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Ética e Serviço Público

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Objetivos e Conteúdo Programático

Você está iniciando o curso Ética e Serviço Público.

Neste curso você obterá informações sobre a dimensão ética de sua atividade
profissional e será estimulado a uma atitude reflexiva sobre os problemas
relacionad os à essa dimensão.

Estrutur a do Curso - Veja aqui os tópicos que serão apresenta do s e discutidos:

MÓDULO 1
- Por que estamos discutindo ética?
- O mérito da ação: intenção e Juízo desinteressado
- Escolha e deliberação
- Virtudes e caráter
– Autono mia e responsabilidade

MÓDULO 2
- Por que falar em ética da vida pública?
- República e democracia
- Estado, cidadania e império da lei
- O cargo público
– A prestação pública de contas (Accountability )

MÓDULO 3
- Por que conduta e regras de conduta?
- Profissionalismo, decoro e civilidade
- Códigos de ética no serviço público
- Iniciativas da administração pública federal
- Conclusão
MÓDULO 1 – Conceitos Básicos

Neste módulo você terá contato com conceitos básicos de ética e com o significado
da “dimensão moral ou ética” da existência.

Os assun to s abordados aqui são:


1.1- Por que estamos discutindo ética?
1.2 - O mérito da ação: intenção e Juízo desinteressado
1.3- Escolha e deliberação
1.4 - Virtudes e caráter
1.5 - Autonomia e responsabilidade

1.1 - Por que estamos discutindo ética?

Do Moralismo à Ética
Há pouco tempo – durante as décadas de 1960 e 1970 – o discurso político que
punha ênfase na moralidade vinha associado a idéias conservadoras.

Defender a moral e os bons costumes era defender valores longamen te


sedimenta d o s na sociedade, e tidos como essenciais à manutenção da ordem
estabelecida.

Os que abraçavam idéias progressistas ou de mudança social, tendiam a entender a


ênfase na moral como um enfadonho moralismo acrítico e, especialmente, como
uma forma de controle ideológico da contestação.

Aquele foi um período de grande choque entre o passado e o futuro, a tradição e a


mudança, que afetou não só as instituições políticas, mas práticas sociais como a
religião, a família , os costumes sexuais, o modo de se vestir, a música e tantas
outras.

Essa polarização deixava pouco espaço para se pensar a ética como uma dimensão
incontorn ável da existência humana.

Vivemos hoje um contexto bem distinto.


De certa forma, as próprias instituições contestada s foram capazes de absorver -
ainda que pasteurizan d o seu conteúdo - parte das práticas e dos significados da
crítica social daquele período, especialmente aquelas que denunciavam um
moralismo rígido.

Isso é muito visível no que diz respeito aos costumes sexuais: o que era então
considerado abominável e excepcional tornou - se corriqueiro e quase um padrão
estético.

É como se, de fato, o estoicismo conservador tivesse se transfor ma d o em peça de


museu.

Algo semelhante ocorreu nos modos de se vestir, na música e, pelo menos em


parte, na família e na religião. “Pelo menos em parte” porque a família e a religião
continua m muito fortes, mas em geral tiveram de se adaptar aos novos tempo s,
flexibilizan d o – na prática, quando não no discurso – os padrões rígidos
recomen d a d o s a seus praticantes.
Embora certas práticas sociais inovadoras tenham ganhado terreno, e a própria
idéia de “contestação” conquistado ampla aceitação social, esse passo adiante não
levou ao esvaziamento do discurso moral.
Pelo contrário, assiste - se hoje a um forte ressurgiment o das preocupações com a
dimensão ética da vida social em todos os campos, especialmente no das
interações entre a economia e a política, e do exercício das funções públicas.

Curiosamen te, percebe - se até mesmo uma inflexão da antiga polarização


ideológica centrada na moralidade: enquant o parte do discurso e da prática
conservadores continua m firmemente aterrados à rigidez moral, associando como
nunca a ética com a tradição e a ordem estabelecida, outra parte tende a deixá- los
de lado, numa atitude cada vez mais flexível e pragmática em relação a princípios e
valores éticos.

Por outro lado, os que se sentem comprome tidos com o discurso e a prática
contestató rios têm se dado conta da importância de resgatar esses princípios e
valores, na medida mesmo em que forças do status quo parecem desenfatizá - los
ou mesmo desprez á - los, sem dúvida porque têm atinado que a perspectiva da
mudança social e a consciência ética não são, se bem compreendida essa última,
opções conflitantes.

De todo modo, pode - se dizer que as sociedades contem por â nea, independen te das
inclinações político - ideológicas da maioria de seus cidadãos, têm demons tra d o
uma inédita abertura para refletir seriamente sobre os pressupos t os éticos de sua
existência, problematizan do desse maneira seus costumes, regras formais e
práticas informais.

Essa abertura acaba repercutindo nas instituições públicas, tanto nas de


representação quanto nas de administração, na forma de uma demanda para que
seus profissionais acolham as inquietações morais das comunida des a que servem.

Uma familiarização com o que significa a dimensão moral ou ética da existência


parece, portanto, muito apropriada a quem pretende aprimorar sua atuação
profissional nos diversos setores do serviço público.

1.2 - O mérito da ação: intenção e juízo desinteressado

O que queremos dizer quando afirma mos que a existência humana tem uma
dimensão ética ou moral?
Certas correntes da teoria moral costum a m distinguir os campos da Ética e da
Moral. Filósofos alemães, por exemplo, freqüente me nte distinguem as práticas,
regras ou costumes substantivos de uma comunidade específica (o campo da ética),
dos princípios formais, e suposta me n t e de caráter universal, implicados na
consciência do dever (o campo da moral propriame nte dito). Outras correntes são
menos propensas a essa distinção. Embora esclarecedora para certos propósitos,
essa distinção não será relevante para o nosso curso.
Etimologicamente, os dois termos têm significados semelhantes: “ética” vem do
grego ethos , e “moral” do latim mos , ambos significando “uso” ou “costume”.
Assim como os movimentos das rochas, dos mares e dos planetas, as ações
humanas modificam o mundo. Contudo, esses dois tipos de eventos são apreciados
de formas completa men te distintas.

Quando o evento é desencadea do por pessoas, a avaliação moral supõe não apenas
o aspecto exterior, visível, do evento, mas um aspecto introspectivo, que diz
respeito ao sentido interior e consciente que essas pessoas dão às suas próprias
ações. A avaliação moral implica um esforço para escrutinar as intenções do
agente.

Quando o evento é originado por uma cega força causal, essa avaliação não ocorre
exatamen te porque não há como atribuir uma intenção àquela força.
A ética envolve um processo avaliativo especial sobre o modo como os seres
humano s intervém no mundo ao seu redor, principalmente quando se relacionam
com os seus semelhantes. Esse processo avaliativo diz respeito ao mérito ou
demérito do agir humano. São as atribuições de mérito ou demérito que
impregnam esse agir com um tipo de valor: o valor moral.

Tomemos um acontecimento recente, que tanto impacto causou na opinião pública


internacional...

A destruição de uma escola pública na região de Ossétia do Norte em Beslan,


Rússia, após uma tentativa malograda de manter como reféns centenas de pessoas
no seu interior, resultou na morte de mais de trezentas delas, a maioria crianças.
Muitas outras catástrofes, remotas ou recentes, em sua manifestação exterior e
visível, provocaram tanta (ou mais) destruição quanto a tragédia russa. São
frequentes as notícias de terremotos, tempesta des e furacões que devasta m
cidades inteiras, contendo não uma escola, mas muitas delas, causando um número
muito maior de vítimas, inclusive crianças.
Porém, não é verdade que o choque e a repulsa que nos provoca o evento russo é
muito mais significativo?
Qual a diferença?
Ocorre que no evento russo, levamos em conta não apenas seu aspecto exterior – a
destruição física e humana resultante – mas o pensamen to, a meditação (prévia ao
ato visível) que impulsionou seus agentes àquele objetivo. Quando atribuímos a
essa meditação uma intenção de qualidade negativa – dizemos “má”, “perversa”,
“torpe” etc. - tal qualidade contamina a avaliação do conjunto. Não fazemos o
mesmo quando se trata de terremotos e furacões, e isso diminui o choque que eles
nos provocam, mesmo que causem muito mais morte e destruição.
O inverso é igualmente válido: eventos de origem humana aos quais atribuímos
uma intenção de qualidade positiva, e que resulta m em algo tomado como
“constru tivo”, causam em nós um impacto muito mais sublime do que eventos
naturais benéficos à humanidade.

O processo avaliativo do agir moral leva também a uma clivagem dos próprios
eventos de origem humana. Isso tem a ver com o sentido da intenção.

Um evento humano involuntário ou acidental carrega um impacto moral muito


diferente de um evento voluntário ou planejado. Esse tipo de clivagem é muito
comu m nas práticas do direito penal e criminal (a diferença entre dolo e culpa, por
exemplo), mas na verdade permeia todas as nossas avaliações do gesto humano.
O desastre ocorrido na década de 1980 na usina nuclear de Chernobyl, na ex- URSS,
quase equivaleu, por causa do vazament o radioativo que provocou, a uma explosão
nuclear.

Ele foi fortemente repudiado pela opinião pública, pelo que revelou de negligência
das autoridades competentes. Contudo, a apreciação moral desse evento de “causa
humana”, porém acidental, é muito diferente – e provoca bem menos controvérsia –
do que o lançamento, cuidadosa m e nte planejado, de bombas atômicas no Japão
duran te a Segunda Guerra Mundial.

Por mais plausíveis que fossem as justificativas pragmáticas desses bombar deios
(as inevitáveis “razões de guerra”), assim mesmo nos impressiona – e nos apavora –
a simples idéia de que as bombas tivessem sido lançadas com a intenção precisa de
matar dezenas de pessoas, inclusive crianças.

Pode - se atribuir valor – positivo ou negativo – ao próprio gesto involuntário se for


percebido como subprod ut o de uma atitude prévia, “negligente” ou “pruden te”.
Ainda assim, porém , essa avaliação tende a ter menor impacto do que uma atitude
perfeitamen te consciente e premeditada que tenha relação direta com o evento
“bom” ou “ruim” produ zido.

Nas crenças religiosas de civilizações remotas, costum ava - se atribuir significados


éticos a catástrofes naturais, exatamente porque se supun ha que tais eventos eram
provocados por “deuses” ou “espíritos” que possuíam características humanas –
entre as quais, é claro, a premeditação e a intenção - o que levava a imaginar que a
“fúria” das catástrofes advinha da fúria desses entes antropo m o rfizados.

