
outro lado, os merozoitos podem diferenciar-se nas formas assexuadas do parasita, os
gametócitos, que voltam ao mosquito quando este se alimenta do sangue humano, retomando
o ciclo completo.

P á g i n a 59 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Quando as células estão infetadas pelo parasita no caso do P. vivax e do P. ovale, verifica-
se uma aumento do tamanho dos eritrócitos, enquanto nos outros dois não há grande mudança
no tamanho dos eritrócitos.

A patogénese da malária é caracterizada pela invasão e destruição dos eritrócitos pelo


parasita e depende da reação do hospedeiro. Quando o parasita infeta o eritrócito consome e
destrói a proteínas intracelulares causando alterações na membrana celular, nomeadamente as
suas propriedades de transportes, os antigénios de superfície e inserindo proteínas do parasita.
Assim o eritrócito fica com uma forma irregular, mais antigénico e com menor deformabilidade.

No caso do P. falciparum, este apresenta


proteínas que introduz na membrana do
eritrócito, com capacidade de citoaderência,
aderência ao endotélio, levando a uma agregação
de células e aglutinação levando a uma falsa
parasitémia.

Nos outros Plasmódios isto não acontece, levando a uma parasitémia real. O P.
falciparum afeta todos os eritrócitos, enquanto os restantes são específicos do eritrócitos jovens
(P. vivax e P. ovale) ou do eritrócitos maduros (P. malariae).

Relativamente à reação do hospedeiro o baço efetua a sua função imunológica e de


filtração, nomeadamente de remoção dos eritrócitos parasitados e não parasitados, sendo que
alguns do parasitados escapam a esta filtração. Esta é uma das causas de anemia desta doença,
assim como a destruição da hemoglobina por parte do parasita.

Os eritrócitos parasitados que não são filtrados acabam por ser destruídos na rotura dos
esquizontes, levando a libertação de merozoitos que ativam os macrófagos e a libertação de
citocinas pró-inflamatórias por células mononucleares, originando picos de febre a cima dos
40ºC. Os paroxismos febris da malária resultam da rotura dos esquizontes e iniciam-se com
calafrios, depois sobe a temperatura e por fim ocorre sudação. Podem ocorrer de 3 em 3 dias
(febre quartã) no cado de P. malariae, de 2 em 2 dias (febre terçã) no cado de P. ovale, P. vivax
e P. falciparum, ou evoluir para irregular entre os dois intervalos no caso de P. falciparum (ferbre
terçã maligna).

A imunidade da malária é parcial e pode ser obtida por repetidas infeções, observando-
se uma resposta imune dependente do número de episódios de doenças e da permanência
numa área endémica, desenvolvendo-se uma imunidade parcial ou “semi-imunidade”. Sendo
que esta não previne, mas confere proteção à doença, desaparecendo após ausência
prolongada da área endémica. Existem polimorfismos genéticos que conferem alguma proteção
à doença, como hemoglobinopatias S, E, C, F (a S confere resistência à infeção por P. falciparum),
ausência de “Duffy antigen” (imunidade para P. vivax), alfa-talassémia, ovalocite no sudoeste
asiático, favismo, deficiência de ferro. Por outro lado a esplenectomia é um fator de risco.

O período de incubação da Malária varia consoante o agente infeccioso. Para P.


falciparum são cerca de 8 a 15 dias, para P. malariae são 28 a 37 dias e para P. ovale e Pvivax são
10 a 18 dias. Existem casos raros de incubação de mais de 1 ano para P. falciparum, uma vez que
pode ficar patente.

O quadro clínico inclui sintomas como febre, mau estar, astenia, adinamia, cefaleias,
mialgias e artralgias. O que pode criar confusão com outras patologias como a encefalite, a febre
amarela, endocardite, entre outras. A febre é irregular como dito anteriormente. Sintomas
P á g i n a 60 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

menos frequentes são desconforto abdominal, dor torácica ou abdominal, anorexia, náuseas,
vómitos, diarreia ou icterícia. Sendo que estes podem criar confusão relativamente a hepatites,
febre tifóide, dengue, meningite, entre outras.

O exame objetivo apresenta febre, taquicardia, esplenomegalia, hepatomegalia, sinais


de anemia e icterícia, principalmente em localizações endémicas.

O caso de malária por P. falciparum pode apresentar quadros não complicados


apresentando uma mortalidade de 0,1%, ou então quadros mais complicados, sendo que este
parasita representa cerca de 95% da mortalidade por malária.

As complicações da Malária grave incluem Malária cerebral/coma/crises epiléticas,


edema pulmonar não cardiogénico, disfunção renal, disfunção hepática/icterícia, anemia e/ou
trombocitopenia graves, hipoglicémia, acidémia/acidose.

A Malária cerebral pode levar a encefalopatia difusa assimétrica, sinais focais comuns,
alterações do estado de consciência e alterações dos reflexos cutâneos e osteotendinosos. 50%
das crianças podem apresentar crises epiléticas. O coma representa 15% da mortalidade das
crianças e 20% dos adultos, instalando-se gradualmente ou abruptamente após crise epilética.
15% das crianças e 3% dos adultos apresentam sequelas como, hemiplegia, paralisia cerebral,
cegueira cortical, surde, défices cognitivos, problemas de linguagem ou dificuldades de
aprendizagem. Nesta complicação pode ainda existir envolvimento oftalmológico relacionado
com a aglutinação que ocorre na microvasculatura levando a obstrução da mesma.

A hipoglicémia ocorre devido a falha na gliconeogéneses hepática, existindo um


aumento de glicose pelo hospedeiro e além disso a quinina e quinidina são fatores estimulantes
da secreção de insulina. OS problemas de diagnóstico prendem-se com a ausência de sinais
típicos e as manifestações de hipoglicémia versus malária cerebral.

A acidose é causada pela glicólise anaeróbia, a produção de lactato pelos parasitas e


pela insuficiência renal e/ou hepática. Manifesta-se por taquipneia (compensação respiratória).

O edema pulmonar não cardiogénico é responsável por mais de 80% da mortalidade,


sendo uma variante da síndrome da dificuldade respiratória aos adultos de causa desconhecida,
e pode ser agravado pela administração vigorosa de fluídos intravenosos.

O atingimento renal é causado devido ao sequestro parasitário na circulação renal,


manifestando-se por oligúria, anúria, hemoglobinúria e elevação da creatinina, sendo necessária
diálise precoce ou hemofiltração para aumentar a probabilidade de sobrevivência.

As anomalias hematológicas como a anemia e a trombocitopenia, ocorrem devido à


remoção acelerada de eritrócitos pelo baço, destruição de eritrócitos pelos parasitas e
eritropoiese ineficaz. Levam a alteração na coagulação, coagulação intravascular disseminada e
hemorragia.

A disfunção hepática pode apresentar-se como icterícia ligeira que é mais comum, ou
como icterícia grave associada a P. falciparum, levando a hemólise, lesão dos hepatócitos e
colestase.

Na Malária existem várias análises que devem ser pedias de modo complementar as
conclusões clínicas. No entanto o diagnóstico é feito pelo exame microscópico para identificação
do plasmódio envolvido na infeção. Pode ser feito com uma gota espessa, o que apresenta uma
grande sensibilidade, ou pela técnica do esfregaço, que é menos sensível, mas mais específico,
P á g i n a 61 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

o que permite distinguir as diferentes espécies. Outros métodos de diagnóstico incluem testes
serológicos, microscopia de fluorescência, técnicas de deteção de antigénios de P. falciparum e
técnicas moleculares. No entanto estes são métodos de aplicação reduzida na prática clínica
quotidiana, mas amplamente usados nas investigação epidemiológicos.

O tratamento é instituído nos doentes diagnosticados, sendo que se o teste der negativo
deve ser repetido ao fim de dois dias, sendo necessários três testes negativos para se excluir
malária. O tratamento tem de ter em conta as localizações de resistência à cloroquina. Os
fármacos atuam no ciclo eritrocitário principalmente, havendo dois que atuam no ciclo hepático.

O tratamento da Malária deve ser sempre feito em terapêutica dupla, nomeadamente


baseados em artemisinina. Sendo que se deve ter em conta que já existem localizações com
resistência a este tipo de fármacos.

P á g i n a 62 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Em caso de P. vivax ou P. ovale após a cloroquina deve fazer-se a primaquina de modo


a eliminar as formas quiescentes, exceto em doentes com deficiência grave na G6PD (crises
hemolíticas, grávias e crianças com menos de 4 anos.

A Malária grave implica um tratamento por via endovenosa com monitorização de UCI
respiratória e fluidoterapia.

A prevenção é feita por quimioprofilaxia, medidas de erradicação do vetor (faladas no


início da aula), medidas de barreira e uma vacina, que embora não seja muito eficaz, passou a
ser recomendada para as crianças que são o principal grupo de risco.

É feita uma consulta do viajante para que se possa fazer quimioprofilaxia para pessoas
que viajem para zonas endémicas de Malária.

P á g i n a 63 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 11 – Hepatites Víricas


Data Docente
11/11/2021 Dr. Robert Badura

O primeiro sinal visível de um problema hepático é a Icterícia. A coloração amarela das


escleróticas visíveis, é um indicador globalmente conhecido e que leva as pessoas a visitar o
médico. Esta pode ser gerada por um sem número de condições.

Esta bilirrubinemia, também pode ser verificada noutros locais, como por exemplo junto ao freio
lingual, podendo dar uma estimativa grosseira até dos valores de concentração de bilirrubina no
sangue (quando se consegue verificar uma cor amarelada junto ao freio lingual, a concentração
de bilirrubina é aproximadamente 3.0 mg/dl ou superior). Os valores normais de bilirrubina
situam-se entre os 1,2-1,3 mg/dl.

A bilirrubinemia está associada ao equilíbrio entre a bilirrubina não conjugada e do


urobilinogénio no sangue. Normalmente a bilirrubina não conjugada e transportada ao fígado,
onde é conjugada nos hepatócitos e depois acumulada no sistema biliar. O sistema biliar vai
excretar a bílis para o intestino delgado onde a bilirrubina conjugada vai ser transformada em
Urobilinogénio pela flora intestinal. Boa parte desse urobilinogénio vai ser excretado nas fezes
(atribuindo-lhes a sua coloração acastanhada), mas cerca de 10% é absorvido pela veia porta,
passando pelo fígado e indo para a circulação sanguínea, onde vai ser filtrado pelo rim, de forma
a ser excretado (e dando à urina a sua coloração). Se os hepatócitos não conjugarem a
bilirrubina, esta ficará em circulação, originando assim Icterícia.

Funções do Fígado:
• Produção de bílis e seus portadores;
• Regulação de bílis, colesterol, lecitina e fosfolipídeos;

P á g i n a 64 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

• Metabolismo e conjugação de componentes lipofílicos para a sua eliminação por via


biliar ou urinária.

Quando há aumento do urobilinogénio ou da bilirrubina a urina começa a surgir com uma


coloração castanha. As fezes por ausência da produção de bilirrubina conjugada passam a ter
uma cor mais clara

Possíveis colorações fecais, consoante a patologia:

Hepatite

Hepatite – Qualquer afeção inflamatória do fígado.

No caso da infeção viral, o que acontece é que os vírus entram no hepatócito e vão emitir um
sinal à sua superfície que vai provocar uma reação citotóxica no local, conduzindo à destruição
do hepatócito. O fígado tem alguma capacidade de reparação, mas com o progredir da infeção
essa deixa de ser eficaz. Assim ocorre uma paragem no metabolismo da bilirrubina, e com a
destruição dos hepatócitos, leva à libertação de enzimas hepáticas (como a Alanina
Aminotransferase) que ficam aumentadas no sangue. Assim a destruição do fígado, devido à
inflamação, pode ser visível clinicamente, e confirmada através de provas laboratoriais.
Ocorrerão também problemas relacionados com a absorção de substâncias ingeridas, visto não
haver produção de bílis, nem processamento de substâncias que chegam ao fígado pela veia
porta.

P á g i n a 65 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

A acumulação de gorduras no fígado (fígado gordo) é o primeiro sinal de que existe algo errado.
A destruição dos hepatócitos por inflamação leva a formação de zonas fibróticas no fígado, que
quando muito marcadas e em grande parte do órgão, fazem com que este deixe de funcionar
corretamente. Chamamos a esse fígado com fibrose marcada, um fígado cirrótico.

