Você está na página 1de 75

AULAS DO MEDCURSO

RESUMIDAS

CLÍNICA MÉDICA

Guilherme Augusto Turbino Ribeiro


Belo Horizonte, 07 de março de 2023
SUMÁRIO

Fisiologia Renal – Glomérulo..............................................................................................................................................1

Síndrome Nefrítica..............................................................................................................................................................4

Glomerulonefrite Pós-Estreptocócica (GNRP)...........................................................................................................7

Doença de Berger...............................................................................................................................................................10

Glomerulonefrite Rapidamente Progressiva (GNRP)...........................................................................................12

Síndrome Nefrótica – Introdução................................................................................................................................14

Síndrome Nefrótica – Etiologias....................................................................................................................................17

Trombose Glomerular......................................................................................................................................................22

Fisiologia Renal – Aspectos do Sistema Tubular...................................................................................................23

Necrose Tubular Aguda..................................................................................................................................................27

Nefrite Intersticial Aguda...........................................................................................................................................32

Necrose de Papila Renal..................................................................................................................................................34

Síndromes Vasculares – Estenose de Artéria Renal..............................................................................................36

Síndromes Vasculares – Ateroembolismo..................................................................................................................39

Distúrbios do Sódio – Introdução e Hiponatremia................................................................................................42

Distúrbios do Sódio – Hipernatremia.........................................................................................................................47

Distúrbios do Potássio – Introdução e Hipocalemia.............................................................................................48

Distúrbios do Potássio – Hipercalemia........................................................................................................................51

Distúrbios Ácido-Base – Introdução e Acidose.......................................................................................................52

Distúrbios Ácido-Base – Alcalose..................................................................................................................................57

Urologia – Nefrolitíase.....................................................................................................................................................59

Urologia – Hiperplasia Prostática...............................................................................................................................63

Urologia – Câncer de Próstata.....................................................................................................................................69


1

FISIOLOGIA RENAL
ASPECTOS DO GLOMÉRULO
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro
➢ ANATOMIA DO RIM: O rim apresenta 11 cm a 12 cm de comprimento em seu maior eixo. Ressalta-se
que o conhecimento disso pode ser importante em uma questão para diferenciar doenças que cursam com
a redução no tamanho do órgão e doenças que cursam com o aumento dele, sendo essa última situação
menos frequente. De forma simplificada, o rim pode ser dividido em córtex e medula. Nesse sentido, o
córtex é a porção mais externa do órgão, ao passo que a medula se localiza mais internamente. Contudo,
a medula não é uma estrutura contínua como o córtex, sendo composta por várias pirâmides de Malpigh,
que, por sua vez, são separadas pelas colunas de bertin, pertencentes ao córtex. Ressalta-se ainda a o ângulo
inferior de uma pirâmide de Malpigh é a papila renal, por onde o filtrado glomerular sai do parênquima
renal para alcançar um cálice menor. Na sequência, a urina passa por um cálice maior, fruto da confluência
de aproximadamente 3 cálices menores e, por fim, chega à pelve renal, por onde a urina deixa o rim e
segue na via urinária através do ureter.

➢ VASCULARIZAÇÃO DO RIM: Diferentemente do que ocorre na maioria das vísceras, o sistema


arterial renal, primeiramente, tem a função de promover a filtração glomerular, tendo em vista que a
nutrição do órgão só ocorre após o sangue arterial ter passado pelo processo de filtração glomerular. Nesse
sentido, partindo do hilo renal, a artéria renal logo se bifurca após alcança-lo e, a partir daí os ramos
gerados passam a dar origem às artérias lobares, que contornam as pirâmides de Malpigh, separando a
medula do córtex renal. Em um determinado momento, as artérias até então chamadas de lobares passam
a se chamar artérias arciformes ou arqueadas, tendo em vista que originam vários ramos, chamados de
artérias interlobulares, já que penetram o interior dos lobos renais, dividindo-o em lóbulos. Na sequência,
as artérias interlobulares geram as arteríolas aferentes, que resultam em vários capilares. Todavia, no caso
dos rins, esses capilares não promovem a nutrição e a irrigação do parênquima, uma vez que formam o
glomérulo, por onde ocorre a filtração glomerular. Posteriormente, esses capilares glomerulares confluem
em uma arteríola eferente, diferentemente dos capilares no geral que se encontram em uma vênula. Por
fim, as arteríolas eferentes se juntam e formam as vasas retas, que, por sua vez, são responsáveis pela
nutrição e oxigenação do parênquima renal.

Tendo em vista o diferenciado sistema arterial dos rins, deve-se destacar que a nutrição e a
oxigenação do parênquima renal se iniciam no córtex e terminam na medula, que, portanto, é menos
vascularizada. Dessa forma, conclui-se que a papila renal é a porção menos irrigada do rim e,
portanto, mais sensível às alterações do fluxo sanguíneo renal, que ocorrem em doenças, como
Diabetes Mellitus e Anemia Falciforme, bem como a partir do uso de medicamentos, como AINES.
Ressalta-se que, nesses casos, a papila renal se torna propensa a sofrer processo de isquemia, seguido
por necrose e, por fim, pelo surgimento de um corpo estranho (papila necrosada) capaz de se
comportar como um cálculo obstrutivo, que, por sua vez, oferece um risco de infecção maior do que
o observado em casos usuais de litíase renal. Ressalta-se que nesses casos, a abordagem terapêutica
conta com a associação de tratamentos para nefrolitíase e pielonefrite.

➢ NÉFRON: O néfron é uma estrutura microscópica e representa a unidade funcional do rim. Nesse sentido,
a somatórias dos milhões de néfrons resulta no rim. Do ponto de vista estrutural, o néfron é composto pelo
Corpúsculo de Malpigh, sistema tubular e aparelho justaglomerular. Resumidamente, o filtrado renal é
formado nos glomérulos e, na sequência, alcança o sistema tubular, por onde passa por modificações
através dos processos de reabsorção e secreção feitos pelas células tubular. Ao longo desse percurso ocorre
a comunicação entre o filtrado que está sendo formado e o sangue que está alcançando os glomérulos,
papel desempenhado pelo aparelho justaglomerular e fundamental para a manutenção da homeostase. Por
fim, as ilustrações abaixo permitem a compreensão estrutural do néfron.

1. Corpúsculo de Bowman

Folheto interno da cápsula de Bowman:


Camada de tecido epitelial com Folheto externo da Cápsula de
prolongamentos denominados podócitos, Bowman: Delimitação externa
localizada em contato íntimo com o do Corpúsculo de Malpigh.
glomérulo.

Glomérulo: Emaranhado de capilares


fenestrados oriundos de uma única Espaço de Bowman: Espaço
arteríola aferente. que recebe o filtrado
glomerular logo após passar
pela barreira de filtração e
delimitado pelos folhetos
externo e interno da Cápsula
de Bowman.
2. Barreira de filtração glomerular

Folheto interno da Cápsula de


Bowman: Tecido epitelial com
prolongamentos denominados
podócitos.

Capilares glomerulares:
Formados por endotélio
com fenestrações

Mesângio: Espaço entre os capilares


glomerulares e resultante do revestimento feito
pela membrana basal, que, por sua vez, é
Membrana basal: Única região contínua
contínuo no glomérulo e não nos capilares
do glomérulo, tendo em vista que as
individualmente. Ressalta-se que o mesângio
fenestrações e os podócitos conferem
abriga células mesangiais com função de defesa.
irregularidades aos capilares glomerulares
Ademais, o mesângio é uma área sensível que,
e folheto interno, respectivamente.
quando agredida, cursa com hematúria do ponto
de vista clínico

➢ O RIM RECEBE 20% A 25% DO DÉBITO CARDÍACO: Diante de infecções em outros locais do
organismo, como as vias áereas superiores, os produtos inflamatórios gerados, como células de defesa,
anticorpos e imunocoplexos, atingem a circulação sistêmcia e, consequentemente, o nível renal. Dessa
forma, é possível que esses produtos do sistema imunológico impactem na barreira de filtração,
promovendo um quadro inflamatório nos glomérulos. Nesses casos, a imunofluorescência glomerular
permite visualizar a lesão renal, bem como contribui para determinar o local específico de agressão dentro
da barreira de filtração. Isso é possível, tendo em vista que, quando positivo, a imunofluorescência pode
apresentar dois padrões, isto é, padrão linear e padrão granular. Dessa forma, diante do padrão granular é
possível concluir que a lesão acometeu uma área irregular da barreira de filtração, que pode ser o
glomérulo, devido às fenestrações dos capilares, ou o folheto interno da Cápsula de Bowman, devido aos
podócitos presentes no epitélio. Por outro lado, quando o padrão é linear, é possível afirmar que a lesão se
encontra na membrana basal, visto que é a única região contínua e regular da barreira de filtração e,
portanto, capaz de conferir um padrão linear na imunofluorescência.

Resultados de imunofluorescência glomerular com padrão linear são conclusivas para afirmar
acometimento da membrana basal da barreira de filtração.
4

SÍNDROME NEFRÍTICA
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ AS DOENÇAS RENAIS DO PONTO DE VISTA SINDRÔMICO: De acordo com o local de


acometimento no rim, as doenças podem ser agrupadas nos 5 grupos abaixo.

− Síndrome glomerular: Quando a agressão ocorre a nível glomerular.


− Síndrome tubular: Quando o sistema tubular abriga a lesão.
− Síndrome vascular: Quando a doença decorre de agressão vascular.
− Desequilíbrio hidroeletrolítico ou ácido-básico: Quando há comprometimento da homeostase.
− Síndrome urêmica: Quando ocorre perda de função renal.

➢ SÍNDROMES GLOMERULARES: Os glomérulos podem ser alvo de diversos processos patológicos,


primários ou secundários. Tendo em vista que os rins recebem 20% a 25% do débito cardíaco e filtram
cerca de 100 ml de sangue por minuto, as lesões glomerulares secundárias a condições infecciosas,
neoplásicas e autoimunes, por exemplo, são mais comuns. Considerando a manifestação clínica, as
síndromes glomerulares podem ser subdivididas em 5 grupos, conforme visto abaixo.

− Síndrome nefrítica
− Alterações assintomáticas
− Glomerulonefrite rapidamente progressiva
− Síndrome nefrótica
− Trombose glomerular.

➢ OLIGÚRIA, HIPERTENSÃO ARTERIAL E EDEMA NA FISIOPATOLOGIA DA SÍNDROME


NEFRÍTICA: A partir de uma lesão glomerular, causada, por exemplo, por produtos inflamatórios
oriundos de outro local do organismo, ocorre a inflamação dos glomérulos com consequente queda na taxa
de filtração glomerular, o que, clinicamente, se manifesta a partir de oligúria. Em razão disso, ocorre uma
hipervolemia e, portanto, o paciente pode vir a apresentar hipertensão arterial. Considerando, dessa forma,
um aumento na pressão hidrostática, é possível o surgimento de edema, seja localizado ou generalizado.
Por fim, ressalta-se que, além de critérios diagnósticos de síndrome nefrítica, a hipertensão arterial e o
edema podem levar a complicações do quadro, como a encefalopatia hipertensiva e o edema agudo de
pulmão, respectivamente.
Sequencialmente, a fisiopatologia da síndrome nefrítica pode ser resumida em: Inflamação
glomerular, redução na taxa de filtração glomerular, hipervolemia, aumento da pressão arterial e
edema. Ressalta-se que, se não houver resolução do quadro, a hipertensão arterial e o edema podem
gerar complicações, ao passo que a redução na taxa de filtração glomerular pode se tornar cada vez
mais importante, podendo, inclusive, levar à uma obstrução azotênica.

➢ HEMATÚRIA DISMÓRFICA SUGERE SÍNDROME NEFRÍTICA: O processo inflamatório que


acomete os glomérulos leva a uma alteração morfológica nas fenestrações dos capilares glomerulares e,
consequentemente, na permeabilidade nesse local. Sendo assim, as hemácias passam a atravessar a barreira
de filtração com certa dificuldade e, consequentemente, sofrem comprometimento em sua estrutura,
resultando em um quadro conhecido por hematúria dismórfica ou acantositose. Além disso, nesses casos,
o paciente pode caracterizar a urina como “urina com cor de coca cola”, uma vez que o pigmento heme
das hemácias sofre oxidação em meio ao pH ácido da urina e, como resultado disso, adquire coloração
marrom.

Em questões de prova a presença de hematúria dismórfica ou acantositose indica quadro de


síndrome nefrítica. Além disso, conforme explicado acima, o paciente pode sugerir hematúria a
partir do relato de “urina em cor de coca cola”.

➢ CILINDROS HEMÁTICOS TAMBÉM SUGEREM SÍNDROME NEFRÍTICA: As células da alça


ascendente de Henle, em condições normais, produzem cilindros, formados à base de uma proteína
denominada TAMM-HORSFALL, que, por sua vez, se adere com facilidade a diversos elementos do
filtrado glomerular, quando em contato. Tendo isso em mente, nos casos de síndrome nefrítica, as
hemácias de origem glomerular que alcançam o sistema tubular se aderem a esses cilindros, gerando
cilindros hemáticos como achado laboratorial e altamente sugestivo de síndrome nefrítica.

Na prática, cilindros hemáticos sugerem síndrome nefrítica, apesar dos túbulos, quando lesados,
também cursarem com o extravasamento de hemácias. Ressalta-se que a provável justificativa para
isso é a proporção entre hemácias e leucócitos no filtrado glomerular, que diverge nas condições em
questão. Nas lesões glomerulares a quantidade de hemácias que alcança o filtrado é muito maior
quando comparada à quantidade de leucócitos, resultando, dessa forma, nos cilindros hemáticos
como achado laboratorial. Já nas lesões tubulares a relação se inverte e, portanto, os cilindros
leucocitários são mais frequentes.

➢ OUTROS SINAIS E SINTOMAS: Diante da progressão do processo inflamatório a nível glomerular, a


alteração na permeabilidade da barreira de filtração pode cursar com proteinúria não maciça, isto é,
dosagens de proteína na urina com valores 150 mg a 3,5 g. Nesse sentido, ressalta-se que, até 150 mg de
proteína ou 30 mg de albumina são aceitáveis, em condições normais, na urina 24h. Por fim, na síndrome
nefrítica também é possível observar piúria.

Na síndrome nefrítica, a proteinúria, quando presente, não é maciça, diferentemente do que ocorre
na síndrome nefrótica. Em valores laboratoriais, a síndrome nefrítica cursa com proteinúria de 150
mg a 3,5 g, ao passo que na Síndrome Nefrótica, valores de proteinúria superiores a 3,5 g são bem
sugestivos desse quadro.

➢ CAUSAS DE SÍNDROME NEFRÍTICA: O quadro sindrômico denominado síndrome nefrítica pode


ser desencadeado por qualquer estrutura presente na circulação sistêmica e capaz de lesar o glomérulo,
contudo, a causa disparadamente mais frequente é a Glomerulonefrite pós-estreptocócica (GNPE).

Diante do exposto, do ponto de vista etiológico, comumente, a síndrome nefrítica é classificada em


pós-estreptocócica e não pós-estreptocócica.
7

GLOMÉRULO NEFRITE
PÓS-ESTREPTOCÓCICA (GNPE)

Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ HISTÓRIA NATURAL DA GNPE: A GNPE é causada por um estreptococo beta-hemolítico do grupo


A, que tem o S. pyogenes como principal representante. Tendo em vista que os sítios de infecção mais
comuns desse patógeno são a orofaringe e a pele, o paciente, primeiramente, manifesta um quadro
infeccioso na orofaringe ou na pele. Na sequência, é preciso que o sistema imunológico responda ao quadro
com a produção de anticorpos. Nesse sentido, ressalta-se que, no caso de infecções localizadas na
orofaringe, esse período varia de 7 a 21 dias, ao passo que nas infecções cutâneas é esperado um período
de 14 a 28 dias. Passado esse tempo, produtos inflamatórios podem alcançar os glomérulos, por meio da
circulação sistêmica, lesando-os e, consequentemente, levando o paciente à manifestação clínica da
síndrome nefrítica.

➢ EPIDEMIOLOGIA DA GNPE: Indivíduos de qualquer faixa etária podem manifestar GNPE, contudo,
a faixa etária mais susceptível se encontra entre 2 a 15 anos. Além disso, na ampla maioria dos casos, o
prognóstico da doença é favorável e auto resolutivo do ponto de vista etiológico.

➢ DIAGNÓSTICO DA GNPE: Apesar da ampla maioria dos casos de síndrome nefrítica serem causados
por glomerulonefrite pós estreptocócica, é fundamental a certificação de que o quadro se trata de fato dessa
doença, tendo em vista que as outras causas de síndrome nefrítica, no geral, não cursam com bom
prognóstico e, inclusive, podem levar o paciente à insuficiência renal. Portanto, deve-se adotar as etapas
investigativas abaixo em pacientes com diagnóstico clínico de síndrome nefrítica.

1. Questionar quadro prévio de faringite ou piodermite.

2. Verificar se o intervalo entre a infecção inicial na orofaringe ou pele e os sintomas renais é condizente
com a história natural na GNPE.

3. Documentar infecção estreptocócica através de cultura ou dosagem de anticorpos. Nesse sentido, nos
casos em que o paciente reporta infecção prévia de orofaringe, recomenda-se realizar a dosagem do
anticorpo anti-estreptolisina O (ASLO), que possui sensibilidade de 80% a 90%. Já quando o relato é
de infecção prévia na pele, a orientação é a realização do exame anti-DNAse, que, por sua vez, possui
sensibilidade de 60% a 70¨%.
4. Queda transitória do complemento. Tendo em vista que a maioria dos casos de infecção de orofaringe
é de origem viral e que as infecções cutâneas podem ter outros agentes, como os estafilococos, a
presença de ASLO ou anti-DNAse positivo não certifica o diagnóstico de GNPE, já que o paciente
pode ter tido a infecção prévia ao quadro renal causada por um agente etiológico diferente de um
estreptococo beta-hemolítico do grupo A. Sendo assim, a verificação de queda transitória de C3,
principalmente, e de CH50 são conclusivos para o diagnóstico de GNPE, visto que a deposição de
imunocomplexos a nível glomerular tende a cursar com consumo de complemento pela via alternativa.

Caso uma questão de prova apresente caso clínico de síndrome nefrítica acompanhado de
dosagem de complemento em valores normais, deve-se descartar GNPE da investigação
etiológica.

➢ QUANDO SOLICITAR BIÓPSIA EM QUADROS SUSPEITOS DE GNPE: As lesões glomerulares,


de modo geral, podem evoluir mal e acabar com o rim em semanas. Conforme já mencionado, a GNPE é
autolimitada e, na maioria das vezes, não requer uma abordagem mais complexa. Porém, no intuito de
preservar os rins, existem alguns quadros que fogem ao padrão da GNPE e, consequentemente, precisam
ser melhor investigados por meio de biópsia. Nesse sentido, seguem abaixo os critérios para a realização
de biópsia renal.

1. Oligúria há mais de 7 dias: A oligúria deve ser o primeiro sintoma a ir em bora na GNPE, deixando
de se mostrar presente em cerca de 7 dias. Ressalta-se que o desaparecimento da oligúria deve ser
mensurado por uma redução na dosagem da creatinina, que, em quadros de retenção renal, se mantém
mais elevada.

2. Hematúria macroscópica por mais de 4 semanas: A hematúria macroscópica costuma persistir, de


forma superestimada, por até 4 semanas na GNPE. Portanto, hematúria macroscópica presente há mais
de 4 semanas sugere atenção ao quadro.

3. Proteinúria acima de 3,5g por mais de 4 semanas: A proteinúria da síndrome nefrítica não costuma
ultrapassar a dosagem de 3,5g. Contudo, caso esteja nefrótica no início do quadro, deve-se,
primeiramente, acompanhar. Todavia, caso essa alteração atípica persista por mais de 4 semanas é
preciso ficar mais atento e repensar a conduta.