Além da intenção, há um segundo aspecto que captura bem a moralidade como um


processo avaliativo especial. Trata - se do ponto de vista desinteressado.

Mas o que é o ponto de vista desinteressado?

Quando avaliamos o mérito da ação, nos esforçamos para ser imparciais não
levando em conta se ela nos prejudica ou nos beneficia. Procura mos desconsiderar
se aquele gesto promove ou não nosso próprio interesse.

Claro que os seres humanos são fortemente motivados por impulsos egoístas e
interessad o s; e que esses impulsos não raro nublam nossa capacidade de avaliar o
gesto alheio.

Mesmo assim é característico da avaliação moral escrutinar o mérito ou demérito


de uma ação independen te do fato de beneficiar ou prejudicar essa ou aquela
pessoa.
Veja como fenômenos corriqueiros indicam a presença de uma sensibilidade moral,
embora indiquem, também, o quão sutil e difícil é sua operação na prática...

Por exemplo: é essa sensibilidade que nos faz pensar que um adversário em uma
competição é moralmente “decente”, ainda que ele venha a nos vencer (e portan to,
prejudicar) nessa competição.
Ou é isso que faz o torcedor de um time chegar à conclusão que os jogadores do
time adversário são “honestos”, ainda que venham a superar o time de seu coração.

Concluindo: pode - se admitir que a sensibilidade moral é geralmente menos intensa


do que as reações advindas do interesse próprio ou de emoções como a ira, a
inveja ou o ciúme. Mas ela é suficienteme nte sólida para orientar as exigências de
imparcialidade para o mérito alheio, fundame nt ais para sustenta r o que chamam o s
aqui de dimensão moral da existência.

Muitos aspectos da vida social – talvez mesmo o próprio viver comunitário – seriam
simplesmen te inimagináveis, não fosse essa capacidade de fazer juízos morais,
desinteressados, a respeito do que fazem outras pessoas ou comunidades.

O SENSO E JUÍZO MORAIS

Um filósofo escocês do século dezoito, David Hume, dedicou - se longamente a


estudar as peculiaridades do ponto de vista moral, e a criticar os que supunh a m
que este ponto de vista poderia ser reduzido a uma perspectiva egoísta ou parcial.

Em seu livro mais famoso a respeito – Uma Investigação sobre os Princípios da


Moral (Campinas: ed. UNICAMP, 1996) – Hume destaca precisamente o tipo de juízo
que está em jogo quando fazemos avaliações morais.
“Frequen te men te dedicamos elogios a ações virtuosas realizadas em épocas muito
distantes e em países remotos, casos em que a máxima sutileza da imaginação não
conseguiria revelar qualquer vestígio de interesse próprio ou encontrar qualquer
conexão entre nossa felicidade e segurança presentes e eventos tão amplamen te
separados de nós.
Um feito generoso, nobre e corajoso realizado por um adversário granjeia nossa
admiração, ainda que possa ser reconhecido, por suas consequências, como
prejudicial a nossos interesses particulares.
Nos casos em que vantagem privada se combina com a afeição geral pela virtude,
nós pronta me nt e percebemos e confessa mos a mistura desses sentimento s
distintos, cuja atuação e influência sobre o espírito são muito diferentes. [...]
Construa - se o modelo de um caráter digno de todos os elogios, composto de todas
as mais estimáveis virtudes morais; citem - se exemplos nos quais estas se
manifesta m do modo mais esplêndido e extraor dinário – conquistar - se- á
pronta me n te, neste caso, a estima e a aprovação de todos os ouvintes, que não irão
indagar sequer uma vez em que época ou país viveu essa pessoa, apesar de ser essa
informação, dentre todas, a mais importante do ponto de vista do interesse
próprio ou preocupação com a própria felicidade individual.[...]
'Que tem isso a ver comigo?' Há poucas ocasiões em que essa pergunta não é
pertinente; e se ela tivesse a influência universal e infalível que lhe é atribuída,
tornaria ridículos todos os discursos e quase todas as conversas que
contivessem algum louvor ou repreensão de pessoas ou costume s.” (pp.80 - 1)

O filósofo alerta também que a avaliação moral não é apenas uma questão de
sentimento.
“Dedicamos sempre uma consideração mais apaixonada a um estadista ou patriota
que serve nosso próprio país em nossa própria época do que a um outro cuja
influência benéfica operou em eras remotas ou nações distantes, nas quais o bem
resultante de sua generosa benevolência, estando menos relacionado conosco,
parece - nos mais obscuro e nos afeta com uma simpatia menos vivida. Podemo s
reconhecer que o mérito é igualmente grande em ambos os casos, embora nossos
sentimento s não se elevem à mesma altura.” (p..95)

A avaliação moral mobiliza também a razão, que procura corrigir um eventual


desequilíbrio dos sentimentos.
“Aqui, o juízo corrige a parcialidade de nossas emoções e percepções internas, do
mesmo modo que protege do erro diante de muitas variações das imagens
apresen ta d a s aos nossos sentidos externos.” (p.95)

A que se deve essa capacidade de atribuir mérito e demérito às nossas ações?

Desde a Antiguidade Grega e Romana, os filósofos se dividem sobre a questão.

Alguns atribuíra m a origem de nossas avaliações morais a uma faculdade racional


pura, completame nte livre de nossos desejos e emoções capaz de determinar
máximas universais para nossos atos, qualificando - os então como dignos de
mérito.

Outros, como o próprio Hume, citado anteriormente, pensara m que a razão é


apenas um fator subsidiário do juízo moral, que de resto opera graças a uma
capacidade inata que possuímos de compar tilhar as misérias e as alegrias alheias.

Mais recenteme nte, outros recortes se superp usera m. Por exemplo...

Concepções que remetem a moralidade à condição intrinsecamente social do ser


humano e...

Concepções que têm em conta o caráter prático da linguagem humana.


A linguagem, nestas concepções, não apenas tem a função de representar o
mundo, mas é uma forma de agir. Uma das visões mais influentes, nesse
campo, é a Teoria da Ação Comunicativa do Filósofo alemão J. Habermas.

Apesar das divergências entre as correntes filosóficas, todas reconhecem a ética


como uma dimensão especial da vida – isso, tanto para lhe dar significado
existencial mais profundo, quanto para preservar e aprimorar (através da política) a
própria vida comunitária.

1.3 - Escolha e deliberação

Até aqui falamos pouco dos aspectos cognitivos da ética. Contudo, o agir moral é
um tipo de atividade inteligente, e dos mais complexos.

 ESCOLHA

A escolha é o momento final – e o mais visível – de uma meditação que a precede.

O que significa a escolha?

. A rigor, esse aspecto da ação seria impensável se ao agente não se colocassem


alternativas. Pois com apenas um caminho a seguir não haveria escolha.

. O processo avaliativo da ética depende de que se façam certas coisas não tomadas
como inevitáveis. Do contrário não haveria mérito na ação.

. É a partir das comparações com o que as pessoas poderiam ter feito, mas
acabaram não fazendo, que se chega a um juízo sobre o mérito ou demérito.

 DELIBERAÇÃO

A moralidade supõe uma estrut ur a do mundo em que pelo menos uma parte dos
eventos não está submetida a uma necessidade férrea, em que tudo que acontece
não poderia ser diferente, da qual nada e ninguém pode escapar. Se todos os
eventos fossem inevitáveis, a escolha não seria apenas impensável, mas inútil.

Contu d o, a escolha exige uma introspecção prévia que vai não só definir a intenção
do agir, mas desencadear um processo de amadureciment o.

Isto é, a ação que provocará uma intervenção no mundo, a modificação de um


estado de coisas, requer um tempo de gestação interna: a deliberação.

É como se a escolha crescesse dentro de nós antes de adquirir um aspecto mais


bem definido ou maduro na forma da própria escolha, para só então se expor ao
mund o visível.

 O PROBLEMA DO ACASO

Por outro lado, a deliberação e a escolha não seriam plausíveis se supuséssem o s


que os acontecimentos do mundo estão à completa mercê do acaso.
POR QUÊ?
. Os eventos que não derivam de uma necessidade férrea nem por isso são
meramen te acidentais, como que resultado da pura “sorte” ou “azar”.
. Embora haja muitos eventos que não depende m de nós, há outros cuja existência
efetiva dependem de nós.
. Os eventos que depende m de nós são fruto de nossa atividade inteligente e
premeditad a.

 ENTRE A NECESSIDADE E O ACASO

Para que a ética seja fato de uma dimensão significativa de nossas vidas,
precisamo s estar convictos de que a deliberação e a escolha fazem uma grande
diferença no resultado final, isto é, que o mundo seria muito distinto do que é se o
deixássemo s seguir seu curso sem a nossa interferência consciente.

A ação humana em geral, e o agir moral em particular, situam - se portanto num


meio termo entre a necessidade férrea e o acaso total.

 MEIOS E FINS
Vejamos agora como o agir moral representa um campo privilegiado da deliberação
e da escolha.

Toda a ação visa a objetivos, “metas” ou “fins”, que se colocam ao agente no


contexto de um plano de sua ação.
Porém...
. O plano não pode se limitar à meta ou fim
. Há etapas intermediárias no caminho, cada etapa corresponde n d o a um “meio” ou
“recurso” para se atingir o “fim” almejado.
. O plano exige uma meditação sobre esses níveis distintos de um mesmo processo
– os “fins” da ação e os “meios” para alcançá - los.

Em resu mo, temos os seguintes problemas sobre os quais deliberar e escolher:


. a determinação das metas (ou fins)
. o discernimento de todos os meios que tornaria m aquelas metas realizáveis.
. a própria seleção dos meios que o agente consideraria adequados, entre os vários
que ele poderia mobilizar.

Falando mais sobre o vínculo entre meios e fins...

Um fim tem que ser algo que o agente deseja, porém sempre pode haver mais de
uma opção ao agente – vejamos:
1) Posso desejar algo, mas chegar à conclusão de que os meios para alcançá - lo
estão fora de meu alcance.
2) Posso desejar algo perfeitamente alcançável, mas que eu mesmo não o considero
apropriad o do ponto de vista moral.
3) Posso desejar algo moralmente apropriado, mas pensar que certos meios
disponíveis para alcançá - los são inapropriados.

