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MM.

JUÍZO DA ª VARA CÍVEL – COMARCA DE SÃO PAULO – TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO


ESTADO DE SÃO PAULO – TJSP

*Pedido de Gratuidade de Justiça


TUTELA DE URGÊNCIA CAUTELAR

NOME – “REQUERENTE/AUTOR”, brasileiro, solteiro, ---, inscrito no CPF sob nº ------------------,


RG nº ---------------, residente e domiciliado em
-------------------------------------------------------------------------------------- vem, por meio de seus
advogados, in fine assinados, com endereço profissional na
---------------------------------------------------------------------------------------------------------, onde
recebem intimações e notificações, constituídos na forma da procuração anexa (Doc. 01 -
Procuração), ajuizar

AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS (SUPERENDIVIDAMENTO)

Em face de BANCO INTER S.A, sociedade anônima aberta, inscrita no CNPJ sob o nº
00.416.968/0001-01, com endereço na Avenida Barbacena, nº 1219, Andar 13 ao 24,
Santo Agostinho, CEP 30190-131, Belo Horizonte/MG; BANCO BRADESCO S.A., pessoa
jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o nº 60.746.948/0001-12, com sede à
Cidade de Deus, S/N, Osasco, São Paulo, CEP 06029-900, sac@bradesco.com.br; BANCO
ALFA DE INVESTIMENTO S.A, sociedade anônima aberta, inscrita no CNPJ sob o nº
60.770.336/0001-65, com sede na Al. Santos, nº 466, 4º andar, Cerqueira Cesar, CEP
01.418-000, São Paulo/SP; BANCO BMG S.A., sociedade anônima aberta, inscrita no CNPJ
sob o nº61.186.680/0001-74, com sede na Av. Presidente Juscelino Kubitschek, nº 1830,
andar 9, 10, 14, sala 94, 101, 102, 103, 104, 141, bloco 01, 02, 03 e 04, CEP:04.543-900,
Vila
Nova Conceição, São Paulo/SP; BANCO MASTER S.A, inscrita no CNPJ sob o nº
33.923.798/0001-00, com sede em Praça Botafogo, nº 228, sala 1702, bairro Botafogo,
CEP 22.250-906, Rio de Janeiro/RJ; e BANCO DO BRASIL S.A, sociedade de economia
mista, inscrita no CNPJ sob o nº 00.000.000/0001-91, com sede em Q SAUN, Quadra 5,
Lote B, Torres I, II, e III, s/n, CEP 70040-912, Asa Norte, Brasília/DF, pelos fatos e
fundamentos a seguir delineados.

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I. PRELIMINARMENTE

I.A. DA GRATUIDADE DE JUSTIÇA

1. O AUTOR é militar, percebendo renda bruta mensal de R$


5.531,59 (cinco mil, quinhentos e trinta e um reais e cinquenta e nove centavos),
conforme observado em documento anexo (Doc. 05).

2. Não obstante, dessa remuneração incidem descontos que


integralizam défice de R$ 1.121,96 (mil, cento e vinte e um reais e noventa e seis
centavos), de modo que a renda líquida do AUTOR corresponde à R$ 4.409,63 (quatro mil,
quatrocentos e nove reais e sessenta e três centavos).

3. Apesar de não se tratar de remuneração ínfima para os


padrões brasileiros atuais, o REQUERENTE se vê submerso em dívidas, tendo o
superendividamento ocorrido em razão de contratos celebrados junto aos credores,
todos integrantes do polo passivo desta ação.

4. A soma dos encargos financeiros mensais referente aos


contratos firmados junto aos REQUERIDOS totaliza R$ 3.092,35 (três mil, noventa e dois
reais e trinta e cinco centavos), de maneira que, contabilizando todos os valores
mencionados com alguns dos gastos inerentes à rotina e sobrevivência do A UTOR,
chegamos ao seguinte demonstrativo:

Doc. 06
ANEXOS BANCO INTER - CONSIGNADO
REFERÊNCIA R$ 985,85
VALOR
Doc. 07 BANCO BRADESCO - CONSIGNADO R$ 8,65
Doc. 08 BANCO ALFA - CONSIGNADO R$ 152,50
Doc. 09 BANCO BMG – CARTÃO CONSIGNADO R$ 172,32
Doc. 10 PKL ONE – CARTÃO CONSIGNADO R$ 530,88
Doc. 11 BANCO DO BRASIL - RENEGOCIAÇÃO R$ 739,02
Doc. 12 BANCO DO BRASIL – CHEQUE ESPECIAL R$ 503,13
Doc. 13 ALUGUEL R$ 1.846,19
Doc. 14 ENERGIA ELÉTRICA R$ 272,46
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Doc. 15 GÁS R$ 53,36
Doc. 16 INTERNET + TELEFONIA R$ 272,55
Doc. 05 ASSISTÊNCIA MÉDICA R$ 89,39
TOTAL: R$ 5.626,30

5. Ou seja, para que não se comprometa com encargos


previdenciários, governamentais ou juros de mora, o A UTOR precisaria renunciar a R$
5.626,30 (cinco mil, seiscentos e vinte e seis reais e trinta centavos), equivalendo a MAIS
DE 127% DE SUA RENDA LÍQUIDA, gerando demasiado desequilíbrio a sua vida financeira.

6. Segundo o artigo 981 do Código de Processo Civil, a pessoa


que não possuir recursos para pleitear judicialmente seus Direitos, sem que prejudique a
sobrevivência de sua família, faz jus ao benefício da gratuidade de justiça. No mesmo
sentido estão dispostos os parágrafos 2º, 3º e 4º do artigo 992 do Código de Processo
Civil.

7. É evidente que, tendo encargos financeiros mensais


superiores a 127% de sua renda líquida, NÃO HÁ POSSIBILIDADE DE QUE O R EQUERENTE
ARQUE COM CUSTAS PROCESSUAIS EM UM PROCESSO CUJO VALOR DE CAUSA
CORRESPONDE À R$ 15.000,00 (quinze mil reais) sem abrir mão do mínimo necessário à
manutenção de sua sobrevivência, demais, o próprio objeto da ação é o
superendividamento.

8. Assim, nos termos da lei, acompanhando o pedido de


concessão da gratuidade de justiça, junta-se aos autos a declaração de hipossuficiência do

1
Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as
custas, as despesas processuais e honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da
lei.
2
Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na
petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.
§ 2º O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos
pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à
parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.
§ 3º Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural.
§ 4ºA assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça.
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AUTOR, com a expectativa de que seja deduzida a presunção de veracidade das alegações,
conforme determina a legislação processual (Doc. 04 – Declaração de hipossuficiência).

9. Diante de tais fatos, pleiteia-se o benefício da gratuidade de


justiça, assegurado pela Constituição Federal, no seu art. 5º, LXXIV e pelo Código de
Processo Civil, no Art. 98 e seguintes.

II. FATOS

10. O AUTOR é militar, percebendo renda bruta no valor de R$


5.531,59 (cinco mil, quinhentos e trinta e um reais e cinquenta e nove centavos)
mensais (Doc. 05).

11. No entanto, deste montante bruto incidem descontos


obrigatórios referentes a Imposto de renda, Proteção Social Militares, FEPOM e
APMDFESP, integralizando défice de R$ 1.121,96 (mil, cento e vinte e um reais e noventa
e seis centavos), de modo que a renda líquida do AUTOR é de R$ 4.409,63 (quatro mil,
quatrocentos e nove reais e sessenta e três centavos):

Doc. 05 Imposto de renda R$ 371,66


ANEXOS REFERÊNCIA DESCONTO
Doc. 05 Proteção Social Militares R$ 469,30
Doc. 05 FEPOM R$ 192,94
Doc. 05 APMDFESP R$ 88,06
TOTAL: R$ 1.121,96

12. Ademais, o REQUERENTE possui encargos financeiros mensais


oriundo de contratos celebrados junto aos R ÉUS, que, quando somados, correspondem ao
valor de R$ 3.092,35 (três mil, noventa e dois reais e trinta e cinco centavos),
demonstrativo in verbis:

ANEXOSNº CONTRATO REFERÊNCIA QTD PARCELA TOTAL


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1 Doc. 06 10879773 BANCO INTER - CONSIGNADO 75x R$ 985,85 R$ 73.938,75
2 Doc. 07 433517319 BANCO BRADESCO - CONSIGNADO 64x R$ 8,65 R$ 553,60
3 Doc. 08 570451137 BANCO ALFA - CONSIGNADO 84x R$ 152,50 R$ 12.810,00
4 Doc. 09 Final nº 5163 BANCO BMG – CARTÃO CONSIGNADO 19x R$ 172,32 R$ 3.274,08
5 Doc. 10 s/n PKL ONE – CARTÃO CONSIGNADO 15x R$ 530,88 R$ 7.963,20
6 Doc. 11 997600788 BANCO DO BRASIL - RENEGOCIAÇÃO 119x R$ 739,02 R$ 87.943,38
7 Doc. 12 s/n BANCO DO BRASIL – CHEQUE ESPECIAL 2x R$ 503,13 R$ 1.006,26
TOTAL: R$ 3.092,35 R$ 187.489,27

13. Ou seja, para que não se comprometa com encargos


previdenciários, governamentais ou juros de mora, o AUTOR precisaria renunciar a R$
3.092,35 (três mil, noventa e dois reais e trinta e cinco centavos), equivalendo a MAIS
DE 70% DE SUA RENDA LÍQUIDA, gerando demasiado desequilíbrio a sua vida financeira.

14. Logo, em razão dos fatos descritos, motivado pela


necessidade de regularização de sua situação financeira em busca de assegurar um
mínimo existencial para si, o REQUERENTE propõe a presente ação de repactuação de
dívidas.

III. DO DIREITO

III.A. DA APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – INVERSÃO DO


ÔNUS DA PROVA

15. O Código de Defesa do Consumidor, norma reguladora das


relações consumeristas, define a figura do consumidor como pessoa que adquire ou
utiliza produto como destinatário final (art. 2º).

16. Também estabelece o conceito de fornecedor como pessoa


que desenvolve atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação,
importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de
serviços (art. 3º).

17. No presente caso, conforme já exposto, o AUTOR é


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consumidor dos REQUERIDOS, tendo firmado contratos extremamente onerosos e se
encontrando atualmente em situação de superendividamento.

18. Soma-se a isso a hipossuficiência técnica do REQUERENTE e sua


hiper vulnerabilidade econômica, sendo evidente, portanto, tratar-se de relação
consumerista, o que exige a aplicação das normas dispostas no Código de Defesa do
Consumidor.

19. Em geral, vigora a regra prevista no Art. 373, I do Código de


Processo Civil, de modo que seria incumbido ao A UTOR, o ônus da prova quanto ao fato
constitutivo de seu direito.

20. Entretanto, o mesmo Art. 373, no §1º, determina que nos


casos previstos em lei ou diante de peculiaridades relacionadas à impossibilidade ou
excessiva dificuldade para obter as provas dos fatos, o juízo poderá atribuir o ônus da
prova de maneira diversa daquela determinada como uma das regras gerais da
processualística.

21. No presente caso, é imperiosa a inversão do ônus da prova


pelas duas razões, uma vez que I) é extremamente dificultoso para o REQUERENTE
estabelecer provas além daquelas documentalmente trazidas aos autos; II) o próprio
Código de Defesa do Consumidor, prevê a possibilidade de que seja invertido o encargo
probante, em razão da hipossuficiência do elo mais frágil da relação consumerista.

22. Por tais razões, requer-se que este d. juízo determine a


inversão do ônus das provas para àquelas evidências que só poderiam ser formuladas e
apresentadas pelos próprios RÉUS, ou aquelas que os REQUERIDOS tenham maior facilidade
em produzir, em especial: I) todos os instrumentos contratuais das dívidas que se
pretende repactuar existentes entre o AUTOR e os REQUERIDOS, contendo o número dos
contratos, a quantidade total de parcelas, e o valor das parcelas;; e II) a evolução
atualizada da dívida, informando quantas parcelas já foram adimplidas pelo A UTOR, de
modo a possibilitar a posterior confecção de Plano de Pagamento.

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III.B. DO SUPERENDIVIDAMENTO

23. A Lei do Superendividamento foi incorporada a CDC para


estabelecer normas que buscam a proteção do consumidor frente às abusividades
perpetradas indiscriminadamente por empresas e prestadores de serviços. Nessa esteira,
consignou o § 1º do Art. 54-A do CDC que:

§ 1º Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de


o consumidor pessoa natural, de boa-fé́, pagar a totalidade de suas
dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu
mínimo existencial, nos termos da regulamentação.

24. Este é exatamente o caso da Parte Autora, que se vê diante


da necessidade de propor a presente demanda judicial para repactuar suas obrigações e
conseguir viver com dignidade e com seu nome limpo, podendo retornar a participar do
mercado de consumo.

