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QOAA-AFN/2022

TURMA REGULAR
CONHECIMENTOS GERAIS
MÓDULO – I I
JANEIRO - FEVEREIRO
2022
PORTUGUÊS E REDAÇÃO Prof. Rafael Dias
MATEMÁTICA Prof. César Loyola
GEOGRAFIA ECÔNOMICA Prof. Odilon Lugão
HISTÓRIA MILITAR NAVAL Prof. Vagner Souza

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MATERIAL INTERNO DE USO EXCLUSIVO DOS ALUNOS


Proibida a reprodução total ou parcial

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CURSO www.cursoadsumus.com.br – adsumus@cursoadsumus.com.br - ESTUDE COM QUEM APROVA!
Sumário
PORTUGUÊS ............................................................................................................................. 5
Tipos de argumentos / parágrafos ........................................................................................................................................ 7
RECONHECIMENTO DA IDEIA PRINCIPAL E DO ARGUMENTO DE APOIO DE UMA DISSERTAÇÃO ....................... 8
PLANEJAMENTO - Exemplo de roteiro de planejamento .................................................................................... 16
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................................................... 18
ADJETIVO.............................................................................................................................................................................. 24
ADVÉRBIO ............................................................................................................................................................................ 29
PREPOSIÇÃO ........................................................................................................................................................................ 32
NUMERAL ............................................................................................................................................................................. 38

MATEMÁTICA ........................................................................................................................ 41
POTENCIAÇÃO E RADICIAÇÃO .................................................................................................................................................. 43
TEORIA DOS CONJUNTOS ....................................................................................................................................................... 50
FUNÇÕES .............................................................................................................................................................................. 63
FUNÇÃO AFIM (POLINOMIAL DO 1º GRAU) ............................................................................................................................... 66
FUNÇÃO QUADRÁTICA (POLINOMIAL DO 2º GRAU) .................................................................................................................. 68
FUNÇÕES EXPONENCIAIS ........................................................................................................................................................ 71
FUNÇÕES LOGARÍTMICAS ....................................................................................................................................................... 73

GEOGRAFIA............................................................................................................................ 87
5. A LÓGICA DOS ESPAÇOS INDUSTRIAIS (continuação) .............................................................................................................. 89
5.3 - Ciclos tecnológicos da Revolução Industrial (continuação) ................................................................................................. 89
5.4 - Desemprego ................................................................................................................................................................... 89
5.5 - Países pioneiros no processo de industrialização - Cenários Regionais ................................................................................ 90
5.6 - Países de industrialização planificada ............................................................................................................................ 104
5.7 - Países recentemente industrializados ............................................................................................................................. 115
6. - BRASIL: modelo econômico, dinâmicas territoriais e o espaço industrial ............................................................................. 122
6.1 - Origens da industrialização brasileira ............................................................................................................................. 122
6.2 - A economia brasileira a partir de 1985 ........................................................................................................................... 128
6.3 - Estrutura e distribuição da indústria brasileira ................................................................................................................ 133
7. O Meio Técnico - Economia e Tecnologia: Geografia e Política da Energia .............................................................................. 135
7.1 - Introdução - O Pano de fundo global .............................................................................................................................. 135
7.2 - A matriz energética mundial ........................................................................................................................................... 138

7.3 - Petróleo ....................................................................................................................................................................... 141


7.4 - Carvão mineral e Gás natural ......................................................................................................................................... 143
7.5 - Energia elétrica ............................................................................................................................................................ 143
2
7.6 - Problemas ambientais ................................................................................................................................................... 145
7.7 - Energia e Meio Ambiente .............................................................................................................................................. 146

HISTÓRIA ............................................................................................................................. 155


ÍNDICE
Índice ................................................................................................................................................ 01

AS NAÇÕES
(Continuação)
5) Grã-Bretanha ................................................................................................................................ 003
6) Alemanha ...................................................................................................................................... 024
7) Japão ............................................................................................................................................. 032
8) Estados Unidos ............................................................................................................................. 039

Leitura Complementar ................................................................................................................... 047


A História da Navegação .................................................................................................................. 047
Os Navios de Madeira: construindo embarcações e navios .............................................................. 047
O Desenvolvimento da Navegação Oceânica: os instrumentos e as cartas de marear ..................... 048
A Vida a Bordo dos Navios Veleiros ............................................................................................... 048
Os Reflexos da Revolução Industrial na Navegação ........................................................................ 049
A Roda Vai Girando ......................................................................................................................... 053
Da Vela ao Vapor .............................................................................................................................. 057

Artigo: Evolução Tecnológica no Setor Naval na Segunda Metade do Século XIX e as Consequências Anx
para a Marinha do Brasil.

BRASIL
Capítulo I – A Descoberta do Brasil ............................................................................................. 061
1) As Razões da Expansão Marítima ................................................................................................ 061
2) Os Portugueses se Espalham pelo Mundo .................................................................................... 063
3) A América Descoberta .................................................................................................................. 064
4) O Acordo de Tordesilhas .............................................................................................................. 066
5) O Caminho das Índias Decifrado .................................................................................................. 067
6) A Viagem de Cabral ..................................................................................................................... 067

Capítulo II – A Colonização do Brasil .......................................................................................... 069


1) O Período Pré-Colonial (1500 – 1530) ......................................................................................... 069
2) O Período Colonial (1530 – 1808) ............................................................................................... 071
2.1) A Expedição de Martim Afonso de Sousa .............................................................................. 071
2.2) O Projeto Agrícola da Exploração Colonial Portuguesa ........................................................ 073
2.3) O Sistema de Capitanias Hereditárias .................................................................................... 074
2.4) A Centralização do Governo .................................................................................................. 075
2.5) Os Governadores Gerais ......................................................................................................... 076
A) Tomé de Sousa ................................................................................................................... 076
B) Duarte da Costa .................................................................................................................. 077
C) Men de Sá .......................................................................................................................... 077
2.6) A Sucessão de Men de Sá ...................................................................................................... 078
2.7) A União Ibérica (1580 – 1640) .............................................................................................. 079
2.8) A Restauração em Portugal .................................................................................................... 080
2.9) As Invasões do Território Português Brasileiro ..................................................................... 081
3
A) Os Franceses ..................................................................................................................... 081
A.1) A França Antártica .................................................................................................... 081
A.2) A França Equinocial .................................................................................................. 084

A.3) As Ações de Corsários Franceses no Rio de Janeiro ................................................. 085


A.4) Nova Ação Francesa .................................................................................................. 087
B) Os Ingleses ......................................................................................................................... 088
C) Os Holandeses .................................................................................................................... 090
C.1) A Invasão da Bahia (1624 a 1625) ............................................................................. 090
C.2) A Invasão de Pernambuco (1630 a 1654) .................................................................. 091
C.3) O Governo de Nassau (1637 a 1644) ......................................................................... 093
C.4) A Luta de Reconquista (A Insurreição Pernambucana) ............................................. 095
2.10) Os Anos do 1700 .................................................................................................................. 098
A) A Descoberta do Ouro ....................................................................................................... 098
B) Os Vice-Reis na Bahia ....................................................................................................... 099
C) Progressos do Rio de Janeiro ............................................................................................. 099
D) A Administração do Marquês de Pombal ......................................................................... 100
E) O Governo dos Vice-Reis no Rio de Janeiro ..................................................................... 101
F) Progresso Econômico ........................................................................................................ 102
G) As Revoltas Coloniais – Inconfidências e Sedições .......................................................... 105
G.1) Conspiração ou Conjura de Nosso Pai ...................................................................... 105
H) As Questões de Fronteiras ................................................................................................. 105
H.1) Tratado de Lisboa (1681) ........................................................................................... 106
H.2) Tratados de Utrecht (1713 e 1715) ............................................................................ 106
H.3) Tratado de Madri (1750) ............................................................................................ 106
H.4) A Guerra Guaranítica (1753-1756) ............................................................................ 107
H.5) O Distrato de El Pardo (1761) ................................................................................... 108
H.6) Perda e Restauração do Rio Grande .......................................................................... 108
H.7) O Tratado de Santo Ildefonso (1777) ........................................................................ 110
H.8) O Tratado de Badajós (1801) ..................................................................................... 110

Bibliografia ...................................................................................................................................... 112

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REDAÇÃO
Tipos de argumentos / parágrafos

1. Argumento de autoridade: ajuda a sustentar o ponto de vista, pois lança mão da voz de um especialista, uma
pessoa respeitável (líder, artista, político) ou uma instituição de pesquisa considerada autoridade no assunto em debate.
Ex: O cinema nacional conquistou, nos últimos anos, qualidade e faturamento nunca vistos antes. “Uma câmera na mão e
uma ideia na cabeça” - a famosa frase-conceito do diretor Gláuber Rocha virou uma fórmula eficiente para explicar os R$
130 milhões que o cinema brasileiro faturou no ano passado. (Adaptado de Época, 14/04/2004).

2. Argumento por exemplificação: pretende-se levar o leitor a admitir a tese ou a conclusão justificando-a por meio
de exemplos de um fato ocorrido, mostrando que aquilo que se defende é válido.
Ex: Vejam os exemplos de muitas experiências positivas — Jundiaí (SP), Campinas (SP), São Caetano do Sul (SP), Campina
Grande (PB) — sistematicamente ignoradas pela grande imprensa. Tantos exemplos levam a acreditar que existe uma
tendência predominante na grande imprensa do Brasil de só noticiar fatos negativos.

3. Argumento por comparação: O argumentador pretende levar o leitor a aderir a sua tese de modo a mostrar
diferenças e semelhanças entre dois ou mais lados.
Ex: A quebra de sigilo nas provas do Enem 2009, denunciada pela imprensa, faz todos indagarem quem seriam os
responsáveis. O sigilo de uma prova de concurso deve pertencer ao âmbito das autoridades educacionais e não da mídia.
Assim como a imprensa é responsável por seus próprios sigilos, as autoridades educacionais devem ser responsáveis pelo
sigilo do Enem.

4.Argumento de provas concretas ou de princípio: comprova seus argumentos com informações incontestáveis:
dados estatísticos, fatos históricos, acontecimentos notórios.
Ex: De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio (PNAD) de 2008, o telefone, a televisão e o computador
estão entre os bens de consumo mais adquiridos pelas famílias brasileiras. Esses dados mostram que boa parte desses
bens de consumo é ligada ao desejo de se comunicar. A presença desses três meios de comunicação entre os bens mais
adquiridos pelos brasileiros é uma evidência desse desejo.

5.Argumentação por causa e consequência: a tese ou a conclusão é aceita justamente por ser uma causa ou uma
consequência dos fatos apresentados, ou seja, um fato ocorre em decorrência de outro.
Ex: Ao se desesperar num congestionamento em São Paulo, daqueles em que o automóvel não se move nem quando o
sinal está verde, o indivíduo deve saber que, por trás de sua irritação crônica e cotidiana, está uma monumental ignorância
histórica. São Paulo só chegou a esse caos porque um seleto grupo de dirigentes decidiu, no início do século, que não
deveríamos ter metrô. Como cresce dia a dia o número de veículos, a tendência é piorar ainda mais o trânsito.

EXEMPLOS: Tema: Televisão

1. Argumentação por exemplificação


Já foi criada até uma campanha – Quem financia a baixaria é contra a cidadania – para que sejam divulgados os
nomes das empresas que anunciam nos programas que mais recebem denúncias de desrespeito aos direitos humanos. O
mais importante nessa iniciativa é que a participação da sociedade pode fazê-la abandonar a passividade e interferir na
qualidade da programação que chega às casas dos brasileiros.

2. Argumentação histórica
Quem assiste à televisão hoje talvez nem imagine que seu compromisso inicial, quando chegou ao país, há pouco
mais de meio século, fosse com educação, informação e entretenimento. Não se pode negar que ela evoluiu – transformou-
se na maior representante da mídia, mas, em contrapartida, esqueceu-se de educar –, informa relativamente e entretém de
maneira discutível.

3. Argumentação por constatação


Para além daquilo que a televisão exibe, deve-se levar em conta também seu papel social. Quem já não renunciou
um encontro com amigou ou a um passeio com a família para não perder a novela ou a participação de algum artista num
programa de auditório? Ao que tudo indica, muitos têm elegido a televisão como companhia favorita.

4. Argumentação por comparação


Enquanto países como Inglaterra e Canadá têm leis que protegem as crianças da exposição ao sexo e à violência na
televisão, no Brasil não há nenhum controle efetivo sobre a programação. Não é de surpreender que muitos brasileiros
estejam a defender alguma forma de censura sobre esse meio de comunicação.
7
5. Argumentação por autoridade
Conforme citado pelo jornalista Nelson Hoineff, "o que a televisão tem de mais fascinante para quem a faz é justamente
o que ela tem de mais nocivo para quem a vê: sua capacidade aparentemente infinita de massificação". De fato, mais de
80% da população brasileira tem esse veículo como principal fonte de informação e referência.

RECONHECIMENTO DA IDEIA PRINCIPAL E DO ARGUMENTO DE APOIO DE UMA DISSERTAÇÃO

Quando opinamos a respeito de alguma coisa, temos o objetivo de convencer nosso interlocutor ou leitor de que estamos
corretos. Para atingir esse objetivo não basta emitir a opinião, é preciso argumentar, ou seja, desenvolver raciocínios,
apresentar provas, exemplificar de forma a sustentar nosso ponto de vista.

Esses argumentos podem ser desenvolvidos em etapas:


·frases que propõem a CONFIRMAÇÃO ou JUSTIFICATIVAS do que foi proposto anteriormente;
·frases que propõem a CONTESTAÇÃO da mesma ideia central;
·na conclusão, a RETOMADA DA IDEIA CENTRAL proposta na DECLARAÇÃO INICIAL.

EXEMPLO: “VIVER EM SOCIEDADE’’


“Sem a vida em sociedade, as pessoas não conseguiriam sobreviver, pois o ser humano, durante muito tempo, necessita de
outros para conseguir alimentação e abrigo’’.

IDEIA PRINCIPAL =
______________________________________________________________________________________________

ARGUMENTO DE APOIO =
______________________________________________________________________________________________

A) “Os seres humanos não vivem juntos, não vivem em sociedade, apenas porque escolhem esse modo de vida, mas porque
a vida em sociedade é uma necessidade da natureza’’.

IDEIA PRINCIPAL = ______________________________________________________________________________

ARGUMENTO DE APOIO = ________________________________________________________________________

B) “A televisão é prejudicial, pois torna os modos de pensar dos espectadores muito parecidos, uniformiza-os’’.

IDEIA PRINCIPAL = ______________________________________________________________________________

ARGUMENTO DE APOIO = ________________________________________________________________________

C) “A violência mostrada na televisão não tem o mesmo efeito em todos os países; por exemplo, a televisão japonesa é de
uma violência terrível e os índices de criminalidade são baixíssimos no Japão’’.

IDEIA PRINCIPAL = ______________________________________________________________________________

ARGUMENTO DE APOIO =________________________________________________________________________

Identificar a IDEIA PRINCIPAL (tese) e os argumentos nos parágrafos

1) Nos parágrafos abaixo, sublinhe a tese e coloque os argumentos entre parênteses.

a) As leis já existentes que limitam o direito de porte de arma e punem sua posse ilegal são os instrumentos que
efetivamente concorrem para o desarmamento, e foram as responsáveis pelo grande número de armas devolvidas por
todos os cidadãos responsáveis e cumpridores da lei, independentemente de sua opinião a favor ou contra o ambíguo e
obscuro movimento denominado desarmamento. Os cidadãos de bem obedecem às leis independentemente de resultados
de plebiscito, enquanto os desonestos e irresponsáveis só agem de acordo com seus interesses desobedecendo a todos
os princípios legais e sociais, e somente podem ser contidos através da repressão. (Opinião, site o Globo. In:
http://oglobo.globo.com/opiniao/mat/2011/04/12/a-quem-interessa-um-plebiscito-sobre-desarmamento-924221689.asp)

8
b) As ditaduras militares foram uma infeliz realidade na América do Sul dos anos 1960 e 1970. Em todas elas houve drástica
repressão às oposições e dissidências, com a adoção da tortura e da perseguição como política de governo. Ao fim desses
regimes autoritários adotaram-se formas semelhantes de transição com a aprovação das chamadas leis de impunidade, as
quais incluem as anistias a agentes públicos. (Eugênia Augusta Gonzaga e Marlon Alberto Weichert, Carta capital. In:
http://www.cartacapital.com.br/sociedade/o-brasil-promovera-justica)

c) Todos os palestrantes concordaram que a participação da sociedade civil é fundamental para que qualquer debate sobre
a comunicação avance no Congresso. “Se dependermos apenas do conservadorismo da Câmara e do Senado, será muito
difícil avançar”, discursou o deputado Ivan Valente. Ele destacou o fato de que existem parlamentares no Congresso que
tem fortes vínculos ou até mesmo são proprietários de meios de comunicação. “Até os Estados Unidos, o país mais liberal
do mundo, estabelece limites para evitar monopólios e define que quem tem rádio não pode ter televisão, e vice-versa.
Precisamos pautar-nos em propostas como essas”. (Ricardo Carvalho. Regulação da mídia é pela liberdade de expressão.
Carta capital. In: http://www.cartacapital.com.br/politica/regulacao-da-midia-e-pela-liberdade-de-expressao)

d) Para a presidente do Conselho Federal de Nutricionistas, Rosane Nascimento, não é necessário que o Brasil lance mão
de práticas baseadas no uso de agrotóxicos e mudanças genéticas para alimentar a população. "Estamos cansados de
saber que o Brasil produz alimento mais do que suficiente para alimentar a sua população e este tipo de artifício não é
necessário. A lógica dessa utilização é a do capital em detrimento do respeito ao cidadão e do direito que ele tem de se
alimentar com qualidade", protesta. (Raquel Júnia. Agronegócio não garante segurança alimentar. Caros Amigos. In:
http://carosamigos.terra.com.br/)

e) A leitura de jornais e revistas facilita a atualização sobre a dinâmica dos acontecimentos e promove o enriquecimento do
debate sobre temas atuais. A rapidez com que a notícia é veiculada por esses meios é clara, garantindo a
complementaridade da construção do conhecimento promovida pelas aulas e pelos livros didáticos. O apoio didático
representado pelo uso de jornais e revistas aproxima os alunos do mundo que os cerca. (Ana Regina Bastos - Revista
Eletrônica UERG. Mundo vestibular. In: http://www.mundovestibular.com.br/articles/4879/1/Como-se-preparar-para-o-
vestibular-utilizando-jornais-e-revistas/Paacutegina1.html)

OPINIÕES DIFERENTES SOBRE UM MESMO TEMA


TEMA = TELEVISÃO
IDEIA DEFENDIDA (TESE)

1ª IDEIA (TESE) = A TELEVISÃO INFLUENCIA DE FORMA NEGATIVA A FORMAÇÃO DAS CRIANÇAS, POIS OS
CONTEÚDOS DE SEUS PROGRAMAS SÃO ABUSIVOS.

2ª IDEIA (TESE) = A TELEVISÃO NÃO INFLUENCIA DE FORMA NEGATIVA A FORMAÇÃO DAS CRIANÇAS, EMBORA
ALGUNS PROGRAMAS DEVAM SER COMBATIDOS.

ARGUMENTOS
01.ACUSAR A TELEVISÃO DE SER PERNICIOSA É UMA ATITUDE SEMELHANTE AO QUE SE FAZIA NO PASSADO
EM RELAÇÃO A ALGUMAS PUBLICAÇÕES POLÊMICAS (DANDO A ENTENDER QUE ESSA ATITUDE É NATURAL E
PASSAGEIRA).

02.AS CRIANÇAS TÊM IMITADO, NA VIDA REAL, OS ROTEIROS PRODUZIDOS PARA SEUS ÍDOLOS TELEVISIVOS.

03.OS PERSONAGENS QUE PRATICAM CRIMES TÊM ESTIMULADO A VIOLÊNCIA ENTRE AS CRIANÇAS E OS
JOVENS.

04.MOSTRAR NA TELEVISÃO UM MUNDO TOTALMENTE HARMÔNICO SERIA TÃO ERRÔNEO QUANTO O QUE SE
TEM MOSTRADO DE FATO.

05.A TELEVISÃO NÃO PODE ABRIR MENTES OU FECHÁ-LAS PARA INCUTIR NAS CRIANÇAS VALORES
HORRENDOS.

06.AS CENAS DE SEXO, SEM ORIENTAÇÃO, FAZEM COM QUE OS JOVENS BUSQUEM O PRAZER DE FORMA
EQUIVOCADA.

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TAREFA: SEPARE OS ARGUMENTOS QUE CONCORDAM E DISCORDAM DAS IDEIAS APRESENTADAS SOBRE O
TEMA PROPOSTO.

Objetivos: Desenvolver a habilidade de redação de parágrafos dissertativos com o emprego dos elementos de coesão ou
articuladores textuais próprios para a expressão de determinadas ideias.
 Proposta: Faça 2 parágrafos Obs.: Cada parágrafo pode conter, no mínimo, 3 períodos.

Proposta estrutural:
1º parágrafo: Desenvolvimento
2º parágrafo: Conclusão (Portanto, logo, por isso)

Exemplo: Escapando das drogas


É muito importante que os jovens não comecem a fumar. Tal pressuposto ocorre, porque o cigarro faz muito mal
à saúde, o que pode causar até a morte, além de as pesquisas mostrarem que os gastos anuais com o vício equivalem
ao que se poderia juntar para uma viagem de férias. De fato, ninguém para de fumar sem muito sofrimento, após um
longo período de abstinência.
Todos os meios de comunicação devem, portanto, intensificar as campanhas antidrogas. Nesse sentido, é preciso
reforçar a ideia de que fumo e álcool — as chamadas drogas lícitas — precisam ser evitadas a todo custo. O governo,
então, deve incentivar a mídia com alguns subsídios fiscais.

AS RELAÇÕES DE CAUSA E CONSEQUÊNCIA NA DISSERTAÇÃO

Como encontrar a causa e a consequência?

tema: Constatamos que, no Brasil, existe um grande número de correntes migratórias que se deslocam do campo para
as pequenas ou grandes cidades.
causa ( POR QUÊ?) : A zona rural apresenta inúmeros problemas que dificultam a permanência do homem no
campo.
consequência (O QUE ACONTECE EM RAZÃO DISSO?): As cidades encontram-se despreparadas para absorver
esses migrantes e oferecer-lhes condições de subsistência e de trabalho.

Alguns exemplos:
1. Tema: Muitas pessoas mais velhas são analfabetas eletrônicas, pois não conseguem operar nem mesmo um
computador.
Causa: As pessoas mais velhas têm medo do novo, elas são mais conservadoras, até em assuntos mais prosaicos.
Consequência: Elas se tornam desajustadas, pois dependem dos mais jovens até para ligar um forno micro-ondas.

2.Tema: É de fundamental importância a preservação das construções que se constituem em patrimônios históricos.
Causa: A nação que deixa depredar as construções consideradas como patrimônios históricos destrói parte da história de
seu país.
Consequência: Essa situação demonstra claramente o subdesenvolvimento de uma nação, pois, quando não se conhece
o passado de um povo e não se valorizam suas tradições, despreza-se a herança cultural deixada pelos antepassados.

3.Tema: A maior parte da classe política não goza de muito prestígio e confiabilidade por parte da população.
Causa: A maioria dos parlamentares preocupa-se muito mais com a discussão dos mecanismos que os fazem chegar ao
poder do que com os problemas reais da população.
Consequência: Caos na saúde e na educação.

4.Tema: Muitos jovens deixam-se dominar pelo vício em diversos tipos de entorpecentes, mal que se alastra cada vez mais
em nossa sociedade.
Causa: Algumas pessoas refugiam-se nas drogas na tentativa de esquecer seus problemas.
Consequência: Formam-se dependentes dos psicóticos dos quais se utilizam e, na maioria das vezes, transformam-se em
pessoas inúteis para si mesmas e para a comunidade.

Exercícios: Apresentaremos alguns temas e você se incumbirá de encontrar uma causa e uma consequência para cada
um deles. Escreva-as, seguindo o modelo apresentado acima:

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1. Tema: As linhas de ônibus que percorrem os bairros das grandes metrópoles não têm demonstrado muita eficiência no
atendimento a seus usuários.

Causa:___________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

Consequência: ____________________________________________________________________________________

________________________________________________________________________________________________

2. Tema: A convivência familiar está muito difícil.

Causa:___________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

Consequência:_____________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

3 Tema: As novelas de televisão passaram a exercer uma profunda influência nos hábitos e na maneira de pensar da
maioria dos telespectadores.

Causa:___________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

Consequência:_____________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

4 Tema: As doenças infectocontagiosas atingem particularmente as camadas mais carentes da população.

Causa:___________________________________________________________________________________________

________________________________________________________________________________________________

Consequência:_____________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

5 Tema: Apesar de alertados por ecologistas, os lavradores continuam a utilizar produtos agrotóxicos indiscriminadamente.

Causa:___________________________________________________________________________________________

________________________________________________________________________________________________

Consequência:_____________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

Elementos de coesão: Algumas palavras e expressões facilitam a ligação entre as ideias, estejam elas num mesmo
parágrafo ou não. Não é obrigatório, entretanto, o emprego destas expressões para que um texto tenha qualidade. Seguem
algumas sugestões e suas respectivas relações:

assim, desse modo - têm valor conclusivo, exemplificativo e complementar. A sequência introduzida por eles serve
normalmente para explicitar, confirmar e complementar o que se disse anteriormente.
11
ainda - serve, entre outras coisas, para introduzir mais um argumento a favor de determinada conclusão; ou para incluir
um elemento a mais dentro de um conjunto de ideias qualquer.

ademais, além do mais, além de tudo, além disso - introduzem um argumento decisivo, apresentado como acréscimo.

mas, porém, todavia, contudo, entretanto... (conj. adversativas) - marcam oposição entre dois enunciados.

embora, ainda que, mesmo que - servem para admitir um dado contrário para depois negar seu valor de argumento,
diminuir sua importância. Trata-se de um recurso dissertativo muito bom, pois sem negar as possíveis objeções, afirma-se
um ponto de vista contrário.

Exercício de texto 1: Gravidez Precoce


A gravidez precoce é considerada como um problema de saúde pública no Brasil e em outros países. No Brasil,
uma em cada quatro mulheres que dão à luz nas maternidades tem menos de 20 anos de idade. Essas meninas, que não
são mais crianças, nem tão pouco adultas, estão em processo de transformação e, ao mesmo tempo, prestes a serem
mães. O papel de criança que brinca de boneca e de mãe na vida real confunde-se. Na hora do parto é onde tudo acontece.
A fantasia deixa de existir para dar lugar à realidade. É um momento muito delicado para essas adolescentes, o qual gera
medo, angústia, solidão e rejeição.
As adolescentes grávidas vivenciam dois tipos de problemas emocionais: um pela perda de seu corpo infantil, e
outro por um corpo adolescente recém-adquirido, que se está modificando novamente pela gravidez. Essas transformações
corporais, rapidamente ocorridas, de um corpo em formação para o de uma mulher grávida são vividas muitas vezes com
certo espanto pelas adolescentes. Por isso é muito importante a aceitação e o apoio quanto às mudanças que estão
ocorrendo, por parte do companheiro, dos familiares, dos amigos e, principalmente, pelos pais.
A escola muitas vezes não dispõe de estrutura adequada para acolher uma adolescente grávida. O resultado é
que a menina acaba abandonando os estudos durante a gestação, ou após o nascimento da criança, o que traz
consequências gravíssimas para o seu futuro profissional.
Os riscos de complicações para a mãe e a criança são consideráveis quando o atendimento médico pré-natal é
insatisfatório. Isso ocorre porque, normalmente, a adolescente costuma esconder a gravidez até a fase mais adiantada, o
que impede uma assistência pré-natal desde o início da gestação. É muito comum também o uso de bebidas alcoólicas e
cigarros, o que, consequentemente, aumenta os riscos de surgimento de problemas. ( Lúcia Helena Salvetti De Cicco /
Diretora de Conteúdo e Editora Chefe Fonte: http://www.saudevidaonline.com.br/gravprec.htm )

FICHA DOCUMENTADA DA LEITURA ARGUMENTATIVA

01.Na sua opinião, o que o título da leitura está sugerindo?

_________________________________________________________________________________________________

02.Qual é a tese (ponto de vista) apresentado pelo autor no texto?

_________________________________________________________________________________________________

03. Qual é o tema apresentado no texto?

_________________________________________________________________________________________________

04. Segundo os argumentos apresentados pela autora no 1º parágrafo, ela aprova ou critica a gravidez na adolescência?
Identifique os argumentos da autora, justificando a sua resposta.

_________________________________________________________________________________________________

05. A autora não cita exemplos, isso interfere na compreensão do leitor? Justifique sua resposta.

_________________________________________________________________________________________________

06. Qual é a sua posição sobre o assunto do texto? Concorda com a autora? Por quê? Escreva um parágrafo de 5 a 7
linhas, com 3 frases, no mínimo, na folha separada de redação do curso.

07. Marque, no texto, os elementos (conectivos) que servem de ligação entre os argumentos apresentados no texto.
12
08. Observe que o texto foi escrito em quatro parágrafos e, em cada um deles foi apresentada uma ideia nova. Reescreva.
com suas palavras, a ideia apresentada em cada parágrafo.

1º parágrafo: ______________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

2º parágrafo: ______________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

3º parágrafo:______________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

4º parágrafo:______________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

Exercício de texto 2: Buscando esperanças em meio ao sofrimento


As principais consequências do desemprego no Brasil se agravam a cada dia, principalmente nos grandes centros
urbanos, onde se pode observar o número excessivo de pessoas que vive na mais completa miséria, a expansão de favelas
nesses grandes centros e o aumento da criminalidade.
Movidas pela ideia de que, nos grandes centros, o ser humano conta com melhores condições para a sua
subsistência, populações inteiras imigram do interior. O sonho termina logo que essas pessoas chegam e começam a
procurar emprego. São inúmeros os problemas com os quais se deparam e a resposta é sempre a mesma: "Não há vaga",
ou ainda "A vaga já foi preenchida".
Sem terem para aonde ir, essas pessoas se alojam em favelas, o que as aumenta em sua extensão territorial, ou
se formam outras que crescem do mesmo modo e vivem de maneira degradante. A luta agora é outra - com a fome, a total
miséria. O pouco que conseguem mal dá para a sua sobrevivência e a de suas crianças. Toda essa situação explica a
existência de tantos meninos que tentam vender balas, chocolates e outras pequenas mercadorias aos motoristas que
param à espera do sinal abrir. Junto com a miséria e a fome, surgem doenças, muitas vezes sem a possibilidade da cura,
pois, se conseguem atendimento médico gratuito, não têm como comprar os remédios.
Diante de todos esses problemas, pode-se acrescentar mais um: o da criminalidade. Bastaria citar a grave situação
desencadeada nas favelas entre os denominados traficantes que lá se instalam e os policiais. Todavia esse é apenas um
dos mais graves exemplos. Além da conotação que se tem com relação a quem mora em uma favela - a de bandido -, há
ainda o forte impulso da miséria que, com o desemprego, faz com que muitos roubem aqui e acolá, de pequenos a grandes
roubos, de um simples furto a assaltos à mão armada, e provocam a morte de inocentes.
Portanto pode-se confirmar a gravidade das consequências geradas pelo desemprego; consequências essas que
tendem a aumentar diariamente, pois não há muito comprometimento por parte dos governantes e da sociedade. Enquanto
cada cidadão estiver preocupado apenas com seus direitos, a taxa de desemprego continuará a crescer, e também a
miséria, as favelas e a criminalidade.

FICHA DOCUMENTADA DA LEITURA ARGUMENTATIVA

01. Na sua opinião, o que o título da leitura está sugerindo?

_________________________________________________________________________________________________

02.Qual é a tese (ponto de vista) apresentado pelo autor no texto?

_________________________________________________________________________________________________

03. Qual é o tema apresentado no texto?

_________________________________________________________________________________________________

13
04. Identifique os argumentos apresentados sobre o tema proposto da dissertação.

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

05. Marque, no texto, os elementos ( conectivos ) que servem de ligação entre os argumentos apresentados no texto.

06. Observe que o texto foi escrito em cinco parágrafos e, em cada um deles foi apresentada uma ideia nova. Reescreva
com suas palavras a ideia apresentada em cada parágrafo.

1º parágrafo:

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

2º parágrafo:

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

3º parágrafo:

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

4º parágrafo:

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

5º parágrafo:

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

Exercício de texto 3: Cidadania virtual


Assistimos hoje ao fenômeno da expansão das redes sociais no mundo virtual, um crescimento que ganha
atenção por sua alta velocidade de propagação, o que traz como consequência, diferentes impactos para o nosso cotidiano.
Nesse sentido, faz-se necessário um cuidado, uma cautelosa discussão a fim de encarar essa nova realidade com uma
postura crítica e cidadã para então se desfrutar dos benefícios que a globalização dos meios de comunicação pode oferecer.
14
A internet abre uma ampla porta de acesso aos mais variados fatos, verbetes, imagens, sons, gráficos etc. Um
universo de informações de forma veloz e prática permite que cada vez mais pessoas, de diferentes partes do mundo,
diversas idades e das mais variadas classes sociais, possam conectar-se e fazer parte da grande rede virtual que integra
nossa sociedade globalizada. Dentro desse contexto, as redes sociais simbolizam de forma eficiente e sintética como é o
conviver no século XXI, como se estabelecem as relações sociais dentro da nossa sociedade pós-industrial, fortemente
integrada ao mundo virtual.
Toda a comodidade que a rede virtual oferece é, no entanto, acompanhada pelo desafio de ponderar aquilo que
se publica na internet, de modo que fica evidente a instabilidade que existe na tênue linha entre o público e o privado. Afinal,
a internet se constitui também como um ambiente social que, à primeira vista, pode trazer a falsa ideia de assegurar o
anonimato. A fragilidade dessa suposição se dá na medida em que causas originadas no meio virtual podem sim trazer
consequências para o mundo real. Crimes virtuais, processos jurídicos, disseminação de ideias, organização de
manifestações são apenas alguns exemplos da integração que se faz entre o real e o virtual.
Para um bom uso da internet, sem cair nas armadilhas que esse meio pode eventualmente nos apresentar, é
necessária a construção da criticidade, o bom senso entre os usuários da rede, uma verdadeira educação capaz de
estabelecer um equilíbrio entre os dois mundos, o real e o virtual. É papel de educar tanto das famílias, dos professores
como da sociedade como um todo, só assim estaremos exercendo de forma plena nossa cidadania.

FICHA DOCUMENTADA DA LEITURA ARGUMENTATIVA

01. Na sua opinião, o que o título da leitura está sugerindo ?

_________________________________________________________________________________________________

02.Qual é a tese ( ponto de vista ) apresentado pelo autor no texto ?

_________________________________________________________________________________________________

02. Qual é o tema apresentado no texto ?

_________________________________________________________________________________________________

04. Identifique os argumentos apresentados sobre o tema proposto da dissertação.

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

05. Marque, no texto, os elementos ( conectivos ) que servem de ligação entre os argumentos apresentados no texto.

_________________________________________________________________________________________________

06. Observe que o texto foi escrito em cinco parágrafos e , em cada um deles foi apresentada uma ideia nova. Reescreva
com suas palavras a ideia apresentada em cada parágrafo.

1º parágrafo :

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

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2º parágrafo :

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

3º parágrafo :

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

4º parágrafo :

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________________________

PLANEJAMENTO - Exemplo de roteiro de planejamento


Tema

Problemas do meio ambiente Ideia 1: Aquecimento global

Ideia 2: Queimadas / Desmatamento

Ideia 3: Falta de políticas públicas

Introdução

Técnica de introdução:
Tese: Nesse contexto, cabe ressaltar estes problemas: aquecimento global, queimadas e desmatamento e a falta
de políticas públicas.

Desenvolvimento

Parágrafo 1 = ideia 1

Recentemente, cientistas descobriram que o aquecimento global é causado pela enorme destruição do meio
ambiente.

Parágrafo 2 = ideia 2

Ademais, dois problemas graves e recorrentes são as queimadas e os desmatamentos.

Parágrafo 3 = ideia 3

Por fim, a falta de políticas públicas consistentes impede a preservação do ambiente.


16
Conclusão

Retomada da tese: O ser humano é, portanto, responsável pela destruição gradativa do meio ambiente.

Técnicas de conclusão:

Título

NA MB, o título é a repetição do tema.

Planejamento Textual
Tema
Ideia 1:

Ideia 2:

Ideia 3 (opcional):

Introdução

Técnica de introdução:

Tese:

Desenvolvimento
Parágrafo 1 = ideia 1 = tópico frasal 1

Parágrafo 2 = ideia 2 = tópico frasal 2

Parágrafo 3 = ideia 3 = tópico frasal 3(opcional)

Conclusão
Retomada da tese:

Técnicas de conclusão:

Título

17
INTRODUÇÃO
1) Funções:
* Contextualizar: de onde o tema surgiu? Qual a relevância da questão proposta? Qual é a melhor estratégia para começar
a falar desse tema? Essa estratégia “fere” a essência da introdução ou, ao contrário, consegue enriquecê-la?
* Direcionar a abordagem: como o tema será tratado? Que ponto de vista será defendido?

2) Estrutura:
* 1º parágrafo do texto → cerca de cinco ou seis linhas
* Contextualização + Tese

2.1) Tese
* Conceito: eixo central / linha de raciocínio / Expressão do ponto de vista.

a) Tese explícita por etapas: explicitação dos três argumentos


* Tese explícita por etapas: trata-se da apresentação clara dos argumentos que serão explorados nos parágrafos de
desenvolvimento, resumidos em um período, na ordem em que eles aparecerão no texto.

Exemplo 1:
Tema: Consumismo
Tese: Embora necessário, o consumismo constitui uma violência simbólica, que pode levar, também, à criminalidade.

Arg1: relevância econômica


Arg2: imposição de “necessidades” / sedução publicitária
Arg3: criminalidade para o consumo

Exemplo 2:

Tema: Redução da maioridade penal


Com o aumento da quantidade e da gravidade dos casos de delinquência juvenil, vem à tona o debate em torno
de suas possíveis soluções. Dentre as propostas, destaca-se a redução da maioridade penal para dezesseis anos no Brasil.
Embora seja necessário melhorar previamente o sistema carcerário, essa mudança no código penal confirma a precocidade
dos jovens de hoje e ajuda a diminuir sua imunidade frente à lei.

Arg1:

Arg2:

Arg3:
18
Exemplo 3:
Tema: a identidade da música brasileira
Quem vai à História descobre logo que o samba não seria o mesmo sem os ritmos africanos e as danças latinas,
o mesmo vale para outros estilos tipicamente brasileiros. Nesse contexto, vê-se com histeria o alarme diante da música
americana nas rádios e lojas de CD. Entretanto a velocidade das influências, hoje, é realmente motivo de preocupação.
Afinal, embora as trocas estejam na base de qualquer cultura, os excessos da globalização econômica precisam ser
filtrados, a fim de que a música brasileira mantenha o mosaico que sustenta sua identidade.

Arg1:

Arg2:

Arg3:

b) Tese implícita por ideia geral ou palavra-chave: sugestão sutil de ponto de vista
* Tese implícita por ideia geral ou palavra-chave: trata-se da sugestão genérica e/ou sutil da opinião que será defendida
na argumentação.

Exemplo 1:
Tema: Efeitos negativos da tecnologia:
Tese: Existe um paradoxo tecnológico: quanto maior o progresso, maior a desumanização.

Arg1: comunicação mediada


Arg2: dependência da tecnologia
Arg3: redução das identidades culturais

Exemplo 2:
Tema: Representações sociais da mulher no Brasil hoje
O discurso politicamente correto parece ocupar todos os espaços sociais disponíveis. Não seria diferente no que
diz respeito à mulher. Reconhecimento por parte de autoridades, mudanças na legislação eleitoral, teses e mais teses
acadêmicas. Na hora do comercial, porém, lá está a mesma mulher-objeto de sempre, corpo escultural, boca calada. No
Brasil, sem dúvida, vive-se uma espécie de contradição, pois a imagem feminina oficial nunca coincide com a real.

Exemplo 3:
Tema: Democracia e desigualdade social no Brasil.
Sabe-se que o Brasil é, historicamente, marcado por absurdas desigualdades sociais e por nenhuma medida
política eficaz para, pelo menos, amenizá-las. Nesse contexto de displicência governamental, o abismo entre as classes
apenas aumentou e chegou, nos dias atuais, a uma assustadora realidade de divisão e segregação. O paradoxal, no
entanto, é que, mesmo em um país de muitas diferenças, há quem acredite viver em uma plena democracia.

c) Tese implícita por pergunta: questionamento retórico e sugestivo


* Tese por pergunta retórica: trata-se da sugestão de sutil de um ponto de vista por meio de um questionamento que
induz a uma resposta.

Exemplo 1:
Tema: Os avanços da consciência ecológica no mundo.
Rio 92, Rio+10, Rio+20. Não há, na história, registro de tantas reuniões e congressos para discutir os problemas
ambientais que desafiam a todos. Tema obrigatório em sala de aula e em páginas de jornal, a ecologia entrou e ficou em
pauta. O que era pura ciência alcança o cidadão comum, que, nos atos mais simples, aos poucos muda sua postura.
Mantêm-se, no entanto, os problemas mais graves, causados pelas grandes empresas de sempre. Nesse contexto, cabe
indagar: de que adianta a pura consciência individual se o sistema não vê obstáculos para sua expansão destruidora?

Exemplo 2:
Tema: Redução da maioridade penal
Com o aumento da quantidade e da gravidade dos casos de delinquência juvenil, vem à tona o debate em torno de suas
possíveis soluções. Dentre as propostas, destaca-se a redução da maioridade penal no Brasil. Uma análise menos emocionada da
situação, no entanto, revela governos incapazes de oferecer educação de base; prisões lotadas, que não reintegram indivíduos à
sociedade e bandidos dispostos a aliciar pessoas cada vez mais jovens para o tráfico. Nesse contexto, será mesmo que prender jovens
de dezesseis e dezessete anos será benéfico para o país?

19
Exemplo 3:
Tema: Identidade da música brasileira
Samba misturado à batida “Funk”. Música eletrônica com pitadas de “Rock”. Jazz com apelo Brega. Se a essência
da música contemporânea é a mistura, o Brasil desempenha muito bem sua função. No país da miscigenação étnica, a
produção musical herda a qualidade da reciclagem criativa, responsável pela diversidade cultural da nação. Convém
indagar: mosaico ou colcha de retalhos?

2.2) Estratégias de contextualização


a) Tradicional
* Frases genéricas de ambientação
- “quando o assunto é (...), não são poucas as dúvidas presentes (...)”
- “muito se discute acerca de (...)”

* Evitar os lugares-comuns
- “Atualmente” (impreciso)
- “Desde os primórdios da humanidade” (não faz sentido)
- “A cada dia que passa”

Exemplos:
Tema: Descrença na política no mundo contemporâneo
Muito se tem discutido acerca da desvalorização da política no mundo atual. De fato, o descaso com o voto parece
constituir forte sintoma desse panorama. Para compreender tal fenômeno, cabe analisar a influência dos políticos, da
sociedade e do próprio sistema. Só assim será possível perceber a complexidade da situação.
Tema: Preservação ambiental
Não são poucos os fatores envolvidos na discussão acerca de preservação ambiental hoje. Basta ler com atenção os jornais ou
observar a força dos Partidos Verdes em boa parte do mundo. Em meio a esse grande debate, ganha espaço a valorização da água, por
razões científicas, econômicas e humanitárias. Compreender tais fatores é o primeiro passo para afastar uma ameaça grave ao próprio
ser humano.
Tema: Aquecimento global
É cada vez mais frequente a discussão sobre o aquecimento global. Realmente, os cientistas alertam para os perigos
da emissão de gases poluentes, os quais afetam a temperatura da Terra. Diante disso, o homem começa a se preocupar
um pouco mais com suas atitudes, enquanto governos preparam leis e acordos. Resta saber se ainda há tempo para mudar.
b) Histórica
* Citação de época passada ou episódio histórico
* Objetivo: comparação com o presente
→ semelhança
→ diferença
* Necessidade de exatidão, sem detalhismo
* Interdisciplinaridade
Exemplos:
Tema: O fim das utopias
Em 1917, uma revolução começou a concretizar uma das maiores utopias do ser humano – a criação de uma
sociedade igualitária. Menos de um século depois, em 1989, esse ideal acabou com a destruição de um muro que, de certa
forma, o simbolizava. A sociedade mundial chegou ao século XXI descrente e cínica e apostou tudo em uma única e triste
certeza: o indivíduo. O problema – ou solução, nesse caso, – é que o homem nunca deixou de sonhar.
Tema: Trote nas universidades
Na Idade Média, quando surgiu, o trote constituía um ritual de passagem cuja violência apresentava significados
filosóficos: os traumas físicos e psíquicos ajudavam os calouros a entender seu novo lugar. Hoje, porém, essa prática
tornou-se vazia e se limita à expressão de uma violência cada vez mais banalizada.
Tema: Problemas na política brasileira
Quando o governo militar se aproveitou da vitória brasileira na Copa de 70 para fazer propaganda política, muitos
denunciaram uma postura populista. Hoje, apesar da liberdade de imprensa, não são poucos os políticos que agem apenas
pela simpatia do público e fogem de medidas impopulares. Das cotas nas universidades ao Bolsa Escola, passando pelos
restaurantes populares, muito pouco é feito para mudar, de fato, as estruturas sociais do País.
c) Conceitual
* Definição da palavra-chave
* Útil em temas reflexivos abstratos

20
Exemplos:
Tema: Educação brasileira hoje
Em sua etimologia, educar significa elevar, conduzir a um patamar superior. Infelizmente, nem sempre a teoria se
aproxima da prática. O sistema educacional brasileiro é um bom exemplo desse distanciamento. Infraestrutura decadente,
baixa remuneração de profissionais e currículos antiquados não combinam com o discurso do Ministério da Educação, pois
o tornam etéreo.

Tema: A ciência e o dinheiro


Os dicionários registram que a ciência é o conjunto de conhecimentos de determinada área, obtidos segundo um
método objetivo e demonstrável. Embora clara, essa definição deixa de lado um fator cada vez mais presente no mundo
científico: o dinheiro. Sejam as verbas para universidades públicas, sejam os investimentos em laboratórios privados, o fato
é que os cientistas tornaram-se reféns da lógica econômica. Nesse novo contexto, a humanidade só tem a perder.

Tema: A transgressão às leis no contexto contemporâneo


Segundo o filósofo grego Aristóteles, “a lei é a razão livre da paixão”. A julgar pelo panorama atual, esse precioso
ensinamento tem sido constantemente desvirtuado. Para muitos, a paixão – como sinônimo de interesses e desejos
pessoais – revela-se elemento inerente à observância de uma lei e, o que é pior, pode ser o pretexto necessário para que
esta não seja sequer cumprida.

d) Fotográfica
* Citação de três imagens sucessivas que apresentem o tema
* Vantagem: dinamismo
* Depois é preciso fazer uma frase para explicar os flashes.
Exemplos:
Tema: Relações amorosas na atualidade
Adolescentes “ficando”. Namoros via internet. Aumento do número de divórcios. Tais são alguns dos indícios de
que as relações amorosas têm passado por transformações profundas. Sem dúvida, a economia, a tecnologia e a
aceleração dos processos têm sido decisivas na caracterização do amor contemporâneo. Cabe compreender esse processo
para julgá-lo, se for o caso.
Tema: O brasileiro diante do medo da violência
Olhos inquietos, bolsa levada à frente do corpo, andar apressado. Esses exemplos não tratam de um cidadão
neurótico, mas de um típico brasileiro morador das grandes cidades. Seja nas estatísticas, seja nas ruas, a violência aparece
em todas as suas dimensões e, dessa forma, altera o cotidiano das pessoas. Nessa realidade, todos garantem sua
segurança como podem: uns compram armas, outros planejam roteiros, outros ainda evitam sair de casa. Afinal, ninguém
quer ser vítima da violência.
Tema: Identidade da música brasileira
Samba misturado à batida “Funk”. Música eletrônica com pitadas de “Rock”. “Jazz” com apelo Brega. Se a essência
da música contemporânea é a mistura, o Brasil desempenha muito bem sua função. No país da miscigenação étnica, a
produção musical herda a qualidade da reciclagem criativa, responsável pela diversidade cultural da nação. Convém
indagar: mosaico ou colcha de retalhos?
e) Jornalística
* Micronarrativa que ilustre o tema
* Uma espécie de narrativa
Exemplos:
Tema: Violência gratuita
Em junho de 2011, cinco adolescentes de classe média espancaram uma empregada doméstica na Barra da Tijuca.
De modo semelhante ao que ocorrera com o índio Galdino, incendiado em Brasília há dez anos, a vítima ainda não entendeu
por que sofreu a agressão. Às gargalhadas, o grupo repetia um fenômeno que não é novo e só piora a cada ano: a violência
gratuita praticada por jovens abastados. Embora injustificável, essa prática precisa ser compreendida para ser controlada.
Eis o desafio.
Tema: Trote nas universidades
Há cerca de cinco anos, a USP foi palco de uma tragédia: a morte de um calouro de medicina durante o trote. Esse
episódio trouxe à tona uma discussão que ficara escondida por muito tempo. Trata-se do debate em torno dos trotes
universitários e sua violência descontrolada. Embora represente um sadismo compreensível, essa prática vai de encontro
ao espírito universitário e pode ser substituída por atividades mais inteligentes.
f) Cultural
*Interdisciplinaridade com a cultura: música, artes, literatura, etc.

21
Exemplos:
Tema: O sentido do tempo para o homem contemporâneo
Entre os poderes da Arte, encontra-se a capacidade de traduzir certas percepções em palavras ou imagens
especiais. Na música, por exemplo, canções como a “Oração ao Tempo”, de Caetano Veloso, e “Tempo Rei”, de Gilberto
Gil, falam de um mesmo assunto e o fazem da mesma maneira: personificam o tempo com letras maiúsculas. Essa opção
faz sentido, sobretudo, quando se reflete acerca da importância dada ao tempo pelo homem contemporâneo, que o trata
como uma espécie de religiosidade vazia.

Tema: O sentido do tempo para o homem contemporâneo


Há cem anos, Einstein mudou a cosmovisão ocidental ao propor a teoria da relatividade. Embora se trate de
assunto complexo, a hipótese do físico alemão colocou o tempo em evidência, tornando-se a grande questão desta época.
Em meio à preponderância da economia, nunca foi tão verdadeiro o clichê “tempo é dinheiro”. Em virtude dessa visão
pragmática, a aceleração tecnológica reduz o tempo do homem, que tenta detê-lo em vão.

Tema: O sentido do tempo para o homem contemporâneo


Quando Santos Dumont inventou o relógio de pulso, talvez não tenha imaginado o quanto esse instrumento seria
importante, até mesmo para evidenciar sua obra mais famosa. Sem dúvida, seja para embarcar num avião, seja para regular
suas atividades vitais, o homem mede o tempo de tudo. Entretanto quanto mais a humanidade imagina controlar a
passagem dos ponteiros nos relógios, mais ela se torna refém desse controle.

Outros Tipos de Contextualização

g) Divisão
Tema: Exclusão Social
Predominam ainda no Brasil duas convicções errôneas sobre o problema da exclusão social: a de que ela deve
ser enfrentada apenas pelo poder público e a de que sua superação envolve muitos recursos e esforços extraordinários.
Experiências relatadas mostram que o combate à marginalidade social em Nova Iorque tem contado com intensivos
esforços do poder público e ampla participação da iniciativa privada.

a) Oposição
Tema: Educação no Brasil
De um lado, professores mal pagos, desestimulados, esquecidos pelo governo. De outro, gastos excessivos com
computadores, antenas Wi-Fi, aparelhos de DVD. Esse é o paradoxo que vive hoje a educação no Brasil.

h) Uma frase nominal seguida de explicação


Tema: Educação no Brasil.
Uma catástrofe. Essa é a conclusão da própria Secretaria de Avaliação e Informação Educacional do Ministério da
Educação e Cultura sobre o desempenho dos alunos do 3º ano do Ensino Médio submetidos ao Sistema de Avaliação da
Educação Básica (Saeb), que ainda avaliou estudantes em todas as regiões do território nacional. É preciso, então, que o
governo busque alternativas para esse grave problema.

i) Citação
Tema: política demográfica
"As pessoas chegam ao ponto de uma criança morrer e os pais não chorarem mais". O comentário do fotógrafo
Sebastião Salgado sobre o que viu em Ruanda é um estímulo no estado de letargia ética que domina algumas nações do
Mundo Desenvolvido. Será que a humanidade está deixando de ser humana?

j) Citação de forma indireta


Tema: Escravidão
O teórico Joaquim Nabuco, em sua comiseração pelo escravo brasileiro, disse que este só tem a própria morte.
O movimento brasileiro antiescravista, quando já fortalecido, deixou bem clara essa pungente acusação nas palavras dos
abolicionistas.

k) Comparação
Tema: Reforma agrária
O tema da reforma agrária está presente há bastante tempo nas discussões sobre os problemas mais graves que
afetam o Brasil. Numa comparação entre o movimento pela abolição da escravidão no Brasil, no final do século passado, e
o movimento atual pela reforma agrária, podem-se perceber algumas semelhanças. Como na época do Império existiam
elementos favoráveis e contrários a acabar com aquele mal, também hoje há os que são a favor e os que são contra a
implantação de uma reestruturação no campo.

22
EXERCÍCIO DE INTRODUÇÃO

Leia com atenção o seguinte texto: Amazônia Azul


Há quem diga que o futuro da humanidade dependerá das riquezas do mar. Nesse sentido, torna-se inexorável o destino
brasileiro de praticar sua mentalidade marítima para que o mar brasileiro seja protegido da degradação ambiental e de interesses
alheios. Na tentativa de voltar os olhos do Brasil para o mar sob sua jurisdição, por ser fonte infindável de recursos, pelos seus
incalculáveis bens naturais e pela sua biodiversidade, a Marinha do Brasil criou o termo "Amazônia Azul", para, em analogia com os
recursos daquela vasta região terrestre, representar sua equivalência com a área marítima.
Mas como é delineada essa Amazônia Azul?
A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM) tem origem em sua 3ª Conferência, encerrada em 10 de
dezembro de 1982, em Montego Bay, na Jamaica. O Brasil assinou a convenção naquela mesma data, juntamente com outros 118
países, mas só a ratificou em 1993; a CNUDM só entrou em vigor em 16 de novembro de 1994. Nela foram definidos os espaços
marítimos: o Mar Territorial, que não deve ultrapassar o limite de 12 milhas náuticas (MN); a Zona Contígua, adjacente ao mar territorial,
cujo limite máximo é de 24 MN e é medida a partir das linhas de base do mar territorial; a Zona Econômica Exclusiva (ZEE), medida a
partir das linhas de base do mar territorial e que não deve exceder a distância de 200 MN; e a Plataforma Continental, que compreende
o solo e o subsolo das áreas submarinas, além do mar territorial, podendo estender-se além das 200 milhas até o bordo exterior da
margem continental. A distância máxima está limitada a 350 milhas, a contar da linha de base a partir da qual se mede a largura do mar
territorial.
Foram definidos ainda conceitos complementares, como as Águas Interiores: situadas no interior das linhas de base do mar
territorial e que fazem parte das águas interiores de um país. Como exemplo, as águas do Rio Amazonas, do São Francisco e da Lagoa
dos Patos; as Águas Arquipelágicas, circunjacentes aos arquipélagos como os de Martim Vaz e Trindade, Fernando de Noronha e o Atol
das Rocas; Alto Mar, como se configuram as partes não incluídas na zona econômica exclusiva, no mar territorial ou nas águas interiores,
nem nas águas arquipelágicas de um Estado. Regime das Ilhas: o Mar Territorial, a Zona Contígua, a Zona Econômica Exclusiva e a
Plataforma Continental de uma ilha são determinados de acordo com a convenção citada. Os rochedos, porém, não se prestam à
habitação humana ou à vida econômica, não tendo zona econômica exclusiva ou plataforma continental. Assim, no final dos anos 1990,
o Brasil adotou providências em relação aos rochedos São Pedro e São Paulo, situados a cerca de 520 MN do Estado do Rio Grande do
Norte: mudou-lhes o nome de “rochedos” para “arquipélago”; construiu e instalou lá um farol, para substituir o que fora destruído por um
sismo, em 1930, e construiu uma estação científica permanentemente guarnecida por um pequeno grupo de pesquisadores.
O Alto-Mar, segundo os acordos internacionais, é franqueado a todos os Estados, sejam eles costeiros ou não, desde que
utilizado para fins pacíficos. Porém, os Estados devem estabelecer os requisitos necessários à atribuição da sua nacionalidade a navios,
para o registro deles em seu território e para o direito de mostrar sua bandeira, impedir o transporte ilegal de material e pessoal, reprimir
a pirataria e cooperar para a repressão do tráfico ilícito de drogas. A pirataria tem crescido em determinadas áreas do mundo e deve ser
combatida. Devemos estar prontos para combater tal ilícito.

23
Uma breve observação do mapa acima permite esclarecer a importância da Amazônia Azul para o Brasil: com a
ampliação da nossa Plataforma Continental e mais as áreas marítimas dos Arquipélagos de Fernando de Noronha e São
Pedro e São Paulo, somadas à área marítima das ilhas Oceânicas de Trindade e Martim Vaz, a área disponível para a
exploração de riquezas e exploração científica (fundamental para o futuro da humanidade) se assemelha à atual superfície
amazônica. Não são necessárias maiores explicações para justificar as razões da necessidade de protegê-la.
Dia da Amazônia Azul
O “Dia Nacional da Amazônia Azul” é celebrado no dia 16 de novembro. Sancionada pela Lei n° 13.187, de 11 de
novembro de 2015, a data foi escolhida em homenagem à entrada em vigor da Convenção das Nações Unidas sobre Direito
do Mar, em 16 de novembro de 1994.