Um fígado cirrótico leva a montante, a uma dilação da veia


porta (hipertensão portal), devido a estase intra-hepática,
podendo eventualmente levar a trombose. Essa hipertensão
portal, pode ser visível, através da presença de varizes
esofágicas, varizes enterogástricas, “cabeça de medusa” na
zona do abdómen (por aumento da visibilidade das veias
nessa zona),

Em última análise, a continuação da atividade inflamatória


num fígado cirrótico, pode gerar secundariamente um
carcinoma hepatocelular.

As causas de problemas hepáticos podem ser:


• Hepatites agudas:
o Dano súbito ao fígado, que leva a uma inflamação rápida. No total de todas as
lesões hepáticas, contribuem com cerca de 8,4% dos casos, dos quais a maior
parte são causadas pelo vírus da Hepatite A (44,3%), seguidos de tóxicos
(32,2%), vírus da Hepatite C (6,4%) e vírus da Hepatite B (4,0%). 9% causadas
por criptogénicos*.
• Hepatites crónicas:
o 62,7% do total das lesões hepáticas. 26% causadas pela Hepatite C, 24%
causadas pelo alcoolismo, 14% causado pela Hepatite C e alcoolismo
concomitantes. 14% são causados por Hepatite B (11%) e Álcool (3%). 17%
causadas por criptogénicos*.
• Carcinoma hepatocelular:
o 8,1% do total das lesões hepáticas. Maioritariamente causado por vírus da
Hepatite B (50%) e Hepatite C.

* Doenças Criptogénicas – Doenças de caracter desconhecido ou quando todas as causas foram


eliminadas (Retirado da Internet)

Funções do Fígado:
• Síntese de proteínas séricas:
o Albumina
o Proteínas portadoras

P á g i n a 66 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

o Fatores de coagulação (protrombina;


fibrinogénio e heparina)
o Fatores hormonais
• Regulação de nutrientes:
o Gliconeogénese – glucose
o Lípidos
o Colesterol
o Aminoácidos
o Armazenamento de vitaminas (A, B,
D, E & K)
• Desintoxicação:
o Amónio -> Ureia
o Metabolismo enzimático

Uma destruição do fígado superior a 80%, implica falência hepática.

Apresentação de um doente com hepatite aguda:

Fadiga Dor abdominal


Asténica Hepatomegalia dolorosa
Náusea Esplenomegalia
Vómitos Icterícia
Anorexia Colúria
Flapping (alterações neurológicas que levam
Alteração da Consciência
a movimentos involuntários)

Alterações laboratoriais:
• Aumento de Aminotransferases;
• Alteração da Coagulação;
• Hipoglicémia / Hiperglicémias;

Valores de Referência da Função Hepática

70-110 mg/dL
Glucose
3,9-6,1 mmol/L
ALT/TGP 10-49 U/L
Alanina Aminotransferase (Na hepatite aguda pode chegar aos milhares, na
Transaminase Glutâmico-pirúvica crónica não é tão elevado)
AST/TGO
Aspartato Aminotransferase
0-34 U/L
Transaminase Glutâmico-
oxalacética
γGT
< 73 U/L
Gama-glutamil-transferase
FA
45-129 U/L
Fosfatase Alcalina
< 1.0 mg/dL
16 umol/L
Bilirrubina Total
(Normalmente na hepatite aguda encontram-se
facilmente valores superiores a 6-12 mg/dL)
P á g i n a 67 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

TP (INR)
11.1-13.1 s
Tempo de protrombina
Albumina 3.7-5.8 g/dL

Hepatite Viral

Vírus Hepatotrópicos Herpes Vírus Outros Vírus


VHA EBV Sarampo
VHB CMV Paramixovírus
VHC HSV Rubéola
VHD HZV Enterovírus
VHE Febre Amarela
Não A-E Lassa
Ébola

Hepatite Víricas – Perspetiva Histórica

De uma perspetiva histórica, para os vírus hepatotrópicos existem dois grandes grupos:
• O grupo dos infeciosos, devido a ter uma via de infeção entérica, composto pela
Hepatite A e E.
• O grupo das hepatites transmitidas pelo soro, cujas hepatites são a Hepatire B, C e D.
No principio pensava-se que a hepatite B era apenas transmitida pelo sangue, mas
verificou-se que esse não era o caso, podendo ser transmitida por outras secreções
secundárias.

Hepatite A
• 27 nm ARN- picorna vírus;
• Incubação de 4 semanas;
• Transmissão fecal-oral;
• ↑ Clínica com idade.

P á g i n a 68 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Geografia da Infeção por VHA

Pode haver transmissão por via sexual, caso haja relações sexuais anais. A maior parte dos casos
provém de África e India

Hepatite E:
• 32-34 nm ARN- Hepeviridae;
• 4 genotipos;
• Incubação de 6 semanas;
• Transmissão fecal-oral;
• >25% não ABC;

P á g i n a 69 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

• Fulminante na grávida (Diminuição da sua resistência??);


• Epidemias:
o Nova Delhi 1955;
o Ahmedaban, India 75-6;
o Pune, India 78;
o Kashmir 1980;
o Tashkent, 83.

Geografia da Infeção por VHE

A Maior parte dos casos provém de Africa ou do Médio Oriente.

P á g i n a 70 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Hepatite B:
• Hepadnavirus tipo 1;
• ADN;
• 8 genotipos (A-G):
o A prevalente na Europa e nos EUA;
o B e C na Ásia.

Concentração do VHB nos Vários Fluidos do Organismo:


• Alta: sangue, soro, exsudados, feridas
• Moderada: sémen, fluído vaginal, saliva
• Baixa: urina, fezes, suor, lágrimas, leite materno, LCR

Vias de Transmissão de Infeção por VHB:


• Sexual;
• Parentérica;
• Perinatal.

VHB – Prevalência:
• 350 milhões portadores crónicos
• Áreas Alta Prevalência ( ≥ 8%): 45% população global
o Risco infeção: 60%
o Recém-nascidos e crianças
• Áreas Moderada Prevalência ( 2-7%): 43% população global
o Risco infeção: 20-60%
o Todas as idades
• Áreas Baixa Prevalência ( < 2%): 12% população global
o Risco infeção: < 20%
o Adultos de risco

Geografia da Infeção por VHB

P á g i n a 71 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

A prevalência dos portadores é muito mais alta em África, Ásia, América do Sul e entre as tribos
indígenas do Norte do Canada / Alasca.

Evolução da Infeção por VHB de Acordo com a Idade

Pacientes infetados muito cedo na sua vida têm uma maior probabilidade de desenvolver uma
infeção crónica por VHB, enquanto que pacientes infetados já adultos, têm mais probabilidade
de desenvolver uma infeção sintomática (Aguda).

Incidência de Hepatite B Aguda

EUA Portugal

A vacinação teve um impacto na diminuição da prevalência da infeção por VHB.

P á g i n a 72 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Hepatite B: Antigénios e Anticorpos

Antigénios Anticorpos
Antigénio de superfície Anticorpo de superfície
(AgHBs) (AcHBs)
Antigénio do core
Anticorpo contra Antigénio do core
(AgHBc)
(AcHBc)
(Normalmente não exposto, é intracelular)
Antigénio “e” Anticorpo contra Anticorpo “e”
(AgHBe) (AcHBe)

O Anticorpo de Superfície (AcHBs) é o que confere imunidade contra o VHB.

Evolução dos Marcadores Serológicos na Hepatite B Aguda e Crónica

Exposição,
seguida de
incubação por
cerca de 8
semanas até
manifestar
sintomas. A
produção de
Anticorpo HBs
começa mais
tardiamente,
pela 32ª
semana.

Na hepatite
crónica, não
ocorre
produção de
Anticorpo HBs.
O título de
Antigénio HBs
mantêm-se
elevado
durante toda a
vida do
paciente.

P á g i n a 73 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Hepatite B: História Natural

Classificação:

Sem Infeção Infeção Crónica


Vacinado
Infeção Curada Aguda AgHBe + Ag HBe -
AgHBs - - - + + + + + + +
AcHBs - + + +/-
AgHBe - - - +/- + + + - - -
AcHBe - - - +/- - - - + + +
AcHBc - - + +/- + + + + + +
AcHBc-
- - - + - - - - - -
IgM
ADN- > <
- - - ++
VHB 2000 2000
1-2x >
ALT N N N ++ N >N N N
N 2xN

Terapêutica da Hepatite B
• Interferão α 2 / Peg INF α 2
o Taxa resposta 30-40%
o Mecanismo acção dependente da resposta imunitária do individuo
o Efeitos adversos
• Entecavir
o Terapêutica 1ª linha
o Mecanismo ação: guanosine analog inibitor of viral polymerase
• Tenofovir (TDF) / tenofovir alafenamid (TAF)
• Lamivudina (3TC)
• Adefovir
• Telbivudine
P á g i n a 74 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

In development: encapsidation inhibitors, entry inhibitors, TLR7 agonist and therapeutic vacines.

Prevenção da Hepatite B
• Vacina
o Crianças, adolescentes (não vacinados na infância);
o Adultos de grupos de risco;
o Esquema: 0-2-6 meses;
o Dosagem pediátrica: 10μg;
o Dosagem do adulto: 20μg;
o Títulos < 10 UI/ml ?
• Imunoglobulina
o RN e mãe Ag HBs+ (0.06ml/kg via IM);
o Contaminação acidental.

Hepatite D
• Co-infecção (VHB + VHD):
o Doença aguda mais grave;
o Hepatite fulminante 2-20%,
hepatite aguda que leva
rapidamente à falência do
fígado sendo necessário
transplante imediato;
o Infeção crónica VHB menos
frequente.
• Superinfecção (VHB crónica + VHD):
o Infeção crónica por VHD;
o DHC / cirrose mais frequente (70-80%).

A prevenção contra a Hepatite B é a melhor forma de prevenção contra a Hepatite D.

P á g i n a 75 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Hepatite C
• Hepacivírus da familia flavivírus;
• ARN;
• 6 genotípos + subtipos;

Hepatite C – Prevalência / Incidência:


• Prevalência global 3% / 150 milhões portadores crónicos;
• Portugal: Prevalência 1,4% / 10.000-140.000 infetados;
• VHC representa:
o 70% hepatites crónicas;
o 40% cirroses;
o 60% CHC;
o 30% Transplantes hepáticos.
• Incidência Infeção Sintomática: 1-3 casos / 100.000.

P á g i n a 76 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Prevalência da Hepatite C

Africa e Ásia têm grande prevalência de Hepatite C. Existe normalmente uma certa associação à
toxicodependência, devido a uma transmissão entre pessoas de produtos sanguíneos (partilha
de seringas contaminadas).

Vias de Transmissão:
• Sangue e seus derivados:
o Toxicofilia (drogas endovenosas);
o Sangue e derivados (até 1992);

P á g i n a 77 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

o Sexual?;
o Vertical;
o Horizontal (agregado familiar);
o 30-40% risco não identificado.

Números em Portugal
• Anos 90’ dadores de sangue: 0,8%;
• Prevalência estimada em : 1-1,5%;
• Estudo de 866 na MGF (Estudo E-COR, 2013): 0,12%;
• Em toxicodependentes estimado: 70 - 90%;
• Em toxicodependentes em geral: 30 – 50%;
• 200.000 consumidores problemáticos (→ 60-100.000 VHC).

Normalmente os sintomas aparecem entre 1 a 2 meses após exposição. A prevalência de


hepatite aguda é muito menor que na hepatite B.

P á g i n a 78 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Progressão da Doença: Hepatite C

Terapêutica da Infeção por VHC:


• Monoterapia com α IFN R: 15-25%
• Tx combinada com IFN peg α 2b + ribavirina R: 40-50% e >90% p/ 2/3
• Tx combinada com IFN peg α 2b + ribavirina + bocepravir/telepravir p/ 1
• Direct Acting Antivirals (DAA):
o NS3/4A protease inhibitor:
▪ Simepravir (1,4); paritaprevir (1,4); grazoprevir (1,3,4); glecaprevir(1-6);
voxilaprevir (1-6)
o NS5B polymerase inhibitors:
▪ Sofosbuvir (1-4); dasabuvir (1)
o NS5A inhibitors:
▪ Ombitasvir (1,4); pibrentrasvir (1-6); daclatasvir (3); elbasvir (1,4);
ledispavir (1); Ombitasvir (1); velpatasvir (1-6)

Ao contrário da Hepatite B, a Hepatite C é tratável e curável com DAA. Normalmente são


aplicados tratamentos de 8 semanas, exceto em pacientes com cirrose hepática que precisam
de um tratamento mais longo.