25. O AUTOR encontra-se em estado de insolvência, incapaz de


pagar suas dívidas, visto que, ao adimplir com as obrigações, sua subsistência estaria
prejudicada, impossibilitando-o de pagar por bens essenciais como comida, aluguel, água,
luz e telefone.

26. Mesmo recebendo rendimentos brutos no valor total de R$


5.531,59 (cinco mil, quinhentos e trinta e um reais e cinquenta e nove centavos), é de
clara compreensão que o REQUERENTE se encontra em situação de hiper vulnerabilidade, já
que, subtraindo de sua renda os descontos de Imposto de renda, Proteção Social
Militares, FEPOM e APMDFESP, (vide Doc. 05), sua renda líquida é de R$ 4.409,63 (quatro
mil, quatrocentos e nove reais e sessenta e três centavos), e o valor total de encargos
financeiros mensais referentes aos contratos celebrados junto aos REQUERIDOS totalizam
R$ 3.092,35 (três mil, noventa e dois reais e trinta e cinco centavos), de modo que a
dívida corresponde a MAIS DE 70% DE SUA RENDA LÍQUIDA, impossibilitando o AUTOR de
prover o mínimo existencial para si e sua família.

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27. Em específico, se está diante de uma situação de hiper
vulnerabilidade do REQUERENTE em face dos RÉUS. Conforme estipula o CDC em seu Art. 4º,
inciso I:

“Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o


atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua
dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos,
a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e
harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: “

I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de


consumo;”

28. Tal dispositivo tem de ser analisado em conjunto com o


inciso X incluídos pela Lei nº 14.181/2021, que trata sobre o superendividamento,
colocando a prevenção e tratamento deste mal como forma de inclusão social do
consumidor hipervulnerável, permitindo-o participar com dignidade do mercado de
consumo moderno: “Art. 4º [...] X - prevenção e tratamento do superendividamento como
forma de evitar a exclusão social do consumidor.”

29. Portanto, em face da vulnerabilidade de fato, o consumidor


merece a proteção jurídica da legislação, conforme inciso X do Art. 4º do Código de
Defesa do Consumidor. No caso, a Parte Autora preenche todos os requisitos para se
enquadrar na Lei do Superendividamento.

30. Diante da situação específica dos autos –


superendividamento e hipervulnerabilidade – qualquer infração aos ditames da boa-fé
objetiva e do estabelecido no ordenamento jurídico pátrio resultará na anulação dos
negócios jurídicos firmados.

31. O fundamento da ação, inclusive, possui cunho


constitucional, baseado num dos princípios fundamentais da ordem democrática,
presentes no Art. 1º, III da CF: “A República Federativa do Brasil, formada pela união
indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado
Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...] III - a dignidade da pessoa
humana”.
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Diante disso, a tutela pleiteada visa a proteção da dignidade do consumidor e visa
proteger o mínimo existencial da Parte Autora.

32. Ocorre que o superendividamento da Parte Autora não


permite a fruição plena destes direitos fundamentais que proporcionam a dignidade ao
cidadão, sendo que o que se pretende com a presente demanda é justamente preservar
esses direitos abrangidos pelo mínimo existencial, tais como alimentação, vestimenta,
manutenção da saúde, educação e despesas importantes como água e luz.

33. Nesse sentido é possível destacar a vasta jurisprudência dos


Tribunais Pátrios, que adotam o entendimento de que a limitação pretendida atende aos
referidos princípios, conforme se constata dos julgados abaixo:

“0021500-64.2016.8.19.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO DES. SERGIO


SEABRA VARELLA - Julgamento: 22/06/2016 -VIGÉSIMA QUARTA
CÂMARA
CÍVEL CONSUMIDOR. Agravo de instrumento. Relação de Consumo.
Limite máximo de desconto a título de empréstimo consignado na folha
de pagamento. Servidor público estadual. Policial militar. Decisão que
limitou os descontos em 30% da renda do agravado. Irresignação da
parte ré. Descontos relativos a mútuo bancário que não podem
ultrapassar o percentual de 30% da renda do servidor. Aplicável,
analogicamente, as súmulas 200 e 295 do TJRJ. Precedentes. Ainda que
se trate de servidor público estadual, os descontos devem ser limitados
ao patamar de 30% dos seus GANHOS LÍQUIDOS. Decreto Estadual
25.547/99. Inaplicabilidade. Prevalência dos preceitos constitucionais do
mínimo existencial, da dignidade da pessoa, da isonomia e da natureza
da verba alimentar da remuneração do servidor. NEGA-SE PROVIMENTO
AO RECURSO”.

