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Tema 2_1

Esquema
Objetivos de aprendizagem:
A função social da Literatura medieval
Repertórios (géneros) Medievais
Lírica profana (tipologias)
Neste tema estudamos o processo de construção dum sistema literário laico da mão da nobreza, em
romance, no Noroeste peninsular entre os séculos XII e XV. Na hora de estudarmos desta maneira a
literatura medieval galego-portuguesa interessará-nos especialmente identificar as condições sociais
de produção e analisar a sua função social. Isto é:
• o/s grupo/s que promovem e executam o repertório (quer dizer, essas práticas, formas e
discursos que hoje chamamos literatura medieval)
• os objetivos e interesses (sociais, ideológicos, estéticos, políticos, ...) que esses agentes
perseguem com essas práticas culturais concretas
• as ideias que veiculam os produtos de cada tipologia específica (sobre a sociedade medieval,
a arte, as relações simbólicas, políticas e económicas dos vários agentes envolvidos ...).
Para além das principais tipologias de produtos (géneros) e as suas características mais destacadas,
neste tema 2 atenderemos também o processo de canonização (em virtude de que critérios é
atribuído valor a cada tipologia concreta, nomeadamente lírica vs prosa) e que posição ocupam
atualmente os repertórios medievais na historiografia literária galega. Veremos igualmente a função
específica atribuída à literatura medieval galego-portuguesa noutras épocas (em concreto na
chamada Época Nós)

Numas comunidades coesionadas basicamente pola fé, ao lado e em relação com o sistema cultural
do clero (veiculado em latim e alargado ao espaço social do conjunto da cristandade) emergem
claramente a partir do século XII todo um conjunto de práticas culturais e literárias ligadas aos
interesses específicos da nobreza europeia. Este sistema cultural laico é veiculado em línguas
romances e tem presença no âmbito restrito da nobreza através da transmissão oral e manuscrita dos
seus produtos. Essas práticas (no caso da lírica, ligadas estreitamente com a música) vão
conformando uma rede de elementos mui pouco diversificada se a compararmos com a atual (na
altura a nobreza produz apenas para a nobreza) e visa a legitimação da própria nobreza como
estamento (como grupo, classe, ...) e das suas práticas e modos de comportamento e de relação,
focando igualmente a sua formação (a educação da nobreza, daí o didatismo, ligado com a própria
ideia de arte medieval) e regularização/ coesão, num momento, aliás, em que a nobreza assiste a
vários processos sociais que colocam em risco o seu sistema de (re)produção social...
... A começar pola mudança produzida no sistema de herança que passa de ser distribuída mais ou
menos equilibradamente ao conjunto da descendência a concentrada no filho (varão) primogénito,
gerando um conjunto numeroso de segundogénitos sem capitais específicos (terras, títulos, ...).
Numa sociedade com mui escassa mobilidade social ascendente e onde a posição depende da
linhagem (valor aristocrático) e não do mérito (valor burguês), essa falta de capitais coloca sérias
dificuldades para acederem ao mercado matrimonial e poderem dar continuidade assim à sua
linhagem (> cantigas de amor).
Apesar disto, a verdade é que o morgado (concentração da herança no primogénito varão) reforça a
posição da “casa” (da família), e pode ser entendido até como resposta à ameaça que supõe para a
nobreza o processo de concentração do poder empreendido pola monarquia (cada vez mais
hereditária e menos eletiva...) (> livros de linhagem)
Outros dous elementos a serem levados em conta para o entendimento da produção medieval:
1) Ela é condicionada pola relação de mecenato que se estabelece entre a nobreza (também
produtora ela própria) e os agentes responsáveis diretos pola produção. Da largueza
(generosidade) d@ senhor depende o mantimento dos agentes, limitados também polo poder
civil e religioso da altura.
2) Os produtos gerados atendem as estreitas normas (de composição, estrutura, formas, imagens,
...) fixadas pola Escolástica, uma ideia platónica de arte que entende os produtos como
reproduções mais ou menos acabadas de um modelo fixo e estável. Os desvios do modelo são
possíveis (vid as cantigas de amigo como desvio das cantigas de amor) mas a originalidade (tal
como entendida desde o romantismo) é considerada um “pecado de orgulho”, a arte é anónima e
deve servir Deus..
Este fragmento pode ajudar a entender este último ponto:
“As obras de arte medievais surgiram no contexto em que o conceito de arte não existia
como fim em si mesmo. Nem o da beleza como objetivo, nem mesmo o conceito de artista ou
de artes plásticas, mas sim, o de artes mecânicas, diferenciados dos liberais.
O objeto artístico medieval tinha, na sociedade em que foi produzido, um caráter
basicamente funcional. Para o medievalista francês Georges Duby, a obra de arte medieval
cumpriu essencialmente três tarefas:
Seja uma oferta a Deus, aos santos e/ou a falecidos, a fim de obter sua graça, sua
indulgência, etc;
Ser intermediário entre o mundo sobrenatural e o mundo humano, tornando visíveis nesta
realidade divina, segundo a máxima paulina per visibilia ad invisibilia (através do visível
para o invisível);
Ser uma afirmação de poder.” (fonte: https://artout.com.br/arte-medieval/)