P á g i n a 79 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Características dos Vírus das Hepatites

VHA VHB VHC VHD VHE


15-45 30-180 15-160 30-180 14-60
Incubação
30 60-90 50 60-90 40
Agudo / Agudo /
Início Agudo Insidioso Agudo
Insidioso Insidioso
Crianças / Qualquer Qualquer
Idade Jovens Jovens
Jovens Idade Idade
Sangue / Sangue /
Transmissão Fecal - Oral Sangue Fecal - Oral
Sexual Sexual
Moderada /
Moderada / Severa /
Clínica Ligeira Fulminante / Ligeira
Crónica Crónica
Crónica
Portador Não 0.1-30% 1.5-3.2% Variável Não
HBIG /
Profilaxia IG / Vacina Não Vacina VHB Não
Vacina
INF
Terapia Não DAA INF Não
3TC / Adefovir

P á g i n a 80 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 12 – Zoonoses
Data Docente
17/11/2021 Drª. Carla Santos

Zoonoses são infeções ou doenças naturalmente transmissíveis entre animais vertebrados e o


homem.

A grande maioria das doenças


humanas são zoonoses (o desenho não
está à escala e o círculo branco devia
ser muito maior).

Algumas das zoonoses começaram a


adaptar-se ao ser humano, passando a
transmitir-se de homem para homem (ex: sarampo, gripe, HIV, …)

Epidemiologia
• 60-80% de todas as doenças são zoonóticas
• 75% das doenças emergentes são zoonóticas
• Zoonoses re-emergentes: brucelose, raiva, salmonelose, cistircercose e equinococose
• Novas epidemias: gripe A, SARS, gripe aviária, ébola, COVID-19

Os critérios de definição de uma zoonose implicam:


• Existência de um reservatório animal
• Transmissão ao homem por contacto direto, contacto com produtos de origem animal
ou através de um vetor (por vezes o vetor é também o reservatório)
• Síndrome infecioso específico (cada zoonose tem sintomas muito característicos, quase
patognomónicos).
• Surgem em áreas geográficas definidas com frequência variável ao longo do ano
• Definem-se indivíduos de maior risco (laboral por exemplo)

Os avanços científicos e a melhoria das condições de higiene permitiram o decréscimo de


algumas zoonoses nos países desenvolvidos.

Zoonoses em Portugal
• Febre escaro-nodular
• Brucelose
• Febre Q
• Leptospirose
• Equinococose
• Leishmaniose
• Doença de Lyme
• Neurocisticercose
• Malária (importada – não consegue fazer o ciclo completo em Portugal)
• Salmoneloses, Listeriose, ….

P á g i n a 81 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Febre escaro-nodular
Provocada pela bactéria Richecttsia conorii – gram negativo, com crescimento intracelular
obrigatório.

O reservatório e vetor é o artrópode Rhipicephalus sanguineus (carraça do cão). A infeção é


adquirida quando a carraça se alimenta de um vertebrado infetado e depois transmite ao
homem pela mordedura ou através do contacto dos seus fluidos corporais com a pele/mucosa
do homem. A carraça mais comum é a ninfa (mais difícil de detetar).

Somos um dos países que tem maior prevalência desta doença.

A sua transmissão é sazonal e está muito provavelmente relacionada com as alterações


climáticas ao longo do ano – o terceiro trimestre do ano (época estival/verão) está associada a
maior transmissibilidade.

Atividades do ser humano em meio rural e proximidade com o cão doméstico são fatores
predisponentes.

Fisiopatologia: ocorre multiplicação bacteriana no local de inoculação ao nível das células


endoteliais do vaso lesado, o que induz uma reação inflamatória peri-vascular responsável pela
formação da escara de inoculação (a carraça liberta um anestésico no local da mordedura para
que não sintamos); a partir daqui a bactéria infeciosa entra na circulação causando uma
vasculite sistémica que se propaga a todos os órgãos (pele, pulmão, coração, cérebro, rim,
fígado, etc).

O período de incubação (da mordedura à manifestação) é cerca de 7 dias.

O período prodrómico dura 3-7 dias (com sintomas como febre alta >39º, cefaleias,
mialgias, artralgias, prostração e alterações gastrointestinais).

O período de estado sucede o período prodrómico e caracteriza-se pelo aparecimento de


sintomas menos inespecíficos, nomeadamente o exantema maculo papular (semelhante a
umas borbulhinhas que atingem as palmas das mãos e plantas dos pés). Este exantema é
frequentemente difícil de visualizar, sendo identificado mais facilmente pela palpação (não é
comum o paciente queixar-se da presença das manchas porque muitas vezes nem repara). Neste
período procura-se sempre identificar a escara (lesão com crosta negra com 0.5-2 cm de
diâmetro e halo eritematoso). Normalmente a escara encontra-se em zonas mais escondidas e
quentes (zona axilar, atras das orelhas, região abdominal ao nível do cinto, entre os dedos dos
pés, etc).

Em Portugal as 2 estirpes mais frequentes são R. conorii Malish e R. conorii Israeli. Esta
última estirpe é mais recente e surgiu a partir da importação de carneiros que vieram de Israel.
É também mais virulenta e está associada a um quadro menos típico, pelo que passa
despercebida mais vezes, assumindo maior mortalidade: a escara produzida é menor, origina
um exantema menos nodular e mais urticariforme, dá mais sintomas gastrointestinais
(confundido frequentemente com gastroenterites).

Existem outras Richettsia em Portugal que não causam febre escaro-nodular, mas sim outros
quadros (não tao graves). A R. sibirica origina linfangite (inflamação localizada dos vasos
linfáticos) a par de outros sintomas tradicionais de infeção da pele. A importância da sua
identificação prende-se com a terapêutica, porque muitas vezes os sintomas são confundidos

P á g i n a 82 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

com infeções da pele causadas por agentes típicos onde os antibióticos usados não funcionam
aqui, acabando por arrastar a situação se não houver perspicácia na sua identificação. Ainda
assim, o quadro não tende a evoluir para casos fatais como acontece na febre escaro-nodular.
Existe ainda a R.slovaca que ataca sobretudo o couro cabeludo e manifesta-se pelo aumento
muito grande dos gânglios linfáticos do pescoço; é muitas vezes confundida com quadros graves
(como linfomas), sendo o diagnostico diferencial feito a partir da identificação da escara no
couro.

O diagnóstico da febre escaro-nodular envolve:


• Avaliação analítica (ocorre elevação dos parâmetros inflamatórios, ausência de
leucocitose, trombocitopenia ligeira, elevação das provas de função hepática e
insuficiência renal).
• Métodos serológicos (imunofluorescência direta)
• Métodos de biologia molecular (PCR do sangue, biopsia da lesão de exantema e da
escara de inoculação)

O tratamento é feito sobretudo com doxiciclina (é fotossensível, mas para este tipo de
doenças que se manifestam mais no verão é muito eficaz).

O pronóstico é favorável após a introdução de antibioterapia, sendo expectável o


desaparecimento dos sintomas 2-3 dias depois. A gravidade depende da existência de co-
morbilidades ou atraso no diagnostico e prescrição da antibioterapia adequada – pode ser fatal
e já se morreu muito em Portugal com febre escaro-nodular.

Brucelose

Esta doença tem distribuição mundial. É causada por Brucella spp. – cocobacilo gram
negativo, intracelular facultativo, não movel, não formador de esporos, aeróbio, com período
de incubação prolongado (como é intracelular facultativo, embora demore mais tempo, acaba
por crescer em meio cultural rico, ao contrário da Richettsia conorii que por ser um
microrganismo de crescimento intracelular obrigatório não é identificável por método cultural
tradicional).

Vias de transmissão não incluem vetor! A transmissão é feita pelo contacto acidental
com animais ou os seus produtos infetados (leite, urina, esperma, secreções genitais, líquido
amniótico, etc) através da via digestiva (facilitada pelo consumo de antiácidos para o estomago),
via cutânea-mucosa (mais associada a profissões de risco como pastores ou veterinários) ou via
P á g i n a 83 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

aérea. Pode existir contágio inter-humano (transfusões sanguíneas e contacto sexual) apesar de
ser muito raro.

A brucela é destruída pela fervura, pasteurização e acidez (pH<4), sendo resistente à


refrigeração e congelamento – a brucela mantém-se transmissível durante muitos dias.

A nível mundial, não somos o país com maior incidência de Brucelose, mas existem ainda
assim muitos casos.

Etiopatogenia: nos animais a brucelose é frequentemente subclínica; se for sintomática


distingue-se sobretudo a existência de infeção a nível genital (orquite e abortos) por ter
apetência para atuar em órgãos ricos em eritritol. O homem não é o hospedeiro natural de
nenhuma espécie de brucela.

Fisiopatologia: ocorre a penetração da barreira cutânea ou mucosa (digestiva,


respiratória ou conjuntiva) através dos vasos linfáticos, causando frequentemente adenite
satélite como foco primário. É ao nível dessa adenopatia que ocorre a multiplicação bacteriana
até se tornar sistémico através de septicémica linfática, afetando comummente os órgãos do
sistema reticulo-endotelial (principalmente medula) e causando granulomas (focos
secundários). É por isto que muitas vezes se faz mielograma para diagnóstico quando há suspeita
de brucelose. Por vezes esta infeção estende-se ao osso e torna-se uma infeção crónica.

Sendo uma doença sistémica apresenta um período de incubação grande (2-8 semanas)
e pode assumir diferentes formas de apresentação: aguda, subaguda, focal ou crónica (>12
meses de sintomas).

Na fase aguda existe uma tríade sintomática: febre + sudação + algias (febre sudoro
álgica). A febre pode ser continua, intermitente, irregular ou ondulante. A sudação é profusa e
assume um cheiro característico a palha podre/molhada. As algias manifestam-se sob a forma
de cefaleias ou dores musculares e articulações (reumatismo brucelósico).

A brucelose focal ataca comummente a coluna vertebral (45-55% dos casos, sobretudo
ao nível lombar e sacroilíaco). Estas focalizações osteoarticulares causam espondilite,
espondilodiscite, abcesso paravertebral, etc. Podem ainda focalizar ao nível do: sistema nervoso
(neurobrucelose) causando meningo-encefalite subguda; endocárdio, induzindo endocardite
brucélica (é raro e surge ao nível da válvula aórtica mais frequentemente); sistema
genital/urinário; sistema hepático (hepatite granulomatosa subclínica); ocular, etc

O diagnostico deve ser acompanhado por exames analíticos (leucócitos normais/baixos,


anemia, trombocitopenia, transaminases elevadas), culturais (sangue e medula) e serológicos
(são mais difíceis de interpretar).

O tratamento depende da combinação de antimicrobianos com boa penetração


intracelular, sendo bastante prolongado no tempo: doença aguda são ~6 semanas, focalizada 3-
6 meses. A combinação de eleição é rifampicina + doxaciclina.

A maioria das vezes resume-se a uma doença benigna com baixa mortalidade, mas
podem existir recaídas e pode induzir uma síndroma de fadiga crónica.

P á g i n a 84 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

A prevenção deve passar pela redução de consumo de produtos lácteos não


pasteurizados, educação de trabalhadores de risco sobre as medidas de segurança (uso de
máscaras, luvas) e pela vacinação animal/abate de animais infetados.

Febre Q

É uma zoonose de distribuição mundial (exceto na Nova Zelândia). É provocada por


bactérias da espécie Coxiella burnetii – gram negativo, de crescimento intracelular obrigatório,
tem diferenciação esporogénica (resiste à dissecação e calor, sendo os esporos transportados
pelo vento a distâncias consideráveis) e elevada infecciosidade (transmissão por partículas
aerossolizadas). É considerado um agente potencial de bioterrorismo, embora assuma baixa
mortalidade.

Os reservatórios são muitos (carraças, aves, mamíferos, etc). ainda assim, a principal
fonte de infeção para o homem são os mamíferos domésticos (gado bovido, ovino, caprino, caes
e gatos). Nos animais não causa doença, mas se estes ficarem infetados depois eliminam as
bactérias na urina, fezes e leite, podendo a partir daí infetar o homem.