4. Hipocomplementemia por mais de 8 semanas: Conforme já mencionado, a queda transitória de C3,


principalmente, e de CH50 são conclusivos no diagnóstico de GNPE. Entretanto, é esperado que até 8
semanas haja a regularização dos níveis de complemento.
➢ O QUE ESPERAR NA BIÓPSIA EM CASOS DE GNPE: No geral os achados são inúteis ao manejo
do paciente, tendo em vista que a microscopia do paciente com GNPE revela padrão difuso e proliferativo,
informação previamente conhecida pelo médico diante de um quadro clínico de Síndrome Nefrítica
sugestivo de GNPE. Porém, conforme dito anteriormente, em casos atípicos o encontro desses achados é
importante para confirmar a suspeita ou apontar para outro diagnóstico etiológico.

➢ RESTRIÇÃO HIDROSSALINA, DIURÉTICO DE ALÇA E ANTIBIÓTICOTERAPIA NO


TRATAMENTO DA GNPE: O tratamento inicial dos quadros de GNPE consiste nesse tripé, conforme
será explicado. Ressalta-se que nenhuma dessas três condutas visa o tratamento etiológico do quadro, mas
sim o manejo das manifestações clínicas, que comprometem o bem estar e oferecem risco de complicação
ao paciente. Nesse sentido, a restrição hidrossalina e o uso de diurético de alça, como a Furosemida, são
recomendados para reduzir o acúmulo de água no paciente, respectivamente, por meio da redução na
entrada de líquido e facilitação à saída. Dessa forma, haverá menor volume de água para acumular na rede
vascular do paciente e, consequentemente, uma amenização da hipertensão arterial e do edema. Já a
antibioticoterapia, na maioria das vezes, é recomendada objetivando a prevenção da disseminação de cepas
nefrogênicas e ocorre por meio da administração de Penicilina Benzatina em dose única. Por fim, existem
outros métodos terapêuticos que podem ser adotados de acordo com a evolução do quadro, conforme será
visto abaixo.

− Vasodilatadores diretos: Caso o paciente não responda bem ao diurético no tocante à hipertensão
arterial, é possível experimentar o uso desses fármacos.

− Terapia de substituição renal (Hemodiálise ou diálise peritoneal): A maioria dos casos não chega
a precisar dessa abordagem terapêutica. Contudo, caso o paciente se encontre em insuficiência renal
aguda, essa modalidade terapêutica costuma ser bem sucedida na resolução do quadro e, geralmente,
ocorre apenas durante o período de recuperação da função renal do paciente.

− Nitroprussiato: A encefalopatia hipertensiva é uma das complicações da hipertensão arterial presente


na síndrome nefrítica. Caso haja esse desfecho, recomenda-se o uso de Nitroprussiato.

➢ CONSIDERAÇÕES FINAIS: Conforme já mencionado, é esperado oligúria até o 7º dia de início da


Síndrome Nefrítica causada por GNPE, bem como hipocomplementemia até a 8ª semana. A hematúria
macroscópica, também já mencionada, demora, no máximo, 4 semanas para desaparecer, contudo, a
hematúria microscópica pode perdurar por 1 a 2 anos. Já a proteinúria sub-nefrótica pode durar de 2 a 5
anos, inclusive, existem referências que consideram duração desse achado por até 10 anos. Por fim, diante
do exposto, deve-se destacar que hematúria microscópica e proteinúria leve não são parâmetros de
acompanhamento da GNPE.
10

DOENÇA DE BERGER
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ VISÃO GERAL: Consiste na glomerulopatia primária mais frequente, acometendo preferencialmente


homens (2:1) entre 10 e 40 anos. Do ponto de vista fisiopatológico, a Doença de Berger decorre do depósito
granular de IgA no mesângio, o que pode resultar em 5 formas da doença, conforme será discorrido nos
próximos tópicos.

TIPOS DA DOENÇA DE DERGER

1. Hematúria Microscópica Recorrente


2. Hematúria Macroscópica Persistente
3. Síndrome Nefrítica
4. Síndrome Nefrótica
5. Glomerulonefrite Rapidamente Progressiva

➢ HEMATÚRIA MICROSCÓPICA RECORRENTE: Representa 40% a 50% dos casos de Doença de


Berger, sendo o tipo da doença que cursa com melhor prognóstico. De forma didática é possível
compreender a Hematúria Macroscópica Recorrente como uma espécie de “asma glomerular”, tendo em
vista que o paciente apresenta um glomérulo hiper-reativo, que responde com hematúria macroscópica
diante de situações de estresse, como infecções, vacinação e exercícios físicos vigorosos, por exemplo.

➢ HEMATÚRIA MICROSCÓPICA PERSISTENTE: É o segundo tipo mais comum da Doença de


Berger, englobando 30% a 40% dos casos. Neste contexto, o paciente apresenta hematúria dismórfica
microscópica persistente, bem como pode apresentar quadros de hematúria macroscópica diante de
situações de estresse, conforme descrito no tópico anterior. Tendo em vista que o rim do paciente com
Hematúria Microscópica Persistente está constantemente inflamado, mesmo que em pequena intensidade,
pode haver também episódios de proteinúria sub-nefrótica.

➢ SÍNDROME NEFRÍTICA: Representa cerca de 10% dos casos de Doença de Berger, que, neste caso, é
um diagnóstico diferencial de GNPE. Dessa forma, a diferenciação entre as duas condições pode ser feita
na medida em a Nefropatia por IgA não cursa com hipocomplementemia, bem como não respeita o período
de incubação entres a manifestações clínicas da Síndrome Nefrítica e de uma infecção prévia em outro
sítio, como ocorre na GNPE.
➢ SÍNDROME NEFRÓTICA E GLOMERULONEFRITE RAPIDAMENTE PROGRESSIVA
(GNRP): A Síndrome Nefrótica também ocorre em 10% dos pacientes com Doença de Berger. Já a
Glomerulonefrite Rapidamente Progressiva acomete cerca de 5% dos pacientes com a Nefropatia por IgA
e será abordada de forma mais complexa em outro material do módulo de nefrologia.

➢ DIAGNÓSTICO LABORATORIAL: Os achados laboratoriais mais frequentes em pacientes com


Doença de Berger são hematúria dismórfica, complemento normal, aumento sérico de IgA (50% dos
casos) e depósito de IgA em vasos e pele (50% dos casos).

➢ BIÓPSIA: A avaliação histológica deve ser recomendada nos pacientes com suspeita de Doença de Berger
que cursam com Síndrome Nefrítica, proteinúria acima de 500 mg/dia e insuficiência renal. Ressalta-se
que, conforme dito no material de Síndrome Nefrótica, a suspeita de GNPE, principal etiologia desse
quadro sindrômico, não carece de biópsia inicialmente, porém, quando a apresentação clínica foge a regra,
como é o caso do achado laboratorial de complemento normal, deve-se solicitar a avaliação histológica.

➢ TRATAMENTO: A corticoterapia é recomendada em pacientes com proteinúria acima de 1g/dia,


Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS), creatinina acima de 1,5 mg/dl ou alterações à biópsia sugestivas de
mal prognóstico, como “crescentes”. Além disso, o uso de IECA e BRA também pode ser avaliado,
especialmente em pacientes com proteinúria acima de 1g/dia e/ou HAS.

➢ PROGNÓSTICO: Considerando que o tipo mais frequente da Doença de Berger é a Hematúria


Macroscópica Recorrente, bem como um percentual dos outros tipos que possui uma evolução satisfatória,
sabe-se que cerca de 60% dos pacientes com Doença de Berger apresentam bom prognóstico. Já no caso
da Hematúria Microscópica Persiste, o paciente tem um estado inflamatório crônico, o que justifica a
evolução lenta para insuficiência renal observada em aproximadamente 40% dos pacientes. Por fim, menos
de 5% dos pacientes apresentam remissão completa, bem como é rara a evolução rápida para insuficiência
renal.

FATORES DE MAU PROGNÓSTICO

1. Idade avançada ao diagnóstico


2. Sexo masculino
3. Creatinina maior que 1,5 mg/Dl ao diagnóstico
4. HAS
5. Proteinúria persistente > 1g/dia
6. Ausência de hematúria macroscópica
7. Depósito de IgA nas alças capilares
12

GLOMÉRULO NEFRITE

RAPIDAMENTE PROGRESSIVA
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ DEFINIÇÃO: A Glomerulonefrite Rapidamente Progressiva (GNRP) consiste em uma manifestação da


síndrome nefrítica, cuja evolução é rápida e, na ausência de intervenção, capaz de levar à falência renal
em um curto intervalo de tempo. Com relação à etiologia, qualquer causa de síndrome nefrítica, isto é, de
inflamação do glomérulo, é capaz de levar a este quadro. Contudo, deve-se ressaltar que foi percebido que
os processos inflamatórios que cursam com agressões à membrana basal são mais propensos a evoluírem
para a GNRP.

➢ QUANDO SUSPEITAR E CONDUTA EM CASOS SUSPEITOS: Diante de uma evolução atípica da


síndrome nefrítica, conforme já abordado na aula de síndrome nefrítica, há a indicação de biópsia renal,
sendo uma das principais indicações para tal conduta o diagnóstico e consequente intervenção precoce em
quadros de GNRP. Além da biópsia, a corticoterapia também já deve ser iniciada em paciente com quadro
clínico de síndrome nefrítica atípica e suspeito de GNRP, tendo em vista o objetivo de evitar a progressão
do processo de fibrose em glomérulos ainda hígidos.

➢ ACHADOS NA BIÓPSIA: O principal achado microscópico são as crescente em mais de 50% dos
glomérulos de rápida instalação, o que é conhecido a partir da associação entre interpretação do exame e
a história clínica. Ressalta-se que um glomérulo tomado por crescentes pode ser descrito como um
glomérulo associado ao extravasamento de monócitos e fibrina para o espaço glomerular, bem como
tomado por capilares esmagados por esses produtos inflamatórios.

➢ TIPOS DE GNRP: Os quadros de GNRP podem ser classificados em tipos I, II e III, sendo os dois últimos
mais frequentes dentro do espectro da doença, conforme será abordado abaixo.

→ GNRP do tipo I: Responde por 10% dos casos de GNRP, sendo a Síndrome de Goodpasture a
principal doença que cursa com essa manifestação de glomerulonefrite fulminante. Ademais, a
principal característica desses quadros são os depósitos de anticorpo anti-MBG.

→ GNRP do tipo II: Responsável por 45% dos casos de GNRP, é marcada por depósitos de
imunocomplexos. Dentre as causas bases que podem evoluir para esse tipo da destruição rápida dos
rins, destacam-se a Doença de Berger, Glomerulonefrite pós-estreptocócica, endocardite, hepatites
virais e Lúpus Eritematoso Sistêmico.
→ GNRP do tipo III: Também é responsável por 45% dos casos de GNRP e se diferencia das demais,
do ponto de vista propedêutico, por apresentar imunofluorescência escura, já que, diferentemente das
demais, não conta com a participação de anticorpos na mediação do seu processo fisiopatológico.
Dentre as etiologias dessa manifestação da GNRP, destaca-se a Doença de Wegner e as vasculites
ANCA +.

➢ SÍNDROME DE GOODPASTURE: Dentre as doenças de base que cursam com GNRP e de origem
renal, a Síndrome de Goodpasture foi a única não estudada até então no módulo de nefrologia. Nesse
sentido, essa síndrome acomete preferencialmente homens (6:1) entre 20 e 30 anos, possui o tabagismo
como importante fator de risco e, conforme já sugerido, tem sua patogênese marcada pelo depósito de
anticorpos anti-MBG nas membranas basais dos glomérulos e dos alvéolos pulmonares. Como
consequência disso ocorre a agressão desses locais e, clinicamente, o paciente pode cursar com uma
síndrome pulmão-rim, caracterizada por sintomas semelhantes os observados em uma GNRP clássica,
porém associados à manifestação de hemoptise. Do ponto de vista propedêutico, a dosagem de anti-MBG
pode sugerir o diagnóstico, entretanto, o diagnóstico conclusivo ocorre a partir de biópsia com
imunofluorescência de padrão linear e, em casos já mais avançados, com visualização de crescentes à
microscopia. Por fim, com relação ao tratamento, a primeira conduta a ser adotada deve ser o plasmaférese,
objetivando a “lavagem” dos anticorpos agressores presentes no sangue. Além dessa conduta, recomenda-
se corticoterapia associada a uso de imunossupressor (Azatioprina ou Ciclofosfamida).

➢ O PAPEL DO COMPLEMENTO NA DIFERENCIAÇÃO DOS QUADROS DE SÍNDROME


NEFRÍTICA: O complemento será consumido nos casos de GNPE, glomerulonefrite infecciosa não
GNPE e de Lúpus Eritematoso Sistêmico. Já nos casos de Doença de Berger, Doença de Goodpasture e
vasculites, no geral, o complemento apresentará dosagem dentro dos valores de referência.
14

SÍNDROME NEFRÓTICA

INTRODUÇÃO
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

DEFINIÇÃO

Proteinúria > 3,5 g/dia (adultos)

Proteinúria > 40 mg/kg/dia ou > 40 mg/m2/h ou


relação proteína/creatinina > 2 (crianças)

➢ O PAPEL DO EAS NA SÍNDROME NEFRÓTICA: A partir do exame de urina simples não é possível
dar o diagnóstico, mas a presença de proteinúria, principalmente quando associado a outros achados,
sugere investigação de síndrome nefrítica. Nesse sentido, ressalta-se que em questões de prova é preciso
estar atento ao entorno do paciente diante da informação de proteinúria no EAS, pois é possível que seja
o único exame indicativo de síndrome nefrótica.

➢ A MEMBRANA BASAL NA FISIOPATOLOGIA DA SÍNDROME NEFRÓTICA: A filtração das


proteínas presentes no plasma que alcança os glomérulos possui duas barreiras de filtração, em especial,
sendo uma física e outra elétrica. As fendas de filtração, formadas pelos prolongamentos dos podócitos,
impedem a passagem de proteínas grandes, contudo, a albumina possui um tamanho pequeno e capaz de
ultrapassar essa barreira física. Todavia, a membrana basal oferece uma barreira elétrica ao glomérulo,
devido ao seu caráter elétrico negativo. Dessa forma, proteínas que apresentam carga negativa, como a
albumina, antitrombina III, algumas imunoglobulinas e a transferrina são perdidas. Diante do exposto,
conclui-se que na síndrome nefrótica a agressão à barreira de filtração envolve a membrana basal.

➢ CONSEQUÊNCIAS DA PROTEÍNÚRIA NEFRÓTICA: As proteínas desempenham diferentes papéis


no nosso organismo e a perda delas pode cursar com diversas consequências, como as descritas abaixo.
Conforme já ressaltado, na Síndrome Nefrótica, ocorre uma perda, preferencialmente, de proteínas de
carga negativa e de menor tamanho. Dessa forma, o fígado pode responder à hipoalbuminemia com a
produção de outras proteínas e substâncias que, caso apresentem características que as impeçam de passar
pela barreira de filtração, terão sua concentração plasmática aumentada.

→ Edema: Tendo em vista que a albumina é a principal atuante na determinação da pressão oncótica
sanguínea, a hipoalbuminemia cursa com a redução da pressão oncótica vascular e, por fim, edema.
→ Estado pró-trombótico: A antitrombina III, cofator para a ação da heparina, também é perdida
nesses quadros e, portanto, sua perda aumenta a predisposição à formação de trombos.

→ Anemia ferropriva irresponsiva à suplementação de ferro: Essa condição decorre da perda de


transferrina, que, por sua vez, é um transportador fundamental ao metabolismo do ferro.

→ Dislipidemia: Como mecanismo compensatório à queda da pressão oncótica, ocorre um aumento


na produção hepática de lipídeos e lipoproteínas. Dessa forma, é possível também observar no exame
de urina a presença de lipidúria e cilindros graxos.

→ Aumento sérico de alfa-2-globulina: O aumento da produção hepática dessa proteína também


decorre de um mecanismo compensatório, porém, devido ao seu tamanho molecular, é retida pelos
rins.

➢ ESPUMÚRIA E EDEMA SÃO AS PRIMEIRAS MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS: Apesar de ser um


diagnóstico sindrômico, a síndrome nefrótica é definida pela proteinúria, isto é, um achado laboratorial.
Clinicamente, a proteinúria pode se manifestar por meio de espumúria, bem como por meio de edema,
devido à queda na pressão oncótica vascular. Contudo, ao longo do tempo, a perda proteica e a dislipidemia
compensatória podem cursar com complicações, conforme será abordado à diante.

➢ TROMBOSE DE VEIA RENAL: Conforme já comentado, a perda da antitrombina III na síndrome


nefrótica aumenta a predisposição à formação de trombos. Nesse sentido, especialmente na
Glomerulopatia Membranosa, bem como na Glomerulonefrite membrano-proliferativa e na Amiloidose,
o paciente, além de trombose venosa profunda, pode apresentar também a trombose de veia renal.
Conforme será visto abaixo, esse evento vascular pode se manifestar diferentemente, de acordo com a veia
renal acometida e com o sexo do paciente.

→ Trombose de veia renal (dor lombar, assimetria renal e hematúria): A obstrução dessa veia, em
ambos os lados e sexos, impede a drenagem do sangue venoso oriundo dos rins, que, por sua vez,
passa a se acumular no órgão. Consequentemente a isso, pode haver distensão da cápsula renal,
resultando em dor lombar e assimetria renal. Ademais, o aumento da pressão nos vasos renais devido
ao acúmulo de sangue pode favorecer o extravasamento de hemácias, o que se manifesta através de
hematúria.

o Varicocele e trombose de veia renal esquerda em homens: Deve-se ressaltar que, nos homens, a
veia gonadal (testicular) esquerda drena para a veia renal esquerda. Portanto, nos homens, a
trombose renal esquerda, além das manifestações clínicas já descritas, pode cursar também com
varicocele.
➢ PERITONITE BACTERIANA: Devido ao edema, consequente à hipoalbuminemia sérica da síndrome
nefrótica, é possível o surgimento de ascite. Tendo em vista também que esse líquido oriundo dos vasos
sanguíneos é pobre em IgG, perdido pelo rim, o peritônio se torna um sítio predisposto a ser acometido
por infecção bacteriana, especialmente pelo estreptococos pneumoniae (pneumococo).

➢ ATEROGENESE ACELERADA: O aumento da produção hepática compensatória de lipídeos e


lipoproteínas favorece um surgimento rápido de placas de ateroma. Associado a isso, o estado pró-
trombótico da síndrome nefrótica também contribui nesse sentido, já que contribui à formação de trombos
nos locais de desprendimento das placas ateromatosas.
17

SÍNDROME NEFRÓTICA

ETIOLOGIAS
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

CAUSAS DE SÍNDROME NEFRÓTICA

1. Doença por lesão mínima


Criança, fusão e retração dos processos podocitários e bom prognóstico.

2. Glomeruloesclerose focal segmentar


Principal etiologia em adultos; associada a situações de sequela renal, hiperfluxo e
sobrecarga.

3. Glomerulonefrite proliferativa mensangial


Rara e pouco cobrada em provas.

4. Glomerulopatia membranosa
Depósitos de imunocomplexos na membrana basal; 50% dos casos cursa com trombose de
veia renal; proteinúria intensa.

5. Glomerulonefrite membranoproliferativa (mesangiocapilar)


Importante diagnóstico diferencial de GNPE; dupla camada à microscopia óptica; segunda
etiologia nefrótica que mais cursa com trombose de veia renal; hipocomplementemia.

➢ DOENÇA POR LESÃO MÍNIMA: Representa aproximadamente 85% dos casos de Síndrome Nefrótica
em crianças e, geralmente, cursa com bom prognóstico. Com relação à fisiopatologia, decorre de um
processo inflamatório que promove a fusão e retração dos processos podocitários com comprometimento
associado da membrana basal, que, por sua vez, perde seu caráter elétrico negativo. Do ponto de vista
clínico, a doença se manifesta por meio de uma síndrome nefrótica clássica intermitente, isto é, que
intercala períodos de atividade e remissão. Tendo em vista o bom prognóstico da doença e a necessidade
da microscopia eletrônica para uma melhor visualização histológica, o quadro, inicialmente, dispensa a
realização de biópsia, sendo a corticoterapia a conduta inicial. Por fim, seguem abaixo algumas
observações da doença por lesões mínimas que auxiliam na diferenciação entre as classificações
etiológicas da síndrome nefrótica
TÓPICOS IMPORTANTES DA DOENÇA POR LESÕES MÍNIMAS

1. É a única etiologia de síndrome nefrótica que dispensa a biópsia em um momento inicial.