Observe...
Em (1) o fim planejado não pode estar descolado de uma avaliação da capacidade
de realizá - lo: se acho que não há meios disponíveis que me levem àquele fim, devo
reconsiderar a própria meta.
Em (2) e (3) a questão do mérito ou demérito da ação já qualifica de um modo
especial as opções. Eu tenho certas opções ao meu alcance, sei que elas poderiam
acontecer se assim o desejasse, mas a percepção de um demérito nela me leva a
cogitar uma espécie de veto interno.

O veto interno é independen te de qualquer coação externa, de ordem física ou


legal, que possa eventualmente impedir ou dificultar o exercício da opção.

POR QUE FAZEMOS O VETO?


As alternativas que vetamos estão lá, ao nosso dispor, apenas recusamos procurá -
las, simplesme nte porque consideramos seus fins, ou seus meios, indignos daquilo
que valorizamos moralmente.

Porque apesar de serem momentos de um mesmo processo, insistimos na distinção


entre a deliberação e a escolha?

A deliberação é um raciocínio ou meditação sobre alternativas. Como essa


meditação não é da ordem de uma demonstr ação, não temos como saber se sua
conclusão é verdadeira.
Sendo de um resultado incerto, a meditação poderia prosseguir indefinida men te,
não fosse por uma questão: É PRECISO AGIR.
O término da deliberação não está inscrito no próprio raciocínio – como é o caso de
uma demons tração matemática – mas advém do fato de que a ação é prática, ela
visa a uma intervenção no mundo.

A intervenção possui um tempo oportuno, antes ou depois do qual ela se torna


inútil ou inefetiva.
Por causa das pressões de caráter prático, surgirá um momento em que a
meditação terá que ser encerrada, mesmo que permaneça m dúvidas a respeito da
opção a ser feita.

“SE NÃO ESCOLHERMOS, SEREMOS ESCOLHIDOS”

Entre a deliberação e a ação subsequente no mundo há, pois, um fosso que somos
obrigados a transpor através de um salto arriscado.
Não fosse por isso, poderíamos continuar vacilando indefinidamente a respeito das
alternativas. Entretanto, isso é impossível na prática, pois...

CHEGARÁ O MOMENTO DA ESCOLHA.

1.4 - Virtudes e caráter

O problema da escolha, como algo distinto da deliberação, já insinua que a ética


não se resume a uma questão de inteligência, de capacidade cognitiva.

É preciso, além da naturez a inteligente da ação moral, uma disposição para agir
confor me a direção apontada pelo intelecto. Esse ponto remete às virtudes.
Muitos obstáculos se colocam adiante do plano meditado na consciência:

. Devemos, é claro, considerar o mundo ao redor: o mundo físico e também o


constituído por outras pessoas, que podem resistir ou colaborar.
. Mas não é só isso: o agente é um ser complexo, que não se resume ao seu
intelecto. Outras faculdades desse complexo entram em jogo quando ele decide
modificar o mundo através de seu agir: o corpo, as emoções, os apetites...

O que é preciso para se chegar à virtude?


É preciso que os desígnios do intelecto estejam bem concatenados a essas outras
faculdades (internas a nossa própria pessoa) que engendram a ação no mundo.
Em seu conjunto, as partes engrenadas umas às outras, dispõem as pessoas a agir
de uma determinada maneira, e não de outra.
As disposições dão consistência prática, e não apenas cognitiva, aos nossos planos
de vida.
Se são virtudes, falamos de disposições “corretas”, “adequadas” ou “excelentes”. Se
são vícios, falamos de disposições “erradas”, “inadequa das” ou “ruins”. Há graus de
virtude, tanto quanto de mérito.
Veja uma situação típica...
Posso desejar algo e, no entanto, carecer da força de vontade para buscar o objeto
desejado.
Posso pretender reagir de certa maneira quando o momento exigir, mas
simplesmen te não conseguir fazê - lo quando o momento chega.
Por exemplo, costuma - se dizer que a coragem é uma virtude.
Porém, não basta qualificar a coragem como um mérito, considerá - la um valor,
para nos dotar mos dessa virtude.
Ainda que a coragem seja desejável, e a desejemos genuinamen te, é bem possível
que não consigamos ser corajosos quando as circunstâncias assim o exigirem.

Como adquirimos as virtudes?


Adquirimos as virtudes por HÁBITO.

O hábito é mais do que o gesto que se repete automaticamen te.


Trata - se de um longo esforço acompanha d o de intensa concentração que, juntos,
refinam a agência moral e a torna m apta a fazer coisas que considerar desejáveis.
E desejar coisas que considerar moralmente corretas ou nobres.

 O CARÁTER

Na verdade, NÃO EXISTE UMA VIRTUDE, MAS VÁRIAS.


Uma pessoa encerra em si mesma uma mistura de disposições, que lidam com as
diferentes partes da engrenagem da ação.
Algumas dessas disposições podem ser virtudes, em diferentes graus, e outras,
vícios.
Podemos ser corajosos, mas impruden tes; medrosos, porém honestos, e assim por
diante.
É pouco provável que uma pessoa consiga reunir todas as boas disposições
imagináveis, e menos ainda no seu ponto mais alto. Ninguém é perfeito.

A complexa mistura de disposições numa personalidade vai constituir o que


chamam o s de CARÁTER.

Quando julgamos o caráter de alguém, não avaliamos uma página ou um breve


capítulo de sua vida. Fazemos um balanço do conjunto da obra até ali.
Não dizemo s que tal sujeito “é honesto” apenas porque foi honesto numa
deter min ad a ocasião.
Precisamo s saber se aquele gesto representa um aspecto mais ou menos estável de
sua personalidade. Se sua vida pregressa confirma essa impressão, então dizemos
que a honestidade é um traço de seu caráter.
Somos propens os, aliás, a dar mais peso moral a um caráter virtuoso – talvez por
causa de seus efeitos duradour os para o convívio – do que a um gesto virtuoso
ocasional.

Saiba Mais: O PAPEL DA EDUCAÇÃO

Antes mesmo de chegar à idade adulta, adquirimos certos hábitos, alguns dos
quais difíceis de serem alterados depois.
Não nascemos prontos para a vida: os grupos a que pertencemos – a família, com
nossos pais, e a comunida de política, com suas autoridades – encarregam - se de
completar aquilo que a naturez a deixou em aberto.

Assim, parte não despre zível de nossa capacidade para deliberar e escolher em
sentido pleno, e que sempre acompan ha as virtudes, é fruto de uma herança que
recebemos pela educação.

Com ela se trans mite conhecimentos, mas também se forma o caráter. Isso dá à
Educação uma incontor nável dimensão ética. E se cremos, como hoje, que um de
seus institu tos mais importantes, a escola, é um dever do Estado, imediatame n te
essa dimensão transfor ma - se numa questão política da mais alta relevância.
1.5 - Autonomia e responsabilidade

 AUTONOMIA

Autono mia é a condição que nos torna autores da ação. A autonomia dos atos
significa uma latitude para governar a nós mesmos, e para fixar nossas próprias
regras de vida.

. Tão logo nos reconhecemos como autores, passa mos a ver nossos atos como que
situado s fora de uma cadeia contínua de causas e efeitos que, de outro modo,
seriam simples elos dessa cadeia, apagando assim a nossa autoria.

. Se sou autor de algo é porque sou capaz de iniciá- lo de forma independen te e


livre, isto é, de acordo com minha vontade, e não apenas por causa de uma força
alheia. Forças alheias podem concorrer favoravelmente com a minha vontade,
ajudan d o - me a alcançá - lo. Porém, antes de tudo, sou eu que o quero, por minha
própria escolha.

Saiba Mais: KANT E A AUTONOMIA

Há muita discussão filosófica sobre o funda men to da autono mia.


Numa das elaborações mais influentes, Immanuel Kant, o famoso filósofo alemão,
penso u poder justificá - la pela noção de uma vontade inteiramente livre não só de
causas externas, mas até mesmo dos apetites e emoções.

Seria então uma vontade totalmente espontânea?

Sim, se a entender m o s como uma vontade que não pertence a uma cadeia causal
anterior a ela.
Mas não, se a entender m os como um capricho ou uma mera preferência.

Para Kant, a vontade genuina mente livre não pode ser um capricho, mas deve
receber a forma de uma lei universal, signo da própria razão.

Outras elaborações da autonomia dão menos peso a essa razão depurada de


influências emocionais, e atenta apenas à universalidade de sua forma,
indepen den te do conteúdo que receba.
Não precisamos, porém, concordar inteiramente com a justificação Kantiana para
reconhecer a importância da idéia de autonomia para nossa vida ética.

 RESPONSABILIDADE

A responsabilidade é uma consequência direta dessa idéia de autoria da ação.

. Se me sinto capaz de iniciar uma ação, independe nte de outros fatores que
venham a concorrer para a sua realização no mundo, devo ser capaz também de
respo n der por pelo menos parte de suas consequências – aquelas em que for
possível identificar um vínculo especial com seu início, a minha autoria.
. Se a autonomia significa o início da obra, a responsabilidade significa a assinatu ra
dela tão logo ganhe o mundo.

Não podemos controlar todas as consequências de nossos gestos, e contudo


podemo s nos responsabilizar por elas até certo ponto.
Isso indica um aspecto importa nte da responsabilidade que nos remete outra vez à
deliberação e à escolha.
Por quê?

. A deliberação discrimina alternativas, todas precárias e incertas, ainda que uma


ou algumas delas sejam mais prováveis que outras.
. A escolha deve encerrar a deliberação, mesmo na dúvida. Mas a dúvida é um início
da possibilidade do erro.
. De fato, algo poderá dar errado, mesmo que a escolha tenha sido a melhor
possível, dadas as circunstâncias e a urgência do ato.
. A escolha é, portanto, um salto arriscado.

SER RESPONSÁVEL É ASSUMIR ESSE RISCO E IR EM FRENTE.


Bibliografia – Módulo 1

1) Sobre a nature za da moralidade de um modo geral, ver de R.M. Hare, Ética –


Problemas e Propostas (São Paulo: Edunesp, 2004). Ver também a coletânea de
artigos A Companion to Ethics, organizada por Peter Singer (Oxford: Blackwell,
1991); o Dicionário de ética e Filosofia Moral, organizado por Monique Canto -
Sperber (São Leopoldo, RS Unisinos, 2003; 2 vols.) e da mesma autora e de R.
Ogien, ver Que devo fazer? (São Leopoldo, RS: Ed. Unisinos, 2004).