A transmissão pode ocorrer via respiratória (é a principal via), digestiva (produtos


lácteos não pasteurizados) ou por contacto direto com animais infetados, os seus produtos ou
ambiente contaminado por estes. Existe uma tendência sazonal com preferência pelo final da
Primavera e início do Verão (época dos partos do gado).

Como não é uma doença muito mortal nem crónica, embora seja muito prevalente é
muito pouco notificada.

Fisiopatologia: ocorre infeção por via respiratória/digestiva e, por disseminação hematogénea,


acaba por atingir o sistema macrofagico-macrocitico (ocorre multiplicação no fagolisossoma) e
em alguns tecidos faz granulomas (lesões vasculares com inflamação, hemorragia e necrose) –
é uma doença granulomatosa como a tuberculose.

A nível clínico, embora exista variabilidade geográfica, é uma doença predominantemente


hepática ou pulmonar (quadro semelhante a hepatite ou pneumonia, respetivamente).

Diz-se que é uma doença febril


autolimitada porque acaba por
passar, ficando curada.
Assume caracteristicamente
tosse seca.

Existe o risco de o agente não


desaparecer se não for tratado,
causando endocardite.

Sintomas de febre Q aguda:


• Febre elevada (pode atingir 40ºC e durar até > 3 semanas), mas estranhamente é bem
tolerada.
• Calafrios, sudorese
• Cefaleias retrobulbar intensa
P á g i n a 85 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

• Artralgias e mialgias
• Astenia, cansaço
• Exantema cutâneo (excecional)
• Tosse seca e toracalgia
• Esplenomegalia

A avaliação analítica assume elevação dos parâmetros inflamatórios, ausência de


leucograma normal, trombocitopenia ligeira, elevação moderada das provas de função hepática.
A biopsia hepática pode revelar hepatite granulomatosa, com granulomas circulares
constituídos por um anel fibrinóide e espaço central lipídico (granuloma em forma de donut).
Contudo, isto só esta presente em <10% das biopsias nas formas agudas.

Se diagnosticarmos febre Q aguda, o tempo de tratamento pode estar dependente da


existência de comorbilidades (ex: se houver existência de patologia valvular o tempo de
tratamento pode ser aumentado para evitar o desenvolvimento de endocardites). De forma
geral o tratamento é feito com doxaciclina, ~3 semanas na febre Q aguda e pelo menos 18
meses na febre Q crónica, sendo aconselhada cirurgia valvular neste último caso.

Leptospirose

É uma zoonose provocada por espiroquetas do género Leptospira. Existem várias


espécies, mas a L. interrogans é a única patogénica para os seres humanos e animais. Por
exemplo, a L. biflexa é uma espécie saprófita muito comum, mas não patogénica. Existem muitos
subgrupos de L. interrogans, distribuídas diferencialmente a nível mundial. É sobretudo
endémica em áreas tropicais apos períodos de elevada precipitação (ex: Açores).

Os principais reservatórios são os roedores (sobretudo os ratos, transmitem pela urina).


As bactérias sobrevivem meses nos rins dos reservatórios e no meio ambiente podem sobreviver
semanas se existirem condições favoráveis (T 28-32ºC, pH neutro, etc).

A transmissão ao homem faz-se pelo contacto cutâneo-mucoso com o animal infetado


ou com as suas excreções (comum em esgotos, armazéns, etc). Transmite-se da mãe para o feto.

Fisiopatologia: ocorre penetração da barreira cutâneo-mucosa (mesmo se intacta, uma vez que
atravessa a pele) e, por disseminação hematogénea, adere às células endoteliais dos pequenos
vasos causando vasculite sistémica (rim, fígado, pulmões, musculo, etc); ocorre a produção de
anticorpos específicos que opsonizam as bactérias para serem fagocitadas e removidas da
P á g i n a 86 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

circulação. A doença grave tem por base o ataque destes anticorpos específicos ao próprio
organismo (autoimune).

É uma doença de gravidade variável: 90% é autolimitado e resolve-se; 10% é patologia


ictérica potencialmente fatal. O período de incubação é bastante variável.

Quadro clínico:

A primeira fase é muitas vezes


confundida com uma gripe e é
difícil de diagnosticar. Após esta
primeira fase a bactéria é
frequentemente eliminada na
totalidade (pode por vezes ser
identificada na urina)

A 2ª fase é de causa imune (sintomas causados por autoanticorpos produzidos durante a 1ª


fase), sendo caracterizada por doença grave (paciente fica muito amarelo devido à icterícia).

Ictericia muito exuberante é


tipicamente indicativo de Leptospirose.

Esta bactéria não aparece em


hemoculturas, mas por vezes
pode ser detetada na urina após
a 1ª fase.

P á g i n a 87 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

É de difícil tratamento por


antibioterapia.

P á g i n a 88 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 13 – Infeção por VIH


Data Docente
23/11/2021 Drª. Inês Leitão

Epidemiologia

Infeção por VIH - Infeção pelo vírus da imunodeficiência humana (retrovírus).

Dados da OMS:
• Globalmente, 37,7 milhões de pessoas vivem com infeção por VIH, das quais 2/3 vivem
na região africana e >1,5 milhões são crianças menores de 15 anos;
• 1,5 milhões correspondem a diagnósticos de novo em 2020 e 680.000 morreram de
doenças relacionadas com a infeção por VIH no mesmo ano;
• No total, 79,3 milhões de pessoas foram infetadas e 36,3 milhões morreram de doenças
relacionadas com o VIH desde o início da epidemia;
• Apenas 84% conhecem o seu status virológico, 73% estão sob terapêutica antirretroviral
e 66% apresentam supressão virológica.

Em Portugal, ainda fazemos o diagnóstico de VIH de forma muito tardia, daí a necessidade de
mais atenção ao rastreio para esta doença. Não esquecer que o VIH é uma doença de declaração
obrigatória.

Virologia
• Retrovírus;
• Envelope:
o Proteínas estruturais (p24 e p28);
o Bicamada fosfolipídica;
o Glicoproteínas.
• Núcleo com 2 cadeias simples de RNA:
o Transcriptase reversa;
o Integrase;
o Protease.

P á g i n a 89 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Afinidade para as células CD4+:


• Linfócitos T;
• Monócitos / Macrófagos;
• Células dendríticas.

Ciclo de vida:

Gp120: Ligação do vírus à célula do hospedeiro.

Gp41: Fusão da membrana celular do vírus com a da célula hospedeira.

Os co-recetores CCR5 ou CXCR4 são importantes para definir o tropismo do vírus, que tem
importância do ponto de vista da terapêutica. Alguns fármacos só são úteis para um dado
tropismo do vírus.
Estadios da Infeção
P á g i n a 90 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Vias de Transmissão:
• Relações sexuais não protegidas com parceiro infetado pelo VIH;
• Partilha de material de punção com parceiro infetado pelo VIH;
• Transmissão vertical da mãe infetada para o filho (durante o parto ou através da
amamentação);
• Menos frequente:
o Transfusão de sangue infetado;
o Contacto com sangue infetado em mucosa ou pele não íntegra (ferida /
mordedura)

Risco de Transmissão por Exposição

P á g i n a 91 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Modelo de Progressão da Infeção por VIH-1

Infeção Primária:
• Imediatamente após a transmissão;
• Caracterizada por:
o Carga viral elevada (elevada concentração de ARN VIH 1 em circulação no
sangue);
o Declínio da contagem de linfócitos T CD4+(em média de 1 000 cél. / uL antes da
transmissão).
• Inicialmente assintomática.

Síndrome Retrovírico Agudo:


• Surge 1 a 6 semanas após a exposição
de risco (pico de incidência às 3
semanas);
• Carga viral elevada e contagem de LT
CD4+ baixa;
• Apresentação com síndrome mono
nucleósido “like” em 1/2 2/3 dos
doentes;
• Resolução espontânea após 1 a 2
semanas;
• Cerca de 50 dos doentes são
assintomáticos;

Pelas manifestações relativamente inespecíficas, é necessário fazer diagnóstico diferencial com:


• Infeções por outros vírus (EBV, CMV, VHB/C, HSV);
• Toxoplasmose;
• Sífilis;
• Neoplasia hematológica.

P á g i n a 92 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Latência Clínica (Infeção Assintomática):


• Após o quadro de infeção aguda a maioria dos doentes mantém se assintomática
durante vários anos o sistema imunitário do hospedeiro desenvolve anticorpos que
contribuem para uma supressão da replicação viral e estabilização da carga viral (set-
point viral);
• Verifica se um declínio progressivo da contagem de LT CD4+(em média cerca de 50 a 75
células por ano);
• Em média após 8 a 10 anos de evolução constata se progressão para fase SIDA:
o Existem doentes com progressão mais rápida que desenvolvem clínica de SIDA
em menos de 5 anos (cerca de 20%);
o Uma percentagem inferior pode manter se assintomática e sem sinais de
imunodepressão por mais de 10 anos (< 5%).

P á g i n a 93 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Exceções:
• Long-term nonprogressors:
o Mantêm se assintomáticos sem terapêutica ou evidência de declínio imunitário
durante vários anos;
o Dois grupos:
▪ Doentes com carga viral detetável e manutenção de contagens de LT
CD4+ que conferem adequada proteção contra infeções oportunistas
(mas que acabam por decair gradualmente ao longo do tempo);
▪ Elite controllers - Pequeno subgrupo de doentes capazes de controlar a
replicação viral, mantêm carga virais indetetáveis e contagens de LT
CD4+ normais.

Progressão para Fase SIDA

Com a redução das contagens LT CD4+ e o aumento / manutenção da carga viral, os doentes
irão progredir para a fase SIDA.

Classificação CDC
• Clássica: Baseada na contagem de células T CD4 e sintomas (mais usada na prática
clínica):

Considera-se que os doentes estão em fase SIDA quando estão em qualquer estadio C, ou
quando têm menos de 200 células/µl.

• Modificada: Inclui também a percentagem de linfócitos T CD4 (mais do que o valor


absoluto de linfócitos T, a percentagem tem um papel importante na perceção de quais
os doentes em maior risco).

P á g i n a 94 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Classificação OMS
• Apenas baseada em critérios clínicos, foi desenvolvida para ser utilizada em países em
desenvolvimento, porque pode não haver acesso à contagem de linfócitos T CD4.

Apresentação Clínica – LT CD4+ > 500 cel/uL:


• Geralmente assintomáticos;
• Linfadenopatias generalizadas persistentes;
• Infeções herpéticas recorrentes;
• Psoríase;
• Foliculite eosinofílica;

Apresentação Clínica – LT CD4+ 200-499 cel/uL:

P á g i n a 95 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Apresentação Clínica – LT CD4+ < 200 cel/uL:


• Classificação em fase SIDA;
• Apresentação clínica com doenças oportunistas pela imunodepressão severa;
• Risco aumentado de determinadas neoplasias:
o Carcinoma invasivo do colo do útero nas mulheres;
o Carcinoma rectal ou anal nos homens.
• Distúrbios hematológicos (anemia, neutropenia, PTI) e leucemia / linfomas;
• Nefropatia associada ao VIH.

Doenças Definidoras de SIDA:


• São as doenças oportunistas que normalmente estão associadas a estes doentes;
• Variam de incidência consoante as doenças do doente: algumas surgem mais
inicialmente, e outras mais tardiamente.

SIDA em Fase Tardia:


• Doentes com contagens de LT CD4+ < 50 cél/uL (imunodeficiência severa);
• Risco aumentado de outras infeções oportunistas:
o Infeção disseminada por Mycobacterium avium complex;
o Leucoencefalopatia multifocal progressiva;
o Meningite criptocócica;
o Micoses disseminadas;
o Linfoma primário do SNC;
o Retinite por CMV;
o Wasting syndrome (perda ponderal, anorexia, sarcopénia, etc.).

P á g i n a 96 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Contagem de LT CD4+ à Apresentação de Infeções Oportunistas

Mortalidade em Fase SIDA:


• A sobrevida média de um doente após atingir uma contagem de LT CD4+ <200 cél/uL e
sem tratamento é de 38-40 meses;
• Após desenvolvimento de manifestações clínicas definidoras de SIDA esta baixa para 12-
18 meses;
• A presença de infeções oportunistas acarreta um aumento independente do risco de
morte.