“89166-29.2012.8.19.0001 - APELAÇÃO DES. JOAQUIM DOMINGOS DE


ALMEIDA NETO - Julgamento: 26/06/2014 - VIGÉSIMA QUARTA CÂMARA
CÍVEL CONSUMIDOR. Relação de consumo. Rito ordinário. Litisconsórcio
passivo facultativo. Contratos de mútuo consignado em folha de
pagamento. Pensionista de servidor federal militar.
Superendividamento. Absorção de 48% dos ganhos mensais. Pretensão
de restrição dos descontos ao patamar de 30% dos proventos líquidos.
Verba alimentar. Necessidade de garantia do mínimo existencial. Medida
Provisória no 2215- 10/2001, artigo 14, § 3o. Comprometimento de até
70% da remuneração. Tratamento desigual entre iguais. Reforma da
sentença de extinção do feito por ilegitimidade passiva ad causam.
Tratamento isonômico entre os consumidores contratantes de
empréstimo. Preceito constitucional. Limitação dos descontos em 30%
dos proventos líquidos do mutuário. Manutenção da sentença de
improcedência dos demais pedidos. Precedentes jurisprudenciais
deste Tribunal. RECURSO

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PARCIALMENTE PROVIDO. Assim sendo, é à luz dos princípios da
dignidade da pessoa humana e do mínimo existencial que os autores
requerem a suspensão das cobranças dos débitos referentes a
empréstimos contratados e cobrança de cartão de crédito por 06 (seis)
meses e, após o decurso do prazo, a limitação dos descontos no patamar
de 30 % (trinta por cento) de seus rendimentos líquidos”. (grifo nosso)

34. Portanto, o caso em tela enseja na hipótese que justifica a


excepcionalidade ao princípio do pacta sunt servanda, pois há valores maiores a serem
preservados, em especial o direito a uma vida digna.

35. Conforme já amplamente exposto no tópico dos fatos, está


mais do que evidente no caso em comento o A UTOR encontra-se em situação de hiper
vulnerabilidade.

36. É impossível a conservação de uma existência digna quando,


no caso em questão, a quantia líquida recebida é de R$ 4.409,63 (quatro mil,
quatrocentos e nove reais e sessenta e três centavos), e os encargos financeiros mensais
correspondem à R$ 3.092,35 (três mil, noventa e dois reais e trinta e cinco centavos).

37. À luz da dignidade da pessoa humana, o mínimo existencial


deve ser preservado, não sendo aceitável, num Estado Democrático de Direito, que
privilegia o bem-estar do cidadão em detrimento do poderio econômico das grandes
empresas, que o direito à vida digna padeça frente ao direito ao crédito.

38. Sendo assim, requer sejam os encargos mensais no tocante


aos débitos referentes aos contratos celebrados junto aos REQUERIDOS limitados à R$
1.543,37 (mil, quinhentos e quarenta e três reais e trinta e sete centavos), quantia
equivalente a 35% da remuneração líquida do A UTOR, nos moldes da Lei 14.181/21, e do
entendimento jurisprudencial colacionado no que diz respeito ao superendividamento.

IV. TUTELA DE URGÊNCIA CAUTELAR

39. Conforme consignado, o REQUERENTE não possui nenhuma


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condição de arcar com suas dívidas junto aos R ÉUS sem comprometer sua subsistência. Tal
circunstância coloca em risco inclusive sua dignidade, o que requer seja considerado por
esse MM. Juízo.

40. A tutela de urgência se destina a permitir a imediata prática


do direito alegado. Segundo Câmara, a respectiva modalidade de tutela de urgência é
“adequada em casos nos quais se afigure presente uma situação de perigo iminente para
o próprio direito substancial [...] em caso no qual a demora do processo pode acarretar
grave dano à própria subsistência do demandante”3, ou seja, é uma resposta jurisdicional
que se destina a satisfação provisória da pretensão.