2. Laboratorialmente, não cursa com alterações de complemento.
3. Quando secundária, pode estar associada ao Linfoma de Hodkin e ao uso de AINES.
4. É a causa de síndrome nefrótica mais comum em crianças.
5. Apresenta o melhor prognóstico dentre as etiologias de síndrome nefrótica.

➢ GLOMERULOESCLEROSE FOCAL E SEGMENTAR: Esta etiologia, por sua vez, é a principal


responsável pela síndrome nefrótica em adultos. Com relação à fisiopatologia primária, acredita-se que
seja explicada a partir de um ataque de linfócitos aos podócitos da barreira de filtração. Contudo, nas
provas essa doença é cobrada mais frequentemente como uma manifestação secundária, por exemplo, a
sequela de doença renal, sobrecarga renal e hiperfluxo renal, conforme será melhor abordado abaixo. Do
ponto de vista clínico, manifesta-se, especialmente, por meio de proteinúria e suas complicações, como a
hipertensão arterial, que também pode ser a doença de base em um quadro de GEFS secundária. Já na
esfera da propedêutica, recomenda-se a realização de biópsia. No tocante ao tratamento, deve-se adotar a
corticoterapia (remissão em 40% a 60% dos casos), bem como avaliar a prescrição de nefroproteção
através de fármacos da classe dos IECAs ou BRAs. Por fim, abaixo serão abordados um “macete” para as
causas primárias de GEFS secundárias abordadas nas provas, bem como o mecanismo de nefroproteção
dos IECAs e BRAs.

MACETE PARA AS CAUSAS PRIMÁRIAS DE GEFS SECUNDÁRIA NAS PROVAS DE


RESIDÊNCIA MÉDICA

Nas provas de residência, quando questionada q etiologia de uma síndrome nefrótica secundária, a
resposta sempre será GEFS, caso não haja nenhuma das doenças de base abaixo.

- Linfoma de Hodkin e uso de AINES: Associações mais frequentes na doença por lesões mínimas.

- Neoplasias, Lúpus Eritematoso Sistêmico, Hepatite B e uso de captopril, AINES, sais de ouro e D-
Penicilamina: Associações mais frequentes na Glomerulopatia Membranosa.

- Hepatite C e endocardite: Associações mais comuns na Glomerulonefrite Membrano-proliferativa.

A NEFROPROTEÇÃO DOS IECA E BRA

Situações de hipoperfusão renal e/ou de aumento da concentração de cloreto de sódio nas porções
distais dos túbulos renais ativam o sistema renina angiotensina aldosterona. Dentre os diversos
efeitos disso, a vasoconstrição promovida pela angiotensina II a nível glomerular ocorre em maior
intensidade na arteríola eferente, aumentando, dessa forma, a sobrecarga renal. Sendo assim,
fármacos que inibem a formação de angiotensina II, como os IECA e os BRA, possuem efeito
nefroprotetor e, portanto, podem ser considerados em alguns quadros de síndrome nefrótica, como na
GEFS.
MACETE PARA AS CAUSAS PRIMÁRIAS DE GEFS SECUNDÁRIA NAS PROVAS DE
RESIDÊNCIA MÉDICA

Nas provas de residência, quando questionada q etiologia de uma síndrome nefrótica secundária, a
resposta sempre será GEFS, caso não haja nenhuma das doenças de base abaixo.

- Linfoma de Hodkin e uso de AINES: Associações mais frequentes na doença por lesões mínimas.

- Neoplasias, Lúpus Eritematoso Sistêmico, Hepatite B e uso de captopril, AINES, sais de ouro e D-
Penicilamina: Associações mais frequentes na Glomerulopatia Membranosa.

- Hepatite C e endocardite: Associações mais comuns na Glomerulonefrite Membrano-proliferativa.

A NEFROPROTEÇÃO DOS IECA E BRA

Situações de hipoperfusão renal e/ou de aumento da concentração de cloreto de sódio nas porções
distais dos túbulos renais ativam o sistema renina angiotensina aldosterona. Dentre os diversos
efeitos disso, a vasoconstrição promovida pela angiotensina II a nível glomerular ocorre em maior
intensidade na arteríola eferente, aumentando, dessa forma, a sobrecarga renal. Sendo assim,
fármacos que inibem a formação de angiotensina II, como os IECA e os BRA, possuem efeito
nefroprotetor e, portanto, podem ser considerados em alguns quadros de síndrome nefrótica, como na
GEFS.

➢ GLOMERULONEFRITE PROLIFERATIVA MENSANGIAL: Representa 5% a 10% das causas de


síndrome nefrótica primária e é pouco abordada nas provas de residência médica. Do ponto de vista
fisiopatológico, está associada à proliferação do mesângio e, portanto, clinicamente, é esperada hematúria
além, obviamente, da proteinúria. Apesar da resposta não ser muito satisfatória, o tratamento ocorre por
meio de corticoterapia e, mais uma vez, deve-se avaliar a prescrição de nefroproteção.

➢ GLOMERULOPATIA MEMBRANOSA: Consiste na segunda causa mais frequente de síndrome


nefrótica nos adultos. Do ponto de vista fisiopatológico, pode ser explicada por depósitos subepiteliais de
imunocomplexos e consequente espessamento da membrana basal. Clinicamente, o paciente manifesta
quadro de síndrome nefrótica com proteinúria intensa. Tendo em vista as associações que a glomerulopatia
membranosa possui com doenças primárias alarmantes, pacientes com essa classificação etiológica de
síndrome nefrótica devem ser rastreados para as neoplasias mais frequentes, bem como para Lúpus
Eritematoso Sistêmico e Hepatite B. Ainda, o prognóstico é variável, o tratamento é feito com
nefroproteção (IECA ou BRA e/ou estatina) e, considerando o risco de trombose de veia renal, pode contar
também com anticoagulação profilática. Por fim, abaixo seguem alguns tópicos-chave para a memorização
da glomerulopatia membranosa, bem como os sinais de bom prognóstico que indicam bom prognóstico.
TÓPICOS IMPORTANTES DA GLOMERULOPATIA MEMBRANOSA

- É a classificação etiológica de síndrome nefrótica que mais cursa com trombose de veia renal (50%
dos casos) e, portanto, a anticoagulação deve ser avaliada na abordagem terapêutica.

- Laboratorialmente, não cursa com alteração de complemento.

- IECA e BRA, especialmente o Captopril, podem ser causa de Glomerulopatia Membranosa, contudo,
mesmo nesses casos o uso desses medicamentos com finalidade nefroprotetora pode ser considerado.

- Quando secundária, a glomerulopatia membranosa pode ter como doença de base, principalmente,
neoplasias, Lúpus Eritematoso Sistêmico, Hepatite B e uso de drogas, como sais de ouro, IECA,
AINES e D-Penicilamina.

SINAIS DE BOM PROGNÓSTICO NA GLOMERULOPATIA MEMBRANOSA

- Idade jovem

- Sexo feminino

- Proteinúria < 10 g/dia

- Albumina sérica > 2,5 g/l

- Ausência de fenômeno tromboembólico

- Ausência de insuficiência renal

- Ausência de alterações túbulo-intersticiais à biópsia.

➢ GLOMERULONEFRITE MEMBRANO-PROLIFERATIVA: A Glomerulonefrite membrano-


proliferativa se caracteriza, histologicamente, por uma intensa proliferação mesangial, que leva ao
afastamento entre a membrana basal e o endotélio fenestrado, dando o aspecto de dupla camada na
microscopia óptica. Semelhantemente ao que ocorre na Síndrome Nefrítica, o paciente na glomerulonefrite
membranoproliferativa apresentará uma dificuldade na formação do filtrado glomerular e, portanto,
cursará com oligúria, hipertensão arterial e edema. Além disso, tendo em vista o acometimento do
mesângio, o paciente apresenta hematúria também. Dessa forma, percebe-se que há uma manifestação
clínica da síndrome nefrítica nesse caso, porém o acometimento da membrana basal e a consequente
proteinúria maciça tornam a glomerulonefrite membrano-proliferativa em uma classificação etiológica de
síndrome nefrótica. Nesse contexto, ressalta-se ainda que a glomerulonefrite membrano-proliferativa é o
grande diagnóstico diferencial da glomerulonefrite pós-estreptocócica (GNPE), tendo em vista que, além
de aspectos clínicos semelhantes, também há consumo de complemento do ponto de vista laboratorial,
bem como história prévia de infecção de via aérea superior em 50% dos casos. Sendo assim, a
diferenciação entre esses dois quadros pode ser observada na evolução do paciente, visto que aqui a
hipocomplementemia persiste por mais de 8 semanas, a proteinúria geralmente é maciça e persistente por
mais de 4 semanas e, por fim, o intervalo entre um quadro de IVAS, quando presente, e o quadro renal
não respeita o período de incubação. Quanto ao tratamento, recomenda-se a adoção de nefroproteção
(IECA ou BRA e/ou estatina), a avaliação do uso de corticoterapia e, em quadros graves, a
imunossupressão.

TÓPICOS IMPORTANTES DA GLOMERULONEFRITE MEMBRANO-PROLIFERATIVA

- É o grande diagnóstico diferencial da GNPE, devido à clínica de síndrome nefrítica, ao consumo de


complemento e à associação com infecções de via aérea superior.

- É a única classificação etiológica de síndrome nefrótica que cursa com consumo de complemento
(hipocomplementemia).

- É a segunda causa de síndrome nefrótica que mais evolui com trombose de veia renal.

- Sua fisiopatologia é marcada pela formação de uma dupla camada entre a membrana basal e o
endotélio fenestrado.

- Quando secundária a uma causa base, a hepatite C é a mais frequentemente abordada nas provas.
22

TROMBOSE GLOMERULAR
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ EPIDEMIOLOGIA: A trombose glomerular consiste em um acometimento dos glomérulos que tem seus
casos com incidência, especialmente, em países subdesenvolvidos e/ou em crianças com idade entre 2 e 4
anos. Ressalta-se que esses fatores de risco se relacionam a duas características da trombose glomerular,
isto é, origem infecto-parasitária (países subdesenvolvidos) e transmissão por meio de água, alimentos ou
objetos contaminados por fezes (crianças).

➢ A CEPA O157:H7 DA E. COLI É A RESPONSÁVEL PELO QUADRO: Ao ser contaminado pela


cepa O157:H7 da bactéria Escherichia Coli, ocorre a produção da toxina SHIGA TOXINA pelo
microrganismo em questão. Na sequência, essa toxina promove lesão do endotélio glomerular, o que cursa,
consequentemente, com o estímulo do sistema de coagulação de forma difusa nos glomérulos renais e, por
fim, com a formação de trombos nos glomérulos.

➢ INSUFICIÊNCIA RENAL AGÚDA, PLAQUETOPENIA E ANEMIA HEMOLÍTICA


CONSTITUEM A TRÍADE CLÍNICA DA TROMBOSE GLOMERULAR: A instalação de trombos
nos glomérulos de forma difusa leva o paciente a um quadro de injúria renal aguda. Ademais, a
hiperativação do sistema de coagulação leva a um enorme consumo de plaquetas, resultando em
plaquetopenia. Por fim, as hemácias, ao tentar passar pelos trombos de textura irregular, são destruídas, o
que justifica a instalação de anemia hemolítica microangiopática. Ressalta-se que os fragmentos de
hemácia destruídos e visualizados por microscopia na circulação periférica são denominados esquizócitos.

➢ O TRATAMENTO É CENTRADO NO SUPORTE DO PACIENTE: Inicialmente, deve-se ressaltar


que a antibioticoterapia é contraindicada nos casos de trombose glomerular, pois, apesar de atuar na
tentativa de eliminação da bactéria, esses fármacos estimulam maior liberação da toxina SHIGA TOXINA
e, portanto, pioram o quadro. Nesse sentido, tendo em vista o caráter autolimitado do quadro em 7 a 21
dias, a recomendação é o suporte do paciente.
23

FISIOLOGIA RENAL

ASPECTOS DO SISTEMA TUBULAR


Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ TÚBULO CONTORCIDO PROXIMAL: O túbulo contorcido proximal se destaca por realizar quase
toda a reabsorção da glicose e dos aminoácidos, bem como por ser o principal local de reabsorção do
bicarbonato. Ressalta-se que, em condições normais, praticamente toda a quantidade de glicose,
aminoácidos e bicarbonato presentes no filtrado glomerular é reabsorvida nos túbulos. Além disso, nesse
nível, ocorre também a reabsorção de frações de ureia, água, sódio, cloreto, bem como a secreção de
frações de hidrogênio, conforme será visto abaixo.

→ Reabsorção de sódio, glicose e aminoácidos: As células do túbulo contorcido proximal contam com
a bomba de sódio e potássio em sua porção que estabelece contato com o interstício (lado oposto ao
lúmen tubular). Dessa forma, o sódio do meio intracelular é direcionado para o interstício por
transporte ativo primário com consequente armazenamento de energia potencial. Do outro lado, a
porção das células epiteliais em contato com o lúmen tubular dispõem de proteínas transportadoras de
sódio e glicose, bem como de sódio e aminoácidos, que realizam transporte ativo secundário. Sendo
assim, o sódio se liga a essas proteínas e, ao seguir para o meio intracelular, por transporte passivo,
libera a energia potencial armazenada, que, por sua vez, é usada para o transporte da glicose ou do
aminoácido. Por fim, o sódio pode ser reabsorvido, passivamente, por outras proteínas que permitam
a sua passagem.

→ Reabsorção de água: O túbulo proximal é altamente permeável à água, que é reabsorvida por osmose,
principalmente, através das junções oclusivas.

→ Reabsorção de cloreto: Os íons cloreto pode ser reabsorvidos tanto por transporte ativo quanto por
transporte passivo. Com relação ao transporte passivo, as reabsorções de sódio e água determinam a
reabsorção de cloreto, tendo em vista a necessidade de alcançar o equilíbrio iônico e osmolar,
respectivamente.

→ Reabsorção de ureia: À medida em que a água vai sendo reabsorvida no túbulo contorcido proximal,
a contração luminal de ureia aumenta e, por transporte passivo, uma pequena porção dessa excreta
nitrogenada é reabsorvida no túbulo contorcido proximal.
→ Secreção de hidrogênio e reabsorção de bicarbonato: O CO2 que alcança, passivamente, o meio
intracelular do epitélio de revestimento do túbulo contorcido proximal reage com a água, por ação da
enzima anidrase carbônica, gerando ácido carbônico, que se dissocia em íons hidrogênio e bicarbonato.
Posteriormente, na porção do epitélio em contato com o lúmen tubular, existem proteínas que realizam
o contratransporte de sódio e hidrogênio. Nesse sentido, o sódio deixa o lúmen tubular por transporte
passivo, liberando a energia potencial armazenada pela atividade da bomba de sódio e potássio, o que
permite a secreção de hidrogênio contra o gradiente de concentração no lúmen tubular. Quanto ao
bicarbonato, a fração formada a partir da dissociação do ácido carbônico no meio intracelular segue
para o interstício por transporte passivo. Já o bicarbonato presente no filtrado que chega ao túbulo
contorcido proximal reage com íons hidrogênio no lúmen tubular, formando, dessa forma, o ácido
carbônico, que, na sequência se dissocia em H2O e CO2. Ainda, o dióxido de carbono, por transporte
passivo, segue para o meio intracelular.

➢ ALÇA DE HENLE: Pode ser subdividida em duas porções, denominadas porção descendente fina e
porção ascendente espeça. A porção descendente fina é responsável por reabsorver cerca de 20% da água
presente no filtrado renal, bem como alguns solutos que fluem contra o lúmen por osmose. Já a porção
ascendente espessa reabsorve quantidades significativas de diversos íons, contudo, deve-se chamar a
atenção para a reabsorção de sódio, cloreto e potássio que ocorre nessa porção do túbulo renal, através do
cotransportador 1-sódio, 2-cloreto, 1-potássio. Destaca-se também um mecanismo de contratransporte de
sódio e hidrogênio presente na porção ascendente espessa da alça de henle.

→ Cotransportador 1-sódio, 2-cloreto, 1 potássio: O sódio, por transporte passivo, segue para o meio
intracelular do epitélio tubular e, devido a isso, promove a liberação da energia potencial armazenada
a partir da atividade da bomba de sódio e potássio, conforme já discutido. Consequentemente, o
gradiente energético liberado permite o transporte ativo de potássio do lúmen tubular para o meio
intracelular do epitélio tubular contra o gradiente de concentração do íon. Por fim, devido à reabsorção
de duas cargas positivas, o cloro é reabsorvido, passivamente, no intuito de manter o equilíbrio iônico.

➢ TUBULO CONTORCIDO DISTAL INICIAL: O túbulo contorcido distal é dividido em porções inicial
e distal, que por sua vez apresentam diferentes características. Nesse sentido, a parte inicial do túbulo
contorcido distal abriga as células da mácula densa, que, de acordo com a concentração de cloreto de sódio
percebida, regulam o sistema renina-angiotensina-aldosterona. Ademais, essa porção tem como
característica o potencial de reabsorção da maioria dos íons e a impermeabilidade à água e à ureia.

➢ TÚBULO CONTORCIDO DISTAL FINAL E TÚBULO COLETOR CORTICAL: O túbulo coletor


é dividido em parte cortical e parte medular, sendo as características da parte cortical semelhantes às da
parte final do túbulo contorcido distal, o que motiva o entendimento dessas duas divisões como uma única
estrutura dentro do sistema tubular renal. Nesse sentido, é nesse nível que ocorre a atuação de hormônios
conhecidos, como a aldosterona e o hormônio antidiurético (ADH). Além disso, essa região do túbulo
renal é de suma importância na regulação ácido-base.

→ Aldosterona: Quando liberada, a aldosterona permite a reabsorção passiva de sódio acompanhada


pela secreção também passiva de potássio ou hidrogênio, processos que envolvem células chamadas
“células principais”.

→ Hormônio antidiurético ou vasopressina: Este hormônio é o principal responsável pela regulação


da osmolaridade da urina. Diante de situações de déficit hídrico ocorre o aumento da osmolaridade
extracelular, que consiste no aumento da concentração plasmática de sódio. Nesses casos, ocorre o
“murchamento” de células osmorreceptoras localizadas no hipotálamo anterior e, consequentemente,
no disparo de potenciais de ação que estimulam a secreção do ADH armazenado na hipófise posterior.
Ao alcançar o rim, o hormônio antidiurético se liga nos receptores vasopressina 2, localizados no
túbulo coletor cortical, o que cursa com o aumento dos canais aquaporina 2 no túbulo contorcido distal
final e em todo o túbulo coletor, aumentando a permeabilidade à água nessa região. Por fim, ressalta-
se que, além da osmolaridade extracelular, reduções da pressão arterial e/ou do volume sanguíneo
consistem em gatilhos para o estimulo da secreção de ADH, a partir da atividade dos barorreceptores
presentes no arco aórtico, seio carotídeo e átrios cardíacos, bem como os reflexos cardiopulmonares.

→ Regulação ácido-base: Adjacente às células principais existem as células intercaladas, que podem ser
do tipo A ou do tipo B. À medida em que as células principais secretam íons de hidrogênio por ação
da aldosterona, o pH urinário vai reduzindo até chegar em um momento no qual o gradiente de
concentração do lúmen se torna muito superior ao do meio intracelular. Diante disso, a regulação dos
íons hidrogênio passa a ser feita pelas células intercalares do tipo A, que dispõem da proteína
hidrogênio-ATPase em sua porção apical (luminal). Além disso, deve-se ressaltar que os íons de
hidrogênio secretados são produzidos em uma reação que também libera íons de bicarbonato,
posteriormente direcionados de forma passiva para o meio extracelular, por meio de proteínas
denominadas Cl-bicarbonato, que, por sua vez, se localizam na porção basal das células intercalares
do tipo A. Por fim, as células intercalares do tipo B possuem essas mesmas proteínas de transporte,
porém em lados opostos e, dessa forma, são capazes de reter íons de hidrogênio e secretar íons de
bicarbonato em situações de alcalose metabólica.