Quando existe um diagnóstico atempado e intervenção terapêutica, o risco de infeção


oportunista e de morte associada ao VIH, diminui.

P á g i n a 97 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Com o advento da terapêutica,


conseguimos diminuir não só a
incidência das variadas doenças
oportunistas, mas também de
outras complicações associadas ao
VIH (inflamatórias, neoplásicas). No
entanto continuam a existir alguns
desafios, não só relacionadas com
outras comorbilidades do doente,
mas também com o vírus em si e
com a toxicidade da terapêutica.

Em resumo:
• Cerca de 1 6 semanas após a infeção primária (em média 3 semanas) 1/2 a 2/3 dos
doentes desenvolvem um síndrome mononucleósido “like” designado por síndrome
retrovírico agudo o qual dura 1 2 semanas;
• Após a infeção aguda segue se um período médio de 8-10 anos de latência clínica em
que os doentes se mantêm assintomáticos;
• A progressão da doença pode ser prevista pela carga viral e contagem de LT CD4+ no
baseline;
• Ao longo do tempo, a maioria dos doentes (excepto os non-progressors) vão apresentar
um declínio progressivo das contagens de células CD4+ acompanhado de aumento do
risco de desenvolvimento de sintomas;
• Quando estas contagens descem abaixo de 200 cél/uL ou quando existem
manifestações oportunistas definidoras considera se que o doente se apresenta em fase
SIDA;
• O risco de morte aumenta drasticamente quando se desenvolve sintomatologia
definidora.

P á g i n a 98 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Diagnóstico
• Demonstração da presença de anticorpos contra o VIH (testes indiretos) e/ou deteção
direta do vírus ou dos seus componentes (deteção do RNA viral por PCR ou deteção de
antigénios proteicos):
o Testes serológicos de 3ª ou 4ª Geração (Testes de 4ª Geração detetam para
além de anticorpos o antigénio p24);
o Teste confirmatório de diferenciação de anticorpos;
o Deteção e quantificação da carga de RNA viral;
o Genotipagem e teste de deteção de resistências.

• Contagem de linfócitos T CD4+ → Estadiamento e estratificação de gravidade da


imunodepressão;
• Rastreio de infeções oportunistas: Anamnese e exame Objetivo + Serologias e outros
MCD;
• HLA B57*01 → Valor preditor de reação de hipersensibilidade ao Abacavir.

A contagem de LT CD4+ e a carga viral do VIH devem ser reavaliadas de forma seriada a cada 3
meses se doente sem terapêutica ou com terapêutica recente e a cada 6 meses na fase de
manutenção com supressão virológica e recuperação imunitária.

Tratamento
• Terapêutica antirretroviral:
o Cura funcional supressão da replicação viral de forma a prevenir / reverter a
degradação do sistema imunitário e o desenvolvimento de infeções
oportunistas
o Revolução no prognóstico da infeção - Atualmente as pessoas que vivem com o
VIH têm uma esperança de vida semelhante à da população em geral
• De acordo com o estadiamento profilaxia primária, tratamento e/ou profilaxia
secundária de infeções oportunistas

Terapêutica Tripla (como a HAART): 2 NRTI (Nucleotide Reverse Transcriptase Inhibitors) +3º
Agente de outra classe.

Terapêutica Dupla em casos selecionados

Monoterapia, não é eficaz.

P á g i n a 99 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Objetivos da OMS para 2020 (Para 2030, 95% para todas as componentes):

P á g i n a 100 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Outras complicações

Síndrome Inflamatória de Reconstituição Imunitária – Algum grau de inflamação que pode


complicar a recuperação da imunidade por parte de alguns doentes, e desmascarar algumas
infeções oportunistas, quando o doente começa a recuperar o seu sistema imunitário

Outras complicações relacionadas com a Inflamação Crónica e os Efeitos Adversos da TARc:


• Alterações metabólicas;
• Doença hepática crónica;
• Alterações neurocognitivas /demência;
• Aumento do risco de eventos cardiovasculares;
• Doença renal crónica;
• Alterações do metabolismo ósseo;
• Lipodistrofia e Lifoatrofia.

Outras co-morbilidades frequentes:


• Outras doenças associadas: por exemplo, VHB e VHC;
• Outras terapêuticas concomitantes: por exemplo, antituberculosa.

Prevenção:
• Precauções universais;
• Rastreio universal e de grupos de risco;
• Profilaxia pré e pós exposição;
• TARc: “Treatment as Prevention”;
• Imunizações e Rastreio / Profilaxia de doenças associadas.

P á g i n a 101 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 14 – Infeções do SNC


Data Docente
23/11/2021 Dr. Robert Badura

O sistema nervoso central é responsável por coordenar os nossos movimentos,


pensamentos, sensações e reações. Qualquer infeção que atinja este sistema essencial à vida
pode ter consequências devastadoras.

O cérebro processa informações sensoriais, coordena respostas adequadas e acumula


memórias. Para tudo isto, é necessária cerca de 20% de toda a energia consumida no corpo,
pelo que o cérebro recebe cerca de 15% do output cardíaco. Para além disso, existe grande
dificuldade na recuperação perante determinadas lesões cerebrais, embora exista uma forte
capacidade de plasticidade.

Uma lesão central pode espelhar-se a nível periférico com sequelas para a vida.

Meningite

Resulta da inflamação das 3 membranas que revestem o encéfalo e a medula espinal


(duramater, aracnoide e piamater) e do líquido cefaloraquidiano. Este líquido é essencial para o
funcionamento cerebral.

Frequentemente estas infeções das meninges são acompanhadas por edema cerebral
extenso que leva à própria extensão do parênquima. Isto pode aumentar a pressão intracraniana
causando disfunção de algumas áreas cerebrais. Quando a infeção se estende ao parênquima
cerebral fala-se de meningoencefalite; caso a infeção se localize apenas ao nível do parênquima
sem envolvimento meníngeo, fala-se de encefalite (um agente muito típico é o vírus do herpes
que causa encefalite herpética e que afeta comummente o lobo temporal).

Cérebro com Cérebro


meningite normal

Outros exemplos de infeções do SNC são o empiema (pus numa cavidade natural do
encéfalo como os ventrículos), abcesso cerebral (pus numa cavidade recém-formada) ou
neurocistocercose (infeção por parasita)

As manifestações clínicas são diferentes conforme estejam afetadas as meninges, o


parênquima ou ambos.

P á g i n a 102 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

A meningite é uma doença grave e apesar da existência de antibioterapia, terapêutica


adjuvante e UCI, permanece uma elevada mortalidade e morbilidade – existe uma enorme
possibilidade de deixar sequelas para o resto da vida. Complicações da doença podem incluir
convulsões, hidrocefalia, abcesso cerebral ou AVC hemorrágico. O fator mais critico que
condiciona este panorama é o início atempado da antibioterapia.

Assim que exista suspeita de uma infeção do SNC, em particular de uma meningite, é
necessário iniciar imediatamente terapêutica antibiótica empírica com antibacterianos que
cubram a maior parte dos agentes que possam estar envolvidos. Antes de iniciar a terapêutica
empírica, colhe-se sangue e LCR para pesquisa de microrganismos e teste de suscetibilidade aos
antibióticos. A identificação do microrganismo e da sua suscetibilidade vai permitir uma terapia
antibiótica mais direcionada.

O controlo epidemiológico tem sido feito com recurso a vacinas, o que já permitiu
diminuir muito a incidência desta doença.

As principais causas de meningites são:

• Infeções – vírus, bactérias, fungos, amebas, protozoários, helmintas…


• Abuso de drogas ou medicamentos (metronidazol, carbapenemes…)
• Processos autoimunes (ex: sarcoidose, artrite reumatoide)
• Processos neoplásicos (meningite carcinomatosa, metastização…)
As infeções virais que causam meningite são muito mais frequentes nas crianças. As
infeções por fungos ou protozoários são muito raras.

A meningite
piogénica é uma
meningite bacteriana
clássica com várias
etiologias possíveis;

a meningite
tuberculosa é causada
por Micobacterium
tuberculosis.

Barreira hematoencefálica

Regula de forma seletiva a passagem de compostos, células e agentes infeciosos do


sangue para o cérebro. Limita as potenciais infeções no encéfalo, mas também dificulta o seu
tratamento ao limitar o acesso dos fármacos ao SNC.
P á g i n a 103 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

As artérias centrais e corticais são envolvidas por uma bainha de pia-máter até ao nível
pré-capilar, sendo que, a nível capilar, a barreira é composta por:

• Células endoteliais com tight junctions e sem fenestrações.


• Membrana basal
• Extensões de astrócitos perivasculares
• Espaço intercelular preenchido por líquido intersticial
• Pericitos, processos neuronais, etc.

• No caso da infeção por S. pneumoniae, a sialidase NanA vai promover a hidrolise de


ligações de resíduos siálicos terminais em oligossacáridos, glicoproteínas, glicolípidos
etc, contribuindo para a colonização da mucosa. Este processo vai estimular os
monócitos e aumentar a permeabilidade.
• Por sua vez, os Streptococcus do grupo B vão interagir com o glucosaminoglicano e com
a proteína C e assim promover a invasão da barreira hematoencefálica.
• Por último, a Neisseria meningitidis tem pili tipo IV que vai estar na origem de micro-
colónias na membrana basal das células endoteliais, estabelecendo também
interligações com CD47 e beta-adrenorrecetores. Após infeção, o hospedeiro vai ter
algumas defesas, tais como a opsonização, que pode ser inibida pela clivagem de IgA,
evitando a fagocitose dos agentes infeciosos, e ainda a ação do complemento, que pode
ser inibida pela cápsula polissacarídea.

Assim, as várias bactérias têm diferentes mecanismos para induzir o aumento da


permeabilidade da barreira hematoencefálica de forma a promoverem a sua entrada no SNC.

Como o SNC é um órgão privilegiado e com fraca vigilância imunológica, em particular a


imunidade humoral, estes microrganismos conseguem multiplicar-se no espaço meníngeo e
desencadeiam uma resposta imunitária, com a produção de citocinas inflamatórias e aumento
P á g i n a 104 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

do número de leucócitos no LCR. Contudo, esta resposta inflamatória pode também lesar as
células do SNC. Para além disto, há ainda um aumento do volume e da pressão do LCR que pode
condicionar lesão do SNC e situações de hidrocefalia obstrutiva, coma e morte.

As principais vias de infeção são:

• Via hematogénea de infeções à distância (primária ou secundária). Neste caso existe


uma infeção noutro local do organismo, por exemplo uma pneumonia, uma endocardite
ou um abcesso, que origina bacteriémia. Uma vez presentes na corrente sanguínea, os
microrganismos atravessam a barreira hemato-encefálica atingindo as meninges.
• Por contiguidade de infeções adjacentes às meninges (ex: faringite, sinusite, otite
média, nos nervos olfativos).
• Quebra da barreira hematoencefálica e entrada direta dos microrganismos que se
encontram nas regiões adjacentes como a pele (traumatismo craniano, cirurgia,
rinorráquia)

O quadro clínico da meningite assenta numa tríade clássica: febre, cefaleia e rigidez da
nuca.

Outros sintomas passam pela diminuição do nível de consciência (de sonolência a coma),
náusea, vómitos, fotofobia, convulsões etc.

Para além dos sintomas sugestivos de meningite, existem ainda alguns sinais clássicos
da meningite que, quando positivos, sugerem irritação meníngea e que podem ser pesquisados
para orientar o diagnóstico:

• Sinal de Brudzinski: positivo quando o doente se encontra deitado e após flexão passiva
do pescoço há também flexão espontânea das coxas e dos joelhos;
• Sinal de Kernig: positivo quando o doente está deitado com a coxa em flexão sobre o
abdómen e a tentativa de extensão passiva do joelho causa dor.
P á g i n a 105 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

• Também podem apresentar o espasmo opistótono de todo o corpo, o que leva a que as
pernas e a cabeça se dobrem para trás, tornando o corpo arqueado anteriormente.
Estes sinais encontram-se ausentes ou diminuídos em crianças, idosos, imunodeprimidos e
consoante diferentes estados de consciência. São bastante úteis para diagnóstico precoce de
meningite. No entanto, este nunca se baseia apenas neles devido à sua especificidade e
sensibilidade desconhecida e ao facto de se ter verificado que em diversos casos de meningite
confirmada estes não se observam.