2) Sobre a ética das virtudes, ver a coletânea Virtue Ethics (nova York Oxford Univ
Press, 1997), organizada por R. Crisp e M. Slote. Para uma crítica da filosofia
moderna, por suposta m en te ter colocado em segundo plano a ética das virtudes,
ver de A Macintyre. Depois da Virtude (Bauru, SP: Edusc, 2001).

3) Sobre deliberação e escolha, ver de P. Aubenque, A Prudência em Aristóteles (São


Paulo: Edusp,) especialmente o capítulo III.

4) Sobre a origem e desenvolvimento da idéia de autono mia moral, ver de J.B.


Schnnewind, A Invenção da Autonomia (São Leopoldo, RS: ED. Unisinos, 2001).
MÓDULO 2 – A Ética e a Vida Pública

Neste mód ulo serão indicadas as relações entre a ética e as instituições políticas e
apresen ta d o s termos - chave da moralidade pública.

Os assun to s abordados aqui são:


2.1 - Por que falar em ética da vida pública?
2.2- República e democracia
2.3 - Estado, cidadania e império da lei
2.4- O cargo público
2.5- Apresentação pública de contas (Accountability )

2.1 - Porque que falar em ética da vida pública?

 A NATUREZA DA POLÍTICA

A política diz respeito à ação de uma comunidade.


Trata - se de uma dimensão essencial de nossas vidas porque sabemos que a
maioria das grandes coisas que precisamos e podemos fazer jamais seria feita por
um único indivíduo ou por um punha do de indivíduos. Elas depende m do amplo
concerto e da sólida união de um grupo bastante numeroso. Esse fazer coletivo,
porém, não apenas resulta em grandes coisas: embora nem sempre o percebamo s,
muito de nossos próprios pequenos sucessos individuais depende do sucesso de
nossa comunidade. E isso é obra da política.

A política significa deliberar e fazer escolhas, como a ética.

Não haveria política se não houvesse alternativas, se tudo fosse submetido à


necessidad e férrea ou ao absoluta me nt e casual.

A política é uma atividade inteligente.

Sua marca também é intervir no mundo segundo uma intenção premeditada, para
conservar ou mudar um estado de coisas. Além disso, as alternativas políticas não
são neutras em relação aos valores morais, pois elas dificilmente escapam a uma
ponderação sobre o mérito ou demérito da ação: sua justiça, prudência, coragem,
magnanimidade...

Aquilo que na ação individual é precedido por uma meditação introspectiva e


silenciosa, no âmbito político se torna um processo visível, interpessoal e, às vezes,
bem barulhento : desde um simples intercâmbio de opiniões até uma discussão
acalorada ou uma pomposa assembléia.

É verdade que, ao fazer intercâmbios para deliberar e escolher, as pessoas o fazem


sem deixar de meditar consigo mesmas o que vão dizer, conservando a
introspecção.
 A VIDA PÚBLICA

A política, por ser uma ação comunitária, precisa de um ambiente para viabilizar a
concertação e a união de seus membros: a vida pública.

Esse ambiente tem em mira o convívio de todos os membros de acordo com regras
e virtudes que garantam a amizade cívica, o respeito mútuo e os modos de
resolução pacífica dos conflitos sociais.

 AS INSTITUIÇÕES POLÍTICAS

As formas pelas quais esse convívio se realiza efetivamente são as instituições


políticas.
Essas formas variam no tempo e no espaço, segundo o modo com que as
comunidades estabelecem suas autorida des e confor me o nível de igualdade
reconhecido a seus membros.

A questão da autorida de é especialmente importante para definir a noção de


serviço público.

A questão da igualdade é central para estipular o padrão de tratamen t o que esse


serviço deve prestar à sua respectiva comunida de.

Examinaremos a seguir as mais destacadas dessas instituições, resgatando a


história brasileira e universal.

2.2 - República e democracia

 REPÚBLICA

Todo ano nosso país comemora a proclamação da República. Apesar do feriado,


não é uma data das mais marcantes em nossa lista de dias cívicos. E, embora não
sejamos uma sociedade que geralmente dê muita atenção para essas coisas, o
feriado da Independê ncia nos toca mais do que o 15 de novembro. Um observador
daquela época, aliás, chegou a dizer que “o povo assistiu bestificado à proclamação
da República”.

A passagem da Monarquia (ou melhor, “Império”) para a República foi uma


mudança importante na vida constitucional do País.
Mas, a abolição da escravatura, um ano antes, marcou uma reviravolta na sua vida
social. E há quem diga que esse fato precipitou a queda da Monarquia, pois as duas
instituições – a Monarquia e a Escravidão – eram como que unha e carne. De modo
que a emergência da República teria sido uma mera decorrência formal desse
acontecimento anterior mais substantivo.
Porém , a proclamação da República represento u de fato uma alteração não
despre zível no modo de se perceber e interpretar o poder político no país. A
Monarquia era uma sobrevivência do que os cientistas sociais costum a m chamar de
“Patrimo nialismo”.

O PATRIMONIALISMO é um tipo de regime em que não há uma distinção clara entre


o que pertence ao Soberano e seus auxiliares, e o que pertence à Comunidade: isto
é, uma clara demarcação entre o público e o privado.

O pensame n t o republicano, desde os gregos da Antiguidade, passando pelos


roman os, sempre insistiu nesta distinção.
Num regime patrimonialista, o Soberano e seus auxiliares não são solicitados a
separar com rigor sua própria “conta bancária” da conta do Governo.

Você deve estar pensando: mas esse problema continua a existir!

Isso é verdade. Mas devemos chamar a atenção para a mudança que uma forma de
constituição provoca nas percepções sociais. Com a República, consagrou - se a
norma da separação entre o público e o privado: o poder político passou a ser
definitivamente um assunto do público, e as práticas de confusão entre os dois
campos condenada s não só pela lei, mas por uma opinião pública cada vez mais
atenta.

Quando o poder político é considerado um assunto público, qualquer prejuízo ao


bem comu m por interesses privados, uma vez descoberto e interpreta do como tal,
passa a ser objeto de questioname n to no mínimo moral, para não dizer jurídico.

É exatamen te isso que não acontece num regime patrimonialista clássico: a


confusão entre privado e público é uma prática vista como normal, menos
permeável à crítica e portanto menos propens a a tornar - se objeto de
questioname n to moral. Em suma, afeta menos a legitimidade do regime. Na
República, ocorre exatamente o inverso.

 DEMOCRACIA

Falamos até agora de República, mas não de Democracia.

Costu ma - se pensar a Democracia como um regime em que os governantes são


eleitos pelos cidadãos. Numa república, os governantes são eleitos. Mas para uma
democracia essa definição é insuficiente.

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA DEMOCRACIA NO OCIDENTE

Na antiguidade Grega, Esparta era uma república, e seu governo era eleito. Porém,
apenas sua rival política e militar, Atenas, era tida como “democracia”. Veneza, no
final do período medieval, era uma república, porém recusava para si o termo
“democracia”.

Qual a diferença entre elas?

Primeiro, a maioria dos postos de governo de Atenas não eram eleitos, mas
escolhidos por sorteio entre os cidadãos – em outras palavras, os cidadãos
atenienses viam- se rigorosame nte como iguais em capacidade para governar.
Mas esse não era o produt o mais importante: a diferença crucial estava na
compo sição da pólis, o grupo dos que detinham poderes reconhecidos de influencia
nas decisões comunitárias.

Em Atenas, as camadas mais pobres da população livre participavam da Assembléia


soberana, o que não corria em Esparta nem em Veneza.
Dizemos “população livre” porque, na Antiguidade grega, nem toda a
população de uma cidade era livre: havia escravos, e a condição das mulheres
estava longe de ser livre. A ausência de escravidão e emancipação das
mulheres serão fenômenos típicos das democracias modernas, não das
antigas.

Como a pólis ateniense era bastante heterogênea econômica e socialmente, suas


assembléias eram marcadas por fortes conflitos internos entre ricos e pobres,
nobres e plebeus. E é por isso que a palavra “democracia” entrou para a história do
pensa me n to como sinônimo de “regime da multidão”, onde reinava os “tumultos”,
falta de respeito à hierarquia social e à proprieda de. Daí a palavra carregar um
sentido profunda m e n te negativo, pejorativo, até mais ou menos metade do século
XIX, a partir de quando vai ganhar gradualmente um sentido positivo até receber a
ampla aceitação que possui hoje.
O prestígio da democracia é, nesse sentido, um fenômeno relativamente recente da
história ocidental. Se hoje todos nós, ou a maioria de nós, fazemos questão de nos
dizer “democratas” - não raro, até mesmo defensores de regimes autoritários
dizem que seu objetivo, senão de curto prazo, pelo menos de longo prazo, é a
democracia – não podemos esquecer que, num passado não muito longínquo,
chamar alguém de “democrata” bem poderia ser interpreta do como um
xingamen to, e não como um elogio.

Portanto, uma democracia reconhece o acesso à arena das decisões das camadas
mais baixas ou pobres ou socialmente relegadas da população.

Contem p o r anea m e n t e, esse reconhecimento implica, no mínimo, o seguinte:


- O direito de votar e ser votado.
- O direito de defender publicamente interesses e opiniões (o direito de expressão)
- O direito de associar - se para defender esses interesses e opiniões.

É claro que, se os países modernos continuas se m a depender tanto, como os


antigos, do trabalho escravo, esses direitos não poderiam ter sido estendidos à
maioria dos trabalhadores. E foram eles os primeiros a reclamar do caráter não
democrático de seus governos.

Como os trabalha dores normalmente também constituem a maioria da população,


duran te o século XIX falar em “democracia” significava estender os direitos à
grossa maioria da população adulta e masculina de um país.
Mesmo o movimento dos trabalhadores, que reivindicava o direito de votar,
considerava que as mulheres eram representa da s pelos homens adultos.
No começo do século XX, com a gradual emancipação jurídica, social e sexual das
mulheres (que normalme nte representa m 50% da população), passou - se a
considerar a mulher adulta pessoa tão dotada de juízo político quanto os homens.
Portanto, ficou difícil falar em democracia sem reconhecer às mulheres os mesmos
direitos políticos dos homens.
Assim, a Democracia passou a designar os regimes políticos cujos governos não
são apenas eleitos, mas eleitos pelo conjunto da população adulta de um país.

