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Resenha: P. F. Strawson “Escritos Lógico-Linguísticos, Cap.

I: Sobre Referir”, 1971


André Gusmão Schittini RA: 21016814

Strawson inicia definindo o domínio de sua análise: as expressões cujo uso objetiva fazer referência: de
indicar “alguma pessoa individual ou objeto singular” a expressar “a execução de um enunciado” sobre
um objeto, definindo o modo de tais expressões como “uso referencial individualizante”, abrangendo-
se na definição para a inclusão de pronomes demonstrativos, pessoais e impessoais, e frases com artigo
definido, todas no singular, estabelecendo uma “sentença de sujeito-predicado no singular”; admitindo,
no entanto, que tais expressões possam possuir sentidos diversos a depender do contexto nas quais são
utilizadas, como no generalizante “A baleia é um mamífero”, onde, apesar do artigo singular, o
contexto indica que a referência é “todas as baleias”, não uma em particular; tal contexto também
podendo ser estabelecido a priori, como na relação entre proferir “Napoleão foi o maior soldado
francês” e, em seguida, “O maior soldado francês morreu no exílio”, ficando claro que se trata do
referente da expressão anterior, e não um outro indivíduo qualquer de outro contexto. Strawson nega
também a intenção de sustentar que haja, sempre, somente uma expressão para o referente que deseja
indicar.
Elucidado o domínio de sua análise, parte então a expressar seu principal objetivo: destacar erros
fundamentais na então bem-estabelecida Teoria das Descrições de Russell. Tomando como exemplo a
expressão “O rei da França é sábio”, a qual Russel, através de sua teoria, buscou esclarecer de que
maneira possui significado mesmo admitindo a ausência de um referente para “O rei da França” em seu
contexto, Strawson a desmembra em dois argumentos: que “O rei da França” é o sujeito da sentença em
questão, e que, se a sentença possui significado, ela deve ser verdadeira ou falsa.
Estabelece-se então que estes argumentos sejam “maus” no sentido de que, em sua interdependência,
não levem à conclusão de se a sentença“O rei da França é sábio”, pois o sujeito “O rei da França”, por
não existir, faz com que a sentença não possa ser acerca do mesmo a menos que exista “em algum
mundo”; assim sendo, só pode se definir o valor de verdade de tal sentença admitindo tal ”mundo de
entidades estranhas”, esclarecendo, então, porquê Russell rejeita tais argumentos: “O rei da França”
pode ser o sujeito gramatical da sentença, mas não pode ser seu sujeito lógico; assim, a sentença não é,
logicamente, uma estrutura sujeito-predicado, mas sim uma “proposição existencial individualizadora”
de natureza complexa.
Posta esta distinção entre a forma como a sentença é expressa gramaticalmente, e sua inferência lógica,
busca-se então uma expressão que indique devidamente, sem ambiguidades, seu verdadeiro referente
de forma que faça sentido que elas possuam significado. Assim sendo, conclui-se que seu sujeito lógico
tenha, de fato, um referente e que, portanto, estes existam para sentenças lógicas que não sejam da
forma sujeito-predicado: no caso do exemplo, aquelas formadas com que Russell chama de “descrições
definidas”. Estas “descrições” se contrapõem aos “nomes logicamente próprios”, que são os únicos que
podem ser utilizados como sujeito em expressões de sujeito-predicado, e também que somente possuem
significado caso refiram-se a um objeto individual (ao contrário das descrições definidas, cujo objeto
não existe).
Dadas estas definições e implicações, Strawson destaca o ponto no qual acredita que Russell esteja
errado: de que sentenças cuja estrutura gramatical sugira uma relação de sujeito-predicado somente
possuam significado quando seu sujeito gramatical seja um nome logicamente próprio válido, ou, caso
não seja, admitindo que sua apresentação seja enganosa para analisá-las a partir de uma estrutura que
não a reflita (de “tipo especial de sentença existencial”). A justificativa de tal erro é que tais expressões
refenciais individualizantes possuam sujeito que caem tampouco sobre a definição de “nomes
logicamente próprios” quanto de “descrições definidas” conforme o modelo da Teoria das Descrições;
estes tipos de termo, portanto, para Strawson, não existem.
Para pautar sua crítica, Strawson segue utilizando o exemplo da expressão “O rei da França é sábio”,
definindo as asserções de tal sentença como três: de que “há um rei na França”; de que “não há mais
que um rei na França”; e que “não há nada que seja rei da França e que não seja sábio.” Tais poderiam
ser vistas como os arguentos conceituais do que Russell descreve como “descrição definida.” Em
seguida, define que a forma como chega-se ao juízo de que tal expressão possui significado é através da
análise das circunstâncias onde tal expressão possui valor verdadeiro: as asserções descrevem
“condições necessárias” para que o juízo de tal sentença traga este valor. Em conclusão, define que,
uma vez que pelo menos uma das asserções é, invariavelmente, falsa na ausência de um objeto que
seja, de fato “O rei da França” e, assim sendo, a sentença como um todo, por relação lógica, só pode ser
falsa, apesar de possuir significado quando proferida.
A partir desta definição, Strawson busca demonstrar que tal definição não se encaixa a todas as
sentenças iniciadas por frase de forma “o tal-e-tal”. Definindo “uma expressão” como referente a uma
expressão utilizada de forma referencial individualizante e “uma sentença” como referente a uma
sentença que faça uso de tal expressão, o autor busca distinguir entre a definição, utilização, e elocução
das mesmas.
A iniciar pela elocução de uma sentença, Strawson inicia destacando que, enquanto pode ser proferida
regularmente ao longo de diversas épocas, suas ocasiões de utilização afetam seu significado por meio
da alteração do referente de sua expressão: caso o referente da expressão fosse um incongruente com
sua ocasião de uso, a sentença tomar-se-ia com valor de falsidade. Na ausência de expressão explícita
de tal referente, a suposição derivada é a que faz com que o juízo a considere verdadeira ou falsa, a
depender da ocasião de uso, definindo, assim a utilização de uma sentença, que pode ser diferente para
a mesma elocução em ocasiões de uso diferentes: assim sendo, uma sentença é utilizada para expressar
(asserir) um valor de verdade, e não para que este valor seja derivado de seu juízo.
Destaca-se, assim, que a utilização de uma expressão como “O rei da França” também possui
distinções: enquanto não possui, por si, valor de verdade por não ser sentença, somente é possível
derivar significado de tal expressão – seu referente – através de sua utilização em uma sentença; assim,
uma expressão pode ter o que Strawson define como diferentes utilizações mencionadoras, e uma
sentença diferentes enunciados para exprimir diferentes valores de verdade. Assim sendo, uma
expressão não realiza uma referência: a referência é feita a partir de sua utilização em uma sentença,
considerando sua ocasião de uso; portanto, a referência é a utilização de uma expressão da mesma forma
como o valor de verdade é a utilização de uma sentença.
Assim, Strawson contrapõe Russell através de sua definição de significação: enquanto que Russell define que o
significado de uma sentença habita no juízo de seu valor de verdade e, para tanto, de sua natureza referente
ou descritória, Strawson defende que habita na função da sentença ou da expressão – o que passa a chamar de
“tipos” – definidos com base nas “regras, hábitos e convenções” sob as quais são utilizadas. Destes tipos, uma
expressão obtém significação a partir de suas “diretivas gerais” de sua utilização para referir, enquanto que
uma sentença, de sua utilização para asserir um valor de verdade.

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