41. Ao teor do Art. 300 do Código de Processo Civil, a tutela de


urgência cautelar será concedida quando houver elementos que evidenciem a
probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

42. Explica-se: o REQUERENTE percebe renda líquida mensal de R$


4.409,63 (quatro mil, quatrocentos e nove reais e sessenta e três centavos), quando
subtraídos os descontos obrigatórios de Imposto de renda, Proteção Social Militares,
FEPOM e APMDFESP (vide - Doc. 05):

Doc. 05 Imposto de renda R$ 371,66


ANEXOS REFERÊNCIA DESCONTO
Doc. 05 Proteção Social Militares R$ 469,30
Doc. 05 FEPOM R$ 192,94
Doc. 05 APMDFESP R$ 88,06
TOTAL: R$ 1.121,96

43. No entanto, a soma dos encargos financeiros mensais dos


contratos realizados junto aos REQUERIDOS totaliza R$ 3.092,35 (três mil, noventa e dois

3
CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2017. p. 162.
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reais e trinta e cinco centavos), senão vejamos:

ANEXOSNº CONTRATO REFERÊNCIA QTD PARCELA TOTAL


1 Doc. 0610879773 BANCO INTER - CONSIGNADO75x R$ 985,85 R$ 73.938,75
2 Doc. 07433517319 BANCO BRADESCO - CONSIGNADO64x R$ 8,65 BANCO ALFA - CONSIGNADOR$84x
553,60R$ 152,50
3 Doc. 08570451137 BANCO BMG – CARTÃO CONSIGNADO 19x R$ 172,32 PKL ONE –R$CARTÃO
12.810,00
CONSIGNADO15x R$ 5
4 Doc. 09Final nº 5163 BANCO DO BRASIL – CHEQUE ESPECIAL2x R$ 503,13 R$ 3.274,08
5 Doc. 10s/n
R$ 7.963,20
6 Doc. 11997600788
7 Doc. 12s/n R$ 87.943,38
R$ 1.006,26

TOTAL:R$ 3.092,35R$ 187.489,27

44. O perigo de dano é evidente quando observado que os


encargos financeiros mensais do AUTOR, correspondem à MAIS DE 70% DE SUA RENDA
LÍQUIDA, quando considerados os descontos obrigatórios.

45. Insta também ressaltar que não há perigo de


irreversibilidade, conforme Art. 300, §3º do CPC, já que se trata unicamente de objetos de
natureza pecuniária. Ainda assim, destaca-se que, conforme Enunciado 419 do Fórum
permanente de Processualistas Civis, a referida regra não seria absoluta:

FPPC, enunciado 419: Não é absoluta a regra que proíbe a tutela provisória
com efeitos irreversíveis.

46. Há então necessidade de que o presente juízo analise


especificamente o caso concreto discutido para que compreenda as exceções da tutela
pretendida.

47. A Parte Autora não se nega a pagar o que deve, pelo


contrário, busca repactuar suas obrigações de forma a ser possível adimpli-las, o que é
feito com base na norma presente no CDC, introduzidas pela Lei 14.181/2021.

48. Seguindo esse raciocínio, é clara a compreensão de que R$


3.092,35 (três mil, noventa e dois reais e trinta e cinco centavos) não é quantia
suscetível
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de gerar dano a nenhum aos RÉUS, mas corresponde a MAIS DE 70% DA RENDA LÍQUIDA
do AUTOR, sendo um encargo financeiro fatal ante a manutenção de seu sustento.

49. Quanto a probabilidade do direito, temos que a Lei do


Superendividamento foi incorporada ao CDC para estabelecer normas que buscam a
proteção do consumidor, conforme disposto no Art. 54-A, §1º:

§ 1º Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de


o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas
dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu
mínimo existencial, nos termos da regulamentação.

50. Este é exatamente o caso do REQUERENTE, que se vê diante da


necessidade de propor a presente demanda judicial para repactuar suas obrigações e
conseguir viver com dignidade e com seu nome limpo, podendo retornar a participar do
mercado de consumo.

51. Em específico, se está diante de uma situação de hiper


vulnerabilidade do AUTOR em face dos RÉUS. Conforme estipula o CDC em seu Art. 4º,
inciso I:

“Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o


atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua
dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos,
a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e
harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: “

I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de


consumo;”

52. A isso se acresce os incisos IX e X incluídos pela Lei


14.181/2021, que trata sobre o superendividamento:

“IX - fomento de ações direcionadas à educação financeira e ambiental


dos consumidores;
X - prevenção e tratamento do superendividamento como forma de
evitar a exclusão social do consumidor.”

