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Plantão Psicológico

na perspectiva fenomenológica
existencial

Dr. André Prado Nunes


contato:
andre.pradonunes@gmail.com
De que plantão estamos falando?
 Multiplicidade de perspectivas e técnicas acerca dos serviços
de plantão ofertados à comunidade.

 Destaca-se, entretanto, a predominância do plantão como


uma modalidade de prática psicológica já instituída nas
clínica-escolas.

 O modelo usual de plantão psicológico aproxima-o muitas


vezes das entrevistas de triagem cujo objetivo é esclarecer a
demanda do cliente para então encaminhá-lo à psicoterapia
individual.
 O que fica pressuposto nesse saber instituído é que somente o processo
psicoterapêutico consegue de fato trabalhar as questões centrais do
cliente.

 Assim, o plantão só trabalharia as queixas mais superficiais, devido ao


número de sessões reduzidas e a necessidade, também pressuposta, de
se estabelecer um vínculo mais duradouro com o cliente para que se
possa tocar em questões mais profundas.

 Por outro lado, o estagiário-terapeuta fica protegido na proposta de


processo psicoterapêutico pois tem como justificativa de que as suas
intervenções devem ocorrer nas sessões posteriores, geralmente nos
momentos finais da devolutiva. Assim, a sua angústia e insegurança
ficam geralmente mascarados e silenciados.
Plantão Psicológico
na perspectiva fenomenológica existencial
 A perspectiva fenomenológica existencial marca uma ruptura do molde
usual de se pensar o estágio, convidando o plantonista a constituir saberes
de ofício a partir da própria experiência: explicitação de saberes prévios e
“perda” de referências instituídas

 O tripé ensino-pesquisa-extensão abre a possibilidade de se investigar


outras possibilidades de plantão, de acordo com cada contexto, grupo e
comunidade.

 O caráter clínico do plantão coloca-o como um modo de intervenção


atento às especificidades de cada pedido/demanda. O Plantão não deve
ser visto como um modelo pronto de serviço a ser implantado nas
instituições.
Uma perspectiva existencial...

Pensar o plantão como uma árvore... Somos


convocados a atender, responsabilizando-nos por
oferecer uma sombra de uma árvore grande para
aquele que pro-cura poder parar por alguns
instantes, refletir, des-ocultar urgência e retomar
o caminho que deseja trilhar.
Em campo aberto, uma árvore frondosa é
um marco aos pés que descansam os
tropeiros para, no dia seguinte, seguirem
viagem. Recorrendo à linguagem poética:
era uma vez uma árvore grande que,
enraizada no húmus, abriu-se em ramas
para cuidar do peregrino desalojado em
sua errância...
Plantão Psicológico
na perspectiva fenomenológica existencial

 Priorizar o encontro como sendo um momento único e oportuno


para que o cliente (sofrente) esclareça melhor a sua queixa
(problema identificado), trabalhando junto ao estagiário na
possibilidade de se dar a ver uma demanda (modo de ser do
cliente em relação ao problema).

 O plantonista é convidado a afastar-se da dimensão técnica da


profissão – do “fazer pelo cliente” e, ao invés dele tomar o
cuidado do cliente para si, ele se coloca “junto ao cliente” –
escuta disponível e atenta em busca do sentido do que é dito.
A atitude fenomenológica que fundamenta a ação psicológica
investigada, privilegia a solicitude em seu modo liberador no estar com
outro, pois não se pretende “fazer por ele”, mas “estar junto a”.
Compreende-se que o psicólogo acompanha o outro em seus
questionamentos e impasses, devolvendo a compreensão de algo que
surge nesta comunicação, de modo a propiciar contato com a angústia.

Tal humor é compreendido como estado de ânimo que coloca o homem


diante da precariedade do sentido, na experiência do “nada” que surge
ao deslocar-se das próprias certezas (ausência de mundo), convocando-o
a apropriar-se de um caminho mais singular pelo existir.
Usualmente, a angústia é interpretada como sintoma ou
transtorno mental, podendo ser percebida como sofrimento
e vivência de crise pelo homem. Entretanto, em Heidegger,
ela se remete mais originalmente a este “clamor da
consciência” para um “poder-ser” mais próprio, dirigindo-se
não à ansiedade, mas à contemplação no modo da
serenidade, desapegada de expectativas e conclusões
(RODRIGUES, 2006).
Estar junto ao cliente é testemunhar o contar de uma história. Além
disso, no modo como os clientes fizeram uso do plantão, os estagiários
revelaram como essas tramas narradas compunham-se não somente de
fios, apontando continuidade na história, mas também de buracos,
indicando descontinuidades e rupturas na linearidade da narrativa:
condição própria do existir.

Deste modo, eles trouxeram uma compreensão de homem distinta da


noção de identidade como personalidade fixa, estável e categorizável,
característica do ideário moderno e científico.
Segundo Morato (2013), tal ação psicológica busca inspiração na compreensão
fenomenológica da solicitude em seu modo liberador, pelo qual “compreende-se
o outro diante de suas próprias possibilidades, encarregando-o de seu poder-ser
para conduzir-se em dada situação, pertinentemente a seu ser-no-mundo.”
(Morato, 2013, p. 52).
Plantão Psicológico
na perspectiva fenomenológica existencial

O encontro único pode desdobrar em outros encontros


possíveis e sugeridos, a depender da especificidade de
cada caso. Mesmo assim, a cada encontro, trabalha-se
um começo, meio e fim. Por isso não se trata de
substituir um modelo de plantão por outro, mas de
flexibilizar as possibilidades de intervenção a partir do
que é visto e compreendido no espaço clínico de
atendimento.
Plantão Psicológico
na perspectiva fenomenológica existencial

 O exercício da “familiaridade” x “estranhamento”: noção de acolhimento

 Linguagem poética: dizer sobre aquilo que “tocava” o plantonista e manter


o espaço de liberdade do cliente, que poderia compreender o que se
tentou comunicar ou não. Libertar a palavra do âmbito da explicação
causal. (sugestão x convencimento)

 Num mundo em que, concretamente, há cada vez menos liberdade e cada


vez mais massificação, esse modo de ser psicólogo implica
necessariamente uma postura ética de denúncia dos mecanismos de
“domesticação dos indivíduos”, ao atentar para a singularidade de cada
ser, como modo único e imprevisível de realização de sentido.
“Atender” e “cuidar” pautam-se, sobretudo, no oferecer
guarida, abarcar e conter o sentido de uma experiência que, de
outro modo, poderia permanecer como ausência de sentido ou
no desamparo. Mais do que um esforço no sentido de dirigir-se
a, trata-se de estar presente como abertura para deixar vir. É o
modo do psicólogo estar atento e disponível àquilo que, no
outro, demanda por expressão, trânsito, diálogo... testemunho.
Uma vez abrigado, cabe ao cliente retomar a sua trajetória de
des-continuidades e atravessamentos, podendo ou não retornar,
mas considerando o plantão uma referência de cuidado às suas
questões.

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