Em resu mo, se na República a distinção entre público e privado é a clivagem


decisiva, na democracia a garantia da igualdade de direitos políticos a todas as
camad as da população, independen te de sua condição social, é a questão - chave.

2.3 - Estado, cidadania e império da lei

Em tempos modernos, os governos democráticos funcionam tendo por referência


uma ordem jurídica que engloba toda a comunida de, o ESTADO.
Essa ordem jurídica estabelece direito e deveres iguais para cada membro da
comunidade. Isso é a CIDADANIA.
O CIDADÃO, nesse sentido abstrato, é aquele que não apenas participa das
decisões de governo, mas recebe do Estado uma série de garantias legais (os
direitos) que protege sua integridade física e moral. Em contrapar tida, o Estado
espera dele que cumpra um conjunto de obrigações legais (os deveres), cujo pilar é
o acatamen to às decisões de governo.

UM POUCO DE HISTÓRIA...

A reciprocidade entre direitos e deveres, e sua igualdade, que dão forma à


cidadania democrática moderna, é fruto de árduas lutas sociais.

Seu advento pôs em questão o velho muro institucional que separava “nobres” e
“plebeus”, e que explicitamente distribuía os membros da comunida de, digamos
assim, em “vagões” de primeira e segunda classe.

Essa foi a luta contra o chama do Antigo Regime, tornada emblemática na


Revolução Francesa (1789) e nas rebeliões nacionais – européias e coloniais –
subseq üen tes ao longo do século XIX.

Saiba Mais: REVOLUÇÃO FRANCESA

A Revolução Francesa de 1789 surgiu na seqüência do Iluminismo francês.


Em causa estavam o Antigo Regime e a autoridade do clero e da nobreza na
França. A Guerra da independê ncia nos EUA de 1776 tinha servido de
exemplo aos ideais de liberdade e igualdade. Além do mais, a França passava
por um período de crise econômica após anos de prosperidade. A
participação francesa na guerra da independência americana e os elevados
custos da corte do rei Luís XVI tinham deixado as finanças do país em mau
estado. A convocação de cortes pelo rei, com o fim de anunciar o aumento
dos impostos para fazer face àquelas dificuldades financeiras acabaria por
desencadear a Revolução. A Revolução dá início à era moderna na França.
Acaba com o feudalismo em França e proclama os princípios de “Liberdade,
Igualdade e Fraternidade”(Liberté, Egalité, Fraternité). Acabam também os
privilégios da nobreza e de castas e começam a imperar os ideais igualitários.

Datas e fatos essenciais:


1787: Revolta dos Notáveis.
1789: Revolta do Terceiro Estado – Tomada da Bastilha.
1790: Confisco dos bens do clero.
1791: Constituição que estabeleceu a Monarquia Constitucional.
1791: Tentativa de fuga e prisão do Rei Luís XVI.
1792: Invasão da França pela Áustria e Prússia.
1793: Oficialização da República e morte do Rei Luís XVI – 2ª
Constituição.
1793: Terror contra os inimigos da Revolução.
1794: Deposição de Robespierre.
1795: Regime do Diretório – 3ª Constituição.
1799: Golpe de 18 Brumário de Napoleão.

(Extraído da página http: / / p t.wikipedia.org / wiki /Revolu%C3%A7%C3%


A3o_francesa)

A derrubad a desse muro pôs fim às desigualda des de status jurídico entre pessoas
situadas numa hierarquia de estament os, e que garantiam privilégios legais às suas
camad as superiores: acesso privilegiado a justiça, aos frutos da cooperação social,
à participação nas decisões de governo e aos próprios cargos governamentais. Ao
final dessa longa contestação, consolida - se um ideal de cidadania que deixa de
reconhecer tais diferenças,nivelando - as num único e mesmo status jurídico, e
como que transfor ma n d o a todos os membros da comunidade em simples
“plebeus”.

T. H. Marshall, um dos grandes teóricos da questão, diz que “A cidadania é


um status concedido àqueles que são membros integrais de uma
comunidade.
Todos aqueles que poss uem o status são iguais com respeito aos direitos e
obrigações pertinentes aos status. Não há nenhu m princípio universal que
determine o que estes direitos e obrigações serão, mas as sociedades nas
quais a cidadania é uma instituição em desenvolvimento criam uma imagem
de uma cidadania ideal em relação à qual o sucesso pode ser medido e em
relação à qual a aspiração pode ser dirigida. A insistência em seguir o
caminho assim deter mina do equivale a uma insistência por uma medida
efetiva de igualdade, um enriquecimento da matéria - prima do status e um
aumento do número daqueles a quem é conferido o status”.
(Cidadania, Classe Social e Status, p.76)

O nivelamen to jurídico não eliminou as desigualdades sociais e econômicas entre


pessoas e grupos sociais. Mas colocou ao Estado, como protetor dos direitos de
cidadania, o dever do trata ment o igual.
Como entidade jurídica abstrata, o Estado lida com seus cidadãos através da lei
escrita e impessoal, expressão de uma meta de imparcialidade: a ordem jurídica
não distingue as pessoas por sua cor, sexo, religião ou condição social, e avalia
seus atos por um mesmo padrão de medida. Esse padrão impõe procedimentos
claros e públicos – acompa nha d os de uma boa dose de rituais altamente
formalizado s – para mediar todas as disputas e conflitos...

... Isso é o IMPÉRIO DA LEI. Sob a sua inspiração, o Estado incorpora uma série de
valores e regras substa ntivas, por final adotadas em quase todas as constituições
democráticas contempor â nea s, inclusive a brasileira.
Seguindo o ideal do Império da Lei, o Estado cria regras que procura m dar
concretu de aos valores do respeito e da dignidade intrínseca da pessoa huma na.

Exemplificando, graças ao Império da Lei, o Estado:


• Só obriga seus cidadãos a leis que sejam de conhecimento público.
• Só pune alguém após o devido processo legal – o que significa que todo cidadão
acusado de infringir as leis merece um julgamento correto.
• Estabelece que nenhu m a confissão, durante uma investigação policial, deve ser
obtida sob tortura.
• Garante que ninguém seja obrigado a depor contra si mesmo.
• Proíbe a invasão da privacidade.

Saiba Mais: O IMPÉRIO DA LEI E A CONSTITUIÇÃO DE 1988

Em seu artigo 5°., a Constituição brasileira, promulgada em 1988, enuncia os


princípios e direitos básicos que, na interpretação do legislador brasileiro,
consubs tanciam o ideal do império da lei. Eis o caput e os parágrafos iniciais desse
artigo:

Art. 5º.,Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer nature za,
garantindo - se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
I- homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta
Constituição;
II- ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude
de lei;
III- ninguém será submetido a tortura nem a trata men to desuma no ou degradan te;
IV- é livre a manifestação do pensame nto, sendo vedado o anonimato;
V- é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização
por dano material, moral ou à imagem;
VI- é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre
exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de
culto e a suas liturgias;
VII- é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas
entidades civis e militares de internação coletiva;
VIII- ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de
convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir - se de obrigação
legal a todos imposta e recusar - se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;
IV- é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de
comunicação, independen te m e n te de censura ou licença;
X- são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua
violação;
XI- a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem
consen timen to do morador,salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para
prestar socorro, ou, durante o dia, por deter minação judicial;
2.4 - O cargo público

 A ESTRUTURA ADMINISTRATIVA DO ESTADO

O Estado constitui, além da ordem jurídica que engloba toda a comunidade, uma
estrutu r a administrativa permane nte.

O Estado é um agente coletivo com identida de própria. É uma “pessoa artificial”


formad a por uma combinação de pessoa de carne e osso - as autoridades e seus
auxiliares – com poderes suficientes para cumprir quatro missões básicas, a saber:
● Promover o bem comum.
● Representar a comunidade perante outras comunidades
● Mediar as relações entre os cidadãos e o governo.
● Mediar as relações entre os próprios cidadãos.

E o CARGO PÚBLICO? O que é?


O Cargo Público é uma posição de poder dentro da estrutur a administrativa do
Estado...

...E essa posição de poder vincula - se ao serviço prescrito no cargo:o poder é


propo rcional à responsabilidade.

Qual o sentido dessa “responsabilidade”?

 PODER E RESPONSABILIDADE

● O aspecto público do cargo significa que ele não pertence à pessoa que
eventualmente o ocupa.
● Sua investidura não implica um título de propriedade, um direito de “uso e
abuso”, em que seu detentor pudesse herdar, doar, empresta r ou vender ao seu
bel- prazer, ou extrair rendas através de sua exploração econômica.
● A pessoa investida no cargo recebe uma missão com a expectativa de que
utilizará os meios e recursos adicionados ao cargo na proporção que a missão
exigir.

Porém há algo mais:

A missão do servidor é necessariamente um serviço em nome do sujeito político


que, em última instância, o investiu no cargo: a comunida de.

No fundo, esse servidor público faz pela comunidade aquilo que ela não poder
fazer por si mesma. Ele a representa, sabendo que não está ali para fazer o que
bem entender.

Em resu mo, a responsabilidade do detentor do cargo correspon de a esses três


aspectos da consciência político - moral:
• De que zela por algo que não lhe pertence.
• De que tem poder e autono mia proporcionais à sua missão.
• De que faz coisas importantes não em seu próprio nome, mas em nome de uma
coletividade.
2.5 - A prestação pública de contas (Accountability )

 AUTORIDADES PÚBLICAS

As autorida des públicas mais importantes nas democracias modernas são as


pessoas que ocupam cargos graças ao consentiment o explícito de sua comunidad e.

Características desses cargos:


• São mand atos eletivos, com prazos fixos, e “devolvidos” aos eleitores
periodicamente.
• Representa m a vontade desses eleitores, segundo um critério majoritário de
decisão, com base num programa ou declaração de intenções que deve ser posta
em prática durante o seu mandato.

Essas autoridades precisam responder por seus atos à opinião pública, indicand o
em que medida o exercício do cargo corresponde u à expectativa aprovada em
sufrágio.