53. Portanto, em face da vulnerabilidade de fato, o consumidor


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merece a proteção jurídica da legislação. No caso, o REQUERENTE preenche todos os
requisitos para se enquadrar na lei do superendividamento.

54. O superendividamento impede que o A UTOR possa fruir de


direitos fundamentais básicos como a proteção de um mínimo existencial.

55. Nesse sentido, cumpre ressaltar que os Tribunais Pátrios têm


concedido medidas de urgência semelhantes, sendo inequívoco o Direito pleiteado. Nesse
sentido:

Agravo de Instrumento. Decisão que deferiu o pedido de tutela


provisória de urgência, para o fim de determinar que os réus se
abstivessem de efetuar na conta corrente do autor, descontos em
valores superiores a 30% (trinta por cento) dos seus vencimentos
líquidos, sob pena de multa mensal correspondente ao dobro de cada
desconto indevido. Inconformismo de um dos réus. A fixação do
percentual em 30% (trinta por cento) dos rendimentos do agravado, a
fim de limitar os referidos descontos, evitando o comprometimento da
sua própria subsistência, é medida que se revela em harmonia com os
princípios do mínimo existencial e da dignidade humana. Inteligência que
se extrai da Súmula 295 deste Egrégio Tribunal de Justiça. In casu, as
provas trazidas aos autos foram suficientes para convencer o magistrado
a quo da verossimilhança das alegações formuladas pelo demandante,
correto se revela o deferimento da medida pleiteada. Trata-se de ato
judicial que não é teratológico nem contrário à lei ou à evidente prova
dos autos. Manutenção do decisum que se impõe, na forma da Súmula
59 desta Corte de Justiça. Recurso a que se nega provimento, nos termos
do artigo 932, inciso IV, alínea a, do Código de Processo Civil. AGRAVO
DE INSTRUMENTO N.o 0019933-61.2017.8.19.0000

“0021500-64.2016.8.19.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO DES. SERGIO


SEABRA VARELLA - Julgamento: 22/06/2016 -VIGÉSIMA QUARTA
CÂMARA
CÍVEL CONSUMIDOR. Agravo de instrumento. Relação de Consumo.
Limite máximo de desconto a título de empréstimo consignado na folha
de pagamento. Servidor público estadual. Policial militar. Decisão que
limitou os descontos em 30% da renda do agravado. Irresignação da
parte ré. Descontos relativos a mútuo bancário que não podem
ultrapassar o percentual de 30% da renda do servidor. Aplicável,
analogicamente, as súmulas 200 e 295 do TJRJ. Precedentes. Ainda que
se trate de servidor público estadual, os descontos devem ser limitados
ao patamar de 30% dos seus GANHOS LÍQUIDOS. Decreto Estadual
25.547/99. Inaplicabilidade. Prevalência dos preceitos constitucionais do
mínimo existencial, da dignidade da pessoa, da isonomia e da natureza
da verba alimentar da remuneração do servidor. NEGA-SE PROVIMENTO
AO RECURSO”.

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“89166-29.2012.8.19.0001 - APELAÇÃO DES. JOAQUIM DOMINGOS DE
ALMEIDA NETO - Julgamento: 26/06/2014 - VIGÉSIMA QUARTA CÂMARA
CÍVEL CONSUMIDOR. Relação de consumo. Rito ordinário. Litisconsórcio
passivo facultativo. Contratos de mútuo consignado em folha de
pagamento. Pensionista de servidor federal militar.
Superendividamento. Absorção de 48% dos ganhos mensais. Pretensão
de restrição dos descontos ao patamar de 30% dos proventos líquidos.
Verba alimentar. Necessidade de garantia do mínimo existencial. Medida
Provisória no 2215- 10/2001, artigo 14, § 3o. Comprometimento de até
70% da remuneração. Tratamento desigual entre iguais. Reforma da
sentença de extinção do feito por ilegitimidade passiva ad causam.
Tratamento isonômico entre os consumidores contratantes de
empréstimo. Preceito constitucional. Limitação dos descontos em 30%
dos proventos líquidos do mutuário. Manutenção da sentença de
improcedência dos demais pedidos. Precedentes jurisprudenciais deste
Tribunal. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Assim sendo, é à luz dos
princípios da dignidade da pessoa humana e do mínimo existencial que
os autores requerem a suspensão das cobranças dos débitos referentes
a empréstimos contratados e cobrança de cartão de crédito por 06 (seis)
meses e, após o decurso do prazo, a limitação dos descontos no patamar
de 30 % (trinta por cento) de seus rendimentos líquidos”. (grifo nosso)

56. Sendo assim, resta caracterizada a probabilidade do direito,


assim como o perigo de dano, uma vez que qualquer demora colocará o AUTOR em
situação totalmente insustentável.