➢ TÚBULO COLETOR MEDULAR: Nesta porção final do túbulo renal ocorre reabsorção de água por
ação do ADH, semelhantemente ao observado no túbulo coletor cortical e no túbulo contorcido distal final.
Além disso, é no túbulo coletor medular que ocorre a maior parte da reabsorção de ureia. Por fim, há
também a reabsorção de sódio, bem como a secreção de íons hidrogênio, o que, por sua vez, ocorre através
de transporte ativo.
27

NECROSE TUBULAR AGUDA


Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ DEFINIÇÃO E CAUSAS: Do ponto de vista histológico, a necrose tubular aguda consiste na perda de
epitélio tubular em diversos pontos do parênquima renal, o que pode decorrer de condições isquêmicas ou
da ação de toxinas. Posteriormente, ocorrem os eventos elencados no fluxograma abaixo.

ISQUEMIA TOXICINA

NTA OLIGÚRICA NTA NÃO OLIGÚRICA


NECROSE DO EPITÉLIO TUBULAR E DESCAMAÇÃO DAS CÉLULAS

CHEGADA DE ELEVADA FORMAÇÃO DE PLUGS VASAMENTO DE FLUIDO DO


CONCENTRAÇÃO DE CLORETO DE OBSTRUTIVOS QUE LÚMEN DESCAMADO PARA
SÓDIO À REGIÃO DA MÁCULA DENSA LIMITAM O FLUXO TUBULAR O INTERSTÍCIO (BACKLEALK)

➢ CAUSAS: As situações que podem levar à isquemia e/ou intoxicação do epitélio tubular se encontram
descritas abaixo.

→ Choque: Nestes casos, o sistema nervoso simpático responde por meio de vasoconstrição periférica e,
consequentemente, o rim passa a conviver com hipoperfusão, resultando, dessa forma, em necrose.

→ Síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SIRS): Quadros de SEPSE, pancreatite aguda


necrosante e queimaduras extensas cursam com esse quadro. A nível renal, a SIRS cursa com lesão
endotelial resultante da hiperativação de leucócitos, complemento e fatores de coagulação. Dessa
forma, há um bloqueio da síntese local de vasodilatadores importantes produzidos pelo endotélio
(óxido nítrico e prostaglandinas). Simultaneamente, a mesma resposta inflamatória cursa com a
produção de importantes vasoconstritores sistêmicos, como endotelina, leucotrienos e tromboxano.
Sendo assim, na SIRS o sangue é desviado dos rins devido a vasodilatação renal e vasoconstrição
sistêmica.

→ Pós operatório: Nestes casos a NTA pode decorrer tanto da isquemia renal quanto da ação de toxinas.
Com relação à isquemia renal, pode ser resultante da depleção volêmica pré ou intraoperatória, bem
como do efeito de anestésicos e da hemotransfusão maciça, que, por sua vez, pode cursar com lise de
hemácias e consequente resposta inflamatória produtora de SIRS.
Ressalta-se que as três cirurgias com maior incidência de NTA são a cirurgia cardíaca, a ressecção de
aneurisma de aorta e a cirurgia hepatobiliar. Por fim, a NTA nos casos de cirurgia hepatobiliar é
causada pela ação da enterotoxina dos gram negativos entéricos, que não é degradada quando há
ausência de sais biliares, o que ocorre, por exemplo, nos pacientes com colestase.

→ Medicamentos: Dentre os medicamentos nefrotóxicos, os que podem causar NTA podem ser
classificados em dois grupos, de acordo com a presença ou não de oligúria na NTA em potencial.

− NTA sem oligúria: Nestes casos, a ação tóxica lesa diretamente o epitélio tubular, promovendo
uma queda na reabsorção renal que supera a redução da filtração glomerular que ocorre
concomitantemente. Os aminoglicosídeos são os fármacos com maior potencial de causar NTA
sem oligúria, porém outros medicamentos, como Anfotericina B, Aciclovir, Foscarnet, Indinavir,
Pentamidinina, Cisplatina, Carboplatina, Ifosfatida e Metotrexato também podem levar ao quadro
de NTA sem oligúria.

o Aminoglicosídeos: A toxicidade ocorre, principalmente, no túbulo contorcido proximal e,


portanto, promove o aumento da concentração de sódio que alcança o néfron distal. Tendo em
vista que nessa porção o sódio é reabsorvido em troca de potássio, os pacientes com NTA por
aminoglicosídeos costumam cursar com hipocalemia. Ainda, há também um
comprometimento na reabsorção feita pela porção ascendente espessa da alça de henle e, dessa
forma, o paciente costuma apresentar hipomagnesemia também. Por fim, a administração em
dose única diária dos aminoglicosídeos se relaciona a uma menor toxicidade renal do que em
doses múltiplas, sem comprometer o potencial bactericida.

− NTA com oligúria: Por outro lado, existem fármacos capazes de lesar a microvasculatura renal,
promovendo, dessa forma, um quadro de NTA com oligúria, já que o déficit maior ocorre na taxa
de filtração glomerular. Ciclosporina, contraste iodado e tracolimus são os exemplos de fármacos
que podem cursar com a NTA oligúrica.

→ Rabdomiólise: A toxicidade que a mioglobina oferece aos túbulos renais associada à vasoconstrição
arteriolar consequente aos quadros de rabdomiólise justifica a NTA.

→ Hemólise: O pigmento hemoglobina, quando livre, é filtrado nos glomérulos e tóxico ao epitélio
tubular. As causas mais frequentes de hemólise que cursam com NTA são reação transfusional
hemolítica, deficiência de G6PD e malária causada pelo Plasmodium falciparum.
→ Envenenamento: Neste caso, deve-se destacar os envenenamentos pelo anticoagulante etilenoglicol,
pelas serpentes Botrophs jararaca e Crotalus durissimus, bem como pela aranha Loxosceles sp.

− Etilenoglicol: O metabolismo desse anticoagulante leva à produção de elevada quantidade de


cristais de oxalato de cálcio nos túbulos, obstruindo-os.

− Bothrops jararaca: O veneno dessa cobra cursa com efeito tóxico direto sobre o epitélio tubular,
bem como com hemólise intravascular e trombose glomerular consequente à coagulação
intravascular disseminada.

− Crotalus durissimus: O veneno possui efeito miotóxico e, portanto, o paciente cursa com
rabdomiólise.

− Loxosceles sp.: O veneno é hemolítico e nefrotóxico.

➢ NTA OLIGÚRICA x NTA NÃO OLIGÚRICA: Conforme já mencionado, a NTA pode ser oligúrica
ou não oligúrica, sendo esse caráter determinado pela perturbação renal predominante. Nesse sentido,
quando a necrose tubular predomina sobre uma eventual lesão vascular na rede de vasos que conduz o
sangue aos glomérulos, ocorre a NTA não oligúrica. Nesses casos, a taxa de filtração glomerular pode ser
menor, porém a queda na reabsorção é mais importante e, portanto, a urina é mais diluída, podendo até se
manifestar por meio de poliúria. Ressalta-se que esses quadros de NTA não oligúrica costumam ser
decorrentes da exposição dos túbulos renais a nefrotoxinas. Já quando o comprometimento vascular é
predominante sobre a necrose tubular, a NTA é oligúrica, tendo em vista que a queda na taxa de filtração
glomerular é o principal componente fisiopatológico. Além disso, nesses casos, o filtrado reduzido
encontra um sistema tubular com maior potencial de reabsorção quando comparado ao presente nos casos
de NTA não oligúrica, intensificando ainda mais a redução no volume de urina excretado. Por fim, os
casos de NTA oligúrica costumam decorrer de etiologias isquêmicas.

➢ NTA OLIGÚRICA X INSUFICIÊNCIA RENAL AGUDA (IRA) PRÉ-RENAL: Diferentemente da


NTA, a IRA pré-renal é um quadro reversível e ocorre em situações de hipotensão, quando a pressão de
perfusão cai abaixo de 80 mmHg. Contudo, é possível diferenciar esses quadros a partir das características
abaixo. Por fim, para entender esses parâmetros é preciso ter em mente que na insuficiência pré-renal os
túbulos estão ávidos para reabsorver sódio e água na tentativa de reestabelecer a volemia, o que não ocorre
na NTA. Dessa forma, a urina do paciente com insuficiência renal pré-aguda é pobre em sódio e em água
(concentrada). Já no paciente com NTA a urina é rica em sódio e em água (diluída), tendo em vista o
déficit na reabsorção.
→ Concentração de sódio urinário: É maior na NTA (> 40 mEq/L) quando comparado à insuficiência
pré-renal (< 20 mEq/L).

→ Osmolaridade urinária: É menor na NTA (< 350 mOsm/L) quando comparada à IRA pré-renal (>
500 mOsm/L).

→ Densidade urinária: É maior na IRA pré-renal (> 1020) quando comparada à NTA (< 1015).

→ Relação creatinina urinária/creatinina sérica: É maior na IRA (> 40) quando comparado à NTA
(<20).

→ Relação ureia urinária/ureia sérica: É maior na IRA (> 8) quando comparada à NTA (<3).

→ Cilindros: Na IRA ocorre apenas a manifestação de cilindros hialinos, ao passo que na NTA os
cilindros granulosos pigmentares e/ou epiteliais se fazem presentes.

→ Relação ureia plasmática/creatinina plasmática: É maior na IRA pré-renal (>40) quando


comparado à NTA (< 20 – 30).

→ Fração excretória de sódio: É calculada a partir da multiplicação da relação sódio urinário/sódio


plasmático pela relação creatinina plasmática/creatinina urinária. Na comparação entre as patologias
em questão, a FENa se encontra maior na NTA (<1%) e menor na IRA pré-renal (<1%).

→ Fração excretória de ureia: Substituindo o sódio pela ureia, a FEureia é calculada da mesma forma
que a FENa.

➢ TRATAMENTO: Não há tratamento para o reestabelecimento da porção lesada do túbulo renal, tendo
em vista que é esperada a regeneração tubular em um prazo de 7 a 21 dias. Dessa forma, a conduta diante
dos quadros de necrose tubular aguda é retirar o fator agressor e, se necessário, submeter o paciente à
terapia de substituição renal (hemodiálise ou diálise peritoneal). Contudo, deve-se chamar a atenção para
o papel do médico na prevenção da necrose tubular aguda, quando em situações potencialmente
ameaçadoras à saúde tubular, mas preveníveis, conforme os exemplos abaixo.

→ Uso de contraste iodado: Conforme já mencionado, o contraste iodado é uma substância capaz de
lesar os túbulos renais. Portanto, diante da necessidade de uso desse fármaco, o médico deve optar
por um contraste hipo-osmolar, bem como aumentar o aporte hídrico do paciente, tendo em vista que
a hipervolemia cursa com a aceleração do processo de filtração glomerular e, consequentemente, com
menor contato entre o contraste e o epitélio tubular renal.

→ Paciente vítima de queimadura/choque elétrico: Tendo em vista que, nesses casos, ocorre uma
lesão muscular extensa, há uma circulação intensa de mioglobina na corrente sanguínea.
Considerando a toxicidade da mioglobina, deve-se, no atendimento, hidratar o paciente, bem como
realizar a administração de diurético osmótico (manitol), no intuito de acelerar a diurese e, dessa
forma, reduzir o contato da mioglobina com o epitélio tubular.
32

NEFRITE INTERSTICIAL AGUDA


Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ DEFINIÇÃO E CAUSAS: A Nefrite Intersticial Aguda, também conhecida como Nefrite Intersticial
Alérgica, consiste na inflamação do interstício renal (tecido renal), que, por sua vez, é a região que
entremeia os milhões de néfrons microscópicos. A causa mais frequente desse quadro é a reação alérgica
a um determinado fármaco introduzido recentemente. Por fim, os principais fármacos envolvidos na
etiologia da Nefrite Intersticial Aguda, em ordem de incidência, se encontram abaixo.

MÉTODO MNEMÔNICO “ABCDR”


1. Antibióticos betalactâmicos A – Antibióticos betalactâmicos
2. Bactrim B – Bactrim
3. Anti-inflamatórios não esteroidais (AINES) C- Cataflam (fármaco pertencente à classe dos
AINES)
4. Diuréticos tiazídicos
D – Diuréticos tiazídicos
5. Rifampicina.
R- Rifampicina

➢ FISIOPATOLOGIA: O paciente, geralmente, inicia uma medicação que ativará o sistema imunológico,
dentro de um contexto de reação alérgica. Devido a isso, haverá uma resposta inflamatória no interstício
renal com o surgimento de edema, que, por sua vez, comprimirá os túbulos renais, podendo levar o
paciente a um quadro de injúria renal aguda oligúrica.

➢ FEBRE, DOR LOMBAR E OLIGÚRIA SÃO AS PRINCIPAIS MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS:


Nesse sentido, a oligúria surge em decorrência da compressão que o edema intersticial exerce no sistema
tubular, ao passo que a febre e a dor lombar são decorrentes da resposta inflamatória. Deve-se ressaltar
que a dor lombar também pode ser uma manifestação do acúmulo difuso de líquido no Espaço de Bowman,
que, dessa forma, desencadeia a distensão da cápsula renal.

➢ ACHADOS LABORATORIAIS: No exame do sedimento urinário (EAS) é possível encontrar hematúria


não dismórfica, tendo em vista a origem tubular das hemácias, bem como proteinúria inferior às faixas
nefróticas. Além disso, considerando o quadro alérgico, espera-se um protagonismo dos eosinófilos na
atividade inflamatória e, portanto, a adoção do método de Hansel pode revelar esses leucócitos na urina
(eosinofilia), enquanto o exame de sangue pode revelar eosinofilia e concentrações elevadas de IgE, que,
por sua vez, é um anticorpo muito associado aos eosinófilos.
➢ DIAGNÓSTICO: Na maioria das vezes o diagnóstico da Nefrite Intersticial Aguda é clínico, contudo,
quando o quadro apresentado pelo paciente leva a dúvidas, é recomendável recorrer à biópsia renal para a
confirmação da etiologia. Nesse sentido, caso confirmada a suspeita de Nefrite Intersticial Aguda, espera-
se o encontro de infiltrado inflamatório rico em eosinófilos no interstício renal.

➢ TRATAMENTO: O tratamento padrão para a Nefrite Intersticial Aguda é afastar o paciente do agente
alergênico. Ademais, se o médico julgar necessário, é possível também o uso de antialérgicos. Por fim,
caso o quadro não melhore dentro de 7 dias, recomenda-se o uso de corticoide, tendo em vista a sua
eficiente ação anti-inflamatória.
34

NECROSE DE PAPILA RENAL


Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ PAPILA RENAL: Consiste no local de término de todos os túbulos renais dentro de uma mesma pirâmide
de malpigh e, portanto, é o local por onde a urina é gotejada nos cálices menores para, posteriormente,
alcançar as porções mais distais do trato urinário. Além disso, tendo em vista que a irrigação da papila
renal, naturalmente, já é limitada, conclui-se que a necrose dessa estrutura possui uma incidência
significativa.

➢ A NECROSE DE PAPILA E SUAS CAUSAS: Diversas situações podem comprometer a já limitada


irrigação da papila renal, levando à necrose. Nesse sentido, a papila necrosada se desprende da estrutura
renal e alcança a urina, comportando-se semelhantemente a um cálculo, pois, na prática, assume a estrutura
de um corpo sólido na urina. Com relação às causas de necrose de papila, algumas se encontram abordadas
abaixo.

→ Pielonefrite: A inflamação do tecido renal cursa com edema regional, que, por sua vez, limita a
perfusão da papila.

→ Anemia falciforme: O formato de foice das hemácias possui potencial de obstruir os vasos que irrigam
a papila renal, levando-a a uma situação de isquemia.

→ Obstrução do trato urinário: A presença de cálculo renal obstrutivo ou de próstata com volume
aumentado pode causar a obstrução da via urinária. Consequentemente a isso pode ocorrer o aumento
da pressão no trato urinário, comprometendo a perfusão da papila renal.

→ Diabetes Mellitus: A vasculopatia consequente a essa doença pode comprometer a irrigação da papila,
levando-a a um quadro de isquemia.

→ Medicamentos: Analgésicos e AINES, por exemplo, promovem a vasoconstrição dos vasos que
irrigam a papila, limitando, dessa forma, a irrigação dessa estrutura renal, que já é limitada em
condições normais.

➢ MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS: Com relação aos sintomas, é possível mencionar dor lombar, febre,
hematúria não dismórfica e proteinúria não nefrótica. Nesse contexto, o ponto chave para a compreensão
desses sintomas é a inflamação gerada no local de desprendimento da papila. Ressalta-se que a dor lombar
pode também decorrer da obstrução que a papila necrosada pode causar no trato urinário.
➢ DIAGNÓSTICO: O principal exame solicitado diante da suspeita de necrose da papila renal é a urografia
excretora. Este método propedêutico consiste na administração de contraste, que será filtrado por completo
e eliminado na urina. Diante disso, é possível ver o comportamento dele ao longo do percurso. Nesse
sentido, diante da presença de papilite necrosante haverá uma falha de enchimento no local de transição
entre o sistema tubular e o trato urinário, o que, no exame é visualizado por meio do achado de “sombras
em anel”. Ademais, pode ser observado também uma falha no enchimento do ureter, o que se deve, mais
uma vez, ao comportamento semelhante entre a papila necrosada e o cálculo renal.

➢ TRATAMENTO: Nesse sentido, o mais importante é a abordagem terapêutica da doença de base que
causou a necrose de papila renal.
36

DISTÚRBIOS TUBULARES

ESPECÍFICOS
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ DISTÚRBIOS DO TÚBULO CONTORCIDO PROXIMAL: GLICOSÚRIA RENAL, ACIDOSE


TUBULAR RENAL DO TIPO II E SÍNDROME DE FANCONI

Elementos-chave: Transportadores de
glicose e bicarbonato

→ Glicosúria Renal: Diante de um paciente com glicosúria no exame de urina, por exemplo, a principal
hipótese diagnóstica é a Diabetes Mellitus, tendo em vista que a hiperglicemia cursa com o aumento da
concentração de glicose no filtrado que alcança o túbulo proximal, que, dessa forma, não é capaz de
reabsorver toda a glicose. Contudo, caso o paciente apresente valores normais de glicemia de jejum
e/ou hemoglobina glicada, a glicosúria passa a ser explicada por um defeito hereditário que compromete
a reabsorção e glicose pelo túbulo proximal.

→ Acidose Tubular Renal do tipo II: O bicarbonato, em sua maior parte, é reabsorvido pelo túbulo
proximal. Nesse sentido, diante de um defeito no transportador que reabsorve o bicarbonato, o paciente
cursa com bicarbonatúria e acidose metabólica.

→ Síndrome de Fanconi: Diz respeito à perda de toda a função reabsortiva do túbulo proximal, o que
pode ocorrer, por exemplo, em quadros de mieloma múltiplo.

➢ DISTÚRBIOS DA ALÇA DE HENLE: INTOXICAÇÃO POR FUROSEMIDA E SÍNDROME DE


BARTTER

Elemento-chave: Transportador
Na+/K+/2Cl-

→ Intoxicação por Furosemida e Síndrome de Bartter: O mecanismo de ação da Furosemida,


classificada como diurético de alça, consiste na inibição do transportador Na+/K+/2Cl-. Sendo assim,
em alguns pacientes, principalmente quando intoxicados por esse fármaco, a redução na reabsorção
de sódio pela porção ascendente espessa da alça de henle terá como consequência o aumento da
concentração de NaCl que chega ao túbulo contorcido distal.
Consequentemente, haverá uma hiperatividade da macula densa, resultando no aumento na secreção
de renina, que, por fim, cursará com o aumento na atividade da aldosterona. Tendo em vista que esse
mineralocorticoide atua aumentando a reabsorção de sódio, bem como as excreções de potássio e
hidrogênio na porção final do túbulo contorcido distal e no túbulo coletor cortical, percebe-se que a
inibição do transportador Na+/K+/Cl- na alça de henle pode resultar em hipocalemia e alcalose
metabólica pelo aumento da atividade desempenhada pela aldosterona. Por fim, ressalta-se que a
Síndrome de Bartter consiste em uma doença hereditária na qual o paciente acometido possui uma
disfunção do transportador Na+/K+/2Cl-, clinicamente semelhante à intoxicação por Furosemida.

