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HISTÓRIA DA IGREJA - I

A Igreja Apostólica e o Início do Cristianismo

A IGREJA
IMPERIAL
E AS MAIORES
MUDANÇAS
Aula 8

A GRANDE TRANSIÇÃO
No início do IV século a igreja entrou em uma fase totalmente nova:
a fase da igreja imperial. Essa grande transição aconteceu através
do apoio do imperador Constantino ao cristianismo. Constantino
foi o primeiro imperador romano a professar o cristianismo, na se-
quência da sua vitória sobre Maxêncio, na Batalha da Ponte Mílvia,
perto de Roma em 312. Ele atribuiu sua vitória ao Deus cristão, pois
na noite anterior à batalha sonhou com uma cruz, formada pelas
duas primeiras letras do nome de Cristo em grego e
ouviu em latim: “In hoc signo vinces”, que significa “Com este sinal
vencerás”. De manhã, um pouco antes da batalha, mandou que
pintassem uma cruz nos escudos dos soldados e conseguiu uma
vitória esmagadora sobre o inimigo. Pouco tempo depois de sua
vitória, em 313, Constantino promulgou o famoso Edito de Milão.
Este foi um documento proclamatório no qual se determinou que
o Império Romano seria neutro em relação ao credo religioso,
acabando oficialmente com toda perseguição sancionada

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oficialmente, especialmente aos cristãos. Esse ato deu ao cristianismo,


e a todas as outras religiões, o estatuto de legitimidade, comparável
com o paganismo e com efeito destituiu o paganismo como religião
oficial do Império Romano. Tal documento, publicado em forma de
carta, transcreveu o acordo entre os tetrarcas Constantino (impe
rador do Ocidente) e Licínio (imperador do Oriente). Além da libe
rdade religiosa, a aplicação do Edito fez devolver os lugares de culto
e as propriedades que tinham sido confiscadas dos cristãos duran-
te o período da perseguição. Com o tempo, Constantino passou
a favorecer o cristianismo fazendo generosas concessões à igreja
e seus líderes, em termos de doação de propriedades, isenção de
tributos e outros privilégios.

A conversão de Constantin
Existe muita polêmica sobre se Constantino se converteu de ver-
dade tornando-se de fato um cristão. Muitos historiadores defen-
dem a ideia de que o favorecimento da igreja por Constantino foi
um ato de sua vontade e não de sua “conversão”. Para Constantino,
o Deus dos cristãos era um ser extremamente poderoso, que estava
disposto a ajudá-lo sempre, quando ele favorecia os fiéis. Ele retar-
dou o ato de seu batismo até às vésperas da morte, julgando que o
ato do batismo lavava todos os pecados cometidos anteriormente,
ideia que prevalecia entre os cristãos naquela época. Jesse Lyman
fala que se Constantino não foi um grande cristão, foi, sem dúvida,
um grande político, pois teve a ideia de unir-se ao movimento que
dominaria o futuro de seu império¹. É provável que Constantino
tenha assumido o cristianismo porque a igreja poderia servir como
um novo centro de unidade e, assim, salvar a cultura clássica e o
Império Romano.

Impactos positivos e negativos na igreja a partir de Constanti-


no e da oficialização do cristianismo
Com a “conversão” do Imperador Constantino, o rumo do cristianis
mo mudou radicalmente. A igreja que até então era perseguida,
passou a respirar novos ares de liberdade. Sem dúvidas, o maior
impacto positivo de Constantino na história da igreja foi o fim da
perseguição. Contudo, em troca dos benefícios concedidos à igreja,
Constantino sentiu-se no direito de intervir em questões eclesiásti-
cas, começando assim o complexo e por vezes tumultuado