57. Sendo assim, estão presentes os requisitos para que seja


deferida a antecipação parcial dos efeitos da tutela, para que o R EQUERENTE seja
autorizado a depositar em juízo o montante de R$ 1.543,37 (mil, quinhentos e quarenta
e três reais e trinta e sete centavos) mensais – equivalente a 35% de sua renda líquida
mensal.

58. Assim como determinar a suspensão da exigibilidade dos


demais valores devidos, ao menos até a realização da audiência de conciliação prevista no
artigo 104-A do CDC e, como efeito da tutela provisória, requer seja determinado aos
demandados que se abstenham de incluir o nome da parte autora em cadastros de
restrição de crédito, tais como SERASA, SPC e afins.

V. PEDIDOS

Ante o exposto, requer-se:

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a. Pugna que todas as publicações pertinentes ao presente feito sejam realizadas, tão
somente, em nome do advogado PEDRO HENRIQUE PANDOLFI SEIXAS, inscrito
perante a OAB/ES sob o n. 33.242; OAB/DF sob o n. 74.014; OAB/MG 219.842 e
OAB/RJ 251.757, sob pena de nulidade, nos termos do art. 272, §5º, do CPC;

b. a concessão do benefício da gratuidade de justiça, nos termos do Art. 98 e


seguintes do CPC;

c. seja deferida a tutela de urgência, em caráter inaudita altera pars, para:

i. seja a Parte Autora autorizada a depositar em juízo o montante de R$


1.543,37 (mil, quinhentos e quarenta e três reais e trinta e sete
centavos) – equivalente a 35% de sua renda líquida mensal e seja
determinada a suspensão da exigibilidade dos demais valores
devidos, ao menos até a realização da audiência de conciliação
prevista no artigo 104-A do CDC;

ii. que os REQUERIDOS se abstenham de incluir o nome da parte autora


em cadastros de restrição de crédito pelas dívidas aqui discutidas,
sob pena de multa diária a ser arbitrada por este d. juízo;

d. seja aplicada a inversão do ônus da prova, em atenção aos Arts. 6º, VII e 14, §3º, do
Código de Defesa do Consumidor para àquelas evidências que só poderiam ser
formuladas e apresentadas pelos próprios RÉUS, ou aquelas que os REQUERIDOS
tenham maior facilidade em produzir, em especial:

i. todos os instrumentos contratuais das dívidas


que se pretende repactuar, contendo o número
dos contratos, a quantidade total de parcelas, e
o valor das parcelas; e

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ii. a evolução atualizada da dívida, informando
quantas parcelas já foram adimplidas pelo
AUTOR, de modo a possibilitar a posterior
confecção de Plano de Pagamento

e. em especial, para que os REQUERIDOS juntem toda a documentação referentes às


dívidas do AUTOR, em até 15 (quinze) dias antes da realização de audiência de
conciliação;

f. a citação e intimação dos REQUERIDOS para comparecer à audiência de conciliação


prevista no artigo 104-A do CDC;

g. na hipótese de acordo parcial ou inexistência de acordo, desde logo requer seja


ordenado o prosseguimento do feito, com a sua conversão em “processo por
superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das
dívidas” conforme expressamente previsto no artigo 104-B do CDC;

h. requer ainda a revisão dos contratos firmados entre as partes para ajustar os juros
remuneratórios à taxa média de mercado apurada pelo Banco Central, de forma
que os juros viabilizem o pagamento pela parte autora, respeitando os ditames
constitucionais citados, dentre eles o da dignidade da pessoa humana;

i. a condenação dos REQUERIDOS ao pagamento de honorários advocatícios, no importe


de 20% (vinte por cento) do proveito econômico obtido em razão da causa;

j. que sejam admitidos todos os meios de provas cabíveis para o deslinde da presente
tutela jurisdicional;

Dá-se à causa, o valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais).

Nestes termos,
Pede deferimento.

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