Com base nas ideias presentes nos textos acima, redija 4 parágrafos diferentes de introdução sobre o tema:

A importância da Amazônia Azul

OBS.:
- Utilize as várias técnicas de contextualização e de tese;
- Não se esqueça de escrever a técnica DE CONTEXTUALIZAÇÃO E DE TESE por você escolhida antes de cada parágrafo.
- Faça 2, 3 ou 4 frases em cada parágrafo;
- Faça parágrafos de 4 a 7 linhas;

Redações Exemplares
As novas tecnologias na Marinha do Brasil (Renato Duque)
As novas tecnologias são exaltadas pela Marinha do Brasil (MB) em seus planejamentos. Nesse contexto,
para entender tal fato, cabe considerar aspectos como a importância do reaparelhamento da economia e da segurança.
Sabe-se, primeiramente, que a aquisição de novos meios é essencial para a modernização da Esquadra
brasileira. A Estratégia Nacional de Defesa disponibilizou recursos para serem empregados na compra de novos
equipamentos para as Forças Armadas. Observa-se, nessa perspectiva, a preocupação do Governo Federal em equiparar
a Força Naval brasileira à dos países centrais, uma vez que a ONU exige um requisito tecnológico mínimo para atuar sob
a sua égide.
Compreende-se, também, que a MB é uma irrigadora de recursos econômicos no País. O transporte
marítimo é responsável por mais de 90% das transações comerciais do Brasil com o mundo, em virtude de ser a forma
mais barata de descolar mercadorias. Nessa direção, uma proteção eficiente das águas jurisdicionais colaborará para uma
estabilidade, necessária, a fim de captar investidores no cenário internacional.
Constata-se, além disso, que a segurança aquática é primordial para a nação. A proteção da enorme massa
líquida brasileira exige equipamentos atualizados para inibir qualquer ameaça inimiga de origem oceânica. Nesse contexto,
a construção de submarinos – convencionais e nucleares –, no Estado, proporcionará um grande avanço militar e
tecnológico para a Esquadra brasileira.
As modernas tecnologias são, portanto, muito importantes para a MB se manter forte perante as grandes
potências mundiais. A atualização da Esquadra nacional é, nesse sentido, influente para o País continuar a apoiar a ONU
nas missões de paz.

GRAMÁTICA
ADJETIVO

Adjetivo é a palavra que expressa qualidade, característica ou estado dos seres em geral. É variável em gênero, número e
grau. Pode ser classificado de quatro formas.

Primitivo (não são formados por derivação de nenhuma outra palavra) – Ex.: azul, curto, feliz.
Derivado (formado por derivação) – Ex.: azulado, infeliz, desconfortável.

Simples (apresentam um radical) – Ex.: branco, claro, livre.


Composto (apresenta dois ou mais radicais) – Ex.: luso-africano, político-institucional, sul-rio-grandense.

Obs.: A locução adjetiva é uma expressão geralmente formada de preposição + substantivo, com valor de adjetivo. Ex.: A
água da chuva destruiu a lavoura de café. Ele apresentou uma atitude sem qualquer cabimento.

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Emprego dos adjetivos e locuções adjetivas
1. Qualificação: livro interessante, restaurante modesto.
2. Caracterização: livro verde, livro grosso, livro de cima.
3. Informação: livro de meu pai, roupa importada da Alemanha.
4. Restrição: Secretaria de Educação, porta da sala,
5. Frequentemente, usa-se o adjetivo depois do substantivo. Ex.: Os assuntos ecológicos ganharam destaque.
6. Seu emprego antes do substantivo, em determinados contextos, confere-lhe destaque. Ex.: Suas belas músicas me
encantam.
7. Sua posição, em alguns casos, pode alterar-lhe o sentido. Ex.: A personagem central era uma pobre mulher. A
personagem central era uma mulher pobre.

INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES
1. FLEXÃO DE NÚMERO
1.1. Plural dos adjetivos simples: seguem as mesmas regras dos substantivos.
1.2. Plural dos adjetivos compostos

1.2.1. Apenas o último elemento varia quando


*palavra invariável + adjetivo: semi-internos
*adjetivo + adjetivo: amizades luso-brasileiras; conflitos sino-soviéticos; folhas azul-claras.

OBS.: Nos substantivos compostos que designam cores, ambos os elementos vão para o plural: os verdes-claros, os
amarelos-esverdeados, os azuis-escuros.

EXCEÇÕES : surdo-mudo - surdos-mudos


1.2.2. Adjetivos referentes a cores são invariáveis quando o segundo elemento da composição é um substantivo: canários
amarelo-ouro, uniformes verde-oliva, blusas verde-garrafa, camisas vermelho-sangue

OBS.: Nos substantivos compostos desse tipo, admitem-se dois plurais:


O verde-água - os verdes-águas ou os verdes-água
O verde-abacate - os verdes-abacates ou os verdes-abacate
1.4. São adjetivos invariáveis: azul-marinho, azul-celeste e os que começam por “cor de” (Blusas cor-de-rosa)

2. FLEXÃO DE GÊNERO (formação do feminino)

2.1. Os adjetivos terminados em –o trocam essa terminação por –a.


Ex.: ativo / ativa, branco / branca

2.2. Os terminados em –es, -or e –u geralmente recebem a terminação –a.


Ex.: freguês / freguesa, sedutor / sedutora, cru/ crua.

Obs.: os adjetivos hindu, sensabor, cortês, incolor, multicor, bicolor, tricolor, maior, melhor, menor, pior, superior, anterior,
posterior são usados dessa forma também para o feminino. Ex.: roupa hindu, atitude superior.

2.3. Os terminados em –ão trocam essa terminação por –ã, -ona e, mais raramente, por –oa.
Ex.: alemão / alemã, cristão / cristã, chorão / chorona, comilão / comilona, beirão / beiroa.

2.4. Os terminados em –eu (com som fechado) trocam essa terminação por -eia/ os terminados em –eu (som aberto) trocam
por –oa.
Ex.: ateu / ateia, europeu / europeia, ilhéu / ilhoa, tabaréu / tabaroa.
Exceções: judeu / judia, sandeu / sandia, réu/ré

2.5. Feminino dos compostos: apenas o segundo elemento varia. Ex.: literatura hispano-americana

Exceção: menino surdo-mudo / menina surda-muda

Observação importante: Os adjetivos compostos cujo segundo elemento é um substantivo são invariáveis. Ex.: amarelo-
ouro, verde-mar.

2.6. Há muitos adjetivos uniformes (servem para masculino e feminino): agrícola, audaz, exemplar, frágil, ruim.
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3. GRAUS DO ADJETIVO

COMPARATIVO (Indica uma relação de 1 ser para 2 adjetivos ou de 2 seres para 1 adjetivo.)

3.1. Grau comparativo de igualdade: Pedro é tão forte quanto eu./ Pedro é tão forte quanto inteligente.

3.2. Grau comparativo de superioridade: Pedro é mais forte (do) que eu./ Pedro é mais forte (do) que inteligente.

3.3. Grau comparativo de inferioridade: Pedro é menos forte (do) que eu. / Pedro é menos forte (do) que inteligente.

OBS.: Ao se comparar 2 qualidades ou ações de sum ser, empregam-se “mais bom”, “mais mau”, “mais grande”, “mais
pequeno” e, vez de melhor, pior, maior, menor:
Ele é mais bom do que mau. A escola é mais grande do que pequena. Ele é mais mau do que simpático. Ele é mais
pequeno do que grande.

SUPERLATIVO (Destaca um ser)

3.4. Superlativo absoluto: Pedro é muito forte. (analítico)


Pedro é fortíssimo. (sintético)

3.5. Superlativo relativo: Pedro é o mais forte da turma. (de superioridade)


Pedro é o menos forte da turma (de inferioridade)

Obs.: na linguagem coloquial, pode-se empregar a repetição do mesmo adjetivo, sem pausa e sem vírgula.
O dia está belo belo. Ela era linda linda.

4. FORMAÇÃO DO SUPERLATIVO ABSOLUTO SINTÉTICO

4.1. Forma-se pelo acréscimo de –íssimo:


original - originalíssimo
belo – belíssimo
triste - tristíssimo

4.2. Adjetivos terminados em –vel têm o superlativo em –bilíssimo:


amável - ambilíssimo
terrível –terribilíssimo
móvel –mobilíssimo

4. 3. Adjetivos terminados em –z fazem o superlativo em –císsimo :


capaz – capacíssimo
feliz – felicíssimo
atroz – atrocíssimo

4. 4. Adjetivos terminados em -m e -ão recebem -níssimo :


comum – comuníssimo
são – saníssimo

4.5. Adjetivos que seguem a forma latina no superlativo :


amargo –amaríssimo
amigo – amicíssimo
antigo – antiquíssimo
benéfico – beneficentíssimo
cristão – cristianíssimo
cruel – crudelíssimo
doce – dulcíssimo
fiel – fidelíssimo
frio – frigidíssimo
geral – generalíssimo
inimigo – inimicíssimo
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4.6. Adjetivos em -imo e -rimo :
célebre – celebérrimo
humilde - humílimo
livre – libérrimo
magro – macérrimo
negro – nigérrimo
pobre – paupérrimo

4.7. Adjetivos terminados em -io :


sério – seriíssimo
cheio – cheiíssimo
necessário – necessariíssimo ( também com um só –i )

4.8. Comparativos e superlativos anômalos


adjetivos comparativo de superioridade superlativo
Absoluto Relativo
bom melhor ótimo o melhor
mau pior péssimo o pior
grande maior máximo o maior
pequeno menor mínimo o menor

EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO

1. “Talvez seja bom que o proprietário do imóvel possa desconfiar de que ele não é tão imóvel assim.” As palavras
destacadas assumem, respectivamente, valor de

a) substantivo e substantivo.
b) substantivo e adjetivo.
c) adjetivo e verbo.
d) advérbio e adjetivo.
e) adjetivo e advérbio.

2. Assinale o período em que ocorre a mesma relação significativa indicada pelos termos destacados em "A atividade
científica é tão natural quanto qualquer outra atividade econômica":

a) Ele era tão aplicado, que em pouco tempo foi promovido.


b) Quanto mais estuda, menos se aprende.
c) Tenho tudo quanto quero
d) Sabia a lição tão bem como eu.
e) Todos estavam exaustos, tanto que se recolheram logo.

3. “Os homens são os melhores fregueses do bairro" ... Os melhores encontra-se no grau:

a) comparativos de superioridade.
b) superlativo comparativo de superioridade.
c) superlativo absoluto sintético.
d) superlativo relativo sintético de superioridade.

4. Assinale a alternativa em que o adjetivo está flexionado no grau superlativo absoluto sintético:

a) O garoto é tão inteligente quanto sua irmã.


b) O aluno é o mais inteligente da sala.
c) A cerveja está geladíssima.
d) O político é muito influente.
e) O leite está melhor que o café.

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5. O desagradável da questão era vê-lo de mau humor depois da troca de turno.
Na frase acima, as palavras em destaque comportam-se, respectivamente, como:

a) substantivo, adjetivo, substantivo


b) adjetivo, advérbio, verbo
c) substantivo, adjetivo, verbo
d) substantivo, advérbio, substantivo
e) adjetivo, adjetivo, verbo

6. Qual o significado das palavras destacadas nas frases?

a) O príncipe era um homem grande.


________________________________________________________________________________________________

b) O príncipe era um grande homem.


________________________________________________________________________________________________
c) Se você tem-se decepcionado com amigos cachorros, arrume um cachorro amigo.
________________________________________________________________________________________________
d) Seja paciente no trânsito para não ser paciente (usuário do) no hospital.
_______________________________________________________________________________________________

7. Assinale a alternativa em que o termo cego(s) é um adjetivo:

a) "Os cegos, habitantes de um mundo esquemático, sabem aonde ir..."


b)"O cego de Ipanema representava naquele momento todas as alegorias da noite escura da alma..."
c)"Todos os cálculos do cego se desfaziam na turbulência do álcool."
d)"Naquele instante era só um pobre cego."
e)"... da Terra que é um globo cego girando ao caos."

8. Se preenchermos os espaços com a expressão colocada entre parênteses, ficará gramaticalmente correta somente a
frase da alternativa:

a) Naquele ano, passariam pela ponte... de pessoas. (duas milhões)


b) Quando chegaram ao local, ... estava dormindo. (o sentinela)
c) Tivemos... deles, mas não pudemos fazer nada. (muita dó)
d) Por causa do ferimento, ... não resistiu e morreu. (a sabiá)
e) Falta apenas... para completarmos a quantidade exigida. (uma milhar)

9. Assinale a alternativa que completa corretamente as lacunas da frase.


Ficou com... quando soube que... caixa do banco entregara aos ladrões todo o dinheiro... clã.

a) o moral abalado- o – do
b) a moral abalada- o – da
c) o moral abalado –o- da
d) a moral abalado – a – do
e) a moral abalada – a – da

10. Classificam-se como substantivos as palavras destacadas, exceto em:

a) "... o idiota com quem os moleques mexem...".


b) "... visava a me acostumar à morna tirania...".
c) "Adeus, volto para meus caminhos".
d) "... conheço até alguns automóveis...".
e)"... todas essas coisas se apagarão em lembranças...".

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11. Classifique o grau dos adjetivos nas frases abaixo.

a) O cajueiro é mais alto que a roseira.


_________________________________________________________________________________________________
b) A palmeira é a mais alta árvore desse lugar.
_________________________________________________________________________________________________
c) Henrique está menos adiantado do que Paulo.
_________________________________________________________________________________________________
d) Esta lição parece tão fácil como a precedente.
_________________________________________________________________________________________________
e) Guardei as melhores recordações daqueles dias de férias.
_________________________________________________________________________________________________
f) Sem o teu auxílio, o meu trabalho seria péssimo.
_________________________________________________________________________________________________
g) fizemos uma viagem muito rápida.
_________________________________________________________________________________________________
h) Moras em casa maior do que a minha.
_________________________________________________________________________________________________

ADVÉRBIO
Advérbio é palavra invariável que caracteriza o processo verbal, exprimindo circunstâncias em que esse processo se
desenvolve. Ex.: “Hoje não ouço as vozes daquele tempo.” (circunstâncias de tempo e negação).

Obs. 1: Em alguns casos, os advérbios podem se referir a uma oração inteira; nessa situação, normalmente transmitem a
avaliação de quem fala ou escreve sobre o conteúdo da oração. Ex.: Infelizmente, os deputados não aprovarão as emendas.
Possivelmente não haverá como avisá-los.

Obs. 2: As locuções adverbiais são conjuntos de duas ou mais palavras que funcionam como um advérbio. São geralmente
formadas por preposição + substantivo ou por preposição + advérbio. Ex.: “Estavam todos lá”. (advérbio). Estavam todos à
frente (locução adverbial) do rei. Já andei aqui. (advérbio). Comecei por aqui. (locução adverbial).

1. Classificação dos advérbios

a) de afirmação: sim, certamente, realmente, efetivamente.


b) de dúvida: acaso, por ventura, possivelmente, provavelmente, quiçá, talvez.
c) de intensidade: bastante, bem, demais, mais, menos, muito, pouco, quão, quase, tanto, tão.
d) de lugar: abaixo, acima, adiante, aí, além, ali, aquém, aqui, cá, fora, junto, longe, perto.
e) de modo: assim, depressa, devagar, mal, melhor, pior e quase todos os terminados em mente (normalmente)
f) de negação: não
g) de tempo: agora, ainda, amanhã, antes, breve, cedo, jamais, nunca, ontem, outrora, sempre, tarde

2. Advérbios interrogativos são advérbios empregados em interrogativas diretas e indiretas. São eles:

a) de causa: por que (Por que não trouxeste o livro? Quero saber por que não trouxeste o livro.)
b) de lugar: onde (Onde está o livro?)
c) de modo: como (Como está o rapaz ferido ontem?)
d) de tempo: quando (Quando ele foi ferido? Precisamos saber quando ele foi ferido.)

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3. Gradação dos advérbios
Os advérbios de modo podem ser empregados com diferentes gradações. Podem apresentar grau comparativo
(Caminhava mais depressa que eu.) ou superlativo (Estranhou muitíssimo a forma de agir do pai.). As palavras melhor e
pior podem tanto ser empregadas como adjetivos ou advérbios. Ex.: Ele se sentia melhor/ pior naquele dia. (=mais
“bem”=advérbio). Ele era melhor do que o irmão. (=mais “bom”=adjetivo).

Advérbios são, tradicionalmente, classificados como palavras invariáveis, mas é comum, principalmente na
linguagem coloquial, o advérbio assumir uma forma diminutiva, com intenção de valorizar, ou seja, com valor superlativo.
Ex: Chegou cedinho ao trabalho. Ele vive falando baixinho. Outra forma de ênfase ao que está sendo dito é repetir o
advérbio. Ex.: Estava quase quase a descobrir a verdade. Descobrirá logo logo que ela o trai.

4. Palavras denotativas
São palavras classificadas à parte em função do sentido que adquirem no contexto em que se encontram. Não
devem ser incluídas entre os advérbios, pois não modificam o verbo, nem o adjetivo, nem outro advérbio.

a) de inclusão: até, inclusive, mesmo, também Ex.: Até o presidente do clube sorriu.
b) exclusão: apenas, salvo, só, somente, senão Ex.: Só o presidente do clube sorriu.
c) designação: eis Ex.: Eis o nosso candidato.
d) realce: cá, lá, é que, só Ex.: Sei lá, não sei de nada. Eu cá é que sei?
e) retificação: aliás, ou antes, isto é, ou melhor Ex.: Ressurgi, isto é, recuperei-me da cirurgia.
f) situação: afinal, agora, então Ex.: Afinal, ele virá ou não para a reunião?

OBSERVAÇÃO IMPORTANTE
Há palavras que assumem diferentes valores semânticos, morfológicos e sintáticos, que dependem do contexto.

Palavras pronome indefinido advérbio


Comeram muito ontem.
Comeu muito doce. (bastante) Chegaram muito cansados.
muito, bastante
Comeu muitos doces. (bastantes) Lutou muito bravamente.

Palavra adjetivo advérbio


alto, baixo Ele é alto. Ele é baixo. Falou alto. Falou baixo

Palavra substantivo numeral advérbio


Ele anda meio triste.
Achei um meio. Tomou meio copo.
meio
Ela anda meio triste.
Achei os meios.

Ela achou somente uma meia


meia Tomou meia taça de vinho. xxxxxxxxx
preta.

Exercícios

1. Em cada par de frases a seguir, classifique a palavra destacada.


a) Faça isso direito!
Saiu pelo portão direito.

b) Pagou barato o par de tênis que está usando.


É um carro barato?

c) Breve nos tornaremos a ver.


O discurso do paraninfo foi breve.

d) Fale baixo!
É um homem baixo.
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2. Aponte a alternativa correta para a complementação da frase dada a seguir, com relação à concordância nominal:
Ela parecia ....... irritada e, à ...... voz, porém com .............. razões, dizia ........... desaforos.
a) meio – meia – bastantes – bastantes.
b) meio – meia – bastante – bastantes.
c) meia – meia – bastante – bastante.
d) meio – meia – bastante – bastante.
e) meia – meia - bastante - bastantes
3. Classifique a palavra assinalada usando:
(A) para advérbio;
(B) para pronome indefinido;
(C) para numeral;
(D) para substantivo;
(E) para adjetivo.

1. Maria tomou a meia da mão da irmã. ( ) 8. Carlos deseja bastante este cargo. ( )
2. Maria tomou meia xícara de café. ( ) 9. Ana adquiriu mais livros. ( )
3. Pedro anda meio ( ) triste; precisa achar meio ( ) de reagir. ( ) 10. Ana está mais aborrecida ainda. ( )
4. Pedro derramou meio bule. ( ) 11. Rodrigo é um menino alto. ( )
5. João comprou muito doce. ( ) 12. Rodrigo costuma resmungar alto. ( )
6. João está muito gordo. ( ) 13. Lutou tanto e hoje tem salário baixo. ( )
14. Comprou alto-falantes novos para o carro. ( )
7. Carlos deseja ter bastante amigo lá. ( )

4. CLASSIFIQUE OS ADVÉRBIOS SUBLINHADOS:


1. DEPOIS ME OFERECERAM UMA LATA DE COMIDA.
2. EU SENTI QUE ELES NÃO IAM ME ENTENDER NUNCA.
3. ISSO ESTÁ MUITO INTERESSANTE!
4. EMBORA DE BARRIGA VAZIA, LATIA LÁ DENTRO.
5. FOI ASSIM QUE EU PERDI UM GRANDE AMIGO.
6. EU SEMPRE LHE DIZIA ISSO.
7. ENGOLIU O BOLO DEPRESSA.
8. IMEDIATAMENTE ELE CAIU.
9. O BANDIDO ESTAVA LONGE.
10. ELE JÁ NEM ME RECONHECIA.
11. FIZ TUDO MUITO CALMAMENTE: DEVAGAR SE CHEGA MAIS DEPRESSA.
12. AS ILUSÕES ANDAM SEMPRE NA FRENTE E AS DESILUSÕES, ATRÁS.
13. TEU IRMÃO PARTIU ONTEM, MEIO TRISTE. TALVEZ NÃO O VEJAS TÃO CEDO.
14. UNS COMEM POUCO; OUTROS, DEMAIS.
15. ÀS VEZES VEMOS PESSOAS QUE FALAM BEM E AGEM MAL.
16. A CASA ERA MUITO VELHA, O TELHADO JÁ MEIO TORTO.
17. COMO SE FAZ PARA OBTER ÁGUA BEM LIMPA?
18. SENTIU-SE EXTRAORDINARIAMENTE FORTE.
19. A CIDADE HOJE É BOM DIFERENTE DO QUE FOI OUTRORA.
20. A MÁQUINA TRABALHAVA ININTERRUPTAMENTE.
21. VIVE-SE BEM AQUI.
22. ELE AGIU CORRETAMENTE.
23. LEVANTOU CEDINHO E APRONTOU-SE BEM DEPRESSA.
24. HÁ COISAS MUITO CARAS E POUCO ÚTEIS.
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5. SUBLINHE OS ADVÉRBIOS DAS FRASES E DIGA AS CIRCUNSTÂNCIAS QUE INDICAM:

1. CERTAMENTE, A FAMÍLIA DA VIÚVA NÃO ERA MUITO UNIDA.


2. NUNCA TINHAM VISTO UM CRIME TÃO ENGENHOSO.
3. O HOMEM TALVEZ NÃO VÁ PARA O HOSPÍCIO, MAS PARA UMA PRISÃO.
4. A FAMÍLIA PROVAVELMENTE ADOROU O FATO DE ELE TER IDO PARA MUITO LONGE.
5. O PLANO DELE NÃO FUNCIONOU MUITO BEM.
6. NO DIA SEGUINTE, ALMOÇAMOS NUM RESTAURANTE E TOMAMOS VINHO; DEPOIS, NUM BAR, FIQUEI
ALISANDO TERNAMENTE SUAS MÃOS.

PREPOSIÇÃO
A preposição estabelece um elo de subordinação entre dois elementos oracionais (duas palavras), no entanto pode
aparecer como conectivo oracional (entre orações): Apesar de não ser bonita, Ana é agradável.

Locução prepositiva
a) advérbio + preposição: O garoto escondeu-se atrás do móvel.
b) preposição + substantivo + preposição: Não saímos por causa da chuva.

1.1. PREPOSIÇÕES ESSENCIAIS E ACIDENTAIS

Essenciais - só aparecem como preposição: a, ante, até, após, com, contra, de, desde, em, entre, para, por, perante, sem,
sob, sobre, trás.

Acidentais - as que passaram a serem usadas como preposição: durante, conforme, visto, segundo, mediante, como (=
na qualidade de), consoante.

As preposições podem assumir diferentes valores:

VALORES SEMÂNTICOS DAS PREPOSIÇÕES ESSENCIAIS

Preposição “A”

Condição A persistirem os sintomas, o médico deverá ser consultado!


Direção Quero conhecer o Brasil de norte a sul.
Fim João estudou a passar no concurso.
Meio Obteve êxito a estudo.
Lugar Estávamos ao portão do curso.
Conformidade O professor fez a questão ao método prático.
Preço Vendeu a um real o quilo.
Concessão Ele nada fazia a não ser jogar futebol.
Tempo Ao encontrar a solução, fiquei aliviado.
Instrumento Mataram a galinha a machado.
Modo Falar aos berros.
Semelhança João não saiu a vocês.
Distribuição proporcional, gradação dia a dia, mês a mês, ano a ano.
Posse Tomou o pulso ao doente.(= do doente)

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1. Numere as frases de acordo com o valor semântico da preposição “a”:

1 Causa
2 Direção
3 Fim
4 Meio
5 Lugar
6 Conformidade
7 Preço
8 Concessão
9 Posse
10 Instrumento
11 Modo
12 Semelhança
13 Proporção , Gradação
14 Condição

a. ( ) Escrevemos a carta a lápis.


b. ( ) Será bom que o mundo morra à fome?
c. ( ) Fui a Niterói.
d. ( ) Falaremos ao modo tradicional.
e. ( ) Do Forte de Copacabana ao Arpoador, a caminhada é tranquila.
f. ( ) Mantiveram-se no local a pedir perdão.
g. ( ) A camisa foi vendida a R$100,00.
h. ( ) Aprenderemos pouco a pouco o assunto.
i. ( ) Passear a camelo.
j. ( ) Matar à fome.
k. ( ) Esqueci-me de tudo a não ser do seu nome.
l. ( ) Maria puxou ao pai.
m. ( ) Arrancou o prazer da leitura ao homem.
n. ( ) A cumprirem suas responsabilidades, serão bem recebidos.

Preposição “ATÉ”
Limite de lugar Segui você até o final da rua.
Limite de tempo Esperei até ontem.
Limite numérico O produto custará até três vezes mais.
1. Numere as frases de acordo com o valor semântico da preposição “até”:
1 Limite de lugar
2 Limite de tempo
3 Limite numérico
a. ( ) Capacidade até 10 quilos de roupa.
b. ( ) As longas e cansativas caminhadas até o cemitério eram desesperadoras.
c. ( ) Tenho até hoje para enviar os documentos.
d. ( ) Apostarei até R$100,00 no jogo de hoje.
e. ( ) Debruçada até quase os meus joelhos, ela gritou.
f. ( ) Amar-te-ei até o último dia de nossas vidas.

Preposição “COM”
Companhia Gostaria de sair mais vezes com você.
Soma Uniremos as tuas com as nossas palavras.
Modo Ele gritou com força.
Instrumento Lavei a roupa com sabão de coco.
Condição Com sorte, atingiremos nossos objetivos.
Causa Os japoneses ficaram aflitos com o Tsunami.
Tempo Com seis meses de uso, as peças começam a ficar ruins.
Conformidade Reconhecemos, com o ilustre professor, que a questão deveria ser anulada.
Lugar Talvez encontremos, com o fim da estrada, água.
Concessão Com vinte anos de carreira, seu patrimônio se resume a dois carros modestos.
Meio Fui com minha moto para os lugares mais remotos do Brasil.
33
1 . Numere as frases de acordo com o valor semântico da preposição “com”:

1 Companhia
2 Soma
3 Modo
4 Instrumento
5 Condição
6 Causa
7 Tempo
8 Meio
9 Conformidade
10 Lugar
11 Concessão

a. ( ) Somaremos as minhas partes com as suas para formarmos o inteiro.


b. ( ) Sairemos com a mamãe para fazer compras.
c. ( ) O aluno sorriu com timidez.
d. ( ) Resolvemos, com a orientação do Doutor, todas as questões.
e. ( ) Fiz questão de realizar a prova com uma caneta especial.
f. ( ) Andaremos e encontraremos, com o fim da rua, a casa colorida.
g. ( ) Com esse desempenho, não passará no concurso.
h. ( ) Com o tempo, seu cabelo cairá.
i. ( ) Muitos ficaram aflitos com a notícia dos terremotos no Japão.
j. ( ) Com toda sua riqueza, não consegue ser feliz.
k. ( ) Só gosto de viajar com o meu carro.

Preposição “CONTRA”
Lugar Ele pressionou a mão contra o peito.
Adversidade Tudo isso é contra meus princípios.
Comparação No ano passado, o curso teve duzentas aprovações, contra trezentas e cinquenta que obtivemos este ano.

1 . Numere as frases de acordo com o valor semântico da preposição “contra”:

1 Lugar
2 Adversidade
3 Comparação

a. ( ) O cavalo se coça contra uma cerca.


b. ( ) As pesquisas mostraram que o índice de analfabetismo aumentou 10% neste mês contra 5% no mês passado.
c. ( ) Os políticos falam contra o governo.

BIZU
A PREPOSIÇÃO CONTRA ENTRA EM EXPRESSÕES FIXAS
Ser contra / ficar contra / ir contra → opor-se a
Sou contra os charlatões. / Ninguém pode ir contra a vontade de Deus.

Preposição “DE”
Modo Os espertos vão saindo de fininho.
Lugar De longe nada se via.
Tempo A reunião acontece de manhã.
Instrumento Devia ter feito a barba de gilete.
Causa As frutas caíram do pé de podre.
Matéria A casa foi feita de madeira.
Intensidade Ele estudou de não aguentar mais o ritmo.
Negação Não quisera regressar de jeito algum.
Posse Ela bebeu com o dinheiro de Maria.
Finalidade “E o coração… é instrumento de sopro ou de percussão?”
Assunto Falava de política.
Origem “Afirmava-se que o fogo começara de uma sala” (Raul Pompéia).
34
1. Numere as frases de acordo com o valor semântico da preposição “de”:
1 Modo
2 Lugar
3 Tempo
4 Instrumento
5 Causa
6 Matéria
7 Intensidade
8 Negação
9 Posse
10 Finalidade
11 Assunto
12 Origem
a. ( ) Ele vive de pequenos furtos.
b. ( ) Roubaram a bolsa de uma aluna da turma.
c. ( ) Cheguei de imediato.
d. ( ) Comprei uma casa de campo.
e. ( ) Meu coração pulou de saudades.
f. ( ) O fio foi feito de cobre.
g. ( ) Ele riu de todos estarem com sono.
h. ( ) A aluna falou de música com o professor.
i. ( ) Vamos capinar de enxada.
j. ( ) Sentou-se de frente para você.
k. ( ) Ela não acreditava de maneira alguma em alienígenas.
l. ( ) A manifestação começou de todos os escritório e foi até a praça.
m. ( ) Ele chegou de Paris agora
Preposição “EM”
Lugar Ele estava em São Paulo.
Modo Em lágrimas, confessou o crime.
Tempo A reunião acontecerá em trinta minutos.
Causa Ela estava triste em não poder ajudar a pobre moça.
Finalidade João acariciou em despedida a face de seu pai.
Matéria O talher é feito em cobre.
Instrumento Desenharam na máquina os projetos futuros.
Meio O professor, em explicações exatas, conseguiu o gabarito.
Preço Eu estimei em vinte milhões o terreno.
1. Numere as frases de acordo com o valor semântico da preposição “em”:
1 Lugar
2 Modo
3 Tempo
4 Causa
5 Finalidade
6 Matéria
7 Instrumento
8 Meio
9 preço
a. ( ) O rapaz estava contente em conseguir estudar oito horas por dia.
b. ( ) O casaco foi feito em lã.
c. ( ) Na rua do mercado, eu a vi.
d. ( ) O corte foi feito na tesoura.
e. ( ) Em março, fui nomeado.
f. ( ) Vai taxar em 10% todos os saques bancários.
g. ( ) Em desespero, corri atrás do ônibus.
h. ( ) Machado de Assis, em frases curtas, demonstrava sua depressão.
i. ( ) Deixou em herança todos os bens.

35
Preposição “ENTRE”
Lugar A moto estava entre os dois carros no trânsito.
Tempo Entre 1979 e 1985, foram vendidas três mil peças.
Quantidade O preço vai girar entre oito e dez dólares.
Companhia Vivia entre os mais pobres.

1 . Numere as frases de acordo com o valor semântico da preposição “entre”:


1 Lugar
2 Tempo
3 Quantidade
4 Companhia

a. ( ) Entre junho e setembro, viajaremos ao nordeste.


b. ( ) Entre duas e três meninas, a mais bela foi a escolhida.
c. ( ) Entre as árvores estava uma linda mulher.
d. ( ) Eu adoro me deitar entre os meu cães.

Preposição “PARA”
Direção Eu caminhei para a rua animada.
Tempo Marcamos o encontro para amanhã.
Conformidade Para mim, isso não é doença.
Finalidade O aluno estuda para passar.
Condição Para desejar cantar comigo, terá de tratar da voz.
Lugar Havia um pouco de comida mais para o canto da sala.
Restrição Proibido para menores.

1 . Numere as frases de acordo com o valor semântico da preposição “para”:


1 Direção
2 Tempo
3 Conformidade
4 Finalidade
5 Condição
6 Lugar
7 Restrição

a. ( ) Para o segundo semestre, deixaremos o problema.


b. ( ) Compraremos roupas para doar.
c. ( ) Conteúdo específico para maiores de dezoito anos.
d. ( ) Para ele, o mundo da imaginação é real.
e. ( ) Havia muito mais confete para a plateia do que para o palco.
f. ( ) Peguei um atalho para sua casa.
g. ( ) Para querer ficar comigo, terá de mudar seu jeito de pensar.

Preposição “POR”
Meio As casas são ligadas por uma escada.
Causa Aparentava mais idade por seus cabelos brancos.
Modo Resolveremos as questões por partes.
Lugar Ele passou por baixo da ponte.
Agente Ele foi baleado por uma criança.
Tempo Na piscina, por muitas horas, tomou muito sol.

1. Numere as frases de acordo com o valor semântico da preposição “por”:

1 Meio
2 Causa
3 Modo
4 Lugar
5 Agente
6 Tempo
36
a. ( ) O meu amor deixou de comer por mim.
b. ( ) Eles se comunicavam por cartas.
c. ( ) O resultado foi dado por todos da banca.
d. ( ) Pela manhã, você surgiu radiante.
e. ( ) Por onde anda, meu filho?
f. ( ) Ele estudou a matéria por assunto.

Preposição “SOB”
Lugar (posição inferior) Namoramos sob aquelas pedras.
Causa Não se deve ficar aqui, sob o risco de ser assaltado.
Proteção A criança estava sob minha custódia.
Sujeição Bentinho foi exilado sob a regência severa da ditadura.

1. Numere as frases de acordo com o valor semântico da preposição “sob”:

1 Lugar
2 Causa
3 Proteção
4 Sujeição

a. ( ) Só confessará sob ameaça de perder a vida.


b. ( ) Os soldados, sob o meu comando, ganharam a Guerra.
c. ( ) As nuvens se ondulavam sob o céu.
d. ( ) Estávamos sob o amparo da lei.

Preposição “SOBRE”
Lugar (posição superior) O livro estava sobre a mesa.
Assunto Falávamos sobre o tango brasileiro.
Especificação Houve um acréscimo de 33% sobre os dados do governo anterior.
Preferência (acima de) Amar a Deus sobre todas as coisas.

1 . Numere as frases de acordo com o valor semântico da preposição “sobre”:

1 Lugar
2 Assunto
3 Especificação
4 Preferência

a. ( ) Depois de ouvir a história sobre políticos, ficou deprimido.


b. ( ) Os funcionários foram multados em 30% sobre os seus salários.
c. ( ) Observou as baratas sobre o esgoto.
d. ( ) Os cuidados com os filhos estão sobre todas as outras coisas.

Preposição “ANTE”
Lugar João encontrou o livro ante o único lugar vago.
Causa ante a belíssima atuação dos flamenguistas.

EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO

1 . Numere as frases de acordo com o valor semântico da preposição “ante”:

1 Lugar
2 Causa

a. ( ) Os baderneiros parariam ante o guarda.


b. ( ) O marido chorou arrependido ante a revelação da mulher.
c. ( ) Apareciam ante mim as pessoas sedentas.
d. ( ) Ante os sinais de explosão, decidiu correr.
37
BIZU
A PREPOSIÇÃO ANTE COM IDEIA DE LUGAR PODE SER SUBSTITUÍDA POR: perante, diante de
A PREPOSIÇÃO ANTE COM IDEIA DE CAUSA PODE SER SUBSTITUÍDA POR: por causa de

Preposição “APÓS”
Lugar posterior Após o canteiro da obra, você encontrará um buraco.
Tempo posterior Após a apresentação, fomos ao restaurante.

1 . Numere as frases de acordo com o valor semântico da preposição “após”:

1 Lugar
2 Tempo

a. ( ) Após o curso, situa-se o Teatro Municipal.


b. ( ) Após a apresentação, o professor se emocionou.
c. ( ) Chegando a minha rua, estacione após o orelhão.
d. ( ) Dia após dia, sonho com você.

Preposição “DESDE”
Afastamento de um lugar Ele caminhou desde o Leblon.
Início de um tempo Desde seu nascimento, era esperto.
Condição Desde que estudes, passarás.
Causa Desde que tenho muito trabalho, não fui à festa alguma.

1 . Numere as frases de acordo com o valor semântico da preposição “desde”:

1 Lugar
2 Tempo
3 Condição
4 Causa

a. ( ) Desde que nos preocupamos com a educação, trabalhamos com zelo e atenção.
b. ( ) Desde cedo, papai me ensinava a tocar violão.
c.( ) Acho que todo aluno deve estudar muito, desde que não atrapalhe o cuidado com a saúde.
d. ( ) Ele já acenava desde a escada rolante.

Preposição “PERANTE”
Diante de / Na frente de / Ante O professor, perante dois mil alunos, explicou.

Preposição “SEM”
Modo Ele fez os exercícios sem pensar.
Condição Sem sorte, nem podemos sair de casa.
Ausência (falta) “Sem ela o que é a vida?” (Castro Alves).

1 . Numere as frases de acordo com o valor semântico da preposição “sem”:

1 Modo
2 Condição
3 Ausência (falta)

a. ( ) Chorava sem dar um pio.


b. ( ) Sem estudo, ele não era ninguém.
c. ( ) Fui para São Paulo sem Maria.

BIZU
A PREPOSIÇÃO SEM ENTRA EM EXPRESSÕES FIXAS:
Exemplo: Saía gritando pelas ruas da cidade, sem quê nem para quê.
Exemplo: Sem mais, para hoje, envio-lhe saudações.
Exemplo: Sem essa, meu amor, só tenho olhos para você.
38
5.2. VALORES SEMÂNTICOS DAS PREPOSIÇÕES ACIDENTAIS
PREPOSIÇÕES FORMAÇÃO

Durante, mediante, consoante, não obstante, tirante. São formados de verbos em particípio presente (-nte).
Visto, salvo, exceto, feito São formados de verbos em particípio passado.
Inclusive, exclusive, fora, afora, menos. São formas de advérbios.
Incluso, excluso São formas de adjetivos (ligadas a particípios passados).
Conforme É forma de adjetivo.
Como É forma de conjunção.
Senão É conjunção condicional SE com o advérbio de negação NÃO.
Segundo É forma de numeral ordinal.

BIZU
CONFORME / SEGUNDO / CONSOANTE
Os elementos acima podem ser conjunções confirmativas, construindo-se, então, com forma verbal no indicativo ou no
subjuntivo.
Exemplo: Conforme estudava, as informações chegavam.

NUMERAL
Numeral é a palavra que indica número ou ordem numa determinada série.
Os numerais classificam-se em cardinais, ordinais, fracionários ou multiplicativos.

a) Anteposto ao substantivo, o número romano deve ser lido como ordinal; posposto ao substantivo, deve ser lido como
cardinal, concordando com a palavra número subentendida. Ex.: Reprisaram a VII Copa do Mundo. (sétima). Interrompi
a leitura na página XXII. (vinte e dois).
b) A leitura de leis, decretos e portarias deve ser feita com ordinais até nono; depois deve ser feita com cardinais.
Ex.: Decreto VII (sétimo), Portaria X (dez)
c) Nomes de papas, soberanos, séculos e partes de obra devem ser lidos com ordinais até décimo; depois deve ser feita
com cardinais. Ex.: Henrique V (quinto), século XI (onze)
d) AMBOS pode ser classificado, segundo BECHARA, como numeral ou como pronome. Ex.: Ambas as filhas ou As filhas
ambas. Ambos os livros ou Os livros ambos.
e) Pode ser substituído por “um e outro”. Ex.: Ambas (as) razões ou Uma e outra razão. “Ambos” não pode ser usado
numa situação que indique contrariedade. Ex.: As suas partes chegaram a um entendimento no processo. (E não
Ambas as partes.)
f) Podem ser grafados com lh ou li: bilhão/bilião, trilhão/trilião, quatrilião, quintilião, sextilião, setilião, octilião. As formas
com lh são mais usuais no Brasil.
g) Os adjuntos de milhar e milhões devem ficar no masculino. Ex.: Alguns milhares de pessoas se expõem. Os milhares
de pessoas estudam línguas estrangeiras.
h) O numeral cardinal pode, às vezes, ser empregado para indicar número indeterminado.
Ex.: Peço-lhe um minuto de sua atenção. (por alguns poucos minutos)
Contou-lhe o fato em duas palavras. (por poucas palavras)
Ele tem mil e um defeitos. (por muitos defeitos)
i) Último, penúltimo, antepenúltimo, anterior, posterior, derradeiro, anteroposterior e outros tais, ainda que exprimam
posição do ser, não têm correspondência entre os numerais e devem ser considerados adjetivos.
j) Têm emprego como substantivos e guardam analogia com os coletivos: dezena, década, dúzia, centena, lustro,
sesquicentenário, grosa etc.

EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO

1. Comente o valor dos numerais destacados nas frases seguintes:


a) Já lhe disse isso um milhão de vezes!
b) É artigo de primeira!
c) Isso é trocar seis por meia dúzia.
d) Comprou um carro de segunda e agora se arrepende.
e) Dou dez pela aparência e zero pela sutileza.

39
2. Assinale o caso em que não haja expressão numérica de sentido indefinido:
a) Ele é o duodécimo colocado.
b) Quer que veja este filme pela milésima vez?
c) "Na guerra os meus dedos dispararam mil mortes."
d) "A vida tem uma só entrada; a saída é por cem portas."

3. Analise as duas orações que seguem e atenda ao propósito de responder ao seguinte questionamento:

O prêmio foi entregue a um garoto.


Na biblioteca havia apenas um garoto estudando.

Quanto à classe morfológica, os termos em destaque possuem a mesma classificação? Justifique.

4. Assinale o item em que não é correto ler o numeral como vem indicado entre parênteses:

a – Pode-se dizer que no século IX (nono) o português já existia como língua falada. ( )
b – Pigmalião reside na casa 22 (vinte e duas) do antigo Beco do Saco do Alferes em Aparecida. ( )
c - Abram o livro, por favor, na página 201 (duzentos e um). ( )
d – O que procuras está no art. 10 (dez) do código que tens aí à mão.( )
e – O Papa Pio X (décimo), cuja morte teria sido apressada com o advento da Primeira Guerra Mundial, foi canonizado em 1954.( )

5. Nas frases abaixo, coloque dentro dos parênteses, a letra que indica a classificação das palavras em negrito.

1 – Numeral cardinal.
2 – Numeral ordinal.
3 – Numeral multiplicativo.
4 – Numeral fracionário.
5 – Numeral coletivo.

( ) José chega ao aeroporto; duas horas depois do avião ter decolado.


( ) Consegui a vigésima terceira classificação no concurso de contos da escola.
( ) Ainda resta a metade da torta.
( ) Ele trabalhou o dobro do que havia planejado.
( ) Recebi um doze avos do meu salário.
( ) Ele recebeu dois terços da herança paterna.
( ) Vendi duas dúzias de ovos.

40
M
A
T
E
M
Á
T
I
C
A
41
42
Assunto: Matemática Módulo II – QOAM

1) POTENCIAÇÃO E RADICIAÇÃO

Regras:

Definições e Demonstrações:
Raiz de 1 quociente e quociente de 2 raízes: o quociente de 2
radicais do mesmo índice, é o radical do mesmo índice cujo o
radicando é quociente dos radicandos do divisor e do dividendo.

Raiz de 1 Raiz: A raiz de índice n da raiz de índice p de um certo


numero e a raiz de índice n.p desse numero.

Raiz de 1 produto e produto de 1 raiz: A raiz de um produto e igual


ao produto das raizes do mesmo indice.

Multiplicação de Potencia da mesma base (no caso base -3): O


produto de potencia da mesma base é a potencia com a mesma
base cujo expoente é a soma dos expoentes dos factores.

Divisão de potencias com a mesma base (base -2): O quociente


de potencias com a mesma base é uma potencia com a mesma
base e cujo expoente é a diferença entre os expoentes do dividendo
e do divisor.

Potencia de expoente fracionário: Reciprocamente todo o radical


é convertível em potencia de expoente fracionário.

Potencia de uma potência: A potência de uma potencia é outra


potência com a base da 1ª e expoente igual ao produto dos
expoentes.

43
Introdução ao radical: Qualquer coeficiente ou fator de um radical
pode passar para fator do seu radicando desde que se multiplique
o seu expoente pelo índice do radical.

Os Exercícios seguintes 1., 2. e 3. são os mais importantes para a


manipulação fluente de potencias e raízes, verifique com atenção a
simplicidade das operações:

O próximo exercício vem demonstrar o porque das operações entre


coeficiente (o n° fora da raiz) e radicando (o n° dentro da raiz) 2. Efetue os seguintes cálculos elevando ao
são possíveis.
quadrado cada um dos exercícios propostos:
Quando o expoente da raiz for igual ao expoente do radicando, o
radicando vira coeficiente de expoente 1.

Exercícios:
Vamos resolver alguns exercícios simples da utilização de potência
e radicais, saliento, a simplicidade destes exercícios farão com que
domine muito bem esse tipo de operações podendo posteriormente
tentar resolver exercícios maiores e mais complexos.

1. Efetue as divisões e multiplicações


propostas:

No exercício seguinte, Não se preocupe com a utilização de


letras, só precisa assumir a letra como se fosse um numero
NOTA: Existe diferença entre o uso dos sinais: qualquer do qual não sabe o valor.

significa equivalente; usa-se quando não é feito cálculo


nenhum mas sim um arranjo, simplificação, moldagem do exercício
de forma a que possamos percebê-lo melhor.

o sinal de igual; apresenta sempre um resultado é sempre


realizada alguma operação (soma, divisão, subtração ou
multiplicação).

44
Resolucão 2.2
3. Calcule utilizando as operações de potências:
1. O exercício 2., propõe que se eleve ao quadro, assim
colocamos tudo entre parênteses indicando que se vai
englobar todo o calculo no quadrado:

2. Segundo a regra Potência de uma Potência multiplicam-se


os dois expoentes de potencia:

3. Conforme a regra Introdução ao radical qualquer


coeficiente pode passar para radicando (para dentro da raiz)
desde que se multiplique o seu expoente pelo da raiz:

QUESTÕES DE CONCURSOS

4. Seguinte, a regra Multiplicação de potencia da mesma


base diz que se as base forem iguais então dá-se uma a mesma 1) Calculando a expressão abaixo obtemos:
base e somam-se os seus expoentes:

a) – 10/9
b) -3/5
c) 2
d) 3
e) 1/5
5. Continuando, aplica-se a regra Raiz de uma raiz onde
têm-se 2 raízes com o mesmo índice ou expoente, 2,
multiplicam-se então os seus expoentes e como seu produto
resulta numa só raiz:
2) Qual o valor da expressão é:
a) 3/5
b) 2/3
c) 2
d) 23/7
e) 32/9

3) Simplificando a raiz temos:


a) 8
b) 10
c) 12
d) 14
e) 16
45
9) Desenvolvendo a expressão
4) Efetuando-se a expressão obtemos: obtemos:
a) 5 a) 2
b) 7 b) 3
c) 9 c) 4
d) 10 d) 5
e) 12 e) 6

5) Ache o valor de : 10) Calcule :


a) 1/3 a) 2/3
b) 3/5 b) 3/5
c) 2/7 c) 2
d) 4/9 d) 5/4
e) 5 e) 7/4

6) Calcule o valor da expressão :


a) – 1 11) Calcule :
b) 0 a) - 63/8
c) 1 b) - 32/5
d) 2 c) – 3/5
e) 3 d) 7/8
e) 7/5

7) Efetue :
a) 2/3
b) 5/9 12) Calcule :
c) 1/3 a) 2
d) 2 b) 3
e) 3 c) 4
d) 5
e) 6

8) Calculando a expressão obtemos:


a) 2/5
b) 3/5
c) 3 13) Desenvolva :
d) 4 a) - 56/17
e) 4/5 b) - 13/23
c) - 119/25
d) - 23/19
e) – 17/37

46
19) Desenvolva :
14) Calcule :
a) 15 a) 10
b) 21
c) 27 b) 3 10
d) 30
e) 32 c) 5 10
d) 7 10
e) 10 10

15) Calculando-se o valor de , obtemos:


a) 5
1 1 1 1
b) 6 20) Se A   , qual o valor de ?
c) 8 2 2 1 2 1 A
d) 10
e) 12 2
a)
3
2
b)
5
3 2
23 . 3 2 c)
16) Simplifique : 5
6 5
2
a) 1 2
d)
b) 2 2
c) 3
d) 4 3 2
e) 5 e)
2

21) (FUVEST) A expressão a seguir

17) Efetue : 28
a)
a) 2 5
b) 3
3 2 29
c) b)
5
d) 2 2
c) 28
e) 2
d) 29
1
 258  3
e)  
 10 

5 3 22) (FUVEST) Qual é o valor da expressão:


18) Racionalize :
5 3
a) 4  15
a) 3
b) 1  15 b) 4
c)1  15 c) 3
d) 2
d) 5 e) 2
e) 3
47
33 n  3.32 n  9.31 n
23) Simplificando-se a expressão para
9.32 n 27) (ESPM) 251  250  249 é igual a:
n , obtem-se: 48
a) 2
a) 1/6
b) 1/3 b) 2 49
c) 6.3 n1 c) 249
d) 1  3
1 n d) 248
e) 3
n1 e) 250

2n 3.2  2n 1.7
28) (F.C. Chagas) A expressão é igual a:
a 5.2n  4
 1  2 a) 40
24) (U.E. Londrina) Calculando-se    onde a , b) 30
 243  5 c) 5/8
obtém-se:
a) - 81 d) 22
b) - 9 e) 2 6
c) 9
d) 81
e) um número não real

29) Sabe-se que n é um número natural e maior do que 1. Então o

1 22 n  22 n 2
 1  4
6 1 2 valor da expressão
5
é:
25) Calcule  8 2    16 4  27 3 é igual: a) 1/5
  
b) 2n
a) - 5 3
b) - 3
c) - 1 c) 24
d) 0 n
e) 2 d)
2
n
e)
5

 2 .k .5t 3  .  2 x 1.k y .5t 1   150


x y 1 1
26) (Mackenzie) Se ,
então k vale: 213  216
a) 1 30) Simplificando a expressão ,obtemos:
b) 2 215
c) 3
d) 4 a) 2
e) 5 b) 1,5
c) 2,25
d) 2
e) 1

48
QUESTÕES DO CONCURSO QOAM 5) (QOAM – 2013) Qual é o valor numérico da expressão
a2  1  a2 1 a 2  1  a 2  1 quando a  25 ?
1) (QOAM) Entre 5 e 5.000, tem-se k números da forma 2 n , onde E 
n é um número natural. Qual é o valor de k? a2  1  a2 1 a2  1  a2 1
a) 8
b) 9 a) 1
c) 10 b) 2
d) 11 c) 210
e) 12
d) 211
e) 213

 8
4
3
2) (QOAM) é igual a:
a) 1/16
b) 1/8
c) 1/6
A8  A8  A8  A8
d) 6 6) (QOAM – 2014) Sabendo-se que k e
e) 16 B 3 .B 5 .B 4 .B 7 .B 1
4
B
  2
4
o valor de k é:
 A
 
0,25
3) (QOAM - 2011) Sabendo que k 2 9
, qual o valor de a) 1
b) 2
2 n 1
k .k 3 n c) 3
? d) 4
k 7 : k n e) 5

3
a)
2
3
b)
4 7) (QOAM – 2017) Ao simplificar a expressão
2
c)
2 , encontra-se:
2
d) a)
4
b)
2
e) c)
3
k d)
4) (QOAM – 2012) Determine o valor de , sabendo que
10 e)

k  28  2 3  3 2 : 
5
a)
4 8) (QOAM – 2017) Assinale a opção que apresenta o valor
simplificado da expressão
8
b)
3
13 .
c) a) 1
7 b) 3/2
7 c) 2
d) d) 4/3
5 e) 6/5
11
e)
6
49
9) (QOAM – 2018) Consideradas satisfeitas as condições de 2) TEORIA DOS CONJUNTOS
existência das frações e simplificando as expressões

Símbolos

: pertence : existe
e

: não pertence : não existe


, é correto afirmar que vale:
: está contido : para todo (ou qualquer que
seja)

: não está contido : conjunto vazio

: contém N: conjunto dos números naturais

: não contém Z : conjunto dos números inteiros

/ : tal que Q: conjunto dos números racionais

Q'= I: conjunto dos números


: implica que irracionais

: se, e somente se R: conjunto dos números reais

Símbolos das operações


10) (QOAM – 2020) Dada a expressão ,
onde m e n são números reais e n ≠ 0. Nessas condições, o valor
positivo de m é: : A intersecção B

: A união B

A - B: diferença de A com B

a < b: a menor que b

: a menor ou igual a b

a > b: a maior que b

: a maior ou igual a b

:aeb

: a ou b

GABARITO – QUESTÕES DE CONCURSOS

1–a 2–e 3–c 4–b 5–d 6–c 7–b 8–a 9


Conjunto Universo: Em certos problemas da teoria dos
conjuntos, é preciso que se defina um conjunto que contenha todos
– d 10 – e 11 – a 12 – e 13 – c 14 – c 15 – b 16 –
os conjuntos considerados. Assim, todos os conjuntos trabalhados
b 17 – c 18 – a 19 – b 20 – b 21 – d 22 – b 23 – b
no problema seriam subconjuntos de um conjunto maior, que é
24 – b 25 – a 26 – c 27 – c 28 – a 29 – b 30 – b.
conhecido como conjunto universo, ou simplesmente universo.

GABARITO – QUESTÕES DO CONCURSO QOAM Por exemplo: em um problema envolvendo conjuntos de números
inteiros, o conjunto dos números inteiros Z é o conjunto universo;
1–c 2–a 3–d 4–d 5–d 6–b 7–e 8–b 9 em um problema envolvendo palavras (consideradas como
–a 10 – d. conjuntos de letras), o universo é o alfabeto.

50
Relações entre conjuntos representado por , formado por todos os
elementos pertencentes a A ou B, ou seja:
Relação de Inclusão: Para relacionar um conjunto com outro
conjunto (ou subconjunto) utilizamos a relação de inclusão.

Exemplo: Se considerarmos o conjunto formado por todas as


letras do alfabeto e o conjunto formado pelas vogais, podemos
dizer que (A contém V) ou (V está contido em
A)

Relação de Pertinência: Se é um elemento de , nós


podemos dizer que o elemento pertence ao conjunto e
podemos escrever . Se não é um elemento de , nós
podemos dizer que o elemento não pertence ao conjunto e
Intersecção de Conjuntos: dados os conjuntos
podemos escrever . A e B, define-se como intersecção dos conjuntos A e B ao
conjunto representado por , formado por todos os
Exemplos: elementos pertencentes a A e B, simultaneamente, ou

seja:

Conjunto vazio: é um conjunto que não possui elementos. O


conjunto vazio é representado por { } ou .

Diferença de Conjuntos: dados os conjuntos A


Conjunto unitário: é um conjunto que possui somente um e B, define-se como diferença entre A e B (nesta ordem)
elemento. ao conjunto representado por A-B, formado por todos os
elementos pertencentes a A, mas que não pertencem a

B, ou seja

Subconjuntos: quando todos os elementos de um


conjunto A qualquer pertencem a um outro conjunto B, diz-
se, então, que A é um subconjunto de B, ou seja A B.
Observações:

 Todo o conjunto A é subconjunto dele próprio, ou seja


;
 O conjunto vazio, por convenção, é subconjunto de
qualquer conjunto, ou seja

DIAGRAMAS DE EULER-VENN – Um bom modo de visualizarmos Produto Cartesiano: dados os conjuntos A e B,


relações entre conjuntos é através dos diagramas de Euler-Venn. chama-se peoduto cartesiano A com B, ao conjunto AxB,
Os conjuntos são representados por regiões planas interiores a uma formado por todos os pares ordenados (x,y), onde x é
curva fechada e simples. elemento de A e y é elemento de B, ou seja

Operações com conjuntos

Conjunto Complementar: Dado um universo U,


União de Conjuntos: dados os conjuntos A e B, diz-se complementar de um conjunto A, em relação ao
define-se como união dos conjuntos A e B ao conjunto universo U, o conjunto que contém todos os elementos
51
presentes no universo e que não pertençam a A. Também
define-se complementar para dois conjuntos, contanto que O conjunto IN é subconjunto de Z.
um deles seja subconjunto do outro. Nesse caso, diz-se,
por exemplo, complementar de B em relação a A (sendo Temos também outros subconjuntos de Z:
B um subconjunto de A) — é o complementar relativo — e Z* = Z-{0}
usa-se o símbolo . Matematicamente: Z+ = conjunto dos inteiros não negativos = {0,1,2,3,4,5,...}
Z_ = conjunto dos inteiros não positivos = {0,-1,-2,-3,-4,-5,...}

Observe que Z+=IN.


Exemplo: Podemos considerar os números inteiros ordenados
sobre uma reta, conforme mostra o gráfico abaixo:
A = { 3,4,9,{10,12},{25,27} }
D = { {10,12} }

Conjunto das Partes ou Potência

Dado um conjunto A, definimos o conjunto das partes de A,

, como o conjunto que contém todos os subconjuntos de A  Conjunto dos números racionais (Q)
(incluindo o conjunto vazio e o próprio conjunto A).

Os números racionais são todos aqueles que


podem ser colocados na forma de fração (com o
Uma maneira prática de determinar é pensar em todos os
subconjuntos com um elemento, depois todos os subconjuntos com numerador e denominador  Z). Ou seja, o conjunto dos
dois elementos, e assim por diante. números racionais é a união do conjunto dos números
inteiros com as frações positivas e negativas.