1 LYMAN, Jesse Hurlbut, A história da Igreja Cristã, Editora Vida, São Paulo, 2007. Pg 85.

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relacionamento entre a igreja e o Estado, que dura de uma forma ou


de outra até os nossos dias. Duas décadas depois do Edito de Milão,
em 380, o Imperador Teodósio promulgou o Edito de Tessalônica
no qual reconheceu o cristianismo como religião oficial do Império.
A esse edito seguem-se outros, sempre reforçando o primeiro, con-
denando o paganismo e as heresias e punindo até com a perda dos
direitos civis aos que não professam o cristianismo. Jesse Lyman fala
que se o término da perseguição foi uma bênção, a oficialização do
cristianismo como religião do Estado foi, não há dúvida, maldição².
Se antes confessar o nome de Cristo era motivo para ser morto, ago
ra significava projeção e segurança. Isso, sem dúvidas, foi um dos
principais motivos da extraordinária expansão do cristianismo nessa
fase. No entanto, a oficialização do cristianismo e sua nova relação
com o Estado trouxe algumas consequências negativas para a igre-
ja. Muitos homens ímpios, mesmo sem uma real conversão, deseja-
vam postos na igreja, para assim obterem influência social e política.
Assim, o nível moral do cristianismo no poder foi se tornando mais
baixo do que aquele que distinguia os cristãos nos tempos de perse-
guição. Apesar dos cultos de adoração aumentarem em esplendor,
eram menos espirituais e menos sinceros do que no passado. Os
costumes e as cerimônias do paganismo foram pouco a pouco infil-
trando-se nos cultos de adoração. Algumas das antigas festas pagãs,
por exemplo, foram aceitas na igreja com nomes diferentes e as
imagens dos santos e mártires começaram a aparecer nos templos,
inicialmente como objetos de reverência, e posteriormente como
objetos de adoração e culto.

Ações e impactos gerais de Constantino na Igreja

• Criou leis que isentava o clero dos encargos públicos;


• Proibiu trabalhos aos domingos;
• Proibiu sacrifícios pagãos em casas particulares;
• Fez altos donativos ao clero;
• Patrocinou a construção de grandes igrejas em Roma, Jerusalém, etc.
• Com o apoio do imperador a igreja ganha mais espaço social;
• Mãe de Constantino empreende uma viagem a Jerusalém na tentativa
de trazer relíquias sagradas;
• Uma assimilação do cristianismo com práticas pagãs romanas;
• Organização e hierarquia maior na igreja;

• Desafio da relação: igreja e estado.

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Impacto positivo Impacto negativo


• Fim da crucificação; • Paganização nas práticas
internas da igreja;
• Repressão do infanticídio;
• Desvalorização da experiên-
• Fim dos jogos de gladiadores;
cia de conversão (cristianismo
• Maior organização possibili- social);
tou preservação e desenvolvi-
• Distanciamento das bases
mento das bases da fé cristã
da fé cristã em troca de uma
(corpo doutrinário definido e
organização e poder político/
Escrituras).
social.

Como a igreja reagiu a essa nova fase


Essas mudanças em relação ao status da igreja não foram fáceis,
e houve cristãos que reagiram de muitas maneiras diferentes. Al-
guns enxergam isso como uma grande vitória do cristianismo e se
mostram tão gratos pela nova situação que se lhes tornou difícil
adotar alguma atitude crítica, tanto para com o governo como para
com a igreja. Este foi o caso de Eusébio de Cesareia, o primeiro
historiador do cristianismo. Outros tiveram uma atitude totalmente
oposta, fugiram para o deserto e locais isolados, pois acreditavam
que a cultura secular estava capturando a essência da fé cristã.
Os Padres do Deserto tiveram uma enorme influência no desen-
volvimento do cristianismo primitivo e escreveram grandes obras
de espiritualidade. As comunidades monásticas do deserto que
cresceram através destes encontros informais de monges eremi-
tas se tornaram o modelo para o monasticismo cristão. Outros cris-
tãos, porém, como os mais destacados líderes do cristianismo nessa
época, adotam uma postura intermediária: continuam vivendo nas
cidades e participando da vida comum em sociedade, mas com
espírito crítico. Esses se tornaram alguns dos maiores teólogos da
igreja, o que trouxe o florescimento da “era patrística".