➢ DISTÚRBIOS DO TÚBULO CONTORCIDO DISTAL: INTOXICAÇÃO POR DIURÉTICOS


TIAZÍDICOS E SÍNDROME DE GITELMAN

Elemento-chave: Transportador Na+/Cl-

→ Diuréticos Tiazídicos e Síndrome de Gitelman: O raciocínio aqui é semelhante ao observado nos


distúrbios da alça de henle, tendo em vista que tanto uma classe de diuréticos quanto uma doença
hereditária são capazes de inibir a atividade de uma proteína de transporte do túbulo renal. Todavia,
nesse caso, a proteína alvo é o transportador Na+/Cl-, que, por sua vez, reabsorve sódio e cloro. Como
consequência e no intuito de compensar a menor reabsorção de sódio do ponto de vista iônico, os rins
lançam mão do aumento na reabsorção de cálcio. Por outro lado, mais uma vez haverá o aumento na
concentração de cloreto de sódio no filtrado glomerular com consequente hiperativação do estímulo
secretor de renina, que cursa, por fim, com o aumento na atividade da aldosterona. Portanto, o paciente
também poderá apresentar alcalose metabólica e hipocalemia.

o Diuréticos tiazídicos e litíase renal obstrutiva de repetição: Tendo em vista que a maioria dos
cálculos renais possui o cálcio como principal constituinte, a adoção de diuréticos tiazídicos
em pacientes com quadros repetitivos de cálculo renal pode ser recomendada. Ressalta-se
que esses diuréticos terão como consequência o aumento da reabsorção de cálcio, que, dessa
forma, terá sua concentração reduzida na urina.

➢ DISTÚRBIOS DO TÚBULO COLETOR CORTICAL: ACIDOSES TUBULARES RENAIS DOS


TIPOS I E IV

Elemento-chave: Transportador
aldosterona dependente
→ Acidose Tubular Renal do Tipo I: O paciente apresenta níveis fisiológicos de aldosterona, porém
um defeito na excreção de hidrogênio. Como consequência o potássio passa a ser excretado em maior
quantidade, levando o paciente a um quadro de hipocalemia. Paralelamente a isso, insta-se também
uma acidose metabólica resultante da retenção de íons hidrogênio.

→ Acidose Tubular Renal do Tipo IV: A causa base, nesse contexto, é a redução na secreção da
aldosterona (hipoaldosteronismo). Sendo assim, esse quadro consiste na única acidose tubular renal
que cursa também com hipercalemia.

➢ DISTÚRBIOS DO TÚBULO COLETOR MEDULAR: DIABETES INSIPIDUS NEFROGÊNICA

Elemento-chave: Sensibilidade do
epitélio tubular ao ADH

→ Diabetes insipidus nefrogênica: Diante da ausência de atividade do hormônio antidiurético (ADH),


haverá um quadro de diabetes insipidus. Quando central, a base do problema consiste em uma
hipoatividade do hipotálamo quanto ao estímulo secretor do ADH, ao passo que, quando nefrogênica,
o quadro resulta de uma insensibilidade do túbulo coletor medular ao hormônio antidiurético.
39
SÍNDROMES VASCULARES

ESTENOSE DE ARTÉRIA RENAL


Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ ETIOLOGIA: A maioria dos casos de estenose da artéria renal (2/3) decorre de aterosclerose, isto é, da
instalação de uma placa de ateroma na artéria renal, geralmente em uma porção próxima à sua origem na
artéria aorta. Estes casos ocorrem, preferencialmente, em pacientes com idade superior a 50 anos e/ou
portadores de fatores de risco para doença aterosclerótica. Já os outros 1/3 dos casos decorre de
fibrodisplasia, um quadro que acomete, preferencialmente, mulheres entre 15 e 40 anos sem a existência
de fatores de risco significativos além do etário.

➢ FISIOPATOLOGIA: A estenose de artéria renal cursa com a redução da perfusão sanguínea nos rins, o
que, teoricamente, levaria à redução na taxa de filtração glomerular. Contudo, os rins dispõem de um
mecanismo compensatório, isto, é do sistema renina-angiotensina-aldosterona. Nesse sentido, a má
perfusão renal é percebida pelo componente vascular do aparelho justaglomerular, gerando, dessa forma,
um estímulo para a ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona. Na sequência, por meio
especialmente da angiotensina II, haverá uma restauração da perfusão renal, contudo, é possível também
a instalação deum quadro de hipertensão arterial sistêmica secundária, conforme será visto abaixo.

→ Efeitos da atuação do sistema renina-angiotensina-aldosterona a nível renal: Sistemicamente, a


angiotensina II promoverá o aumento da resistência vascular periférica e, consequentemente, da
pressão arterial, o que favorece a chegada de sangue aos rins. Por outro lado, do ponto de vista
glomerular, a angiotensina II atua preferencialmente na arteríola eferente, reduzindo o fluxo
sanguíneo de saída dos glomérulos e, portanto, aumentando a pressão glomerular e, por fim, a taxa de
filtração glomerular.

→ Efeitos da atuação do sistema renina-angiotensina-aldosterona a nível sistêmico: Além da


angiotensina II, que atua no aumento da resistência vascular periférica, a aldosterona, por meio do
aumento na reabsorção de sódio e água, também contribui à elevação da pressão arterial. Ressalta-se
que esse mineralocorticoide tem sua secreção estimulada a partir da atividade da angiotensina II a
nível das glândulas suprarrenais. Dessa forma, é possível que o paciente com estenose de artéria renal
desenvolva um quadro conhecido por hipertensão vásculo-renal.
➢ QUANDO SUSPEITAR: Excetuando-se a presença de fatores de risco para as causas base de estenose
da artéria renal, principalmente no caso de origem aterosclerótica, essa doença vásculo-renal pode ser
suspeitada em algumas situações, como as que serão abordadas à diante. O surgimento de hipertensão
arterial sistêmica em pacientes abaixo de 30 anos ou acima de 50, tendo em vista que essa doença, quando
primária, costuma surgir entre 30 e 50 anos, sugere origem secundária, sendo a renal uma das
possibilidades a serem consideradas. Ademais, o aumento na dosagem da creatinina após início de IECA
ou BRA também pode levar à suspeição de estenose de artéria renal, considerando a fisiopatologia já
comentada.

➢ RASTREIO E DIAGNÓSTICO: O rastreio pode ser feito através da ultrassonografia com doppler, uma
vez que esse exame permitirá visualizar achados, que, quando presentes, sugerem a estenose de artéria
renal, como o turbilhonamento do fluxo local e/ou a redução do mesmo. Contudo, o diagnóstico só pode
ser feito diante da visualização direta da artéria renal e, nesse sentido, o padrão ouro é a arteriografia.
Todavia, devido ao caráter invasivo desse exame, sua indicação geralmente ocorre associada ao
estabelecimento da angioplastia como conduta terapêutica após uma confirmação diagnóstica, conforme
ainda será comentado, ou diante de dúvida. Nesse sentido, ressalta-se que exames menos invasivos, como
a angiotomografia e a ressonância magnética, permitem o diagnóstico, na maioria dos casos, e devem ser
considerados antes da arteriografia.

➢ TRATAMENTO: Os casos originados da fibrodisplasia devem ser tratados através da angioplastia sem
a colocação de stent. Já nos casos decorrentes de processo aterosclerótico, a indicação é de tratamento
medicamentoso com IECA ou BRA, desde que o paciente apresente o quadro vascular unilateral com o
outro rim em condições hígidas. Ressalta-se que a administração desses bloqueadores do sistema renina-
angiotensina-aldosterona em pacientes com estenose de artéria renal bilateralmente ou unilateralmente em
rim único é contraindicada, tendo em vista a supressão do mecanismo de adaptação dos rins e o risco de
evolução para injúria renal aguda e/ou doença renal crônica. Por fim, nesses casos, recomenda-se a
realização de angioplastia com a colocação de stent
41
SÍNDROMES VASCULARES

ATEROEMBOLISMO
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ DEFINIÇÃO E FISIOPATOLOGIA: O Ateroembolismo consiste em um quadro sistêmico, que pode


acometer os rins. Nesse sentido, o que ocorre é a desestabilização de alguma placa de ateroma em artérias
de maior calibre, o que pode ocorrer, por exemplo, em procedimentos vasculares ou mesmo em fraturas
de ossos longos. Dessa forma, ocorre a soltura de uma porção da placa de ateroma de forma fragmentada
em vários êmbolos, que, posteriormente, podem alcançar vasos em diferentes sistemas no organismo,
como o geral, gerando quadros isquêmicos.

➢ MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS: Tendo em vista o caráter sistêmico do ateroembolismo, o paciente não


apresentará apenas isquemia nos setores renais irrigados pela vasculatura acometida. Dessa forma, outros
locais no corpo devem ser examinados no intuito de detectar sítios diferentes do rim acometidos por
isquemia. Portanto, abaixo se encontram alguns achados que podem ser investigados no exame físico.

1. Dedo azul: Cianose em dedos decorrente do comprometimento na perfusão periférica.

2. Levedo reticular: Áreas na pele que alternam regiões desgastadas por isquemia e regiões sadias.

3. Placas de Hollenhorst: Dizem respeito a êmbolos de colesterol que podem ser visualizados nos vasos
retinianos durante o exame de fundo de olho. Ressalta-se que esse achado é patognomônico de
ateroembolismo.

➢ LABORTATÓRIO: Tendo em vista a vasculite que pode ser desencadeada pela obstrução por êmbolos
de gordura, é possível o encontro de eosinofilia e eosinofilúria. Além disso, há também o consumo de
proteínas do complemento.

➢ BIÓPSIA RENAL: Caso a avaliação microscópica da histologia renal seja solicitada para confirmação
diagnóstica, será percebida a presença de fendas ou fissuras no meio da vasculatura renal, que sinalizam a
existência prévia de êmbolos de colesterol.

➢ TRATAMENTO: Do ponto de vista etiológico, deve-se aguardar a auto resolução do quadro. Contudo,
caso apareçam sinais e sintomas promotores de comprometimento do bem-estar ou com potencial para o
desencadeamento de complicações, deve-se abordá-los terapeuticamente
42

DISTÚRBIOS DO SÓDIO

INTRODUÇÃO E HIPONATREMIA
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ DEFINIÇÃO E FISIOPATOLOGIA: O Ateroembolismo consiste em um quadro sistêmico, que pode


acometer os rins. Nesse sentido, o que ocorre é a desestabilização de alguma placa de ateroma em artérias
de maior calibre, o que pode ocorrer, por exemplo, em procedimentos vasculares ou mesmo em fraturas
de ossos longos. Dessa forma, ocorre a soltura de uma porção da placa de ateroma de forma fragmentada
em vários êmbolos, que, posteriormente, podem alcançar vasos em diferentes sistemas no organismo,
como o geral, gerando quadros isquêmicos.

➢ MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS: Tendo em vista o caráter sistêmico do ateroembolismo, o paciente não


apresentará apenas isquemia nos setores renais irrigados pela vasculatura acometida. Dessa forma, outros
locais no corpo devem ser examinados no intuito de detectar sítios diferentes do rim acometidos por
isquemia. Portanto, abaixo se encontram alguns achados que podem ser investigados no exame físico.

4. Dedo azul: Cianose em dedos decorrente do comprometimento na perfusão periférica.

5. Levedo reticular: Áreas na pele que alternam regiões desgastadas por isquemia e regiões sadias.

6. Placas de Hollenhorst: Dizem respeito a êmbolos de colesterol que podem ser visualizados nos vasos
retinianos durante o exame de fundo de olho. Ressalta-se que esse achado é patognomônico de
ateroembolismo.

➢ LABORTATÓRIO: Tendo em vista a vasculite que pode ser desencadeada pela obstrução por êmbolos
de gordura, é possível o encontro de eosinofilia e eosinofilúria. Além disso, há também o consumo de
proteínas do complemento.

➢ BIÓPSIA RENAL: Caso a avaliação microscópica da histologia renal seja solicitada para confirmação
diagnóstica, será percebida a presença de fendas ou fissuras no meio da vasculatura renal, que sinalizam a
existência prévia de êmbolos de colesterol.

➢ TRATAMENTO: Do ponto de vista etiológico, deve-se aguardar a auto resolução do quadro. Contudo,
caso apareçam sinais e sintomas promotores de comprometimento do bem-estar ou com potencial para o
desencadeamento de complicações, deve-se abordá-los terapeuticamente
➢ O PAPEL DO SÓDIO NA OSMOLARIDADE: O sódio é o principal cátion do meio extracelular e,
tendo em vista o fato de ser osmoticamente ativo, também é o principal determinante da osmolaridade
plasmática. Feitas essas considerações, abaixo se encontram a fórmula da osmolaridade plasmática e o
valor de referência desse parâmetro.

Osm: 2 x [Na] + glicemia/18 + ureia/6

Valor de referência da osmolaridade plasmática: 285 – 295 mOsm/L

− Osmolaridade efetiva (tonicidade): Na prática, a ureia não interfere na osmolaridade, portanto, a


osmolaridade efetiva é apenas 2 x sódio sérico + glicemia/18.

− Nitrogênio ureico sanguíneo (BUN): Pode ser utilizado para o cálculo da osmolaridade plasmática em
substituição à ureia, contudo, nesse caso, o BUN entra na fórmula da osmolaridade dividido por 2,8
(BUN/2,8).

➢ O PAPEL DO GAP OSMÓTICO NO DIAGNÓSTICO DE INFECÇÕES: A osmolaridade pode ser


aferida a partir do cálculo discutido acima ou através do uso do osmômetro. Nesse sentido, caso a diferença
encontrada entre as duas aferições seja superior a 10 mOsm/L, sugere-se que o paciente apresenta um
quadro de intoxicação, sendo o álcool o principal agente tóxico encontrado na prática nessas situações.

➢ LOCAIS DE CONTROLE DO SÓDIO: O sódio é controlado pelo centro da sede, localizado no


hipotálamo, e pela ação do hormônio antidiurético (ADH), que atua no ducto coletor. Nesse sentido, de
antemão já é válido comentar que os distúrbios do sódio (hipernatremia e hiponatremia), geralmente, não
decorrem de alterações na quantidade absoluta de sódio, mas sim por descompensações hídricas
envolvendo, principalmente, a disponibilidade do ADH.
➢ O NEURÔNIO É A PRINCIPAL VÍTIMA DOS DISTÚRBIOS DO SÓDIO: Essas células nervosas
são as principais afetadas em quadros de hiponatremia e hipernatremia e, portanto, perda de consciência,
cefaleia e crises convulsivas são algumas das manifestações clínicas presentes nos distúrbios do sódio.

➢ A HIPONATREMIA GERALMENTE É ACOMPANHADA PELA HIPO-OSMOLARIDADE DO


MEIO EXTRACELULAR: Considerando a fórmula da osmolaridade apresentada acima, percebe-se que
o sódio é muito mais importante que a glicose na determinação da osmolaridade, portanto, os quadros de
hiponatremia tendem a cursar com a hipo-osmolaridade do líquido extracelular. Ressalta-se que em alguns
casos específicos, como quadros severos de hiperglicemia e mieloma múltiplo, é possível a ocorrência de
quadros de hiponatremia iso-osmolar.

➢ A HIPONATREMIA, NA MAIORIA DAS VEZES, DECORRE DA HIPERATIVIDADE DO ADH:


Tanto disfunções nos receptores de ADH quanto a hiperprodução desse hormônio podem levar à
hiponatremia, sendo, conforme já dito, o hormônio antidiurético o principal precursor dos quadros de
hiponatremia. Em algumas situações, como cirurgias de próstata, em que há contínua irrigação prostática,
e polidipsia psiquiátrica caracterizada por consumo superior a 10L água/dia, a hiponatremia pode decorrer
de um elevado consumo de água.

➢ CLASSIFICAÇÃO DA HIPONATREMIA DE ACORDO COM A VOLEMIA: Conforme será


discutido abaixo, a hiponatremia pode ser acompanhada pelos três estados volêmicos, ou seja, pode ser
classificada como hiponatremia hipovolêmica, hiponatremia normovolêmica ou hiponatremia
hipervolêmica.

− Hiponatremia hipovolêmica: Vômitos e diarreias incoercíveis, uso descompensado de diuréticos


tiazídicos e hemorragia, por exemplo, cursam com hipovolemia. Nesses casos, como mecanismo
compensatório, o organismo responde com a secreção de ADH e de aldosterona no túbulo renal final,
hormônios que promovem a reabsorção de água. Enquanto a aldosterona promove a reabsorção de
sódio e água, o ADH, por sua vez, permite a absorção exclusiva de água. Portanto, o paciente tem seu
estado hipovolêmico justificado pela causa base do desequilíbrio hidroeletrolítico e a hiponatremia
explicada pela excessiva ação do hormônio antidiurético.

− Hiponatremia normovolêmica: Nos casos em que a volemia se mantém normal, de modo geral, a
hiponatremia decorre da Síndrome da Antidiurese Inapropriada (SIAD), quadro marcado pela
secreção acentuada de ADH e, dessa forma, por poliúria. Nesse contexto, a elevação do ADH leva à
retenção exclusiva de água e à consequente redução da concentração extracelular de sódio, isto é,
hiponatremia. Entretanto, em um primeiro momento, a ação do ADH promove um estado de
hipervolemia transitória, marcado pelo aumento do retorno venoso e pela maior distensão da parede
atrial. Em resposta ao aumento da pressão exercida nos átrios, ocorre a secreção do peptídeo
natriurético atrial, que, por sua vez, promove a excreção de água e sódio, regularizando a volemia,
mas não a hiponatremia, que passa a existir em um estado de normovolemia. Por fim, nos casos de
hiponatremia normovolêmica pode haver também perda de ácido úrico e, portanto, do ponto de vista
laboratorial, esse distúrbio do sódio pode ser caracterizado por hiponatremia, normovolemia,
natriurese e hipouricemia.

o Síndrome da Antidiurese Inapropriada (SIAD): Dentre as causas dessa síndrome, é possível


mencionar doenças do sistema nervoso central (TCE, AVC e meningite, por exemplo); uso de
medicações de ação neurológica (anticonvulsivantes e antidepressivos, por exemplo); doenças
pulmonares (tuberculose, pneumonia por legionella, outras pneumonias, ventilação mecânica e
pneumotórax, por exemplo); neoplasias (pulmão, próstata, pâncreas e bexiga) e também
cirurgias de grande porte.

o Lesão neurológica e hiponatremia hipovolêmica: Apesar do TCE e do AVC, por exemplo,


poderem cursar com SIAD, lesões neurológicas podem levar a uma hiponatremia hipovolêmica
por outra via fisiopatológica. Nesse sentido, diante de um TCE, por exemplo, é possível que
ocorra o aumento na secreção de peptídeo natriurético cerebral (BNP), substância que também
age aumentando a excreção de sódio e água. Sendo assim, o ADH pode até aumentar, porém em
níveis fisiológicos e em quantidade insuficiente para compensar a perda de água promovida pela
secreção exacerbada de BNP.

− Hiponatremia hipervolêmica: Nesses casos, o que ocorre na verdade é um intenso extravasamento


de água para o terceiro espaço, causando o aumento do volume extracelular e redução do volume
circulante. Tendo isso em mente, percebe-se que apesar do termo “hiponatremia hipervolêmica”, há
uma redução plasmática de água, que, por sua vez, resulta na liberação de ADH e o aumento da
reabsorção exclusiva de água, promovendo, por fim, a instalação de hiponatremia.