Nas crianças o quadro é menos específico, com abaulamento da fontanela por


hipertensão intra-craniana, irritação e choro continuado. Aqui a rigidez da nuca só é
normalmente identificável a partir dos 4 meses. Pode ocorrer espasticipade (aumento do tónus
muscular) grave.

Em casos de internamento, a alteração do estado de consciência, convulsões e défices


neurológicos focais podem ocorrer.

Nota: a rigidez da nuca tem a particularidade de, nos idosos, poder induzir em erro o diagnóstico
uma vez que nesta classe etária ocorre uma rigidez generalizada das articulações da coluna
cervical (artroses) condicionando um falso positivo.

É possível avaliar indiretamente a pressão intracraniana através da aparência do globo


ocular – a existência de edema da papila é indicativa de hipertensão intracraniana.

À esquerda: fundo
ocular mais normal,
com vasos emergentes
facilmente visíveis; à
direita: fundo ocular
com edema papilar

Perante a observação da tríade de sintomas, deve iniciar-se logo a terapêutica empírica


como mencionado. Pode haver indicação para TAC antes da punção lombar no caso de
traumatismos cranianos, neoplasia do SNC, edema da papila, etc.

A indicação para internamento depende da depressão do estado de consciência


(sonolência exagerada ou coma), da existência de convulsões e défices neurológicos focais.

P á g i n a 106 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Punção lombar

Permite obter uma amostra do LCR para analise (exame microbiológico) e medição da
sua pressão. Não deve ser realizada perante indícios de aumento da pressão intracraniana,
infeção epidural ou se houver uma alteração grave da coagulação.

A punção lombar não é um exame inócuo que se realize em qualquer situação, podendo
ter efeitos secundários/complicações:

• Cefaleia é o mais frequente e pode ser mitigada com


hidratação adequada, para compensar o líquido
retirado, e com repouso (cerca de duas horas);
• Dor ou parestesias, se durante o exame se picar
acidentalmente um nervo da cauda equina;
• Hemorragia epidural ou medular;
• Traumatismo medular, se a punção for realizada a um
nível superior ao recomendado (não é habitual);
• Infeção do SNC, uma vez que, se não for feita
desinfeção adequada da pele, os microrganismos da
flora comensal têm uma via direta para o espaço
subaracnoideu através da agulha.
A PL pode ser realizada com o indivíduo deitado ou
sentado.

Mesmo antes de enviar a amostra para o laboratório é possível avaliar a aparência do LCR,
nomeadamente a cor e a turbidez, sendo esta uma fase importante na avaliação de um caso de
meningite. Em situações normais o liquor é límpido e incolor. Em situações patológicas, pode
apresentar certas alterações:

• LCR xantocrómico (cor amarela). Devido à icterícia (a bilirrubina em excesso), presença


de hemoglobina, ou concentração de proteínas aumentada-
• LCR rosa ou vermelho indica a presença de sangue sendo necessário perceber se o
liquor já continha sangue ou se inadvertidamente foi picado um vaso sanguíneo durante
a punção lombar (punção traumática).
• Liquor turvo indica aumento do número de glóbulos brancos. Habitualmente significa
meningite bacteriana piogénica, pelo que, se o quadro for muito sugestivo, não se
espera pelo resultado do exame citoquímico (que pode levar uma a duas horas) e inicia-
se terapêutica antibiótica.

Os testes laboratoriais de rotina incluem ainda a contagem total e diferencial de células


(glóbulos brancos e vermelhos) e a medição da concentração de glicose, lactatos e proteínas.

Os linfócitos surgem aumentados em situações de infeção viral e as células


polimorfonucleares (neutrófilos) nas infeções por bactérias.

P á g i n a 107 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

A glicose é medida no LCR e no sangue. Em situações normais a glicorráquia é cerca de 60%


da glicose. Verifica-se
frequentemente nas
infeções bacterianas, por
fungos e em algumas
infeções por Micobacterium
tuberculosis, uma descida
significativa da glicose que
se deve ao facto de esta ser
consumida pelos
microrganismos presentes
no LCR.

Os lactatos estão habitualmente aumentados nas infeções bacterianas e fúngicas, embora


não sejam avaliados em todos os hospitais.

As proteínas estão habitualmente aumentadas em infeções bacterianas (até 500 mg/dL),


mas também nas infeções virais (embora um pouco menos)

Tratamento

P á g i n a 108 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Neisseria meningitidis

É um microrganismo menos frequente devido à implementação e utilização de vacinas anti-


meningocócicas. Ainda assim tem-se associada à infeção por esta bactéria uma mortalidade de
3 a 13%. Tal como o pneumococcus é um agente que coloniza a naso-faringe, no entanto, a
meningite que resulta da infeção por este agente tem uma evolução muito mais rápida e está
associada ao desenvolvimento de petéquias ou lesões cutâneas purpúricas (resultado de
grandes hemorragias), pois este agente provoca vasculite (envolvimento dos vasos sanguíneos).
É facilmente detetada numa biópsia das lesões resultantes da infeção. Contudo, atualmente, o
diagnóstico por este método já é pouco realizado, sendo substituído por outros métodos como
a punção lombar.

Meningite Tuberculosa

É provocada por Micobacterium tuberculosis que pode atingir o SNC por via hematogénea
ou por contiguidade. Como a tuberculose é uma doença de evolução insidiosa que afeta
primariamente os pulmões, a via hematogénea surge normalmente a partir de um foco de
doença pulmonar.

Quanto ao quadro clínico, o que caracteriza a meningite tuberculosa são as sequelas


pulmonares, resultantes de infeções antigas por tuberculose, visíveis em RX. Tipicamente o
quadro clínico é também mais arrastado que o da meningite piogénica. Tal deve-se ao facto de,
nesta patologia, ao invés do doente ter logo febre e cefaleias durante 2 dias que fazem recorrer
rapidamente a unidades de saúde, existe um período prodrómico de cerca de 2 semanas
(período de tempo entre os primeiros sintomas da doença e o início dos sinais ou sintomas com
base nos quais o diagnóstico pode ser estabelecido) de febre, mal-estar, anorexia e
irritabilidade, sendo habitualmente sintomas referidos pelos familiares. Passadas estas duas
semanas, pode haver então evolução aguda, com um quadro grave de dor de cabeça, confusão
mental, agravamento da letargia e alteração do estado de consciência, evoluindo para deteção
de rigidez da nuca e coma.

Para além de mais arrastado, este quadro clínico caracteriza-se por uma maior reação
inflamatória e pode haver afeção de nervos cranianos, em particular dos nervos oculares. Pode
haver também envolvimento de artérias cerebrais com diminuição da chegada de oxigénio aos
locais, o que causa a isquemia de alguns locais do cérebro. Por fim, o doente pode evoluir para

P á g i n a 109 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

coma com hidrocefalia e hipertensão intracraniana mais frequentemente do que na meningite


piogénica.

A nível nacional, dados fornecidos pela Direção Geral de Saúde (DGS) mostram a sua
diminuição ao longo dos anos. Existem uma série de razões que justificam esta diminuição, de
salientar a introdução da vacina BCG que, não sendo a vacina ideal para o combate da
tuberculose (não consegue prevenir todas as infeções), consegue prevenir os casos mais graves
particularmente em crianças, no qual o número de casos registados era maior. É por isso que
esta vacina é recomendada ainda hoje no nosso país.

P á g i n a 110 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 15 - Antibióticos
Data Docente
23/11/2021 Dr. Ricardo Baptista

A infeção é das principais causas de admissão hospitalar. Foi verificado que 50% dos
doentes admitidos em UCI tinham infeção e que 38% dos doentes admitidos em UCI
apresentavam sépsis.

Antibiótico adequado e precoce diminui mortalidade nas infeções graves:


→ Janela de oportunidade
→ Reconhecimento e tratamento precoces de infeção
→ Seleção de antibiótico apropriado
→ Otimização farmococinética e farmacodinâmica
→ Redução de resistências

Um estudo de Kumar et al
verificou que quando um doente
tem sépsis que há uma forma
mensurável de que a cada hora
que passava de atraso após a 1ª
hora de antibiótico era
mensurável a diminuição da
sobrevida dos doentes.

Muitas vezes as prescrições são desadequadas:


- Opção terapêutica
- Dose
- Via de administração
- Ausência/ajuste ao microrganismo/deslocação
- Tempo

Principais erros/armadilhas
• Conceitos errados
Resistência ≠ patogenicidade
Espetro ≠ eficácia

• Expertise
Conhecer a bactéria/ conhecer a infeção/ conhecer o antibiótico

• Medo
Deixar o doente sem antibiótico

P á g i n a 111 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

• Antibiogramas indiscriminados
Antibiograma seletivo

• Guidelines
Adaptadas à da epidemiologia nacional

Multirresistência
Acontece devido à má prescrição.

Princípios da antibioterapia

A prescrição de antibiótico deve ser feita em situações de infeção bacteriana presumida


ou confirmada, de modo a reduzir significativamente a carga bacteriana, diminuir
potencialmente o estado inflamatório sistémico e evitar o risco de choque irreversível e
morte.

Os antibióticos podem ser bactericidas ou bacteriostáticos.


→ Bactericida: mata a bactéria, reduz a carga bacteriana
→ Bacteriostático: inibe o crescimento e reprodução da bactéria

TODOS OS ANTIBIÓTICOS NECESSITAM DO SISTEMA IMUNITÁRIO PARA ATUAR


APROPRIADAMENTE.

P á g i n a 112 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Checklist do Antibiótico
1. O doente tem uma infeção?
2. Gravidade da situação clínica?
3. Foco da infeção?
4. Microrganismos mais prováveis?
5. Fatores de risco para multirresistência?
6. Monoterapia vs Combinada?
7. PK/ PD?
8. Controlo cirúrgico de foco?
9. Posso “descalar” ou suspender?

SIRS – síndrome
inflamatório de
resposta
sistémica

Infeção é
diferente de
colonização.
Podemos ter
colonizações de
Candida spp. Em
produtos
respiratórios e urinários, presença de bactérias em urocultura em doente algaliado,
zaragatoa de úlcera cutânea.

Podemos ter
terapêutica
empírica ou
dirigida. A
terapêutica
empírica faz
sentido quando o
doente tem uma
infeção grave ou
uma condição
clínica mais débil,
como doentes
hemato-
oncológicos. É
usada quando não
há conhecimento do microrganismo responsável e seu perfil de sensibilidade:
a) Não existe vantagem clínica potencial na identificação do microrganismo
responsável (ex. amigdalite bacteriana)
b) Gravidade do quadro clínico e/ou particularidades do doente justificam
prescrição e antibiótico precocemente.
P á g i n a 113 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

A terapêutica dirigida é quando temos conhecimento do microrganismo responsável e


seu perfil de sensibilidade.

ANTIBIOTERAPIA EMPÍRICA – IMPORTANTE


1. Atraso após início da hipotensão → aumento mensurável da mortalidade
2. Estratégia não isolada, sobretudo em casos de infeção grave
3. Colheita de produtos microbiológicos
4. A antibioterapia precoce só demonstra benefício clínico em infeções graves
(choque, neutropenia febril, meningite bacteriana)

Confirmação do foco infecioso.

Comunidade → Guidelines/recomendações s
Nosocomial → Guidelines/recomendações, antibiótico prévio, exposição hospitalar,
colonização conhecida.

P á g i n a 114 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Os antibióticos nos últimos 6


meses são os fatores mais
importantes, pressão de
seleção.

Quanto mais
tempo estivermos
expostos ao
mesmo antibiótico
mais facilmente
ganhamos
resistências.

P á g i n a 115 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Na farmacodinâmica temos que ter em atenção os seguintes parâmetros:

Na farmacocinética:

Infeções têm que ser


controladas cirurgicamente, o
material deve estar bem
esterilizado.

P á g i n a 116 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Quanto mais tempo se dá de


antibiótico pior. É fundamental
isolamento microbiológico
fidedigno, melhoria clínica,
tolerabilidade, PK/PD favorável.