Cinco maiores mudanças da igreja na fase Imperial


Desde os primórdios de sua história, a igreja esteve preocupada em
sobreviver aos desafios, permanecendo na pureza do evangelho.

2 LYMAN, Jesse Hurlbut, A história da Igreja Cristã, Editora Vida, São Paulo, 2007. Pg 90.

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Depois da morte dos apóstolos vemos a igreja reagindo, tentando


montar uma estrutura para preservar a fé. Isso acarretou pontos
positivos e negativos, assim como tudo na história da igreja. A seguir
veremos as cinco principais mudanças da igreja nesta nova fase.
Muitas dessas mudanças já vinham sendo concebidas e formula-
das desde a fase anterior e caracterizavam-se por elementos essen
ciais de unidade e estabilidade como a aceitação de um conjunto
de livros tidos como divinamente inspirados (as Escrituras Hebraicas
e o cânon do Novo Testamento), a declaração formal dos pontos
centrais da fé cristã (o credo, geralmente em forma trinitária), a
concentração da autoridade nas mãos de um bispo monárquico,
a supremacia do bispo de Roma e o florescimento do desenvolvi-
mento teológico.
1. Formação do credo apostólico
Uma das melhores formas de manter a pureza do evangelho era se
segurar na doutrina dos apóstolos que era passada tanto por meio
dos seus escritos como por seus discípulos. Essa transmissão da fé
apostólica deu origem aos primeiros credos da igreja. A expressão
‘credo’ que vem da palavra latina, que apresenta a mesma grafia e
cujo significado é ‘eu creio’, expressão inicial do credo apostólico
-, provavelmente o mais antigo e o mais conhecido de todos os
credos. Esta expressão, “credo dos apóstolos”, veio a significar uma
referência à declaração de fé, que sintetiza os principais pontos da
fé cristã, os quais são compartilhados por todos os cristãos. Ele é
formado pelas 12 seguintes afirmações:

1. Creio em Deus Pai, todo-poderoso, Criador do céu e da terra;


2. E em Jesus Cristo, um só seu Filho (seu único Filho), Nosso Senhor,
3. Que foi concebido pelo poder do Espírito Santo, nasceu de Maria Virgem;
4. Padeceu sob o poder de Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado;
5. Desceu ao reino dos mortos, ressuscitou ao terceiro dia;
6. Subiu ao Céu, está sentado à direita de Deus Pai todo-poderoso,
7. De onde há de vir a julgar os vivos e os mortos.
8. Creio no Espírito Santo,
9. Na Santa Igreja Católica, na comunhão dos Santos,
10. Na remissão dos pecados,
11. Na ressurreição da carne,
12. Na vida eterna.

Amém.

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Apesar de não ser escrito pelos apóstolos, ele é baseado na fé dos


apóstolos. O estímulo para seu desenvolvimento foi a necessidade
de proporcionar uma síntese adequada da fé cristã, apropriada para
ser utilizada em ocasiões públicas, dentre as quais, a mais impor-
tante era o batismo. A igreja primitiva costumava batizar seus con-
vertidos no dia de Páscoa, usando o período da quaresma como
um tempo de preparação e instrução voltado para esse momento
de profissão pública de fé e de compromisso. Cada convertido, que
desejasse se batizar, deveria declarar publicamente sua fé, assim
os credos começaram a se sobressair como uma declaração de fé
homogênea, que os convertidos podiam utilizar nessas ocasiões.
Cairns fala que o credo apostólico é claramente trinitariano, dá
atenção à pessoa e obra de cada uma das três pessoas da Trindade.
Destaca a natureza universal da igreja e, depois de fundamentar
em Cristo a salvação, apresenta uma escatologia explícita centra
lizada na ressurreição dos crentes e nos seus alvos de vida eterna.
Essas declarações de fé tinham fins didáticos, catequéticos, confes-
sionais, litúrgicos e apologéticos.³
2. Formação do cânon do Novo Testamento
Desde o começo, os cristãos honraram as Escrituras do Antigo Tes-
tamento, vendo nelas a preparação para Cristo, e as liam nos seus
cultos. Gradualmente, por uso e consentimento comum, alguns li
vros de autoria cristã foram também aceitos pelas igrejas. Desde
o começo, diversas cartas de Paulo e alguns dos Evangelhos eram
lidos nas assembleias de cristãos e tinham aceitação geral na maior
parte da igreja cristã. Porém, com o tempo havia muitos escritos
heréticos circulando entre as igrejas a fim de levar o povo ao erro.
Diante desse crescente ensinamento herético, a igreja viu a neces-
sidade de compilar uma lista de livros sagrados. Tal lista não se fez
de modo formal, não houve uma reunião ou concílio para deter-
miná-la. Pouco a pouco foi se formando um consenso dentro da
igreja. Alguns livros que haviam sido usados por algumas igrejas lo-
cais caíram em desuso e não foram incluídos no Novo Testamento.
Outros, logo conseguiram acolhida geral. E, outros foram discutidos
por algum tempo antes de serem aceitos de uma forma generaliza-
da. Inicialmente foram reunidos os quatro Evangelhos e as epísto-
las paulinas, depois o livro de Atos dos Apóstolos servindo como
ligação entre ambas as coleções. Por último, foram acrescentados as