➢ MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS: Quadros de hiponatremia de instalação aguda (<48h) podem cursar


com sintomatologia, especialmente nervosa. Tendo em vista que a redução da concentração extracelular
de Na+ torna o meio extracelular hipo-osmolar em relação aos neurônios, a água tende a fluir, por osmose,
para as células nervosas. Sendo assim, o paciente pode apresentar hipertensão intracraniana e os sinais e
sintomas disso, como cefaleia, perda de consciência, coma e crises convulsivas. Já nos quadros de
hiponatremia que se instalam de forma progressiva e lenta (>48h), os neurônios conseguem acompanhar
o processo, lançando mão de mecanismos compensatórios que evitam a hipertensão intracraniana e as
consequências disso. Portanto, a hiponatremia crônica costuma ser assintomática.
➢ REPOSIÇÃO DE NACL 3%: Essa medida deve ocorrer apenas nos pacientes que apresentarem quadro
de hiponatremia aguda sintomática, sendo a dosagem de Na+ sérica, geralmente, inferior a 120 mmEq/L.
Ressalta-se que, caso necessária, essa reposição de NaCl 3% deve elevar a natremia em até 10 mmEq/L a
cada 24h, sendo pequenas variações já motivadoras de bons resultados clínicos, mesmo sem ainda ao
alcance da natremia ideal.

➢ TRATAMENTO: Para a abordagem adequada da hiponatremia é preciso interferir em sua causa-base.


Dessa forma, deve-se classificar a hiponatremia com relação à volemia, tendo em vista que as condutas
diferem. Por fim, abaixo se encontram as medidas adotadas para cada situação.

− Hiponatremia hipovolêmica: Deve ser tratada com solução fisiológica 0,9%.

− Hiponatremia normovolêmica: Deve ser abordada com restrição hídrica e, se necessário,


furosemida.

− Hiponatremia hipervolêmica: Deve ser revertida com restrição hídrica e furosemida, desde o início.
47
DISTÚRBIOS DO SÓDIO

HIPERNATREMIA
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ ETIOLOGIA: Na hipernatremia o paciente possui um déficit hídrico ou na atividade do ADH. Dessa


forma, há uma redução plasmática da água (solvente), aumentando a concentração do sódio e, portanto,
promovendo hipernatremia. Neste contexto, as principais causas de base são o déficit hídrico ou a diabetes
insipidus nefrogênica.

− Déficit hídrico: É causado por uma limitação na hidratação, o que pode ser consequência da má
assistência de pacientes acamados em comportamento passivo ou de recém nascidos, por exemplo.

− Diabetes insipidus: De modo geral, resulta da ausência de atividade do hormônio antidiurético


(ADH), o que pode ser de origem central ou renal. Quando central, há uma incapacidade hipotalâmica
na secreção do ADH e, portanto, o paciente não reabsorve água de forma eficaz. Por outro lado, o
ADH pode ser secretado normalmente pelo hipotálamo, porém os receptores aos quais ele se liga
podem estar insensíveis, resultando na ausência de efeito do hormônio.

➢ MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS: Na hiponatremia a diferença entre as osmolaridades plasmáticas e


intracelulares resultava no “alagamento neuronal”. Já na hipernatremia, a diferença de osmolaridade
promove o fluxo de água do meio intracelular para o meio extracelular, cursando com desidratação
neuronal. Contudo, os sintomas de ambos os distúrbios do sódio são os mesmos e, portanto, o paciente
com hipernatremia pode apresentar cefaléia, vômitos, convulsões, sonolência e torpor. Os sintomas da
hipernatremia são os mesmos da hiponatremia, isto é, cefaleia, vômitos, convulsões, sonolência e torpor.

➢ TRATAMENTO: Caso o paciente apresente nível de consciência preservado, é possível uma reposição
oral de água. Já em casos graves ou de incapacidade da deglutição, recomenda-se o uso intravenoso de
solução hipertônica (soro glicosado a 5% ou solução salina 0,45%).

− Atenção: Da mesma forma que na hiponatremia é contraindicado o aumento do potássio sérico em


níveis superiores a 10 mEq/L nas primeiras 24h, na hipernatremia a redução do potássio sérico
também não deve ultrapassar 10 mEq/L nas primeiras 24h.
48

DISTÚRBIOS DO POTÁSSIO

INTRODUÇÃO E HIPOCALEMIA
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

VALOR DE REFERÊNCIA DO POTÁSSIO EXTRACELULAR


3,5 mmEq a 5,5 mmEq

➢ O POTÁSSIO SE ENCONTRA ESPECIALMENTE NO MEIO INTRACELULAR: A pequena


concentração de sódio no meio extracelular se justifica pela sua maior presença no meio intracelular,
especialmente, nas células musculares esqueléticas e cardíacas. Isso se justifica pela imprescindível função
do potássio na excitabilidade das células musculares diante de um estímulo neuronal. Nesse sentido, já é
válido adiantar que a hipopotassemia é uma causa de fibrilação ventricular, por exemplo.

➢ MECANISMOS DE CONTROLE DO POTÁSSIO: O potássio pode ser controlado rapidamente por


meio de um fluxo celular, o qual é determinado por fatores, como o pH sanguíneo e a circulação de
hormônios. Nesse sentido, destaca-se, por exemplo, o pH alcalino e a ação dos hormônios adrenalina e
insulina como fatores que estimulam a entrada de potássio nas células. Por outro lado, o pH e as lesões
musculares são situações que orientam a saída de potássio das células.

➢ MECANISMOS EFETIVOS DE CONTROLE DO POTÁSSIO: Os mecanismos de controle


abordados acima influenciam na concentração extracelular do potássio, contudo, não interferem na
quantidade global do íon, tendo em vista que não ocorre eliminação. Já os rins, por meio da ação da
aldosterona, são capazes de regularem as concentrações de potássio efetivamente, tendo em vista que
ativam transportadores que realizam a reabsorção de sódio e a excreção de potássio e hidrogênio na porção
final dos túbulos renais.

➢ OS DISTÚRBIOS DE POTÁSSIO PROMOVEM SINTOMAS MUSCULARES E AMEAÇAS AO


CORAÇÃO: Ambos os distúrbios do potássio cursam com sintomatologia semelhante na musculatura
esquelética, como câimbras e fraqueza. Contudo, a grande ameaça que esses distúrbios oferecem é ao
coração, tendo em vista o papel do potássio na excitabilidade da musculatura miocárdica, fundamental à
estabilidade hemodinâmica.
➢ A HIPOCALEMIA PODE SER CAUSADA POR EXCESSO DE ARMAZENAMENTO OU PELA
PERDA RENAL: Alcalose metabólica, uso de beta-agonista e uso de insulina intravenosa em grande
quantidade e reposição de vitamina B12 são eventos que estimulam o fluxo de potássio do meio
extracelular para o meio intracelular e, consequentemente, a ocorrência de hipocalemia. Por outro lado, o
hiperaldosteronismo, diuréticos, vômitos e medicamentos tóxicos ao túbulo renal podem promover o
excesso de eliminação do potássio pela urina, resultando também em hipocalemia.

VITAMINA B12 E HIPOCALEMIA


A vitamina B12 é um elemento importante na formação das hemácias. Sendo assim, a
reposição dessa vitamina em situações de anemia, por exemplo, cursa comum sequestro do
potássio extracelular, resultando, portanto, em hipocalemia.

CETOACIDOSE DIABÉTICA E HIPOCALEMIA


O potássio deve ser sempre monitorado nos quadros de cetoacidose diabética, tendo em vista
que a insulinoterapia de emergência promoverá um influxo de potássio do meio extracelular
para o meio intracelular, podendo resultar em hipocalemia.

VÔMITOS E HIPOCALEMIA
Os vômitos incoercíveis podem levar à perda de potássio tanto por um aumento do
armazenamento intracelular quanto pela eliminação renal. O excesso de eliminação do ácido
graxo alcaliniza o sangue, estimulando, portanto, o direcionamento do potássio para o interior
das células. Tendo em vista o estado de alcalose metabólica, os rins, a nível dos túbulos distal
e coletor poupam o hidrogênio e aumentam a excreção do potássio em troca do sódio
reabsorvido pela ação da aldosterona.

MEDICAMENTOS E HIPOCALEMIA
Fármacos, como os aminoglicosídeos e a anfotericina B, são nefrotóxicos e, diante de uma
insuficiência renal causada por eles, haverá uma redução na reabsorção do potássio, resultando
em uma insuficiência renal com hipocalemia. Ressalta-se que na grande maioria dos casos de
insuficiência renal há hipercalemia.

➢ CLÍNICA: O paciente com hipocalemia pode apresentar fraqueza na musculatura esquelética, cãibras e
íleo paralítico, devido à perda do peristaltismo muscular liso no intestino.
➢ MANIFESTAÇÕES NO ELETROCARDIOGRAMA: Os distúrbios do potássio interferem na onda T
de forma diretamente proporcional à amplitude da onda, ou seja, a hipocalemia cursará com um
achatamento da onda T. Consequentemente a isso haverá alargamento do intervalo QT, bem como poderá
haver o aparecimento de onda U (logo após a onda T) e uma elevação na onda P.

➢ TRATAMENTO: A hipocalemia leve pode ser abordada com xarope de KCl 6% 3 vezes ao dia. Já a
hipocalemia grave e/ou a intolerância oral, bem como a hipocalemia acompanhada por alterações
eletrocardiográficas podem ser abordadas através de intervenção intravenosa com KCl 13 mEq, infundido
10 – 20 mEq/h. Além disso, existem várias associações para a reposição de cloreto de potássio, como NaCl
0,45 (210) ml + KCl 10% (40ml), administrados continuamente de 4h/4h, sendo o paciente também
reavaliado com esses intervalos.

→ Evitar o soro fisiológico: Essa solução é mais osmolar que o plasma e, portanto, a sua administração
combinada ao cloreto de potássio poderá tornar o plasma ainda mais osmolar e, consequentemente,
promover flebite.

→ Evitar soro glicosado: Apesar de ser uma solução hipotônica, que, geralmente, é indicada na
reposição de potássio, a glicose estimula a secreção de insulina, que, por sua vez, orienta o fluxo de
potássio para o meio intracelular.

→ Infusão intravenosa de KCl > 20 mEq/h: Conforme mencionado, esse é o limite de fluxo na
administração intravenosa de KCl, tendo em vista que, acima desse valor a infusão do íon pode cursar
com severas consequências.

➢ MAGNÉSIO E HIPOCALEMIA REFRATÁRIA: Pacientes que não respondem à reposição de


potássio devem ser submetidos à dosagem do magnésio, tendo em vista que a hipomagnesemia tem a
eliminação de potássio como consequência. Portanto, nos casos de hipocalemia refratária com
hipomagnesemia, deve-se repor o magnésio.
51

DISTÚRBIOS DO POTÁSSIO

HIPERCALEMIA
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ A HIPERCALEMIA PODE SER CAUSADA POR EXCESSO DE LIBERAÇÃO CELULAR E


POR RETENÇÃO A NÍVEL RENAL: A acidose metabólica e a destruição muscular, observada na
rabdomiólise, por exemplo, cursam com a saída de potássio da célula para o meio extracelular, resultando,
portando, em hipercalemia. Já a maioria dos quadros de insuficiência renal e o hipoaldosteronismo podem
levar à hipercalemia.

➢ MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS: Semelhantemente à hipocalemia, a hipercalemia também leva a


sintomas musculares, como fraqueza muscular e cãibras.

➢ ALTERAÇÕES ELETROCARDIOGRÁFICAS: Neste caso, ocorre o oposto da hipocalemia, ou seja,


na hipercalemia há elevação da amplitude da onda T, encurtamento do intervalo QT e achatamento da
onda P. Ressalta-se que o QRS pode se alargar em ambos os distúrbios do potássio, contudo, é mais
frequente em situações de hipercalemia.

➢ O ELETROCARDIOGRAMA É A PRIMEIRA MEDIDA A SER ADOTADA EM PACIENTES


COM HIPERCALEMIA: Tendo em vista a ameaça que esse distúrbio do potássio oferece ao coração,
os pacientes com hipercalemia devem ser rapidamente submetidos ao eletrocardiograma, que, se alterado,
orienta a prescrição de Gluconato de Cálcio. Ressalta-se que esse fármaco não atua na redução do potássio,
mas sim na prevenção/tratamento de complicações cardíacas.

➢ TRATAMENTO: Pensando na redução rápida do potássio extracelular, é possível a administração de


glicoinsulinoterapia, bem como o uso de beta2-agonista e, na presença de acidose metabólica, o uso de
bicarbonato. Ressalta-se que o uso de insulina isolado poderia levar o paciente a um quadro de
hipoglicemia e, portanto, recomenda-se a associação com glicose, resultando em uma glicoinsulinoterapia.
Por outro lado, a redução global do potássio pode ocorrer por meio de diuréticos de alça (furosemida) em
pacientes que não se encontram em anúria/oligúria, bem como através da resina de troca (Sorcal). Ressalta-
se que esse fármaco oferece uma resina associada ao cálcio, que, a nível plasmático, libera o cálcio e
absorve o potássio, posteriormente, eliminado nas fezes.

➢ O PAPEL DA TERAPIA DE SUBSTITUIÇÃO RENAL NA HIPERCALEMIA: Pacientes com


hipercalemia grave e refratária devem ser encaminhados à hemodiálise ou diálise peritoneal.
52

DISTÚRBIOS ÁCIDO-BASE

INTRODUÇÃO E ACIDOSE
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ O pH SANGUÍNEO E A HOMEOSTASE: Para o adequado funcionamento do organismo humano e,


consequentemente, para a manutenção da vida é imprescindível que o pH se encontre dentro dos valores
ideais. Caso o pH se encontre abaixo da sua faixa ideal, considera-se que que o indivíduo apresenta um
quadro de acidose, ao passo que, valores de pH acima da faixa ideal determinam um estado de alcalose.
De modo geral, os quadros de acidose são desencadeados por um excesso sérico de íons H+ em relação à
disponibilidade de íons HCO3-, enquanto os casos de alcalose são decorrentes do excesso sérico de íons
HCO3- em relação aos íons H+. Pensando nos quadros de acidose, deve-se ressaltar que os íons H+ são
oriundos da dissociação de ácidos, como o ácido lático e o ácido pirúvico, o que nos leva a concluir que
os íons hidrogênio são produzidos, por exemplo, nos processos de respiração aeróbica e anaeróbica. Nesse
sentido, deve-se ressaltar que diversos processos metabólicos, além desses citados, cursam com a liberação
de íons H+. Por outro lado, esses prótons são excretados pelos túbulos renais e, portanto, os rins também
desempenham um papel importante na determinação da disponibilidade de H+ no sangue.

➢ SISTEMA TAMPÃO: Os íons H+, ao alcançarem a corrente sanguínea, são neutralizados por uma reação
ácido-base com os íons HCO3-, gerando, dessa forma, H2CO3 (ácido carbônico). Este ácido, por sua vez,
se dissocia em CO2 (gás carbônico) e H2O (água).

➢ ACIDOSE: Em situações de homeostase a liberação de H+ na corrente sanguínea ocorre de modo que a


disponibilidade de HCO3- é suficiente para promover a reação de neutralização, cursando com a formação
de gás carbônico e água. Contudo, caso a liberação de íons hidrogênio supere a disponibilidade de
bicarbonato, considera-se o estabelecimento de um quadro de acidose. As consequências podem incluir as
manifestações clínicas e laboratoriais de mecanismos compensatórios, outros distúrbios hidroeletrolíticos,
bem como sinais e sintomas de disfunções orgânicas decorrentes da acidose.

➢ A PROPEDÊUTICA DA ACIDOSE: Para a investigação de quadros de acidose, bem como para a


correta classificação dos mesmos, deve-se seguir as etapas descritas abaixo.

1. Diagnosticar a acidose, incialmente, apenas a partir do valor de pH sanguíneo encontrado: Caso


o pH se encontre abaixo de 7,35 é possível afirmar que o paciente apresenta um quadro de acidose.

pH sanguíneo: 7,35 a 7,45


2. Determinar se a acidose é metabólica ou respiratória: Neste momento, deve-se verificar os valores
de pressão parcial de CO2 (pCO2) e de bicarbonato sérico. Caso o paciente apresente resultado de pCO2
acima da faixa ideal, considera-se o quadro de acidose respiratória. Por outro lado, quando o
bicarbonato se encontrar inferior ao intervalo ideal, classifica-se o quadro como acidose metabólica.
Deve-se ressaltar também que, em algumas situações, é possível encontrar uma alta pCO2 associada a
uma baixa disponibilidade de bicarbonato, quadro conhecido como acidose mista.

− Acidose respiratória: Com a retenção de CO2 no sangue, devido a um quadro de dispneia, por
exemplo, ocorre o deslocamento da equação mostrada abaixo no sentido de formação do ácido
carbônico, que, por sua vez, se dissocia em água e H+ no meio aquoso. Dessa forma, a pCO2 é o
parâmetro adotado na gasometria arterial para inferir disponibilidade de íons de hidrogênio no
sangue.

− Acidose metabólica: Caso haja um déficit na reabsorção renal de bicarbonato ou caso o paciente
se encontre em um quadro de diarreia incoercível, por exemplo, haverá uma redução na
disponibilidade sérica de bicarbonato. Sendo assim, os íons hidrogênio fisiologicamente liberados
não serão neutralizados pelo HCO3- , o que levará à instalação de um estado de acidose.

Valores de referência
pCO2 = 35 a 45 mEq/L
HCO3 = 22 a 26 mEq/L

HCO3 actual x HCO3 standart


O raciocínio aqui guarda uma proximidade com alguns dos parâmetros laboratoriais adotados na
propedêutica da diabetes. Dessa forma, o significado do HCO3 actual seria semelhante ao da glicemia
capilar, pois reflete o valor do bicarbonato sérico no momento de realização do exame. Já o valor do HCO3
possui um significado que se assemelha ao da glicemia de jejum, pois informa a dosagem do bicarbonato
sem interferências transitórias. Portanto, nas provas de residência, caso apareçam os dois valores, deve-se
considerar o HCO3 standart.

Diarreia e acidose metabólica


Tendo em vista que o pH ótimo para a atuação das enzimas entéricas é alcalino e o bolo alimentar oriundo
do estômago é ácido, há uma secreção de bicarbonato no intestino delgado para a viabilização do bom
funcionamento do processo de digestão. Nesse sentido, quadros incoercíveis de diarreia podem cursar com
a eliminação de bicarbonato maciça e, consequentemente, com a instalação de uma acidose metabólica.
3. Determinar se a acidose é aguda ou crônica: Primeiramente, é preciso considerar que o bicarbonato
é a principal base presente no sangue e que a sua disponibilidade sérica é controlada, principalmente,
pelos rins. Além disso, deve-se ter em mente também que os rins demoram cerca de 48h para
responderem a distúrbios ácido-base. Feitas essas considerações, é possível concluir que um parâmetro
laboratorial capaz de avaliar alterações na disponibilidade de bicarbonato em relação à normalidade
poderia informar se a o distúrbio ácido base encontrado a partir da alteração no pH sanguíneo é
decorrente de um evento agudo (iniciado em menos de 48h) ou crônico (iniciado a mais de 48h). Este
parâmetro existe e é denominado Buffer Base extracellular fluid (BBecf), cujo valor de referência é 48
mEq/L. Ainda, há um outro parâmetro denominado Base excess extracellular fluid (BEecf), que, por
sua vez, reflete a o excesso ou o déficit de bases totais, sendo o valor de referência desse último
parâmetro de +3 ou -3. Em outras palavras, o BEecf indica que é aceitável um valor de BBecf entre 45
e 51 mmHg, isto é, 3 mmHg acima ou abaixo de 48 mmHg. Por fim, em situações de acidose, caso o
BBecf e o BEecf se encontrem alterados é possível concluir que o distúrbio hidroeletrolítico em
questão é crônico.

− Possíveis alterações de BBecf e BEecf na acidose: Esses parâmetros podem estar aumentados na
acidose respiratória crônica, que cursa com o aumento da pCO2 e com a retenção compensatória
de HCO3- pelos rins após 48h de instalação do distúrbio ácido-base primário. Por outro lado, nos
quadros de acidose metabólica há uma excreção aumentada de bicarbonato, como pode ser
observado na acidose tubular do tipo II. Dessa forma, nesses casos, o BBecf e o BEcef se
apresentarão reduzidos na gasometria arterial.