Classes de antibióticos

• B-lactâmicos;
• Aminoglicosídeos;
• Fluoroquinolonas;
• Macrólidos;
• Tetraciclinas;
• Glicopéptidos;
• Metronidazol;

B-LACTÂMICOS

P á g i n a 117 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Espectro de atividade:
• Espectro variável;
• Gram positivo e negativo;
• Anaeróbios;

Efeitos Adversos:
• Penicilina - Hipersensibilidade 0.4% to 10 %
o Moderada: Rash
o Grave: Anafilaxia & morte
• Reatividade cruzada entre Penicilinas
• Penicilinas e cefalosporinas ~5 15%

Mecanismos de Resistência:

• β-Lactamase;
• Outros mecanismos menos relevantes.

P á g i n a 118 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Importante:
• Β-Lactâmicos necessitam de doses frequentes para atingirem eficácia;
• Β-Lactâmicos são os mais seguros na insuficiência renal e hepática:
o Ajustes de dose podem ainda assim ser necessários na insuficiência
grave

Resumindo:
• Antibióticos de parede celular:
o Bactericida.
• Largo espectro:
o Antibióticos de eleição em muitas infeções;
o Limitações:
▪ Alergia;
▪ Resistência devido a β-lactamases.
• Muito seguro na maioria das situações:
o Geralmente não necessita de monitorização.

AMINOGLICOSÍDEOS

Mecanismo de Ação

P á g i n a 119 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Espetro de Atividade:
• Aerobios Gram Negativo:
o Enterobacteriaceae (E. coli, Proteus sp., Enterobacter sp. Pseudomonas
aeruginosa)
• Aerobios Gram Positivo (frequentemente em combinação com β-lactâmicos)
o S. aureus e staphylococci coagulase negativos
o Streptococci viridans
o Enterococcus sp. (gentamicina)

Efeitos Adversos:
• Nefrotoxicidade:
o Dano tubular - reversível se suspender;
o Factores de risco: Dose elevada, uso prolongado, disfunção renal prévia,
nefrotoxicos concomitantes, etc.
• Ototoxicidade
o Dano 8º par craniano - toxicidade vestibular e auditiva irreversível:
▪ Vestibular: tonturas, vertigem, ataxia;
▪ Auditiva: tinnitus, diminuição audição;
o Factores de risco: mesmo nefrotoxicidade.
• Paralisia neuromuscular:
o Pode ocorrer com rápidade infusão EV, sobretudo:
▪ Myasthenia gravis;
▪ Uso concomitante com succinilcolina durante anestesia;

Monitorizar toxicidade:
• Níveis séricos devem ser monitorizados para prevenir toxicicidade;
• Evitar em situações de risco de lesão renal:
o Desidratação;
o Fármacos nefrotoxicos concomitantes.

Mecanismosde resistência:
• Inativação por Aminoglycoside modifying enzymes:
o Mecanismo mais importante

Importante:
• Devem ser administradas doses elevadas únicas para boa eficácia:
o Doses pequenas múltiplas levam a falência terapêutica e risco de
toxicidade renal.
• São tóxicos e necessitam de monitorização:
o Evitar na insuficiência renal mas seguro na insuficiência hepática;
o Evitar uso concomintante de outros fármacos nefrotoxicos;
o Vigiar função renal.

Resumindo:
• Atividade em aeróbios restrita;
• Tóxico , necessita de doseamentos séricos;

P á g i n a 120 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

• Mais usado em infeções da corrente sanguínea por Gram Negativo;


• ITU;
• Limitado ou sem penetração no:
o Pulmão;
o Osso e articulações;
o LCR;
o Abcessos;

MACRÓLIDOS

Mecanismo de Ação:
• Bacteriostático;
• Inibe a RNA dependent protein synthesis:
o Liga reversivelmente ao RNA 23S ribosomal da subunidade 50S;
o Bloqueia a reação de translocação da elongação da cadeia de polipeptido.

Espectro de ação:
• Aeróbios Gram Positivo:
o Atividade: Claritromicina > Eritromicina > Azitromicina:
▪ MSSA;
▪ S. pneumoniae;
▪ Streptococci Beta haemolytic e Streptococci viridans.
• Aeróbios Gram Negativo:
o Atividade : Azitromicina > Claritromicina > Eritromicina;
o H. influenzae, M. catarrhalis, Neisseria;
o Sem atividade contra Enterobacteriaceae;
• Anaeróbios : via respiratória superior;
• Bactérias atípicas.

Mecanismos de Resistência:
• Alteração local de ligação:
o Metilação dos ribossomas prevenindo ligação do antibiótico.
• Resistência cruzada entre macrólidos:

Uso Clínico:
• PAC e Pneumonia atípica

P á g i n a 121 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

• Pele e tecidos moles


o S treptococci Beta haemolytic;
o Staphylococcus aureus.
• Microrganismos intracelulares
o Chlamydia
o Gonococcus

Resumindo:
• Bacteriostático;
• Eliminação hepática;
• Efeitos adversis GI (++ eritromicina):
o Nausea;
o Vómitos;
o Diarreia;
o Dispépsia.
• Pneumonia atípica;
• Excelente penetração celular e tecidular;

FLUOROQUINOLONAS

Mecanismo de Ação:
• Evita:
o Replicação de DNA;
o Recombinação de DNA;
o Reparação de DNA.

Espetro de Atividade:
• Gram positivo:
o Levofloxacina é mais ativo.
• Gram Negativo:
o Enterobacteriaceae, H. influenzae, Neisseria spp., Pseudomonas
aeruginosa
o Ciprofloxacina é mais ativo.
• Bactérias atípicas - execelente atividade

P á g i n a 122 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Resumindo:
• Largo espectro de atividade (Gram Positivo e Gram Negativo);
• Sepsis com partida intra abdominal e genito-urinária:
o Bacilos Gram negativo.
• ITU:
o E. coli.
• Excelente penetração tecidular
• Escelente biodisponibilidade oral
• Alto risco de C. difficile.

TETRACICLINAS:

Mecanismo de Ação:
• Bacteriostático;
• Inibe síntese proteica:
o Liga reversivelmente às subunidades ribossomais 30S;
o Previne síntese de polipeptídeo.

Espetro de Atividade:
• Todos com atividade e espectro semelhante - excepto Tigeciclina;
• Cocos Gram-positivo:
o Staphylococci;
o Streptococci.
• Aeróbios Gram-Negativo;
• Microrganismos atípicos:
o Mycoplasmas;
o Chlamydiae;
o Rickettsiae;
o Protozoa.
• Anaeróbios – Tigeciclina.

Efeitos Adversos:
• Ulceração esofágica;
• Fotosensibilidade;
• Fetos e crianças: Infiltração dentes e osso.
• Evitar em crianças e grávidas.

P á g i n a 123 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Resumindo:
• Excelente penetração tecidular;
• Sobretudo infeções de:
o Pele e tecido moles
o Chlamydia e outros intracelulares (zoonoses bacterianas)
o Bacilos GN MDR

GLICOPEPTÍDEOS

Mecanismo de acção:
• Inibe síntese de peptidoglicano na parede bacteriana:
o Impede a ligação cruzada de cadeias de peptidoglicanos;

Efeitos adversos:
• Vancomicina:
o Red Neck Syndrome;
o Toxicidade renal????;

Resumindo:
• Molécula de grandes dimensões;
• Apenas ativa em Gram positivo;
• 2ª linha em todas as indicações exceto:
o MRSA;
o E. faecium;
o C. difficile;
P á g i n a 124 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

METRONIDAZOL:

• Antibiótico;
• Amebicida;
• Anti protozoário:
o Trichomonas vaginalis.

Mecanismo de Ação:
• Inibição síntese de DNA;
• Degradação de DNA.

Espetro de Ação:
• Anaeróbios:
o Vaginose bacteriana;
o Doença inflamatória pélvica;
o Infeções intra abdominais;
o Colite por C. difficile.
• Etamoeba hystolitica;
• Trichominas vaginalis.

Efeitos adversos:
• Gastro intestinal;
• Estomatite; paladar “metálico”;
• Cefaleias, tonturas, epilepsia, ataxia.

Resumindo:
• Largo espectro de atividade;
• Anaeróbios;
• Geralmente em terapêutica combinada.

P á g i n a 125 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 16 – Resistência aos Antibióticos


Data Docente
23/11/2021 Drª. Carla Santos

O uso excessivo de antibióticos conduz a resistências.

Cada vez é mais difícil


criar uma classe nova de
antibióticos que não
tenham já alguma
resistência.

P á g i n a 126 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Os carbapenemos eram os
antibióticos que resolviam tudo, no
entanto agora já existem
resistências.

Causas da resistência a antibióticos:


• Prescrição a mais;
• Não fazerem o tratamento completo;
• Excesso de uso de antibióticos nos animais e plantas;
• Baixo controlo de infeções nos hospitais e clínicas;
• Falta de desinfeção, higiene e saneamento pobre;
• Falta de novos antibióticos a serem desenvolvidos.

Os continentes onde mais se prescrevem antibióticos são África e Ásia.

A gripe é muitas vezes


confundida com infeção
bacteriana.

P á g i n a 127 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

China é o país que mais antibióticos dão


aos animais.

Ao viajarmos para outros


países, se tivermos por
exemplo um episódio
diarreico, isso pode fazer
com que fiquemos
colonizados com
bactérias endémicas que
até são
multirresistentes.

P á g i n a 128 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Stewardship antimicrobiana – todas as estratégias que sejam aplicadas de modo a dar-


se melhor uso aos antibióticos.

P á g i n a 129 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

O espetro do antibiótico é
alargado quando a infeção é
muito grave.

P á g i n a 130 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Principais Erros / Armadilhas:


• Conceitos errados:
o Gravidade ≠ resistência; Largo espectro ≠
maior eficácia;
o Colonização ≠ infeção.
• Falta de conhecimento:
o Principais princípios na escolha da
antibioterapia;
• Medo:
o Nas infeções não graves, % aceitável de
falha = critério de qualidade.
• Antibiogramas indiscriminados:
o Antibiograma selectivo.
• Guidelines:
o Adaptadas à da epidemiologia nacional.

P á g i n a 131 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

P á g i n a 132 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 17 – Infeções Nosocomiais


Data Docente
25/11/2021 Drª. Carla Santos

Conceitos:

Nosocomium – Hospital

• Infeção que acontece 48 h após a admissão hospitalar ou durante o


internamento;
• Não estava presente no momento da admissão;
• Pode manifestar se após a alta;
• Pode afetar também os profissionais ou outras pessoas que contactem com o
hospital.

Um doente que tenha saído do hospital à pouco tempo pode ainda ter colonização de
agentes hospitalares.

P á g i n a 133 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

P á g i n a 134 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

P á g i n a 135 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

P á g i n a 136 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

A 1ª imagem corresponde a
um cateter periférico, a 2ª a
um cateter central, a 3ª é
uma linha arterial usado para
medir a tensão e a última é
usado em pessoas que fazem
diálise, são os cateteres
tunelizados (ajudam a reter
as bactérias).

P á g i n a 137 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Inserção do Cateter:
• Obrigatório usar barreiras de proteção máximas:
o Touca;
o Máscara;
o Bata esterilizada;
o Luvas esterilizadas;
o Campo cirúrgico esterilizado de grandes dimensões com orifício.

A azul os gram+ e a vermelho os


gram-.

P á g i n a 138 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Aula 18 – Medicina do Viajante


Data Docente
25/11/2021 Dr. Diogo Mendes Pedro

Hoje em dia é muito fácil deslocarmo-nos do lado ao outros do planete, principalmente


por via aérea, sendo esse também o maior meio de transmissão de doenças infeciosas. O
número de viajantes tens aumentado exponencialmente ao longo dos anos, tendo sido apenas
interrompido esse crescimento pela pandemia de Covid-19.

A medicina do viajante é uma área da medicina preocupada com a promoção da saúde


no contexto da viagem, não apenas relativamente a doenças infeciosas dos locais endémicas
dos locais visitados, mas também relacionada com outros aspetos da viagem que podem causar
distúrbio. É então uma disciplina preventiva multidisciplinar, a evoluir rapidamente,
extremamente dinâmica, que requer:

• Proficiência relativamente às várias doenças (e não só infeções!) relacionadas


com as viagens
• Conhecimento atualizado sobre a epidemiologia global de riscos infeciosos e
nãoinfeciosos, padrões de resistência aos antimicrobianos e regulamentações
sobre saúde e vacinação dos vários países
A maioria das viagens ocorre para a Europa em todos os âmbitos, seguido nas Ásia e
América. Existe sazonalidade, pelo que os riscos não são iguais ao longo do ano inteiro nem para
sítios diferentes. Nem todas as pessoas que viajam são turistas, havendo cada vez mais
migrantes, o que pode levar a ter mais em conta os cuidados de saúde.