3 CAIRNS, Earle E. O cristianismo através dos séculos : uma história da Igreja cristã, São Paulo, Vida Nova,
1995. Pg. 95.

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epístolas gerais (Hebreus a Judas) e o Apocalipse. Os vários concílios


que se pronunciaram sobre o problema do cânon do Novo Tes-
tamento apenas tornaram públicos os livros do Novo Testamento,
que já eram reconhecidos amplamente pela igreja. Nesse processo
gradual de fixação do cânon, foram observados alguns critérios:
• Apostolicidade: Para que um livro fosse aceito ele deveria
ter sido escrito por um apóstolo ou por alguém intimamente ligado
a um deles. Essa questão tinha especial importância com respeito
aos livros de Marcos e Lucas, que apesar de não serem apóstolos
eram discípulos próximos de Pedro e Paulo. Franklin Ferreira fala que
se não ficasse provado que um livro era de autoria de um apóstolo
ou que, pelo menos, tinha o suporte da autoridade de um apósto-
lo, ele era tecnicamente rejeitado, por mais que fosse edificante
ou popular entre os fiéis. Existiram certos livros que, durante mui-
to tempo, estiveram na iminência de ser incluídos no cânon, mas
no final deixaram de ser admitidos, geralmente porque lhes faltava
essa marca indispensável. Entre eles, estavam o ‘Didaquê’ e o ‘Pastor
de Hermas’4. Contudo, a apostolicidade não poderia ser o único
critério a ser usado, visto que muitos escritos heréticos conhecidos
como “pseudográficos”, tinham a sua autoria indevidamente atribuí-
da a algum apóstolo.
• Exatidão doutrinária: Um livro só poderia ser aceito se seu
conteúdo fosse doutrinariamente correto. Qualquer livro conten-
do heresias ou algum pensamento contrário aos livros canônicos já
aceitos, era rejeitado.
• Uso geral: Outro critério importante para admitir um li
vro como canônico era se tal livro tinha autoridade universalmente
reconhecida nas igrejas, sendo lido nos cultos públicos e ampla-
mente citado pelos pais da igreja. Franklin Ferreira fala que alguns
dos livros que mais tarde foram incluídos tiveram de aguardar um
tempo considerável antes de obter reconhecimento universal. Du-
rante muito tempo, a epístola aos Hebreus esteve sob suspeita no
Ocidente, e, em geral, no quarto e no quinto séculos o livro de
Apocalipse estava excluído do cânon em várias localidades. A igre-
ja ocidental manteve absoluto silêncio sobre Tiago até a segunda
metade do quarto século; e, em certos círculos, as epístolas de 2 Pe-
dro, 2 e 3 João e Judas, estavam ausentes de quase todas as primei-
ras listas, e continuaram sendo tratadas como duvidosas por algum