 PRESTAÇÃO DE CONTAS

Em outras palavras, a eleição do cargo gera um processo de prestação pública de


contas(no inglês,accounta bility), termo que simplesmente indica um amplo
conjunto de formas de controle dos cargos pela comunidade.
A própria periodicidade das eleições, por exemplo, constitui um mecanismo
elementar de prestação de contas.
Mas poderíamos falar em prestação de contas quando se trata de cargos públicos
não sujeitos à eleição, chamados “cargos de carreira”?
• Todo cargo público envolve certas expectativas a respeito de sua função, e
daquilo que promete ser capaz de realizar em prol da comunida de, mesmo não
sendo eletivo.
• Ainda que seja um cargo técnico, do qual se espera um conhecimento
especializado,ele sempre visa ao atendiment o de uma necessida de comunitária. E
a própria comunidade tem que ser capaz de controlar em que medida esse
objetivo está sendo satisfeito.
• Todo cargo público requer um considerável investimento da comunidade :
pagamen t o de salários, treinament o, aperfeiçoamen to, recursos adicionais no
ambiente do trabalho e para o bom exercício da função, entre outros. É claro que
esse investimento tem que retornar na forma de serviços adequados.

Mas há uma razão adicional para a prestação de contas:


• Como uma agência ético- política especial, o serviço público sempre se coloca
perante alternativas complexas e, muitas vezes, dramáticas.
• Por mais graves e honestas que sejam as deliberações dos servidores públicos, as
escolhas resultantes raramente escapam a controvérsias.

Diversos fatores concorrem para isso, entre os quais:


• A urgência do serviço pode levar a uma respos ta por demais apressada.
• As alternativas colocadas podem envolver valores igualmente nobre, mas apenas
um deles ter chance de ser promovido - situação típica dos chamados”dilemas
morais”.
• Ponderações de longo prazo podem, freqüente me nte ,ter que dar lugar a
necessidades de curto prazo.

Seria grave indício de insolência do cargo se o detentor do mesmo, cônscio das


incertezas do seu exercício, o fechasse ao exame crítico da opinião pública.

Tal atitude significaria, ao mesmo tempo, uma falta de respeito à comunidade e um


prejuízo ao aperfeiçoament o profissional.

Então... Como fazer a prestação de contas?

1- Criando condições para verificar e discutir publicamente, e em linguagem


acessível ao não - especialista, o quanto o exercício da função vem satisfazendo a
comunidade.

2- Avaliando criticamente, por meio do escrutínio da opinião pública:


Em que medida esse retorno está ocorrendo de fato.
• Como o detentor do cargo lidou com ocorrências imprevistas.
• Que correções de rota fazer.
• Que possíveis melhoras implementar.

3- Desencadeand o a reflexão coletiva por meio de uma série de instituições:


Na imprensa, através de reportagens investigativas e do confronto de idéias.
• No parlamento, através do debate com os representan tes dos partidos e seus
assessores.
• Nas universidades e centros de pesquisa, através de seus próprios especialistas.
• Na Sociedade Civil, através dos movimentos sociais e organizações não -
govername ntais.
Bibliografia – Módulo 2

1) Sobre o conceito de república e o pensamen t o republicano, ver a coletânea de


artigos Pensar a República organizada por N. Bignotto (Belo Horizonte: Ed. UFMG,
2002).Ver também os artigos publicados em Lua Nova- Revista de Cultura e Política
nº.51, 2000(São Paulo: Cedec).

2) Sobre o conceito de democracia, ver de R. Dahl, Sobre a Democracia (Brasília:


UnB,2001).

3) Sobre a origem da idéia de Estado, ver de Q. Skinner, El Nacímiento del Estado


(Buenos Aires: Editorial Gorla, 2003).Sobre o desenvolvimento histórico do Estado
moderno, ver C. Tily, Coerção, Capital e Estados Europeus (São Paulo: Edusp,
1996).

4) Sobre o império da lei (rule of law ), ver o verbete correspon den te em The
Blackwell Encyclopaedia of Political Thought , organizado por D. Miller et all (Oxford:
Blackwell. 1987).

5) Sobre a noção de cidadania, ver os ensaios de T. H. Marshall referidos no curso


em Cidadania, Classes Sociais e Status (Rio de Janeiro: Zahar, 1967) e o livro de R.
Bendix, Construção Nacional e Cidadania (São Paulo: Edusp, 1996).

6) Sobre os conceitos de cargo e cargo público, ver de M. Walzer, Esferas da Justiça


(São Paulo: Martins Fontes, 2003), capítulo 5.

7) Sobre a prestação pública de contas (accountability ), ver o artigo de G. O'Donnell,


“Accountability Horizontal e as Novas Poliarquias” em Lua Nova- Revista de Cultura
e Política 44:27- 54, 1998.
Módulo 3 – A Conduta no Serviço Público

Neste m ódulo você será apresenta do a um ideal de conduta no serviço público, que
vise combinar a excelência e retidão, e obterá informações sobre as iniciativas
governamen t ais para introdu zir noções de ética na gestão pública, bem como
conhecer as vantagens de criar e observar instru men tos de orientação da conduta
na Administração Federal.

Tópicos desse módulo:


3.1- Por que com conduta e regras de conduta?
3.2 - Profissionalismo, decoro e civilidade
3.3- Códigos de ética no serviço público
3.4 - Iniciativa da administração pública federal
3.5 - Conclusão

3.1 - Por que conduta e regras de conduta?

 CONDUTA MORAL

A conduta moral do servidor público não é apenas uma questão de permitir ou


proibir.
O essencial da conduta é o orientação interna que ele dá a suas ações: a motivação,
o esmero, o gosto com que realiza seu ofício para cumprir seus deveres ou para
fazer mais do que a função lhe prescreve.

Há certos aspectos do serviço público que não se mede m pelo simples


cumprimen to exterior das normas, mas pela qualidade com que as regras são
estritamen te observadas.

Quantas vezes nossas leis são cumpridas “na letra”, mas não no seu “espírito”?

A conduta, portanto, leva em conta a subjetividade do agente, por definição


indevassável ao direito e à lei, mas não ao julgamento moral.

Contu d o, é bem razoável que se fale em regras de conduta. Por quê?

● Para ajudar o servidor a desenvolver suas próprias orientações internas, dando -


lhe a segurança e o estímulo para a sua atuação profissional.

● Para ajudá - lo a alcançar o domínio dos modos de realizar ou construir algo. Esse
domínio implica a familiaridade com as regras ou procediment os que indicam o
quê e como fazer.

Porém, não se trata de qualquer regra ou procedimento.


Na verdade, devemos estar atentos a dois tipos diferentes de regras.

Vejamos...
REGRAS IMPERATIVAS
São regras que simples mente proíbem ou ordena m, pressupon d o que se saiba fazer
o que se proíbe ou ordena. Abrange a maior parte daquilo que se denomina “lei” no
sentido jurídico.

REGRAS CONSTITUTIVAS
São regras que instrue m o agente a fazer algo. Elas orientam o sujeito moral a
realizar ou constr uir o que se deseja. Como toda regra, elas limitam o leque de
coisas que poderiam ser feitas; contudo, ao contrário das regras imperativas, elas
mais possibilitam a ação do que a impede.

REGRAS: TRILHAS PARA AGIR


Suponha, por exemplo, que você queira fazer algo com um determinado programa
de compu ta do r. Para fazer algo com esse tipo de ferrament a, não basta tê- la às
mãos, ou simplesme nte possuí - la como um proprietário. É preciso saber manusear
o progra ma para que ele faça aquilo que você quer. E, para tanto você precisa ler o
anual que o instruirá sobre os passos a seguir. O manual contém regras que,
evidentemen te, o induze m a seguir um caminho e não outro. Sem o manual, você
teria possivelmente inúmeros caminhos a seguir. E precisamente esse grande
número de alternativas o impediria de seguir em frente. O manual diz: “faça isso,
não faça aquilo”etc. Ele traça em caminho imaginário à sua frente e, ao traçá - lo,
possibilita sua ação.

Quando queremos fazer algo complexo e de alta respons abilidade, como é o caso
do serviço público, vemo - nos perante uma floresta densa e escura que, se não
possuir nenhu m a trilha, oferece inúmeras possibilidades de atravessá - la e, por
isso, grandes chances de erro. Sabendo disso, ficamos inibidos de atravessá - la.
Em outras palavras: sem regras de conduta, tendemos a nos retrair perante um
empreen dime nto desafiador e arriscado.

Tendo em conta essa concepção das regras, vejamos agora alguns princípios
básicos da conduta do servidor público.

3.2 - Profissionalismo, decoro e civilidade

SERVIÇO PÚBLICO X EMPREGO


A carreira do serviço público não é um emprego comum, no sentido que este termo
adquiriu na sociedade industrial. O Estado, por um lado, não é uma empresa
capitalista, cujo objetivo é a produção de mercadorias(“com mo dities”) com vistas
ao lucro. E, portanto, o serviço público está longe de ser um pacote indefinido de
produ t o s voltado para o mercado.

ESTADO X PATRÃO
Por outro lado, o Estado não é um “patrão” no sentido usual, que precisa explorar
severame n te o trabalho alheio para promover seus próprios interesses. Se há um
“patrão” em jogo – a própria comunidade que o Estado deve representar - ,ele não
se encaixa bem no papel de explorador do trabalho, embora até possa ser rigoroso
com os seus funcionários, no que tange ao zelo com a coisa pública.

O serviço público é uma vocação profissional...

● ▪É vocação pelo caráter nobre da atividade: servir uma comunidade e promover


o bem comum são missões honradas e dignificantes.
● ▪E é vocação porque exige desprendimen to: por mais bem pago que seja, o
serviço público jamais será o lugar ideal para que busca o mais alto retorno que
o mercado de trabalho pode oferecer.
Desprendime nto não significa ausência de uma ambição salutar.
Trata - se, porém, de uma ambição de nature za distinta daquela que se espera
nos negócios privados: estamos falando do desejo de tornar a sua cidade ou
país um lugar melhor de se viver, enfrentar os desafios que essa meta impõe
e ser reconhecido por isso).

 PROFISSIONALISMO

O serviço público é uma atividade altamente profissional porque é produt o de uma


opção: o Estado convoca seus quadros de carreira para uma dedicação plena.

O que se espera dos ocupantes dos cargos públicos?


- Vínculo permane nte permanente
- Concentração no trabalho
- Dedicação
- Empenho para servir à comunidade
- Competência

Dos ocupan tes desses cargos não se espera um vínculo eventual ou superficial, mas
uma concentração, intelectual e emocional, na função pública específica que se
venha a escolher.
Por isso, essa função tem que estar relacionada a um talento real, desenvolvido
pela educação e pela experiência ao exercê- la.

Uma dedicação plena e por toda uma vida só pode dar certo se o candidato ao
cargo tiver, além do empenho para servir à comunida de, a competência e o gosto
para fazer o que se espera do cargo.
Do contrário, o desempen h o se tornará enfadonho em pouco tempo, com prejuízo
ao público e ao próprio servidor.