A divisão entre artes liberais e artes mecânicas ajuda-nos a entender as diferenças na consideração
social dos três agentes responsáveis pola produção da lírica medieval (ainda que a divisão é um
bocado artificial... <http://artedetrovar.blogspot.com/2016/09/trovadores-x-jograis-x-segreis.html>):
Trovador: nobreza, alta consideração social, compõe cantigas, sem troca económica (artes liberais)
Jogral: classe baixa, pode compor mas de regra executa as cantigas compostas polos trovadores,
troca económica (artes mecánicas)
Segrel: Fidalgos, infançons? Jograis que compõem e executam cantigas, aspiram a ser considerados
trovadores (artes mecânicas> liberais)

Em relação com os géneros e a sua função social, vão interessar especialmente:


Lírica > cantigas de amor e amigo
Questões sociais e políticas que condicionam/ determinam a produção: heranças apenas para os primogénitos
e problemas sociais que isso gera.
Origem e evolução do repertório: Da cantiga de amor aos cantares de amor [cantigas de amor e cantigas de
amigo].
Função social: acesso ao matrimónio e normas de comportamento vassalático.
Função específica da cantiga de Amigo: adoutrinamento feminino na política matrimonial da casa.

Historiografia > livros de linhagens


Utilidade prática e simbólica e função social dos Livros de linhagens:
legitimação da nobreza
regulamentação do matrimónio [proibição da Igreja de casar até ao 7º grau de parentesco]
direitos de padroado, avoengo, etc.

Prosa > Matéria de Bretanha


Condições sociais de produção dos textos (quem e porquê?)
A concentração do poder na figura do rei e a ameaça que para a nobreza supõe o ascenso da burguesia (e a
eventual aliança desta com a monarquia), determina a produção duma série de textos (aqui “Matéria de
Bretanha”) que promovem uma imagem de harmonia entre o rei e a nobreza (e a generosidade do rei, a
largueza, aparecerá como instrumento fundamental para a consecução dessa harmonia) e de unidade do
estamento (e aqui está a Távoa Redonda como símbolo dessa unidade...)
Papel do Císter na passagem da “cavalaria terrenal” para a “cavalaria celestial”:
Cristianização do repertório levada a cabo polo Císter percetível nos lugares, datas, personagens, símbolos,
objetivos... d'A Demanda do Santo Graal.

Ah! Lembrai que durante a Idade Média (nomeadamente na época de Gelmírez) a Coroa Galega tinha uma
posição central na política e na cultura europeias. As luitas pola preeminência de Compostela face Braga (no
Reino da Galiza), Toledo (na península) e Roma (na Europa) ajudam também a entender tanto essa
centralidade como a queda posterior… (https://gl.wikipedia.org/wiki/Reino_de_Galicia /
https://gl.wikipedia.org/wiki/Diego_Xelm%C3%ADrez).

Bibliografia de interesse para consulta:


BITAGAP: Bibliografia de Textos Antigos Galegos e Portugueses
https://bancroft.berkeley.edu/philobiblon/bitagap_po.html
Universo Cantigas: https://www.universocantigas.gal/
Lírica galego-portuguesa no CIRP: https://www.cirp.es/proxectos.html
Recursos Philobiblon https://bancroft.berkeley.edu/philobiblon/resources_po.html

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