4 FERREIRA, Franklin, A Igreja Cristã na História: das origens aos dias atuais, São Paulo Vida Nova, 2013,
pag. 47

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tempo5. A demora da inclusão destes livros deveu-se, sobretudo, à


incerteza de sua autoria.
O primeiro documento oficial que prescreveu como canônicos os
livros do Novo Testamento atual foi a Carta de Páscoa, escrita por
Atanásio, em 367, para as igrejas sob sua jurisdição como bispo de
Alexandria. Concílios posteriores, como os de Hipona Régia (393),
Cartago (397) e Calcedônia (451), apenas aprovaram e deram ex-
pressão uniforme àquilo que já era aceito como fato pelas igrejas
havia um bom tempo.
3. O bispo monárquico
Por causa dos desafios enfrentados, tanto internos quanto externos,
os bispos se tornaram uma espécie de guardião da unidade e da
ortodoxia da igreja. Isso elevou à exaltação da posição do bispo
em cada igreja, chegando ao ponto de as pessoas o reconhecerem
como superior aos outros presbíteros. Ao contrário do primeiro sé-
culo, em que cada igreja tinha vários bispos ou presbíteros, a partir
do segundo século a igreja passou a diferenciar entre esses dois
termos e estabelecer um único bispo em determinada cidade ou
região. Se uma cidade tivesse mais de um bispo, os outros além
daquele seriam seus assistentes. O bispo singular era mais do que
um administrador. Ele também era responsável pela adoração e su-
pervisão da vida total da igreja dentro da sua jurisdição. O conjunto
de todos os bispos constituía a igreja no sentido mais amplo. Quem
estivesse em comunhão com os bispos estava na igreja, e quem não
estivesse estava fora da igreja. A partir daí, a identificação da igreja
com a hierarquia eclesiástica passou a ser cada vez mais acentuada.
4. Liderança centralizada em Roma
Junto com a ideia de sucessão apostólica passou a existir, nessa
nova fase, uma semelhança da igreja com o império, o que reforçou
ainda mais a tendência da nomeação de um líder único na igreja.
Em um Estado governado por um imperador com poderes absolu-
tos, era natural que a igreja, da mesma forma, fosse governada por
um chefe único. Em todas as partes do império os bispos governa-
vam as igrejas sob sua jurisdição, porém esta pergunta surgia con-
stantemente: Quem governará os bispos? Qual o bispo que deve
exercer na igreja a autoridade que o imperador exerce no império?

5 FERREIRA, Franklin, A Igreja Cristã na História: das origens aos dias atuais, São Paulo Vida Nova, 2013,
pag. 47;00

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Primeiro os bispos das capitais provinciais passaram a ser chamados


de metropolitanos (arcebispos). Depois os bispos das igrejas mais
importantes e antigas – Roma, Constantinopla, Alexandria, Antio-
quia e Jerusalém – receberam o título de patriarcas. Entre os cinco
patriarcados acima mencionados havia frequentes e fortes disputas
pela supremacia. Mais tarde essa disputa ficou somente entre o
patriarca de Constantinopla e o papa de Roma, para saber qual dos
dois seria chefe da igreja. O bispo de Roma tomou o título de "pai",
que mais tarde foi modificado para papa. Roma reclamava para si
autoridade apostólica. Os principais fatores que contribuíram para
o surgimento do papado romano foram: a insistência no primado
de Pedro, que teria sido o primeiro bispo de Roma, e a alegação de
que essa autoridade foi transmitida aos seus sucessores; o suposto
martírio de Pedro e Paulo em Roma; a importância da cidade e da
igreja de Roma; as declarações de governantes em apoio às pre-
tensões papais; a rápida aceitação desta autoridade no ocidente,
devido à falta de concorrentes; o declínio do Império do ocidente,
tornando a igreja a instituição mais importante da sociedade; a ha-
bilidade de muitos bispos de Roma como teólogos, administradores
e promotores da obra missionária. Essas reivindicações encontraram
forte resistência no oriente, sendo um dos fatores da futura sepa-
ração entre as igrejas oriental (ortodoxa) e ocidental (católica).
5. Desenvolvimento teológico
Jesse Lyman fala que enquanto a igreja lutava para sua própria
sobrevivência contra a perseguição, conservou-se unida, apesar
dos rumores de dissensões doutrinárias. Entretanto, quando a igre
ja se viu a salvo e no poder, surgiram acalorados debates acerca
de suas doutrinas, e tão fortes se mostravam, que lhe abalavam os
fundamentos6. Neste período, houve um grande florescer e desen-
volvimento da teologia, foi nele que se estabeleceram os principais
dogmas da igreja cristã. Os dogmas ou doutrinas formuladas neste
período foram o resultado de pensamento e pesquisa demorados
por parte dos cristãos no desejo de interpretarem corretamente o
significado da Bíblia nas questões disputadas e de evitar as opiniões
errôneas dos filósofos de sua época. Cairns fala que um forte zelo
pela doutrina pode levar uma pessoa ou uma igreja involuntaria-
mente ao erro, se não se fizer um estudo equilibrado da Bíblia7.
Assim como Sabélio que, por exemplo, chegou a negar a Trindade