A boa carreira na estrutur a administrativa do Estado é, portanto, uma síntese de


vocação e aptidão para lidar com as questões, técnicas ou outras, próprias do
serviço prescrito.

Mas o profissionalismo do serviço público é mais do que o exercício talentoso de


uma função. Há valores em jogo e uma conduta adequada a seguir.

Para além do compromiss o ético com o bem comum, uma atitude profissional
exige, entre outras qualidades:
a)▪Imparcialidade
b) Objetividade
c) Excelência
a) Imparcialidade
O serviço sempre envolve relacionamen tos humanos que se chocam com nossos
gostos e preferências pessoais – políticas, ideológicas, religiosas ou o que for.
Às vezes simpatiza m os muito com certas pessoas e detesta m os outras, apoiamos
um partido ou corrente política e não outra, essa igreja e não aquela, etc.
É claro que o exercício correto de qualquer ofício não pode deixar que esses gostos
e preferências turvem a apreciação do que deve ser feito.

b) Objetividade
Objetividade significa uma abordagem razoavelmente distanciada e serena do
trabalho a fazer.
Isso não significa indiferença ou frieza: trata - se apenas de evitar que sentimento s
explosivos atrapalhe m o bom desempen ho.
Nâo é o caso de sufocar as emoções mas, ao contrário, educá - las para seguir e
adensar o fluxo racional que leva ao sucesso do trabalho.

c) Excelência
O trabalho profissional é a busca incessante da perfeição. Nunca alcançaremos a
perfeição, mas ao buscá - la, chegaremos ao melhor possível.

 DECORO

Mas há outras qualidades que focam mais de perto a nature za político - moral do
serviço público.

Vejamos algumas delas em detalhes...

O Estado é a instituição de mais alto poder na sociedade, cujas decisões afetam


profun d a me n t e a vida dos cidadãos e para o que, por isso mesmo, convergem
forças representan d o interesses diversos e conflitantes. Além disso, o Estado
reclama para si o monopólio de certas atividades e decisões que tornam inevitáveis
as pressões contraditórias da sociedade.

O Servidor público, em maior ou menor escala, quase sempre depara - se com o


problema da condução correta dessas pressões e conflitos. Não há, por certo,
receitas prontas nesse caso. Mas há, sim, uma postura geral que deve ser observada
com zelo. Essa postura é o decoro.

O decoro é uma “postura” porque une a disposição interna para agir corretamen te
com a aparência desse agir.
Decoro, do latim decoru m, é “a face pública de uma estado pessoal da
honrade z” - David Burchell.

Sabedor de que sua função é alvo natural de desconfiança das partes interessad as e
de ressentimento de quem não consegue obter o benefício particular esperado, o
servidor trata de constr uir uma personalidade e uma reputação cívicas à altura de
sua autoridade formal.
Eis o valor auxiliar das normas de conduta, que se relaciona m diretamente com os
“Códigos de ética” que veremos a seguir.
O propósito desses códigos é justamen te indicar ao ocupante do cargo público
maneiras de constr uir aquela personalidade.

Exatamen te porque a reputação é tão importante na noção de decoro, duas


qualidades vizinhas o acompa nha m inevitavelmente: a probidade e a integridade.

Essas qualidades se referem ao vínculo entre passado, presente e futuro: uma boa
reputação não se constrói do dia para a noite. Ela se faz ao longo de toda uma
carreira.
Sendo, pois, provada pelo tempo e percorrida com lisura, e vista como tal, ela dá
uma noção segura do caráter e da personalidade do servidor.

À autoridade formal junta - se, então, a autoridade moral. E ao poder do cargo


junta - se a confiança na pessoa do seu ocupante.

O decoro, a probidade e a integridade não são apenas patrimônios pessoais. São


caracteres imediatamen te transferidos à “personalidade” do Estado.
Uma administração pública proba e íntegra, atenta ao decoro, é função direta da
probidade e integridade de seus funcionários.

 CIVILIDADE

Finalmente, há que mencionar a civilidade.


Essa qualidade é, genericamente falando, uma disposição para tornar as relações
sociais mais fluentes ou menos ásperas.
Ela é tanto mais importante quanto mais o contexto dessas relações é de
competição e conflito. E essa é, como dissemos, a tendência nas relações em que o
Estado é mediador.

Mais especificamente, a civilidade é:

a) “Prestação de contas”
Uma abertura para justificar publicamente decisões tomadas ou estratégicas
adotad as, e para ouvir interpelações, críticas e sugestões. Porém, fazê - los de forma
respeitosa, independe nte m en te da simpatia pessoal que se tenha pelo interlocutor.
Nessa chave, a civilidade é uma disposição necessária à prática da prestação de
contas.

b) “Espírito Cooperativo”
Uma abertura para polir e acomodar diferenças. Essa é uma qualidade essencial da
mediação. Não se trata de promover a conciliação a qualquer preço, ferindo
princípios éticos.
Mas todo conflito ou competição gera um afã para ampliar exagerada me nte o
campo de atrito das relações, e estreitar demais as possibilidades de cooperação e
acordo. O servidor público, ao contrário, deve credenciar - se como um agente
catalizado r da boa vontade e de ações coletivas constr utivas.
3.3 - Códigos de ética no serviço público

O que é um Código de Ética?

É um padrão que serve de guia para a conduta de um determinado grupo.

É um conjunto de princípios norteadores, assumidos publicamente, de modo a


moldar as atividades a que se aplica o código, de acordo com anseios por
honestida de, solidariedade, correção e outros do gênero.

O código deve ser posto em relação, por um lado, com a lei e, por outro, com a
moralidade em sentido mais amplo.

Um código de ética não pode, obviamente, pôr - se fora ou além da lei: não pode
servir como desculpa ou meio para legitimar compor ta m en t os que a lei proíbe.

Para que serve o Código de Ética?


Vejamos...

O código tenta capturar um aspecto que escapa, em geral, à legislação e ao


legislador: pode - se cumprir perfeitamente a lei e, ainda assim, por exemplo,
prejudicar alguém. Exige- se ética na vida pública porque as pessoas não apenas
desejam o cumprimento da lei, mas sim o seu bom cumprimento.

Capturar essa dimensão do bom cumprimento da lei é uma tarefa difícil, mas que
caberia perfeitamente a um código de ética.

Por outro lado, também não faria sentido ter um código de ética que apenas
repetisse o que já está plenamente determinado e assegurado na lei.

Pontos a serem observados quando da elaboração de um Código de Ética:


● Explicitar os valores afirmados por um grupo e, em seguida, dar uma concretu de
maior a eles através de normas que sirvam de instru men t o s para realizar os
valores afirmados.
● Cuidar para não ser entendido, primariamente, como um instrume nt o disciplinar
e repressivo.
● Cuidar para que não esteja voltado exclusivamente para “quem não tem ética”. É
bem provável que o inverso seja mais verdadeiro.
● Articular princípios ou valores que freqüente me nt e entram em choque,
colocando - se em perspectiva, a fim de reconciliá - los ou priorizá - los. Isso pode
ser útil na resolução de dilemas morais, vividos justamen te por aqueles que
procuram se condu zir eticamente.

Para diferentes contextos, pode haver diferentes códigos.

Em particular, um código de ética é feito para:


- Todos os que exercem uma deter minada profissão.
- Todos os que integram uma deter mina da entidade ou órgão público.

Quando se trata de uma entidade ou órgão público, quatro questões devem ser
tratadas num Código de Ética:
1) A finalidade e as características mais gerais de entidade.
2) As relações internas entre os seus servidores e outros colaboradores.
3) As relações com outras entidades, públicas ou privadas.
4) As relações com o cidadão.

Em resu mo, o Código de Ética numa entidade pública deve estabelecer um padrão
geral de conduta.
Mas, atenção...

► Aose definir o seu conteúdo, é bom lembrar que não se está agindo nem como
um legislador no Congresso Nacional nem como um reformador moral.

► Não se pode ir contra a lei, mas também não se deve simples mente repeti - la. É
preciso, capturar o aspecto do bom cumprimento da lei, identificando os casos em
que, mesmo dentro da legalidade, cometem - se atos que, intencionalmente ou não,
prejudique m alguém.

►O código deve ser um instru me n to para a resolução de conflitos morais do grupo


a que se aplica, e não um instru me nto repressivo ou disciplinador.

► Não deve haver nenhum a pretensão de uso universal do código: ele deve servir de
guia para a resolução dos problemas específicos do grupo de servidores
concernidos.

3.4 - Iniciativas da administração pública federal

No âmbito da Administração Federal Brasileira, uma série de iniciativas tem sido


tomad as desde meados da década de 1990.

Entre elas, cabe mencionar:


● O código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo
aprovado em 22 de junho de 1994.
● O Código de Conduta de Alta Administração Federal, de 18 de agosto de 2000.
● O Código de Conduta Ética dos Agentes Públicos em Exercício na Presidência da
República, de 11 de janeiro de 2002.

Veja o conteúdo desses Códigos no endereço:


www.presidencia.gov.br / e tica / f r a m e_cond ut a.ht m

 COMISSÃO DE ÉTICA

Como ponto alto desse processo, há que destacar a formação da Comissão de Ética
Pública, criada por Decreto Presidencial em 26 de maio de 1999, de cujas atividades
falaremos a seguir.

COMPOSIÇÃO
• Integrada por seis pessoas não vinculadas ao governo e com amplos
conhecimen tos em política, sociologia, direito e administração.
• Seus membros não recebem remuneração. Os trabalhos por eles desenvolvidos
são considerados prestação de relevante serviço público.

OBJETIVOS DA COMISSÃO
• Assegurar um padrão ético efetivo para os ocupantes dos mais altos cargos do
Executivo Federal, por meio de normas de fácil aplicação e compreensão,
suficientes para o cumprimento dos valores éticos estabelecidos pela Constituição
Federal para a Administração Pública.
• Prevenir transgressões éticas durante e depois de exercício do cargo público.
• Atuar como instância consultiva que proteja o administrador honesto.
• Fazer com que a ética seja reconhecida como instru me n t o imprescíndivel para
uma administração pública efetiva, transparente e democrática.

A perspectiva da Comissão é essencialme nt e preventiva e educativa.

METODOLOGIA DE TRABALHO

– Quando se trata de violação de norma legal, a Comissão encaminha a matéria ao


órgão competente para apurá - la.