4. Avaliar se a acidose está compensada ou descompensada: Primeiramente, é preciso ter em mente


que todos os pacientes acometidos por acidose apresentam hiperventilação, tendo em vista a
necessidade do organismo em eliminar CO2. Contudo, esse aumento da frequência respiratória é
limitado, já que frequências acima de um determinado limite tendem a cursar com a fadiga da
musculatura respiratória, levando o paciente a um quadro de hipoventilação, o que agravaria ainda
mais a acidose. Portanto, um quadro de acidose é considerado compensado quando a pCO2 apresentada
na gasometria se encontra entre +2 ou -2 mmHg do valor calculado para a pCO2 esperada, conforme a
fórmula abaixo.

pCO2 esperada: (1,5 x HCO3) + 8

− Interpretações dessa avaliação: Um paciente com acidose metabólica que apresenta a pCO2 acima
do valor esperado possui também uma acidose respiratória, visto que ele não é capaz de ventilar o
necessário. Por outro lado, caso a pCO2 se encontre abaixo do valor esperado é possível afirmar
que o paciente está eliminado gás carbônico acima necessário e, portanto, que está sendo acometido
por uma alcalose respiratória associada. Nesse caso, deve-se atentar para o desgaste da musculatura
respiratória, considerando o risco de fadiga muscular, conforme comentado.

5. Calcular o valor do ânion gap: Em situações de homeostase, o plasma sanguíneo se encontra em


equilíbrio eletroquímico, ou seja, o total de cátions é igual ao total de ânions. O sódio é o principal
cátion do plasma sanguíneo, ao passo que o bicarbonato e o cloro são os principais ânion. Contudo, a
somatória desses dois ânions não é suficiente para se igualar ao potencial elétrico oferecido pelo sódio,
o que é justificado pela presença de uma série de outros ânions, que, por sua vez, são unificados em
ânion gap. Diante do exposto, a fórmula para o cálculo do ânion gap se encontra abaixo.

Na+= Cl- + HCO3- + ânion gap


Considerando os valores desses íons a conta deve ser feita, conforme descrito abaixo.
140 mEq/L = 106 mEq/L + 24 mEq/L + 10 mEq/L

− Qual a importância de calcular o ânion gap: De forma objetiva, as causas de acidose podem ser
divididas entre as que cursam com a elevação do ânion gap e as que não cursam com o aumento
desse parâmetro. Para compreender isso, deve-se considerar que um ácido ao se dissociar no
plasma sanguíneo cursa com a formação de um íon hidrogênio (cátion) e de uma base (ânion).
Entendido isso, conclui-se que todas as causas de acidose cujo ácido envolvido cursa com a
formação de bicarbonato ou cloreto não cursaram com a elevação do ânion gap, ao passo que, nos
quadros em que o ácido dissociado cursa com a formação de outras bases, haverá o aumento do
ânion gap. Por fim, abaixo se encontram um exemplo de cada situação dessas.

Acidose metabólica por SEPSE


Um paciente em sepse apresenta uma vasodilatação arterial, que dificulta as trocas gasosas e,
consequentemente, a oxigenação dos tecidos. Sendo assim, o paciente pode apresentar acidose justificada
pelo aumento do ácido lático, produto da respiração anaeróbica. Considerando que o ácido lático, ao se
dissociar no plasma, cursa com formação de íon hidrogênio (cátion) e lactato (ânion), conclui-se que,
nesses casos, a acidose será acompanhada por aumento de ânion gap.

Acidose metabólica por diarreia


O exemplo da diarreia como precursora da acidose já foi apresentado acima, porém agora será mais
aprofundado. Considerando que na diarreia incoercível há a eliminação de quantidades elevadas de
bicarbonato, o organismo busca recursos para a compensação eletroquímica e, dentre elas, está o aumento
sérico do cloro, conforme pode ser induzido pela fórmula do ânion gap.
➢ CONSIDERAÇÕES FINAIS: Diante de distúrbios hidroeletrolíticos, como os distúrbios ácido base, é
comum que um evento patológico leve à ocorrência de outro. Os estados de alcalose metabólica, que serão
estudados à diante, por exemplo, costumam cursar com quadros de hipocloremia e hipocalemia. Portanto,
para facilitar o raciocínio nessas situações é sempre bom ter a fórmula do ânion gap e os mecanismos
renais de reabsorção/secreção em mente.
57
DISTÚRBIOS ÁCIDO-BASE

ALCALOSE
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ CONTEXTUALIZAÇÃO: O raciocínio aqui é semelhante ao observado no contexto da acidose, ou seja,


a alcalose vai ocorrer devido a ao excesso de bicarbonato em relação aos íons hidrogênio. Dessa forma,
conclui-se que a alcalose pode ser diagnosticada na gasometria arterial a partir de um valor elevado de
bicarbonato ou de um valor reduzido da pressão parcial de dióxido de carbono (pCO2). Nesse sentido, a
propedêutica da alcalose se inicia também a partir da avaliação do valor de pH e, na sequência, constatado
um valor de pH superior a 7,45, deve-se prosseguir avaliando os valores da pCO2 e do bicarbonato. Caso
seja percebido uma pCO2 abaixo de 35 mmHg, considera-se um quadro de alcalose respiratória, ao passo
que, valores de bicarbonato acima de 26 mmHg indicam alcalose metabólica e, por fim, a presença de
ambos os achados levam ao diagnóstico de alcalose mista. Dando sequência, a alcalose respiratória só
pode ser desencadeada por hiperventilação, enquanto a alcalose metabólica requer avaliações mais
detalhadas, conforme será abordado abaixo.

➢ PARÂMETROS AVALIADOS NA ALCALOSE METABÓLICA: Os parâmetros que podem e devem


ser avaliados em quadros de alcalose metabólica se encontram descritos abaixo.

− Avaliação do cloreto sérico: Geralmente o paciente com alcalose metabólica se encontrará em um


quadro de hipocloremia, tendo em vista a equação do equilíbrio hidroeletrolítico/ânion gap.
Considerando que o bicarbonato e o cloreto são os principais ânions do sangue, espera-se que o
aumento do bicarbonato sérico curse com a redução sérica do cloreto, conforme visto na fórmula
abaixo. Ressalta-se que esse mecanismo de compensação do equilíbrio iônico dificulta a auto
resolução do quadro de alcalose metabólica, tendo em vista que o cloreto não será reabsorvido junto
do sódio e do potássio pelo transportador Na/K/2Cl presente na alça de henle. Dessa forma, o
bicarbonato passa a ser reabsorvido em substituição ao cloro na tentativa de manter o equilíbrio de
cargas iônicas, contudo, isso impede a auto resolução do quadro de alcalose metabólica. Por fim, tendo
em mente mais uma vez a fórmula do equilíbrio hidroeletrolítico abaixo, é possível classificar os
quadros de alcalose metabólica em responsivos ao cloreto e não responsivos ao cloreto, isto é, em
quadros causados por um aumento compensatório do bicarbonato diante da queda do cloreto ou não.

Na+ = HCO-3 + Cl- + ânion gap


− Avaliação do potássio sérico: Primeiramente, é importante ter em mente que a hipocalemia e a
alcalose metabólica são quadros que guardam uma grande proximidade. A justificativa dessa
afirmação se encontra muito na ação desempenhada pela aldosterona, que, ao se ligar em um receptor
próprio, permite a reabsorção de sódio acompanhada pela secreção de potássio e íons hidrogênio no
túbulo contorcido distal. Dessa forma, um hiperaldosteronismo, por exemplo, levaria a uma alcalose
em decorrência da elevada excreção de hidrogênio, bem como levaria à hipocalemia em decorrência
da elevada excreção de potássio. Contudo, causas de alcalose metabólica que cursam com a
desidratação do paciente, como quadros de diarreia incoercível, levam a um estado hiperosmolar da
urina. Dessa forma, ao chegar na região da mácula densa o filtrado com elevada concentração de Na+
promove uma hiperestimulação do sistema renina-angiotensina-aldosterona e, consequentemente, a
ação potencializada da aldosterona promove intensa reabsorção de sódio e água acompanhada por
intensa excreção de potássio. Ressalta-se que esses canais “trocam” sódio por potássio ou íons
hidrogênio, porém, devido ao estado de alcalose, a disponibilidade de H+ para ser excretado é limitada,
de modo que o paciente entre ou agrava um quadro de hipocalemia.

− Avaliação da resposta compensatória na alcalose metabólica: A fórmula para a pCO2 esperada,


nesse caso, se encontra abaixo.

pCO2 esperada
HCO3- + 15

➢ ALCALOSE METABÓLICA X ALCALOSE RESPIRATÓRIA: Conforme já discutido, a alcalose


metabólica pode ter diferentes causas, como vômitos incoercíveis, Síndrome de Bartter, Síndrome de
Gitelman e uso/ação inadequada de diuréticos de alça e diuréticos tiazídicos. Já a alcalose respiratória,
quando analisada de forma isolada, é causada exclusivamente por hiperventilação. Contudo, a
hiperventilação pode ser uma manifestação de diferentes quadros, tanto agudos quanto crônicos.
59
UROLOGIA

NEFROLITÍASE
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ OS CÁLCULOS DE OXALATO DE CÁLCIO SÃO OS MAIS FREQUENTES: Os cálculos de


oxalato de cálcio representam 70% a 80% dos casos de nefrolitíase. Nesse sentido, os cálculos podem ser
de oxalato de cálcio puro (33% do total de casos de cálculo renal), oxalato de cálcio associado a
hidroxiapatita (34% do total de casos de cálculo renal), e oxalato de cálcio associado a ácido úrico (1% do
total de casos de cálculo renal). Por fim, deve-se ter em mente que a hipercalciúria idiopática consiste no
principal fator de risco para a ocorrência dos cálculos de oxalato de cálcio e, portanto, dependendo do
caso, a atuação nesse sentido é de suma importância à abordagem terapêutica.

➢ OS CÁLCULOS DE FOSFATO AMONÍACO MAGNESIANO OCORREM APENAS NA


PRESENÇA DE BACTERIÚRIA: Também conhecidos como cálculos de estruvita ou cálculo
infeccioso, os cálculos de fosfato amoníaco magnesiano representam o segundo tipo constitucional mais
frequente de nefrolitíase. A principal característica desses cálculos é a necessidade de bactérias produtoras
de urease na urina do paciente para que sejam formados. Nesse sentido, bacteriúrias decorrentes da
presença de Klebisiella e bactérias do gênero Protheus, por exemplo, bem como pH alcalino, consistem
em fatores de risco para a formação dos cálculos de estruvita.

➢ OS CÁLCULOS DE ÁCIDO ÚRICO, HIDROXIAPATITA, CISTINA E BRUSHITA SÃO OS


MENOS FREQUENTES: Os cálculos de ácido úrico representam 5% a 10% dos quadros de nefrolitíase
e possuem a hiperuricosúria e o pH urinário ácido como fatores de risco. Já os cálculos de fosfato de cálcio
podem ser de dois tipos, isto é, hidroxiapatita e brushita, representando, respectivamente, 6% e 1% dos
casos de litíase renal. Por fim, a cistina é responsável pela constituição de 2% a 3% dos cálculos renais.

➢ A CÓLICA NEFRÉTICA É A MANIFESTAÇÃO CLÍNICA MAIS CARACTERÍSTICA: A cólica


nefrética é comumente caracterizada por episódios de dor lombar intensa e intermitente, que variam de 20
a 60 min. Do ponto de vista fisiopatológico, a justificativa dessa dor são os espasmos repetitivos que o
ureter vivencia na tentativa de forçar a passagem do cálculo impactado, geralmente, em um dos três locais
de constrição do ureter.
➢ IRRADIAÇÕES E CONSTRIÇÕES DO URETER: O ureter apresenta três locais de constrição ao
longo do seu percurso. De forma detalhadas, essas constrições se localizam na junção ureteropélvica (terço
proximal do ureter), no cruzamento do ureter sobre os vasos ilíacos internos (terço medial do ureter) e, por
fim, na junção vesicoureteral (terço distal do ureter). Nesse sentido, de acordo com o local de impactação
do ureter, é possível a irradiação da dor nefrética, conforme será visto abaixo.

→ Impactação do cálculo na junção ureteropélvica: Dor irradiada para flanco e sinal de Giordano
positivo.

→ Impactação do cálculo no terço médio do ureter: Dor irradiada para ligamento inguinal e/ou
testículo (homens)/grandes lábios (mulheres).

→ Impactação do cálculo na junção vesicoureteral: Sintomas de cistite bacteriana, como disúria,


polaciúria, urgência miccional e dor uretral, que, por sua vez, é referida pelo homem como dor peniana.

➢ A PIELONEFRITE É A COMPLICAÇÃO MAIS TEMIDA NOS CASOS DE NEFROLITÍASE: A


pielonefrite é a complicação mais temida no contexto da nefrolitíase. A justificativa disso ocorre em função
de se tratar de uma infecção fechada com potencial de evoluir com sepse intensa e de rápida instalação,
bem como com a destruição dos rins. Do ponto de vista sintomático, os pacientes com nefrolitíase
complicada por pielonefrite evoluem com febre alta, calafrios e leucocitose com desvio à esquerda. Por
fim, conforme será abordado na sequência, esses pacientes devem ter a desobstrução da via urinária sem
a retirada do cálculo como primeira conduta a ser adotada.

➢ A OBSTRUÇÃO URETERAL TOTAL BILATERAL OU EM PACIENTE COM RIM ÚNICO


EVOLUI COM INSUFICIÊNCIA RENAL PÓS-RENAL: Conforme já visto em outro momento, 5%
dos quadros de insuficiência renal aguda são de topografia pós renal, sendo a nefrolitíase responsável por
uma parcela desses casos. Contudo, deve-se ressaltar que, no contexto da nefrolitíase, para o paciente
evoluir com insuficiência renal aguda é preciso que haja obstrução total da via urinária em localização
bilateral ou em paciente com rim único. Nesses casos, assim como na nefrolitíase complicada por
pielonefrite, a primeira conduta consiste na desobstrução do trânsito urinário sem a retirada do cálculo.

➢ O PAPEL DA TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA E DA ULTRASSONOGRAFIA NO


DIAGNÓSTICO DA NEFROLITÍASE: O método padrão-ouro para o diagnóstico de nefrolitíase é a
tomografia computadorizada (TC) sem contraste do abdome e da pelve. Neste exame, a litíase renal será
evidenciada a partir de uma imagem hiperdensa (branca), localizada no interior da via urinária. Por outro
lado, a ultrassonografia (USG) também permite o diagnóstico, a partir da visualização de imagem
hiperecogênica com sombra acústica posterior. Por fim, ressalta-se que, em gestantes, deve-se optar pela
USG, tendo em vista a ausência de radiação nesse método propedêutico, diferentemente do que ocorre na
TC.

➢ O MANEJO DO PACIENTE COM DOR TÍPICA DE CÓLICA RENAL: O fluxograma abaixo


apresenta o que deve ser feito pelo médico diante de um paciente que chega ao pronto atendimento com
quadro sintomático sugestivo de nefrolitíase não complicada.

1. Analgesia: Deve ser feita a partir da prescrição endovenosa de anti-inflamatório e/ou opioide.

2. Diagnóstico por exame de imagem: Conforme já dito, deve-se solicitar TC sem contraste de abdome
e pelve ou USG para o diagnóstico de nefrolitíase.

3. Conduta a partir do tamanho do cálculo: Confirmado o diagnóstico de nefrolitíase, o tamanho do


cálculo determinará a conduta. Nesse sentido, obstruções por cálculos de até 10 mm apresentam
potencial satisfatório de eliminação espontânea e, portanto, deve-se prescrever ao paciente a terapia
média expulsiva. Por outro lado, cálculos superiores a 10 mm carecem de intervenção para serem
retirados.

3.1.Terapia médica expulsiva: Deve-se prescrever, preferencialmente, um fármaco alfa-bloqueador,


destacando-se a Tansulosina. Estes fármacos relaxam a musculatura lisa ureteral e, portanto,
facilitam a saída do cálculo impactado no ureter. Por outro lado, os bloqueadores de canal de cálcio,
com destaque ao Ninfedipino, surgem como uma escolha alternativa e menos utilizada quando
comparado aos alfa-bloqueadores.

3.2.Abordagem cirúrgica: De acordo com a localização e o tamanho do cálculo, é possível um dos


três procedimentos abaixo.

▪ Litotripsia percutânea: Indicado para cálculos proximais, localizados em pelve ou ureter


proximal, e que possuam tamanho inferior a 20 mm. Ressalta-se que esse método é
contraindicado para gestantes e portadores de aneurisma de aorta.

▪ Nefrolitotripsia percutânea: Indicado para cálculos proximais e de tamanho superior a 20


mm.

▪ Ureteroscopia: Indicado para cálculos impactados em ureter médio ou ureter distal.

➢ PACIENTES COM NEFROLITÍASE COMPLICADA DEVEM TER A VIA URINÁRIA


DESOBSTRUÍDA SEM A RETIRADA DO CÁLCULO COMO PRIMEIRA CONDUTA: Pacientes
acometidos por nefrolitíase obstrutiva que evoluíram com pielonefrite, bem como os pacientes apresentam
a obstrução bilateralmente ou em rim único devem ser encaminhados imediatamente para a colocação de
cateter duplo J ou para a realização de nefrostomia. Ressalta-se que, nesses casos, cálculo não deve ser
retirado a princípio, sendo que a finalidade de ambos os procedimentos consiste na desobstrução da via
urinária.

➢ TRATAMENTO CRÔNICO: Sabe-se que, estatisticamente, após um quadro de nefrolitíase a chance de


reincidência em 5 anos é de 50%, portanto, a profilaxia é importante, nesse sentido. De modo geral, a
prevenção de novos episódios de nefrolitíase é feita a partir de hidratação (consumo de água ≥ 2 a 2,5
l/dia) e da prevenção dos fatores de risco. Neste aspecto, é preciso ter em mente as constituições existentes
para os cálculos renais, bem como a epidemiologia, nesse sentido, e a história prévia de nefrolitíase do
paciente. Feito isso, abaixo se encontram detalhadas as prevenções para cada tipo constitucional de cálculo
renal.

→ Cálculos de oxalato de cálcio: O principal fator de risco, nesse sentido, é a Hipercalciúria Idiopática.
Confirmado esse diagnóstico, a prevenção de episódios futuros de litíase renal pode ser feita a partir
da restrição da ingesta de sódio e proteínas, bem como por meio do uso de diuréticos tiazídicos.
Ressalta-se que os diuréticos tiazídicos bloqueiam a capacidade dos trocadores de Na+/Cl- do túbulo
contorcido distal em reabsorverem sódio e, portanto, esses canais passam a reabsorver cálcio,
reduzindo, portanto, a concentração desse íon na urina. Com esse mesmo raciocínio é possível
entender o impacto da restrição de sódio como profilaxia de cálculos compostos por oxalato de cálcio,
uma vez que, diante da presença de menores concentrações urinárias de sódio, os trocadores de
Na+/Cl- citados farão uma maior reabsorção do cálcio urinário. Por fim, deve-se chamar a atenção que
a restrição na ingesta de cálcio não consiste em um método de prevenção nesses casos.

→ Estruvita: A prevenção de casos recorrentes desse tipo de cálculo pode ser feita por meio do uso de
ácido acetohidroxâmico, que, por sua vez, reduz as concentrações de urease na urina.

→ Cálculos de ácido úrico: A profilaxia de episódios de nefrolitíase por esses cálculos pode ser feita a
partir da restrição do consumo de purinas, bem como por meio do uso de citrato de potássio, que, por
sua vez, alcaliniza a urina. Ademais, os casos refratários de nefrolitíase por cálculo de ácido úrico
podem contar com o Alupurinol, que, por sua vez, reduz a síntese de ácido úrico.
63

HIPERPLASIA PROSTÁTICA
Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ O AUMENTO DO ESTROGÊNIO É O PROTAGONISTA PARA A ALTA INCIDÊNCIA DE


HIPERPLASIA PROSTÁTICA A PARTIR DOS 50 ANOS: A testosterona livre penetra na célula
epitelial prostática e, por ação da enzima 5-alfa-redutase, é transformada em di-hidrotestosterona (DHT),
que é a forma biologicamente ativa. A DHT se apresenta por meio do isotipo 1, presente em vários órgãos,
e do isotipo 2, presente de forma exclusiva no tecido prostático. A nível prostático a DTH promove a
proliferação da próstata, tanto por ação direta nas células quanto pelo estímulo à secreção de fatores de
crescimento do epitélio prostático. Na medida em que o homem envelhece ocorre o aumento sérico dos
níveis de estrogênio, que, por sua vez, estimula o aumento na expressão de receptores de androgênio nas
células prostáticas, potencializando, dessa forma, a ação da DHT e, por fim, o aumento do volume
prostático.