6 LYMAN, Jesse Hurlbut, A história da Igreja Cristã, Editora Vida, São Paulo, 2007. Pg 98.
7 CAIRNS, Earle E. O cristianismo através dos séculos : uma história da Igreja cristã, São Paulo, Vida Nova,
1995. Pg. 103.

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essencial ao tentar salvaguardar a unidade de Deus, ou como Ário


que descambou para uma interpretação antibíblica do relacio-
namento de Cristo com o Pai em uma tentativa de evitar aquilo
que ele considerava ser o perigo do politeísmo. Essas controvérsias
sobre problemas teológicos aconteceram relativamente tarde na
história da igreja, provavelmente pelo fato de que nos tempos da
perseguição, a submissão a Cristo e à Bíblia era mais importante do
que o significado de certas doutrinas. Porém, uma vez que a igre-
ja tinha liberdade, ela pôde se dedicar a questões teológicas mais
profundas. Um outro motivo, destacado por Cairns, é o fato de que,
na tentativa de Constantino unificar o Império para salvar a civili-
zação clássica, isso significou que a igreja precisaria ter um corpo
unificado de doutrinas se quisesse ser o cimento capaz de manter
unido o corpo político. Para isso, o Império precisa de um dogma.
Como, então, definir esse dogma? O método adotado pela igreja
para resolver as diferenças fundamentais de interpretação sobre o
significado da Bíblia e suas implicações teológicas foi a realização
de concílios ecumênicos ou universais, geralmente convocados e
presididos pelo imperador romano. Houve sete concílios que repre-
sentaram a Igreja Cristã toda.9

CONCLUSÃO
Começamos nossa disciplina estudando sobre porque estudar
história da igreja, vimos o início da igreja, como ela nasceu em todo
o seu dinamismo, mas também com todos seus desafios. Em toda
a sua história, desde sua origem até hoje, a igreja é desafiada justa-
mente porque está no mundo. Nos seus primeiros quinhentos anos
a igreja venceu aos desafios de sobreviver a perseguição dos judeus,
dos imperadores romanos; manter a pureza do evangelho em meio
aos ensinos dos falsos mestres; depois, com a nova relação com o
Estado a igreja foi desafiada a se manter correta diante da tentação
de uma posição de autoridade e privilégio. Ao estudar este período,
podemos ficar perplexos diante do surgimento de crenças e práti-
cas que não nos parecem corretas. Ficamos nos perguntando por
que Deus permitiu que as coisas tomassem certos rumos. A história
da igreja é importante porque mostra os acertos e os erros da igreja
em sua caminhada no mundo. Nós também cometemos erros e
temos as nossas próprias divergências teológicas. Precisamos pelo
menos entender como certas coisas aconteceram, mesmo que não
concordemos com elas. Por outro lado, seria um erro nos concen-
trar nos desvios e esquecer as coisas positivas.

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