– A Comissão mantém linha direta de comunicação com cada autoridade


individualmente, por meio de carta, comunicação telefônica e e- mail.

– Os atos normativos e interpretativos são transmitidos a todas as autoridades e


incluídos no site da Comissão.

– A Comissão expede mensalmente cerca de 400 orientações e 30 notificações, que


funcionam como alertas para situações que podem configurar descum pri men t o
das normas de conduta ética.

– Respon de a consultas de autorida des que desejam saber se esse ou aquele


procedimento específico pode ser adotado em face das normas de conduta.

– Distribui um manual de perguntas e respostas mais freqüentes,


permane n te me n t e atualizado, às pessoas abrangidas pelos códigos mais gerais
da Administração Federal.

 A REDE DE ÉTICA

ABRANGÊNCIA E OBJETIVO DA REDE

Em maio de 2001 foi estabelecida uma rede de 168 profissionais com


respo ns abilidade pela gestão da ética em 265 órgãos e entidades federais.
A responsabilidade básica desses profissionais é apoiar a Comissão no
cumprimen to das suas funções, assim como zelar pela conduta adequada em suas
respectivas organizações.
RESULTADOS

Antes da Rede de Ética, 30% dos órgãos e entidades federais levavam em conta
regras de conduta padroniza das para seus quadros. E pouco mais de 20% dos
órgãos e entidades federais cumpriam algumas das funções de gestão da ética-
divulgação, capacitação e monitoram en t o das normas.

Em avaliação efetuada recente mente, observa - se substancial mudança desse


quadro: 86% das entidades e órgãos já levavam em conta padrões de conduta e
tinham quem zelasse por sua efetividade.

Não obstan te, apenas 15% dos órgãos e entidades federais dispõem de mecanismo s
de reconhecimento em relação à observância das normas de conduta, o que
demon str a que o caminho a percorrer ainda é longo.

PARCEIROS

► BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento.


► ONU - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico.
► Instituto Ethos.
► Transparência Brasil.
► Diversos profissionais de diferentes áreas de conhecimento presta m serviço
voluntário à Comissão de Ética Pública.
BIBLIOGRAFIA- Módulo 3

1) Sobre ética e profissionalismo, ver a coletânea Professionalism and Ethics in the


Service: Issues and Practices in Selected Regions, publicado na revista Economic &
Social Aflairs (Nova Yor: ONU, 2000). Sobre cargo público, profissionalismo e poder
político, ver o livro de M. Walzer, já citado no módulo II, capítulo 5 e 12.

2) Sobre o decoro, ver o artigo de D. Burchell, “Civic Personae: Macintyre, Cícero


and Moral Personality”, publicado na revista History of Political Thought XIX(1):
101.118, 1998 (Exeter, RU: Imprint Academic).

3) Sobre a civil idade, ver de J. Rawls, Liberalismo Político (São Paulo: Ática, 2000).
Ver também o artigo de G. Cohn, “Civilizacion, ciudadania y civismo: la teoria
política ante los nuevos desafios”, publicado na coletânea Filosofia Política
Contem p o r ânea, organizada por A. Boron (Buenos Aires: Clacso, 2002).

4) Sobre as ações institucionais da Administração Federal brasileira no sentido de


introd u zir questões de ética na gestão pública, ver o site da Comissão de Ética
Pública em http: / / w ww.presidencia.gov.br /e tica .

3.5 - Conclusão

Chegamos ao final do curso.

Ao longo do curso, você entrou em contato com noções básicas da filosofia moral:
o problema do mérito e demérito da ação, o componente intencional da ética, o
juízo desinteressado, os conceitos de escolha e deliberação, virtudes e caráter e as
noções correlatas da autono mia e responsabilidade.

Você também viu um panora ma das questões de fronteira entre a ética, a política e
as instituições públicas, sendo apresenta do aos conceitos de república e
democracia, Estado, cidadania e império da lei.

Em particular, você foi apresenta do à idéia de cargo público e aos problemas


político - morais associados ao seu exercício.

Por último, você se familiarizou com o problema da conduta e das regras de


condu ta no serviço público, e com os valores e atitudes que ele implica.

E isso o remeteu então ao tema dos códigos de ética e às iniciativas governamen tais
no sentido de adotar padrões de comporta me n to ético no Serviço Público Federal
Brasileiro.

Como indicamos no Guia do Aluno, o intuito deste curso foi sensibilizá - lo ao tema
da ética, abrindo o caminho de uma atitude reflexiva sobre os problemas práticos
de seu ofício marcados pelo tema.
Esperamo s que tenha dado um passo importante nessa direção e que você possa, a
partir de agora, aprofundá - lo.

Obrigado pela sua participação!

“Duas coisas enchem o ânimo com admiração e respeito sempre novos, tanto mais
freqüentes e detidame nte delas se ocupa a reflexão: o céu estrelado sobre mim e a
lei moral em mim.”
Immanuel Kant

A sua participação é fundame nt al para a constr ução da excelência no serviço


público brasileiro.
GLOSSÁRIO

ANTROPOMORFIZADOS - Representação estilizada da figura humana.

APODÍTICA - Arte de demons trar a verdade de um princípio por meio do simples


raciocínio, sem recorrer a provas de fato. Diz- se das proposições que não podem
ser contesta d as, porque são o resultado de uma demons tração.
(MICHAELIS: Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo. Melhoramento s,
2002 - Verbete Apodítica)
(Nicola Abbagnano. Dicionário de Filosofia. São Paulo. Mestre Jou, 1970 - Verbete
Apodítica)

AUTORIDADE - Relação de poder fundada na crença da legitimidade ou no direito


do soberan o de exigir obediência de seus súditos a suas decissões.

COGNITIVO - Referente à cognição, ou seja, ao ato de adquirir um conhecimento.

CULTURA - Sistema ou complexo de idéias, conhecimentos, crenças, técnicas e


artefatos, padrões de compor ta me n to e atitudes que caracterizam uma
deter min ad a sociedade.

ESTAMENTO - Designa grupos sociais com status jurídico prático. A organização


estamen t al de uma sociedade envolve, geralmente, forte hierarquia e distinção
entre os grupos.

ESTOICISMO - Sistema filosófico fundado pelo filósofo grego Zenão de Cicio (342-
270 aC), por volta de 300 aC, cuja doutrina condenava todas as emoções e exaltava
a apatia como o ideal dos sábios. Essa doutrina aconselha a indiferença e o
despre zo pelos males físicos e morais. O conceito é apropriado para qualificar os
indivíduos austeros ou impassíveis perante as adversidades.
(Nicola Abbagnano. Dicionário de Filosofia. São Paulo. Mestre Jou, 1970 – Verbete
Estoicismo)

IDEOLOGIA - No seu significado fraco, Ideologia designa o genus, ou a especies


diversame n te definida, dos sistemas de crenças políticas: um conjunto de idéias e
de valores respeitantes à ordem pública e tendo como função orientar os
compor ta me n t o s políticos coletivos. O significado forte tem origem no conceito de
Ideologia de Marx, entendido como falsa consciência das relações de domínio entre
as classes, e se diferencia claramente do primeiro porque mantém, no próprio
centro, diversamen te modificada, corrigida ou alterada pelos vários autores, a
noção da falsidade: a Ideologia é uma crença falsa.
(Norberto Bobbio & outros. Dicionário de Política., 2ed., Brasília. EdUnB, 1986 –
Verbete Ideologia)

INSTITUIÇÃO - Complexo integrado de idéias, padrões de comporta m en t o,


relações inter - humanas e, muitas vezes, um equipament o material, organizado em
torno de um interesse socialmente reconhecido.
(MICHAELIS: Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo. Melhoramento s,
2002 – Verbete Instituição)
LÓGICA - Em um sentido amplo, a lógica é o estudo da estrut ur a e dos princípios
relativos à argumentação válida, sobretudo da inferência dedutiva e dos métodos
de prova e demonstração.
Hilton Japiassú e Danilo Marcondes. Dicionário Básico de Filosofia. 3ed. Rio de
Janeiro. Jorge Zahar Editor, 1996 (Verbete Lógica).

LÓGICA FORMAL OU ARISTOTÉLICA - Consiste em uma investigação das


categorias e princípios através dos quais pensamos sobre as coisas, do ponto de
vista apenas da estrutur a formal desse pensame nto, abstração feita de seu
conteú d o. Divide - se em lógica do conceito, ou seja, dos termos ou categorias que
usamos; lógica das proposições, ou seja, do modo como forma mos nossos juízos
relacionan d o os conceitos e expressando - os em proposições; e uma lógica do
raciocínio, ou do silogismo, que examina como relacionam os inferencialmente as
propo sições para delas extrair conclusões.
Hilton Japiassú e Danilo Marcondes. Dicionário Básico de Filosofia. 3ed. Rio de
Janeiro. Jorge Zahar Editor, 1996 (Verbete Lógica).

META - Resultado prefigurado de um caminho a seguir.

MORALISMO - Doutrina que faz da atividade moral a chave para a interpretação


de toda a realidade. Na linguagem comum e, sempre mais freqüente m en te, na
filosófica, o termo designa a atitude de quem se compra z em moralizar sobre todas
as coisas, sem esforçar - se por compreender as situações a que o juízo moral deve
ser referido. Neste sentido, o moralismo é um formalismo ou conformis mo moral
que tem pouca substância humana.
(Nicola Abbagnano. Dicionário de Filosofia. São Paulo. Mestre Jou, 1970 – Verbete
Moralismo)

PASTEURIZAR - Esterilizar. Em sentido figurado significa destituir uma idéia ou


ato de seu significado original ou abrandar o seu poder de insurgência.

STATUS QUO - Locução latina que significa situação inalterada. Pode ser
enten dida também como ordem estabelecida.

TRADIÇÃO - Herança cultural, isto é, a trans missão de uma geração para a outra
de crenças ou de técnicas.
(Nicola Abbagnano. Dicionário de Filosofia. São Paulo. Mestre Jou, 1970 – Verbete
Tradição)

VASSALO - No sistema de dominação feudal, era o indivíduo dependente do


senhor feudal, ao qual se ligava por juramento de fé e submissão, e a quem devia
obrigações de natureza econômica (trabalho e tributos).

VIDA CONSTITUCIONAL - Diz respeito às leis funda men t ais do país – a


organização dos poderes, a definição da forma de governo, dos principais postos
de autoridade etc.

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