Exemplo:
5 3 3
Então : -2,  ,  1, , 1, , por exemplo, são números racionais.
Se A = { 1, 2, 3 }, então = { ∅, {1}, {2}, {3}, {1, 2}, 4 5 2
{1, 3}, {2, 3}, {1, 2, 3} }.

Exemplos:
Número de subconjuntos de um conjunto: se um conjunto A possuir
n elementos, então existirão 2n subconjuntos de A. 3 6 9
a)  3   
1 2 3
Quantidade de subconjuntos não vazios: 2n - 1 1 2 3
b) 1   
1 2 3
Relação Quantitativa com 2 conjuntos:
n  A  B   n  A  n  B   n  A  B  Assim, podemos escrever:

a
Q  {x | x  , com a  Z , b  Z e b  0}
CONJUNTOS NUMÉRICOS b
 Conjunto dos números naturais (IN)
É interessante considerar a representação decimal de
um número racional, que se obtém dividindo a por b.
IN={0, 1, 2, 3, 4, 5,...}
Exemplos referentes aos decimais exatos ou finitos:

1 6 7
Um subconjunto importante de IN é o conjunto IN*:  0,333 ...  0,8571428571 42...  1,1666 ...
3 7 6
IN*={1, 2, 3, 4, 5,...}  o zero foi excluído do conjunto IN.
Podemos considerar o conjunto dos números
naturais ordenados sobre uma reta, como mostra o
1 6 7
gráfico abaixo:  0,333 ...  0,8571428571 42...  1,1666 ...
3 7 6
Exemplos referentes aos decimais periódicos ou
infinitos:
 Conjunto dos números inteiros (Z)

Todo decimal exato ou periódico pode ser


representada na forma de número racional.
Z={..., -3, -2, -1, 0, 1, 2,
52
3,...}
 Conjunto dos números irracionais QUESTÕES DE CONCURSOS

1) Se um conjunto A possui 1024 subconjuntos, então o cardinal de


Os números irracionais são decimais infinitas não A é igual a:
periódicas, ou seja, os números que não podem ser a) 5
escrito na forma de fração (divisão de dois inteiros). b) 6
Como exemplo de números irracionais, temos a raiz c) 7
quadrada de 2 e a raiz quadrada de 3: d) 9
2  1,4142135 ... e) 10

3  1,7320508 ...

Um número irracional bastante conhecido é o


número =3,1415926535...
2) Se A, B e A  B são conjuntos com 90, 50 e 30 elementos,
respectivamente, então o número de elementos do conjunto A 
B é:
 Conjunto dos números reais (IR) a) 10
b) 70
Dados os conjuntos dos números racionais (Q) e c) 85
dos irracionais, definimos o conjunto dos números reais d) 110
como: e) 170

IR=Q  {irracionais} = {x|x é


racional ou x é irracional}
3) Se F é um conjunto com n + 1 elementos, então o número de
elementos de P(F), ou seja, conjunto das partes do conjunto F, é:
a) 2(n + 1)
O diagrama abaixo mostra a relação entre os b) n + 1
conjuntos numéricos: c) 2n
d) 4n
e) 2.2n

4) Dois clubes X e Y possuem um total de 3.000 sócios. Sabe-se


que 1.850 são sócios de X e 2.500 são sócios de Y. O número de
sócios de X que não são sócios de Y é:
Portanto, os números naturais, inteiros, racionais e a) 350
irracionais são todos números reais. Como subconjuntos b) 500
importantes de IR temos: c) 1.150
IR* = IR-{0} d) 1.350
e) 1.500
IR+ = conjunto dos números reais não negativos
IR_ = conjunto dos números reais não positivos

Obs: entre dois números inteiros existem infinitos


números reais. Por exemplo:
 Entre os números 1 e 2 existem infinitos números reais:
1,01 ; 1,001 ; 1,0001 ; 1,1 ; 1,2 ; 1,5 ; 1,99 ; 1,999 ; 1,9999 5) Sejam A e B possuem um único elemento em comum. Se o
... número de subconjuntos de A é igual a metade do número de
 Entre os números 5 e 6 existem infinitos números reais: subconjuntos de B, o número de elementos do conjunto A união B
é o:
5,01 ; 5,02 ; 5,05 ; 5,1 ; 5,2 ; 5,5 ; 5,99 ; 5,999 ; 5,9999 ...
a) A metade do número de elementos de B
b) A metade do número de elementos de A
c) O dobro do número de elementos de B
d) O dobro do número de elementos de A
e) Igual ao número de elementos de B

53
6) A e B são conjuntos disjuntos e subconjuntos do conjunto 11) Em uma divisão do CPA são praticados dois esportes, vôlei e
universo (U). Se A’ e B’ são conjuntos complementares em U natação. Exatamente 75% dos militares praticam vôlei e 70%
(conjuntos universo) então (B’ – A)  (A  B) é: natação. Sabendo que todo militar é praticante de pelo menos um
a) Conjunto vazio dos esportes, determine o percentual de militares que praticam
b) Conjunto Universo somente um dos esportes.
c) A união B’ a) 40%
d) (A – B)’ b) 45%
e) A’ – B c) 50%
d) 55%
e) 60%

12) Numa pesquisa com fuzileiros navais foram feitas as seguintes


7) Num grupo de estudantes, 80% estudam inglês, 40% estudam perguntas para que respondessem sim ou não: Gosta de tirar
francês e 10% não estudam nenhuma dessas duas línguas. Nesse serviço? Gosta de realizar treinamento de guerra? Responderam
grupo, a porcentagem de alunos que estudam ambas as línguas é: sim somente à primeira pergunta 65 fuzileiro; 85 responderam sim
a) 25% à segunda; 30 responderam sim a ambas; e 35 responderam não a
b) 50% ambas. Quantos fuzileiros foram entrevistados.
c) 15% a) 185
d) 33% b) 155
e) 30% c) 150
d) 195
e) 200

8) Se n é o número de subconjuntos não-vazios do conjunto


formado pelos múltiplos estritamente positivos de 5, menores do 13) Numa pesquisa realizada entre 500 pessoas, 318 gostavam de
que 40, então o valor de n é: uma mercadoria A, 264 de uma mercadoria B e 112 gostavam das
a) 127 duas mercadorias. Quantos não gostavam da mercadoria A e nem
b) 125 da B?
c) 124 a) 30
d) 120 b) 32
e) 110 c) 35
d) 40
e) 42

9) Analisando as carteiras de vacinação das 84 crianças de uma


creche, verificou-se que 68 receberam a vacina Sabin, 50
receberam a vacina contra Sarampo e 12 não foram vacinadas. 14) Em uma prova de concurso público compareceram 500
Quantas dessas crianças receberam as duas vacinas? candidatos. 30% deles acertaram a questão A, enquanto que 10%
a) 11 acertaram as questões A e B. Quantos candidatos acertaram
b) 18 apenas a questão B?
c) 22 a) 320
d) 23 b) 350
e) 46 c) 380
d) 400
e) 420

10) Sejam R e S conjuntos que possuem três elementos em


comum. Se o número de subconjuntos de R é a quarta parte do
número de subconjuntos de S, o número mínimo de elementos do 15) Numa turma de 30 alunos, 6 escrevem com a mão esquerda e
conjunto R  S é o:
dois com as duas mãos. Quantos escrevem com a mão direita?
a) 18
a) 5 b) 20
b) 4 c) 22
c) 6 d) 24
d) 6 e) 26
e) impossível

54
16) Numa turma de 35 alunos, 27 gostam de futebol, 16 de basquete 21) Sabe-se que o sangue das pessoas pode ser classificado em
e 13 gostam dos dois. Quantos não gostam nem de futebol e nem quatro tipos quanto a antígenos. Em uma pesquisa efetuada num
de basquete? grupo de 120 pacientes de um hospital, constatou-se que 40 deles
a) 5 têm o antígeno A, 35 têm o antígeno B e 14 têm o antígeno AB.
b) 6 Nestas condições, pede-se o número de pacientes cujo sangue tem
c) 7 o antígeno O.
d) 8 a) 57
e) 9 b) 59
c) 60
d) 63
e) 70

17) Uma pesquisa entre telespectadores mostrou que, em cada 100


pessoas, 60 assistem a novela A, 50 assistem a novela B, 50 22) Em uma O.M. Naval são praticados dois esportes, vôlei e
assistem a novela C, 30 assistem as novelas A e B, 20 as novelas basquetebol. Exatamente 80% dos fuzileiros praticam vôlei e 60%
B e C, 30 as novelas A e C, e 10 as três novelas. Quantos não basquetebol. Sabendo que todo fuzileiro é praticante de pelo menos
assistem a essas novelas? um dos esportes, determine o percentual de fuzileiros que praticam
a) 8 ambos.
b) 10 a) 28%
c) 12 b) 32%
d) 14 c) 36%
e) 16 d) 38%
e) 40%

23) Numa competição militar com 60 sargentos do CAP, 11 jogam


xadrez, 31 são homens ou jogam xadrez e 3 mulheres jogam
18) Numa cidade existem dois clubes A e B, que têm juntos 6000 xadrez. Calcule o número de homens que não jogam xadrez.
sócios. O clube A têm 4000 sócios e os dois clubes têm 500 sócios a) 20
comuns. Quantos sócios têm o clube B? b) 26
a) 2300 c) 30
b) 2400 d) 32
c) 2500 e) 34
d) 2600
e) 2740

24) Numa O.M. Naval há n sargentos. Sabe-se que 56 sargentos


praticam natação, 21 praticam natação e judô, 106 praticam apenas
19) Numa pesquisa , verificou-se que, das pessoas consultadas, um dos dois esportes e 66 não praticam judô. O valor de n é:
100 liam o jornal A, 150 liam o jornal B, 20 liam os dois jornais (A e a) 146
B) e 110 não liam nenhum dos dois jornais. Quantas pessoas foram b) 148
consultadas? c) 152
a) 320 d) 156
b) 340 e) 158
c) 350
d) 360
e) 380

25) Numa pesquisa com marujos, foram feitas as seguintes


perguntas para que respondessem sim ou não: Gosta de navegar?
20) Numa pesquisa de mercado, verificou-se que 2000 pessoas Gosta de tirar serviço? Responderam sim à primeira pergunta 90
usam os produtos A ou B. O produto B é usado por 800 pessoas, e marujos; 70 responderam sim à segunda; 25 responderam sim a
320 pessoas usam os dois produtos ao mesmo tempo. Quantas ambas; e 40 responderam não a ambas. Quantos marujos foram
pessoas usam o produto A? entrevistados.
a) 1480 a) 170
b) 1500 b) 175
c) 1520 c) 180
d) 1540 d) 182
e) 1560 e) 186

55
26) Temos 400 militares numa corporação da Marinha, constatou- 32) Sendo A e B dois conjuntos quaisquer, determine x para que
se que: 160 deles são oficiais, 130 são homens e 50 são homens n(A) = x + 1, n(B) = 3 – x e n(A x B) = 3.
oficiais. O número de militares praças mulheres é: a) 0 ou 2
a) 150 b) 1 ou 3
b) 155 c) 2 ou 4
c) 160 d) 1 ou 4
d) 168 e) 2 ou 5
e) 170

27) Consultados 500 militares sobre as manobras de guerra a que


habitualmente participam obteve-se o seguinte resultado: 280 33) Um treinamento militar era constituído de dois exercícios. 300
militares participam da manobra A, 250 participam da manobra B e militares concluíram somente um dos exercícios, 260 concluíram o
70 participam de outras manobras distintas de A e B. O número de segundo, 100 militares concluíram os dois e 210 não concluíram o
militares que participam da manobra A e não participam da manobra primeiro. Quantos militares fizeram o treinamento.
B é: a) 380
a) 170 b) 400
b) 180 c) 430
c) 185 d) 450
d) 190 e) 460
e) 196

28) Uma pesquisa de mercado sobre o consumo de três marcas A,


B e C de um determinado produto apresentou os seguintes
resultados: A 48%, B 45%, C 50%, A e B 18%, A e C 15%, B e C
25% e nenhuma das três marcas 5%. Qual a porcentagem dos
entrevistados que consomem uma e apenas uma das três marcas?
a) 57%
b) 58% 34) Quantos elementos nós temos em: ( A  B) ( B  A) .
c) 60%
d) 61%
e) 62%

29) Numa O.M., 58% dos militares são do sexo masculino. Entre os
homens, 22% estão na O.M. há mais de cinco anos; entre as
mulheres, este percentual é de 27%. A porcentagem total de
militares da O.M. que lá servem há mais de cinco anos é de:
a) 21,8%
b) 22,6%
c) 23,7% a) 109
d) 24,1% b) 198
e) 25,4% c) 216
d) 262
e) 290

30) Um estudo de grupos sanguíneos humanos realizados com


1000 pessoas (sendo 600 homens e 400 mulheres) constatou que
470 pessoas tinham o antígeno A, 230 pessoas tinham o antígeno
B e 450 pessoas não tinham nenhum dos dois. Determine o número
de pessoas que têm os antígenos A e B simultaneamente.
a) 120
A  1,3, 4, 7,8 , B  2, 4, 6, 7
b) 130
c) 135 35) Dados os conjuntos e

C  2,3,5, 7,8 , então o conjunto  A  C   B é:


d) 140
e) 150

a) 1,3,5,8
31) A e B são conjuntos disjuntos. Se A’ e B’ são conjuntos
complementares em U (conjunto universo), então o complementar b) 2,3, 4, 6,8
de (B – A)  (A – A’) em U é:
a) A’ c) 3
b) B’
d) 3,8
c) (A  B)’
d) (A  B)’ e) 
e) A  B

56
36) Dado o conjunto A  1, , 1, 2 ,3, 3,1 podemos
40) O diagrama representa o conjunto

afirmar:
a)   A
b) 1, 2  3,1  A

c) 1, 2  A

d)  A
e) 1, 2  3,1  A

37) A e B são dois conjuntos tais que A – B tem 30 elementos,


A  B tem 10 elementos e A  B tem 48 elementos. Então, o
número de elementos de B – A é:
a) 22
b) 12
c) 10
d) 8
e) 18
41) Sejam A, B e C três conjuntos não disjuntos. Das figuras abaixo,
aquela cuja região sombreada representa o conjunto
( A  B)  C é:

38) Dados os conjuntos A  1,3, 4, 7,8 , B  2, 4, 6, 7 e


C  2,3,5, 7,8 , então o conjunto B   A  C  é:
a) 1,3,5,8
b) 2,3, 4, 6,8

c) 3

d) 2, 4, 6

e) 

39) A parte hachurada no gráfico, representa:

57
42) Numa turma de 35 alunos, 27 gostam de futebol, 16 de basquete 47) Num avião temos brasileiros, estrangeiros, fumantes e não
e 13 gostam dos dois. Quantos não gostam nem de futebol e nem fumantes. O total de passageiros é 50. 32 são brasileiros, 8 homens
de basquete? estrangeiros não fumantes, 25 fumantes, 10 mulheres brasileiras
a) 5 não fumantes, 2 homens estrangeiros fumantes, 12 mulheres
b) 6 brasileiras fumantes, 16 brasileiros fumantes. Determine quantos
c) 7 passageiros não fumantes tem no avião?
d) 8 a) 20
e) 9 b) 22
c) 25
d) 28
e) 30

43) Um programa de proteção e preservação de tartarugas


marinhas, observando dois tipos de contaminação dos animais,
constatou em um de seus postos de pesquisa, que: 88 tartarugas
apresentavam sinais de contaminação por óleo mineral, 35 não 48) Numa prova de 3 questões, 4 alunos erraram todas as questões;
apresentavam sinais de contaminação por radioatividade, 77 5 acertaram só a primeira; 6 acertaram só a segunda; 7 acertaram
apresentavam sinais de contaminação tanto por óleo mineral como só a terceira; 9 acertaram a primeira e a segunda; 10 acertaram a
por radioatividade e 43 apresentavam sinais de apenas um dos dois primeira e a terceira; 7 acertaram a segunda e a terceira e 6
tipos de contaminação. Quantas tartarugas foram observadas? acertaram todas as questões. Quantos alunos possui a turma?
a) 144 a) 36
b) 154 b) 38
c) 156 c) 40
d) 160 d) 42
e) 168 e) 45

49) Após uma briga de n malucos em um hospício, verificou-se que:


44) Num grupo de 54 pessoas, 20 usam óculos, 25 são homens e 8 - 50 malucos perderam os olhos
são mulheres que usam óculos. Calcule quantas mulheres não - 48 malucos perderam os braços
usam óculos. - 40 malucos perderam as pernas
a) 20 - 28 malucos perderam os olhos e os braços
b) 21 - 22 malucos perderam os olhos e as pernas
c) 22 - 24 malucos perderam os braços e as pernas
d) 23 - 10 malucos perderam braços, olhos e pernas
e) 24 Pergunta-se:
(1) Quantos malucos brigaram
(2) Quantos malucos perderam somente as pernas
(3) Quantos malucos tiveram pelo menos duas perdas

a) 74; 12; 18
b) 100; 4; 74
45) Consultados 500 militares sobre as manobras e guerra a que c) 74; 4; 54
habitualmente participam obteve-se o seguinte resultado: 280 d) 80; 54; 6
militares participam da manobra A, 250 participam da manobra B e e) 100; 2; 30
70 participam de outras manobras distintas de A e B. O número de
militares que participam da manobra A e não participam da manobra
B é:
a) 100
b) 150
c) 180
d) 200 50) Em uma pesquisa de mercado, foram entrevistadas várias
e) 210 pessoas acerca de suas preferências em relação a três produtos: A,
B e C. Os resultados da pesquisa indicaram que:
- 210 pessoas compram o produto A
- 210 pessoas compram o produto B
- 250 pessoas compram o produto C
- 100 pessoas não compram nenhum dos três produtos
- 60 pessoas compram os produtos A e B
46) Num seminário sobre as doenças relacionadas ao fumo - 70 pessoas compram os produtos A e C
reuniram-se 50 pessoas, 32 são fumantes, 10 são homens não - 50 pessoas compram os produtos B e C
fumantes e 20 são mulheres fumantes. Quantas mulheres não - 20 pessoas compram os três produtos
fumantes foram ao seminário. Quantas pessoas foram entrevistadas?
a) 6 a) 670
b) 8 b) 970
c) 9 c) 870
d) 10 d) 610
e) 12 e) 510

58
51) Em uma pequena cidade, todos os 200 habitantes masculinos 55) (ESAL) Foi consultado um certo número de pessoas sobre as
gostam de praticar pelo menos um dos três esportes: xadrez, futebol emissoras de TV que habitualmente assistem. Obteve-se o
e voleibol. Sabe-se que do total: resultado seguinte: 300 pessoas assistem ao canal A, 270 pessoas
- 100 gostam de xadrez assistem o canal B, das quais 150 assistem ambos os canais A e B
- 100 gostam de futebol e 80 assistem outros canais distintos de A e B. O número de
- 100 gostam de voleibol pessoas consultadas foi:
- 50 gostam de xadrez e futebol a) 800
- 50 gostam de futebol e voleibol b) 720
- 20 gostam de xadrez e voleibol c) 570
Quantos habitantes masculinos gostam de praticar futebol e voleibol d) 500
e não gostam de praticar xadrez? e) 600
a) 22
b) 24
c) 26
d) 28
e) 30

56) (UF – Uberlândia) Num grupo de estudantes, 80% estudam


Inglês, 40% estudam Francês e 10% não estudam nenhuma dessas
52) Considerando os conjuntos A  1, 2, 2 , B  2 , duas línguas. Nesse grupo, a porcentagem de alunos que estudam
ambas as línguas é:
C  ,3 e D  1, 2,3 , assinale a opção INCORRETA. a) 25%
b) 50%
a) 2  A
c) 15%
d) 33%
b) 2  A ` e) 30%

c)  C
d)   C
e) C  D

57) (VUNESP) Uma população utiliza 3 marcas diferentes de


detergente: A, B e C. Feita uma pesquisa de mercado colheram-se
os resultados tabelados abaixo:

53) O número de subconjuntos X que satisfazem à equação


1,3,5  X  1, 2,3, 4,5, 6 é:
a) 8
b) 10 Pode-se concluir que o número de pessoas que consomem ao
c) 12 menos duas marcas é:
d) 16 a) 99
e) 64 b) 94
c) 90
d) 84
e) 79

54) X e Y são dois conjuntos não vazios. O conjunto X possui 64


subconjuntos. O conjunto Y, por sua vez, possui 256 subconjuntos.
Sabe-se, também, que o conjunto Z  X  Y possui 2
58) (UNESP) Numa classe de 30 alunos, 16 alunos gostam de
elementos. Desse modo, conclui-se que o número de elementos do
Matemática e 20 de História. O número de alunos desta classe que
conjunto P  Y  X é igual a: gostam de Matemática e de História é:
a) 4 a) exatamente 16
b) 6 b) exatamente 10
c) 8 c) no máximo 6
d) 1 d) no mínimo 6
e) vazio e) exatamente 18

59
59) (AFA) Entrevistando 100 oficiais da AFA, descobriu-se que 20 64) (AFA) Em um grupo de n cadetes da Aeronáutica, 17 nadam, 19
deles pilotam a aeronave TUCANO, 40 pilotam o helicóptero jogam basquetebol, 21 jogam voleibol, 5 nadam e jogam
ESQUILO e 50 não são pilotos. Dos oficiais entrevistados, quantos basquetebol, 2 nadam e jogam voleibol, 5 jogam basquetebol e
pilotam o TUCANO e o ESQUILO? voleibol e 2 fazem os três esportes. Qual o valor de n, sabendo-se
a) 5 que todos os cadetes desse grupo praticam pelo menos um desses
b) 10 esportes?
c) 15 a) 31
d) 20 b) 37
e) 25 c) 47
d) 51
e) 60

60) Uma prova era constituída de dois problemas. 300 alunos


acertaram somente um dos problemas, 260 acertaram o segundo.
100 alunos acertaram os dois e 210 erraram o primeiro. Quantos
alunos fizeram a prova?
a) 300 65) (UF Pará) Uma escola tem 20 professores, dos quais 10
b) 350 ensinam Matemática, 9 ensinam Física, 7 Química e 4 ensinam
c) 400 Matemática e Física. Nenhum deles ensina Matemática e Química.
d) 450 Quantos professores ensinam Química e Física e quantos ensinam
e) 500 somente Física?
a) 3 e 2
b) 2 e 5
c) 2 e 3
d) 5 e 2
e) 3 e 4

61) (UF VIÇOSA) Dentre 100 leitores dos jornais A e B, 40 lêem o


jornal A e 70 lêem o jornal B. O percentual dos leitores que leem os
jornais A e B é:
a) 10%
b) 17%
c) 28%
d) 11%
e) 30% 66) Numa sociedade, existem 35 homens (que usam óculos ou
não), 18 pessoas que usam óculos, 15 mulheres que não usam
óculos e 7 homens que usam óculos. O número de pessoas que são
homens ou usam óculos é:
a) 42
b) 46
c) 50
d) 54
62) (CESGRANRIO) Em uma universidade são lidos dois jornais A e) 61
e B; exatamente 80% dos alunos leem o jornal A e 60% o jornal B.
Sabendo-se que todo aluno é leitor de pelo menos um dos jornais,
o percentual de alunos que leem ambos é:
a) 48%
b) 60%
c) 40%
d) 140%
e) 80%

67) (U.F. Ouro Preto) Numa sala de aula com 60 alunos, 11 jogam
xadrez, 31 são homens ou jogam xadrez e 3 mulheres jogam
63) Numa escola há n alunos. Sabe-se que 56 lêem o jornal A, 21 xadrez. Conclui-se portanto, que:
lêem os jornais A e B, 106 lêem apenas um dos dois jornais e 66 a) 31 são mulheres
não leem o jornal B. O valor de n é: b) 29 são homens
a) 127 c) 29 mulheres não jogam xadrez
b) 137 d) 23 homens não jogam xadrez
c) 158 e) 9 homens jogam xadrez
d) 183
e) 249

60
68) Feito exame de sangue em um grupo de 200 pessoas, 4) (QOAM - 2008) A e B são subconjuntos de U. Se A’ e B’ são os
constatou-se que: 80 delas tem sangue com fator Rh negativo, 65 seus respectivos complementares em U, então
tem sangue tipo O e 25 tem sangue tipo O com fator Rh negativo.
O número de pessoas, com sangue de tipo diferente de O e com  A  B    A  B ' é igual a:
fator Rh positivo é: a) A’
a) 40 b) B’
b) 65 c) A
c) 80 d) B
d) 120 e) A’ – B’
e) 135

5) (QOAM – 2009) Dados os conjuntos


QUESTÕES DO CONCURSO QOAM
A  B  C  1, 2,3, 4,5,, 6, 7,8,9,10 ,
1) (QOAM) Para cumprir pelo menos uma de duas missões, A e B, A  B  2,3,8 , A  C  2, 7 , B  C  2,5, 6 ,
A  B  1, 2,3, 4,5, 6, 7,8 . Qual é o conjunto C  B ?
80% das praças de uma determinada Base Naval se apresentaram
como voluntários. Se 60% desses voluntários querem cumprir a

7,9,10
missão A e 55% desses voluntários querem cumprir a missão B,
qual é o percentual das praças da referida Base Naval que são a)

b) 7,8,10
voluntários para ambas as missões A e B? a) 15%
b) 12%

c) 5, 7,8
c) 10%
d) 8%
e) 6%
d) 5, 7,9

e) 8,9,10

2) (QOAM - 2006) De um certo grupo de 180 Oficiais da Marinha do 6) (QOAM - 2010) Um banco promoveu uma seleção de pessoal
Brasil, 122 pertencem ao conjunto T dos Tenentes, 108 pertencem para o quadro de estagiários. Exigia-se que os candidatos fossem
ao conjunto A de Oficiais da Armada e 75 pertencem aos dois estudantes universitários. Concluída a seleção, foi feito um
conjuntos. Quantos são os Oficiais desse grupo que não pertencem levantamento sobre as carreiras que os estagiários selecionados
ao conjunto T nem ao conjunto A? estavam cursando. O levantamento apontou que:
a) 155
b) 100 I. 60% dos selecionados cursavam Economia ou Administração de
c) 75 Empresas;
d) 55 II. 30% dos selecionados cursavam Administração de Empresas;
e) 25 III. 25% dos selecionados que cursavam Economia também
cursavam Administração de Empresas.

De acordo com as informações apresentadas acima, é correto


afirmar que a porcentagem de selecionados que cursavam
Economia é igual a:
a) 10%
3) (QOAM – 2007) Sejam P e Q conjuntos que possuem um único b) 30%
elemento em comum. Se o número de subconjuntos de P é igual ao c) 37,5%
dobro do número de subconjuntos de Q, o número de elementos do d) 40%
e) 55%
conjunto P  Q é o:
a) Triplo do número de elementos de P
b) Triplo do número de elementos de Q
c) Quádruplo do número de elementos de P
d) Dobro do número de elementos de P
e) Dobro do número de elementos de Q

61
7) (QOAM – 2011) No intuito de conhecer suas preferências 11) (QOAM – 2016) Dados os conjuntos
alimentares, uma pesquisa foi feita junto à guarnição de um navio e ,
que estava prestes a iniciar viagem. A pesquisa apontou que os determine a soma de todos os inteiros pertencentes ao conjunto A
marinheiros que consomem carne de frango não consomem peixe. – B.
Apontou ainda que 40% consomem carne de frango, 30% a) 3
consomem peixe, 15% consomem carne de frango e carne bovina, b) 5
20% consomem carne bovina e peixe e 60% consomem carne c) 6
bovina. É correto concluir que a porcentagem de marinheiros que d) 8
não consome nenhum dos três alimentos é igual a: e) 9
a) 18%
b) 15%
c) 10%
d) 8%
e) 5%

12) (QOAM – 2017) Considere o conjunto dos números naturais


8) (QOAM – 2012) Um homem programou um passeio de barco com Considere, ainda, que
seus netos, num domingo de verão, por ilhas secundárias da Baía
de Guanabara. Ele selecionou, dentre as muitas existentes,
algumas ilhas que foram listadas formando o seguinte conjunto: I = Se o símbolo # representa a quantidade de elementos de um
(Ilha das Enxadas, Ilha da Conceição, Ilha de Brocoió, Ilha do Sol, conjunto, é correto afirmar que:
Ilha do Pinheiro). O objetivo do passeio era visitar o maior número
de ilhas possível do conjunto I, porém, dependendo de fatores a)
climáticos, isso podia não acontecer. O homem, então organizou um b)
número de roteiros levando em conta a possibilidade de visitação a
cinco ilhas, quatro ilhas, três ilhas, duas ilhas e apenas a uma ilha, c)
pois decidiu que, mesmo com tempo ruim, ao menos a uma ilha, ele d)
levaria os netos convidados. e)
Considerando os dados e que a ordem de visitação às ilhas não
diferencia os roteiros, quantos roteiros, foram organizados?
a) 28
b) 29
c) 30
d) 31
e) 32

9) (QOAM – 2014) Sejam A e B conjuntos não vazios tais que n(A GABARITO – QUESTÕES DE CONCURSOS
– B) = 3 e n(A) = k, logo o total de subconjuntos não vazios de
A  B é igual a:
a) 2 k 3 1 – e; 2 – d; 3 – e 4 – b 5 – d 6 – b 7 – e 8 – a 9
– e 10 – a 11 – d 12 – a 13 – a 14 – b 15 – e 16 –
b) 2 k 3  1 a 17 – b 18 – c 19 – b 20 – c 21 – b 22 – e 23 – a
24 – e 25 – b 26 – c 27 – b 28 – a 29 – d 30 – e 31
c) 2 k 1 – c 32 – a 33 – d 34 – d 35 – d 36 – d 37 – d 38 –
d) 2k 1  1 d 39 – a 40 – c 41 – a 42 – a 43 – a 44 – b 45 – c
46 – b 47 – c 48 – a 49 – c 50 – d 51 – e 52 – e 53
e) 2k  1 – a 54 – b 55 – d 56 – e 57 – d 58 – d 59 – b 60 –
d 61 – a 62 – c 63 – c 64 – c 65 – c 66 – b 67 – c
68 – c.

GABARITO – QUESTÕES DO CONCURSO QOAM


10) (QOAM – 2015) Seja N o número total de maneiras de escolher
pelo menos um brinquedo, de um total de 7 distintos, existentes em
1–b 2–e 3–e 4–c 5–a 6–d 7–e 8–d 9–
um parque de diversões. Pode-se afirmar que N é um número
b 10 – c 11 – e 12 – a.
natural:
a) par, formado por dois algarismos.
b) ímpar, formado por dois algarismos.
c) ímpar, formado por três algarismos.
d) par, formado por três algarismos.
e) ímpar, formado por um algarismo.

62
3) FUNÇÕES DOMÍNIO E IMAGEM DE UMA FUNÇÃO:
O domínio de uma função é sempre o próprio conjunto de partida,
O conceito de função é um dos mais importantes em toda a ou seja, D=A. Se um elemento x  A estiver associado a um
matemática. O conceito básico de função é o seguinte: toda vez que elemento y  B, dizemos que y é a imagem de x (indica-se y=f(x)
temos dois conjuntos e algum tipo de associação entre eles, que e lê-se “y é igual a f de x”).
faça corresponder a todo elemento do primeiro conjunto um único
elemento do segundo, ocorre uma função. Exemplo: se f é uma função de IN em IN (isto significa que o domínio
O uso de funções pode ser encontrado em diversos assuntos. Por e o contradomínio são os números naturais) definida por y=x+2.
exemplo, na tabela de preços de uma loja, a cada produto Então temos que:
corresponde um determinado preço. Outro exemplo seria o preço a  A imagem de 1 através de f é 3, ou seja, f(1)=1+2=3;
ser pago numa conta de luz, que depende da quantidade de energia  A imagem de 2 através de f é 4, ou seja, f(2)=2+2=4;
consumida.
Observe, por exemplo, o diagrama das relações abaixo: De modo geral, a imagem de x através de f é x+2, ou seja: f(x)=x+2.
Numa função f de A em B, os elementos de B que são imagens dos
elementos de A através da aplicação de f formam o conjunto
imagem de f.

Com base nos diagramas acima, concluímos que existem 2


condições para uma relação f seja uma função:

A relação acima não é uma função, pois existe o elemento 1 no


conjunto A, que não está associado a nenhum elemento do conjunto
B. Observações:
 Como x e y têm seus valores variando nos conjuntos A e
B, recebem o nome de variáveis.
 A variável x é chamada variável independente e a
variável y, variável dependente, pois para obter o valor
de y dependemos de um valor de x.
 Uma função f fica definida quando são dados seu domínio
(conjunto A), seu contradomínio (conjunto B) e a lei de
associação y=f(x).

OBTENÇÃO DO DOMÍNIO DE UMA FUNÇÃO:

A relação acima também não é uma função, pois existe o elemento O domínio é o subconjunto de IR no qual todas as operações
4 no conjunto A, que está associado a mais de um elemento do indicadas em y=f(x) são possíveis.
conjunto B. Vamos ver alguns exemplos:

Agora preste atenção no próximo exemplo:

A relação acima é uma função, pois todo elemento do conjunto A,


está associado a somente um elemento do conjunto B.

Agora o denominador: como 3-x está dentro da raiz devemos ter 3-


x  0, mas além disso ele também está no denominador, portanto
devemos ter 3-x  0. Juntando as duas condições devemos ter: 3-
x > 0, ou seja, x < 3 (condição 2).

63
Resolvendo o sistema formado pelas condições 1 e 2 temos:

Devemos considerar o intervalo que satisfaz as duas condições ao


mesmo tempo.
No gráfico acima temos: f(x1)=0, f(x2)=0 e f(x3)=0.
Portanto, D={x  IR | 2  x < 3}. Portanto x1, x2 e x3 são raízes da função.

CONSTRUÇÃO DO GRÁFICO CARTESIANO DE


UMA FUNÇÃO
FUNÇÃO CRESCENTE E FUNÇÃO
Para construir o gráfico de uma função f, basta atribuir valores do DECRESCENTE
domínio à variável x e, usando a sentença matemática que define a
função, calcular os correspondentes valores da variável y. Por
exemplo, vamos construir o gráfico da função definida por y=x/2.
Escolhemos alguns valores para o domínio. Por exemplo
D={2,4,6,8}, e agora calculamos os respectivos valores de y. Assim
temos:

Identificamos os pontos encontrados no plano cartesiano:

O gráfico da função será uma reta que passará pelos quatro pontos FUNÇÃO COMPOSTA
encontrados. Basta traçar a reta, e o gráfico estará construído.
Obs: para desenhar o gráfico de uma reta são necessários apenas
dois pontos. No exemplo acima escolhemos 4 pontos, mas bastaria
escolher dois elementos do domínio, encontrar suas imagens, e
logo após traçar a reta que passa por esses 2 pontos.

RAÍZES DE UMA FUNÇÃO


Dada uma função y=f(x), os valores, os valores de x para os quais
f(x)=0 são chamados raízes de uma função. No gráfico cartesiano
da função, as raízes são abscissas dos pontos onde o gráfico corta
o eixo horizontal.
Observe o gráfico abaixo:

64
Função bijetora: uma função é bijetora se ela é injetora e
sobrejetora. Por exemplo, a função f : A→B, tal que f(x) = 5x + 4.

Note que ela é injetora, pois x1≠x2 implica em f(x1) ≠f(x2)


É sobrejetora, pois para cada elemento em B existe pelos menos
um em A, tal que f(x)=y.

Função inversa: uma função será inversa se ela for bijetora. Se f :


A→B é considerada bijetora então ela admite inversa f : B→A. Por
exemplo, a função y = 3x-5 possui inversa y = (x+5)/3.

CLASSIFICAÇÃO DE FUNÇÕES

As funções possuem algumas propriedades que as caracterizam f :


A→B.

Função sobrejetora
Função injetora
Função bijetora
Função inversa

Função sobrejetora: uma função é sobrejetora se, e somente se,


o seu conjunto imagem for especificadamente igual ao
contradomínio, Im = B. Por exemplo, se temos uma função f : Z→Z
definida por y = x +1 ela é sobrejetora, pois Im = Z.

Podemos estabelecer a seguinte diagramação:

Função injetora: uma função é injetora se os elementos distintos


do domínio tiverem imagens distintas. Por exemplo, dada a função
f : A→B, tal que f(x) = 3x.

Note que a função possui relação de A→B e de B→A, então


podemos dizer que ela é inversa.

65
Definição
DETALHES PARA OBTER A FUNÇÃO INVERSA

Chama-se função polinomial do 1º grau, ou função afim, a


qualquer função f de IR em IR dada por uma lei da forma f(x) = ax +
b, onde a e b são números reais dados e a 0.

Na função f(x) = ax + b, o número a é chamado de coeficiente de x


e o número b é chamado termo constante.

Veja alguns exemplos de funções polinomiais do 1º grau:

f(x) = 5x - 3, onde a = 5 e b = - 3
f(x) = -2x - 7, onde a = -2 e b = - 7
f(x) = 11x, onde a = 11 e b = 0

Gráfico

O gráfico de uma função polinomial do 1º grau, y = ax + b, com


a 0, é uma reta oblíqua aos eixos Ox e Oy.

Exemplo:

Vamos construir o gráfico da função y = 3x - 1:


Como o gráfico é uma reta, basta obter dois de seus pontos e
ligá-los com o auxílio de uma régua:

a) Para x = 0, temos y = 3 · 0 - 1 = -1; portanto, um ponto é


(0, -1).

b) Para y = 0, temos 0 = 3x - 1; portanto, e outro

ponto é .

Marcamos os pontos (0, -1) e no plano cartesiano e


ligamos os dois com uma reta.

x y
0 -1

Já vimos que o gráfico da função afim y = ax + b é uma reta.


O coeficiente de x, a, é chamado coeficiente angular da reta e,
como veremos adiante, a está ligado à inclinação da reta em relação
ao eixo Ox.
4) FUNÇÃO AFIM (POLINOMIAL DO 1º
GRAU) O termo constante, b, é chamado coeficiente linear da reta. Para
x = 0, temos y = a · 0 + b = b. Assim, o coeficiente linear é a
ordenada do ponto em que a reta corta o eixo Oy.

66
Zero e Equação do 1º Grau Regra geral:

a função do 1º grau f(x) = ax + b é crescente quando o coeficiente


Chama-se zero ou raiz da função polinomial do 1º grau f(x) = ax
de x é positivo (a > 0);
+ b, a 0, o número real x tal que f(x) = 0. a função do 1º grau f(x) = ax + b é decrescente quando o coeficiente
de x é negativo (a < 0);
Temos:
Justificativa:

 para a > 0: se x1 < x2, então ax1 < ax2. Daí, ax1 + b < ax2 +
f(x) = 0 ax + b = 0 b, de onde vem f(x1) < f(x2).
 para a < 0: se x1 < x2, então ax1 > ax2. Daí, ax1 + b > ax2 +
Vejamos alguns exemplos: b, de onde vem f(x1) > f(x2).

1. Obtenção do zero da função f(x) = 2x - 5: Sinal


f(x) = 0 2x - 5 =
Estudar o sinal de uma qualquer y = f(x) é determinar os valor de
x para os quais y é positivo, os valores de x para os quais y é zero
0 e os valores de x para os quais y é negativo.
2. Cálculo da raiz da função g(x) = 3x + 6: Consideremos uma função afim y = f(x) = ax + b vamos estudar
g(x) = 0 3x + 6 =
0 x = -2
seu sinal. Já vimos que essa função se anula pra raiz .
3. Cálculo da abscissa do ponto em que o gráfico de h(x) = Há dois casos possíveis:
-2x + 10 corta o eixo das abicissas:
O ponto em que o gráfico corta o eixo dos x é aquele em
que h(x) = 0; então:
h(x) = 0 -2x + 10 = 0 x=5 1º) a > 0 (a função é crescente)

Crescimento e decrescimento
y>0 ax + b > 0 x>
Consideremos a função do 1º grau y = 3x - 1. Vamos atribuir
valores cada vez maiores a x e observar o que ocorre com y:

y<0 ax + b < 0 x<

x -3 -2 -1 0 1 2 3
y -10 -7 -4 -1 2 5 8 Conclusão: y é positivo para valores de x maiores que a raiz; y é
negativo para valores de x menores que a raiz

Notemos que, quando aumentos o valor de x, os


correspondentes
valores de y também aumentam. Dizemos, então que a
função y = 3x - 1 é crescente.
Observamos novamente seu gráfico:

67
2º) a < 0 (a função é decrescente) Gráfico

O gráfico de uma função polinomial do 2º grau, y = ax2 + bx + c,


y>0 ax + b > 0 x< com a 0, é uma curva chamada parábola.

Exemplo:

y<0 ax + b < 0 x> Vamos construir o gráfico da função y = x2 + x:


Primeiro atribuímos a x alguns valores, depois calculamos o valor
correspondente de y e, em seguida, ligamos os pontos assim
obtidos.

Conclusão: y é positivo para valores de x menores que a raiz; y


é negativo para valores de x maiores que a raiz.
x y
-3 6
-2 2
-1 0

0 0
1 2
2 6

Observação:

Ao construir o gráfico de uma função quadrática y = ax2 + bx + c,


notaremos sempre que:

 se a > 0, a parábola tem a concavidade voltada para


cima;
 se a < 0, a parábola tem a concavidade voltada para
baixo;
5) FUNÇÃO QUADRÁTICA (POLINOMIAL
DO 2º GRAU) Zero e Equação do 2º Grau

Chama-se zeros ou raízes da função polinomial do 2º grau f(x) =


ax2 + bx + c , a 0, os números reais x tais que f(x) = 0.

Definição Então as raízes da função f(x) = ax2 + bx + c são as soluções da


equação do 2º grau ax2 + bx + c = 0, as quais são dadas pela
Chama-se função quadrática, ou função polinomial do 2º grau, chamada fórmula de Bhaskara:
qualquer função f de IR em IR dada por uma lei da forma f(x) = ax2
+ bx + c, onde a, b e c são números reais e a 0.
Vejamos alguns exemplos de função quadráticas:

1. f(x) = 3x2 - 4x + 1, onde a = 3, b = - 4 e c = 1


2. f(x) = x2 -1, onde a = 1, b = 0 e c = -1
3. f(x) = 2x2 + 3x + 5, onde a = 2, b = 3 e c = 5 Temos:
4. f(x) = - x2 + 8x, onde a = -1, b = 8 e c = 0
5. f(x) = -4x2, onde a = - 4, b = 0 e c = 0

68
Observação Imagem
A quantidade de raízes reais de uma função quadrática depende
O conjunto-imagem Im da função y = ax2 + bx + c, a 0, é o
do valor obtido para o radicando , chamado conjunto dos valores que y pode assumir. Há duas possibilidades:
discriminante, a saber:
1ª - quando a > 0,
 quando é positivo, há duas raízes reais e distintas;
 quando é zero, há só uma raiz real (para ser mais
preciso, há duas raízes iguais);
 quando é negativo, não há raiz real.

Coordenadas do vértice da parábola a>0

Quando a > 0, a parábola tem concavidade voltada para cima e


um ponto de mínimo V; quando a < 0, a parábola tem concavidade
voltada para baixo e um ponto de máximo V.

Em qualquer caso, as coordenadas de V são . Veja


os gráficos:

2ª quando a < 0,

a<0

69
Construção da Parábola
quando a > 0
É possível construir o gráfico de uma função do 2º grau sem
montar a tabela de pares (x, y), mas seguindo apenas o roteiro de
observação seguinte: y>0 (x < x1 ou x > x2)
y<0 x1 < x < x2
1. O valor do coeficiente a define a concavidade da parábola;
2. Os zeros definem os pontos em que a parábola intercepta
o eixo dos x;

3. O vértice V indica o ponto de mínimo (se a


> 0), ou máximo (se a< 0);
4. A reta que passa por V e é paralela ao eixo dos y é o eixo
de simetria da parábola;
5. Para x = 0, temos y = a · 02 + b · 0 + c = c; então (0, c) é
o ponto em que a parábola corta o eixo dos y.

Sinal

Consideramos uma função quadrática y = f(x) = ax2 + bx + c e


determinemos os valores de x para os quais y é negativo e os
valores de x para os quais y é positivos.
Conforme o sinal do discriminante = b2 - 4ac, podemos
ocorrer os seguintes casos:

1º - >0
Nesse caso a função quadrática admite dois zeros reais distintos
(x1 x2). a parábola intercepta o eixo Ox em dois pontos e o sinal
da função é o indicado nos gráficos abaixo:
quando a < 0

y>0 x1 < x < x2


y<0 (x < x1 ou x > x2)

2º - =0

70
quando a > 0 quando a > 0

quando a < 0

quando a < 0

6) FUNÇÕES EXPONENCIAIS
Chamamos de equações exponenciais toda equação
na qual a incógnita aparece em expoente.

3º - <0
Exemplos de equações exponenciais:
1) 3x =81 (a solução é x=4)
2) 2x-5=16 (a solução é x=9)
3) 16x-42x-1-10=22x-1 (a solução é x=1)
4) 32x-1-3x-3x-1+1=0 (as soluções são x’=0 e x’’=1)

Para resolver equações exponenciais, devemos


realizar dois passos importantes:
1º) redução dos dois membros da equação a
potências de mesma base;
2º) aplicação da propriedade:

a  a  m  n (a  1 e a  0)
m n

EXERCÍCIOS RESOLVIDOS:

1) 3x=81
Resolução: Como 81=34, podemos escrever 3x = 34
E daí, x=4.

2) 9x = 1
Resolução: 9x = 1  9x = 90 ; logo x=0.
71
2) y=(1/2)x (nesse caso, a=1/2, logo 0<a<1)
3) 23x-1 = 322x Atribuindo alguns valores a x e calculando os
Resolução: 23x-1 = 322x  23x-1 = (25)2x  23x-1 = 210x ; correspondentes valores de y, obtemos a tabela e o gráfico
daí 3x-1=10, abaixo:
de onde x=-1/7.
x -2 -1 0 1 2
4) Resolva a equação 32x–6.3x–27=0. y 4 2 1 1/2 1/4
Resolução: vamos resolver esta equação através de
uma transformação:
32x–6.3x–27=0  (3x)2-6.3x–27=0
Fazendo 3x=y, obtemos:
y2-6y–27=0 ; aplicando Bhaskara encontramos  y’=-3
e y’’=9
Para achar o x, devemos voltar os valores para a
equação auxiliar 3x=y:
y’=-3  3x’ = -3  não existe x’, pois potência de
base positiva é positiva
y’’=9  3x’’ = 9  3x’’ = 32  x’’=2

Portanto a solução é x=2

FUNÇÃO EXPONENCIAL Nos dois exemplos, podemos observar que


a) o gráfico nunca intercepta o eixo horizontal; a função não
tem raízes;
Chamamos de funções exponenciais aquelas nas
b) o gráfico corta o eixo vertical no ponto (0,1);
quais temos a variável aparecendo em expoente.
c) os valores de y são sempre positivos (potência de base
A função f:IRIR+ definida por f(x)=ax, com a  IR+ e positiva é positiva), portanto o conjunto imagem é Im=IR+.
a1, é chamada função exponencial de base a. O
domínio dessa função é o conjunto IR (reais) e o
contradomínio é IR+ (reais positivos, maiores que zero). Além disso, podemos estabelecer o seguinte:
1) a > 1
GRÁFICO CARTESIANO DA FUNÇÃO EXPONENCIAL
Temos 2 casos a considerar:
 quando a>1;
 quando 0<a<1.

Acompanhe os exemplos seguintes:

1) y=2x (nesse caso, a=2, logo a>1)


Atribuindo alguns valores a x e calculando os
correspondentes valores de y, obtemos a tabela e o gráfico
f(x) é crescente e Im=IR+
abaixo:
Para quaisquer x1 e x2 do domínio:
x2>x1  y2>y1 (as desigualdades têm mesmo sentido)
x -2 -1 0 1 2
y 1/4 1/2 1 2 4 2) 0<a<1

f(x) é decrescente e Im=IR+


Para quaisquer x1 e x2 do domínio:
x2>x1  y2<y1 (as desigualdades têm sentidos diferentes)

72
7) FUNÇÕES LOGARÍTMICAS Nos dois exemplos, podemos observar que
d) o gráfico nunca intercepta o eixo vertical;
e) o gráfico corta o eixo horizontal no ponto (1,0). A raiz da
A função f:IR+IR definida por f(x)=logax, com a1 e a>0, função é x=1;
é chamada função logarítmica de base a. O domínio f) y assume todos os valores reais, portanto o conjunto
dessa função é o conjunto IR+ (reais positivos, maiores imagem é Im=IR.
que zero) e o contradomínio é IR (reais).

Além disso, podemos estabelecer o seguinte:


GRÁFICO CARTESIANO DA FUNÇÃO LOGARÍTMICA
1) a>1
Temos 2 casos a considerar:
 quando a>1;
 quando 0<a<1.

Acompanhe nos exemplos seguintes, a construção do


gráfico em cada caso:

3) y=log2x (nesse caso, a=2, logo a>1)


Atribuindo alguns valores a x e calculando os
correspondentes valores de y, obtemos a tabela e o gráfico
abaixo:

x 1/4 1/2 1 2 4
y -2 -1 0 1 2
f(x) é crescente e Im=IR
Para quaisquer x1 e x2 do domínio:
x2>x1  y2>y1 (as desigualdades têm mesmo sentido)

2) 0<a<1

4) y=log(1/2)x (nesse caso, a=1/2, logo 0<a<1)


Atribuindo alguns valores a x e calculando os
correspondentes valores de y, obtemos a tabela e o gráfico
abaixo:
f(x) é decrescente e Im=IR
x 1/4 1/2 1 2 4 Para quaisquer x1 e x2 do domínio:
x2>x1  y2<y1 (as desigualdades têm sentidos diferentes)
y 2 1 0 -1 -2
EQUAÇÕES LOGARÍTMICAS

Chamamos de equações logarítmicas toda equação


que envolve logaritmos com a incógnita aparecendo no
logaritmando, na base ou em ambos.

Exemplos de equações logarítmicas:


5) log3x =5 (a solução é x=243)
6) log(x2-1) = log 3 (as soluções são x’=-2 e x’’=2)
7) log2(x+3) + log2(x-3) = log27 (a solução é x=4)
8) logx+1(x2-x)=2 (a solução é x=-1/3)

73
Alguns exemplos resolvidos:
3) (INFO) A função f é tal que f(2x + 3) = 3x + 2. Nestas condições,
1) log3(x+5) = 2 f(3x + 2) é igual a:

a) 2x + 3
Resolução: condição de existência: x+5>0 => x>-5 b) 3x + 2
log3(x+5) = 2 => x+5 = 32 => x=9-5 => x=4 c) (2x + 3) / 2
d) (9x + 1) /2
Como x=4 satisfaz a condição de existência, então e) (9x - 1) / 3
o conjunto solução é S={4}.

2) log2(log4 x) = 1

4) (INFO) Sendo f e g duas funções tais que: f(x) = ax + b e g(x) =


Resolução: condição de existência: x>0 e log4x>0 cx + d . Podemos afirmar que a igualdade gof(x) = fog(x) ocorrerá
log2(log4 x) = 1 ; sabemos que 1 = log2(2), então se e somente se:
log2(log4x) = log2(2) => log4x = 2 => 42 = x => x=16
a) b(1 - c) = d(1 - a)
Como x=16 satisfaz as condições de existência, b) a(1 - b) = d(1 - c)
então o conjunto solução é S={16}. c) ab = cd
d) ad = bc
3) Resolva o sistema: e) a = bc

log x  log y  7

3. log x  2. log y  1
5) (INFO) O conjunto imagem da função y = 1 / (x - 1) é o conjunto:
Resolução: condições de existência: x>0 e y>0
a) R - { 1 }
Da primeira equação temos:
b) [0,2]
log x+log y=7 => log y = 7-log x c) R - {0}
Substituindo log y na segunda equação temos: d) [0,2)
e) (-1 ,2]
3.log x – 2.(7-log x)=1 => 3.log x-14+2.log x = 1 =>
5.log x = 15 =>
=> log x =3 => x=103
Substituindo x= 103 em log y = 7-log x temos: 6) (INFO) Dadas as proposições:
log y = 7- log 103 => log y = 7-3 => log y =4 => y=104. p: Existem funções que não são pares nem ímpares.
Como essas raízes satisfazem as condições de q: O gráfico de uma função par é uma curva simétrica em relação
existência, então o conjunto solução é S={(103;104)}. ao eixo dos y.
r: Toda função de A em B é uma relação de A em B.
s: A composição de funções é uma operação comutativa.
QUESTÕES DE CONCURSOS t: O gráfico cartesiano da função y = x / x é uma reta.

Podemos afirmar que são falsas:


1) Sejam f e g funções de R em R, sendo R o conjunto dos números
reais, dadas por f(x) = 2x - 3 e f(g(x)) = -4x + 1. Nestas condições, a) nenhuma
g(-1) é igual a: b) todas
c) p,q e r
a) -5 d) s e t
e) r, s e t
b) -4
c) 0
d) 4
e) 5 7) Dadas as funções f(x) = 4x + 5 e g(x) = 2x - 5k, ocorrerá gof(x) =
fog(x) se e somente se k for igual a:

a) -1/3
b) 1/3
c) 0
d) 1
2) (UFBA) Se f (g (x) ) = 5x - 2 e f (x) = 5x + 4 , então g(x) é igual a: e) -1

a) x - 2
8) Sendo f e g duas funções tais que fog(x) = 2x + 1 e g(x) = 2 - x
b) x - 6
c) x - 6/5 então f(x) é:
d) 5x - 2
e) 5x + 2 a) 2 - 2x
b) 3 - 3x
c) 2x - 5
d) 5 - 2x
e) uma função par.
74
9) (PUC-RS) Seja a função definida por f(x) = (2x - 3) / 5x. O
elemento do domínio de f que tem -2/5 como imagem é: 14) Se , então vale:

a) 0 a) 5/4
b) 3/2
b) 2/5
c) -3 c) 1/2
d) 3/4 d) 3/4
e) 4/3 e) 5/2

10) A função f é definida por f(x) = ax + b. Sabe-se que f(-1) = 3 e


f(3) = 1, então podemos 15) Funções bijetoras possuem função inversa porque elas são
invertíveis, mas devemos tomar cuidado com o domínio da nova
afirmar que f(1) é igual a:
função obtida. Identifique a alternativa que apresenta a função
inversa de f(x) = x + 3.
a) 2
b) -2
c) 0 a) f(x)-¹ = x – 3
d) 3 b) f(x)-¹ = x + 3
e) -3 c) f(x)-¹ = – x – 3
d) f(x)-¹ = – x + 3
e) f(x)-¹ = 3x

11) 24) A função f, definida por f(x) = - 3x + m, está representada


abaixo:
16) Sejam as funções reais dadas por f(x) = 5x + 1 e g(x) = 3x – 2.
Se m = f(n), então g(m), vale:

a) 15n + 1
b) 14n – 1
c) 3n – 2
d) 15n – 15
e) 14n – 2

f (2)  f (1)
Então o valor de é:
f (0) 17) Os valores de k de modo que o valor mínimo da função f(x) = x²
a) - 1 + (2k – 1)x + 1 seja – 3 são:
b) 0
c) 1 a) 5/2 e – 3/2
d) 7/5 b) 2/3 e 1/2
e) - 5/7 c) 3/2 e – 2
d) 1/3 e 3
e) 2/3 e 4
12) Seja a função

18) Seja a função definida por , tal que .


Então f(a + 1) – f(a) é igual a:

f (1) a) – 1
O valor da razão é: b) 0
f (3) c) 1
a) – 3/2 d) f(a)
b) – 1/2 e) f(a + 1)
c) 1/2
d) 3/2
e) 5
19) Se, para quaisquer valores de um conjunto S (contido no
13) Seja uma função f do 1º Grau. Se f(-1) = 3 e f(1) = 1, então o domínio D), com temos , então podemos afirmar
valor de f(3) é: que a função f é:

a) - 1 a) decrescente
b) - 3 b) crescente
c) 0 c) nula
d) 2 d) constante
e) 3 e) não é função
75
20) Dada a função definida por com 25) (Mackenzie – SP) As funções f(x) = 3–4x e g(x) = 3x+m são tais
que f(g(x)) = g(f(x)), qualquer que seja x real. O valor de m é:
determine os valores de a e b, sabendo-se que
e a) 9/4
b) 5/4
a) a = 2 e b = 1 c) – 6/5
b) a = 3 e b = 2 d) 9/5
c) a = 3 e b = 1 e) – 2/3
d) a = 1 e b = 2
e) a = - 2 e b = 3

26) (PUC – PR) Considere e .


Calcule f(g(x)) para x = 4:
21) Sejam f e g funções de sendo o conjunto dos
números reais. Sabendo que e a) 6
b) 8
então é igual a: c) 2
d) 1
a) – 2 e) 4
b) – 1
c) 0
d) 1
e) 2
27) Seja f: R+ → R dada por f(x) = √x e g: R → R+ dada por g(x) =
x² + 1. A função composta (g o f)(x) é dada

a) √x² + 1
b) x+1
22) O lucro de uma empresa é dado por uma lei c) √x² + 1
d) √x²
em que x é a quantidade vendida (em
e) x² + 1
milhares de unidades) e L é o lucro (em Reais). Qual o valor do lucro
máximo, em reais?

a) 7200
28) (UNICAMP 2016) Considere o gráfico da função y = f (x)
b) 7600
exibido na figura a seguir.
c) 8000
d) 8400
e) 9000

23) Seja a função f: R -> R, definida por , calcule


.

a) 7/2
b) 5/4
c) 3/2
d) 1
e) 2

24) Se f-1 é a função inversa de f, que vai de R em R, cuja lei de


formação f(x) = 2x – 10, o valor numérico de f -1(2) é: O gráfico da função inversa y = f −1(x) é dado por:
a) 1
b) 3
c) 6
d) -4
e) -6

76
a)

d)

b)

e) N.R.A

29) (Ufes) A função cujo gráfico está representado na figura 1 a


seguir tem inversa.