➢ AS REGIÕES PROSTÁTICA DE OCORRÊNCIA DA HPB E DO CÂNCER DE PRÓSTATA SÃO


DIFERENTES: A próstata pode ser dividida em zona periférica, zona de transição, zona centra e estroma
fibromuscular anterior. Nesse sentido, a zona periférica, situada posterolateralmente, responde por 75%
do volume prostático e é o local onde os adenocarcinomas da próstata se originam com maior frequência.
Já a zona de transição, localizada ao entorno da uretra prostática, representa apenas 5% do volume da
próstata, porém, é o local de origem da maioria dos casos de HPB.

➢ A OBSTRUÇÃO DA URETRA PROSTÁTICA PELA HIPERPLASIA APRESENTA DOIS


COMPONENTES, ISTO É, OS EFEITOS MECÂNICOS E FUNCIONAL: Em condições normais,
a proporção estroma/epitélio glandular é 2:1, contudo, diante da proliferação do tecido prostático nos
quadros de HPB, essa relação pode alcançar 5:1, resultando, dessa forma, no efeito mecânico obstrutor do
trânsito urinário. Por outro lado, por ação do sistema simpático, é comum também a ocorrência de
espasmos musculares do estroma prostático, tendo em vista a presença de receptores alfa-1-adrenérgicos
nessa região, o que explica o efeito funcional. Nesse sentido, ressalta-se que esse aumento da contratilidade
da musculatura prostática justifica os quadros sintomáticos em pacientes com HPB pouco volumosa. Em
outras palavras, deve-se destacar que a intensidade e o grau de desconforto dos sintomas prostáticos não
necessariamente são proporcionais ao volume da próstata ou à diminuição do fluxo urinário.
➢ AS MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DA HIPERPLASIA PROSTÁTICA BENIGNA SÃO
CONHECIDAS POR “PROSTATISMO” E PODEM ABRANGER SINTOMAS OBSTRUTIVOS
E SINTOMAS IRRITATIVOS: Os sintomas obstrutivos gerados pela HPB são os mais frequentes,
geralmente responsivos à cirurgia e justificados pelo aumento do tecido prostático. Já os sintomas
irritativos se justificam pela hipertrofia do músculo detrusor, que, por sua vez, aumenta o seu trabalho
diante de uma resistência maior à passagem da urina pela uretra prostática. Consequentemente a isso
podem ocorrer eventos que cursam com a evolução para um quadro de instabilidade vesical, responsável
pela manutenção dos sintomas irritativos após a ressecção cirúrgica em alguns pacientes.

→ Sintomas obstrutivos: Hesitância, jato fraco, intermitência, jato afilado e gotejamento terminal,
esvaziamento incompleto e gotejamento pós-miccional.

→ Sintomas irritativos: Urgência, frequência, noctúria, incontinência de urgência e incontinência de


transbordamento.

➢ COMPLICAÇÕES DA HPB: Retenção urinária aguda, litíase vesical, infecção urinária/prostatite,


falência do detrusor, injúria renal aguda, doença renal crônica e hematúria são as principais complicações
da HPB.

→ Retenção urinária aguda: Acomete 2% a 10% dos pacientes com HPB e pode ser predisposta pelo
uso de simpaticomiméticos ou anticolinérgicos, distensão aguda da bexiga, prostatite infecciosa
aguda, cálculo vesical ou infarto prostático.

→ Litíase vesical: Pode surgir como consequência da estase local ou da impossibilidade de expulsar
cálculos migrados dos rins. Diante da suspeita de litíase vesical, recomenda-se a realização de
ultrassonografia (USG) transretal.

→ Infecção urinária e prostatite: Acomete cerca de 5% dos pacientes com HPB e resultam da
colonização prostática ou da presença de urina residual.

→ Injúria renal aguda/Insuficiência renal: A topografia pós-renal responde por cerca de 5% dos casos
de injúria renal aguda, que, nesses casos, é causada por obstrução da via urinária, especialmente em
quadros de nefrolitíase e hiperplasia prostática. Como consequência dessa obstrução é possível a
instalação de hidronefrose e, nesse sentido, é importante destacar que metade dos quadros de HPB
que cursam com hidronefrose terão a instalação dessa complicação de forma assintomática,
favorecendo a não intervenção imediata e a instalação de doença renal crônica.
→ Hematúria: Quando decorrente da HPB, geralmente ocorre em dimensão macroscópica, decorrente
da ruptura de vasos submucosos locais e com resolução espontânea. Contudo, a presença de
hematúria, tanto microscópica quanto macroscópica, deve orientar a realização da investigação de
outras doenças urológicas, como neoplasias de rim e bexiga.

➢ EXAMES ROTINEIROS NA PROPEDÊUTICA DA HPB: São representados pelo exame de urina


tipo I (EAS) e dosagem sérica de ureia, creatinina e PSA.

→ Exame de urina tipo I (EAS): A presença de piúria significativa orienta a pesquisa por bactérias
gram-positivas e, consequentemente, a investigação de infecção urinária ou prostatite. Já a presença
de hematúria de origem urológica (não dismórfica e sem cilindros hemáticos) sugere a realização de
urotomografia e cistoscopia no intuito de afastar diagnósticos de neoplasia renal ou do trato urinário.

→ Ureia e creatinina: Possuem a finalidade de avaliar a função renal, bem como de afastar a presença
de nefropatia obstrutiva, bem como de outras nefropatias. Diante da elevação da creatinina,
recomenda-se a realização de USG transretal.

→ Antígeno prostático específico (PSA): Consiste na dosagem de uma glicoproteína exclusiva da


próstata, que, portanto, quando aumentada aponta para um tecido prostático de maior volume, o que
pode ocorrer tanto na HPB quanto no câncer de próstata. Nesse sentido é possível a solicitação de duas
dosagens, isto é, o PSA total e o PSA livre. No tocante ao PSA total, os valores de referência variam
de 2,5 ng/ml a 4 ng/ml de acordo com o laboratório. Pensando em 2,5 ng/ml como valor de referência,
dosagens entre 1,6 ng/ml e 2,5 ng/ml, mesmo estando dentro da faixa ideal, apontam para um risco
maior de HPB no futuro. Por fim, diante de valores aumentados do PSA total, a relação PSA livre/PSA
total sugere a etiologia da alteração laboratorial, uma vez que, quando inferior a 0,15 é mais sugestiva
de câncer, ao passo que, quando superior a 0,15, é mais sugestiva de HPB.

➢ OUTROS EXAMES: Além dos exames rotineiros, outros exames podem ser solicitados em quadros de
HPB, de acordo com o quadro clínico e/ou a evolução apresentada pelo paciente. Nesse sentido, surge a
ultrassonografia (USG) transretal, a cistoscopia, o estudo urodinâmico e a urotomografia.

→ Ultrassonografia (USG) transretal: Permite a avaliação do trato urinário superior, bem como a
espessura da parede vesical, o peso da próstata e o volume de resido miccional, quando presente. O
USG sempre deverá ser solicitado diante da indicação cirúrgica, tendo em vista que o peso prostático
é um dos determinantes da modalidade de intervenção, contudo, esse exame também deve ser
solicitado diante da presença de elevação da creatinina, bem como da suspeita de litíase vesical e em
casos de hematúria.
→ Cistoscopia: Recomendada diante da suspeita de estenose de uretra, sugerida a partir da presença de
sintomas obstrutivos e da exclusão diagnóstica de doenças da próstata e cálculo renal. Além disso,
esse exame também é obrigatório quando há hematúria macroscópica de origem urológica.

→ Estudo urodinâmico: Permite mensurar o fluxo urinário, o volume vesical residual e as relações
pressão-volume. Portanto, esse método propedêutico deve ser recomendado quando o paciente
apresenta suspeita de distúrbio neurológico associado e/ou diante da manutenção dos sintomas
irritativos após tratamento cirúrgico.

→ Urotomografia: Conforme já mencionado, juntamente da cistoscopia e da USG transretal, é um


método indicado para a investigação de hematúria.

➢ DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS: As hipóteses diagnósticas em pacientes com sintomas irritativos


são, no geral, a “bexiga do idoso”, doenças neurológicas e doenças urológicas. Já diante da presença de
sintomas obstrutivos, existem outras doenças obstrutivas que são diagnósticos diferenciais da HPB.

→ “Bexiga do idoso”: Provavelmente esse quadro é decorrente de isquemia crônica do músculo


detrusor, ao longo da vida, que, em idades mais avançadas, passa a se comportar de forma instável e
incompetente.

→ Doenças do idoso: Acidente vascular encefálico, Doença de Parkinson, cirurgias neurológicas,


tumores, demência, esclerose múltipla, mielite transversa, trauma, hernia de disco e tumores de
medula óssea.

→ Doenças urológicas: Infecções urinárias oligossintomáticas, prostatite, cálculos vesicais, cálculos do


ureter distal, carcinoma in situ e neoplasias.

➢ O ESCORE INTERNACIONAL DE SINTOMAS PROSTÁTICOS (IPSS) É FUNDAMETAL


PARA A DETERMINAÇÃO DA CONDUTA TERAPÊUTICA A SER ADOTADA: Tendo o
diagnóstico de HPB confirmado, a estratificação quantitativa dos sintomas prostáticos, realizada através
da aplicação do IPSS, permite classificar a sintomatologia do paciente em leve, moderada e grave. Nesse
sentido, de acordo com essa classificação, é possível sugerir o tratamento a ser adotado, conforme será
visto abaixo.

→ Sintomatologia leve (IPSS 1 a 7): Nesses casos, considerando a ausência de complicações, a


recomendação é o acompanhamento anual dos pacientes.
→ Sintomas moderados (IPSS 8 a 19): Nesses casos, a recomendação é a adoção do tratamento
medicamentoso, conforme será abordado na sequência.

→ Sintomas graves (IPSS 20 a 25): Nesses casos, incialmente, sugere-se a abordagem medicamentosa,
contudo, muitos pacientes acabarão seguindo para a abordagem cirúrgica. Ressalta-se que a não
resposta ao tratamento farmacológico é uma indicação cirúrgica clássica.

➢ OS BLOQUEADORES ALFA-ADRENÉRGICOS E OS INIBIDORES DA 5-ALFAREDUTASE


SÃO OS PROTAGONISTAS DO TRATAMENTO FARMACOLÓGICO: Frequentemente, opta-se
pela associação entre medicamentos dessas duas classes, no intuito de promover um potencial terapêutico
mais amplo. Contudo, o conhecimento dos mecanismos de ação e do quadro individual de HPB a ser
abordado são os grandes determinantes da conduta farmacológica a ser adotada. Com relação aos
bloqueadores alfa-adrenérgicos (Tansulosina, Alfuzosina e Silodosina), o mecanismo de ação é a inibição
da estimulação simpática nos receptores alfa1-adrenérgicos do estroma prostático e, consequentemente, a
atenuação dos espasmos dessa musculatura, responsáveis pelo componente funcional do prostatismo. Por
outro lado, os inibidores da 5-alfaredutase (Finasterida e Dutasterida) atuam inibindo a conversão da
testosterona em DHT, isto é, na sua forma funcional e responsável pela ação proliferativa do tecido
prostático, que, por sua vez, representa o componente obstrutivo do prostatismo.

➢ O PREPARO PARA AS ABORAGENS CIRÚRGICAS DA PRÓSTATA: De modo geral, o pré-


operatório das cirurgias de próstata pode ser resumido em antibioticoterapia, profilaxia de trombose
venosa profunda e anestesia, contudo, cada um desses itens tem suas considerações. Com relação á
antibioticoterapia, é recomendada de forma absoluta aos pacientes que apresentem infecção urinária no
pré-operatório, o que ocorrem em 8% a 24% dos casos. Por outro lado, a adoção de tromboprofilaxia
medicamentosa é rotineiramente recomendada nas cirurgias pélvicas. Por fim, a anestesia, geralmente, é
feita a partir de bloqueios anestésicos peridurais ou intrarraqueanos.

➢ A RESSECÇÃO TRANSURETERAL DA PRÓSTATA (RTUP): O tratamento cirúrgico padrão da


HPB vem sendo a ressecção transureteral da próstata (RTUP), tendo em vista a sua excelente relação
custo/benefício. A eficácia da cirurgia no sentido de promover melhora do fluxo urinário é referida em
mais de 90% dos pacientes, ao passo que o desaparecimento dos sintomas é relatado por 85% dos pacientes
após 1 ano e por 75% dos pacientes após 3 anos. Com relação aos efeitos adversos do procedimento, deve-
se considerar incontinência urinária, contratura do colo vesical secundária à fibrose pós operatória,
disfunção erétil e ejaculação retrógrada. Por fim, destaca-se que no pós operatório é recomendado o uso
de sonda ureteral de três vias (tri-way), que, por sua vez, dispõe de um sistema de irrigação contínua
atuante na prevenção de coágulos que possam obstruir o trato urinário.
➢ A PROSTATECTOMIA SUBTOTAL É A ABERTA NA HPB: De modo geral, essa modalidade
cirúrgica é recomendada aos pacientes que apresentam via endoscópica inacessível, presença de afecções
vesicais associadas e tamanho prostático superior a 80g. De modo geral, a prostatectomia subtotal pode
ocorrer através do acesso suprapúbico ou do acesso retropúbico. No primeiro caso, o acesso à próstata
ocorre pela bexiga, permitindo, dessa forma, a enucleação do tecido prostático. Por outro lado, o acesso
retropúbico ocorre externamente à bexiga, sendo o tecido prostático retirado a partir de uma abertura na
cápsula prostática, que, por sua vez, posteriormente, é reconstruída.
69
UROLOGIA

CÂNCER DE PRÓSTATA

Guilherme Augusto Turbino Ribeiro

➢ EPIDEMIOLOGIA: O câncer de próstata é o tipo de câncer mais incidente em homens, excluindo os


casos de câncer de pele não melanoma. Além disso, no ano de 2021 foi o câncer que mais matou no Brasil,
ultrapassando o câncer de pulmão. Contudo, mesmo diante de todos esses dados epidemiológicos, o
rastreio é controverso, uma vez que, o ministério da saúde não recomenda essa prática, divergindo da
Sociedade Brasileira de Urologia (SBU0, que adota a recomendação.

➢ INDICAÇÕES PARA RASTREIO DO CÂNCER DE PRÓSTATA (SBU): O rastreio do câncer de


próstata deve ser feito bianualmente, por meio da dosagem de PSA e do toque retal. Com relação à faixa
etária, recomenda-se o rastreio dos 45 aos 69 anos quando há a presença de ao menos um fator de risco,
isto é, pele preta ou história familiar de primeiro grau positiva. Já na ausência de fatores de risco, o rastreio
do câncer de próstata é recomendado dos 50 aos 69 anos.

➢ DOSAGEM DO PSA: O antígeno prostático específico consiste em uma proteína de produção exclusiva
da próstata e utilizado para rastreio do câncer nessa glândula. Conforme já visto na aula de hiperplasia, é
comum que os homens apresentem o aumento da próstata e, consequentemente, do PSA a partir dos 50
anos. Na maioria das vezes esse aumento será de responsabilidade de um aumento benigno, contudo, pode
também ter a contribuição de um processo neoplásico maligno. Sendo assim, existem aspectos que devem
ser avaliados no resultado do PSA, conforme exposto abaixo, para uma melhora na sensibilidade do exame
e, consequentemente, para indicações mais certas de biópsia.

REFINAMENTO DO PSA
→ Dosagem do PSA ≥ 4 ng/ml
→ Aumento superior a 0,75 ng/ml/ano no valor do PSA
→ Densidade (PSA/peso prostático) > 0,15
→ Fração livre de PSA < 25%

→ Dosagem do PSA: A interpretação desse resultado isoladamente deve levar em consideração a idade
do paciente. Nesse sentido, tendo em vista o aumento esperado do PSA com a idade, muitas referências
consideram normal um valor de PSA até 4 ng/ml nas faixas etárias mais avançadas. Contudo, nos
homens não idosos, dosagens de PSA superiores a 2,5 ng/ml já podem sugerir propedêutica adicional.
→ Aumento anual do PSA: As consultas de rastreio devem constituir um acompanhNenhuma entrada
de sumário foi encontrada.amento longitudinal, uma vez que a comparação entre o exame atual e o
anterior é fundamental. Nesse contexto, espera-se um aumento de 0,75 ng/ml no valor do PSA a cada
ano, portanto, um aumento superior a esse, mesmo em pacientes com valor de PSA normal pode sugerir
propedêutica adicional.

→ Densidade prostática (PSA/peso prostático): A cada aumento de 1g no peso prostático é esperado


um aumento de 15% no valor do PSA. Portanto, densidade prostática acima de 0,15 pode ser indicativo
de malignidade.

→ Fração livre de PSA: Ao alcançar a corrente sanguínea, o PSA pode circular de forma livre ou
associado a proteínas. Nesse sentido, percebeu-se que o PSA originado de células neoplásicas malignas
tende a circular junto a proteínas, diferentemente do PSA originado de células hiperplásicas, que tende
a circular livremente pelo sangue. Sendo assim, a fração livre de PSA, estimada a partir da relação
PSA livre/PSA total é sugestiva de câncer quando menor que 25%.

➢ DIAGNÓSTICO: O diagnóstico do câncer de próstata é feito por meio de biópsia, sendo os achados
histológicos classificados dentro do escore de Gleason. Neste contexto, os achados histológicos são
classificados de 1 a 5 de acordo com o grau de diferenciação das células e, por fim, as duas classificações
predominantes compõe o resultado do Gleason, que, portanto, varia de 2 a 10. Ressalta-se que a
apresentação desse resultado sempre é composta pelas duas classificações em ordem de prevalência, ou
seja, um Gleason 4 + 3 é diferente de um Gleason 3 + 4, uma vez que no primeiro exemplo a classificação
grau 4 foi a mais frequente, ao passo que no segundo exemplo o grau 3 foi o mais encontrado na histologia.
Por fim, a neoplasia pode ser classificada em baixo risco, risco intermediário e alto risco, conforme visto
abaixo.

RISCO DO CÂNCER DE PRÓSTATA A PARTIR DO ESCORE DE GLEASON


1. Risco baixo: Gleason ≤ 6
2. Risco intermediário: Gleason = 7
3. Risco alto: Gleason ≥ 8

➢ ESTADIAMENTO: O estadiamento é feito a partir do TNM associado à classificação histológica de


Gleason e ao valor do PSA total. Pensando no TNM, o tamanho do tumor é avaliado, especialmente, pela
ressonância magnética da próstata, ao passo que, o rastreio de metástases, quando indicado, conta
especialmente com a cintilografia óssea, tendo em vista que o tecido ósseo é o principal local de
acometimento à distância por células prostáticas malignas. Ressalta-se que as lesões ósseas, nesse caso,
são classificadas como metástases blásticas. No que diz respeito às lesões localizadas, os tipos T1-T1a se
referem a processos neoplásicos confinados em menos de 50% de apenas um lobo prostático, enquanto a
classificação T2b se refere a uma lesão em mais de 50% de apenas um lobo prostático e, por fim, a
classificação T2c diz respeito a uma lesão acometedora dos dois lobos da próstata.

➢ TRATAMENTO DA DOENÇA LOCALIZADA: As principais condutas, nesses casos, são vigilância


ativa, abordagem cirúrgica (prostatectomia radical) e a radioterapia. Ressalta-se que a escolha do método
terapêutico adotado deve levar em consideração a classificação de risco do paciente, a opinião do paciente
e a expectativa de vida dele.

➢ TRATAMENTO DA DOENÇA AVANÇADA: A doença avançada corresponde ao câncer de próstata


metastático. Nesse sentido, a principal conduta é a supressão do estímulo androgênico no tecido prostático
e, portanto, é possível a realização de orquiectomia bilateral ou de hormonioterapia.

Você também pode gostar