Riscos associados às viagens: doenças infeciosas, riscos ambientais e alterações


climáticas, acidentes e lesões, sequelas psicológicas. Sendo o trauma a maior causa de morte e
a diarreia é o sintoma mais relatado na doença do viajante.

Arboviroses (Arthropod borne viroses) são infeções transmitidas por um vetor


artrópode: geograficamente definidas; quase todas zoonoses (o ser humano entra por acaso),
P á g i n a 139 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

exceto dengue e O’nyong-nyong, em que o ser humano é o principal hospedeiro vertebrado;


infeções agudas e virémias de curta duração, com espectro clínico variável, frequentemente a-
ou pouco sintomáticas, no entanto podem evoluir facilmente para situações graves. Existem
mais de 2000 descritas, das quais vamos dar ênfase a 5.

Febre Amarela: Flavivírus responsável por múltiplas epidemias ao longo da história

• Epidemia de Lisboa de 1857 terá sido a maior da Europa


• Surto em Luanda em 2016, 4188 casos notificados, 373 mortes
• Surto em Minas Gerais em 2017, 777 casos confirmados, 261 óbitos
A mais importante das febres hemorrágicas e a de maior potencial epidémico, com uma
mortalidade até 50%, existindo apenas terapêutica de suporte. Evidencia-se uma progressão da
doença bifásica. Apresenta um ciclo de vida silvático mediado sobretudo pelos mosquitos Aedes
africanus, Haemagogus e Sabethes (entre mosquitos e primatas), e um ciclo de vida urbano
mediado pelo Aedes aegypti. Transmissão transovárica, ou seja, o mosquito que tenha o vírus
vai pôr ovos infetados pelo vírus.

É uma doença mais prevalente em África, sendo o risco de doença, duma estadia de
duas semanas sem vacinação, é de 1/2000 e de morte é de 1/10000. Na américa do sul o risco
é dez vezes menores, no entanto a doença encontra-se nessa área também.

A prevenção é feita por vacinação, sendo esta uma das únicas vacinas alvo de regulação
internacional, ou seja, não é possível entrar ou sair dum sítio endémico sem essa vacina.
Consiste numa vacina viva atenuada de toma única vitalícia. É eficaz, barata e segura,
apresentando pouca contraindicações como doentes imunodeprimidos, situações de gravidez,
amamentação ou idades inferiores a 9 meses ou superiores a 60 anos.

Dengue: flavivírus, também tem um ciclo urbano e outro silvático (raro): Ciclo urbano
mediado pelo Aedes aegypti; Ciclo silvático com outros Aedes spp, incluindo Ae albopictus.
Também tem transmissão transovárica.

É uma doença predominantemente tropical, sendo mais frequente no sodueste Asiático,


na Índia, e África Ocidental.

Incidência anual ~5% → sintomas ~25% → dengue hemorrágico ~1-2% → morte 0,5-5%;
faz-se principalmente terapêutica de suporte.

Crianças em maior risco; época das chuvas, meio rural e carenciado: surto da Madeira
(2012/13, 2164 casos prováveis)

Vacina extremamente eficaz… em pessoas já com contacto contra pelo menos um dos
serotipos (serotipo 2 é o pior)! Aumenta risco de doença potencialmente fatal em seronegativo,
ou seja, em quem nunca tenha contactado com a doença.

Chikungunya: aphavírus, também tem um ciclo urbano e outro silvático, mediado por
Aedes spp: Ciclo urbano mediado pelo Aedes aegypti; Ciclo silvático com outros Aedes spp,
incluindo Ae albopictus. Também tem transmissão transovárica. Em grande expansão!

Clínica semelhante ao dengue, mas com artralgias extremamente intensas e 5-10%


sequelares. Mortalidade baixa, fazendo-se terapêutica de suporte. Não há vacina

Encefalite japonesa: Flavivírus, transmitido por mosquitos Culex spp. Reservatório em


aves selvagens ou domésticas, porcos (assintomático) e encefalite em cavalos. Predomínio rural
P á g i n a 140 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

(arrozais), quase erradicada pela vacinação universal no Japão, Coreia, Taiwan, a diminuir na
China e Malásia. Após incubação 4-14 dias com início súbito rápido e meningo-encefalite.
Mortalidade ~1/3 se não houver acesso a UCI (vs ~10% com UCI); sequelas 1/3 vs 20%. Vacina
inativada de células humanas, segura, globalmente eficaz, reações alérgicas, cara…

Zika: Flavivírus, transmite-se sobretudo pela picada do mosquito. Também em


transmissão vertical, transfusional/UDEV, e, mais raramente, sexual. Também tem um ciclo
urbano e outro silvático, mediado por Aedes Spp: ciclo urbano mediaod pelo Aedes aegypti; ciclo
silvático com outros Aedes Spp., incluindo Ae albopictus. Também tem transmissão trasovárica.
Febre exantemática, habitualmente sem complicações. Tratamento sintomático, não há vacina.
Evitar engravidar nos meses após possível primoinfeção, uma vez que existe risc de microcefalia!

Não engravidar no mês seguinte à vacina da febre amarela! Infeções sexualmente


transmissíveis extremamente prevalentes nos países tropicais → ter especial cuidado e usar
preservativo!

É uma doença principalmente tropical.

• 91 países endémicos; 212 milhões de casos


• 90% África SS; 7% SEA; 2% Mediterrâneo Este
• 4% Vivax; fora de África 41% PV
• 429,000 mortes
• 92% África SS (>>> P. falciparum), 70% crianças <5 anos
• PV 3100 mortes, 86% fora de África; 99% todas as mortes por PF
• Malária por PF, não tratada, invariavelmente evolui para morte
• Período de incubação habitual 7 a 30 dias, no entanto, existem alguns agentes
que podem provocar infeções secundárias muito depois.
• PF 94% antes dos 30 dias;
• 50% até aos 30 dias;
• PO 47% até aos 30 dias.
• Não esquecer os hipnozoítos

P á g i n a 141 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Diarreia do viajante: Resulta da ingestão de alimentos ou água contaminada (+


frequente). 1970 – 1985 fazia-se profilaxia em rotina (cotrimoxazol, doxiciclina). Desde 1985 que
a profilaxia não está rotineiramente recomendada. Tratamento de reserva com quinolonas,
macrólidos, rifamicinas.

A maior parte dos viajantes deve receber loperamida e um ATB para tratamento de
reserva. Se for para SEA deve ser azitromicina, para outras regiões, azitromicina,
fluoroquinolona ou rifaximina pode ser considerada. A rifaximina só deve ser usada na diarreia
leve ou moderada (2º ATB). Idealmente evitar fazer fármacos se possível (hidratação!) Se
sintomatologia não melhorar em 24-36h → Ajuda médica! Rifaximina ou bismuto como
profilaxia em viajantes de alto risco. Viajantes para locais endémicos com risco de colonização
por MO ESBL (+ SEA)

P á g i n a 142 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Devemos privilegiar terapêuticas de toma única.

Raiva: Doença conhecida há pelo menos 4000 anos. Responsável pela morte de > 60.000
pessoas por ano e ≈ 3,7 milhões de DALYs (disability-adjusted life years) perdidos cada ano; com
custo estimado de 8,6 milhares de milhões de dólares por ano. 40% dos casos são crianças < 15
anos. Predominantemente em países de baixo rendimento → A maioria dos casos ocorre em
África e Asia. 99% dos casos de raiva são por transmissão por cães, apesar de qualquer mamífero
ser suscetível da infeção pelo vírus; mais frequente em carnívoros. Pequena proporção de casos
por transmissão de animais selvagens (raposas, lobos, chacais, morcegos, guaxinis, doninhas e
mangustos)

P á g i n a 143 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Período de incubação: Habitualmente 2 a 3


meses. Pode variar entre 7 dias e 1 ano. Depende:
localização, extensão e profundidade da ferida
(categoria de exposição); localização da mordedura
no corpo – distância entre o local da ferida e o SNC;
a quantidade e a variante do vírus inoculado; o
tempo da profilaxia pós exposição.

Probabilidade de desenvolver raiva sem


profilaxia:

• Cabeça - 45%
• Membros superiores - 28%
• Tronco - 5%
• Membros inferiores - 5%

Altitude – a doença de altitude manifesta-se em fases diferentes, iniciando-se por


hipoxemia e podendo levar a edema pulmonar e cerebral. Fatores de risco são: a idade jovem
por terem maior massa cerebral. Surge acima do 2500m e piora com a o aumento da altitude.
Deve subir-se devagar e ir aclimatizando o corpo à altitude. O melhor tratamento é descer.

Profundidade – com o aumento da pressão pode ocorrer doença. Não se deve voar após
uma mergulho de profundidade, devido a risco de síndrome de descompressão.

Viagens aéreas – um avião circula normalmente entre os 8 e os 12km de altitude,


estando a cápsula pressurizada para aproximadamente cerca de 2500m de altitude. O ar
expande dentro das cavidades, podendo provocar dor. Existem viagens em que o avião aterra a
alturas superiores à pressurização, pelo que se deve ter cuidado.

Exposição solar: Exposição solar aumenta o risco de atipias cutâneas. Obrigatória a


utilização de protetor solar em todas as áreas expostas do corpo: pelo menos SPF 30 (ideal 50!);
bloquear UVA e UVB; resistente a água, idealmente. Hidratação, prevenir a desidratação!
Atenção à fotossensibilidade associada a alguns fármacos, p.ex. doxiciclina! Se indicação para
uso de repelente de insetos, o repelente fica SEMPRE por cima: aplicar em TODAS as áreas
expostas primeiro o protetor e depois o repelente (atenção sandálias/chinelos, decotes, saias,
vestidos, cavas… corpo todo?); se local sem mosquitos (p. ex. quarto de hotel) aplicar primeiro
protetor, aguardar ~15-30m, e só depois aplicar repelente → maximiza eficácia dos dois); re-
aplicar frequentemente (2/2-3/3h); rRe-aplicar repelente sempre que se re-aplicar protetor
solar (independentemente da “duração” do repelente).

Acidentes, lesões e venenos – deve ter-se a certeza de ter acesso a cuidados de saúde,
pelo que é importante ter um seguro de viagens.

Covid-19 – é obrigatório o certificado digital para viajar. Devem manter-se medidas de


prevenção na mesma.

P á g i n a 144 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

Alguns viajantes têm características diferentes, como grávidas, mulheres a amamentar,


crianças, imunosuprimridos…

Pode haver necessidade de adaptar vacinação…

• Pode fazer vacina febre amarela?


• É necessário acelerar esquema de vacinação?
Pode haver necessidade de adaptar a medicação prescrita, sobretudo antimaláricos

• Mefloquina mais estudado na gravidez, A/P provavelmente seguro


• Ensinar a ajustar medicação ao novo horário, p.ex. insulina
• Interações medicamentosas com imunossupressores em doentes
transplantados ou medicação antiVIH, p.ex.
Podem ser necessários documentos especiais

• P.ex. declaração de medicação crónica; declaração de CI para VFA


• Medicação crónica na mala de mão!
A logística pode ser complexa

• Contacto prévio com companhia aérea para ter certos devices no avião (p.ex.
O2 em doentes com DPOC; cadeiras de rodas)
• CI a aviação comercial (p.ex. após ICA 6s, após CABG 10d, após pneumotórax 2s,
EAM complicado >6s, mas após ACS não complicado só 3-10d)
• Arranjar centro de diálise no destino
Podem existir riscos adicionais

• Risco sexual particular em jovens e viagens de estudantes


• Risco infecioso do doente imunossuprimido; difícil decisão sobre vacinação
febre amarela
• Riscos na gravidez: hepatite E (15 a 25% mortalidade na gravidez!), Zika (maior
risco no 1ºT), complicações da gravidez e parto durante a viagem (não podem
viajar de avião a partir das 36s)
P á g i n a 145 | 146
Notas de Infeciologia – Tronco Comum II.a)

P á g i n a 146 | 146

Você também pode gostar