O gráfico de sua inversa é:

c)

77
30) (Unirio) 34) Uma estudante oferece serviços de tradução de textos em
língua inglesa. O preço a ser pago pela tradução inclui uma parcela
fixa de R$ 20,00 mais R$ 3,00 por pagina traduzida. Em
determinado dia, ela traduziu um texto e recebeu R$ 80,00 pelo
serviço. Calcule a quantidade de páginas que foi traduzida.

a) 18
b) 20
c) 22
d) 25
e) 30

35) O prefeito de uma cidade deseja construir uma rodovia para dar
acesso a outro município. Para isso, foi aberta uma licitação na qual
concorreram duas empresas. A primeira cobrou R$ 100.000,00 por
km construído (n), acrescidos de um valor fixo de R$ 350.000,00,
enquanto a segunda cobrou R$ 120.000,00 por km (n), acrescidos
Consideremos a função inversível f cujo o gráfico é visto acima. de um valor fixo de R$ 150.000,00. As duas empresas
apresentaram o mesmo padrão de quantidade de serviços
prestados, mas apenas uma delas poderá ser contratada.Do ponto
de vista econômico, qual equação possibilitará encontrar a extensão
da rodovia que tornaria indiferente para a prefeitura escolher
qualquer uma das propostas apresentadas?

a) 100n + 350 = 120n + 150


b) 100n + 150 = 120n + 350
c) 100(n + 350)=120(n + 150)
d) 100(n + 350.000)=120(n + 150.000)
e) 350(n + 100.000)=150(n + 120.000)

36) (UFSM –2005) Sabe-se que o preço a ser pago por uma corrida
31) (UEL) Sendo a função definida por , de taxi inclui uma parcela fixa, que é denominada bandeirada, e uma
então a expressão que define a função inversa de f é: parcela variável, que é função da distância percorrida. Se o preço
da bandeirada é de R$ 4,60 e o quilômetro rodado é R$ 0,96, a
distância percorrida pelo passageiro que pagou R$ 19,00 para ir de
sua casa ao shopping, é de:
a) 5 km
b) 10 km
c) 15 km
d) 20 km
e) 25 km

37) (UFLAVRAS –2000 alterada) Em relação à função f(x) = 3x + 2,


32) (UFV) Seja f a função real tal que f(2x – 9) = x para todo x assinale a alternativa INCORRETA:
real. A igualdade se verifica para c igual a:
a) f(4)-f(2) = 6
a) 9 b) O gráfico da f(x) é uma reta
b) 1 c) O gráfico de f(x) corta o eixo y no ponto (0,2);
c) 5 d) f(x) é uma função crescente
d) 3 e) a raíz da função é -3/2
e) 7

38) (FAAP –1997) A taxa de inscrição num clube de natação é de


R$ 150,00 para o curso de 12 semanas. Se uma pessoa se inscreve
33) (Ucs–2014) O salário mensal de um vendedor é de R$ 750,00 após o início do curso, a taxa é reduzida linearmente. Calcule
fixos mais 2,5% sobre o valor total em reais, das vendas que ele quanto uma pessoa pagou ao se inscrever 5 semanas após o início
efetuar durante o mês. Em um mês em que suas vendas totalizarem do curso.
x reais, o salário do vendedor será dado pela expressão:
a) R$ 62,50
a) 750 + 2,5x b) R$ 50,50
b) 750 + 0,25x c) R$ 74,50
c) 750,25x d) R$ 78,50
d) 750.(0,25x) e) R$ 87,50
e) 750 + 0,025x

78
39) (UFPI) A função real de variável real, definida por f (x) = (3 – Qual a medida da altura H, em metro, indicada na Figura 2?
2a).x + 2, é crescente quando:
a) 16/3
a) a > 0 b) 31/5
b) a < 3/2 c) 25/4
c) a = 3/2 d) 25/3
d) a > 3/2 e) 75/2
e) a < 3

40) (FGV) O gráfico da função f (x) = mx + n passa pelos pontos (– 44) (UNESP – 2017) Uma função quadrática f é dada por f(x) = x2 +
bx + c, com b e c reais. Se f(1) = –1 e f(2) – f(3) = 1, o menor valor
1, 3) e (2, 7). O valor de m é:
que f(x) pode assumir, quando x varia no conjunto dos números
reais, é igual a
a) 5/3
b) 4/3 a) –12.
c) 1 b) –6.
d) 3/4 c) –10.
e) 3/5 d) –5.
e) –9.

41) (UNIFOR) – A função f, do 1° grau, é definida por f(x) = 3x + k. 45) (UERJ – 2016) Observe a função f, definida por:
O valor de k para que o gráfico de f corte o eixo das ordenadas no
ponto de ordenada 5 é:

a) 2
Se f(x) ≥ 4, para todo número real x, o valor mínimo da função f é
b) 1
4.
c) 3
d) 4
Assim, o valor positivo do parâmetro k é:
e) 5
a) 5
b) 6
c) 10
d) 15
e) 20
42) Um táxi começa uma corrida com o taxímetro marcando R$
4,00. Cada quilômetro rodado custa R$1,50. Se ao final de uma
corrida, o passageiro pagou R$ 37,00, a quantidade de quilômetros
percorridos foi:
46) (UFSM – 2015) A água é essencial para a vida e está presente
a) 26
na constituição de todos os alimentos. Em regiões com escassez de
b) 11
c) 33
água, é comum a utilização de cisternas para a captação e
d) 22
e) 32
armazenamento da água da chuva. Ao esvaziar um tanque

contendo água da chuva, a expressão

43) (Enem – 2017) A igreja de São Francisco de Assis, obra


arquitetônica modernista de Oscar Niemeyer, localizada na Lagoa
da Pampulha, em Belo Horizonte, possui abóbadas parabólicas. A
representa o volume (em m3) de água presente no tanque no
seta na Figura 1 ilustra uma das abóbadas na entrada principal da
capela. A figura 2 fornece uma vista frontal desta abóbada, com
instante t (em minutos).
medidas hipotéticas para simplificar os cálculos.
Qual é o tempo, em horas, necessário para que o tanque seja

esvaziado?

a) 360.

b) 180.

c) 120.

d) 6.

e) 3.

79
47) (Enem – 2013) A parte interior de uma taça foi gerada pela 50) O esboço do gráfico quadrática y = 2x² - 8x + 6 é:
rotação de uma parábola em torno de um eixo z, conforme mostra
a figura. a)

b)

c)
A função real que expressa a parábola, no plano cartesiano da
figura, é dada pela lei f(x) = 3/2 x2 – 6x + C, onde C é a medida da
altura do líquido contido na taça, em centímetros. Sabe-se que o
ponto V, na figura, representa o vértice da parábola, localizado
sobre o eixo x. Nessas condições, a altura do líquido contido na
taça, em centímetros, é

a) 1.
b) 2. d)
c) 4.
d) 5.
e) 6.

48) Determine as raízes ou zeros da função quadrática f(x) = x² – 4x –

5. e) N.R.A

a) 2 e 3
b) 0 e 2
c) – 1 e 5
d) – 2 e 6
e) – 2 e 7 51) Qual a parábola abaixo que poderia representar uma função

quadrática com um .

49) (UfSCar–SP) Uma bola, ao ser chutada num tiro de meta por a)
um goleiro, numa partida de futebol, teve sua trajetória descrita pela
equação h(t) = – 2t² + 8t (t ≥ 0) , onde t é o tempo medido em
segundo e h(t) é a altura em metros da bola no instante t. Determine,
após o chute:
a) o instante em que a bola retornará ao solo.
b) a altura atingida pela bola.

a) 5 s e 7 m
b)
b) 4 s e 8 m

c) 6 s e 6 m

d) 4 s e 7 m

e) 5 s e 8 m

80
c) 53) Chutando-se uma bola para cima, notou-se que ela descrevia a

função quadrática h(x) = 48x – 8x², onde h é a altura em metros e

x o tempo em segundos depois do lançamento. Qual será a altura

máxima atingida pela bola?

a) 68 m

d) b) 72 m

c) 76 m

d) 78 m

e) 80 m

54) Um garoto ao lançar uma pedra para cima, observou que sua

e) N.R.A trajetória era dada pela função h(x) = - x² + 4x + 20, onde h é a

52) O esboço do gráfico da função y = - x² + 1 é: altura em metros e x o tempo em segundos. Qual será altura

a) máxima que esta pedra conseguiu atingir?

a) 16 m

b) 18 m

c) 20 m

d) 22 m

e) 24 m
b)

55) Uma bola de basquete é arremessada por um jogador para o

alto, percorrendo uma trajetória descrita h(x) = - 2x² + 12x, em que

h é a altura, em metros, e x o tempo, em segundos. Qual a altura

máxima atingida por esta bola?


c) a) 16 m

b) 18 m

c) 20 m

d) 22 m

e) 24 m

d)
56) Sabendo que 3x  32 x  8 , calcule o valor de 15  x 2 
a) 9
b) 10
c) 11
d) 12
e) 15

e) N.R.A
81
x2
1
 
x
 62) Determine o valor de a, tal que a ∈ R, de forma que a função
57) A solução da equação   27 pertence ao
 81  exponencial seja decrescente.
intervalo:
a) 0,1 a) 1 < a < 3
b) 2 < a < 5
b) 1, 2
c) 4 < a < 6
d) 6 < a < 8

c) 2,3
e) 9 < a < 10

d) 3, 4

e) 3, 4 63) (Enem 2015) O sindicato de trabalhadores de uma empresa


sugere que o piso salarial da classe seja de R$ 1 800,00, propondo
um aumento percentual fixo por cada ano dedicado ao trabalho. A
expressão que corresponde à proposta salarial (s), em função do
tempo de serviço (t), em anos, é s(t) = 1800·(1,03) t.
De acordo com a proposta do sindicato, o salário de um profissional
dessa empresa com 2 anos de tempo de serviço será, em reais,
58) (Mack – SP) Dadas as funções f(x) = 2 x² – 4 e g(x) = 4 x² – 2x, se
x satisfaz f(x) = g(x), então 2x é: a) 7.416,00
b) 3.819,24
a) ¼ c) 3.709,62
d) 3.708,00
b) 1
c) 8 e) 1909,62
d) 4
e) ½
64) (UNIT-SE). Uma determinada máquina industrial se deprecia de
tal forma que seu valor, t anos após a sua compra, é dado pela lei
abaixo, onde k é uma constante real. Se, após 10 anos, a máquina
estiver valendo R$ 12 000,00, determine o valor que ela foi
comprada.
59) Na função exponencial a seguir, calcule o valor de k. Considere
uma função crescente.
g(x) = (3k + 16)x a) 48000
b) 48500
a) k > - 5 c) 64000
b) k > - 2 d) 45900
c) k > 0 e) 84000
d) k < 3
e) k < 2

65) (UESPI 2007) Um botânico, após registrar o crescimento diário


de uma planta, verificou que o mesmo se dava de acordo com a
função abaixo, com t representando o número de dias contados a
60) Considerando que f(x) = 49x, determine o valor de f(1,5). partir do primeiro registro e f(t) a altura (em cm) da planta no dia t.
Nessas condições, é correto afirmar que o tempo necessário para
a) 81 que essa planta atinja a altura de 88,18 centímetros é:
b) 246
c) 343
d) 364
e) 385 a) 30 dias.
b) 40 dias.
c) 46 dias.
d) 50 dias.
e) 55 dias.

61) (UEMA) Seja f(x) = 3x-4 + 3x-3 + 3x-2 + 3x-1. O valor de x para que
se tenha f(x) = 40 é: 66) (U. E. FEIRA DE SANTANA - BA) O produto das soluções da
equação (43 - x)2 - x = 1 é:
a) 0 a) 0
b) -2 b) 1
c) 1 c) 4
d) 4 d) 5
e) 3 e) 6

82
67) (FIC / FACEM) A produção de uma indústria vem diminuindo 73) (EsSA – 2012) Se , com x real e maior que
ano a ano. Num certo ano, ela produziu mil unidades de seu
principal produto. A partir daí, a produção anual passou a seguir a zero, então o valor de é:
lei y = 1000. (0,9)x. O número de unidades produzidas no segundo
ano desse período recessivo foi de:
a)
a) 900
b) 1000 b)
c) 180
d) 810
e) 90 c)

d)
68) Um biólogo está estudando uma cultura de bactérias que se
reproduzem de formal exponencial. A lei de formação que descreve
a reprodução dessas bactérias é f(t) = Qi · 3t , em que Qi é a e)
quantidade inicial de bactérias e t é o tempo dado horas. Sabendo
que havia 200 bactérias em uma amostra, qual será a quantidade
de tempo necessária para que essa cultura tenha o total de 16.200
bactérias?

a) 2 horas
b) 3 horas
c) 4 horas
d) 5 horas 74) (EsSA – 2013) Os gráficos das funções reais e
e) 6 horas
possuem um único ponto em comum. O valor de c
é:
69) O valor de log 1 32  log10 10 é:
a) – 1/5
4 b) 0
a) – 3/2 c) 1/5
b) – 1 d) 1/15
c) 0 e) 1
d) 2
e) 13/2

70) Se log 2 2 512  x , então x vale:


a) 6 75) (EsSA – 2018) Sejam
b) 3/2
c) 9 , definidas por
d) 3
e) 2/3 , respectivamente. O valor de
é:

a) 0
71) O valor da expressão
b) 1
log0,04 125  log8 32  log1000 0,01 é: c) 2
d) 3
e) 4
a) – 3/10
b) – 3
c) 20/6
d) – 10/2
e) – 9/8

log3  x  4
72) Na equação y2 , y será igual a 8 quando x for 76) Seja uma função f:*+ R → R, definida por
igual a: , calcule f(2) e f(6).

a) 13 a) – 2 e 1
b) – 3 b) 0 e 2
c) – 1 c) 2 e 3
d) 5 d) 3 e 4
e) 23 e) 4 e 6

83
80) (UFF) A figura representa o gráfico da função f definida por
77) Seja f(x) = log2x, o valor do produto f(9) · f(8) · f(7) · … · f(3) ·
f(2) · f(1) é igual a:

a) 0
b) 9
c) 32
d) 64
e) 1024

78) (Ufsm 2012) Suponha que um campo de futebol seja colocado


em um sistema cartesiano ortogonal, conforme mostra a figura.

A medida do segmento PQ é igual a:

Para que o ponto tenha


abscissa e ordenada iguais, é necessário e suficiente que

a) x > -1. 81) (UFRRJ) O gráfico que melhor representa a função mostrada na
b) x = 5.
c) x < -1.
d) x = -5.
figura adiante, é:
e) x > 5.
a)
79) A representação

b)

c)

é da função dada por y = f(x) = logn (x). O valor de logn (n3+8) é:


d)
a) 2
b) 4
c) 6
d) 8
e) 10

e)

84
82) (UFSM) O gráfico mostra o comportamento da função 86) (U. E. FEIRA DE SANTANA – BA) O gráfico da função real f(x)
logarítmica na base a. Então o valor de a é: = x2 – 2:

a) intercepta o eixo dos x no ponto (1, 0);


b) intercepta o eixo dos x no ponto (0, 1);
c) intercepta o eixo dos x no ponto (2, 0);
d) intercepta o eixo dos x no ponto (0, -2);
e) não intercepta o eixo dos x.

87) (FIC / FACEM) A produção de uma indústria vem diminuindo


ano a ano. Num certo ano, ela produziu mil unidades de seu
principal produto. A partir daí, a produção anual passou a seguir a
a) 10 lei y = 1000.(0,9)x. O número de unidades produzidas no segundo
b) 2 ano desse período recessivo foi de:
c) 1
d) 1/2 a) 900
e) – 2 b) 1000
c) 180
d) 810
e) 90

83) (PucMG) Se então:

a) n < - 1
b) n > 3 88) O altímetro é o instrumento usado para medir alturas ou
c) – 1 < n < 0 altitudes. Trata-se de um instrumento básico exigido para todas as
d) 0 < n < 1 aeronaves a receber certificado. Ele mede a pressão atmosférica e
e) n > 2 apresenta-a como altitude.
Suponha que a altitude h acima do nível do mar, em quilômetros,
detectada pelo altímetro de um avião seja dada em função da
pressão atmosférica p , em atm, por A(p)  20  logp .
-1

84) (PucRS) Um aluno do Ensino Médio deve resolver a equação Num determinado instante, a pressão atmosférica medida pelo
com o uso da calculadora. Para que seu resultado seja altímetro era 0,8 atm. Considerando a aproximação log2  0,3 ,
obtido em um único passo, e aproxime-se o mais possível do valor qual a altitude h do avião nesse instante, em quilômetros?
procurado, sua calculadora deverá possuir a tecla que indique a
aplicação da função f definida por: a) 1 km
b) 2 km
c) 3km
d) 4 km
e) 5 km

89) Dado o gráfico a seguir:

85) (UERJ) O número, em centenas de indivíduos, de um


determinado grupo de animais, x dias após a liberação de um
predador no seu ambiente, é expresso pela seguinte função:

Após cinco dias da liberação do predador, o número de indivíduos


desse grupo presentes no ambiente será igual a:

a) 3
b) 4
c) 300
d) 400
e) 500

85
Pode-se afirmar que a lei de formação da função representada no
gráfico é:
93) (QOAM – 2021) Sabendo que log12 27  a , calcule

a) f ( x )  log 5 x log 6 16 e assinale a opção correta.

b) f ( x )  log 2 x
3 a
c) f ( x )  log 4 x a)
6a
d) f ( x )  log 1 x 8  4a
5 b)
3 a
e) f ( x )  log 1 x
2
8a
c)
6a
12  4a
d)
90) O altímetro dos aviões é um instrumento que mede a pressão 3 a
atmosférica e transforma esse resultado em altitude. Suponha que
a altitude h acima do nível do mar, em quilômetros, detectada pelo 3 a
e)
altímetro de um avião seja dada, em função da pressão 6a
atmosférica p, em atm, por
1
h( p )  20  log 10  
 p GABARITO – QUESTÕES DE CONCURSOS
Num determinado instante, a pressão atmosférica medida pelo
altímetro era 0,4 atm. Considerando a
1–d 2–c 3–d 4–a 5–a 6–d 7–a 8–d 9–d
aproximação log 10 2  0,3 , a altitude do avião nesse instante, 10 – a 11 – c 12 – d 13 – a 14 – a 15 – a 16 – a 17 – a
em quilômetros, era de: 18 – d 19 – b 20 – c 21 – d 22 – e 23 – a 24 – c 25 – c
26 – b 27 – b 28 – c 29 – d 30 – c 31 – c 32 – a 33 – e
a) 5 34 – b 35 – a 36 – c 37 – e 38 – e 39 – b 40 – b 41 – e
b) 8 42 – d 43 – d 44 – d 45 – a 46 – d 47 – e 48 – c 49 – b
50 – a 51 – d 52 – c 53 – b 54 – e 55 – b 56 – c 57 – b
c) 9
58 – d 59 – a 60 – c 61 – d 62 – e 63 – e 64 – a 65 – d
d) 11
66 – e 67 – d 68 – c 69 – b 70 – a 71 – b 72 – e 73 – d
e) 12 74 – d 75 – a 76 – c 77 – a 78 – b 79 – b 80 – b 81 – b
82 – d 83 – d 84 – e 85 – c 86 – a 87 – d 88 – b 89 – a
90 – b 91 – b 92 – c 93 – d.

91) Suponha que o número de peças produzidas por uma empresa


do polo industrial de Parnamirim é dado pela função
P(t)  1000.log 2 (3  t) onde t é o número de meses e P,
o número de peças produzidas, contados a partir do início do
funcionamento da empresa. O tempo necessário para que a
produção total dessa empresa seja o dobro do produzido no
primeiro mês de atividade é de

a) 1 ano e 3 meses.
b) 1 ano e 1 mês.
c) 1 mês.
d) 8 meses.
e) 9 meses.

92) (QOAM – 2021) Sejam a e b as soluções da equação


6.32 x  13.6x  6.22 x  0 . Assinale a opção que apresenta
a b .

a) 4
b) 3
c) 2
d) 1
e) 0

86
G
E
O
G
R
A
F
I
A
87
88
5. A LÓGICA DOS ESPAÇOS INDUSTRIAIS (continuação)
5.3 - Ciclos tecnológicos da Revolução Industrial (continuação)
5.3.8 - A indústria na era da globalização
No pós-guerra, os diversos avanços tecnológicos e a internacionalização da economia iniciaram a fase da Terceira
Revolução Industrial, Tecnológica ou Informacional.
Nas últimas décadas do século XX ocorreram também modificações na forma de produzir. O modelo fordista/taylorista
foi substituído pelo modelo toyotista. A capacidade de adaptação ou de flexibilização na produção (modelo toyotista) passou
a ser mais valorizada do que as divisões rígidas na produção (fordismo/taylorismo). A produção e os produtos fabricados
tornaram-se cada vez mais complexos, impondo a necessidade de integrar indústrias e laboratórios de pesquisa, o que levou
a tecnologia a ocupar um lugar cada vez mais importante na produção industrial.
Outra transformação significativa foi a criação e a ampliação da indústria de ponta, com a utilização de máquinas de
ajuste flexível, que permitem modificações rápidas no processo produtivo. Essas indústrias dependem de inovações
constantes e, portanto, de investimentos em pesquisas científicas e tecnológicas.
Beneficiando-se do progresso
nos transportes e nas comunicações,
a produção industrial espalhou-se por
vários continentes, permitindo separar
a concepção e a execução do
produto.
Com a globalização, a indústria
deixou de ter o espaço local e regional
como base, ultrapassando as
fronteiras nacionais. Componentes de
um produto podem ter origem em
países diferentes, pois as
corporações aproveitam as vantagens
comparativas das economias
nacionais. Qualquer desvantagem
pode acarretar a troca do fornecedor
ou mesmo a transferência de
unidades produtoras inteiras.
Estabeleceu-se uma nova
divisão de trabalho, a partir de uma
divisão territorial de indústrias. As
indústrias de ponta concentram-se
nos países centrais ou desenvolvidos.
As economias de maior avanço
tecnológico criam novos produtos e
investem na comercialização mundial
por meio de estratégias de marketing
(estudo dos mercados). Atuam no
cotidiano das pessoas, articulando
continentes inteiros com os mesmos
produtos e as mesmas imagens.
Atualmente, esse tipo de indústria é
em parte responsável pela
preponderância de um país sobre
outro.

5.4 - Desemprego
Se, por um lado, as inovações tecnológicas introduzidas nas indústrias aumentaram a produtividade, por outro lado,
reduziram os empregos, o que implica sérias questões sociais.
Enquanto os empregos, juntamente com as fábricas, foram transferidos para os países subdesenvolvidos, nos países
centrais parte da mão-de-obra passou a ser ocupada pelo setor terciário.
Lembre-se que as atividades econômicas geralmente são classificadas em três setores:
• setor primário – compreende a agricultura, a pecuária, a caça e o extrativismo;
• setor secundário – é composto pelas atividades industriais, em qualquer nível tecnológico;
• setor terciário ou de prestação de serviços – abrange o comércio, setor financeiro, setor público, educação, transportes,
em suma todas as atividades que normalmente ocorrem em áreas urbanas, com exceção das indústrias. Esse setor
complementa os dois primeiros, pois permite ou induz ao consumo de produtos e exerce papel fundamental na produtividade.
89
Atualmente, com o atual estágio tecnocientífico, tende-se a redividir os setores de atividade econômica em quatro,
incluindo o setor quaternário, que abrange a pesquisa de alto nível (biotecnologica, robótica, aeroespacial, etc).
Assim, as inovações tecnológicas do passado acabaram com alguns postos de trabalho, mas deram origem a outros,
em novos setores da economia.
Atualmente, as inovações tecnológicas têm provocado não só aumento de produtividade, mas também desemprego
em todos os grupos de países. Isso ocorre até mesmo no setor terciário, uma vez que a tecnologia da informação invade o
setor de serviços, automatizando bancos, telecomunicações, escritórios, comércio etc. Os computadores, além de diminuir
a participação humana, permitem produção programada e variada; a robotização reduz os custos na produção e permite
realizar atividades que envolvem riscos de segurança ou ocorrem em lugares de difícil acesso ao ser humano, como dutos
ou o fundo do mar (instalação de equipamentos).
Esse processo provoca o desemprego estrutural, que afasta do mercado de trabalho grande massa de população
durante períodos mais ou menos prolongados, atingindo principalmente jovens (dificuldade de acesso ao primeiro emprego)
e trabalhadores de pouca qualificação técnica.

5.5 - Países pioneiros no processo de industrialização - Cenários Regionais


Entre os países pioneiros no processo de industrialização encontram-se o Reino Unido, a França, a Bélgica e os
Estados Unidos. Neste capítulo estudaremos o precursor de todos (Reino Unido) e a atual maior potência econômica mundial
(Estados Unidos).
O Reino Unido foi o primeiro país do mundo a se industrializar, entretanto, com o tempo seu PIB foi ultrapassado por
países que iniciaram o processo de industrialização posteriormente. Por que, embora tenha sido o pioneiro, não conseguiu
acompanhar o ritmo de crescimento econômico de seus concorrentes?
Os Estados Unidos iniciaram seu processo de industrialização na primeira metade do século XIX, um pouco depois
de sua ex-metrópole. Hoje o país é a maior potência do mundo, não só do ponto de vista econômico como também científico-
tecnológico e geopolítico-militar. Vem perdendo poder relativo no mundo, que se consolida como multipolar. Como começou
a supremacia norte-americana, que ainda se mantém no início deste século?

5.5.1 - REINO UNIDO DA GRÃ BRETANHA E IRLANDA DO NORTE


O processo de industrialização
O Reino Unido, muitas vezes chamado de Grã-Bretanha (leia o texto abaixo para entender a diferença), foi o primeiro
país a reunir as condições necessárias para o início do processo de industrialização porque foi um dos que mais acumulou
capitais durante o período do capitalismo comercial. Mas disponibilidade de capitais para investir na produção não foi o único
fator importante no processo de industrialização. Além dos econômicos, é preciso considerar também os fatores políticos,
sociais, tecnológicos e naturais, que serão analisados na sequência.
Foi na Inglaterra que ocorreu a primeira revolução burguesa da História, chamada Revolução Gloriosa. Ela terminou
em 1688, com a deposição do rei absolutista Jaime II e a ascensão ao poder do príncipe holandês Guilherme de Orange e
sua esposa Maria Stuart (filha mais velha de Jaime II). Coroados rei Guilherme III e rainha Maria II, assinaram a Declaração
dos Direitos (1689), que limitava o poder político da monarquia, transferindo-o para o parlamento – no qual a burguesia
estava fortemente representada e podia, desse modo, participar das decisões políticas do país. A Inglaterra tornou-se, assim,
a primeira monarquia parlamentar do mundo, fator político que foi essencial para a eclosão da Revolução Industrial, quase
um século mais tarde.
Antes mesmo da Revolução Gloriosa, para estimular as trocas comerciais, o Estado britânico já vinha tomando uma
série de medidas, como os Atos de Navegação, que impunham a exclusividade do comércio externo do país a navios
britânicos. Ancorado em medidas protecionistas e em poderosa frota naval, o Reino Unido tornou-se a maior potência
mercantil do mundo na fase final do capitalismo comercial. Os capitais acumulados nesse período foram gradativamente
investidos na ampliação da rede de ferrovias e hidrovias, na extração de carvão e na instalação de indústrias, fatores que,
conjugados, permitiram grandes avanços técnicos nas indústrias têxteis, siderúrgicas e navais, ramos mais importantes da
Primeira Revolução Industrial.
O Reino Unido ainda tinha a vantagem de dispor de grandes reservas de carvão mineral, fonte de energia que
possibilitou a disseminação do uso das máquinas a vapor, inicialmente na indústria têxtil e mais tarde nos demais ramos
industriais.
As principais condições econômicas e políticas para a Revolução Industrial no Reino Unido foram sendo criadas ao
longo da História: acúmulo de capitais, disponibilidade de matérias-primas e de energia, avanços técnicos e o controle do
Estado pela burguesia. Faltava, porém, a força de trabalho.
Com as Leis dos Cercamentos, nas últimas décadas do século XVII, as terras – que em grande parte eram comunais,
ou seja, apesar de pertencerem à nobreza eram cultivadas pelos camponeses – foram cercadas. Com isso, as atividades
agrícolas, muitas delas de subsistência, foram em grande parte substituídas por atividades pecuárias, particularmente a
criação de carneiros, realizada por grandes proprietários, para fornecer lã à indústria têxtil que estava se desenvolvendo. Os
camponeses, que foram gradualmente expulsos das terras, se deslocaram para as cidades à procura de trabalho.
Essa massa de trabalhadores rurais converteu-se na mão de obra barata e superexplorada da nascente indústria
britânica. A partir de então, começou de fato a se estabelecer uma relação capitalista de produção baseada no trabalho
assalariado e na exploração dos operários, o que proporcionou lucros crescentes aos industriais.
90
Recursos naturais e localização industrial
A localização das primeiras indústrias ocorreu próximo aos portos e às jazidas de carvão, principalmente no centro da
Grã-Bretanha, onde ficavam as maiores reservas desse combustível fóssil. Por esse motivo, houve grande industrialização
nas proximidades de Yorkshire, Lancashire e Midlands (Inglaterra), Lowlands (Escócia) e no País de Gales, provocando
drásticas transformações nas paisagens, que passaram a ser conhecidas como “regiões negras”.
No centro da ilha foram construídas usinas siderúrgicas, o que viabilizou a produção de locomotivas e navios movidos
a vapor. As indústrias de material ferroviário e naval localizavam-se em torno das siderúrgicas, que, por sua vez, estavam
perto do carvão, o qual também atraiu a indústria têxtil. Isso explica o grande dinamismo das regiões carboníferas britânicas
durante a Primeira Revolução Industrial. Porém, as mudanças futuras no padrão tecnológico e energético levaram as “regiões
negras” e suas indústrias pioneiras à decadência.
Outro fator essencial de atração das indústrias foi a existência de portos marítimos e fluviais. Muitas cidades portuárias
desenvolveram um importante parque industrial, como Liverpool, Glasgow e principalmente a capital, Londres. O maior
centro industrial no Reino Unido sempre foi a região metropolitana da capital, em razão de seu poder de polarização sobre
o território britânico (nacional e colonial). Inicialmente, as indústrias menos dependentes de matérias-primas aí se localizaram
por causa da disponibilidade de mão de obra, de mercado consumidor e de rede de transportes. Durante a Primeira
Revolução Industrial, Londres, que já era o maior porto e centro comercial e financeiro britânico, tornou-se também o maior
entroncamento ferroviário, aumentando sua capacidade de polarização.
Posteriormente, na Segunda Revolução Industrial, muitas indústrias que não dependiam do carvão – automobilísticas,
aeronáuticas, químicas, elétricas, mecânicas, farmacêuticas etc. – foram se instalando em torno da metrópole, ampliando
sua importância. A partir daí, essa região metropolitana se converteu no maior entroncamento rodoviário do país e numa das
maiores confluências de rotas aéreas do mundo. Esses fatores explicam o fato de Londres ter se transformado numa das
mais importantes cidades globais da atualidade.
Por sua posição estratégica, outra cidade que se beneficiou bastante dessa nova tendência foi Birmingham, que,
depois de Londres, era o principal centro industrial britânico, polarizando uma série de cidades e com um parque industrial
bastante diversificado.
No contexto da atual revolução tecnológica, a reorganização das indústrias britânicas atinge o país de forma bastante
desigual: setorial e regionalmente. Há setores que entraram em decadência, como a indústria têxtil, a siderúrgica e a naval,
outrora as maiores do mundo e associadas às antigas bacias carboníferas. Mas há setores bastante dinâmicos, como o de
material bélico, o aeronáutico, o automobilístico, o químico-farmacêutico, o petroquímico (graças ao petróleo explorado no
mar do Norte) e o de biotecnologia. Essas novas e modernas indústrias em geral estão localizadas nas pequenas cidades
do centro-sul da Inglaterra, onde se destaca o importante parque tecnológico de Cambridge, com suas empresas de alta
tecnologia.
Cambridge é uma antiga cidade universitária, localizada a cerca de 80 quilômetros a noroeste de Londres. Em torno
da Universidade de Cambridge começou a ser implantado, na década de 1970, um parque tecnológico concentrando
empresas de setores típicos da Terceira Revolução Industrial, como os de informática e biotecnologia, entre outros.
A cidade contou com fatores muito semelhantes aos do Vale do Silício (Estados Unidos): centros de pesquisa de
renome, mão de obra com alto nível de qualificação, disponibilidade de capitais de risco e desenvolvimento de empresas
inovadoras. Há outros polos de alta tecnologia no Reino Unido, como na região oeste de Londres, conhecida como Corredor
Oeste ou Corredor M4. Observe no mapa da página anterior a distribuição das principais indústrias no Reino Unido. A
produção de carvão no Reino Unido caiu sensivelmente (a maioria das minas se esgotou) e seu consumo foi substituído por
gás natural, petróleo e eletricidade. Embora o país seja produtor de petróleo, sua produção (1,1 milhão de barris/dia em
2011, vigésimo produtor mundial) não é suficiente para abastecer o consumo interno, havendo necessidade de importação,
sobretudo da Noruega. O país também é importador de gás natural, combustível cujo consumo foi o que mais aumentou no
país, especialmente para a produção de eletricidade em termelétricas. Cresceu também a produção de energia em usinas
termonucleares.
Nas regiões carboníferas, são visíveis a desindustrialização, o desemprego e o empobrecimento, principalmente no
centro da Grã-Bretanha, em cidades como Liverpool, Manchester e Sheffield. Desde a década de 1970, com o fechamento
de diversas fábricas, essa região converteu-se em zona de repulsão populacional. O empobrecimento de parte da população
britânica aumentou nos anos 1980, época em que também ocorreu maior concentração de renda nas mãos de sua elite, em
prejuízo do restante da sociedade. Essa situação resultou da perda de competitividade do país diante do aumento da
concorrência em uma economia globalizada.
O Reino Unido enfrentava, de um lado, a concorrência de economias mais competitivas, ancoradas em sistemas de
produção flexível como a japonesa e a coreana, e, de outro, economias emergentes, ancoradas em mão de obra barata,
como a China, a Índia e outros países asiáticos. A gestão da primeira-ministra Margaret Tatcher (1979-1990), do Partido
Conservador, foi marcada por políticas neoliberais que visavam reduzir o papel do Estado na economia e aumentar a
competitividade das empresas britânicas.
Nesse processo muitas empresas estatais foram privatizadas, entre as quais a BP – British Petroleum (petrolífera).
Essas privatizações reduziram a contribuição das estatais para o PIB britânico de 9%, em 1979, para 3,5%, em 1990. A BP
é a maior corporação do Reino Unido e a quarta do mundo (é a terceira no setor de petróleo), de acordo com a Fortune
Global 500 2012. Entre as grandes corporações britânicas, ainda se destacam a Vodafone (telecomunicações), Rio Tinto
91
(mineração), a BAE Systems (aeroespacial e material bélico), a GlaxoSmithKline e Astra Zeneca (farmacêuticas), todas entre
as quinhentas maiores empresas do mundo.
A implantação de políticas neoliberais teve como efeitos colaterais o enfraquecimento do estado de bem-estar e,
durante o governo Thatcher, o aumento da concentração de renda. No fim dos anos 1990, como mostra a tabela a seguir,
apesar de ter havido um pequeno aumento da participação dos estratos mais pobres na distribuição da renda, a participação
dos 10% mais ricos continuou aumentando, em detrimento da classe média.
A política econômica do governo Tatcher atingiu seus objetivos: reduziu o papel do Estado na economia, o deficit
público e os custos de produção das empresas e aumentou a competitividade britânica no mundo globalizado, tanto que de
modo geral foi mantida por seus sucessores, mesmo os do Partido Trabalhista. Entretanto, para isso houve um custo social
e a consequente redução de conquistas trabalhistas, o que levou a enfrentamentos com os sindicatos de várias categorias,
especialmente os do setor de mineração, cuja greve durou um ano. O governo venceu essa queda de braço e, com o tempo,
diversas minas foram fechadas.
A partir dessa greve emblemática, pois atingiu um setor outrora estratégico no país, os sindicatos em geral se
enfraqueceram. O gráfico ao lado mostra que, alguns anos após o fim do governo conservador, o Reino Unido era, entre os
principais países desenvolvidos, aquele no qual os trabalhadores tinham um dos menores salários diretos e os menores
benefícios sociais e previdenciários.
Em 2010, a situação não mudou; apesar da elevação salarial, os trabalhadores industriais do Reino Unido
permanecem entre os de menor remuneração (salário + benefícios) entre os dos principais países desenvolvidos.
A potência pioneira perde poder
Embora o Reino Unido tenha crescido economicamente após a Segunda Guerra Mundial, não acompanhou o ritmo
de crescimento de outras potências econômicas como Estados Unidos, Japão e Alemanha, se considerados os avanços
tecnológicos e os ganhos de produtividade; consequentemente, foi perdendo posições no cenário internacional.
Observe na tabela a seguir o crescimento do PIB do Reino Unido no pós-Segunda Guerra e o compare com o dos
concorrentes. Perceba que até 1980 a economia britânica cresceu bem menos que as de seus competidores. No período
1981-2010 o crescimento do PIB britânico acumulou uma taxa média de 2,7% ao ano, superando dois de seus principais
concorrentes (o Japão cresceu em média 2,0%, e a Alemanha, 1,6%); ficou atrás apenas dos Estados Unidos, que cresceram
2,8% (no mesmo período, a China cresceu a taxas superiores a 10% ao ano).
Considerando o tamanho do PIB, a economia britânica foi ultrapassada pelo Japão e pela Alemanha após a Segunda
Guerra; antes disso, já tinha sido superada pelos Estados Unidos (após a Primeira Guerra Mundial), e, mais recentemente,
também pela China e França. Assim, o Reino Unido, que já foi a maior potência industrial do planeta, em 2011 era o sétimo
PIB mundial (quando foi ultrapassado também pelo Brasil), bem atrás das três maiores potências econômicas, principalmente
da maior delas, sua ex-colônia.
Apesar de permanecer entre as sete maiores economias mundiais, o Reino Unido já não dispõe do poder que deteve
no passado. Não está mais na liderança dos principais avanços tecnológicos e já não tem mais poder econômico e militar
para exercer influência planetária de forma isolada, como fez desde o fim do século XVIII até o começo do século XX. No
entanto, o país ainda mantém certo status de potência mundial porque o governo britânico tem atrelado sua política externa
à dos Estados Unidos, apoiando incondicionalmente as decisõestomadas em Washington. Isso ficou evidente na guerra
empreendida contra Saddam Hussein em 2003, na qual o então primeiro-ministro britânico Tony Blair, contrariando a maioria
da população britânica, apoiou política e militarmente (também enviou tropas) a invasão do Iraque pelas forças armadas dos
Estados Unidos.

5.5.2 - OS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA


O território que hoje pertence aos Estados Unidos da América foi colonizado por britânicos, franceses e espanhóis; no
entanto, foram os britânicos que se tornaram hegemônicos e mais influenciaram a formação da sociedade norte-americana.
A primeira colônia inglesa foi fundada em 1607 na Virgínia, na costa do oceano Atlântico, e ao longo do século XVII várias
outras foram fundadas, totalizando treze colônias, que constituíram o núcleo inicial do atual território.
Em 4 de julho de 1776, representantes de todas as colônias originais promulgaram na Filadélfia a Declaração de
Independência dos Estados Unidos da América, documento fundador dessa nação. A separação só foi reconhecida pelos
ingleses ao final da Guerra de Independência (1775-1783), com a assinatura do Tratado de Versalhes. Após a
independência, iniciou-se um processo de expansão para o oeste, marcado por guerras contra os mexicanos e os povos
indígenas, até então os habitantes dessa região, e o território norte-americano passou a ter sua configuração atual (2012) –
composto de cinquenta estados, além do Distrito de Colúmbia, onde se localiza Washington, a capital do país.

Os fatores da industrialização
Quando o território do que viria a ser os Estados Unidos ainda pertencia ao Reino Unido, recebeu um grande fluxo de
imigrantes britânicos, principalmente nas colônias do Norte. Esses imigrantes, fugindo de perseguições políticas e religiosas
ou em busca de melhores condições de vida do que as da Europa, foram se fixando na faixa litorânea, num trecho conhecido
como Nova Inglaterra. Aí desenvolviam uma agricultura diversificada (policultura) em pequenas propriedades, nas quais
predominava o trabalho familiar.
Cidades como Nova York, Boston e Filadélfia começavam a surgir e crescer em ritmo acelerado, e teve início uma
atividade manufatureira, pois vários imigrantes que eram artesãos na Inglaterra, Escócia e Irlanda trouxeram consigo suas
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habilidades e ferramentas. Gradativamente, foi se estruturando um mercado interno, com o predomínio do trabalho familiar
no campo e do trabalho assalariado nas cidades. Isso criou condições para a crescente expansão das manufaturas, das
casas de comércio e dos bancos.
Assim, nas colônias do Norte, organizou-se uma colonização de povoamento, enquanto nas do Sul imperava a
colonização de exploração, estruturada sobre uma sociedade rigidamente estratificada e na exploração do trabalho escravo.
A economia sulista era baseada em plantations: grandes propriedades monocultoras nas quais se cultivava principalmente
o algodão e se utilizava trabalho escravo de povos negros trazidos à força da África central. Praticamente toda a produção
era exportada para o Reino Unido. A riqueza estava fortemente concentrada nas mãos dos fazendeiros escravagistas (a que
permanecia no país) e dos comerciantes britânicos, de forma que o mercado interno prosperava muito lentamente.
Já nas colônias do Norte os negócios se expandiam com rapidez e os capitais se concentravam nas mãos da burguesia
nascente. Com o tempo, os capitalistas e outros setores da sociedade nortista desenvolveram interesses próprios que
passaram a se chocar com os dos britânicos. O resultado desse conflito de interesses, como vimos, levou a uma guerra
entre a colônia e a metrópole e à independência política, que fez dos Estados Unidos o primeiro país livre da América.
Com isso surge uma dúvida: por que o Reino Unido não manteve um controle mais rígido sobre as treze colônias, já
que foi justamente nessa região que nasceram o separatismo e a industrialização? Esses fatos contrariavam os interesses
britânicos: o separatismo significava a perda de colônias, além de criar um perigoso precedente, e a industrialização, uma
incômoda concorrência. O jornalista uruguaio Eduardo Galeano deu uma boa resposta a essa questão:

A importância de não nascer importante


As treze colônias do Norte tiveram, pode-se bem dizer, a dita da desgraça. Sua experiência histórica mostrou a
tremenda importância de não nascer importante. Porque no norte da América não tinha ouro, nem prata, nem civilizações
indígenas com densas concentrações de população já organizada para o trabalho, nem solos tropicais de fertilidade fabulosa
na faixa costeira que os peregrinos ingleses colonizaram. A natureza tinha-se mostrado avara, e também a História: faltavam
metais e mão de obra escrava para arrancá-los do ventre da terra. Foi uma sorte. No resto, desde Maryland até Nova Escócia,
passando pela Nova Inglaterra, as colônias do Norte produziam, em virtude do clima e pelas características dos solos,
exatamente o mesmo que a agricultura britânica, ou seja, não ofereciam à metrópole uma produção complementar. Muito
diferente era a situação das Antilhas e das colônias ibéricas de terra firme. Das terras tropicais brotavam o açúcar, o algodão,
o anil, a terebintina; uma pequena ilha do Caribe era mais importante para a Inglaterra, do ponto de vista econômico, do que
as 13 colônias matrizes dos Estados Unidos. Essas circunstâncias explicam a ascensão e a consolidação dos Estados
Unidos como um sistema economicamente autônomo, que não drenava para fora a riqueza gerada em seu seio. Eram muito
frouxos os laços que atavam a colônia à metrópole; em Barbados ou Jamaica, em compensação, só se reinvestiam os
capitais indispensáveis para repor os escravos na medida em que se iam gastando. Não foram fatores raciais, como se vê,
os que decidiram o desenvolvimento de uns e o subdesenvolvimento de outros; as ilhas britânicas das Antilhas não tinham
nada de espanholas nem portuguesas. A verdade é que a insignificância econômica das 13 colônias permitiu a precoce
diversificação de suas manufaturas. A industrialização norte-americana contou, desde antes da independência, com
estímulos e proteções oficiais. A Inglaterra mostrava-se tolerante, ao mesmo tempo que proibia estritamente que suas ilhas
antilhanas fabricassem até mesmo um alfinete.
GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986. p. 146.

A maioria dos primeiros imigrantes era britânica, seguidores de religiões cristãs protestantes, principalmente puritanos
(como eram chamados os calvinistas, os seguidores de João Calvino, na Grã-Bretanha), que haviam rompido com a Igreja
católica a partir da Reforma Protestante empreendida por Calvino e outros teólogos no século XVI. As religiões protestantes
favoreciam o desenvolvimento capitalista, uma vez que não condenavam moralmente a riqueza. Ao contrário, pregavam que
a riqueza era bem-vinda porque era fruto do trabalho, de uma vida austera, que afastava o fiel do pecado e o aproximava da
salvação divina.
Embora o aspecto cultural não seja determinante, pois na Itália católica e no Japão xintoísta/budista o capitalismo
também floresceu, é indiscutível que o protestantismo criou condições culturais extremamente favoráveis ao
desenvolvimento de um espírito empreendedor e de uma ética do trabalho, importantíssimas para a acumulação de capitais.
Fatores de ordem natural também foram fundamentais no processo de industrialização dos Estados Unidos. O
nordeste do território, além de estar próximo do oceano – o que há muito vem facilitando os transportes marítimos e o
intercâmbio comercial –, possui grandes reservas de carvão nas bacias sedimentares próximas aos Apalaches, nos estados
da Pensilvânia e de Ohio, e importantes jazidas de minério de ferro nos escudos próximos ao lago Superior, nos estados de
Minnesota e de Wisconsin. Além disso, o país dispõe de grandes e diversificadas reservas minerais e energéticas. Veja no
mapa a seguir a distribuição das principais ocorrências minerais e a localização das principais refinarias de petróleo e usinas
geradoras de energia nos Estados Unidos.
A farta e bem distribuída rede hidrográfica foi outro fator natural que favoreceu o desenvolvimento dos Estados Unidos.
A existência, no nordeste do país, de extensos lagos com desníveis consideráveis possibilitou a construção de grandes
barragens e usinas hidrelétricas para geração de energia. Ao lado das turbinas hidráulicas foram edificadas eclusas, que
permitiram às embarcações transpor os desníveis e ampliar significativamente a rede de hidrovias, garantindo a
disponibilidade de infraestrutura de energia elétrica e de transportes para o desenvolvimento industrial. Os Grandes Lagos
(como são chamados) favoreceram imensamente os transportes: pouco a pouco, foram interligados por canais artificiais e
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eclusas que possibilitaram a ligação do interior do continente com o oceano Atlântico pelo rio São Lourenço, no Canadá, e
pelo Hudson, nos Estados Unidos. Esse rio alcança o lago Erie, por meio de um canal artificial, e desemboca no Atlântico,
onde fica o porto de Nova York.

A arrancada industrial
Após a independência, as diferenças econômicas, sociais e culturais entre a sociedade nortista, das colônias de
povoamento, e a sociedade sulista, das colônias de exploração, afloraram nitidamente e acabaram desencadeando um
conflito armado, na segunda metade do século XIX. As elites aristocráticas que comandavam os estados escravagistas do
Sul, em franca decadência política e econômica, na tentativa de manter o poder e a escravidão criaram os Estados
Confederados da América.
Com isso, esses estados declararam sua separação (secessão) da federação americana, dominada pelos capitalistas
industriais e financeiros do Norte. Essa atitude provocou a Guerra de Secessão, ou Guerra Civil Americana.

A vitória da burguesia nortista teve como resultado geopolítico mais importante a manutenção da unidade territorial do
país, que já se estendia do Atlântico ao Pacífico. Interessada em garantir a ocupação dos territórios tomados dos povos
nativos (à custa de um grande genocídio) e aumentar o mercado consumidor para os bens produzidos por suas indústrias,
a elite do Norte passou a estimular a imigração. Em 1862 foi elaborada a Lei Lincoln (Homestead Act), segundo a qual as
famílias que migrassem para o oeste do país receberiam 65 hectares de terra para se fixar e, caso permanecessem
cultivando-os por pelo menos cinco anos, ganhariam sua posse definitiva. Porém, embora essa lei tenha garantido a
ocupação das terras do oeste, principalmente os férteis solos das planícies centrais, o que mais contribuiu para atrair
imigrantes e ampliar o mercado interno do país foi a aceleração de seu processo de industrialização, sobretudo no final do
século XIX e início do XX: entre 1890 e 1929, mais de 22 milhões de imigrantes, especialmente europeus, se fixaram no país.
A crise de 1929, a depressão dos anos 1930 decorrente dela e a Segunda Guerra Mundial reduziram drasticamente a
entrada de pessoas no país nos anos 1930-1940, porém, o fluxo imigratório voltou a aumentar após a guerra e atingiu seu pico nos
anos 1990, década em que entrou no país quase o mesmo número de imigrantes que nos vinte anos anteriores. Entre 1850 e 2010
os Estados Unidos foram o país que mais recebeu imigrantes no mundo, com a fixação de mais de 74 milhões de pessoas em seu
território.
Outra medida que ampliou o mercado consumidor interno foi a decretação, em 1863, do fim da escravidão nos Estados
Unidos. A partir de então, foi-se disseminando o trabalho assalariado e, pouco a pouco, foi-se estruturando, pela primeira vez na
História, uma ampla sociedade de consumo, que se consolidou após a Primeira Guerra Mundial.

Nordeste: localização industrial e decadência recente


Apesar da desconcentração recente, que estudaremos a seguir, o Nordeste dos Estados Unidos ainda é a maior
região industrial do país e uma das maiores do mundo.
Como vimos, a primeira região do país a se industrializar foi o Nordeste, onde, durante muito tempo, determinados
setores se concentraram mais em algumas cidades que em outras, definindo as “capitais” do aço, do automóvel, etc.
As grandes siderúrgicas, como a United States Steel Corporation, a maior do país, localizada em Pittsburgh,
concentraram-se no estado da Pensilvânia po causa da disponibilidade de carvão, da facilidade de recepção do minério que
provém de Minnesota por meio dos Grandes Lagos e da proximidade dos centros consumidores. Apesar do fechamento de
fábricas e da transferência de usinas para outros lugares, Pittsburgh ainda é conhecida como a “capital do aço”.
A região metropolitana de Detroit, no estado de Michigan, foi o grande centro da indústria automobilística. Sua
localização numa posição central facilitou a recepção de matérias-primas e peças, além do posterior envio dos produtos
acabados (localize-a no mapa). Abrigando fábricas das “três grandes” montadoras – General Motors (GM), Ford e Chrysler
– e diversas fábricas de autopeças, a cidade tornou-se a “capital do automóvel”, mas atualmente sofre com a falência de
algumas indústrias e a saída de outras, que migram para regiões diversas em busca de menores custos de produção. Em
razão da elevação do custo da mão de obra, da má gestão praticada pelos seus administradores e da acirrada concorrência
de carros de outras marcas, especialmente japonesas e coreanas, as grandes montadoras americanas estão perdendo
competitividade, situação agravada pela crise financeira de 2008/2009.
A GM, que por décadas foi a maior montadora automobilística do mundo, pediu concordata em junho de 2009 e, para não
falir, foi encampada pelo governo norte-americano, que injetou 50 bilhões de dólares na empresa e passou a controlar 61% de
suas ações (o governo do Canadá ficou com 12%, o sindicato United Auto Workers, com 17%, e os credores, com 10%). Entretanto,
o plano do governo é se desfazer de suas ações depois de sanear a empresa, o que em 2012 ainda não tinha ocorrido. Naquele
mesmo ano, a Chrysler, para evitar a falência, teve parte de suas ações vendidas ao Grupo Fiat. A Ford, sediada em Dearborn
(Michigan), não enfrentou os mesmos problemas de suas concorrentes nacionais.
Em decorrência de seu enorme efeito multiplicador, a crise no setor automobilístico tem afetado diversos outros setores da
indústria norte-americana. Existe uma grande quantidade de indústrias complementares imprescindíveis ao funcionamento das
montadoras de automóveis: autopeças, plásticos, borrachas, vidros, equipamentos eletrônicos, etc. Essas indústrias, por sua vez,
necessitam de outros setores: siderúrgicas, metalúrgicas, petroquímicas, etc. Isso evidencia como a crise é grave. Detroit já não é
mais a “capital do automóvel” porque muitas de suas antigas fábricas de carros e autopeças fecharam as portas. A cidade e sua
região metropolitana estão enfrentando o desemprego crescente, o empobrecimento da população e a deterioração urbana. Muitos
de seus moradores gostariam de se mudar, mas a profunda desvalorização imobiliária dificulta a venda de suas casas e a compra
de uma nova em outro lugar.
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Diversos outros ramos industriais estão espalhados por inúmeras cidades do Nordeste dos Estados Unidos, a região de
maior concentração urbano-industrial do planeta. Ali, a História mostrou ser verdadeira a frase: “Indústria atrai indústria”. Surgiu,
assim, um grande cinturão industrial, o manufacturing belt, que se estende por várias cidades, como Chicago, Detroit, Cleveland e
Buffalo, às margens dos Grandes Lagos; Pittsburgh e Columbus, na região dos Apalaches; Boston, Nova York, Filadélfia e
Baltimore, na costa leste. Em virtude da crise de setores com forte presença na região, como o automobilístico e outros que
dependem muito dele, como o siderúrgico, e do consequente fechamento de inúmeras fábricas, muitos têm afirmado que essa
região deveria ser chamada de Rust Belt (cinturão da ferrugem) em razão da decadência industrial.

A desconcentração industrial
Está ocorrendo nos Estados Unidos, já há algumas décadas, um processo de desconcentração industrial. O cinturão
industrial (manufacturing belt) do Nordeste já chegou a concentrar, no início do século XX, mais de 75% da produção industrial dos
Estados Unidos. De lá para cá sua participação vem se reduzindo, e hoje ela é inferior a 50%. Como consequência do grande
crescimento de cidades do Nordeste, que se agruparam em gigantescas megalópoles como a que se estende de Boston a
Washington (conhecida como Boswash), passando por Nova York, tem havido uma tendência de elevação dos custos de produção
na região. Novos centros industriais surgiram no sul e no oeste do país, e centros mais antigos nessas mesmas regiões se
expandiram, acarretando uma dispersão industrial. Algumas das cidades norte-americanas que mais têm crescido estão nessas
regiões novas, como Atlanta, Dallas, Houston, Seattle, São Francisco, etc.

Sul
As primeiras fábricas do Sul dos Estados Unidos datam de 1880: produziam fios e tecidos e foram instaladas por
industriais da Nova Inglaterra, atraídos pela disponibilidade de matéria-prima, o algodão cultivado na região. Contudo, a
industrialização efetiva do Sul ganhou grande impulso mesmo no início do século XX, após a descoberta de enormes lençóis
petrolíferos na região, principalmente no Texas. Após a Segunda Guerra o processo se intensificou, pois as necessidades
de defesa e de desenvolvimento do programa espacial estimularam a expansão industrial no Sul. Foi construída uma fábrica
de aviões em Marietta (Geórgia), onde hoje se encontra uma das maiores unidades da Lockheed Martin, empresa do setor
aeroespacial. Em Huntsville (Alabama), foi construído um dos centros da Nasa, a agência espacial dos Estados Unidos, e
uma fábrica de aviões militares e mísseis da Boeing, a maior indústria aeronáutica do mundo.
No Texas, localiza-se o importante Centro Espacial de Houston, sede da Nasa. Na Flórida, em Cabo Canaveral,
encontra-se o Centro Espacial John F. Kennedy, base de lançamento de foguetes. No Texas há também importantes
indústrias aeronáuticas, em Fort Worth e San Antonio, e grandes indústrias petrolíferas em Houston, onde se destaca a
Exxon Mobil. Em 2012 essa empresa era a maior dos Estados Unidos e a segunda do mundo na lista das quinhentas maiores
da revista Fortune, com um faturamento de 453 bilhões de dólares, valor equivalente ao PIB da Argentina (a maior do mundo
era a holandesa Royal Dutch Shell, cujo faturamento era de 484 bilhões de dólares).

Oeste
A última região dos Estados Unidos a se industrializar foi o Oeste. Entre os fatores que contribuíram para a instalação
de indústrias nessa região, destacam-se:
• disponibilidade de mão de obra, que foi se estabelecendo desde a época da Corrida do Ouro, em meados do século
XIX, quando a exploração desse metal na Serra Nevada (Califórnia) atraiu muita gente;
• existência de outros minérios, como ferro e cobre, nas Montanhas Rochosas e na Serra Nevada, e de petróleo e gás
natural na Bacia da Califórnia;
• disponibilidade de elevado potencial hidrelétrico, principalmente nos rios Columbia e Colorado.
Em Seattle (estado de Washington) há uma importante concentração da indústria aeronáutica (divisão de aviões
comerciais da Boeing), e em Portland (Oregon) de indústrias siderúrgicas e metalúrgicas (alumínio), entre outras. Mas o
estado mais importante do Oeste é a Califórnia, com um parque industrial bastante diversificado, localizado principalmente
no eixo São Francisco-Los Angeles-San Diego, a segunda megalópole do país (conhecida como San-San), com indústrias
petroquímicas, automobilísticas, aeronáuticas, navais, alimentícias e outras.
Há, assim, muitos setores tradicionais. No entanto, pelo fato de ser uma industrialização relativamente recente,
bastante vinculada à indústria bélica (tendo recebido por isso fortes incentivos governamentais) e ligada a importantes
universidades e centros de pesquisas, no Oeste se encontram as mais importantes concentrações de indústrias de alta
tecnologia dos Estados Unidos, principalmente no tecnopolo do Vale do Silício.

Os principais parques tecnológicos


Vale do Silício
O Vale do Silício (Silicon Valley), no norte da Califórnia, foi o primeiro parque tecnológico implantado no mundo. Ainda
é o mais importante e serve de modelo para muitos dos que surgiram posteriormente em diversos países. Abrange as cidades
de Palo Alto, Santa Clara, San José e Cupertino, entre outras localizadas em torno da Baía de São Francisco. Essa região
é chamada de Vale do Silício porque sua formação foi baseada nas indústrias de semicondutores, que produzem microchips
(ou microprocessadores), cuja matéria-prima mais importante é o silício, e na indústria de informática, tanto de computadores
e periféricos (hardware) como de sistemas e programas (software).
Embora o início de sua industrialização remonte aos anos 1930, a expressão “Vale do Silício” surgiu em 1971, e o
impulso para o desenvolvimento da região se deu sobretudo durante a Guerra Fria, devido à corrida armamentista e
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aeroespacial. Foram as indústrias eletrônicas do Vale do Silício que, por exemplo, forneceram transistores para mísseis e
circuitos integrados para os computadores que guiaram as naves Apollo, cuja série 11 atingiu a Lua. Assim, o governo dos
Estados Unidos, além de subsidiar as pesquisas nos laboratórios de universidades e empresas, garantia mercado para a
produção regional, comprando parte do que era produzido.
A criação, em 1951, do Stanford Industrial Park, no campus da universidade do mesmo nome, também teve importante papel
no desenvolvimento desse parque tecnológico, pois atraiu indústrias de alta tecnologia, principalmente do setor de microeletrônica
e informática. Outras universidades da região tiveram papel crucial na formação de mão de obra qualificada e na produção de
pesquisa avançada, entre as quais a Universidade da Califórnia (campus de Berkeley e de São Francisco), e a Universidade
Estadual de San José.
Graças aos pesquisadores dessas universidades o Vale do Silício tornou-se o principal centro de alta tecnologia do mundo.
Também contribuiu para isso a existência de um espírito empreendedor, de capitais de risco dispostos a bancar projetos inovadores
e de um ambiente favorável aos investimentos e à gestação de novas empresas. Muitas empresas dos setores de microeletrônica
e informática, que hoje estão entre as maiores do mundo, foram gestadas na região. Por exemplo, em 1939 William Hewlett e David
Packard, dois estudantes da Universidade Stanford, fundaram uma empresa de computadores e impressoras – a Hewlett-Packard,
mais conhecida como HP – que em 2012 era a maior produtora de hardware dos Estados Unidos e a segunda do mundo desse
setor (a primeira era a Samsung Electronics; entre as 500 maiores empresas do mundo, a sul-coreana estava na 20a posição e a
norte-americana, na 31a). Mas há diversas outras no Vale, entre as quais se destacam: Intel e AMD (semicondutores); Apple
(computadores); Oracle e Adobe (programas e sistemas), Cisco Systems (TI), entre outras menos conhecidas. Grandes empresas
do setor de informática que têm sede em outros lugares dos Estados Unidos, como a Microsoft, em Redmond (estado de
Washington), e a IBM, em Nova York (estado de Nova York), também têm filiais aí. Mesmo corporações japonesas e europeias
mantêm centros de pesquisa na região.
Apesar da diversificação posterior, sobretudo com a biotecnologia (observe a foto da página anterior), ainda é
predominante a participação desses setores pioneiros. Importantes empresas que se desenvolveram recentemente devido
à expansão da internet, como a Google (fundada em 1998) e o Facebook (2004), também têm sede no Vale do Silício.

Boston
No leste do país destaca-se outro importante tecnopolo, localizado na região metropolitana de Boston (Massachusetts)
e que se desenvolveu a partir dos anos 1960 ao longo da Rota 128, uma autoestrada que contorna as cidades da metrópole.
Esse tecnopolo também está vinculado à indústria bélica e ao setor de informática e abriga empresas como a Raytheon
(material bélico) e a Lionbridge Tecnologies (TI), entre outras. Mais recentemente têm se desenvolvido novos setores de alta
tecnologia na região, especialmente em Cambridge e arredores, sobressaindo-se as de biotecnologia (novos remédios e
terapias) e de equipamentos médicos, com destaque para empresas como a Biogen Idec e a Genzyme.
A região de Boston passou por um processo de reconversão industrial. Em torno dessa cidade surgiram os prédios
inteligentes dos setores ligados à nova economia informacional, muitas vezes no lugar de antigas fábricas, como as têxteis
ou navais, típicas da Primeira Revolução Industrial. Diferentemente de outras cidades do Nordeste que passaram a fazer
parte do Rust Belt, a região de Boston transformou-se num tecnopolo porque dispõe do ativo mais importante da Revolução
Técnico-Científica ou Informacional: conhecimento científico-tecnológico avançado. Isso ocorre graças aos professores e
pesquisadores da Universidade de Harvard e do Instituto Tecnológico de Massachusetts (MIT), duas das instituições de
ensino e pesquisa mais conceituadas do mundo, além da Universidade de Boston e de cerca de cinquenta outras menos
conhecidas.
Além do Vale do Silício e da Rota 128, há diversos outros tecnopolos no território dos Estados Unidos, entre os quais
se destaca, logo abaixo dos dois mais importantes, o Research Triangle Park, na Carolina do Norte. Esse parque de
pesquisas recebe esse nome porque congrega empresas de alta tecnologia numa região formada por um triângulo em cujos
vértices estão três das mais importantes instituições de ensino e pesquisa do país: Duke University, North Carolina State
University e University of North Carolina at Chapel Hill.
Para finalizar, vale destacar que, como vimos anteriormente, em 2012 os Estados Unidos tinham corporações na lista
da revista Fortune, o que correspondia a 26,4% das quinhentas maiores do mundo. Entretanto, em 2001 chegou a ter 197
empresas na lista, 39,4% do total, um recorde. De lá para cá, empresas
de países emergentes, especialmente da China, têm ocupado esse espaço. Isso é mais uma evidência do
enfraquecimento relativo dos Estados Unidos e, paralelamente, do crescente fortalecimento das economias emergentes no
mundo atual.

A Alemanha e o Japão, assim como a Itália e o Canadá, industrializaram-se na segunda metade do século XIX.
São considerados países de industrialização tardia em comparação com os pioneiros que estudamos no capítulo
anterior. Neste, vamos analisar os dois primeiros, os mais importantes deste grupo.
Por que a Alemanha se industrializou tardiamente em relação aos países pioneiros?
Sua história é marcada pelo envolvimento em guerras, por destruições e reconstruções. Derrotada na Primeira
e na Segunda Guerra, foi arrasada e dividida, mas nas últimas décadas recuperou-se e em pouco tempo emergiu
novamente como potência econômica, com uma indústria moderna e competitiva. O que explica essa rápida
recuperação econômica? Que fatores mais contribuíram para isso?
O Japão foi a primeira potência industrial a se desenvolver na Ásia. A industrialização tardia o levou, como a
Alemanha, à expansão imperialista retardatária e a enfrentamentos com as potências já consolidadas. Durante a
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Segunda Guerra, o país foi arrasado do mesmo modo que a Alemanha, com quem se aliou. Em menos de três
décadas emergiu dos destroços da guerra para o segundo posto na economia mundial. Entretanto, desde os anos
1990 reduziu drasticamente seu ritmo de crescimento econômico e acabou superado recentemente pela China. O
que mudou para interromper o ciclo de crescimento anterior? Para entender seu vertiginoso avanço econômico, e
depois a crise pela qual o país passou, é fundamental estudar seu processo de industrialização.

5.5.3 - ALEMANHA
Unificação territorial e industrialização
De 1815 a 1871 a Alemanha foi uma confederação composta de 39 unidades políticas independentes (Estados, reinos,
ducados, principados e cidades-Estado). Em 1861, sob o comando de Otto von Bismarck, chanceler da Prússia, o Estado
mais poderoso da confederação germânica, iniciou-se o processo de unificação político-territorial marcado por diversas
guerras contra seus vizinhos. A Alemanha entrou em guerra contra a Dinamarca, a Áustria e a França. Venceu todas,
inclusive a que travou contra seu vizinho mais poderoso (a França), de quem tomou os territórios da Alsácia e Lorena ao
final da Guerra Franco-Prussiana (1870-1871)
Após esse período de guerras, o país completou sua unificação político-territorial. A partir daí houve uma aceleração
do processo de industrialização e, em fins do século XIX, a Alemanha já tinha uma economia mais forte que a do Reino
Unido e a da França e liderava, com os Estados Unidos, os avanços tecnológicos da Segunda Revolução Industrial.
A unificação política de 1871 tornou a Alemanha não só um único Estado, mas também um único mercado. Entretanto, o
processo de unificação econômica já havia começado com a criação do Zollverein (união aduaneira estabelecida em 1834 entre
os Estados alemães), o que estimulou desde aquela época o comércio e, portanto, o desenvolvimento industrial. Com a unificação
política, consolidou-se a integração econômica: instituição de uma moeda única, padronização das leis e constituição de um amplo
mercado interno, que ampliou as possibilidades de acumulação de capitais. Em consequência disso, a Alemanha tornou-se uma
potência econômica e militar, mas, como não tinha colônias, envolveu-se em outras guerras com o objetivo de conquistar novos
territórios.
Ao longo dos séculos XIX e XX, graças à disponibilidade de grandes jazidas de carvão mineral (a hulha da bacia do
Ruhr) e à facilidade de transporte hidroviário (observe a foto da página seguinte), muitas indústrias se concentraram na
confluência dos rios Ruhr e Reno, quase na fronteira com os Países Baixos. Desde o final da Idade Média, o vale do Reno,
que liga o norte da Itália aos Países Baixos, já era uma das principais rotas do comércio, o que explica a significativa
concentração de capitais na região e os investimentos cada vez maiores, por parte de grandes proprietários de terras e
banqueiros, na indústria que ali se instalava.
Gradativamente, a população que vivia no campo migrou para as cidades, empregou-se como mão de obra
assalariada e contribuiu para a ampliação do mercado consumidor. Além desses fatores, a França, derrotada na Guerra
Franco-Prussiana, terminada em 1871, foi obrigada a ceder à Alemanha as províncias da Alsácia e Lorena (localize-as no
mapa acima), ricas em carvão e minério de ferro, e a pagar pesada indenização aos alemães. Isso significou mais recursos
e acesso a novas fontes de energia e de matérias-primas. A soma desses fatores explica a intensa industrialização da
Alemanha a partir de então, mas o país enfrentou problemas para sustentar seu crescimento econômico.

Guerras, destruição e reconstrução


Na Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a Tríplice Aliança, formada inicialmente por Alemanha, Áustria-Hungria e
Itália (os italianos saíram em 1915), saiu derrotada pela Tríplice Entente, composta de Reino Unido, França e Rússia. Com
o desenrolar do conflito, diversos países aderiram à Tríplice Entente, entre os quais a Itália, o Japão e os Estados Unidos,
ao passo que Alemanha e Áustria só obtiveram apoio do Império Otomano. Os vitoriosos impuseram uma série de sanções
à Alemanha por meio do Tratado de Versalhes: pesadas indenizações financeiras, grandes restrições militares e
significativas perdas territoriais. Além de perder as poucas colônias ultramarinas que possuía, a Alemanha foi obrigada a
devolver as províncias da Alsácia e Lorena à França e perdeu territórios para a Polônia, que voltou a ter acesso ao mar por
uma faixa de terra que passava no meio do então território da Alemanha (e que ficou conhecida como “corredor polonês”).
Porém, a situação da Áustria-Hungria foi pior: o antigo império se fragmentou, dando origem a novos países na Europa
central.
Pelo fato de ter-se unificado tardiamente, a Alemanha perdeu a fase mais importante da corrida colonial. Embora tenha se
apropriado de algumas colônias na partilha da África durante o Congresso de Berlim (1884-1885), e, também, de algumas ilhas no
Pacífico, não obteve muitas vantagens econômicas. Esses territórios eram limitados em recursos naturais e o país se viu privado
do acesso aos mercados consumidores, às reservas de matérias-primas e às fontes de energia, fatores que poderiam acelerar sua
expansão industrial. Esse conjunto de fatores levou a Alemanha a um enfrentamento bélico com o Reino Unido e a França, as duas
principais potências coloniais da época, que depois envolveu outros países e resultou na 1ª Guerra.
As sanções impostas pelo Tratado de Versalhes e a crise de 1929 conduziram a Alemanha a profunda crise social e
econômica, o que criou as condições políticas para a ascensão de Adolf Hitler ao poder. Assim que assumiu o posto de
chanceler, em 1933, Hitler dissolveu o parlamento e convocou novas eleições, vencidas esmagadoramente pelo Partido
nazista. Com os nazistas no poder, o país transformou-se numa ditadura na qual Hitler era o Führer (‘líder’, em alemão), e
iniciou-se o Terceiro Reich, que se estendeu até 1945.
Assim como no século anterior, nesse período o Estado alemão lançou-se à conquista dos territórios considerados
vitais para sua expansão econômica. O general Karl Haushofer, conselheiro geopolítico e amigo de Hitler, inspirou-se nas
ideias do geógrafo Friedrich Ratzel (1844-1904) para justificar o novo expansionismo alemão. Ratzel, cujas ideias já tinham
97
servido para justificar o expansionismo alemão que resultou na Primeira Guerra, formalizou o conceito que chamou de
espaço vital.
Em 1938 a Alemanha anexou a Áustria com o argumento de que os dois países eram habitados por povos germânicos,
e no ano seguinte, a Tchecoslováquia, onde havia minorias alemãs. Em setembro de 1939, após a invasão da Polônia por
tropas alemãs, Grã-Bretanha e França declararam guerra à Alemanha, dando início à Segunda Guerra Mundial. Em 1941
os Estados Unidos e a União Soviética saíram da neutralidade e também entraram na guerra contra a Alemanha. Em 1945,
ao final do conflito bélico, o país estava mais uma vez derrotado: além das perdas humanas e da destruição material, sofreu
novas perdas territoriais e fragmentação política. Ao terminar a Segunda Guerra, a Alemanha teve seu território partilhado
pelos países vitoriosos em quatro zonas de ocupação, segundo tratado firmado na cidade de Potsdam, em 1945, e ainda
perdeu territórios para a Polônia e a União Soviética.
Posteriormente, em 1949, o país foi dividido em dois: as zonas de administração americana, britânica e francesa foram
unificadas e constituíram a República Federal da Alemanha (RFA), com capital em Bonn (Berlim Ocidental também ficou sob
controle daqueles três países); e como resposta, os soviéticos criaram, em sua zona de ocupação, a República Democrática
Alemã (RDA), com capital em Berlim Oriental.
Com a divisão, dois modelos sociais, políticos e econômicos foram implantados, um em cada lado da fronteira. Na Alemanha
Ocidental, influenciada pelos Estados Unidos, passou a vigorar uma economia de mercado, assentada na propriedade privada, na
livre iniciativa e na concorrência. Politicamente o país se organizou como uma democracia pluripartidária na forma republicana de
governo e, gradativamente, estruturou o Estado de bem-estar. Aliada a uma elevação significativa da produtividade e, portanto,
dos salários, houve melhora considerável da capacidade de consumo e das condições de vida da população. Vale lembrar que
estavam em território da Alemanha Ocidental as regiões industriais mais importantes do país, entre as quais o vale do Rhur.
Em contrapartida, sob a influência da União Soviética, na Alemanha Oriental passou a vigorar uma economia planificada,
na qual os meios de produção eram quase integralmente controlados pelo Estado. Estruturou-se uma ditadura de partido único, o
Partido Socialista Unificado, criado em 1946, nos moldes do Partido Comunista da União Soviética. Havia, portanto, um monopólio
político e econômico por parte do Estado. A produtividade crescia lentamente e o parque industrial aos poucos foi se defasando
tecnologicamente. O padrão de vida e de consumo não acompanhou os níveis ocidentais, gerando um descontentamento popular
que só não aflorava por causa da censura e da repressão política.
A Alemanha Ocidental, capitalista, organizou-se sob um sistema econômico estruturalmente mais competitivo e
dinâmico e beneficiou-se muito da Guerra Fria: recebeu 1,4 bilhão de dólares do Plano Marshall. Esse fato, aliado à sua
entrada em organizações supranacionais, como a Comunidade Econômica Europeia (atual União Europeia), foi fundamental
para sua rápida reconstrução econômica no pós-guerra, o que aprofundou as diferenças entre as duas Alemanhas.
Ao ocorrer a reunificação política, em 1990, as diferenças sociais, econômicas, políticas e culturais entre os dois
sistemas afloraram nitidamente no novo país. O contraste de padrão de vida, comportamentos, ideias e costumes entre
alemães do oeste e do leste revelavam um distanciamento muito maior do que o inicialmente esperado. Entretanto, passados
mais de vinte anos da reunificação, apesar de algumas diferenças socioeconômicas que ainda persistem – por exemplo, o
desemprego e a pobreza no leste são maiores – a Alemanha voltou a ser um único Estado-nação.
A trajetória político-econômica da Alemanha após a Segunda Guerra nega as afirmações de Ratzel no final de seu
texto. Apesar de suas perdas territoriais (mesmo com a reunificação não possui a mesma extensão que tinha antes do
grande conflito bélico), o país não entrou em decadência; ao contrário, tornou-se uma das maiores potências econômicas
do mundo, com um parque industrial muito moderno e competitivo.

Distribuição das indústrias


As indústrias alemãs foram reconstruídas, em sua maioria, nos mesmos lugares que ocupavam antes da Segunda
Guerra. A região de maior concentração continuou sendo a confluência dos rios Ruhr e Reno, pelas mesmas razões do
passado: reservas de carvão, facilidade de transporte, disponibilidade de mão de obra e amplo mercado consumidor. Porém,
após a guerra houve uma rápida modernização do parque industrial e ganhos significativos de produtividade em relação ao
parque industrial britânico e francês. Além disso, antes da guerra a Alemanha já possuía mão de obra qualificada, e maiores
investimentos em educação contribuíram para elevar ainda mais a produtividade dos trabalhadores.
Como afirmado anteriormente, a logística alemã é uma das melhores do mundo. Uma densa e moderna rede de
transportes (hidroviários, ferroviários e rodoviários), armazéns e centros de distribuição interliga os principais polos industriais
aos maiores portos do país – Hamburgo e Bremen – e ao porto de Roterdã, nos Países Baixos.
Apesar de também ter havido certa dispersão, o parque industrial ainda está fortemente concentrado no estado da
Renânia do Norte-Vestfália. Conforme se pode observar, cidades renanas como Colônia, Essen, Düsseldorf e Dortmund,
entre outras, formam uma das maiores concentrações urbano-industriais do mundo.
Também é possível perceber que há praticamente todos os ramos industriais na região do Ruhr, mas alguns merecem
destaque, como o siderúrgico, o químico, o eletroeletrônico e o de refino de petróleo. Percebe-se claramente a predominância
de indústrias pesadas e de ramos oriundos da Segunda Revolução Industrial. A reconstrução e a diversificação dos trustes,
constituídos desde o final do século XIX, possibilitaram a formação dos grandes conglomerados que atuam em vários
setores. Por exemplo, o grupo ThyssenKrupp, com sede em Düsseldorf, é um conglomerado que atua nos setores
siderúrgico, metalúrgico, mecânico, naval, de construção civil, entre outros, produzindo aço, máquinas industriais,
elevadores, autopeças, submarinos, etc.
Embora haja forte concentração nas cidades do estado da Renânia do Norte-Vestfália, o parque industrial alemão está
bastante espalhado pelo território, e algumas cidades de outros estados merecem atenção especial.
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• Stuttgart (Baden-Wurtemberg): possui importante concentração de indústrias mecânicas, principalmente automobilística;
nessa cidade está sediado o Grupo Daimler, terceira maior corporação da Alemanha;
• Hamburgo (Hamburgo): localizada na foz do rio Elba, é o maior porto da Alemanha e concentra, entre outras, importantes
indústrias navais – como a TyssenKrupp Marine Systems, e companhias de navegação, como a Hamburg Süd –, da
mesma forma que a vizinha Bremen;
• Wolfsburg (Baixa Saxônia): localizada próxima à antiga fronteira com a ex-Alemanha Oriental, abriga a sede do Grupo
Volkswagen, a maior corporação alemã (12ª da lista da Fortune Global 500-2012) e a segunda produtora mundial de
automóveis (atrás da japonesa Toyota).

Parques tecnológicos alemães


Como a Alemanha é um país que está na vanguarda tecnológica em diversos setores, há diversos tecnopolos em seu
território. A seguir veremos os mais importantes.
• Munique (Baviera) é um centro industrial antigo que, com o tempo, se transformou no mais importante parque tecnológico
da Alemanha, onde se concentram empresas dos setores eletrônico, de tecnologia de informação (TI), automobilístico,
de biotecnologia e aeroespacial. Implantado a partir dos anos 1970, abriga doze importantes universidades, como a
Universidade Técnica de Munique, e renomados centros de pesquisa, entre os quais treze institutos dos oitenta
controlados pela Sociedade Max Planck, principal instituição de investigação científica alemã. Aí também se localizam as
principais indústrias alemãs do setor eletrônico, como a Siemens e a Robert Bosch, além de filiais de grandes empresas
de outros países.
• Outro importante tecnopolo alemão é o Chempark (parque químico) de Leverkusen (Renânia do Norte-Vestfália). Nele se
concentram mais de setenta empresas do setor químico-farmacêutico que atuam em pesquisa e desenvolvimento, produção
industrial e prestação de serviços, destacando-se a Bayer, um dos maiores conglomerados mundiais desse ramo.

Indústrias do leste após a reunificação


As indústrias da antiga Alemanha Oriental estão localizadas principalmente em torno das cidades de Leipzig, Dresden
e da antiga Berlim Oriental. Elas viveram uma profunda crise após a reunificação política e muitas fecharam as portas porque
eram defasadas tecnologicamente e não conseguiram concorrer com as indústrias ocidentais, que estão entre as mais
modernas e produtivas do mundo.
O símbolo mais emblemático da defasagem tecnológica e da baixa competitividade das indústrias do leste pode ser
resumido numa palavra: Trabant. Mais conhecidos como Trabi, esses carros eram fabricados na antiga RDA. Com a abertura
da fronteira, muitos alemães orientais passaram a viajar à RFA dirigindo esses carros antiquados – vagarosos, barulhentos
e de baixo rendimento, além de poluidores – que “invadiram” o território dos Mercedes-Benz, BMW, Audi e Volkswagen,
entre os mais conceituados automóveis do mundo. Resultado: muitos Trabis eram abandonados por seus proprietários, que
já não queriam os produtos tecnologicamente defasados que eles mesmos fabricavam, e acabavam virando sucata!
Na economia planificada da Alemanha Oriental havia pleno emprego, porque o Estado era o único empregador e as
empresas, estatais, não se orientavam pela concorrência. Após a reunificação, muitas delas foram compradas por empresas
do oeste. Seus novos administradores, para enxugar o quadro de funcionários, demitiram trabalhadores, o que elevou os
índices de desemprego e agravou os problemas sociais.
Para impedir que se agravassem as desigualdades socioeconômicas, a partir da reunificação o governo despendeu
vultosos recursos para modernizar a infraestrutura da ex-RDA. Esses gastos provocaram aumento do deficit público,
obrigando o governo a emitir moeda, o que elevou a taxa de inflação. Tentando minimizar esses problemas, o Bundesbank
(o banco central alemão) manteve, ao longo de 1992 e 1993, uma política de altas taxas de juros, medida que causou
desaceleração do crescimento econômico e levou o país à recessão, em 1993, com o consequente aumento do desemprego.
Na segunda metade da década de 1990, a gradativa redução da inflação, do deficit público e do desemprego
permitiram que a economia alemã retomasse o crescimento, mas o país, um dos mais atingidos pela crise financeira de
2008/2009, enfrentou forte recessão em 2009. Apesar disso, a economia alemã já demonstrou sinais de recuperação em
2010.
Segundo a Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2008 a Alemanha exportou 1,462 trilhão de dólares, mas
em 2010 o volume das exportações caiu para 1,269 trilhão de dólares (o principal mercado dos produtos alemães são os
países da União Europeia, onde naquele momento a crise era mais grave). Com isso, o país perdeu para a China, cujas
vendas externas somaram 1,578 trilhão naquele ano, a posição de maior exportador do mundo. Na pauta de exportações
alemãs predominam produtos industriais de alto valor agregado, portanto, muito valorizados. De acordo com o Relatório de
desenvolvimento industrial 2011, da Unido (Organização de Desenvolvimento Industrial das Nações Unidas), em 2009 93,4%
das exportações do país eram de bens industrializados, dos quais 71,3% são produtos de média e alta tecnologia. Quando
ocorrer a retomada do crescimento na União Europeia, o país deverá ampliar suas exportações.

5.5.4 - JAPÃO
O primeiro contato dos japoneses com os europeus se deu no início do século XVI, com a chegada dos comerciantes
e evangelizadores portugueses, que lá permaneceram por cerca de cem anos. Entretanto, com a ascensão do xogunato
Tokugawa, em 1603, os estrangeiros foram proibidos de entrar no país (inclusive os portugueses), e os japoneses, de sair.
Com isso o Japão permaneceu bastante isolado do mundo exterior no período em que foi governado pelo clã Tokugawa.

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Havia apenas uma exceção: as trocas comerciais feitas com os holandeses, que mantinham um entreposto comercial em
Nagasaqui. Por isso, quando uma esquadra da marinha norte-americana aportou no Japão em 1853, fato que marcou o fim
desse período de isolamento, encontrou um país ainda feudal e defasado economicamente em relação ao mundo ocidental.
Tentando realizar seu projeto geopolítico de controle dos oceanos, os norte-americanos forçaram a abertura do Japão
por meio do Tratado de Kanagawa, assinado em 1854. Essa abertura acelerou a desintegração do sistema feudal japonês
e, em 1868, encerrou-se o domínio do clã Tokugawa e do próprio regime do xogunato. Por que o Japão permaneceu isolado
durante tanto tempo? Por que os europeus e, particularmente, os britânicos, que estenderam seu império à Índia e à China,
não forçaram a entrada no país do Sol Nascente?
O Japão é um país insular muito pequeno (sua área, de 377 mil quilômetros quadrados, corresponde aos estados do
Rio Grande do Sul e de Santa Catarina), formado por montanhas e estreitas planícies, portanto, com pouquíssimas terras
agricultáveis, a maioria na zona temperada do planeta, a qual não oferecia condições para o cultivo dos cobiçados produtos
tropicais, como a cana e o algodão, entre outros. Geologicamente, o Japão é formado por uma combinação de dobramentos
e vulcanismo. Localiza-se numa zona de contato de três placas tectônicas, no Círculo de Fogo do Pacífico, o que explica
sua grande instabilidade geológica, além de um subsolo extremamente pobre em minérios e combustíveis fósseis.
Assim, o que o Japão poderia oferecer às potências colonialistas, tanto na fase do mercantilismo, como, mais tarde,
na etapa do imperialismo? Como se percebe, muito pouco, por isso o país não despertou tanto interesse nos comerciantes
e industriais europeus.
Entretanto, no final do século XIX, quando os Estados Unidos emergiram como potência e se lançaram em busca de
pontos estratégicos nos oceanos Pacífico e Atlântico, o Japão se tornou um país interessante para os norte-americanos,
porque está numa posição estratégica no Pacífico, próximo à costa do leste da Ásia. A partir de então, para não ficarem
dependentes dos Estados Unidos, os japoneses empenharam-se de modo enérgico em viabilizar seu processo de
industrialização, por meio da intervenção do Estado na economia e do militarismo. Assim como a Alemanha e a Itália, o
Japão é um país de capitalismo tardio, de imperialismo tardio, e uma aliança entre esses três países foi apenas uma questão
de tempo. Isso aconteceu no contexto da Segunda Guerra, quando formaram o eixo Berlim-Roma-Tóquio numa tentativa de
dominar o mundo. Aos japoneses era muito interessante o domínio de territórios na Ásia que pudessem viabilizar sua
expansão econômica. Eles também buscavam seu “espaço vital”.

Industrialização e imperialismo
O processo de industrialização e de modernização do Japão começou a partir de 1868, ano que marcou o fim do
xogunato Tokugawa e a restauração do império (os japoneses acreditam que seu primeiro imperador foi entronado no século
VII a.C.), com a ascensão do imperador Mitsuhito. Esse novo reinado, conhecido como Era Meiji (‘governo ilustrado’, em
japonês), estendeu-se até 1912 e foi marcado por políticas modernizantes: investimentos para a criação de infraestrutura
(ferrovias, portos, minas, etc.); maciços investimentos em educação, que foi universalizada e voltada à qualificação de mão
de obra; abertura à tecnologia e aos produtos estrangeiros. A Constituição de 1889 estabeleceu o imperador como chefe
“sagrado e inviolável” do Estado e também a Dieta Nacional do Japão (Parlamento). O governo também estimulou o
desenvolvimento de grandes conglomerados, que no Japão ficaram conhecidos como zaibatsus (em japonês: zai, ‘riqueza’;
batsu, ‘grupo’). Esses grupos econômicos surgiram de tradicionais e poderosos clãs de comerciantes e proprietários de
terras, como Mitsubishi, Mitsui, Sumitomo e Yasuda, entre outros menores. Com o tempo, esses grupos passaram a atuar
em praticamente todos os ramos industriais, além do comércio e das finanças. Foram incorporando empresas menores e
dominando cada vez mais a economia do país (os “quatro grandes” zaibatsus chegaram a controlar até metade de alguns
setores industriais).
Como consequência dessa política modernizante, o Japão viveu um acelerado processo de industrialização. No
entanto, o país enfrentava problemas estruturais graves: escassez crônica de matérias-primas e de energia e limitação do
mercado interno, o que levou o império japonês a se aventurar em busca de territórios na Ásia e no Pacífico. Para atingir tal
objetivo, investiu pesado em seu fortalecimento militar, o que foi facilitado pela rígida disciplina xintoísta (aspecto cultural),
aliada à capacidade industrial (aspecto econômico).
A expansão territorial iniciou-se com a vitória na Guerra Sino-Japonesa (1894-1895), que garantiu a ocupação de
Taiwan, e em 1910 o Japão anexou a Coreia. Posteriormente, com a vitória na guerra contra a Rússia (1904-1905), os
japoneses tomaram as ilhas Sacalinas ao norte e, em 1931, ocuparam a Manchúria, parte do território chinês, onde
implantaram Manchukuo, um Estado fantoche sob o governo do último imperador chinês, Pu Yi.
Com o objetivo de conquistar novos territórios, em 1937 o Japão iniciou uma confrontação total com a China, que se
estendeu até a Segunda Guerra. Como mostra o mapa, essa conflagração mundial marcou a fase de maior expansão
territorial nipônica, quando o país ocupou parte do Sudeste Asiático e diversas ilhas do Pacífico. Tal política expansionista,
porém, levou o país a ser derrotado na guerra e à sua quase total destruição.
Em 1941 os japoneses realizaram um ataque-surpresa à base naval de Pearl Harbor, Havaí (Estados Unidos), numa
evidência de que superestimaram seu poderio militar. Esse ato precipitou a entrada dos norte-americanos na guerra, o que
acabou levando os japoneses à derrota. Após os Estados Unidos lançarem bombas atômicas sobre Hiroxima e Nagasaki,
em 6 e 9 de agosto de 1945, respectivamente, o Japão não teve alternativa a não ser se render. A rendição – assinada em
setembro de 1945 no porta-aviões Missouri, atracado na baía de Tóquio – foi o principal símbolo da superioridade tecnológica
e militar norte-americana e, ao mesmo tempo, o prenúncio do papel reservado ao Japão durante a Guerra Fria: fiel aliado
político e aguerrido adversário econômico dos Estados Unidos.
100
Reconstrução após a segunda guerra
Durante a ocupação, que se estendeu até 1952, quando entrou em vigor um acordo de paz assinado um ano antes
(Tratado de São Francisco), o Japão foi governado pelo Conselho Supremo das Potências Aliadas, presidido pelo general
norte-americano Douglas MacArthur. Nesse período, profundas reformas foram impostas ao país com o objetivo de
modernizá-lo do ponto de vista político e econômico. Em 1947 foi aprovada uma lei antitruste – a Lei de Proibição dos
Monopólios –, o que levou os zaibatsus à dissolução. Com isso, os norte-americanos pretendiam enfraquecer o poder dos
grandes grupos e estimular a concorrência na economia japonesa. No entanto, com o tempo os zaibatsus se rearticularam
e se organizaram como keiretsus.
A Constituição, redigida e imposta pelos ocupantes em 1947, encerrou sua fase militarista ao proibir a intervenção
externa do exército japonês, que foi transformado em força de autodefesa. Na realidade, a proteção do território nipônico,
até mesmo de ataques nucleares, ficou a cargo dos Estados Unidos, com quem o Japão assinou um tratado de defesa mútua
em 1954. A Constituição também garantiu a liberdade de culto e estabeleceu a separação entre Estado e religião: o xintoísmo
deixou de ser a religião oficial e o ensino público passou a ser laico. A independência política e a soberania foram
restabelecidas em 1952, mas o imperador deixou de ser considerado uma divindade e passou a colaborar ativamente com
as reformas. O imperador Hiroito permaneceu no poder de 1926 até sua morte, em 1989 – período denominado Era Showa
(‘paz brilhante’, em japonês) –, quando foi substituído por seu filho Akihito, atual imperador do Japão (em 2012).
A recuperação econômica japonesa após a Segunda Guerra foi avassaladora. Na década de 1960, o país já tinha
conquistado o terceiro lugar na economia mundial e atingiu o segundo na década de 1980 (posição que só perdeu para a
China em 2010). Até o final dos anos 1980 o Japão foi uma das economias que mais cresceu no mundo; entretanto, desde
a década de 1990 vem apresentando um crescimento muito baixo. Que fatores explicam primeiro as altas taxas de
crescimento e, depois, as baixas?
Além das intervenções modernizadoras, os Estados Unidos elegeram o Japão como o principal ponto de apoio asiático
na luta contra o comunismo sino-soviético, estratégia que se fortaleceu, sobretudo, após a Revolução Chinesa de 1949.
Assim, o Japão passou a se beneficiar da ajuda financeira do Tesouro dos Estados Unidos, fundamental para a recuperação
de sua economia. Ainda dentro da lógica da Guerra Fria, os industriais japoneses tiveram altos lucros fornecendo
suprimentos às guerras da Coreia (1950-1953) e do Vietnã (1955-1975), que foram tentativas norte-americanas de conter a
expansão comunista na Ásia.
Diversos outros fatores foram importantes para a rápida recuperação econômica do país, conhecida como “milagre
japonês”, e os crescentes ganhos de produtividade:
• a grande disponibilidade de mão de obra relativamente barata, disciplinada e qualificada (assim como a Alemanha, o Japão
já possuía trabalhadores qualificados antes da Segunda Guerra);
• os maciços investimentos estatais em educação, que melhoraram ainda mais a qualificação da mão de obra e, junto à
iniciativa privada, em pesquisa e desenvolvimento tecnológico;
• a reconstrução da infraestrutura e dos conglomerados (os antigos zaibatsus) em bases mais modernas e a gradativa
introdução de novos métodos organizacionais, como o toyotismo (orientado pelo lema kaizen), aumentando a
competitividade das empresas;
• a desmilitarização do país e de seu parque industrial, que permitiu investimentos maiores nas indústrias civis de bens
intermediários e de capital, o que deu sustentação ao desenvolvimento de uma poderosa e competitiva indústria de bens
de consumo.
Após a Segunda Guerra, em substituição aos zaibatsus, que tinham uma holding que controlava todas as empresas
do grupo (ou seja, possuíam uma “cabeça”), as companhias japonesas reorganizaram-se formando os keiretsus (‘união sem
cabeça’, em japonês). Essa palavra é perfeita para definir as redes de empresas integradas que dominam a economia
japonesa atual. As empresas que as formam são independentes, embora muitas vezes uma possua parte minoritária das
ações da outra e vice-versa. Um keiretsu geralmente se articula em torno de algum grande banco que dá suporte financeiro
às empresas da rede, as quais atuam de forma integrada para atingir seus objetivos. Atualmente os grandes grupos
japoneses – muitos deles antigos zaibatsus, como Mitsubishi, Mitsui, Sumitomo – se organizam como keiretsu.
É importante destacar que até os anos 1970 a principal vantagem apresentada pelo Japão sobre os concorrentes da
Europa ocidental e da América do Norte foi a mão de obra barata. Essa foi a outra face do “milagre”, ou seja, a competitividade
até então esteve assentada em grande medida na superexploração da força de trabalho. Porém, com o passar do tempo, os
salários foram aumentando como decorrência da elevação da produtividade resultante dos avanços tecnológicos (como a
robotização) e organizacionais (como o toyotismo) incorporados ao processo de produção.
Na primeira metade da década de 1990 os trabalhadores japoneses alcançaram salários bastante elevados, entre os
mais altos do mundo, o que sustentou um gigantesco mercado interno e lhes assegurou um dos mais altos padrões de vida
do mundo. Entretanto, a persistência da estagnação econômica provocou o aumento do desemprego e, consequentemente,
a estagnação do valor dos salários. Somente a partir de 2005 houve uma recuperação salarial.

Carência de recursos naturais


Apesar de muito carente em matérias-primas e em fontes de energia, o Japão se transformou numa grande potência
industrial. O país possui pouquíssimas jazidas de minérios e as reservas de combustíveis fósseis são irrelevantes em face
das necessidades de sua indústria. Mesmo o potencial hidráulico, relativamente grande por causa do relevo montanhoso e
do clima úmido, já há muito tempo não é suficiente para garantir as necessidades de consumo de energia. Com isso, o país
101
se tornou um dos maiores importadores de recursos naturais do mundo, especialmente de combustíveis fósseis e minérios
metálicos.
De acordo com o BP Statistical Review of World Energy 2011, as reservas de carvão do país são de 350 milhões de
toneladas (menos de 0,05% do total mundial), o que daria somente para dois anos de consumo, e sua produção anual é de
apenas 900 mil toneladas. Com isso, o Japão importa praticamente 100% do carvão que consome. O território japonês
também abriga reservas de petróleo muito reduzidas: segundo o World Factbook 2012, em 2011 o país produziu 17,5 mil
barris de petróleo diários (74º produtor mundial) para um consumo de cerca de 4,5 milhões de barris/dia (terceiro consumidor
mundial). Isso significa que sua produção equivale a apenas 0,4% do consumo interno, o que faz do país o terceiro maior
importador de petróleo do mundo.
Conforme o relatório Minerals Yearbook 2010, o Japão importa 100% do minério de ferro, 100% do minério de cobre
e 93% do minério de zinco que consome. Ao mesmo tempo que é grande importador de minério de ferro, por exemplo, é
importante produtor e exportA _ m de obter saldos comerciais para compensar as despesas com importações de recursos
naturais e a limitação relativa de seu mercado interno, o Japão passou a exportar volumes cada vez maiores de produtos
industrializados. Assim, a economia japonesa foi gradativamente se convertendo numa grande importadora de produtos
primários (metade de sua pauta de importações) e numa gigantesca exportadora de bens industrializados e exportador de
aço. A Nippon Steel é a maior indústria siderúrgica do país e a sexta do mundo: em 2011, segundo a World Steel Association,
suas usinas produziram 33,4 milhões de toneladas de aço (a primeira era a indo-luxemburguesa ArcelorMittal, com 97,2
milhões de toneladas).

Principais setores industriais e sua distribuição


O Japão é um país fortemente industrializado, e de suas fábricas sai uma gama muito diversi_ cada de produtos. Os
bens intermediários, de capital e especialmente os de consumo de maior valor agregado, como os que aparecem nas fotos
a seguir, são predominantes em suas vendas ao exterior. De acordo com o Relatório de desenvolvimento industrial 2011,
em 2009, 96,7% de sua pauta de exportações era composta de bens industrializados, dos quais 78,7% eram produtos de
média e alta tecnologia. Especialmente a partir dos anos 1980, os produtos “made in Japan” ganharam o mundo devido ao
seu preço competitivo, sua qualidade e confiabilidade.
Como vimos, as primeiras indústrias foram implantadas no Japão no início da Era Meiji, quando teve início seu
processo de industrialização. Inicialmente, predominavam as fábricas de produtos têxteis, que utilizavam seda e algodão
como matéria-prima. Contudo, desde o começo do século XX, por conta das necessidades militares, o Estado e a iniciativa
privada passaram a investir em indústrias intermediárias e de bens de capital, como siderúrgicas, químicas e de máquinas
e equipamentos. As indústrias de bens de consumo, porém, nunca deixaram de se expandir. Com os avanços tecnológicos,
passaram a ser produzidas _ bras sintéticas, como o náilon, e novos setores foram se desenvolvendo, como o eletrônico, o
automobilístico e o mecatrônico, entre outros.
A distribuição das indústrias no território japonês foi condicionada, entre outros fatores, por uma forte dependência em
relação ao exterior, tanto para exportar como para importar, somada ao fato de o país ser insular e montanhoso.
A insularidade e a dependência de produtos primários importados condicionaram especialmente o desenvolvimento
da indústria naval, uma das mais importantes do país. A frota naval japonesa foi quase toda destruída durante a Segunda
Guerra, mas, para um país com as condições geográficas do Japão, era estratégico possuir uma marinha mercante bem
equipada. Por isso o governo incentivou o desenvolvimento dessa indústria: protegeu o mercado interno e assegurou
encomendas para mantê-la funcionando. Com o tempo, os investimentos em tecnologia, a qualificação da mão de obra e a
elevação da produtividade transformaram a indústria naval do país na maior e mais competitiva do mundo: em meados dos
anos 1980, chegou a responder por quase 60% das encomendas mundiais de navios. Com o crescimento da concorrência
de países onde os custos de produção são menores, o Japão foi perdendo terreno. No início dos anos 2000 sua indústria
naval foi superada pela coreana e, em meados daquela década, pela chinesa. Segundo a Associação Japonesa de
Construtores Navais, em 2008 a Coreia do Sul foi responsável por 40,5% das encomendas mundiais de novos navios, a
chinesa, por 33,4%, e a japonesa, por 16,8%.
Assim, a maior parte do parque industrial japonês situa-se próximo aos grandes portos, nas estreitas planícies
litorâneas, onde, além da facilidade de transporte, historicamente a população se concentrou em razão da possibilidade de
praticar a agricultura do arroz, a mais importante do país. Com a industrialização, a população foi se instalando em torno
dessas cidades portuárias, principalmente na costa voltada para o Pacífico, onde hoje se localizam as maiores concentrações
urbano-industriais do país.
No sudeste da ilha de Honshu (a maior do país em extensão) fica a segunda aglomeração urbano-industrial do mundo,
e no eixo Tóquio-Osaka encontra-se o trecho mais importante da megalópole japonesa. Extremamente diversificado, esse
cinturão industrial concentra cerca de 80% da produção do país, e as regiões de Tóquio e Osaka, sozinhas, são responsáveis
por cerca da metade desse total. Nessas duas cidades estão 81% das sedes administrativas das maiores corporações
japonesas constantes da lista da revista Fortune Global 500 2012 (69% em Tóquio). As sedes administrativas das grandes
corporações, assim como suas respectivas fábricas, são muito mais concentradas espacialmente no Japão (principalmente
na região da capital) do que nos Estados Unidos e na Alemanha.

102
Principais parques tecnológicos
O Japão, ao lado dos Estados Unidos e da União Europeia, é o líder em novas tecnologias na atual Revolução
Informacional. O país abriga diversos centros de pesquisa e inúmeras indústrias de alta tecnologia, concentrados
principalmente em seus dois mais importantes tecnopolos, ou cidades da ciência, como os japoneses denominam seus
parques tecnológicos: Tsukuba e Kansai.
A Cidade da Ciência de Tsukuba, no município de Ibaraki, a 60 quilômetros a nordeste de Tóquio, é o principal
tecnopolo do país e um dos mais importantes do mundo (localize-a no mapa da página 191). Sua implantação começou na
década de 1960, com investimentos estatais, e, ao longo dos anos 1970 e 1980, recebeu diversos centros de pesquisas
governamentais. Em 2010 existiam 55 institutos públicos e privados de educação e pesquisa em funcionamento, entre eles
a Universidade de Tsukuba, a Agência de Exploração Aeroespacial do Japão, o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia
Industrial Avançada, o Instituto Nacional de Estudos Ambientais. Desde meados dos anos 1980, com a consolidação desse
parque tecnológico, ocorreu a instalação de muitas empresas privadas em seu interior.
A Cidade da Ciência de Kansai abrange os municípios de Kyoto, Osaka e Nara; por isso esse tecnopolo também é
conhecido pelo acrônimo Keihanna (Kei = Kyoto, Han = Osaka, Na = Nara). Trata-se da segunda região mais industrializada
do Japão, e sua implantação começou em meados dos anos 1980. Porém, diferentemente deTsukuba, que é um
empreendimento predominantemente estatal, em Kansai há uma forte presença de laboratórios de empresas privadas, como
a Panasonic e a Canon. Lá também há importantes universidades e centros de pesquisa públicos e privados geradores de
tecnologias inovadoras: Universidade de Osaka, Instituto de Ciência e Tecnologia de Nara, Instituto Internacional de
Pesquisas Avançadas em Telecomunicações em Kyoto, entre outros. Um dos mais importantes setores de alta tecnologia
em que o Japão é líder mundial, e que pressupõe o domínio da microeletrônica e da mecânica, é a robótica. O país domina
o desenvolvimento e a aplicação da robótica ao processo produtivo. A utilização de robôs, sobretudo na indústria
automobilística, que é o setor mais automatizado da economia nipônica, foi um dos principais fatores que colaboraram para
o grande aumento da produtividade e da competitividade de seu parque industrial. Em 2012, havia no Japão dezenas de
empresas produzindo robôs industriais, tanto para o mercado interno como para exportação. A Fanuc, a maior delas, tem
sede em Yamanashi e filiais em outras cidades do Japão e em outros países, como Estados Unidos, Alemanha, China,
Coreia do Sul e Brasil.
Apesar de o Japão manter a liderança da produção e utilização de robôs industriais, a crise de 2008/2009 atingiu
fortemente sua economia e levou a uma diminuição dos estoques em operação. Em 2008, 34% dos robôs industriais em
funcionamento no mundo operavam em fábricas japonesas, mas em 2009 esse percentual se reduziu para 33% e havia
previsão de redução para 24% em 2012.

Crises econômicas
O grande sucesso econômico do Japão resultou de uma eficiente combinação de livre mercado com planejamento
estatal. O influente Ministério da Indústria e do Comércio Internacional, criado em 1951, teve papel importante na elaboração
de diretrizes macroeconômicas de longo prazo. Em 2001, após passar por um processo de reorganização, teve seu nome
mudado para Ministério da Economia, Comércio e Indústria. Funcionando em sintonia com os grandes grupos econômicos,
após a Segunda Guerra o Estado japonês deu sustentação e apoio à competição para a conquista de mercados no exterior.
Entretanto, no início dos anos 1990 a economia japonesa perdeu fôlego e entrou em um período de estagnação que
de certa forma foi consequência do sucesso dos anos anteriores. O grande acúmulo de riquezas no país levou os agentes
econômicos a uma crescente especulação com ações, o que provocou uma enorme alta na Bolsa de Valores de Tóquio e
também dos imóveis, que atingiram valores estratosféricos. Os bancos japoneses, que na época chegaram a ocupar oito
das dez primeiras posições entre os maiores grupos financeiros do mundo, segundo o relatório World Investiment Report
2012, da Unctad, emplacaram apenas dois entre os dez maiores, considerando o patrimônio: o Mitsubishi UFJ Financial
Group e o Mizuho Financial Group. A concessão de grandes empréstimos sem critério, principalmente para o mercado
imobiliário, gerou grande especulação nesse setor. Essa bolha especulativa – financeira e imobiliária – estourou no início
dos anos 1990. Os valores das ações e dos imóveis despencaram, fazendo a crise se propagar pela economia real e provocar
o fechamento de empresas e o aumento do desemprego. Os bancos, não tendo como receber dos devedores, deixaram de
fazer novos empréstimos. Muitas empresas (industriais e comerciais) e instituições financeiras (bancos, seguradoras,
corretoras de valores, etc.) foram à falência, levando o país à estagnação econômica.
Agravando esse quadro, a população, receosa com a crise, passou a poupar mais, o que reduziu ainda mais os níveis
de consumo. Esse fato, além de aumentar a historicamente alta taxa de poupança interna, dificultou a retomada do
crescimento econômico. Com isso, a economia japonesa cresceu nos anos 1990 apenas 1% na média anual, e nos anos
2000 foi ainda pior: 0,9% (recordando: na década de 1980 o crescimento médio anual havia sido de 4,1%).
Como mostram os dados do gráfico abaixo, a economia japonesa estava esboçando uma reação em meados dos
anos 2000, mas com a crise mundial de 2008/2009 o país entrou novamente em recessão.
Apesar da estagnação que viveu nos anos 1990 e 2000 e de ter sido um dos países mais atingidos pela crise de
2008/2009, o Japão permanece como terceiro PIB do mundo (foi superado pela China em 2010) e é uma potência industrial
de primeira linha: moderna e competitiva. O país sedia algumas das maiores corporações transnacionais do planeta, com
destaque para Toyota, Nissan e Honda (automóveis); Hitachi, Panasonic e Sony (eletrônicos em geral); Mitsubishi, Mitsui e
Sumitomo (navios, automóveis, bancos, etc.); Fujitsu e NEC (computadores e softwares); Canon e Fujifilm (equipamentos
fotográficos); Nippon Steel (aço), todas na lista das 500 maiores da revista Fortune.
103
5.5.5 - UNIÃO EUROPEIA: rumo à integração industrial?
A Europa foi o berço das primeiras grandes aglomerações industriais do planeta, na maioria polarizadas pela presença
de complexos siderúrgicos. Na pioneira Grã-Bretanha, a siderurgia assentou-se sobre as reservas de hulha do Black Country
(Birmingham), do País de Gales e do sul da Escócia.
Na Alemanha, o Vale do Rio Ruhr tornou-se a maior região siderúrgica da Europa. A hulha do Ruhr e das reservas
menores na Bélgica abastecia também as indústrias francesas, através do sistema fluvial do Rio Reno e de seus afluentes.
Essa integração industrial franco-alemã transformou as ricas regiões da fronteira em foco de disputas geopolíticas e militares,
que se estenderam do século XIX à Segunda Guerra Mundial. No pós-guerra, o tratado da Comunidade Européia do Carvão
e do Aço (Ceca) transformou a disputa em colaboração ativa, unificando fretes e tarifas em toda a bacia do Rio Reno.
Entretanto, apesar da integração precoce de parte da siderurgia, a lógica das economias nacionais é que presidiu a
implantação da atividade industrial no continente.
Cada país tinha seu mercado, delimitado e regulado por uma moeda nacional, no interior do qual as empresas
traçavam suas estratégias de localização.
Assim, diversos setores industriais europeus desenvolveram estruturas paralelas. Não existe, por exemplo, uma
indústria automobilística europeia, mas sim indústrias automobilísticas francesas, alemãs e italianas. A localização das sedes
e das unidades produtivas dessas empresas foi escolhida em função de fatores internos a cada um desses países. É por
isso que é muito difícil comparar o espaço industrial da União Européia com o dos Estados Unidos, apesar de se tratar de
economias de dimensões similares. A produção do espaço industrial estadunidense se deu no interior de um único mercado
nacional, regulado por uma única moeda - o dólar.
Na Alemanha, principal potência econômica da União Européia, o complexo industrial do Reno-Ruhr continua a ocupar
lugar de destaque, mas existem muitos outros polos industriais importantes, comandados principalmente pelas indústrias
mecânicas, químicas e eletrônicas.
Na França, os principais centros industriais desses mesmos setores espalham-se no centro-norte do país, destacando-se a
região parisiense, a Alsácia-Lorena e a região da cidade de Lion.
Na Grã-Bretanha, grande parte dos novos investimentos se direciona para a região de Londres, que concentra indústrias
químicas e mecânicas. As velhas regiões industriais carboníferas, por sua vez, há décadas enfrentam um quadro de crise
econômica e social generalizada. Na Itália, os centros industriais mais importantes, ligados principalmente à siderurgia e às
indústrias mecânicas, situam-se em Turim, Milão e Gênova, no norte do país.
O aprofundamento da integração econômica entre os países da União Européia, coroado em janeiro de 1999 com a adoção
de uma moeda única - o euro -, abriu o caminho para uma profunda reorganização espacial da indústria européia. Contando com
um espaço monetário unificado, as empresas e os setores industriais tendem a traçar suas estratégias locacionais visando o
conjunto do mercado europeu. Os processos de fusão entre empresas, de eliminação de unidades produtivas redundantes e de
mudança de localização de fábricas refletem as necessidades geradas pela concorrência em escala européia.
A integração também parece ser o caminho da indústria de alta tecnologia. Com a criação de grandes consórcios de
pesquisa e desenvolvimento, as empresas européias buscam enfrentar a concorrência com o Japão e os Estados Unidos.
A indústria aeronáutica ilustra esse fenômeno, tal como mostra o caso da Airbus.

5.6 - Países de industrialização planificada


5.6.1 - UNIÃO SOVIÉTICA / RÚSSIA
Embora as primeiras fábricas da Rússia tenham sido construídas no século XIX, ainda na época do Império Czarista,
seu processo de industrialização só se acelerou após a Revolução de 1917, que deu origem à União Soviética. Na China
esse processo ocorreu somente depois da Revolução de 1949, inicialmente com apoio soviético. Nos dois países, após as
mencionadas revoluções socialistas, foram implantadas economias planificadas, baseadas na propriedade estatal dos meios
de produção e no planejamento centralizado.
Com o colapso do socialismo, em 1991 a União Soviética fragmentou-se, dando origem a quinze países
independentes, sendo a Rússia o maior e mais importante deles. Depois de passar por profunda crise nos anos 1990, o país
gradativamente renasce como potência, porém, agora na condição de economia emergente, ao lado de China, Índia, Brasil,
África do Sul (com os quais compõe o grupo Brics), México, entre outros. O que levou a União Soviética à decadência e ao
colapso econômico e político-territorial? Que fatores explicam a retomada do crescimento econômico da Rússia e seu
gradativo retorno à condição de potência?

Origem e crise da economia planificada


A União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), formada em 1922, nasceu da vitória dos bolcheviques, sob a
liderança de Vladimir Lenin, na Revolução Russa de 1917. Politicamente, o novo Estado consolidou-se sob o governo de
Josef Stálin (1924-1953), que sucedeu a Lenin após sua morte, em 1924, quando foi implantado um regime de partido único
- o Partido Comunista da União Soviética (PCUS) -, extremamente centralizado e autoritário. O cargo máximo na hierarquia
de poder era o de secretário-geral do PCUS, escolhido entre os membros do Politburo instalados no Kremlin, sede do
governo em Moscou.
Como consequência da revolução, a economia passou por um processo forçado de estatização e planificação:
• praticamente todos os meios de produção - fábricas, minas, fazendas, etc., além do comércio e dos serviços - foram

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estatizados, ou seja, foram confiscados pelo Estado e passaram a ser controlados pelo governo;
• as metas de produção industrial, mineral e agrícola do país passaram a ser definidas por planos quinquenais, elaborados
pelo Comitê Estatal de Planejamento, mais conhecido por Gosplan (o acrônimo vem do russo Gosudarstvennyi planovyi
komitet).
O primeiro plano quinquenal,
implementado de 1928 a 1932, tinha como
principal objetivo construir as bases da economia
socialista, por isso priorizou a implantação da
indústria pesada, a expansão da infraestrutura
básica e a criação de fazendas coletivas,
forçando os agricultores a aderir ao novo modelo
de produção. Com isso a economia cresceu
significativamente e a produção industrial teve
grande avanço, como mostra a tabela a seguir.
No entanto, as metas de produtividade
estabelecidas pelos planos quinquenais eram
quantitativas e quase não levavam em conta a
qualidade dos produtos.
Sob a economia planificada, a União
Soviética saltou de uma posição periférica, no
início do século XX, ao posto de segunda
economia do planeta, na época da Segunda
Guerra Mundial, posição que ainda manteve por
alguns anos. Principalmente na década de 1930,
enquanto as potências ocidentais sofriam o
impacto da crise de 1929, o crescimento industrial soviético foi muito rápido. Observe na tabela que, devido ao colapso
econômico provocado pela Primeira Guerra Mundial (1914-1918) e pela Revolução de 1917, o país socialista partiu de um
patamar muito baixo em 1920.
A economia planificada foi bem-sucedida no período em que o mundo se organizou segundo os padrões tecnológicos
da Segunda Revolução Industrial. Enquanto a produção e, portanto, a tecnologia e os índices de produtividade tiveram como
referência aqueles padrões, a União Soviética esteve em pé de igualdade com os Estados Unidos e outros países capitalistas
desenvolvidos. Como vimos, desde o primeiro plano quinquenal os planejadores soviéticos priorizaram as indústrias
intermediárias e de bens de capital, com o objetivo de garantir autonomia ao país, além de investir na infraestrutura
necessária para sustentar o processo de industrialização. Indústrias como a siderúrgica, a petrolífera, a bélica e a de
máquinas e equipamentos tiveram enorme crescimento: por exemplo, do início do primeiro plano quinquenal até o fi nal do
segundo, a produção de aço saltou de 4 para 18 milhões de toneladas. Foram construídas barragens e hidrelétricas,
ferrovias, redes de transmissão de energia, portos, aeroportos, etc.
O segundo plano quinquenal (1933-1937) continuou a priorizar a indústria pesada, e o terceiro (1938-1942) foi
interrompido pela eclosão da Segunda Guerra. O quarto plano quinquenal (1946-1950) foi direcionado à recuperação da
economia e à reconstrução das fábricas e das obras de infraestrutura destruídas pelo conflito bélico. Os planos seguintes
continuaram enfatizando o setor industrial de base e o bélico, já no contexto da Guerra Fria e da corrida armamentista. Tudo
isso possibilitou um elevado crescimento econômico.
Nos primórdios da Terceira Revolução Industrial, a União Soviética chegou a liderar alguns setores: por exemplo, ao
lançar ao espaço, em 1957, o primeiro satélite artificial (Sputnik), ou quando colocou o primeiro astronauta (Yuri Gagarin)
em órbita ao redor da Terra, em 1961. No entanto, a partir da década de 1970, quando a Revolução Técnico-Científica
começou a se acelerar nos países capitalistas desenvolvidos, sobretudo nos Estados Unidos, a União Soviética não
conseguia acompanhá-los e começou a sofrer defasagem econômica e tecnológica. Uma fatia crescente do orçamento era
comprometida com a indústria bélica e aeroespacial, setores em que o país se mantinha competitivo por conta da corrida
armamentista com os Estados Unidos. Entretanto, ao contrário do que acontecia nos Estados Unidos e na Europa ocidental,
na União Soviética as inovações tecnológicas desenvolvidas nesses setores não migravam para as indústrias civis,
dinamizando a economia e gerando novos produtos. Como a produtividade da indústria em geral e do setor de bens de
consumo em particular era baixa e não acompanhava os avanços tecnológicos dos países capitalistas desenvolvidos, seu
parque industrial mostrou-se incapaz de produzir bens em quantidade e qualidade suficientes para abastecer a população,
gerando filas e aborrecimentos.
No início da década de 1980, os Estados Unidos deram o golpe de misericórdia na enfraquecida economia soviética.
Em 1981, Ronald Reagan, do Partido Republicano, foi eleito presidente em substituição a Jimmy Carter, do Partido
Democrata, tido por muitos como um governo fraco em política externa. Logo depois de assumir o cargo, Reagan triplicou o
orçamento para a defesa. Com isso a União Soviética não teve mais como continuar a corrida armamentista e os acordos
de paz tornaram-se necessários e urgentes.
Em 1985, Mikhail Gorbatchev ascendeu ao cargo de secretário-geral do PCUS. Além de negociar acordos de redução
de armas, seu desafio era recolocar o país no mesmo patamar tecnológico do mundo ocidental e aumentar a produtividade
105
da economia, assim como a oferta e a qualidade de bens de consumo para a população.
O próprio Gorbatchev fez uma análise bastante realista dessa situação em um livro lançado logo depois de chegar ao
poder, um best-seller mundial na época. Leia o trecho a seguir - “Estava-se desenvolvendo uma situação absurda: a URSS,
o maior produtor mundial de aço, matérias-primas, combustíveis e energia, apresentava escassez de tais recursos devido
ao uso ineficiente ou ao desperdício. Apesar de ser um dos maiores produtores de grãos para alimentação, tinha de comprar
milhões de toneladas por ano para forragem. Possuímos o maior número de médicos e leitos hospitalares para cada mil
habitantes, e, ao mesmo tempo, existem claras deficiências em nossos serviços de saúde. Nossos foguetes conseguem
encontrar o cometa de Halley e atingir Vênus com uma precisão surpreendente, mas ao lado desses triunfos científicos e
tecnológicos existe uma ineficiência óbvia para aplicar nossas conquistas científicas às necessidades econômicas, e muitos
dos eletrodomésticos na URSS apresentam uma qualidade sofrível.
Infelizmente, isso não é tudo. Iniciou-se uma gradual erosão de valores ideológicos e morais de nosso povo.
Ficou claro que a taxa de crescimento caía rapidamente e que todo o mecanismo de controle de qualidade não estava
funcionando de forma adequada. Havia falta de receptividade com relação aos avanços científicos e tecnológicos, a melhoria
do padrão de vida estava diminuindo e havia dificuldade no fornecimento de alimentos, habitação, bens de consumo e
serviços. (...)”
GORBATCHEV, Mikhail. Perestroika: novas ideias para o meu país e o mundo. São Paulo: Best Seller, 1987. p. 20.
Gorbatchev, rompendo com o imobilismo da era Brejnev, logo que assumiu o poder propôs um conjunto de reformas
voltadas para a modernização da economia soviética, chamado perestroika (‘reestruturação’, em russo), visando à superação
de suas profundas contradições. Planejava criar condições para atrair investimentos estrangeiros: facilitar a formação de
empresas mistas (joint ventures), assegurando o acesso a novas tecnologias da Terceira Revolução Industrial; introduzir
processos produtivos e métodos de controle de qualidade inovadores, a fim de modernizar as empresas estatais; entre outras
medidas, que visavam ao aumento da produtividade. Para ele, outra necessidade urgente era frear a corrida armamentista.
Esperava com isso diminuir os gastos militares e obter os recursos necessários a essas mudanças. Desde que chegou ao
poder, Gorbatchev sempre tomou a iniciativa para a assinatura de acordos de paz com os Estados Unidos, o que lhe valeu
o prêmio Nobel da Paz em 1990.
A implantação dessas mudanças econômicas também envolveu reformas no sistema político-administrativo. Era preciso pôr
fim à ditadura desmontando o aparelho repressor herdado da era Stálin e assegurando liberdade de imprensa e direitos
democráticos mínimos. Com a implantação da glasnost (‘transparência política’, em russo), teve início a abertura política na União
Soviética. Entretanto, a incipiente desmontagem do aparelho repressor liberou forças contidas havia muito tempo. Nacionalistas de
várias repúblicas da União começaram a reivindicar autonomia em relação a Moscou. Durante a existência da União Soviética,
muitas minorias étnicas foram oprimidas pelos russos, a etnia majoritária e que de fato detinha o poder no país. As repúblicas
bálticas (Estônia, Letônia e Lituânia), anexadas à União Soviética após a Segunda Guerra, foram pioneiras, declarando sua
independência. Em seguida, o separatismo ganhou força nas demais regiões do país, levando à completa fragmentação política
da antiga superpotência.

O fim da União Soviética e o ressurgimento da Rússia


Mikhail Gorbatchev, que já estava sendo fortemente cobrado pela crise econômica e pelos insucessos da perestroika, teve
de contemporizar com as pressões dos separatistas. Buscando manter a coesão territorial do país, tentou firmar um novo Tratado
da União, fazendo um acordo com as repúblicas e concedendo-lhes maior autonomia no âmbito de uma federação renovada. Isso,
porém, era inaceitável para os comunistas ortodoxos russos e, ao mesmo tempo, não contentava os separatistas mais radicais.
Um dia antes de entrar em vigor o acordo firmado entre Gorbatchev e os representantes das repúblicas, os comunistas
ortodoxos e setores conservadores das forças armadas deram um golpe de Estado e mantiveram Gorbatchev em prisão
domiciliar em sua casa de veraneio, onde passava as férias. A tentativa golpista, que durou de 18 a 20 de agosto de 1991,
fracassou por falta de apoio popular, por divisões no PCUS e nas forças armadas e por causa da resistência liderada pelo
reformista Boris Yeltsin (1931-2007), eleito presidente da Rússia um mês antes. Após a fracassada tentativa golpista, Mikhail
Gorbatchev foi reconduzido a seu cargo. No entanto, o poder soviético se enfraquecera, porque as repúblicas, uma a uma,
proclamaram a independência política. Fortalecido com a crise, Yeltsin iniciou o gradativo desmonte das instituições da União
Soviética, como a proibição de funcionamento do PCUS na Rússia e o confisco de seus bens, contribuindo para o
esvaziamento do poder de Gorbatchev. No início de dezembro de 1991, a própria Rússia, principal sustentáculo da União
Soviética, sob a presidência de Yeltsin, proclamou sua independência política, num golpe velado contra Gorbatchev.
Um encontro dos presidentes da Rússia, Ucrânia e de Belarus, realizado em 8 de dezembro de 1991, selou o fim da
União Soviética e firmou o Acordo de Minsk (capital de Belarus, sede do encontro), que criou a Comunidade de Estados
Independentes (CEI). Em 21 de dezembro, essa comunidade foi instituída pelo Tratado de Alma-Ata (Cazaquistão), pelo
qual 11 das antigas repúblicas soviéticas aderiram à CEI (em 1993, a Geórgia também ingressou); apenas Lituânia, Letônia
e Estônia optaram por não fazer parte do grupo. Em 25 de dezembro, com seu poder completamente esvaziado, Gorbatchev
renunciou ao cargo de presidente da União Soviética. No dia seguinte, a bandeira vermelha com a foice e o martelo, da
União Soviética, foi arriada do Kremlin e em seu lugar foi hasteada a bandeira branca, azul e vermelha, da Federação Russa.
Esse fato simbolizou o fim da URSS e a passagem do poder para a Rússia.
A CEI foi criada como tentativa de gerir a interdependência econômica que existia entre as repúblicas da União
Soviética e continuou existindo após se tornarem países politicamente independentes. Por exemplo, a Ucrânia depende de
petróleo e gás natural russos, e a Rússia depende dos cereais produzidos nas férteis terras negras ucranianas. O

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Cazaquistão tem importante produção de petróleo e carvão, mas como possui extensas áreas de desertos, depende da
importação de alimentos das outras repúblicas. Praticamente todas as ex-repúblicas soviéticas dependiam, e em grande
medida ainda dependem, da importação de produtos da indústria russa. Embora os países almejem diversificar seu comércio,
o peso da história comum e da proximidade geográfica faz com que ainda haja considerável dependência em relação à
Rússia, o país mais industrializado e a maior economia da região.
A Rússia ocupou o espaço da antiga União Soviética no cenário internacional como o assento de membro permanente
do Conselho de Segurança da ONU. No entanto, perdeu poder no mundo, mesmo na região em que influenciava diretamente,
o Leste Europeu, onde viu vários de seus antigos satélites ingressarem na Otan e na União Europeia. O fracasso da
perestroika e a conturbada transição para a economia de mercado lançaram o país em profunda recessão. Segundo o Banco
Mundial e o FMI, no período 1990-2000, o PIB russo encolheu 4,7% na média anual (o recorde foi em 1994, quando caiu
12,7%). A economia do país encolheu constantemente até 1996; em 1997 esboçou uma reação, mas veio a crise russa de
1998 e o PIB encolheu novamente. A partir de 1999, a economia da Rússia entrou num período de crescimento elevado
(entre 2000 e 2010 cresceu em média 5,4% ao ano), só interrompido pela crise financeira de 2008/2009.

O resultado da recessão dos anos 1990 e da crise de 1998 foi a elevação do desemprego, que atingiu 11,4% da
população ativa em 1998; com isso, houve aumento da pobreza e piora dos indicadores de distribuição de renda. No entanto,
a partir de 1999 o PIB da Rússia passou a crescer com taxas anuais elevadas, impulsionado pela desvalorização de sua
moeda, que estimulou suas vendas ao exterior, e pela elevação do preço do petróleo, seu principal produto de exportação.
Isso contribuiu para uma melhora nos indicadores de distribuição de renda.

A indústria russa
Os imensos recursos naturais
A Rússia, em razão de sua enorme extensão territorial e da diversidade de sua estrutura geológica, é um dos países
mais ricos do mundo em recursos minerais. Há em seu território extensas áreas de bacias sedimentares, ricas em
combustíveis fósseis, e de escudos cristalinos, ricos em minerais metálicos, além do enorme potencial hidráulico de seus
extensos rios, que possibilitou a construção de grandes usinas hidrelétricas nos trechos planálticos.
A Rússia dispõe de importantes reservas de fontes de energia, com destaque para o petróleo e o gás natural.
Segundo a publicação The World Factbook, o país é o segundo produtor e exportador mundial de petróleo do mundo
(o primeiro é a Arábia Saudita). Em 2011 extraiu 10,2 milhões de barris de petróleo por dia (em média) e exportou 54% desse
total diariamente. A maior produção se encontra na bacia do Volga-Ural e na Sibéria ocidental e oriental. Possui as maiores
reservas e é o maior produtor e exportador de gás natural do planeta. Em 2011 extraiu 670 bilhões de metros cúbicos e
exportou 30% desse total, sendo o principal fornecedor de vários países da Europa ocidental. As principais regiões
produtoras são Pechora (extremo norte da Rússia europeia) e Sibéria ocidental, mas há importantes reservas também na
Sibéria oriental.
A Rússia é também um importante produtor de carvão mineral: em 2011 extraiu 334 milhões de toneladas (sexto
produtor mundial). A extração se concentra nas bacias de Pechora e Donets (fronteira com a Ucrânia), na porção europeia,
e nas bacias da Sibéria ocidental (principalmente na região do Kuzbass). Na parte asiática estão mais de 80% das reservas
e, portanto, as maiores possibilidades de ampliação da produção. O país é um grande produtor de eletricidade (quarto do
mundo). Em 2010, gerou 983 bilhões de kW/h, sobretudo em termelétricas movidas a petróleo, gás e carvão e em grandes
usinas hidrelétricas. As principais se encontram nos rios da bacia do Volga (porção europeia de seu território) e nos rios que
cortam os planaltos do sul da Sibéria ocidental, principalmente no Ienissei e no Angara.
A Rússia dispõe de grandes reservas de minérios metálicos e não metálicos extraídos nos escudos cristalinos dos Montes
Urais, onde se encontram as principais províncias minerais do país e outras no planalto central siberiano. Destaca-se como grande
produtor de diamante industrial, níquel, platina, entre outros, como mostra a tabela. Também é importante produtor de urânio,
extraído de jazidas da Sibéria ocidental. Esse minério radiativo é enriquecido tanto para fins pacíficos quanto bélicos: é usado na
movimentação de reatores de usinas termonucleares que produzem energia elétrica, mas também nas ogivas que armam os
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mísseis balísticos do arsenal nuclear russo.
A riqueza do subsolo russo, especialmente o petróleo e o gás natural, tem sido fator fundamental para a recuperação da
produção industrial, mas seu grande mercado interno de consumo também é muito importante. Com a recuperação econômica,
após anos de recessão, surgiu uma significativa classe média ávida por novos produtos, provocando o crescimento das indústrias
de bens de consumo: automóveis, eletroeletrônicos, vestuário, etc., setores que não eram priorizados durante a vigência do controle
estatal da economia.

O parque industrial
As duas principais concentrações industriais na Rússia são a região dos Montes Urais e a de Moscou, mas há concentrações
menores na Sibéria ocidental (observe o mapa da página seguinte). Nas proximidades dos Urais há predominância de indústrias
de bens intermediários, como as siderúrgicas, devido à disponibilidade do minério de ferro e de carvão mineral. As duas maiores
empresas mineradoras e siderúrgicas do país – Severstal e a Evraz Group – possuem minas de ferro e carvão e usinas siderúrgicas
em diversos lugares do país e do exterior. Há também indústrias de bens de capital, como a de máquinas e equipamentos. As
principais refinarias e petroquímicas do país estão próximas aos grandes lençóis petrolíferos, principalmente na bacia do Volga-
Ural, que fica entre Moscou e os Urais.
Em torno da capital predominam indústrias de bens de consumo e de bens de capital por causa da existência de um amplo
mercado consumidor e da boa infraestrutura de transportes e telecomunicações. Na Sibéria ocidental, em razão da grande
disponibilidade de recursos minerais, há importante concentração de indústrias pesadas, como siderúrgicas e metalúrgicas,
principalmente na região do Kuzbass.
Com o fim do socialismo, iniciou-se um processo de privatização e de adoção de mecanismos da economia de mercado nas
ex-repúblicas soviéticas, além da instauração de um processo de modernização da economia.
Na Rússia, durante o governo de Boris Yeltsin (1991-1999), uma parte das antigas empresas estatais foi privatizada. Dessas,
algumas foram compradas por corporações estrangeiras ou por fundos de investimento, outras tiveram suas ações distribuídas
entre os empregados, mas muitas delas acabaram caindo nas mãos de políticos influentes ou mesmo de grupos criminosos que
corromperam agentes do Estado para conseguir o controle de antigas estatais pagando valores muito baixos. Esses grupos foram
um dos setores da sociedade russa que mais enriqueceu. Desde a época da União Soviética controlavam uma economia paralela
que floresceu nos interstícios da economia planificada em decorrência da escassez dos mais variados produtos. Entretanto, como
veremos, ainda há muitas empresas sob o controle total ou parcial do Estado russo.
Depois de um período de profunda crise, com a retomada do crescimento econômico surgiram grandes corporações russas
de capital aberto, isto é, com ações cotadas na Bolsa de Valores de Moscou. É o caso da Gazprom (principal produtora de gás
natural do planeta, maior empresa russa e 15a na lista da Fortune Global 500 2012), da Lukoil e da Rosneft Oil, ambas também
listadas naquela pesquisa. Essas três empresas são responsáveis por extrair petróleo e gás natural em diversos pontos do território
russo e também no exterior. Não é por acaso que as maiores corporações russas sejam do setor energético: como vimos, o petróleo
e o gás são duas das maiores riquezas naturais do país.
Apesar do avanço do processo de privatização, diversas empresas, principalmente desses setores estratégicos, continuam
pertencendo, em parte, ao Estado. Em 2012, a Gazprom ainda tinha 50% de suas ações nas mãos do governo russo, seu maior
acionista. Do capital da Rosneft Oil, 75% das ações pertenciam ao Estado russo. A Lukoil começou a ser privatizada em 1993: o
governo foi se desfazendo de suas ações e em 2004 vendeu o restante que possuía do capital da empresa.
O presidente Vladimir Putin, em seu primeiro mandato (2000-2004), planejava vender as empresas estatais que restaram, e
que não fossem competitivas ou estratégicas, para sanear as contas públicas e garantir um crescimento de 7% ao ano em seu
segundo mandato (2004-2008). Com isso o governo russo projetava dobrar o PIB do país até o final daquela década. A economia
russa vinha crescendo a taxas elevadas, até que a crise financeira a atingiu em cheio, provocando profunda recessão em 2009.
Em 2010, porém, o crescimento foi retomado e, apesar desse percalço, o valor do PIB do país duplicou desde 2004 e mais que
quadruplicou ao longo daquela década. Ou seja, Putin atingiu seu objetivo e acabou sendo reeleito. Em 2008, não pôde se
candidatar a um terceiro mandato consecutivo e foi substituído por Dmitri Medvedev (ex-membro do Conselho de Administração
da Gazprom), presidente eleito com seu apoio (em retribuição foi por ele indicado ao cargo de primeiro-ministro). Em 2012, Putin
foi eleito presidente para um novo mandato de quatro
anos e, mantendo o rodízio de poder com Medvedev,
indicou-o ao cargo de primeiro-ministro.Com o rápido
crescimento econômico nos anos 2000, ao mesmo
tempo que as empresas russas têm ganhado
importância no mundo, vem crescendo o fluxo de
investimentos estrangeiros no país, que atingiu 75
bilhões de dólares em 2008 e depois caiu um pouco por
causa da crise. De acordo com a Unctad, os capitais
estrangeiros têm sido atraídos pelo crescimento do
mercado interno e pela possibilidade de exploração dos
recursos naturais, especialmente no setor energético.
Por exemplo, a petrolífera Yukos, que chegou a ser a
maior empresa privada russa, faliu em 2006 e foi
comprada pela italiana ENI em associação com a
compatriota Enel. Outro exemplo: naquele mesmo ano
a petrolífera francesa Total e a norueguesa Statoil

108
Hydro firmaram parceria com a Gazprom para a exploração de gás natural no gigantesco campo de Shtokman, no mar
de Barents. Compare os dados da Rússia com os números dos Estados Unidos, o maior receptor de investimentos do
mundo, e de outros países do Brics.

CEI: da desconcentração estratégica ao modelo exportador


Na antiga União Soviética, o processo de industrialização foi marcado pelo controle estatal sobre os meios de produção
e pelo planejamento centralizado. Nesse caso, as estratégias de localização industrial não derivaram de fatores econômicos;
elas resultaram de escolhas políticas.
Dispondo de imensas reservas de carvão, petróleo e minérios nos Montes Urais, na Ásia Central e na Sibéria ocidental,
o Estado investiu intensamente na criação de regiões industriais dispersas, associadas aos recursos naturais. Essa
dispersão funcionava como uma medida de segurança, tornando a indústria soviética menos vulnerável na hipótese de uma
guerra.
Assim, a indústria de base do país desenvolveu-se em cinturões sucessivos, ao longo do traçado da Ferrovia
Transiberiana. Cada um desses cinturões organiza-se em torno de um polo produtivo de grandes dimensões, nucleado por
algumas usinas gigantescas. A indústria de bens de consumo, que jamais conheceu um grande desenvolvimento, apresenta
maior difusão espacial e atende aos mercados locais.
Quando a União Soviética deixou de existir, a indústria pesada (que transforma produtos brutos em semi-elaborados)
enfrentava problemas agudos de defasagem tecnológica. O vasto processo de privatização das empresas estatais implicou
o fechamento de unidades produtivas obsoletas, com queda abrupta da produção, do emprego e do PIB.
Mas, no contexto da implantação da economia de mercado na área da CEI, o setor industrial representa forte atrativo
para as corporações transnacionais. A indústria pesada está assentada sobre ampla base de recursos naturais, dispõe de
mão-de-obra qualificada e opera com baixos custos de trabalho. Essas vantagens comparativas fundamentam o novo
modelo exportador que se consolida na Rússia, principal herdeira da indústria pesada soviética, e mais lentamente em
algumas outras repúblicas da CEI.
O setor energético está no centro da reconversão da economia russa. Atualmente, a exportação de produtos primários
- principalmente petróleo bruto e gás natural- representa mais de 40% do total, e as manufaturas básicas - o aço, o alumínio
e os produtos da indústria mineral- equivalem a cerca de 30% das vendas externas totais.

5.6.2 - China
A China foi a economia que mais cresceu no mundo ao longo dos anos 1980 e 1990, e nos anos 2000 continuou
crescendo a taxas médias de 10% ao ano, quando alcançou a segunda posição entre os maiores PIBs do planeta. Como
explicar as aceleradas transformações pelas quais a China vem passando? Como compreender seu rápido salto à condição
de potência mundial?

A formação da China comunista


A China é um país milenar. Ao longo de séculos de história, alternou períodos de maior ou menor produção econômica,
tecnológica e cultural. Porém, no final do século XIX, sob o governo da dinastia Manchu, o império estava decadente. A
figura do imperador era apenas decorativa, e naquela época o país fora partilhado entre potências estrangeiras.
No início do século XX, sob a liderança do político Sun Yat-sen (1866-1925), foi organizado um movimento nacionalista
hostil à dinastia Manchu e à dominação estrangeira. Esse movimento culminou em uma revolução que atingiu as principais
cidades do país, pôs fim ao império e instaurou a república em 1912, dando origem à República da China. Sob a direção de
Yat-sen foi organizado o Partido Nacionalista, o Kuomintang.
Apesar da proclamação da república, o país continuava envolto no caos político, econômico e social, e mantinham-se
os laços de dependência com as potências estrangeiras.
Nessa época começou a se desenvolver uma incipiente industrialização, com a chegada de investidores estrangeiros
interessados em aproveitar a mão de obra muito numerosa, por isso barata, e a grande disponibilidade de matérias-primas.
Começaram a ser instaladas algumas fábricas nas principais cidades do país, sobretudo em Xangai. No conjunto, porém, a
China continuava a ser um país camponês dominado por estrangeiros. A tímida industrialização foi interrompida pela invasão
e ocupação japonesa, na década de 1930, e pela guerra civil, que se estendeu de 1927 até 1949.
Nesse contexto, ideias revolucionárias ganharam força entre muitos intelectuais chineses. À influência da Revolução
Russa juntou-se o sentimento nacionalista e anticolonial, dando origem ao Partido Comunista Chinês (PCCh), em 1921.
Entre os fundadores desse partido estava Mao Tsé-tung (1893-1976), seu futuro líder.
Com a morte de Sun Yat-sen, o Kuomintang passou a ser controlado pelo militar Chiang Kai-shek (1887-1975), que a
partir de 1928 passou a liderar o Governo Nacional da China, embora não controlasse todo o território do país. Após curta
convivência pacífica, o governo nacionalista colocou o PCCh na ilegalidade, iniciando uma guerra civil entre comunistas e
nacionalistas que se estendeu até o fim da década de 1940. Em 1934, os japoneses implantaram na Manchúria, com a
conivência das potências ocidentais, Manchukuo (‘Estado da Manchúria’, em japonês), um país apenas formalmente
independente. Seu governante era Pu Yi, o último imperador chinês, na realidade um governante fantoche. Quem de fato
governava Manchukuo eram os japoneses, que tinham se apoderado de uma das regiões mais ricas em minérios e
combustíveis fósseis de toda a China.
Em 1937, os japoneses declararam guerra total contra a China e chegaram a ocupar, próximo do fim da 2ª GM, cerca
109
de dois terços de seu território. Somente nesse breve período houve um apaziguamento entre comunistas e nacionalistas,
empenhados em derrotar os invasores japoneses. Bastou o Japão assinar sua rendição para que o conflito interno na China
reacendesse e se intensificasse.
Depois de 22 anos de guerra civil, com breves interrupções, os comunistas do Exército de Libertação Popular –
formado por voluntários, em sua maioria camponeses, e liderado por Mao Tsé-tung - saíram vitoriosos. Em outubro de 1949
foi proclamada a República Popular da China, e o território continental do país foi unificado sob o controle dos comunistas,
comandados por Mao, então secretário-geral do PCCh: nascia a China comunista. Entretanto, os membros do Kuomintang,
comandados por Chiang Kai-shek, se refugiaram na ilha de Formosa, onde fundaram a República da China ou China
nacionalista, mais conhecida como Taiwan, que o governo de Pequim sempre considerou uma província rebelde.

Relação China-Taiwan
A história de Taiwan, por conta da Guerra Fria, é marcada pelo conflito com Pequim e pela duplicidade da política
norte-americana em relação aos dois países. Após a Revolução Comunista, a cadeira reservada à China na ONU foi
oferecida a Taiwan, que a ocupou até o início da década de 1970. A República Popular da China, com cerca de 1 bilhão de
habitantes, simplesmente não era reconhecida. Com o rompimento sino-soviético, em 1965, os Estados Unidos passaram a
ter grandes interesses na aproximação com a China comunista. Em 1972, o então presidente norte-americano, Richard
Nixon, fez uma viagem ao país, dando início ao reconhecimento do governo de Pequim. No ano anterior, o país havia sido
reconhecido pela ONU e admitido como membro permanente do Conselho de Segurança, ao mesmo tempo que Taiwan foi
expulsa da organização por exigência chinesa. Em 1979, os Estados Unidos romperam relações com Taiwan e
reconheceram oficialmente a China. Há setores da sociedade de Taiwan que defendem sua readmissão na ONU e o
restabelecimento de relações diplomáticas com os Estados Unidos, que, apesar de não reconhecerem o país oficialmente,
vendem armas a ele, criando atritos com Pequim. A concretização dessas metas é difícil, pois contraria os interesses
chineses. A China sempre deixou claro que é contrária à independência da ilha e ameaça invadi-la caso isso venha a
acontecer. Os governos dos dois países vêm adotando uma posição moderada em relação a essa questão e firmando
acordos que visam a uma aproximação na área econômica, que pode levar no futuro a uma “reunificação pacífica”, garantindo
certa autonomia a Taiwan, como aconteceu com a reincorporação de Hong Kong, em 1997 (esse território, hoje uma Região
Administrativa Especial da China, era administrado pela Grã-Bretanha desde 1842).
A Revolução Chinesa de 1949 foi um importante divisor de águas na história do país, e isso já ficara evidente quando
Mao Tsé-tung, em discurso feito durante a fundação da República Popular da China, afirmou para uma multidão em Pequim:
“O povo chinês se levantou [...]; ninguém nos insultará novamente”.
No início do período revolucionário, a China seguiu o modelo político-econômico vigente na antiga União Soviética,
país que inclusive enviou muitos técnicos e assessores para ajudar no desenvolvimento da economia chinesa. Com base na
ideologia marxista-leninista, implantou-se um regime político centralizado sob o controle do Partido Comunista Chinês, cujo
líder máximo era o secretário-geral (cargo ocupado por Mao Tsé-tung até 1976). Economicamente, com a coletivização das
terras, foram implantadas de modo gradativo as comunas populares, que seguiam, de modo geral, o modelo das fazendas
coletivas da União Soviética. O Estado passou a controlar também todas as fábricas e a exploração dos recursos naturais;
seu processo de industrialização só deslanchou mesmo após 1949. Vale lembrar que a Revolução Chinesa foi
essencialmente camponesa. Para ter uma ideia, nessa época havia no país em torno de 3,2 milhões de operários, o que
equivalia a apenas 0,6% da população de cerca de 540 milhões de habitantes.

O processo de industrialização
Em 1957, Mao Tsé-tung lançou um ambicioso plano econômico, conhecido como o Grande Salto à Frente, que se
estendeu até 1961. Esse plano pretendia acelerar a consolidação do socialismo por meio da implantação de um parque
industrial amplo e diversificado. Para tanto, a China passou a priorizar investimentos na indústria de base, na bélica e em
obras de infraestrutura que sustentassem o processo de industrialização. Apesar de dispor de numerosa mão de obra e de
abundantes recursos naturais, a industrialização chinesa teve idas e vindas. Devido à burocracia e à má gestão, o Grande
Salto à Frente desarticulou completamente a incipiente economia industrial do país. Além disso, a industrialização chinesa
inicialmente padeceu dos mesmos males do modelo em que se inspirou: baixa produtividade, produção insuficiente, má
qualidade dos produtos, concentração de capitais no setor armamentista e burocratização.
As divergências e as desconfianças entre os líderes dos dois principais países socialistas aumentavam cada vez mais.
Em 1964, a China fez seu primeiro teste subterrâneo com uma bomba atômica e, três anos depois, com a de hidrogênio. A
União Soviética, por sua vez, não admitia perder a hegemonia nuclear no bloco socialista. Esse fato decisivo, somado às
divergências quanto ao modelo de socialismo, acabou provocando, em 1965, o rompimento entre a União Soviética e a
China. Como consequência, Moscou retirou os assessores e os técnicos que mantinha em território chinês, agravando ainda
mais seus problemas econômicos. O rompimento sino-soviético abriu caminho para a aproximação sino-americana. Foi
nessa época que, como vimos, a República Popular da China recebeu a visita do presidente dos Estados Unidos e foi
admitida na ONU, tornando-se membro permanente do Conselho de Segurança. Com a morte de Mao Tsé-tung (1976), após
um curto período de disputa interna pelo poder, Deng Xiaoping foi indicado ao cargo de secretário-geral do PCCh (dois anos
depois), posição em que permaneceu por 14 anos. Nesse período implantou diversas medidas que caracterizam a reforma
econômica, a “segunda revolução da China”, como ele diz na epígrafe, responsável pela completa transformação do país.
Mao foi responsável pela primeira revolução chinesa, a socialista, Deng, pela segunda, a “socialista de mercado”.
110
A “economia socialista de mercado”
O gigante chinês, depois de viver décadas em estado de letargia, à margem do explosivo crescimento econômico de
seus vizinhos – o Japão e os Tigres Asiáticos –, resolveu finalmente se modernizar. Sob o comando de Deng Xiaoping,
iniciou-se, a partir de 1978, um processo de reforma econômica no campo e na cidade, paralelamente à abertura da
economia chinesa ao exterior. Jiang Zemin (sucessor de Deng, foi secretário-geral do PCCh de 1992 a 2002), num balanço
apresentado no 14º Congresso Nacional do Partido Comunista Chinês (1992), assim avaliou esse processo: [...] A III Sessão
Plenária do XI Comitê Central, realizada em 1978, e a direção coletiva central que nela se formou, nucleada em torno do
camarada Deng Xiaoping, assumiram a árdua missão de realizar uma grande virada histórica e iniciar um novo período de
desenvolvimento da causa do socialismo em nosso país. [...]
Na III Sessão Plenária do XI Comitê Central, nosso partido repudiou de maneira categórica a política errônea de “tomar
a luta de classe como elo central”, política “esquerdista” inaplicável à sociedade socialista, e deslocou o centro do trabalho
do Partido e do Estado para a construção econômica. Retificou-se, desse modo, o desvio da linha política. Ao mesmo tempo
que deslocava o centro de seu trabalho, nosso Partido adotou a grande decisão de levar a cabo a reforma e a abertura e,
diante da tendência errônea surgida no processo de retificação do desvio, destacou a necessidade de persistir no caminho
socialista, na ditadura democrática popular, na direção do Partido Comunista da China e no marxismo-leninismo e no
pensamento de Mao Tsé-tung, mantendo assim uma bandeira bem definida. [...]
Com base no cumprimento fundamental da tarefa de retificar o desvio, realizou-se, em 1982, o XII Congresso Nacional
do Partido. Ali, propôs-se a ideia de “integrar a verdade universal do marxismo com a realidade concreta de nosso país,
seguir nosso próprio caminho e construir um socialismo com peculiaridades chinesas”, e estabeleceu-se a meta de
quadruplicar, em duas etapas, o Produto Nacional Bruto até o final deste século. Mais tarde, traçou-se a estratégia da terceira
etapa, que consiste em materializar, fundamentalmente, a modernização socialista do país em meados do próximo século.
Assim, nosso Partido ergueu a grande bandeira do progresso para o século XXI à frente dos povos de todas as
nacionalidades do país.
ZEMIN, Jiang. Balanço das reformas. Revista de política externa. São Paulo: Paz e Terra/Nupri-USP. v. 1, n. 4,
mar./maio 1993. p. 148-150.
O que significa “integrar a verdade universal do marxismo com a realidade concreta de nosso país [...] e construir um
socialismo com peculiaridades chinesas”? Trata-se, na prática, de conciliar o processo de abertura econômica e a adoção
de mecanismos característicos da economia de mercado (aceitação da propriedade privada e do trabalho assalariado,
estímulo à iniciativa privada e ao capital estrangeiro) com a manutenção, no plano político, de uma ditadura de partido único,
que o regime, numa contradição, chama de “ditadura democrática popular”. Tal discurso mostra com clareza a importância
das reformas econômicas para o regime chinês e também a busca por justificar ideologicamente a simbiose da economia de
mercado com o planejamento estatal centralizado. É uma tentativa de perpetuar a hegemonia do PCCh, apoiando-se, porém,
numa economia em crescimento e em moldes capitalistas, que seriam impensáveis na China de algumas décadas atrás. A
evidência mais forte de que os dirigentes chineses não estavam (e até hoje não estão) planejando uma abertura também no
plano político foi a dura repressão aos manifestantes na praça da Paz Celestial. Ocorrido em 1989, o movimento, liderado
pelos estudantes, reivindicava a abertura política, além da econômica, que já estava em curso.
Até hoje não há eleições diretas na China. Em 2012, Xi Jinping foi indicado pelo Comitê Central do PCCh, eleito
durante seu 18º Congresso Nacional, para o cargo de secretário-geral (sucedeu a Hu Jintao, que ficara no poder de 2002 a
2012) e em 2013 assumiu o cargo de presidente da República (também em substituição a Hu). Xi demonstrou intenção de
continuar com a reforma/abertura na economia e, embora tenha criticado a corrupção reinante no partido e seu divórcio do
povo, a reforma/abertura política ainda é um tabu.
No final dos anos 1970, num país de quase 1 bilhão de habitantes, dos quais 75% camponeses, era compreensível que a
reforma fosse iniciada pela agricultura. Foram extintas as comunas populares e, embora a terra continuasse pertencendo ao
Estado, cada família poderia cultivá-la como desejasse e comercializar livremente uma parte de sua produção. A reforma na
agricultura provocou a disseminação da iniciativa privada e do trabalho assalariado no campo, levando a um aumento da
produtividade e da renda dos agricultores. Houve também uma expansão do mercado interno, com o consequente estímulo à
economia como um todo. Mas a grande transformação ainda estaria por acontecer, ao atingir a indústria.
A partir de 1982, após o 12º Congresso Nacional do PCCh, iniciou-se o processo de abertura no setor industrial. Empresas
estatais tiveram de se enquadrar à realidade e foram incentivadas a se adequar aos novos tempos, melhorando a qualidade de
seus produtos, baixando seus preços e ficando atentas às demandas do mercado. Além disso, o governo permitiu o surgimento de
pequenas empresas e autorizou a constituição de empresas mistas (joint ventures), visando atrair o capital estrangeiro.
A grande virada, porém, veio com a abertura das chamadas zonas econômicas especiais, já no início dos anos 1980 – as primeiras
foram as de Zhuhai, Shenzhen, Shantou, Xiamen e Hainan. Com o tempo foram implantadas cidades abertas, portos abertos, entre outras
modalidades de abertura ao exterior. O objetivo fundamental dessas diversas áreas abertas, espécies de enclaves capitalistas dentro do
território chinês, era atrair empresas estrangeiras, as quais levaram, além de capitais, tecnologia e experiência de gestão empresarial, que
faltavam aos chineses. Num esforço para ampliar as exportações, a China concedeu aos capitais estrangeiros ampla liberdade de atuação
nessas novas regiões industriais, especialmente nas zonas econômicas especiais (a maioria se concentra na província de Guangdong).
Consequentemente, desde os anos 1990 o país tem ocupado quase sempre a posição de segundo maior receptor de investimentos
produtivos do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Quase todas as transnacionais com atuação global têm filiais na China, mas para
se instalar em seu território precisam criar joint ventures com empresas nacionais, o que implica transferência tecnológica.
É importante destacar que as empresas estrangeiras são atraídas por um conjunto de fatores que tornam o território
chinês altamente favorável a uma produção voltada ao mercado externo e ao abastecimento do crescente mercado interno:
111
• Baixos salários e mão de obra razoavelmente qualificada: a população é numerosa e os sindicatos são proibidos;
• Política tributária que favorece as exportações: redução ou isenção de impostos sobre produtos industrializados;
• Controle da taxa de câmbio: a cotação do yuan é mantida artificialmente baixa pelo governo, o que torna os produtos
exportados baratos no mercado internacional;
• Disponibilidade de moderna Infraestrutura nas zonas econômicas especiais: o governo tem investido maciçamente em
portos, ferrovias, rodovias, telecomunicações, etc.;
• Disponibilidade de recursos naturais usados como matéria-prima e fontes de energia, mas apesar de seus imensos recursos
naturais a China é grande importador;
• Permivissidade com relação à poluição e à degradação ambiental: essa política está mudando;
• Nos últimos anos, grande crescimento e fortalecimento do mercado interno: está havendo uma elevação da renda da
população.

A economia que mais cresce no mundo e suas contradições


Desde o início da década de 1980 até 2010, a China tem sido a economia que mais cresce no mundo, a uma taxa
média de 10% ao ano. Entretanto, há regiões de seu território que crescem ainda mais. A província de Guangdong, a mais
dinâmica do país e onde a internacionalização está mais avançada, apresentou uma taxa de crescimento de cerca de 12%
ao ano, a mesma apresentada desde 1993 pela cidade de Xangai, escolhida pelo governo para ser o centro financeiro e de
negócios da China. Como consequência desse impressionante crescimento, entre 1980 e 2010 o PIB chinês aumentou 2
810% e se tornou o segundo maior do planeta.
Além da liberalização econômica, dos impostos baixos e do yuan desvalorizado, outro fator fundamental que vem
atraindo vultosos capitais para a China é o baixíssimo custo de uma mão de obra muito disciplinada e relativamente
qualificada. Esse ainda é o principal fator de competitividade da indústria chinesa. Na China paga-se cerca de 1 dólar por
hora trabalhada, muito menos do que ganham os trabalhadores industriais em países desenvolvidos, como o Japão e os
Estados Unidos, e mesmo em países emergentes, como o Brasil e o México.
O governo também tem procurado atrair de volta ao país parte dos chineses que vivem no exterior, sobretudo nos
Estados Unidos. Quer de volta empresários, engenheiros e cientistas com experiência em empresas ocidentais. Vale lembrar
também que as populações de Taiwan, Hong Kong e Cingapura são compostas predominantemente de chineses, o que
favorece o fluxo de capitais, informações e pessoas, além da presença de uma “cultura capitalista” na região.
Outro fator que muito contribuiu para o desenvolvimento chinês foram as enormes reservas de minérios e de
combustíveis fósseis em seu subsolo. Entretanto, o rápido crescimento econômico e a constante elevação do consumo
interno têm levado a China a importar cada vez mais recursos minerais (e também agrícolas). Segundo o Banco Mundial,
em 2010, do valor de 1,4 trilhão de dólares que o país importou, 38% eram matérias-primas agrícolas, minérios e
combustíveis fósseis. Segundo a Agência Internacional de Energia, em 2010 a China foi o segundo maior comprador de
petróleo do mundo, responsável por 11,4% das importações mundiais (o primeiro foram os Estados Unidos, com 25%).
Para garantir acesso a esses recursos, o governo chinês e empresas do país têm feito maciços investimentos em
países em desenvolvimento, especialmente da África subsaariana. Isso fez com que alguns analistas estabelecessem uma
correlação entre essa expansão econômica da China e o imperialismo europeu do século XIX a meados do XX. Porém, seus
líderes não se cansam de dizer que a expansão da China atual é marcada pelo que chamam de “ascensão pacífica” (depois
o termo foi trocado por “desenvolvimento pacífico”, para não gerar atrito com os Estados Unidos).
Diferentemente dos países imperialistas europeus, a China não pretende colonizar a África. Diversamente da ação
dos Estados Unidos e da União Soviética durante a Guerra Fria, não busca impor sua ideologia política nem seu sistema
econômico. Afirma querer apenas fazer negócios e garantir a disponibilidade de recursos naturais, assegurando seu
crescimento econômico sustentado e contribuindo para o crescimento dos outros países. De fato, com sua demanda
crescente no mercado internacional, a China tem contribuído para a valorização dos produtos primários, predominantes na
pauta de exportação de diversos países em desenvolvimento. Muitas nações africanas, como Angola, vêm apresentando
rápido crescimento econômico, em grande parte, graças aos investimentos chineses.
Os chineses também têm investido na construção de enormes usinas hidrelétricas, como a de Três Gargantas, a maior
do mundo, e em energias alternativas, como a eólica.
Os baixos custos de produção têm levado os produtos do país a ganhar cada vez mais mercados no mundo. De
acordo com dados da OMC, em 1980, no início das reformas econômicas, as exportações chinesas somavam 18 bilhões de
dólares (25º lugar na lista dos maiores exportadores do mundo). Trinta anos depois, o país exportou mercadorias no valor
de US$1,6 trilhão, tornando-se o maior exportador do mundo. Para ter uma ideia do explosivo crescimento das exportações
chinesas, basta compará-lo com o de outro país do Brics, o Brasil. Em 1980, nosso país exportou mercadorias no valor de
20 bilhões de dólares (19º lugar na lista) e, em 2010, 202 bilhões de dólares (22º lugar). Enquanto as exportações brasileiras
cresceram 910% no período, as chinesas cresceram 8 667%!
O governo chinês aumentou gradativamente a quantidade de produtos industrializados na pauta de exportação do
país. Em 1980, 48% de suas exportações eram compostas de produtos industrializados; em 2010, esse índice subiu para
94%, de acordo com o Relatório Indicadores de Desenvolvimento Mundial 2012. Desse percentual, a maior parte é composta
de produtos de baixo e médio valor agregado, intensivos em trabalho, ou seja, que se valem da enorme disponibilidade de
mão de obra barata como vantagem competitiva. Entretanto, o governo tem se esforçado para aumentar os produtos de
maior valor agregado na pauta de exportação. Para isso, desde meados da década de 1980 vem implantando tecnopolos,
112
as chamadas zonas de desenvolvimento econômico e tecnológico, que buscam atrair indústrias de alta tecnologia. Em 2010,
de acordo com o relatório do Banco Mundial, 27,5% dos produtos industrializados exportados pelo país já eram bens de alta
tecnologia, que são intensivos em capital. Grande parte desses produtos é fabricada nas mais de cinquenta zonas de
desenvolvimento econômico e tecnológico situadas predominantemente na costa leste, tais como Xangai, Cantão, Fuzhou,
Xiamen e Hainan. Muitas dessas regiões industriais de alta tecnologia localizam-se em zonas econômicas especiais ou em
cidades abertas.
A entrada da China na OMC, em 2001, foi um dos principais acontecimentos da economia internacional no início deste
século e reforça sua posição mundial como grande país comerciante. Ao se adequar às regras dessa organização, o país
ampliou as possibilidades de negócios para suas empresas exportadoras e também para as empresas estrangeiras que
exportam para seu mercado interno.
O rápido crescimento econômico concentrado principalmente nas cidades costeiras provocou o aumento das
migrações internas, apesar das restrições do governo central. Por exemplo, a população da cidade de Shenzen, localizada
na província de Guangdong, próxima a Hong Kong, saltou de 300 mil habitantes, em 1975, para 9 milhões, em 2010. De
acordo com a ONU, a cidade saltou da 401ª posição entre as maiores do mundo para a 26ª colocação. Foi a cidade que
mais cresceu no mundo nas últimas três décadas. A maioria dos migrantes vai em busca de melhores salários nas zonas
econômicas especiais e nas cidades livres, mas é sobretudo essa migração que impede uma elevação maior da remuneração
dos trabalhadores. O governo tem procurado interiorizar a economia, estimulando o desenvolvimento de novos centros
industriais, mas é na fachada litorânea que ainda estão as maiores oportunidades de trabalho.
Outro aspecto desse crescimento acelerado foram os graves impactos ambientais provocados pelo rápido e
insustentável crescimento econômico. Até os anos 1990 não havia nenhuma preocupação com a questão ecológica por
parte do regime chinês, a ordem era crescer a qualquer custo e gerar urgentemente empregos, lucros, saldos comerciais e
impostos. Como consequência dessa política, as agressões ambientais cresceram vertiginosamente: as cidades chinesas
estão entre as mais poluídas do mundo, assim como seus cursos de água, o que tem causado diversas doenças à população,
e muitos de seus recursos naturais estão à beira do esgotamento.
A Agência de Proteção Ambiental Nacional (Nepa, na sigla em inglês) foi criada em 1984, mas nessa época a
prioridade era o crescimento econômico. Somente a partir do / m dos anos 1990 começou a se disseminar no país a
consciência de que o crescimento precisa ser sustentável, não apenas do ponto de vista econômico e social, mas também
do ponto de vista ecológico, e o próprio governo está preocupado com a questão.

Políticas ambientais na China


[...] A proteção ambiental apenas começou, realmente, a exercer plena presença na agenda política na China a partir
dos anos 1990, quando seis leis e regulamentos ambientais foram revisados e/ou aprovados. Uma das mudanças mais
significativas na política foi a revisão do Código de Painel da República Popular da China, em 1997. Ele adicionou novos
artigos referentes à responsabilidade de danos e proteção de recursos naturais e do meio ambiente, e responsabilidade
sobre a falta de gestão ambiental.
Muita atenção tem sido direcionada à redução de emissões de poluentes atmosféricos e à melhoria da qualidade do
ar na China. Como exemplos, podemos citar uma série de leis, regulamentos e padrões tais como a Lei na Prevenção e
Controle da Poluição Atmosférica, os Padrões Ambientais Nacionais da Qualidade do Ar e os Padrões, de Emissão de
Poluentes Atmosféricos para as Centrais de Energia Térmica. De acordo com a literatura as emissões de SO2 (dióxido de
enxofre) foram controladas com sucesso em Beijing, mas não em outras cidades como Xangai ou as cidades do delta do rio
Pérola. Muita atenção também tem sido dedicada à redução de emissões veiculares. Embora o número de veículos aumente
em cerca de 10% ao ano em Beijing, Xangai e nas cidades do delta do rio Pérola, as concentrações de NO2 (dióxido de
nitrogênio) e de CO2 (dióxido de carbono) não aumentaram devido às medidas de controle eficazes.
Em 1998, o Nepa foi promovido de subministério a ministério: a Administração de Proteção Ambiental do Estado
(Sepa). Em 2008, a Sepa foi rebatizada como Ministério da Proteção Ambiental (MEP) e elevada a ministério pleno sob o
Conselho Estatal. Essa mudança foi considerada um sinal do desejo do governo chinês em realizar sérios esforços para
melhorar o meio ambiente. O MEP é o principal órgão de formulação e execução de políticas ambientais. Ele abrange
diversas diretorias de prevenção de poluição em níveis estaduais, municipais e distritais que pareceriam cumprir exigências
normais para a execução de leis e o incentivo do bom comportamento ambiental. Essas diretorias podem realizar inspeções
surpresa e os governos centrais e locais podem impor penalidades para as quebras dos regulamentos.
Além disso, a China tem as leis que tratam questões específicas e setores específi cos tais como o ambiente marinho,
o ar, a água, e assim por diante. Além das leis nacionais há muitas leis regionais e locais que abordam o meio ambiente. De
acordo com os resultados publicados por Huang (2010), a política ambiental chinesa deu mais atenção às questões da água
e da poluição atmosférica; a poluição radioativa também tem recebido grande interesse. Os instrumentos da política
mudaram da ênfase em regulamentos de comando-e-controle para incentivos econômicos. [...]
FERREIRA, L. C.; BARBI, F. Questões ambientais e prioridades políticas na China. Com Ciência - revista eletrônica de
jornalismo científico, n. 137, Campinas: Labjor-Unicamp/SBPC, 10 abr. 2012.
Disponível em: <www.comciencia.br/comciencia/handler.php?>. Acesso em: 14 nov. 2012.

113
O parque industrial
A China dispõe atualmente de um parque fabril muito diversificado, e grandes corporações estão se constituindo no
país. Em 2012, havia 73 empresas chinesas, a maioria delas estatal, na lista das quinhentas maiores do mundo. Entre elas
estão: Sinopec Group (setor petrolífero e petroquímico; em 2012 era a maior empresa do país e a quinta na lista da revista
Fortune), China Nacional Petroleum (setor petrolífero), State Grid (energia elétrica), Baosteel (setor siderúrgico), China
Railway Group (setor ferroviário), Dongfeng Motor e China FAW Group (setor automobilístico) e Aviation Industry Corporation
of China (setor aeronáutico).
Vinte anos antes não havia nenhuma empresa chinesa nessa lista. Essa mudança reflete o explosivo crescimento
econômico do país e evidencia a crescente importância de suas empresas no mundo. Acompanhe, na tabela, a evolução do
número de empresas chinesas entre as maiores do mundo em comparação com outros países. Porém, nem só de grandes
empresas vive a economia chinesa. A maioria dos empregados e grande parte da produção para a exportação,
principalmente das mercadorias de baixo valor agregado, concentram-se em milhões de pequenas empresas espalhadas
pelo país, incluindo a zona rural.
Em muitos setores industriais, principalmente nos estratégicos, as empresas chinesas são controladas
predominantemente pelo Estado. Entretanto, o setor privado está em crescimento constante e, se considerarmos a economia
como um todo, em número de empresas, em empregos oferecidos e em patrimônio, já superou o setor estatal, como mostram
os gráficos. Entretanto, em termos de patrimônio, o Estado ainda tem uma participação importante, indicando que continua
dono das maiores empresas do país. No setor privado predominam empresas nacionais pequenas e médias, que são
também as que mais empregam.
A maioria das grandes empresas transnacionais do mundo e mesmo algumas de menor porte têm instalado filiais na
China para aproveitar o gigantesco mercado interno, que não para de crescer, e as vantagens competitivas que o país
oferece para exportação (quase todas as quinhentas da lista da revista Fortune possuem filiais lá). Há inclusive algumas
multinacionais brasileiras instaladas no país: WEG (motores elétricos), Embraco (compressores), entre outras.
O acelerado crescimento econômico da China e sua transformação em “fábrica do mundo” modificou radicalmente as
paisagens do país, especialmente as urbanas. As cidades cresceram exponencialmente, fábricas foram erguidas por todos
os lados e a poluição cresceu na mesma proporção, mas ao mesmo tempo esse processo tirou milhões de pessoas da
pobreza e constituiu uma classe média numerosa. Em 1981, segundo o Banco Mundial, 97,8% da população chinesa vivia
na pobreza (com menos de 2 dólares/dia); em 2008, a população que estava na penúria caiu para 29,8%. A expansão da
classe média, com crescente poder de compra, ampliou significativamente o mercado consumidor interno, como se pode
constatar pelos dados da tabela.
Entretanto, ao mesmo tempo, esse crescimento acelerado vem concentrando renda nos estratos mais ricos da
sociedade e contribuindo para ampliar as desigualdades sociais, como mostra a tabela ao lado.
De acordo com o Hurun Report, em 2010 havia na China 189 pessoas com uma fortuna superior a US$1 bilhão (só
perdia para os Estados Unidos, com quatrocentos bilionários). O vínculo com o Partido Comunista ajuda a fazer negócios e
a enriquecer: segundo o mesmo relatório, um terço das mil pessoas mais ricas da China pertence ao PCCh.
Essas são algumas das contradições da “economia socialista de mercado”.

CHINA: uma nova potência industrial


A China se tornou uma potência industrial e exportadora nos últimos decênios. A política de liberalização e abertura
econômica lançada em 1978 abriu o país para os investimentos estrangeiros.
As vantagens concedidas pelo governo às companhias transnacionais e a mão-de-obra barata abundante transformaram o
país em uma das mais importantes plataformas de exportação de bens de consumo do mundo, em especial nos setores intensivos
em mão-de-obra, tais como têxteis e de brinquedos. A participação do país no comércio mundial passou de menos de 1 % em 1973
para perto de 8% em 2006. A concorrência com os produtos chineses vem provocando falências generalizadas em vastas regiões
industriais do mundo subdesenvolvido.
A internacionalização da economia acelerou as transformações estruturais no espaço chinês, aprofundando as diferenças
de renda entre a cidade e o campo e entre a indústria e a agricultura. O ponto de partida das reformas industriais foi a criação das
Zonas Econômicas Especiais (ZEEs), em 1984, que funcionam como verdadeiros enclaves econômicos internacionalizados. As

114
empresas instaladas em ZEEs beneficiam-se de legislação especial. A maioria desses enclaves situa-se em cidades do litoral
sudeste ou em polos urbanos dos vales dos rios Yang-Tsé e Huang-Ho.
O litoral, onde se concentram as principais cidades, configura-se como espaço econômico internacionalizado. O dinamismo
econômico dessa faixa, onde a renda per capita é mais elevada, difunde-se aos poucos e através dos vales fluviais para o cinturão
agrícola interior. Nessas províncias essencialmente rurais, a agricultura percorre uma trajetória desigual de modernização e libera
numeroso contingente de trabalhadores para o litoral industrializado. As estimativas indicam que mais de 100 milhões de pessoas
estão em permanente migração na China, constituindo força de trabalho temporária nos polos urbanos e industriais.
A indústria pesada, por sua vez, concentra-se na Manchúria, que dispõe de vastas reservas de carvão mineral e importantes
jazidas de ferro. O complexo estatal de indústrias de base instalado nessa região garante ao país o primeiro lugar na produção
mundial de aço. Contudo, essa área sofre de problemas estruturais de defasagem tecnológica.

5.7 - Países recentemente industrializados


Levando em conta a industrialização ao longo da História, os países emergentes são considerados recém-industrializados
porque neles esse processo teve início cerca de um século e meio depois das nações pioneiras.
Em 2010, apenas as cinco maiores concentravam 62% do valor da produção industrial desse grupo (em 1995 eram 55%),
com grande destaque para a China.
Separamos os países estudados em três grupos distintos: os latino-americanos, que implantaram o modelo de industrialização por
substituição de importações; os Tigres Asiáticos, que criaram plataformas de exportações; e os que pertencem ao Fórum de Diálogo Índia,
Brasil e África do Sul - IBAS. Analisaremos mais detalhadamente os países com produção industrial mais relevante de cada um deles,
respectivamente: Brasil, México e Argentina; Coreia do Sul, Taiwan e Cingapura; Índia e África do Sul.
Entretanto, vale lembrar que atualmente o processo de industrialização, além de se expandir para outros países emergentes
latino-americanos, asiáticos e africanos, tem atingido países de outras regiões do mundo, como o Leste Europeu (com destaque
para a Polônia) e o Oriente Médio (com destaque para a Turquia). Esses dois países vêm recebendo muito investimento de
empresas europeias, principalmente alemãs, que têm montado fábricas em seus territórios para se beneficiar os custos menores
de produção e da proximidade do mercado da União Europeia.

5.7.1 - América Latina: substituição de importações


O processo de industrialização
Embora o processo de industrialização
esteja atingindo outros países da América Latina
(como Venezuela, Colômbia, Chile e Peru), Brasil,
México e Argentina são as maiores, mais
industrializadas e diversificadas economias da
região; por isso vamos aprofundá-los.
Os três países se tornaram independentes
no início do século XIX e, no final dele, iniciaram
lentamente seu processo de industrialização (até
então eram basicamente exportadores de
produtos minerais e agrícolas para os países já
industrializados), que se intensificou somente a
partir da década de 1930. Isso porque, com a crise
de 1929 e a depressão econômica que se seguiu,
os países industrializados passaram a importar
menos, o que fez com que Brasil, México e Argentina tivessem seus níveis de exportação drasticamente reduzidos, o que lhes
dificultou importar diversos produtos industrializados. Essa queda no ingresso de produtos importados acelerou a industrialização
voltada a substituir muitos bens de consumo, principalmente vindos da Europa.
Algumas das primeiras fábricas pertenciam à aristocracia latifundiária, que tinha acumulado capital com as exportações de
produtos agropecuários e passou a investi-los na indústria, no comércio e no sistema financeiro. Os estancieros argentinos (donos
de estancias, grandes propriedades rurais) ganharam muito dinheiro exportando carne e trigo; no Brasil, destacavam-se,
principalmente, os fazendeiros de café, conhecidos como barões do café; e, no México, os proprietários das haciendas (fazendas).
Todos eram grandes latifundiários, com forte influência econômica e política em seu país. Com isso, parte da aristocracia
latifundiária gradativamente se transformou em burguesia industrial e financeira e diversificou suas fontes de lucro, o que explica
como muitos latifúndios, mesmo improdutivos, continuavam nas mãos de seus antigos proprietários. Além disso, parte do dinheiro
dos fazendeiros ficava depositada em bancos e era emprestada para financiar a instalação de indústrias, muitas das quais fundadas
por imigrantes europeus. A inexistência de uma efetiva reforma agrária enquanto se industrializavam, como ocorreu nos países
desenvolvidos, é um dos fatores que explicam a urbanização acelerada e desordenada, a acentuada desigualdade social e a
consequente limitação do mercado interno dos países de industrialização recente da América Latina. O processo de industrialização
não foi acompanhado de políticas sociais e econômicas voltadas à distribuição de renda e maior inserção da população pobre no
mercado de consumo.
Outro agente importante no início da industrialização foi o Estado, que passou a investir em indústrias de bens
intermediários – mineração e siderurgia, petrolífera e petroquímica, etc. – e em infraestrutura – transportes,
telecomunicações, energia elétrica, etc. Na América Latina, os maiores símbolos desse modelo foram as estatais petrolíferas:
Petrobras (fundada em 1954), Pemex (Petróleos Mexicanos, 1934), PDVSA (Petróleos de Venezuela S.A., 1975) e a
argentina YPF (Yacimientos Petrolíferos Fiscales, 1922). Em 2012 todas continuavam sob o controle total ou parcial do
115
Estado, eram tanto as maiores empresas nos respectivos países como, com exceção da YPF, as primeiras colocadas da
América Latina na lista Fortune Global 500 (a YPF foi comprada em 1999 pela espanhola Repsol, mas em 2012 o governo
argentino voltou a controlá-la ao expropriar 51% das ações de um bloco de 57,4% que pertencia à Repsol). Após a Segunda
Guerra, o modelo de industrialização por substituição de importações mostrou suas limitações: carência de maiores volumes
de capitais que permitissem dar continuidade ao processo, inexistência de setores industriais importantes, como a indústria
de bens de capital, e defasagem tecnológica. Foi nessa época que começou a entrada de capitais estrangeiros. As filiais de
empresas transnacionais promoveram expansão de muitos setores industriais nesses países: automobilístico, químico-
farmacêutico, eletroeletrônico, de máquinas e equipamentos e outros, que até então tinham uma produção limitada ou
inexistente. Nos setores tradicionais também entraram grandes empresas alimentícias e têxteis, juntando-se às nacionais já
existentes e, em muitos casos, incorporando-as. Assim, houve um grande avanço no processo de industrialização do Brasil,
do México e da Argentina, o qual passou a se assentar no tripé de capital estatal, nacional e estrangeiro. A entrada das
corporações transnacionais contribuiu para o surgimento de novas empresas nacionais em diversos setores, muitas delas
complementares às estrangeiras: por exemplo, a entrada das empresas automobilísticas estimulou o desenvolvimento de
muitas indústrias nacionais de autopeças.
Esse modelo vigorou também em outros países latino-americanos, como a Venezuela, a Colômbia, o Chile e o Peru,
que, embora tenham menor grau de industrialização, vêm apresentando rápido crescimento econômico neste século, maior
até do que as duas maiores economias da região. Com o tempo, a indústria tornou-se um setor muito importante na economia
do Brasil, do México e da Argentina (e também de outros países da América Latina), com uma significativa participação nos
respectivos PIBs. Os mais importantes complexos industriais estão concentrados nas grandes regiões metropolitanas: no
triângulo São Paulo-Rio de Janeiro-Belo Horizonte, no Brasil; no eixo Buenos Aires-Rosário, na Argentina; e no eixo Cidade
do México-Guadalajara e em Monterrey, no México. Mas há concentrações industriais também na região de Caracas
(Venezuela), Bogotá (Colômbia) e Santiago (Chile). Esses países, embora menos importantes do ponto de vista industrial,
também são classificados como emergentes.
O modelo de substituição de importações incentivou a produção interna de muitos bens de consumo, que deixaram
de ser comprados no exterior, como roupas, calçados, eletrodomésticos, carros, entre outros. Ao mesmo tempo, requeria a
importação de outros bens que não eram produzidos internamente, como máquinas e equipamentos, e exigia a constituição
de uma infraestrutura de transportes, energia e telecomunicações, demandando cada vez mais investimentos. Como a
poupança interna era limitada, esse modelo de industrialização foi muito dependente de capital estrangeiro, e os recursos
externos entravam nesses países como investimento produtivo, por meio da instalação de filiais de transnacionais, ou por
empréstimos contraídos pelos governos e por empresas privadas nacionais.

Crises financeiras e baixo crescimento econômico


No pós-Segunda Guerra, o crescimento econômico do Brasil, do México e da Argentina foi bastante elevado,
estendendo-se até o início dos anos 1980. Como vimos, o desenvolvimento desses países esteve em grande medida
assentado em empréstimos estrangeiros, que a partir dos anos 1970 passaram a ser mais disponíveis no mercado financeiro
mundial. Nessa época, houve um aumento do crédito porque os bancos dos países desenvolvidos passaram a reciclar os
petrodólares, ou seja, a emprestar vultosos recursos depositados pelos países exportadores de petróleo que ganharam muito
dinheiro com a elevação dos preços do barril a partir de 1973. Entre 1974 e 1981, os países da Organização dos Países
Exportadores de Petróleo (Opep) acumularam 360 bilhões de dólares com exportações, e metade desses recursos foi
depositada em bancos dos países desenvolvidos. A grande oferta de dinheiro no mercado financeiro fez as taxas de juros
internacionais caírem após 1973, atingindo o ponto mais baixo entre 1975-1977.
A partir desse período, os países em desenvolvimento, sobretudo os latino-americanos, endividaram-se pesadamente.
Por exemplo, segundo o Banco Central do Brasil, nosso país tinha uma dívida externa total de 8,2 bilhões de dólares em
1971, que saltou para 25,1 bilhões em 1975 (acompanhe os valores subsequentes no gráfico a seguir). O problema é que
os juros não foram fixados nesse patamar e as taxas para a amortização futura da dívida eram flutuantes, isto é, oscilavam
em função do mercado internacional.
Depois do primeiro aumento das taxas de juros, provocado pela crise do petróleo de 1973, houve uma segunda
elevação bem mais forte, com a crise petrolífera de 1979. No final da década de 1970, em consequência de uma política do
governo norte-americano de manutenção de altas taxas de juros para conter a inflação, atrair investimentos e financiar seu
déficit orçamentário e comercial, os Estados Unidos converteram-se no principal receptor de dinheiro no mundo. Assim, além
de sobrarem poucos recursos para os países em desenvolvimento, ainda houve uma elevação artificial de suas dívidas.
Como consequência disso, houve uma explosão do endividamento dos países latino-americanos.
O primeiro grande sinal da crise foi dado em 1982, quando o México decretou a moratória de sua dívida externa. Daquele
momento em diante, aprofundou-se nesses três países a política do “exportar é o que importa”, visando à obtenção de moeda forte,
sobretudo dólares, para o pagamento dos juros da dívida. No entanto, esse esforço acabou contribuindo para baixar os preços dos
produtos primários, na época majoritários em suas exportações, reduzindo a entrada de receitas em moeda estrangeira.
Ao mesmo tempo, os governos mantinham uma política de contenção de importações de produtos industrializados. Tal
medida provocou o sucateamento dos parques produtivos, dada a dificuldade de comprar máquinas e equipamentos necessários
à sua modernização.
A combinação de altas taxas de juros (maior endividamento) com baixos preços de produtos de exportação (menores
receitas) só podia resultar, para muitos países, em uma grave crise econômica. A crise da dívida atingiu os países em
116
desenvolvimento em geral, mas em particular os latino-americanos, os mais endividados. Assim, para esses países, os anos
1980 ficaram conhecidos como a “década perdida”: suas economias sofreram com baixo crescimento e elevada inflação.
Esse modelo econômico provocou forte concentração de renda, sobretudo no Brasil (segundo o Banco Mundial, em
1989 os 10% mais ricos da população se apropriavam de 51,3% da renda nacional, enquanto os 10% mais pobres detinham
apenas 0,7%), porque se assentava em baixos salários pagos aos trabalhadores, o que restringiu a expansão do mercado
interno e, como consequência, o próprio processo de industrialização. Paradoxalmente, o modelo que visava substituir
importações, ou seja, ter autonomia para suprir o mercado interno, acabou limitando-o. Os bens de consumo produzidos,
notadamente automóveis e produtos eletrônicos, eram voltados apenas para pequena parcela da população.
A década de 1990 foi marcada pela estabilização das economias dos países latino-americanos. A redução da inflação
foi alcançada após a implantação de medidas como o controle dos gastos públicos, a privatização de empresas estatais e a
abertura econômica para produtos e capitais estrangeiros. Essas medidas mudaram a modalidade de endividamento externo
e melhoraram o desempenho da economia, entretanto, as crises continuaram ocorrendo, agora no contexto da globalização
financeira.
Com os avanços tecnológicos na informática e nas telecomunicações, ampliaram-se as possibilidades de
investimentos no mercado mundial. Há diversas modalidades de investimentos de capitais no sistema fi- nanceiro
globalizado, destacando-se as ações, os títulos da dívida pública e as moedas estrangeiras.
Além do mercado acionário, que cresceu de forma significativa, uma das modalidades de investimento especulativo
mais difundidas na atual globalização financeira é a compra e a venda de títulos da dívida pública. A emissão desses títulos
pelos governos é uma forma de os países tomarem dinheiro emprestado. Ao comprá-los, os investidores – em geral bancos
ou corretoras que fazem a intermediação entre pessoas e empresas que aplicam no mercado financeiro – emprestam
dinheiro ao Estado, que terá de pagar juros pelo empréstimo.
O problema do capital especulativo é que ele é volátil, ou seja, não cria raízes, transferindo-se rapidamente de um
setor, ou mesmo de um país, para outro, e por isso gera poucos empregos. Além disso, tende a fragilizar as economias dos
países porque os operadores das empresas financeiras muitas vezes retiram o dinheiro no momento em que aqueles mais
precisam de capital. Essa foi a origem das crises financeiras de diversos países emergentes ao longo da década de 1990.
Vejamos o caso mais emblemático: o do México.

A CRISE MEXICANA DE 1994-1995


O México havia sido o primeiro país a sucumbir à crise da dívida na década de 1980 e foi novamente o primeiro a
sucumbir à globalização financeira da década seguinte. A crise de 1994-1995 deveu-se à saída de capitais especulativos,
reduzindo rapidamente as reservas de dólares do país, o que provocou instabilidade em suas contas externas e
desvalorização da moeda nacional (o peso). Um dos problemas mais graves da economia mexicana era o desequilíbrio
crescente em sua balança comercial: em 1990, o déficit no comércio exterior foi de US$3 bilhões; em 1992, tinha atingido
US$20 bilhões. Para fechar seu balanço de pagamentos, o governo mexicano passou a recorrer a capitais especulativos por
meio do aumento da taxa de juros de seus títulos públicos. Em 1992, entraram US$16 bilhões; em 1993, US$18 bilhões, e
a partir daí começou a haver evasão de capitais.
O início das operações dos guerrilheiros do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), em janeiro de 1994,
somou a instabilidade política aos desequilíbrios econômicos pelos quais o país passava. Assim, criou-se um ambiente de
profunda insegurança que acabou afugentando os investidores de curto prazo. Estes passaram a vender seus bônus do
Tesouro e a retirar o dinheiro do México, levando o país a uma grave crise econômica que o obrigou a recorrer ao FMI para
fechar seu balanço de pagamentos. Houve acentuada queda do crescimento econômico e aumento da inflação, do
desemprego e da dívida externa. O país só começou a se recuperar dessa crise a partir de 1996.
Crises semelhantes à mexicana, associadas a saídas maciças de capitais especulativos de países que apresentam
desequilíbrios em seus balanços de pagamentos, ocorreram também no Brasil em janeiro de 1999 e na Argentina em 2001-
2002.
A crise financeira iniciada nos Estados Unidos em 2008 se espalhou pelo mundo em 2009 e atingiu mais fortemente
os países desenvolvidos, mas também provocou consequências nos países emergentes.
Dos três principais emergentes da América Latina, o México foi o mais atingido por essa nova crise financeira, devido
à sua forte dependência econômica em relação aos Estados Unidos. Desde a criação do Tratado Norte-Americano de Livre
Comércio (Nafta, em inglês) em 1994, cresceu a participação do mercado norte-americano nas exportações mexicanas,
atingindo cerca de 80%. Com a crise, os déficit comerciais do México, que já vinham se acumulando, aumentaram
significativamente.
O Brasil foi um dos países da América Latina menos atingidos pela crise de 2008/2009, em grande parte em razão
dos saldos comerciais favoráveis e do grande acúmulo de reservas internacionais ao longo dos anos 2000, como mostram
as tabelas a seguir. Pela primeira vez numa crise financeira mundial não houve fuga maciça de capitais do Brasil. O Banco
Central, em vez de subir a taxa de juros para tentar conter a evasão de capitais estrangeiros, baixou-a, seguindo a tendência
internacional, para estimular a recuperação da economia. Quando a crise se agravou, em outubro de 2008, a taxa de juros
era de 13,75% ao ano e, em julho de 2009, caiu para 8,75% (em outubro de 2012 estava em 7,25%).

117
5.7.2 - Tigres asiáticos: plataforma de exportações
A origem dos Tigres
Coreia do Sul, Taiwan e Cingapura não eram muito diferentes da maioria de seus vizinhos asiáticos até a Segunda
Guerra Mundial. Os dois primeiros, de maior extensão territorial, eram países agrícolas, cuja população, em sua maioria,
vivia no campo e desenvolvia uma agricultura arcaica, com predomínio do cultivo de arroz. Todos tinham população pouco
numerosa, em sua maioria analfabeta, território reduzido, sem nenhuma reserva importante de recursos minerais ou
combustíveis fósseis, portanto, um futuro econômico que não lhes parecia muito promissor. No entanto, atualmente possuem
algumas das economias mais dinâmicas e modernas do mundo. Como isso aconteceu?

A península da Coreia, como a ilha de Taiwan, foi ocupada pelo Japão desde o fim da Guerra Sino-Japonesa (1894-
1895) até o fim da Segunda Guerra Mundial.
A península da Coreia foi dividida após a Segunda Guerra, dando origem a dois países: a Coreia do Norte, socialista,
e a Coreia do Sul, capitalista. Ao fim da guerra travada entre elas, de 1950 a 1953, a península continuou dividida. Enquanto
a Coreia do Norte tornou-se um dos países mais isolados e atrasados do mundo, a Coreia do Sul se transformou na maior
economia dos quatro Tigres e quarta da Ásia.
Taiwan (ou República da China), com capital em Taipé, constituiu-se como Estado a partir da fuga dos membros do
Partido Nacionalista (Kuomintang), após a Revolução de 1949, como vimos no capítulo anterior.
Cingapura era um entreposto comercial da Companhia Britânica das Índias Ocidentais desde 1824. Essa pequena
ilha, depois de pertencer ao Império Britânico, integrou a Federação da Malásia, mas sua independência definitiva ocorreu
apenas em 1965, quando foi constituída a República de Cingapura.
Durante a Segunda Guerra, todos esses territórios estiveram sob ocupação japonesa. Após a guerra, sobretudo a
partir dos anos 1970, eles passaram por um acelerado processo de industrialização, favorecido pela lógica da Guerra Fria:
fizeram parte de um arco de alianças liderado pelos Estados Unidos para fazer frente ao avanço sino-soviético e receberam
apoio financeiro desse país. Nas décadas de 1980 e 1990, apresentaram alguns dos maiores índices de crescimento
econômico do mundo e, desde essa época, suas economias estão entre as que mais têm incorporado novas tecnologias ao
processo produtivo. Além disso, vêm diminuindo as desigualdades sociais e melhorando seus indicadores socioeconômicos.
Desde os anos 1980, ficaram conhecidos como Tigres Asiáticos (junto de Hong Kong), porque o forte empenho na busca de
novos mercados no exterior levou suas economias a crescer, em média, 7,4% ao ano. Resultado do modelo de plataforma
de exportações, cujas características veremos em seguida: em 1965, nos primórdios do processo de industrialização de
cada um desses três territórios, eles detinham uma participação de cerca de 1% do comércio mundial; em 2010, segundo a
OMC, essa participação atingiu 7%.

Industrialização e crescimento acelerado


Nos Tigres Asiáticos foram implantados regimes políticos centralizadores após a Segunda Guerra, e os dois países mais
importantes - Coreia e Taiwan - eram governados por ditaduras militares. Nessa época, o Estado teve papel fundamental no
planejamento estratégico para estimular a industrialização e as exportações. Entre outras medidas:
• concedeu incentivos às exportações, como redução de impostos;
• manteve uma política de desvalorização cambial;
• tomou medidas protecionistas (elevação de tarifas de importação) contra os concorrentes estrangeiros;
• investiu pesadamente em educação e concedeu bolsas de estudos no exterior;
• impôs restrições ao funcionamento dos sindicatos;
• fez grandes investimentos em infraestrutura de transporte, energia, etc.;
• restringiu o consumo para elevar o nível de poupança interna via medidas fiscais (elevação de impostos) e controle das
importações.

118
O alto nível de poupança interna desses
países, aliado à ajuda financeira recebida do Tesouro
dos Estados Unidos no contexto da Guerra Fria, mais
empréstimos contraídos em bancos no exterior (a
taxas de juros fixas) possibilitaram a arrancada da
industrialização.
No início da industrialização, a mão de obra
nesses países asiáticos era muito barata e
relativamente qualificada e produtiva, por causa do
bom nível educacional. Esse baixo custo, associado
às medidas governamentais, como os subsídios às
exportações e o controle da política cambial, tornava
os produtos dos Tigres muito baratos. Isso lhes
garantiu alta competitividade no mercado mundial e,
portanto, elevados saldos comerciais, os quais eram
reinvestidos a fim de alcançar maior capacitação
tecnológica.
Vale destacar que, desde os primórdios de seu processo de industrialização, as sociedades dos Tigres Asiáticos perceberam
a importância de investir em educação, principalmente no nível básico, como condição fundamental para a formação de
trabalhadores e pesquisadores qualificados, a geração de novas tecnologias e o aumento da produtividade. Principalmente a Coreia
do Sul, a maior e mais moderna economia entre os Tigres, desde o início deu muito valor à educação básica e a tomou como
suporte para seu desenvolvimento socioeconômico. O país sempre vem aparecendo nas primeiras posições no Programa
Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa). Esse exame é realizado desde 2000 pela Organização de Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE) para avaliar conhecimentos e habilidades essenciais dos alunos de 15 anos (em tese,
concluintes do Ensino Fundamental). Dele participam os membros da OCDE e alguns países convidados, como o Brasil, que
sempre tem ocupado as últimas posições.
Ao contrário dos países latino-americanos e africanos, os Tigres Asiáticos tinham um vizinho com um modelo bem-sucedido
em que se espelhar: seguiram de maneira quase integral os passos do Japão. Além disso, se beneficiaram de uma conjuntura
mundial liberal, principalmente nos Estados Unidos, dispondo, assim, de amplos mercados para colocar seus produtos, o que os
ajudou a se converterem em plataformas de exportação. Durante muito tempo esses países foram conhecidos como exportadores
de produtos de baixa qualidade e de tecnologia banal, mas hoje estão vendendo produtos sofisticados de alto valor agregado,
como navios, automóveis, semicondutores, computadores, tablets, smartphones, etc. Mais recentemente, o aumento da renda per
capita, e a elevação salarial, resultante do crescimento da produtividade da economia, ocasionaram uma expansão quantitativa e
qualitativa dos mercados internos, sobretudo na Coreia do Sul. Esse país, além de ser o mais populoso dos quatro, é também
aquele no qual os trabalhadores recebem os salários mais elevados (embora ainda seja metade do que ganham norte-americanos
e japoneses).
Deve-se salientar que a elevação dos custos da mão de obra e a valorização de suas moedas têm levado esses países,
novamente seguindo os passos do Japão, a aprimorar suas indústrias. Os Tigres têm investido em novos setores industriais, mais
avançados tecnologicamente, transferindo indústrias tradicionais e intensivas em mão de obra para outros países da região, onde
o custo da força de trabalho é menor. Assim como investidores japoneses, norte-americanos e europeus, os empresários dos
Tigres também têm construído filiais na Tailândia, na Malásia e na Indonésia, que, como os primeiros Tigres, também cresceram
aceleradamente, de 1980 a 2010, conforme se pode constatar pelos dados da tabela a seguir. Por isso esses três países são
conhecidos como os Novos Tigres. Há ainda muitos investimentos sendo feitos na China, sobretudo por empresários de origem
chinesa com empresas sediadas em Taiwan e Cingapura.
Apesar de muitos pontos em comum, principalmente quanto ao processo de industrialização, há grandes diferenças entre
esses países, em particular quanto à estrutura industrial.
A Coreia do Sul é o país mais industrializado dos Tigres Asiáticos, e sua economia é controlada por redes de grandes
empresas, denominadas chaebols, a exemplo dos keiretsus japoneses. Fabricam uma enorme diversidade de produtos, desde
aço e navios até artigos eletrônicos e automóveis, além de também atuarem no setor financeiro e no comércio. Os chaebols sul-
coreanos cada vez mais colocam seus produtos mundo afora, figuram na lista das maiores empresas do mundo e já são
responsáveis por algumas inovações tecnológicas. Entre eles se destacam: a Samsung Electronics (a maior empresa do país e
20ª do mundo, de acordo com a The Global 500, 2012), a SK Holdings, a Hyundai Motor, a LG Electronics e a Hyundai Heavy
Industries (todas na lista da revista Fortune).
As maiores concentrações industriais na Coréia do Sul estão no litoral, nas proximidades de portos, como Busan, o maior
do país e um dos maiores do mundo. Essa localização favorece a chegada de matérias-primas agrícolas, minerais e fósseis, com
forte presença na pauta de importações (segundo o Banco Mundial, 44% em 2010), e a saída de produtos industrializados,
majoritários na pauta de exportações (89% em 2010).
Taiwan tem seis empresas na lista da Fortune Global 500 2012; a maior delas é a Hon Hai Precision Industry (a 43ª do
mundo). Essa empresa é detentora da marca Foxconn, que produz motherboards (placas-mãe), notebooks, tablets e smartphones
para diversas marcas ocidentais, entre as quais a norte-americana Apple. Estão sediadas no país mais duas empresas do setor
microeletrônico que estão entre as quinhentas maiores: Quanta Computer e Compal Electronics. A especialização das empresas
taiwanesas lhes permite agilidade e flexibilidade para se adaptarem às inovações tecnológicas, assegurando-lhes maior
competitividade. Cingapura transformou-se num dos maiores entrepostos comerciais do mundo e importante centro financeiro
asiático. Em 2012, o país apresentava o melhor índice de desempenho em logística do mundo, como vimos no capítulo 6, e em
119
2010 possuía o segundo porto mais movimentado do planeta. Além disso, tem procurado investir em indústrias de alto valor
agregado, como a naval e a eletrônica. Está sediada no país a Flextronics International, segunda fabricante mundial de
componentes eletrônicos, atrás apenas da Foxconn.

Diferenças entre o modelo asiático e o latino-americano


“A diferença entre o modelo asiático, se se pode chamar assim, e o modelo latino-americano, é que o modelo asiático
é construído sobre poupança interna e mercado externo, enquanto o modelo latino-americano é construído sobre poupança
externa e mercado interno.” Essa frase de Celso Amorim, Ministro das Relações Exteriores do Brasil de 2003 a 2010, sintetiza
bem as diferenças estruturais entre o modelo econômico baseado em substituição de importações e o modelo que se apoiou
em exportações. Entretanto, não expressa que o modelo asiático, ao investir em educação e garantir melhor distribuição de
renda, possibilitou, mais do que o latino-americano, a constituição de um amplo mercado interno. A exclusão social foi uma
das piores decorrências do modelo econômico implantado na América Latina.
Outra diferença importante é que o modelo asiático, ao apoiar o desenvolvimento em poupança interna e implantar
um Estado eficiente, mantendo as contas públicas controladas, permitiu, bem antes dos países da América Latina, maior
crescimento econômico com a inflação sob controle. A inflação alta foi durante muito tempo um perverso mecanismo de
concentração de renda nos países da América Latina, mesmo quando a economia cresceu. Como vimos, o modelo asiático,
em comparação com o latino-americano, propiciou maiores taxas de crescimento econômico, maior elevação e melhor
distribuição da renda per capita, consequentemente, assegurou maior alta do índice de desenvolvimento humano.

5.7.3 - Países do fórum IBAS


O Fórum de Diálogo IBAS é uma cooperação trilateral firmada em 2003 entre três importantes países emergentes:
Índia, Brasil e África do Sul. Seu objetivo é aprofundar a cooperação Sul-Sul no âmbito econômico, científico e cultural e
aumentar o poder de negociação com os países desenvolvidos nos organismos internacionais, como a ONU e a OMC.
Apesar de se localizarem em continentes diferentes, esses países apresentam muitas características comuns e por
isso buscam uma aproximação. Segundo o próprio Fórum: “Índia, Brasil e África do Sul procuram, principalmente a partir da
década de 1990, elevar seu perfil internacional a partir de atributos cuja semelhança, por si só, justifica a maior aproximação
entre os três países: são potências
intermediárias, com forte influência
em suas respectivas regiões,
democracias consolidadas e
economias em ascensão e que, dadas
as evidentes desigualdades internas,
confrontam desafios comuns de
desenvolvimento”.
O modelo de industrialização
desses dois países emergentes se
aproxima do vigente no Brasil:
também visou à substituição de
importações e teve (e ainda tem) forte
presença do Estado na economia.

ÍNDIA
A Índia, um dos mais importantes países emergentes, possui uma das economias que mais cresce no mundo,
ancorada em seu gigantesco mercado consumidor: é a 2ª população do planeta (superada apenas pela chinesa; veja a
tabela acima). Segundo o Banco Mundial, o país cresceu em média 8% ao ano no período 2000-2010 (só ficou atrás da
China). Entretanto, iniciou seu processo de industrialização muito tarde, somente após a Segunda Guerra, quando se libertou
do domínio do Reino Unido.
Em 1947, depois de longa campanha sob a liderança de Mohandas Gandhi (1869-1948), mais conhecido como
Mahatma (‘grande alma’, em sânscrito), o país obteve sua independência política. O partido Congresso Nacional Indiano
(Indian National Congress, INC), de maioria hindu, assumiu o poder, tendo como primeiro-ministro outro importante líder do
movimento de independência, Jawarhalal Nehru (1889-1964), que governou até sua morte. Seu partido, porém, permaneceu
no poder até 1996, quando o Partido do Povo Indiano (Bharatiya Janata Party, BJP) venceu as eleições. O país é uma
república parlamentarista, e os indianos gabam-se de ser a maior democracia do mundo, como aparece no próprio slogan
do INC: “O maior partido democrático do mundo”.
Sob o governo de Nehru, a Índia teve uma forte participação do Estado no início de seu processo de industrialização,
embora houvesse também capitais britânicos e norte-americanos. Como se tratava de um governo do grupo dos países não
alinhados, contou também com a assistência técnica soviética em diversos setores, como o petroquímico e o bélico. O Estado
investiu principalmente na indústria de bens intermediários, na indústria bélica e em obras de infraestrutura. Contribuíram
ainda para o processo de industrialização as grandes reservas de minérios, como cromo (2º produtor mundial), ferro (4º) e
manganês (5º), e de combustíveis fósseis, principalmente o carvão mineral, sua principal fonte de energia. Em 2011, o país
extraiu de suas minas 586 milhões de toneladas de carvão mineral (7,5% de toda a produção do planeta), sendo o terceiro
120
produtor mundial. Em 2011, as reservas de petróleo eram de cerca de 9 bilhões de barris (19ª do planeta), e sua produção
era de 897 mil barris diários (23º produtor mundial). A produção interna equivalia a apenas 27% do consumo/dia, tornando
o país um grande importador desse combustível fóssil.
As maiores concentrações industriais do país estão no nordeste do território indiano, em torno de cidades como
Janshedpur e Kolkata (Calcutá), com destaque para indústrias pesadas, como siderúrgicas, mecânicas, carbo e
petroquímicas, em razão das reservas de carvão, petróleo e minérios. Mas há concentrações industriais em outras regiões,
inclusive de alta tecnologia, como em Bangalore, no sul do país.
A Índia dispõe de um parque fabril diversificado, com praticamente todos os setores industriais, e, também, já possui
algumas empresas entre as maiores do mundo, com destaque para a Indian Oil (maior do país e 83ª do mundo na lista da
Fortune Global 500 2012). A empresa atua em extração, transporte e refino de petróleo e também no setor petroquímico. Foi
criada em 1959, no governo de Nehru, com o objetivo estratégico de sustentar o desenvolvimento industrial do país e garantir
o abastecimento de petróleo e derivados. A Indian Oil é o símbolo maior da intervenção estatal no processo de
industrialização da Índia (como é a Petrobras, no Brasil) e até hoje é controlada pelo governo central, que em 2012 detinha
78,9% das ações da companhia.
Outras duas grandes empresas indianas são a Tata Motors e a Tata Steel (314ª e 401ª na lista das 500 maiores em
2012); ambas pertencem ao Grupo Tata, cujo controle está nas mãos do bilionário Ratan N. Tata. Esse gigantesco
conglomerado é composto de 94 empresas que atuam em mais de oitenta países nos mais diversos setores industriais:
siderúrgico, químico, automobilístico, aeroespacial, informática, entre outros; assim como também nos serviços e nas
finanças.

Um país de profundos contrastes


Apesar de a Índia possuir um parque industrial diversificado, em 2010 este ocupava somente 14% da PEA e produzia
26% do PIB. O país continua sendo essencialmente rural e agrícola: em 2010, 69% de sua população ainda vivia no campo,
e a agricultura ocupava 52% da PEA, mas contribuía com somente 19% do PIB. Os serviços ocupavam apenas 34% da
PEA, mas contribuíam com 55% do PIB e, atualmente, é o setor da economia indiana que mais cresce e se moderniza.
Esses dados indicam – e veremos mais elementos que os corroboram – que a Índia é um país marcado por profundos
contrastes socioeconômicos. Ultimamente, dentro de um processo de abertura ao capital estrangeiro combinado com uma
política de desregulamentação e de privatização, a Índia tem atraído muitos investimentos externos, com destaque para
capitais norte-americanos. Um dos fatores que mais têm contribuído para isso, além da mão de obra barata e cada vez mais
qualificada, é o mercado interno em crescimento. Apenas pequena parcela da população indiana é de fato consumidora, já
que a maior parte dela está abaixo da linha internacional de pobreza (em 2010, segundo o Banco Mundial, 68,7% dos
indianos viviam na pobreza, com menos de 2 dólares por dia, e 32,7% na extrema pobreza, com menos de 1,25 dólar por
dia). Porém, mesmo que somente um quarto dos indianos tenha efetivamente capacidade de consumo, isso corresponde a
pouco mais de 300 milhões de pessoas, o que equivale a uma vez e meia a população brasileira. Com a modernização e o
rápido crescimento econômico, a parcela da população pertencente à classe média vem se ampliando.
Na Índia, o moderno e o arcaico, a opulência e a miséria convivem lado a lado. Enquanto é imensa a legião de pobres,
sua economia é uma das que mais cresce no mundo desde a década de 1990, e cada vez mais dispõe de indústrias e
serviços de alta tecnologia, como informática (software e hardware), tecnologias da informação e comunicação (TI) e
biotecnologia. O país é um dos maiores exportadores mundiais de softwares e de produtos da área de TI e possui algumas
das mais importantes empresas mundiais que atuam nesses setores, concentradas sobretudo em torno do parque
tecnológico de Bangalore. Além disso, muitas corporações dos Estados Unidos e do Reino Unido têm terceirizado seus
serviços de atendimento telefônico ao consumidor e de telemarketing, deixando-os sob responsabilidade de empresas
indianas. A mão de obra barata compensa o custo da ligação telefônica internacional, que tem caído com o avanço
tecnológico.
Bangalore é um dos mais importantes parques tecnológicos do mundo. A cidade abriga diversas universidades e
centros de pesquisa, a maioria do governo indiano, entre os quais se destacam: Universidade de Bangalore, Instituto Indiano
de Ciência, Instituto Internacional de Tecnologia da Informação e Organização Indiana de Pesquisa Espacial. Em torno deles
se desenvolveram diversas empresas nacionais (estatais e privadas) de alta tecnologia - Industan Aeronautics (aeronáutica),
Infosys (softwares), Tata Technologies (softwares), Wipro Technologies (TI), entre muitas outras - e ao mesmo tempo se
instalaram na região filiais de praticamente todas as maiores e mais conhecidas corporações transnacionais desses setores.
Somando as empresas nacionais e as estrangeiras, há mais de trezentas companhias dos setores de informática e de TI
instaladas em Bangalore, que por isso ficou conhecida como o “Vale do Silício” da Índia.
“Qualquer empresa que não exija presença física pode funcionar em co-sourcing [terceirização].” Isso me foi dito por
Azim Premji, presidente da Wipro, na sede da empresa, em Bangalore. A Wipro é uma das maiores companhias indianas
que trabalha com terceirização no exterior. A Índia tornou-se uma importante fonte de mão de obra qualificada de baixo
custo, com um corpo de trabalhadores altamente habilitados e que falam inglês, capazes de competir com os melhores,
especialmente em tecnologia e ciência, ganhando apenas uma fração do que um trabalhador semelhante ganha nos EUA e
na Europa. [...]
A Índia está se tornando um centro importante de pesquisa e desenvolvimento para um grande número de companhias
multinacionais. A IBM investiu quase 2 bilhões de dólares no país nos últimos quatro anos e pretende triplicar essa soma,
chegando a 6 bilhões nos próximos dois anos. Atualmente a IBM tem 43 mil empregados na Índia, de um total de 330 mil no
121
mundo inteiro. A Intel vai investir US$1 bilhão na Índia nos próximos cinco anos; a Cisco, outro US$1,1 bilhão. A Microsoft
investirá US$1,7 bilhão e contratará mais 3 mil empregados. [...]
Em 2003, o grupo The Indus Enterpreneur (TIE) calculou que 15 mil a 20 mil indianos deixaram o Vale do Silício e
voltaram para sua terra. Amar Babu, da Intel Índia, disse-me que cerca de 15% dos empregados da Intel em Bangalore são
indianos que voltaram dos EUA. Muitos do que retornam de lá estão imbuídos de boa dose de empreendedorismo. Eles
usam sua capacidade empresarial e seu dinheiro para criar novas empresas na Índia. Alguns moram lá, outros estão
começando novas companhias em solo indiano, embora continuem morando nos Estados Unidos. Outros, ainda, voam tanto
que não sabem mais onde moram.”
KAMDAR, Mira. Planeta Índia: a ascensão turbulenta de uma nova potência global. Rio de Janeiro: Agir, 2008. p. 27-29.

ÁFRICA DO SUL
O processo de industrialização da África do Sul se intensificou a partir da independência política, em 1961 (como a
Índia, também foi colônia do Reino Unido), e contou com uma forte participação de capitais estrangeiros, predominantemente
norte-americanos e britânicos. Os investimentos externos distribuíram-se por vários setores, com destaque para a indústria
extrativa, enquanto os estatais concentraram-se na indústria de bens intermediários e em obras de infraestrutura. Hoje o
parque industrial sul-africano é diversificado, como mostra o mapa da página seguinte.
Embora a África do Sul seja a maior economia do continente africano e possua importantes empresas nacionais
(estatais e privadas), nenhuma delas consta na lista das 500 maiores do mundo. Também não há nenhuma empresa da
África na lista da revista Fortune. Isso é um dos indicadores da baixa concentração de capitais em suas empresas e da
limitação do mercado interno dos países africanos. Em 2011, o PIB da África do Sul, apesar de corresponder a 33% do
produto bruto de toda a África subsaariana (nessa região há 47 países), equivalia a 91% do PIB argentino ou a 16% do
brasileiro.
Os fatores que mais contribuíram para a industrialização da África do Sul foram a disponibilidade de mão de obra
barata – os trabalhadores negros eram super explorados – e as enormes reservas minerais e energéticas. No início do
processo eles serviram para atrair investimentos estrangeiros, mas com o aumento da pressão internacional contra o
apartheid, principalmente a partir dos anos 1980, muitas empresas transnacionais deixaram de investir no país.
Além das pressões externas, muitos líderes sul-africanos lutaram contra o regime segregacionista, entre os quais o
mais conhecido é Nelson Mandela. Ele foi o maior líder do Congresso Nacional Africano, o mais antigo grupo antiapartheid
(fundado em 1912) e o partido político atualmente no poder (2012). Com a introdução do voto secreto e universal em 1994,
Mandela, recém-saído da prisão, foi eleito o primeiro presidente negro do país.
Apesar da extinção do regime do apartheid, a desigualdade socioeconômica permanece. A África do Sul é um dos
países com pior distribuição de renda no mundo: segundo o relatório 2012 do Banco Mundial, os 10% mais ricos se apropriam
de 51,7% da renda nacional, e os 10% mais pobres, de 1,2%. Segundo o mesmo relatório, 31,3% da população vivem na
pobreza (com menos de 2 dólares/dia) e 13,8%, na extrema pobreza (com menos de 1,25 dólar/dia). A maioria da população
pobre é composta de negros, por isso, políticas de ação afirmativa têm sido postas em prática por sucessivos governos
desde Mandela para compensar essa desigualdade.
A concentração da renda nacional e a população relativamente pequena (quatro vezes menor que a brasileira e 24
vezes menor que a indiana) restringem o mercado interno e inibem uma expansão mais acelerada do PIB sul-africano.
Embora nos anos 2000 tenha aumentado a taxa de crescimento econômico em relação à década anterior, na qual o país
estava saindo do apartheid, não chegou a apresentar um desempenho tão elevado como o da Índia, embora tenha superado
o do Brasil. Segundo o Banco Mundial, na década de 1990, o PIB da África do Sul cresceu em média 2,1% ao ano, e, no
período 2000-2010, quase dobrou, foi para 3,9%.

6. - BRASIL: modelo econômico, dinâmicas territoriais e o espaço industrial


6.1 - Origens da industrialização brasileira
Embora a industrialização brasileira tenha começado de forma incipiente na segunda metade do século XIX, período
em que se destacaram importantes empreendedores, como o barão de Mauá, no eixo São Paulo-Rio de Janeiro, e Delmiro
Gouveia, em Pernambuco, foi principalmente a partir da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) que o país passou por um
processo significativo de desenvolvimento industrial e de maior diversificação do parque fabril. Isso porque houve uma
redução da entrada de mercadorias estrangeiras no Brasil por causa do conflito na Europa.
Em 1919, as fábricas de tecidos, roupas, alimentos, bebidas e fumo (indústrias de bens de consumo não duráveis)
eram responsáveis por 70% da produção industrial brasileira; em 1939, no início da Segunda Guerra Mundial, essa
porcentagem havia sido reduzida para 58% por causa do aumento da participação de outros produtos, como aço, máquinas
e material elétrico. Contudo, a industrialização brasileira ainda contava, predominantemente, com indústrias de bens de
consumo não duráveis e investimentos de capital privado nacional.
Apesar da importância do desenvolvimento do setor industrial e do setor agrícola na economia brasileira, as atividades terciárias
(como serviços, comércio, energia, transportes e sistema bancário) apontavam índices de crescimento econômico superiores aos das
atividades agrícolas e industriais. Isso porque é no comércio e nos serviços que circula toda a produção agrária e industrial. A agricultura
cafeeira – principal atividade econômica nacional até então – exigia a implantação de uma eficiente rede de transportes, e assim as
ferrovias foram se desenvolvendo no país para escoar a produção do interior para os portos. Também se estabeleceu um sistema bancário
integrado à economia mundial e um comércio para atender às necessidades crescentes nas cidades.

122
Apesar de ter passado por importantes períodos de crescimento como o da Primeira Guerra, a industrialização
brasileira sofreu seu maior impulso a partir de 1929, com a crise econômica mundial decorrente da quebra da Bolsa de
Valores de Nova York. Principalmente na região Sudeste do Brasil, essa crise se refletiu na redução do volume de
exportações de café e na perda da importância dessa atividade no cenário econômico, o que contribuiu para a diversificação
da produção agrícola brasileira.
Outro acontecimento que contribuiu para o desenvolvimento industrial foi a Revolução de 1930, que desalojou a oligarquia
agroexportadora paulista do poder e abriu novas possibilidades político-administrativas em favor da industrialização, uma vez que
o grupo que tomou o poder com Getúlio Vargas era nacionalista e favorável a tornar o Brasil um país industrial. Apesar disso, a
agricultura continuou responsável pela maior parte das exportações brasileiras até a década de 1970.
A partir da crise de 1929, as atividades industriais passaram a apresentar índices de crescimento superiores aos das
atividades agrícolas. O colapso econômico mundial diminuiu a entrada de mercadorias estrangeiras que poderiam competir com
as nacionais, incentivando o desenvolvimento industrial.
É importante destacar que o café permitiu a acumulação de capitais que serviram para implantar toda a infraestrutura
necessária ao impulso da atividade industrial. Os barões do café, que residiam nos centros urbanos, sobretudo na cidade de
São Paulo, para cuidar da comercialização da produção nos bancos e investir na Bolsa de Valores, aplicavam enorme
quantidade de capital no sistema financeiro, capital esse que ficou em parte disponível para a implantação de indústrias e
infraestrutura. Todas as ferrovias, construídas com a finalidade principal de escoar a produção cafeeira para o porto de
Santos, interligavam-se na capital paulista e constituíam um eficiente sistema de transporte. Havia também grande
disponibilidade de mão de obra imigrante que foi liberada dos cafezais pela crise ou que já residia nas cidades, além de
significativa produção de energia elétrica. Além desses fatores, o colapso econômico mundial causou a diminuição da
entrada de mercadorias estrangeiras, que poderiam competir com as nacionais.
A associação desses fatores constituiu a semente do processo de industrialização, que passou a germinar
notadamente na cidade de São Paulo, onde havia maior disponibilidade de capitais, trabalhadores qualificados e a
infraestrutura básica a que nos referimos. Regiões dos estados do Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais também
intensificaram seus processos de industrialização.
Na instalação de novas indústrias predominava, com raras exceções, o capital de origem nacional, acumulado nas
atividades agroexportadoras. A política industrial comandada pelo governo federal era a de substituir as importações, visando
à obtenção de um superavit cada vez maior na balança comercial e no balanço de pagamentos, para permitir um aumento
nos investimentos nos setores de energia e transportes.

O governo Vargas e a política de “substituição de importações”


Getúlio Vargas, que governou o país pela primeira vez de 1930 a 1945, foi o presidente empossado pela Revolução
de 1930, de cunho modernizador. Até então, o mundo capitalista acreditava no liberalismo econômico, ou seja, que as forças
do mercado deveriam agir livremente para promover maior desenvolvimento e crescimento econômico. Com a crise, iniciou-
se um período em que o Estado passou a intervir diretamente na economia para evitar novos sobressaltos do mercado. Essa
prática de intervencionismo estatal na economia seguiu o modelo proposto pelo keynesianismo.
De 1930 a 1956, a industrialização no país caracterizou-se por uma estratégia governamental de implantação de
indústrias estatais nos setores de bens de produção e de infraestrutura: siderurgia (Companhia Siderúrgica Nacional – CSN),
extração de petróleo e petroquímica (Petrobras) e bens de capital (Fábrica Nacional de Motores – FNM, que, além de
caminhões e automóveis, fabricava máquinas e motores), e também da extração mineral (Companhia Vale do Rio Doce –
CVRD) e da produção de energia hidrelétrica (Companhia Hidrelétrica do São Francisco – Chesf). A implantação desses
setores industriais e de infraestrutura estratégica necessitava de investimento inicial muito elevado. Como essas atividades
na época eram pouco atraentes ao capital privado, fosse ele nacional ou estrangeiro, porque o retorno do capital investido
era muito lento, o Estado se incumbiu de realizar esses investimentos.
Portanto, nesse período, a ação do Estado foi decisiva para impulsionar e diversificar os investimentos no parque
industrial do país, combatendo os principais obstáculos ao crescimento econômico. Além de fornecer os bens de produção
e os serviços de que os industriais privados necessitavam em suas indústrias de bens de consumo, o Estado os fornecia a
preços mais baixos do que os cobrados pelas empresas privadas, fossem elas nacionais ou estrangeiras. Essa medida
visava ao fortalecimento do parque industrial brasileiro. Era uma política fortemente nacionalista.
Foram criados órgãos estatais de regulamentação da atividade econômica, encabeçados pelo Conselho Nacional de
Economia (CNE); e indústrias em setores estratégicos. A intervenção estatal no setor de base da economia foi priorizada.
Embora a expressão substituição de importações possa ser utilizada desde que a primeira fábrica foi instalada no país,
permitindo substituir a importação de determinado produto, foi o governo Getúlio Vargas que iniciou a adoção de medidas
fiscais e cambiais que caracterizaram uma política industrial voltada à produção interna de mercadorias que até então eram
importadas.
As duas principais medidas adotadas foram a desvalorização da moeda nacional (réis até 1942 e, a seguir, cruzeiro)
em relação ao dólar, o que tornava o produto importado mais caro (desestimulando as importações), e a implantação de leis
e tributos que restringiam, e às vezes proibiam, a importação de bens de consumo e de produção que pudessem ser
fabricados internamente.
Em 1934, Getúlio Vargas promulgou uma nova constituição, que incluiu a regulamentação das relações de trabalho.
Entre as principais medidas que beneficiaram o trabalhador figuravam a criação do salário mínimo, as férias anuais e o
123
descanso semanal remunerado. Com essa atitude, que garantia o apoio da classe trabalhadora, e com o apoio das elites
agrária e industrial, Vargas conseguiu aprovar uma nova constituição em 1937, que o manteve no poder como ditador até o
fim da Segunda Guerra, em 1945, período que ficou conhecido como Estado Novo.
Nessa época foram criados órgãos estatais de regulamentação da atividade econômica, encabeçados pelo Conselho
Nacional de Economia (CNE) e por indústrias em setores estratégicos, visando combater os obstáculos ao crescimento
econômico. A intervenção estatal no setor de base da economia (petroquímica, siderurgia, energia elétrica e indústria de
cimento, por exemplo) foi priorizada.
Graças a essa intervenção do Estado, houve grande crescimento da produção industrial, com exceção do período da
Segunda Guerra. Durante os seis anos desse conflito armado, em razão da carência de indústrias de base e das dificuldades
de importação, o crescimento industrial brasileiro foi de 5,4%, uma média inferior a 1% ao ano. A atuação do Estado revelou-
se, então, importante para estimular a produção industrial. Houve significativo crescimento na produção interna em diversos
setores que sofreram restrições durante a guerra, mas o setor de transportes, cuja expansão não poderia ocorrer sem a
importação de veículos, máquinas e equipamentos, sofreu forte redução.

O governo Dutra (1946-1951)


Graças à afinidade ideológica de Getúlio Vargas com o nazifascismo, que foi derrotado na Segunda Guerra, as
oposições liberais se fortaleceram e, em 1945, o presidente foi deposto. Vargas retornou ao poder em 1951, dessa vez eleito
pelo povo. Com sua saída, assumiu a Presidência o general Eurico Gaspar Dutra, em 1946, que instituiu o Plano Salte,
destinando investimentos aos setores de saúde, alimentação, transportes, energia e educação. Até 1950, quando terminou
seu mandato, o Brasil passou por grande incremento da capacidade produtiva.
Durante a Segunda Guerra, o país exportou diversos produtos agrícolas, industriais e minerais para os países
europeus em conflito, obtendo enorme saldo positivo na balança comercial. Esse saldo, porém, foi utilizado no decorrer do
governo Dutra, com a importação de máquinas e equipamentos para as indústrias têxteis e mecânicas, o reequipamento do
sistema de transportes e o incremento da extração de minerais metálicos, não metálicos e energéticos.
Além disso, houve forte mudança na política econômica do país com a abertura à importação de bens de consumo, o que
contrariava os interesses da indústria nacional. Os empresários nacionais defendiam a reserva de mercado, isto é, que o governo
adotasse medidas que tornassem as mercadorias importadas mais caras ou mesmo proibissem sua entrada no país.
Boa parte das reservas cambiais acumuladas ao longo da Segunda Guerra foi utilizada na importação de cremes
dentais, geladeiras, chocolates, brinquedos, artigos decorativos e muitos outros produtos que agradavam à classe média.
Ao utilizar as reservas, essa mudança obrigou o governo a desvalorizar o cruzeiro em relação ao dólar e emitir papel-moeda,
o que provocou inflação e consequente queda de poder aquisitivo dos salários.
Leia, no texto a seguir, as três teorias de desenvolvimento – a neoliberal, a desenvolvimentista-nacionalista e a
nacionalista radical – que embasavam, na primeira metade do século XX, o debate político sobre as estratégias a ser
adotadas para estimular o crescimento econômico. Note que há muitas semelhanças com as ideias discutidas atualmente.

Fórmulas para o crescimento


A fórmula neoliberal baseava-se na suposição de que o mecanismo de preços deveria ser respeitado como a
determinante principal da economia. As medidas fiscais e monetárias, bem como a política de comércio exterior, deveriam
seguir os princípios ortodoxos estabelecidos pelos teóricos e praticantes da política de banco central dos países
industrializados. Os orçamentos governamentais deveriam ser equilibrados e as emissões severamente controladas. O
capital estrangeiro deveria ser bem recebido e estimulado como ajuda indispensável para um país em que há falta de capitais.
As limitações impostas pelo governo ao movimento internacional do capital, do dinheiro e dos bens deveriam ser reduzidas
ao mínimo. [...]
A segunda fórmula era a desenvolvimentista-nacionalista [...]. A nova estratégia deveria visar a uma economia mista,
na qual o setor privado recebia novos incentivos, na proporção de um determinado número de prioridades de investimento.
Ao mesmo tempo, o Estado interviria mais diretamente, através das empresas estatais e das empresas de economia mista,
no sentido de romper os pontos de estrangulamento e assegurar o investimento em áreas nas quais faltasse, ao setor
privado, quer a vontade, quer os recursos para se aventurar. Os defensores dessa fórmula reconheciam que o capital privado
estrangeiro poderia desempenhar um papel importante, mas insistiam em que só fosse aceito quando objeto de cuidadosa
regulamentação pelas autoridades brasileiras.
A fórmula desenvolvimentista-nacionalista foi apresentada por um grupo pequeno, mas variado. O seu denominador
comum era um forte nacionalismo. [...]
A terceira fórmula era a do nacionalismo radical. Merece menos atenção que as outras duas, como fórmula econômica,
porque foi apresentada mais dentro de um espírito de polêmica política, do que como estratégia cuidadosamente pensada
para o desenvolvimento. [...] Os nacionalistas radicais atribuíam o subdesenvolvimento brasileiro a uma aliança natural de
investidores particulares e governos capitalistas dentro do mundo industrializado. Essa conspiração procurava limitar o Brasil
eternamente a um papel subordinado, como exportador de produtos primários, cujos preços eram mantidos em níveis
mínimos, e importador de bens manufaturados, cujos preços eram mantidos em níveis exorbitantes, por organizações
monopolistas.
SKIDMORE, Thomas. Brasil: de Getúlio Vargas a Castelo Branco (1930-1964). 7. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. p.
117-120. Thomas Skidmore (1932-) é norte-americano e historiador brasilianista.
124
O retorno de Getúlio e da política nacionalista
Ao retornar à Presidência em 1951, eleito pelo povo, Getúlio Vargas retomou seu projeto nacionalista: passou a investir
em setores que deram suporte e impulsionaram o crescimento econômico – sistemas de transportes, comunicações,
produção de energia elétrica e petróleo – e restringiu a importação de bens de consumo. Apoiado por um grande movimento
nacionalista popular, Getúlio dedicou-se à criação da Petrobras (1953) e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico
e Social – BNDES (1952).
No confronto entre os getulistas, defensores da política nacional-desenvolvimentista, e os defensores da fórmula
neoliberal, que preferiam promover a abertura da economia aos produtos e capitais estrangeiros, o projeto de Getúlio acabou
sendo derrotado.
Os liberais argumentavam que, com a economia fechada, a modernização e a expansão do parque industrial nacional
ficavam dependentes do resultado da exportação de produtos primários. Qualquer crise ou queda de preço desses produtos,
particularmente do café, resultava em crise na modernização e expansão do parque industrial.

Juscelino Kubitschek e o plano de metas


Durante o governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961), houve um grande crescimento econômico em consequência
da implantação do chamado Plano de Metas. Tratava-se de um amplo programa de desenvolvimento que previa maciços
investimentos estatais em diversos setores da economia – agricultura, saúde, educação, energia, transportes, mineração e
construção civil –, tornando o Brasil um país atraente aos investimentos estrangeiros. Embalado por uma ideologia
desenvolvimentista, o governo divulgava o objetivo de fazer o país crescer “50 anos em 5”, e buscava interiorizar a ocupação
do território, integrando espaços com domínios naturais e ocupados pela agricultura e pecuária aos grandes centros urbano-
industriais. Foi nessa época que a capital federal foi transferida do litoral para o interior com a construção de Brasília,
inaugurada em 1960. Seu projeto urbanístico e a arquitetura materializaram a busca de modernização do país, que à época
ainda era dominado por estruturas econômicas e políticas herdadas do período agrário-exportador.
Na execução desse plano, 73% dos investimentos dirigiram-se aos setores de energia e transportes. Isso permitiu grande
aumento da produção de hidreletricidade e de carvão mineral, forneceu o impulso inicial ao programa nuclear, elevou a capacidade
de prospecção e refino de petróleo, pavimentação e construção de rodovias (14 970 km), além de melhorias nas instalações e
serviços portuários, aeroviários e reaparelhamento e construção de pequena extensão de ferrovias (827 km).
Paralelamente, em virtude dos investimentos estatais em obras de infraestrutura e incentivos do governo, houve expressivo
ingresso de capital estrangeiro, responsável por grande crescimento da produção industrial, principalmente nos setores
automobilístico, químico-farmacêutico e de eletrodomésticos. O parque industrial brasileiro passou, assim, a contar com significativa
produção de bens de consumo duráveis, o que sustentou e deu continuidade à política de substituição de importações.
Ao longo do governo JK consolidou-se o tripé da produção industrial nacional, formado pelas indústrias:
• de bens de consumo não duráveis, que desde a segunda metade do século XIX já vinham sendo produzidos, com amplo
predomínio do capital privado nacional;
• de bens de produção e bens de capital, que contaram com investimento estatal nos governos de Getúlio Vargas;
• de bens de consumo duráveis, com forte participação de capital estrangeiro, como vimos anteriormente.
Entretanto, o sucesso do Plano de Metas resultou num significativo aumento da inflação e da dívida externa, contraída para
financiar seus investimentos.
Além disso, a opção pelo transporte rodoviário, sistema não recomendável em países territorialmente extensos como
o nosso, marcou economicamente o Brasil de forma duradoura, diminuindo a competitividade dos produtos brasileiros no
mercado internacional, com consequências até os dias atuais.
A política do Plano de Metas acentuou a concentração do parque industrial na região Sudeste, agravando os
contrastes regionais. Com isso, as migrações internas intensificaram-se, provocando o crescimento acelerado e
desordenado dos grandes centros urbanos, principalmente São Paulo e Rio de Janeiro.
Os problemas decorrentes da falta de planejamento urbano permanecem até hoje e também abrangem aglomerações
urbanas que não abrigam grande parque industrial.
A concentração do parque industrial no Sudeste determinou a implementação de uma política federal de planejamento
econômico para o desenvolvimento das demais regiões. Em 1959, foi criada a Superintendência do Desenvolvimento do
Nordeste (Sudene), e, nos anos seguintes, dezenas de outros órgãos, como a Superintendência do Desenvolvimento da
Amazônia (Sudam), a Superintendência do Desenvolvimento do Centro-Oeste (Sudeco), a Superintendência de
Desenvolvimento do Sul (Sudesul) e a Companhia do Desenvolvimento do Vale do São Francisco (Codevasf ), entre outras
que foram extintas ou transformadas em agências de desenvolvimento a partir do início da década de 1990.

O governo João Goulart e a tentativa de reformas


João Goulart, conhecido como Jango, exerceu o cargo de ministro do Trabalho de Getúlio Vargas e se elegeu duas
vezes como vice-presidente, nos mandatos de JK e de Jânio Quadros. Na época, era permitido votar para presidente e vice
de partidos ou coligações diferentes. No decorrer de seu governo, o Brasil passou por uma grande crise política, iniciada em
25 de agosto de 1961 com a renúncia do presidente Jânio, empossado poucos meses antes. A crise agravou-se com os
problemas econômicos herdados do governo JK, como a dívida externa e, sobretudo, a inflação.
A posse de Jango, em 25 de setembro de 1961, ocorreu após a instauração do parlamentarismo, que reduziu os
poderes do chefe do Executivo (Presidente).
Essa manobra política foi a solução encontrada para resolver uma crise institucional que abalava a unidade dos setores
125
militares: os três ministros das Forças Armadas pressionavam o Congresso a votar pela desqualificação de Jango como
presidente por motivos de “segurança nacional” (no contexto da Guerra Fria, uma forma de desqualificar um governante aos
olhos dos setores conservadores da sociedade era taxá-lo de comunista). Contudo, vários comandantes regionais,
encabeçados pelo III Exército (Rio Grande do Sul), defendiam a posse do vice-presidente para que a Constituição não fosse
desrespeitada.
Durante o período parlamentarista do governo João Goulart (até início de 1963), como o presidente não conseguiu
estruturar uma diretriz de política econômica, houve aumento da inflação e do desemprego, e redução nas taxas de
crescimento, problemas que haviam provocado várias greves em 1962. Nesse contexto, fortaleceu-se a posição dos que
defendiam a realização de um plebiscito pelo qual a população poderia optar entre a continuidade do regime parlamentarista
ou o retorno ao presidencialismo.
Em 6 de janeiro de 1963, o retorno ao presidencialismo foi aprovado com 82% dos votos, o que conferiu amplos
poderes ao presidente, permitindo-o encaminhar as reformas de base. Propunha-se uma ampla reforma dos sistemas
tributário, bancário e eleitoral, a regulamentação dos investimentos estrangeiros e da remessa de lucros ao exterior, além
da reforma agrária e de maiores investimentos em educação e saúde. Tal política, de caráter claramente nacionalista, foi
tachada de comunista pelos setores mais conservadores da sociedade civil e militar, criando as condições para o golpe
militar de 31 de março de 1964.
O que estava em jogo não era o embate entre socialismo e capitalismo, mas o papel que cabia ao Estado: investir
preferencialmente no setor público (educação, saúde, habitação, infraestruturas urbana e agrária) ou em setores que
beneficiavam as empresas privadas (como o de construção, sobretudo de usinas hidrelétricas e rodovias). A vitória, garantida
pela força das armas, foi a dos que defendiam a segunda opção. A história desse período demonstra que o caminho adotado
pelas forças conservadoras melhorou a vida de alguns em detrimento da maioria da população, fato revelado pela crescente
concentração de renda ao longo do regime militar, que veremos a seguir.

O período militar
Em 1º de abril de 1964, após um golpe de Estado que tirou João Goulart do poder, teve início no país o regime militar,
com uma estrutura de governo ditatorial. O Brasil possuía o 43º PIB do mundo capitalista e uma dívida externa de 3,7 bilhões
de dólares. Em 1985, ao término do regime, o Brasil apresentava o 9º PIB do mundo capitalista e sua dívida externa era de
aproximadamente 95 bilhões de dólares, ou seja, crescemos muito, mas à custa de um pesado endividamento. O parque
industrial cresceu de forma bastante significativa e a infraestrutura nos setores de energia, transportes e telecomunicações
se modernizou. No entanto, embora os indicadores econômicos tenham evoluído positivamente, a desigualdade social
aprofundou-se muito nesse período, concentrando a renda nos estratos mais ricos da sociedade. Segundo o IBGE e o Banco
Mundial, em 1960, os 20% mais ricos da sociedade brasileira dispunham de 54% da renda nacional, em 1970 passaram a
contar com 62%, e em 1989, com 67,5% . O trecho a seguir nos mostra uma consequência imediata do modelo econômico
adotado pelos governos militares, que foi agravado pelo êxodo rural iniciado na década de 1950.

As distorções do “milagre brasileiro”


Concomitante ao “paraíso de consumo” que se abria para a classe média dos grandes centros urbanos, onde
proliferavam supermercados, shoppings e os outdoors de construtoras oferecendo inúmeros lançamentos de apartamentos
de luxo, crescia também a população marginalizada e miserável. A população favelada de Porto Alegre elevou-se de 30 mil
pessoas em 1968 para 300 mil em 1980; a do Rio de Janeiro, de 450 mil em 1965 para 1,8 milhão em 1980; e a de São
Paulo, de 42 mil em 1972 para mais de um milhão em 1980.
REZENDE FILHO, Cyro de Barros. Economia brasileira contemporânea. São Paulo: Contexto, 1999. p. 140. (Manuais).

Entre 1968 e 1973, período conhecido como “milagre econômico”, a economia brasileira desenvolveu-se em ritmo
acelerado.
Esse ritmo de crescimento foi sustentado por investimentos governamentais que promoveram grande expansão na
oferta de alguns serviços prestados por empresas estatais, como energia, transporte e telecomunicações. No entanto, várias
obras tinham necessidade, rentabilidade ou
eficiência questionáveis, como as rodovias
Transamazônica e Perimetral Norte e o acordo
nuclear entre Brasil e Alemanha. O setor de
telecomunicações também foi beneficiado
nesse período. Os investimentos nesse setor
foram feitos graças à grande captação de
recursos no exterior, o que elevou a dívida
externa, pois boa parte desse capital foi
investido em setores pouco rentáveis da
economia. Como pagar a parcela da dívida
contraída com a construção de rodovias na
Amazônia?Outro aspecto importante na
questão do crescimento econômico no período
126
militar foi o dos investimentos externos. O capital estrangeiro penetrou em vários setores da economia, principalmente na
extração de minerais metálicos (projetos Carajás, Trombetas e Jari), na expansão das áreas agrícolas (monoculturas de
exportação), nas indústrias química e farmacêutica, e na fabricação de bens de capital (máquinas e equipamentos) utilizados
pelas indústrias de bens de consumo.
Como o aumento dos preços dos produtos (inflação) não era integralmente repassado aos salários, a taxa de lucro
dos empresários foi ampliada com a diminuição do poder aquisitivo dos trabalhadores. Aumentava-se, assim, a taxa de
reinvestimento dos lucros em setores que gerariam empregos principalmente para os trabalhadores qualificados e exclui os
pobres, o que deu continuidade ao processo histórico de concentração da renda nacional.
Ficou famosa a frase do então ministro da Fazenda Delfim Netto, em resposta à inquietação dos trabalhadores ao ver seus
salários arrochados: “É necessário fazer o bolo crescer para depois reparti-lo”. O bolo (a economia) cresceu – o Brasil chegou
a ser a 9a maior economia do mundo capitalista no início da década de 1980 (em 2012, segundo o Fundo Monetário
Internacional, o Brasil era a 6a economia do mundo) – e, até hoje, a renda permanece concentrada (em 2009, segundo o
Banco Mundial, os 10% mais ricos se apropriavam de 42,9% da renda nacional).
Nesse contexto, as pessoas da classe média que tinham qualificação profissional viram seu poder de compra
ampliado, quer pela elevação dos salários em cargos que exigiam formação técnica e superior, quer pela ampliação do
sistema de crédito bancário, permitindo maior financiamento do consumo. Enquanto isso, os trabalhadores sem qualificação
tiveram seu poder de compra diminuído e ainda foram prejudicados com a degradação dos serviços públicos, sobretudo os
de educação e saúde.
No final da década de 1970, os Estados Unidos promoveram a elevação das taxas de juros no mercado internacional,
reduzindo os investimentos destinados aos países em desenvolvimento. Além de sentir essa redução, a economia brasileira
teve de arcar com o pagamento crescente dos juros da dívida externa, contraída com taxas flutuantes.
Diante dessa nova realidade, a saída imposta pelo governo para obter recursos que permitissem honrar os
compromissos da dívida pode ser sintetizada na frase: “Exportar é o que importa”. Porém, como tornar os produtos brasileiros
internacionalmente competitivos? Tanto em qualidade como em preço, as mercadorias produzidas na época em um país
em desenvolvimento como o Brasil, que quase não investia em tecnologia, enfrentavam grandes obstáculos.
As soluções encontradas foram desastrosas para o mercado interno de consumo:
• redução do poder de compra dos assalariados, conhecido como arrocho salarial;
• subsídios fiscais para exportação (cobrava-se menos imposto por um produto exportado que por um similar vendido no
mercado interno);
• negligência com o meio ambiente, levando ao aumento de diversas formas de poluição, erosão e de outras agressões ao
meio natural;
• desvalorização cambial: a valorização do dólar em relação ao cruzeiro (moeda da época) facilitava as exportações e
dificultava as importações;
• diminuição do poder aquisitivo das famílias para combater o aumento dos preços.
Essas medidas, adotadas em conjunto, favoreceram a venda de produtos no mercado externo, mas prejudicaram o
mercado interno, reduzindo o poder de compra do brasileiro. Assim se explica o aparente paradoxo: a economia cresce, mas
o povo empobrece.
Na busca de um maior superavit na balança comercial, o governo aumentou os impostos de importação não apenas
para bens de consumo, como também para os bens de capital e bens intermediários. A consequência dessa medida foi a
redução da competitividade do parque industrial brasileiro frente ao exterior ao longo dos anos 1980. Os industriais não
tinham capacidade financeira para importar novas máquinas e, por causa da falta de competição com produtos importados,
não havia incentivos à busca de maior produtividade e qualidade dos produtos. Com isso, as indústrias, com raras exceções,
foram perdendo competitividade no mercado internacional e as mercadorias comercializadas internamente tornaram-se
caras e tecnologicamente defasadas em relação às estrangeiras.
Os efeitos sociais dessa política econômica se agravaram com a crise mundial, que se iniciou em 1979. As taxas de
juros da dívida externa atingiram, em 1982, o recorde histórico de 14% ao ano. A partir de então, a economia brasileira
passou por um período em que se alternavam anos de recessão e outros de baixo crescimento. Isso se arrastou por toda a
década de 1980 e início da de 1990, período que se caracterizou pela chamada ciranda financeira: o governo emitia títulos
públicos para captar o dinheiro depositado pela população nos bancos. Como as taxas de juros oferecidas internamente
eram muito altas, muitos empresários deixavam de investir no setor produtivo – o que geraria empregos e estimularia a
economia aumentando o PIB – para investir no mercado financeiro. Na época, essa “ciranda” criava a necessidade de
emissão de moeda em excesso, o que elevou os índices de inflação.
Outro aspecto negativo da política econômica do período militar merece destaque: se as medidas adotadas tinham
como objetivo o crescimento do PIB a qualquer custo, o que fazer com as empresas ineficientes, à beira da falência? A
solução encontrada para esse problema foi a estatização. O Estado brasileiro adquiriu empresas em quase todos os setores
da economia utilizando recursos públicos, em parte acumulados com o pagamento de impostos por toda a população. O
crescimento da participação do Estado na economia, de 1964 a 1985, foi muito grande. Em 1985, cerca de 20% do PIB era
produzido em empresas estatais, enquanto os serviços tradicionalmente públicos, como saúde e educação, estavam se
deteriorando por causa da falta de recursos, que eram redirecionados dos setores sociais para os produtivos.
O período dos governos militares no Brasil caracterizou-se pela apropriação do poder público por agentes que
desviaram os interesses do Estado para as necessidades empresariais. As carências da população ficaram em segundo
127
plano; as prioridades foram o crescimento do PIB e o aumento do superavit na balança comercial. O objetivo de qualquer
governo é o de aumentar a produção econômica. O problema é saber como atingi-lo sem comprometer os investimentos em
serviços públicos, que possibilitam a melhoria da qualidade de vida das pessoas.
Apesar do exposto, durante o período do regime militar, o processo de industrialização e de urbanização continuou
avançando, resultando em significativa melhora nos índices de natalidade e mortalidade, que registraram queda, além do
aumento da expectativa de vida. A interpretação desse fato deve levar em conta o intenso êxodo rural, já que nas cidades
aumentou o acesso a saneamento básico e atendimento médico-hospitalar, bem como a remédios e programas de vacinação
em postos de saúde, e o fato de que muitos migrantes conseguiram melhorar a qualidade de vida nos centros urbanos.
O fim do período militar ocorreu em 1985, depois de várias manifestações populares a favor das eleições diretas para
presidente da República. Os problemas econômicos herdados do regime militar foram agravados no governo que se seguiu,
o de José Sarney, e só foram enfrentados efetivamente nos anos 1990.
Como síntese do processo de industrialização na época do regime militar, leia o texto a seguir, no qual a autora
caracteriza as diferentes fases desse processo.

Depois da tempestade, vem o “milagre”


Do ponto de vista da industrialização brasileira propriamente dita, o golpe de 1964 não trouxe nenhuma mudança nos
rumos por ela tomada desde 1955. Muito pelo contrário, o papel da ditadura militar foi o de consolidar o modelo econômico
implantado nos anos 1950, aperfeiçoando-o. Logo, a primeira característica da industrialização brasileira dessa época foi a
permanência das diretrizes estabelecidas pelo Plano de Metas, mantendo-se o tripé inaugurado nos anos 1950 a pleno
vapor.
A história da economia e da industrialização brasileiras do pós-64 pode ser dividida em três períodos: a) 1962-67 –
fase caracterizada como de crise e recessão;
b) 1968-74 – fase de retomada do crescimento industrial vulgarmente conhecida como “milagre econômico brasileiro”, em
virtude das elevadas taxas de crescimento de nossa economia;
c) de 1974 até o presente (1992) – fase em que o “milagre” entrou em total e completo declínio, sem que as várias saídas
tentadas tenham conseguido grande sucesso.
MENDONÇA, Sônia. A industrialização brasileira. São Paulo: Moderna, 1997. p. 67-68. (Polêmica).

6.2 - A economia brasileira a partir de 1985


O plano cruzado
Tancredo Neves, eleito indiretamente em 1985, não chegou a ser empossado porque faleceu. Nessa eleição, os
eleitores foram os parlamentares – deputados federais e senadores – e os representantes dos partidos políticos que
formavam o Colégio Eleitoral. Seu vice, José Sarney, que apoiou o regime militar desde seu início, assumiu o cargo de
presidente em 15 de março do mesmo ano. Durante seu mandato, preocupou-se em implementar reformas, visando
estabilizar a economia e obter apoio popular.
Embora tenha implantado posteriormente outros três pacotes na tentativa de estabilizar a moeda, seu governo ficou
marcado pelo primeiro deles, o Plano Cruzado, lançado em 28 de fevereiro de 1986. Entre as principais medidas destacavam-
se a troca da moeda nacional – mil cruzeiros passaram a valer um cruzado – e o congelamento de preços e salários. Com
exceção do mínimo (que subiu 16%), todos os salários foram definidos com base no poder de compra médio dos últimos
seis meses e acrescidos de um abono de 8%. Essas medidas, associadas à manutenção das datas de reajuste das
categorias profissionais, ao aumento dos prazos de financiamento dos crediários para a compra de bens de consumo e ao
controle da taxa de câmbio, promoveram rápido aumento no poder de compra dos assalariados.
O plano contou com grande apoio da população e de parcela expressiva de economistas dos partidos de oposição. A
população foi estimulada a denunciar os estabelecimentos comerciais, principalmente supermercados que aumentavam os
preços de suas mercadorias, desobedecendo ao congelamento imposto pelo plano. As taxas de inflação tiveram uma queda
vertiginosa, mantendo-se baixas até outubro de 1986, e levaram o PMDB, partido do presidente, a eleger os governadores
de 22 das 24 unidades da Federação (estados e Distrito Federal) então existentes (atualmente são 27).
Com o aumento da demanda, rapidamente começaram a sumir produtos das prateleiras, e a escassez – que em
alguns casos era real, mas em outros era provocada por fabricantes e comerciantes, que se recusavam a vender seus
produtos pelo preço congelado – levou à cobrança de ágio na comercialização.
Nessa época, como o Brasil possuía uma das economias mais fechadas do mundo ocidental (nossa abertura comercial
se iniciou em 1990), não havia possibilidade de o governo liberar a importação de bens de consumo para combater o aumento
dos preços.
No caso da carne, os pecuaristas se recusavam a abater o gado, e a escassez do produto criou um mercado paralelo,
com a carne sendo vendida a preços muito superiores aos definidos pelo congelamento.
O retorno dos reajustes de preços ocorreu com rapidez e, consequentemente, a inflação voltou a subir em decorrência da:
• cobrança de ágio na comercialização de produtos;
• falta de concorrência dos produtos importados;
• contínua elevação nas cotações do dólar em relação à moeda nacional – que provocava a elevação de preços em todos
os produtos importados, como petróleo, trigo e máquinas;

128
• manutenção do déficit público, que alimentava novamente a ciranda financeira.
Logo após as eleições de outubro de 1986 (para a escolha de novos governadores, senadores, deputados federais e
estaduais), foi lançado o Plano Cruzado II, com grandes reajustes nas tarifas públicas e forte aumento nos impostos indiretos,
reduzindo o poder de compra da população. Em fevereiro de 1987 foi abolido o controle oficial de preços e a correção
monetária voltou a ser mensal, para acompanhar o descontrole inflacionário, cuja consequência é a diminuição dos salários
reais. Também foi decretada a moratória do pagamento da dívida externa, o que bloqueou imediatamente o ingresso de
capital estrangeiro no país e criou grandes dificuldades de negociação no mercado internacional.
Nos anos seguintes, o governo José Sarney se caracterizou por perda de popularidade e pelo lançamento de outros
dois planos econômicos (Plano Bresser e Plano Verão), todos com sérios problemas para ser postos em prática. Apesar das
sucessivas tentativas de controle, uma das principais heranças do governo Sarney foi uma altíssima inflação: 53% em
dezembro de 1989, atingindo 85% em março de 1990, quando o mandato se encerrou.
Ao longo da década de 1980, a ciranda financeira e as altas taxas de inflação, com a consequente perda do poder de
compra dos salários, foram responsáveis por um período de estagnação na produção industrial e de baixo crescimento
econômico (segundo o Banco Mundial, o PIB brasileiro cresceu em média 2,7% nos anos 1980). A necessidade de controlar
a inflação e ajustar as contas externas – fortemente comprometidas com o aumento do preço do petróleo e das taxas de
juros no mercado internacional – havia levado o governo do general João Baptista Figueiredo (1979-1985), o último do
regime militar, a se preocupar com ajustes de curto prazo na política econômica. O mesmo ocorreu na gestão de Sarney.
Essa prioridade significou uma década inteira sem planejamento econômico de longo prazo, com exceção de alguns setores
(política de reserva de mercado para informática e incentivo à exportação de celulose, por exemplo). Houve, nesse período,
uma queda de 5% na participação da produção industrial no PIB brasileiro.
No campo da política econômica e do papel do Estado, o governo Sarney foi responsável por um incipiente processo
de privatização de empresas estatais, começando a retirar o Estado do setor produtivo para concentrar sua ação na
fiscalização e na regulamentação. Foram vendidas dezessete empresas estatais, das quais as mais importantes foram a
Aracruz Celulose, a Caraíba Metais e a Eletrossiderurgia Brasileira (Sibra).

O plano Collor
Fernando Collor, eleito em 1990 para suceder a Sarney, foi o primeiro presidente a chegar ao poder via voto popular
após o fim do regime militar. Um dia depois da posse, o novo governo lançou um plano de estabilização econômica, que
ficou conhecido como Plano Collor, baseado no confisco generalizado por dezoito meses dos depósitos bancários em
dinheiro superiores a 50 mil cruzeiros (cerca de R$ 6 800,00, em valores de dezembro de 2012 usando o IPCA como
indexador, ou R$ 3 200,00, caso se utilize o dólar como referência). Com isso, a equipe econômica esperava reduzir o
consumo e, consequentemente, frear a inflação. A falta de dinheiro em circulação reduziu a inflação, de 85% ao mês em
março, para 14% em abril de 1990.
A liberação antecipada dos recursos retidos poderia ser feita pelo Ministério da Fazenda, que estudava os pedidos
caso a caso. Podiam ser liberados depósitos de empresas para pagamento de salários e dinheiro de pessoas doentes que
necessitavam de tratamento médico, entre outros casos. Como havia exceções que permitiam a liberação dos recursos
bloqueados, aumentavam as pressões exercidas por políticos e lobistas para obtê-las, o que se tornou grande fonte de
corrupção. As práticas de corrupção, comandadas pelo tesoureiro da campanha eleitoral de Collor, foram amplamente
divulgadas pela imprensa. As demais empresas e trabalhadores receberam seu dinheiro de volta em dezoito parcelas, que
começaram a ser pagas após dezoito meses de confisco. Segundo cálculos divulgados na época, o poder de compra do
dinheiro devolvido havia se reduzido em aproximadamente 40%, uma vez que os índices de reajuste utilizados foram
menores que os da inflação.
A permissão para a elevação dos preços de alguns serviços privados e tarifas públicas levou ao retorno da espiral
inflacionária já no início de 1991, antes que o plano completasse seu primeiro ano. Os índices da inflação ocorrida após o
Plano Collor foram menores que os índices anteriores a esse plano porque havia falta de dinheiro em circulação no mercado.
A consequente recessão (em 1992 houve uma queda de 0,5% no PIB) levou a um grande aumento do desemprego e
da economia informal, uma vez que o plano não promoveu crescimento econômico, distribuição de renda, nem combate ao
déficit público.
Além do confisco monetário, o Plano Collor apoiava-se em outros três pontos:
• diminuição da participação do Estado no setor produtivo por meio da privatização de empresas estatais (dezoito empresas,
com destaque para Usiminas e Embraer) e da concessão à iniciativa privada da exploração de rodovias, portos, ferrovias
e hidrelétricas, entre outros;
• eliminação dos monopólios do Estado em telecomunicações e petróleo, e fim da discriminação ao capital estrangeiro, que,
entre outros investimentos, poderia participar dos leilões de privatização;
• abertura da economia ao ingresso de produtos e serviços importados por meio da redução e/ou eliminação dos impostos
de importação, reservas de mercado e cotas de importação.
Essas medidas tiveram continuidade durante os governos de Itamar Franco (sucedeu a Fernando Collor) e Fernando
Henrique Cardoso.

A abertura comercial, a privatização e as concessões de serviços


A abertura do mercado brasileiro aos bens de consumo e de capital, iniciada em 1990 e facilitada pela redução dos
129
impostos de importação, merece uma análise à parte por causa de sua influência no processo de industrialização do Brasil.
A compra no exterior de máquinas e equipamentos industriais de última geração promoveu a modernização do parque
industrial e o aumento da produtividade, e, portanto, da capacidade de competição no mercado internacional; entretanto, a
modernização da produção causou grande elevação nos índices de desemprego estrutural.
No setor de bens de consumo, a entrada de produtos importados de países que aplicavam elevados subsídios às
exportações e pagavam baixíssimos salários (com destaque para a China, nos setores de calçados, têxteis e de brinquedos)
provocou a falência de muitas indústrias nacionais, contribuindo para elevar mais ainda o desemprego. Por outro lado, a
concorrência com mercadorias importadas fez com que a qualidade de muitos produtos nacionais melhorasse e provocou
significativa redução dos preços, beneficiando os consumidores.
Na indústria automobilística, embora num primeiro momento tenha havido grande redução no número de trabalhadores
por unidade fabril, verificou-se significativo aumento no número de instalações industriais, com a entrada de novas fábricas,
que até então não produziam no Brasil (Honda, Toyota, Renault, Peugeot e outras), e novos investimentos de outras
empresas, que já estavam instaladas antes da abertura às importações, como a construção de uma nova fábrica da Ford
em Camaçari (BA) ou da GM em Gravataí (RS). A abertura econômica propiciou um aumento no número de fábricas e uma
diversificação de marcas, além de uma dispersão espacial (até então existiam indústrias apenas em São Paulo e Minas
Gerais). Com isso, em 2008, o Brasil transformou-se no quinto produtor mundial de automóveis.
Tanto a privatização de empresas estatais quanto a concessão de exploração dos serviços de transporte, energia e
telecomunicações a empresas privadas nacionais e estrangeiras apresentaram aspectos positivos e negativos, dependendo
da forma como foram realizadas as transferências e dos problemas relacionados à administração e à fiscalização.
A maioria das empresas privatizadas, quando eram estatais, dependia de recursos do governo e não pagava diversos
tipos de impostos. Ao privatizá-las, os governos federal, estaduais e municipais trocaram uma fonte de prejuízos por uma
maior arrecadação de impostos. Por exemplo, no setor siderúrgico, a única estatal lucrativa era a Usiminas, que,
estrategicamente, foi a primeira a ir a leilão, para que os investidores acreditassem na disposição de reforma estrutural do
Estado brasileiro; atualmente, cerca de 80% do seu capital pertence a a economia brasileira a partir de 1985 35 investidores
brasileiros e 20% a investidores japoneses. Todas as demais companhias siderúrgicas – a Nacional (CSN), a de Tubarão
(CST) e a Paulista (Cosipa, comprada pela Usiminas em 2009), entre outras – eram deficitárias. Com isso passaram a ser
lucrativas, a pagar altas somas de impostos nas três esferas do governo e aumentaram o volume de exportação do país.
Nos setores de transportes e telecomunicações, além de as empresas serem deficitárias, os sistemas estavam muito
deficientes e o Estado tinha dificuldade política e baixa capacidade de investimento para recuperá-los. As rodovias estavam
em péssimo estado de conservação e uma linha telefônica era considerada um patrimônio pessoal (três anos antes da
privatização do sistema Telebrás), chegando a custar R$5 mil (praticamente US$5 mil) no mercado paralelo em 1995. Além
disso, as tarifas estavam muito defasadas. Seu valor era estabelecido segundo conveniências políticas e manipulado para
que não pressionasse as taxas de inflação, o que elevava o déficit público e acabava por alimentar a própria inflação.
Com a privatização e a concessão de exploração dos serviços públicos, esses setores receberam investimentos
privados, se expandiram e passaram a operar em condições melhores que anteriormente, à custa de aumento nas tarifas.
Na década de 1990, os governos eram acusados pelos partidos de oposição de vender o patrimônio do Estado e
abandonar a infraestrutura nas mãos da iniciativa privada, com claro prejuízo para a população. Porém, desde aquela época
até os dias atuais, o Estado continua legalmente comandando todos os setores concedidos e privatizados por intermédio da
ação de agências reguladoras: Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Agência Nacional de Telecomunicações
(Anatel), Agência Nacional do Petróleo (ANP), Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), entre outras.
Por meio dessas agências, o Estado brasileiro regula e fiscaliza os serviços e controla o valor das tarifas praticadas
em cada um dos setores. O aumento no preço do pedágio, do pulso telefônico ou da energia elétrica obedece às condições
estabelecidas nos contratos de concessão. Para aumentar os preços, as empresas concessionárias devem cumprir metas
de investimento, comprovar aumento de custos ou registrar em contrato que o reajuste estará atrelado a algum índice de
inflação. Em alguns casos, até o percentual de lucro que as empresas podem obter está estabelecido em contrato.
Entre os casos de má gestão, tanto por parte do governo quanto das empresas concessionárias, destaca-se o da
energia elétrica. Em 2001, foi imposto um racionamento à população e, em 2009 e 2012, ocorreu um colapso no
abastecimento que deixou grande parte do país sem energia elétrica por algumas horas (conhecido como “apagão”),
conforme veremos no capítulo seguinte. Esses fatos se explicam pela falta de planejamento estratégico, fiscalização e
investimentos no setor.
As empresas de telefonia continuam com sérios problemas técnicos e de atendimento ao consumidor, prestando
serviços com qualidade inferior à de congêneres dos países desenvolvidos, onde fica a sede de algumas delas. Não é raro
os sistemas entrarem em pane e ocorrer desrespeito às normas legais de atendimento ao cliente. Em razão disso,
frequentemente, as agências reguladoras lavram multas, ou mesmo chegam a proibir a expansão do atendimento.
No entanto, a indexação de algumas tarifas públicas causa problemas à população e ao custo de produção industrial.
Como geralmente os salários não são indexados (os reajustes são negociados por setor e sindicato), não acompanham os
reajustes das tarifas, que ano a ano aumentam seu peso nos orçamentos familiares.
Uma das principais críticas ao processo de privatização e concessão refere-se ao destino dado ao dinheiro arrecadado
pelo Estado nos leilões – direcionado ao pagamento de juros da dívida interna, sem amortização do montante principal – e
à desnacionalização provocada por esse processo.
Com as privatizações e a abertura da economia brasileira, houve forte ingresso de capital estrangeiro em setores
130
produtivos anteriormente dominados pelo Estado e por empresas de capital privado nacional. Com a entrada de capital
estrangeiro no setor produtivo, a economia brasileira reduziu sua dependência do capital especulativo, o que a tornou mais
sólida e mais bem estruturada, mas aumentou a saída de dólares na forma de remessa de lucros e pagamento de royalties
às matrizes das empresas que se instalaram no país. Para equilibrar o balanço de pagamentos, as estratégias principais são
o incentivo às exportações, ao aumento no fluxo de investimentos estrangeiros, à internacionalização de empresas
brasileiras e outras.
Apesar do exposto, o Brasil ainda tem uma economia muito fechada do ponto de vista comercial quando comparada
à de outros países, tanto os desenvolvidos quanto alguns emergentes. Segundo a Organização Mundial do Comércio (OMC),
em 2011, sua participação mundial era de apenas 1,8% nas exportações e 1,6% nas importações, enquanto a participação
dos Estados Unidos, por exemplo, era de 16,0% e 12,0%, e a da Coreia do Sul, que tem um PIB menor que o brasileiro, de
3,9% e 3,6%, respectivamente.
Assim, a partir de 1990, os sucessivos déficits públicos se transformaram em superavit à custa de maior
desnacionalização da economia, o que aumentou o fluxo de royalties e remessas de lucros. Em contrapartida, a acelerada
modernização de alguns setores da economia fez aumentar a competitividade da nossa produção agrícola e industrial no
mercado internacional.

O Plano Real
Com a renúncia de Collor, seu vice-presidente, Itamar Franco, assumiu o comando do governo brasileiro por pouco mais de
dois anos – de outubro de 1992 até o final de 1994. Nos primeiros sete meses de seu mandato, três ministros passaram pela pasta
da Fazenda, as taxas de inflação se mantiveram muito altas (observe o gráfico da página seguinte) e o crescimento econômico
muito baixo (segundo o Banco Mundial, entre 1990 e 1994, o PIB brasileiro cresceu apenas 2,2% em média).
Em maio de 1993, o presidente transferiu seu ministro das Relações Exteriores, Fernando Henrique Cardoso, para o
Ministério da Fazenda. A intenção era a de colocar no cargo um político com livre trânsito entre os vários partidos políticos
com representação no Congresso Nacional na época.
O governo tentaria iniciar o processo de estabilização econômica por intermédio de uma negociação política,
conduzida diretamente pelo ministro da Fazenda. A primeira medida adotada foi a de cortar três zeros da moeda corrente e
passar a chamá-la de cruzeiro real – ato ineficiente e de fundo meramente psicológico, que não reduziu a inflação.
O Plano Real, que permitiu controlar a inflação depois de sete pacotes malsucedidos, foi lançado em março de 1994
e se baseava na paridade entre a nova moeda, o real, e o dólar, com cotação de R$ 1,00 = US$ 1,00.
Para controlar o câmbio, o governo elevou as taxas de juros, com a intenção de atrair capitais especulativos do exterior
e aumentar as reservas de dólares do Banco Central. Na lógica desse plano, à medida que a estabilização da moeda se
consolidasse e o Congresso Nacional aprovasse as reformas estruturais necessárias ao controle do déficit público
(principalmente a reforma da previdência, a tributária e a trabalhista), haveria maior ingresso de capitais produtivos e o Banco
Central poderia reduzir as taxas de juros sem comprometer o desenvolvimento econômico.
Antes da substituição do cruzeiro real pelo real, foi criada a Unidade Real de Valor (URV), cuja cotação diária
acompanharia a cotação da moeda norte-americana. A partir de 1º de março de 1994, a URV passou a valer um dólar e a
população deveria acompanhar a variação de preços na cotação das duas moedas: o cruzeiro real, que perdia valor
diariamente, e a URV, cujo valor deveria variar pouco. Na prática, a inflação em cruzeiro real era a inflação brasileira, mas a
população não deveria aceitar aumentos de preços em URVs, porque isso significaria inflação em dólar, que nos Estados
Unidos era inferior a 5% ao ano. Depois de três meses, quando considerou aceitáveis os índices de inflação em URV, o
governo substituiu o cruzeiro real pelo real e garantiu a conversão inicial da nova moeda pela cotação R$ 1,00 = US$ 1,00.
Nos três primeiros anos de sua vigência, o Plano Real proporcionou grandes avanços ao país, o que garantiu a vitória
de Fernando Henrique Cardoso nas eleições presidenciais de 1994 e de 1998. De imediato, houve aumento de 28% no
poder aquisitivo da população de baixa renda, como resultado do controle da inflação, que antes nunca era repassada
integralmente aos salários nas épocas de reajuste. Esse aumento no poder de compra incluiu no mercado de consumo
muitas famílias que estavam abaixo da linha de pobreza, estimulando o aumento da produção industrial. Com o lançamento
do Plano Real, o rendimento médio dos trabalhadores subiu de 742 para 983 reais. Isso significou um aumento de 28% no
poder aquisitivo, índice equivalente ao da taxa mensal de inflação no mês de lançamento da URV. Entretanto, o Banco
Central foi forçado a manter os juros elevados devido:
• à falta de empenho do governo e à conduta da oposição, contrária aos projetos de reforma enviados ao Congresso;
• ao déficit comercial resultante da manutenção de uma taxa de câmbio irreal;
• à ocorrência de crises externas que reduziram a entrada de dólares na economia brasileira.
Como vimos, a manutenção de juros altos inibe o desenvolvimento das atividades produtivas, limitando o crescimento
do PIB. Nesse contexto, a partir de 1997, os ganhos de renda da população de menor poder aquisitivo foram praticamente
anulados pelo aumento dos índices de desemprego e de inflação não repassada aos salários. Apesar de mantida em índices
considerados aceitáveis, a inflação acumulada ano a ano reduziu o poder aquisitivo dos assalariados, concentrando ainda
mais a renda. Leia o texto a seguir, que explica como a inflação reduz o poder aquisitivo da população de baixa renda.

Como a inflação concentra renda


Até 1994, a economia brasileira apresentou índices bastante elevados de inflação, mas esses índices nunca foram
integralmente repassados aos salários, havendo forte concentração de renda. Por exemplo, se a inflação era de 50%, os
131
salários eram reajustados em 40%, reduzindo o poder aquisitivo dos trabalhadores e aumentando a margem de lucro dos
empresários.
Mesmo que o índice de reajuste dos salários fosse de 50%, continuaria havendo transferência ou concentração de
renda porque, em 1994, 80% dos trabalhadores brasileiros recebiam até três salários-mínimos mensais (71,6% em 2008), e
a maioria não tinha como investir e proteger seu salário no mercado financeiro para manter o poder de compra do seu
dinheiro.
Há várias entidades que divulgam índices de inflação, como a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da
Universidade de São Paulo (Fipe/USP), o IBGE e a FGV, entre outras. Cada uma adota uma metodologia de cálculo própria.
Por exemplo, pode-se medir a inflação nos distribuidores atacadistas ou no varejo para as diferentes classes de renda
mensal, e até mesmo para as diferentes regiões do país.
O índice de inflação é composto por muitas variáveis – alimentação, moradia, transporte, vestuário, educação, saúde,
lazer, serviços públicos; portanto, varia para as diferentes faixas de renda. Por exemplo, se o preço dos alimentos subir, o
índice será maior para a população de baixa renda, pois a alimentação tem um peso maior em suas despesas mensais. Por
outro lado, se subir o preço das passagens aéreas e dos automóveis, as classes mais abastadas serão mais atingidas.
Vamos comparar o efeito da inflação para duas pessoas: uma com salário mensal de R$ 600 e outra de R$ 6 mil. Para
simplificar a comparação e facilitar o entendimento, vamos considerar apenas o efeito do item alimentação nessas duas
faixas de renda.
A pessoa que ganha R$ 600 gasta, aproximadamente, R$ 200, ou 33,3% do seu salário, com alimentação. Quem ganha R$
6 mil pode gastar, por exemplo, quatro vezes mais (R$ 800), e, mesmo assim, despenderia apenas 13,3% da sua renda mensal.
Se os gastos com alimentação sofrerem um aumento de 50%, o índice de inflação será de 16,66% para quem ganha R$ 600 (ou
seja, R$ 100 a mais do que gastava: R$ 100/600 x 100 = 16,66%), mas apenas de 6,66% para quem ganha R$ 6 mil (R$ 400/6
000 x 100 = 6,66%).
Como o governo divulgava um único índice de inflação, válido para todas as faixas de renda em todo o território nacional,
saía perdendo quem ganhava menos. Suponha que o governo divulgasse um índice médio de 11,66%, o qual fosse utilizado para
reajuste salarial. O que aconteceria? O trabalhador mais pobre teve uma inflação de 16,66% e seu salário foi reajustado em 11,66%
— perdeu poder aquisitivo, ficou mais pobre. Já quem ganha mais teve uma inflação de 6,66% e seu salário também foi reajustado
em 11,66% — aumentou seu poder aquisitivo. Imagine isso acontecendo todos os meses durante vários anos seguidos e perceba
o desastre provocado na distribuição da renda nacional entre as diferentes faixas de renda.
Ao longo da campanha eleitoral de 1998, o Brasil sofreu um forte ataque especulativo, o que levou o governo a abandonar
o compromisso de manutenção das taxas de câmbio da época (aproximadamente R$ 1,30 por dólar), e em janeiro de 1999 houve
uma maxidesvalorização do real: o dólar subiu de cerca de R$ 1,60 para R$ 2,20. Essa nova cotação deu início a um aumento nas
exportações e a uma redução no volume de bens importados. Observe, ao lado, o comportamento da nossa balança comercial no
período.
A maxidesvalorização cambial do início de 1999 só permitiu saldos positivos na balança comercial brasileira a partir
de 2001, pois as empresas precisam de um tempo relativamente longo para conquistar mercados, comercializar seus
produtos e receber pelas vendas realizadas. Além da desvalorização cambial, não podemos esquecer que a modernização
da economia contribuiu para o aumento da competitividade das empresas brasileiras.
Num primeiro momento, essa desvalorização cambial provocou aumento da inflação, uma vez que produtos
importados (como trigo, petróleo, máquinas e equipamentos de comunicação e informática, entre outros) ficaram mais caros
e a população em geral, novamente, teve perda de seu poder aquisitivo. Depois que esse aumento foi repassado ao preço
dos produtos, entretanto, a desvalorização cambial permitiu que vários setores industriais aumentassem sua produção,
porque muitos bens de consumo e de capital, anteriormente importados, ficaram mais caros no mercado interno. Embora
involuntária, essa foi uma prática de protecionismo. A redução no volume das importações, associada ao aumento nas
exportações, reduziu – mas não eliminou – a vulnerabilidade da economia brasileira e sua dependência do ingresso de
capital estrangeiro.
Ao longo do governo Fernando Henrique, os índices de crescimento econômico foram baixos e o desemprego
continuou elevado, na casa de 10% da População economicamente ativa (PEA), ou seja, as pessoas ocupadas mais a
parcela de pessoas desocupadas que estão procurando trabalho. Esses fatores, associados à consequente perda de poder
aquisitivo dos assalariados a partir de 1997, colaboraram para a derrota de José Serra (PSDB) contra Luiz Inácio Lula da
Silva (PT) nas eleições de 2002. Durante a campanha eleitoral daquele ano e durante o período de transição entre o governo
de Fernando Henrique e o de Lula, a moeda norte-americana novamente sofreu forte valorização especulativa, chegando a
ser cotada a R$ 4,00.
Ao longo do governo Lula (2002-2010), a cotação do dólar recuou para cerca de R$ 1,80, e as taxas de juros caíram
para 8,75% ao ano (dados de janeiro de 2010), pois não houve mudanças bruscas quanto à política econômica vigente:
• estabelecimento de metas para a inflação;
• responsabilidade fiscal com aumento do superavit primário, que em 2002 aumentou de 3,75% para 4,25% do PIB;
• elevação nas taxas de juros do Banco Central, atingindo 26,5% em abril de 2003, a partir de quando foi passando por lentas
reduções;
• manutenção do câmbio flutuante;
• garantia de cumprimento dos contratos;
• ampliação da rede de proteção social com aumento da transferência direta de renda para a população de baixo poder
aquisitivo.
132
Nesse contexto, os índices de crescimento econômico apresentaram elevação em 2007 e 2008. Além de, em linhas
gerais, dar continuidade à política econômica do governo Fernando Henrique, o governo de Lula tomou medidas que:
• cessaram as privatizações e concessões de serviços públicos;
• aumentaram os superávits comerciais;
• ampliaram os programas de transferência de renda à população carente;
• melhoraram a confiança dos investidores estrangeiros no Brasil – o risco-país caiu para cerca de 200 pontos;
• elevaram a cotação dos títulos da dívida pública emitidos pelo governo brasileiro;
• elevaram as reservas internacionais, o que levou o país a quitar sua dívida com o FMI e se tornar credor em dólar, em vez
de devedor (segundo o Banco Central do Brasil, em 4 de dezembro de 2012, as reservas atingiram US$378 bilhões,
superando os compromissos internacionais do país);
• elevaram a dívida interna (resultante da emissão de títulos da dívida pública) de R$ 684 bilhões para R$ 1,9 trilhão entre
abril de 2002 e outubro de 2012.
Com esse conjunto de medidas, houve uma retomada da captação de empréstimos no exterior, feitos por empresas
brasileiras, fluxo que estava estagnado desde a campanha eleitoral. O aumento da oferta de dólares na economia também
foi decisivo para a queda da cotação da moeda norte-americana em relação ao real ao longo de 2003, primeiro ano do novo
governo. Entretanto, apesar dos avanços, o crescimento econômico permaneceu baixo.
Na média, o crescimento do PIB ao longo dos dois governos de Fernando Henrique Cardoso foi de apenas 2,3% ao
ano. Nos oito anos do governo Lula, o crescimento melhorou, com média de 4,4%, mas continuou baixo, além de inferior ao
de outros países emergentes nesse mesmo período. São índices baixos para um país com as enormes carências sociais
que o Brasil apresenta.
O baixo crescimento econômico não permitiu que fossem gerados os empregos necessários para a absorção
daqueles, especialmente os mais jovens, que estavam tentando entrar no mercado de trabalho. No período de 1995 a 2011
houve um aumento de 23,8 milhões de pessoas ocupadas, mas o crescimento da PEA foi maior – 27 milhões de pessoas
tentaram entrar no mercado de trabalho. Resultado: embora a taxa de desemprego tenha se mantido entre 6,1% e 6,7%, em
números absolutos houve crescimento.
Em resumo, entre 1994 e 1999 foi possível controlar a inflação manipulando o câmbio, o que gerou sobrevalorização
da nossa moeda e grande déficit na balança comercial. Para financiar esse déficit, o país passou a depender da entrada de
capitais especulativos, atraídos por uma política de juros internos elevados. A manutenção dos juros altos por vários anos
resultou no aumento do déficit público, no aumento da dívida interna e em baixos índices de crescimento industrial (de 1995
a 1999, a produção industrial brasileira cresceu em média apenas 1,2% ao ano, e o PIB, 2,2%, na média do período).
Para combater esse quadro, o governo promoveu uma desvalorização cambial em janeiro de 1999 e o comércio
exterior brasileiro passou, em 2001, a apresentar superavit. Porém, somente a partir de outubro de 2003 foi possível reduzir
os juros, o que continuou acontecendo até 2012, ano em que houve queda para um dígito (7,25% ao ano no mês de
dezembro). Mesmo assim, o país ainda apresentava a quarta maior taxa do mundo, sendo superado apenas por Argentina,
Egito e Índia.
Quando eclodiu a crise econômica mundial de 2008, o Brasil e outros países emergentes se encontravam em situação
econômica muito melhor que a das crises de 1997, 1999 e 2001. A inflação controlada dentro das metas estabelecidas, os
juros em queda, um grande volume de reservas em moeda estrangeira no Banco Central e um mercado interno em
crescimento permitiram que o país sofresse consequências bem mais brandas que as verificadas nos Estados Unidos, na
União Europeia e no Japão.
Em 2011 foi empossada na Presidência da República Dilma Rousseff, ex-ministra e sucessora de Lula. Os primeiros
dois anos de seu governo foram marcados por baixo crescimento do PIB (2,3% em 2011 e 0,9% em 2012) e manutenção
das linhas gerais da política econômica de seu antecessor, com ampliação dos programas de transferência de renda à
população carente e redução das taxas de juros.
Ao longo dos oito anos de governo Lula e na primeira metade do governo Dilma, os investimentos em infraestrutura
foram insuficientes para sustentar um crescimento econômico mais acelerado, e houve deterioração na qualidade de alguns
serviços públicos, com destaque para o transporte aéreo, que apresentou alguns episódios de grande transtorno aos
usuários. Para enfrentar a necessidade de novos investimentos em transportes, energia e outros setores, em 2012 o governo
Dilma retomou o projeto de Fernando Henrique para atrair investimentos privados por meio da concessão da administração
de usinas, aeroportos, portos, rodovias e ferrovias à iniciativa privada.

6.3 - Estrutura e distribuição da indústria brasileira


Em 2010, a atividade industrial era responsável por 23% do PIB brasileiro. Segundo o IBGE (Sistema de Contas
Nacionais 2005-2009), as atividades mais importantes em 2009 e responsáveis por quase 75% do total do valor da
transformação industrial do país foram: fabricação de produtos alimentícios e bebidas (21%), fabricação de veículos
automotores (12%), produtos químicos e farmacêuticos (11%), derivados de petróleo e biocombustíveis (10%), metalurgia e
produtos de metal (10%), máquinas, equipamentos e materiais elétricos (7%), informática, eletrônicos e ópticos (3%). Porém,
embora os produtos não industrializados tenham obtido grande crescimento entre 2000 e 2010 – de US$ 9 bilhões para US$
73 bilhões, principalmente por causa do aumento da importação de matérias-primas e de alimentos pela China e outros
países emergentes –, a exportação de produtos de alta e média tecnologias cresceu de cerca de US$ 20 bilhões para US$
47 bilhões nesse mesmo período.
133
Essa modernização do parque industrial ganhou impulso com a instalação de diversos parques tecnológicos (ou
tecnopolos) espalhados pelo país, que estimulam a parceria entre as universidades, as instituições de pesquisa e as
empresas privadas, e buscam maior competitividade e desenvolvimento de produtos.
No Brasil, os parques tecnológicos aparecem em todas as regiões, num total de 55 espalhados pelo país em 2012.
Os principais estão localizados em:
• São Paulo, Campinas e São José dos Campos (SP); Santa Rita do Sapucaí e Viçosa (MG); e Rio de Janeiro (RJ), no
Sudeste;
• Recife (PE); Fortaleza (CE); Campina Grande (PB); e Aracaju (SE), no Nordeste;
• Porto Alegre (RS); Florianópolis (SC); e Cascavel (PR), no Sul;
• Brasília (DF), no Centro-Oeste;
• Manaus (AM) e Belém (PA), no Norte.
Entre os aspectos positivos da dinâmica atual da indústria brasileira, podemos destacar:
• grande potencial de expansão do mercado interno, com desconcentração de produção e consumo (que vem se fortalecendo
pelas políticas de transferência de renda promovidas pelos governos federal, estaduais e municipais);
• o aumento nas exportações de produtos industrializados, mesmo que em ritmo inferior ao dos produtos primários, em
virtude das crescentes importações chinesas;
• o aumento na produtividade;
• a melhora da qualidade dos produtos.
A indústria ainda enfrenta, porém, vários problemas que aumentam os custos e dificultam a maior participação no
mercado externo, tais como:
• preço elevado da energia elétrica;
• problemas de logística: deficiências e altos preços nos transportes;
• baixo investimento público e privado em desenvolvimento tecnológico;
• baixa qualificação da força de trabalho - mão de obra barata não é mais vantagem;
• elevada carga tributária;
• barreiras tarifárias e não tarifárias impostas por outros países à importação de produtos brasileiros.
Devido a esses problemas, a partir da metade da década passada, a participação percentual do setor industrial na
composição do PIB vem sofrendo reduções.
A abertura da economia brasileira na década de 1990 facilitou a entrada de muitos produtos importados, forçando as
empresas nacionais a se modernizar e incorporar novas tecnologias ao processo produtivo para concorrer com as empresas
estrangeiras. Apesar da modernização, continua havendo aumento no contingente de trabalhadores na indústria de todos
os gêneros, porém, como vimos, esse aumento não acompanhou o ritmo de ingresso de mão de obra no mercado de
trabalho.

Desconcentração da atividade industrial


Em função de fatores históricos e de novos investimentos em infraestrutura de energia e transportes, entre outros, o
parque industrial brasileiro vem se desconcentrando e apresenta uma maior dispersão espacial dos estabelecimentos
industriais em regiões historicamente marginalizadas.
Embora desde o início do século XX o eixo São Paulo-Rio de Janeiro seja responsável por mais da metade do valor da
produção industrial brasileira, até a década de 1930, a organização espacial das atividades econômicas era dispersa. As atividades
econômicas regionais progrediam de forma quase totalmente autônoma. A região Sudeste, onde se desenvolvia o ciclo do café,
quase não interferia nem sofria interferência das atividades econômicas que se desenvolviam no Nordeste (cana, tabaco, cacau e
algodão) ou no Sul (carne, indústria têxtil e pequenas agroindústrias de origem familiar). As indústrias de bens de consumo, a
maioria ligada aos setores alimentício e têxtil, escoavam a maior parte da sua produção apenas em escala regional. Somente um
pequeno volume era destinado a outras regiões, não havendo significativa competição entre as empresas instaladas nas diferentes
regiões do país, consideradas até então arquipélagos econômicos regionais.
Com a crise do café e o impulso à industrialização, comandada pelo Sudeste, esse quadro se alterou. Intensificou-se um
processo de integração dos mercados regionais, comandado pelo centro econômico mais dinâmico do país, o eixo São Paulo-Rio
de Janeiro, interligando os arquipélagos econômicos regionais. Houve um aumento da participação de produtos industriais do
Sudeste nas demais regiões do país, o que levou muitas indústrias, principalmente nordestinas, à falência.
Além de terem se iniciado historicamente com mais força no Sudeste, as atividades industriais tenderam a concentrar-se
nessa região por causa de dois outros fatores básicos:
• a complementaridade industrial: as indústrias de autopeças tendem a se localizar próximo às automobilísticas; as petroquímicas,
próximo às refinarias; etc.;
• a concentração de investimentos públicos no setor de infraestrutura industrial: pressionados pelos detentores do poder econômico,
os governantes costumam atender às suas reivindicações.
O governo gasta menos concentrando investimentos em determinada região em vez de distribuí-los pelo território nacional,
sobretudo no início do processo de industrialização, quando os recursos eram mais escassos.
A primeira grande ação governamental para dispersar o parque industrial aconteceu em 1968, quando foi criada a
Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa) e instalado um polo industrial naquela cidade, o que promoveu grande
crescimento econômico. A seguir, como resultado dos Planos Nacionais de Desenvolvimento dos governos Médici (1969-1974) e
Geisel (1974-1979), no final da década de 1970 e início da seguinte, começaram a ser inauguradas as primeiras usinas hidrelétricas
134
nas regiões Norte e Nordeste: Tucuruí, no rio Tocantins (PA); Sobradinho, no rio São Francisco (BA); e Boa Esperança, no rio
Parnaíba (PI). Quando o governo passou a atender ao menos parte das necessidades de infraestrutura das regiões historicamente
marginalizadas, começou a haver um processo de dispersão do parque industrial pelo território, não apenas em escala nacional,
mas regional, com industrialização dispersa pelo território de várias regiões e estados brasileiros.
Além da alocação de infraestrutura, ao longo da década de 1990, as indústrias passaram a se dispersar em busca de mão
de obra mais barata e onde os sindicatos são menos atuantes, provocando a intensificação da guerra fiscal entre estados e
municípios que reduzem impostos e oferecem outras vantagens, como doação de terrenos, para atrair as empresas.
Mesmo no estado de São Paulo, o mais equipado do país quanto à infraestrutura de energia e transportes, historicamente
houve maior concentração de indústrias na Região Metropolitana de São Paulo.
Entretanto, atualmente, seguindo uma tendência já verificada em países desenvolvidos, tem ocorrido um processo de
deslocamento das indústrias em direção às cidades médias em todas as regiões do país, como as que receberam a instalação dos
parques tecnológicos. Isso é possível graças ao grande desenvolvimento da informática e à modernização da infraestrutura de
produção de energia, transporte e comunicação, criando condições de especialização produtiva por intermédio da integração
regional. As regiões tendem, atualmente, a se especializar em poucos setores da atividade econômica e a buscar em outros
mercados (do Brasil ou do exterior) as mercadorias que satisfaçam as necessidades diárias de consumo da população.

7. O Meio Técnico - Economia e Tecnologia: Geografia e Política da Energia


7.1 - Introdução - O Pano de fundo global
The Energy Outlook explora as forças que moldam a transição energética global até 2050 e as principais incertezas em torno
dessa transição. É provável que o sistema energético global passe por uma reestruturação fundamental para se descarbonizar, o
que criará desafios e oportunidades para o setor. Três cenários principais - Rápido, Net Zero e Negócios como sempre - fornecem
uma gama de resultados possíveis para compreender a
gama de incertezas à frente.

As emissões de carbono do uso de energia são a maior


fonte de emissões de gases de efeito estufa
Evidências científicas sugerem que a causa dominante das
mudanças climáticas é a liberação de gases de efeito
estufa (GEE). O World Resources Institute (WRI) estima
que o total de GEEs foi igual a 49,4 Gt CO2e em 2016, com
as emissões de carbono do uso de energia sendo a maior
fonte de GEEs, respondendo por cerca de 65% de todos os
GEEs.
A estimativa das emissões de carbono da energia
usada no Energy Outlook difere ligeiramente da definição
do WRI. O Energy Outlook não modela as emissões
fugitivas de metano da produção de hidrocarbonetos e,
portanto, elas são excluídas das estimativas usadas. O
Outlook, entretanto, inclui emissões de combustíveis de
bunker que estão excluídas da definição do WRI. Com base
na definição do Energy Outlook, as emissões de carbono
do uso de energia em 2016 foram de 32,9 Gt CO2e,
semelhante à estimativa do WRI de 32,3 Gt CO2e.
Além das emissões de carbono do uso de energia, o WRI estima que as outras principais fontes de emissões em 2016
foram: agricultura (5,8 Gt CO2e); processos industriais (2,8Gt CO2e); uso da terra e mudança florestal 3.2 GtC02e); e
instalações de gestão de resíduos (1,6 Gt CO2e).
Em termos de emissões de carbono do uso de energia, quase metade das emissões provém da energia usada na
indústria. O restante é dividido igualmente entre os setores de transporte e edifícios (incluindo agricultura).
Conforme a transição energética avança, algumas emissões podem ser evitadas mais prontamente do que outras. Em
particular, as emissões de carbono de atividades ou processos que são relativamente simples ou baratos de eletrificar podem
ser reduzidas à medida que o setor de energia é cada vez mais descarbonizado. Uma exceção a isso são as demandas
sazonais de aquecimento e resfriamento em edifícios. Embora essas demandas possam ser eletrificadas, a escala das
flutuações sazonais é difícil de atender em um setor de energia fortemente baseado em energia renovável intermitente.
A maioria das emissões que são difíceis de abater resultam de atividades ou processos que são difíceis de eletrificar
e, portanto, precisam de fontes alternativas de energia de baixo carbono. Isso inclui processos industriais de alta temperatura,
como os usados em ferro e aço, cimento e produtos químicos. Também inclui serviços de transporte de longa distância,
incluindo caminhões pesados, e marítimo.

PIB global segue em expansão, mas em ritmo mais lento


A economia mundial continuará a crescer nos próximos 30 anos, impulsionada pelo aumento da riqueza e dos padrões
de vida no mundo em desenvolvimento, mas a um ritmo mais lento do que no passado.
A média de crescimento anual do PIB global é de cerca de 2,6% (com base na Paridade do Poder de Compra em
2015) em todos os três cenários. Esse crescimento é consideravelmente mais lento do que sua média nos últimos 20 anos,
135
em parte refletindo o impacto persistente da Covid-19 na atividade econômica. Veja abaixo uma discussão sobre o tratamento
da Covid-19 no Panorama de Energia deste ano.
O crescimento econômico mais fraco do
que no passado também reflete o suposto
impacto crescente das mudanças climáticas no
potencial produtivo da economia (veja
Mudanças climáticas, abaixo, e Estimativas
das mudanças climáticas no crescimento do
PIB para uma discussão desse impacto).
A expansão da atividade global é
apoiada pelo crescimento populacional, com a
população mundial aumentando em mais de 2
bilhões de pessoas para cerca de 9,6 bilhões
em 2050.
Mas o fator mais importante que
sustenta o crescimento global é o aumento da
produtividade (PIB per capita) - e, portanto, da
prosperidade (renda per capita) - que
impulsiona cerca de 80% da expansão do PIB
global em relação ao Outlook.
As economias em desenvolvimento
respondem por mais de 80% do crescimento
da economia mundial, com China e Índia
contribuindo com cerca de metade desse
aumento.
O crescimento da atividade global e da prosperidade é sustentado por altos níveis contínuos de urbanização, que
muitas vezes é parte integrante do processo de desenvolvimento, levando a níveis crescentes de industrialização e
produtividade. Os países que devem ter um ritmo
relativamente rápido de urbanização nos próximos
30 anos - ou seja, o nível de urbanização deve
aumentar em pelo menos um terço até 2050 -
contribuem com bem mais da metade do aumento
da produção mundial sobre o Outlook, apesar de
representar menos de um terço do PIB global em
2018.

O impacto das mudanças climáticas no


crescimento econômico aumenta em relação
ao Outlook
Mudança no PIB per capita em relação à
projeção usando temperaturas médias que são
mantidas constantes no nível atual.

Supõe-se que a concentração crescente de gases de efeito estufa em todos os três cenários terá um impacto crescente
no crescimento e no potencial produtivo da economia global.
O aumento das temperaturas, combinado com padrões climáticos mais extremos e o aumento do nível do mar, pode
desencadear uma série de impactos que reduzem o crescimento econômico. Os esforços para reduzir ou mitigar as emissões
de carbono também podem desviar o investimento de outras fontes de crescimento.
Estimar o tamanho potencial desses impactos é altamente incerto, com a maioria dos modelos e estudos ambientais
e econômicos existentes capturando apenas um subconjunto desses efeitos, muitas vezes de forma muito imperfeita. Por
exemplo, a literatura econômica na qual nosso impacto ilustrativo sobre o PIB se baseia considera apenas o aumento das
temperaturas.
Para fins ilustrativos, o nível do PIB em 2050 em todos os três cenários é projetado para ser cerca de 5% menor em
relação a um mundo hipotético no qual a concentração de gases de efeito estufa foi congelada nos níveis atuais. Presume-
se que esses efeitos sejam maiores nas regiões que têm as temperaturas médias mais altas atualmente (consulte Estimativas
de mudanças climáticas no crescimento do PIB para mais detalhes).
O impacto negativo do aumento dos níveis de temperatura é maior no BAU, onde pouco progresso é feito na redução
das emissões de carbono. Mas os custos iniciais das ações políticas tomadas para reduzir as emissões são maiores em
Rápido e Net Zero, de forma que o impacto geral no PIB nos próximos 30 anos é projetado para ser amplamente semelhante
em todos os três cenários.

136
É importante ressaltar que se os cenários fossem extrapolados para além de 2050, a erosão da riqueza e da
prosperidade no BAU ficaria progressivamente pior, levando a níveis significativamente mais baixos de atividade e bem-estar
do que no Rápido ou Net Zero.
Os modelos e estudos ambientais e econômicos que sustentam essas estimativas ilustrativas do impacto do
aquecimento global sobre a atividade econômica são altamente incertos e quase certamente incompletos - por exemplo, eles
não captam muitos dos custos humanos potenciais. Edições futuras do Energy Outlook atualizarão essas estimativas à
medida que o entendimento científico e econômico desses efeitos melhorar.

A demanda de energia cresce liderada pelo aumento da prosperidade, parcialmente compensada por ganhos de
eficiência
O crescimento da demanda global
de energia é sustentado por níveis
crescentes de prosperidade nas
economias emergentes. A energia
primária aumenta cerca de 10% no Rapid
and Net Zero e cerca de 25% no BAU.
Muito desse aumento no consumo
de energia - todo o crescimento no Rapid
and Net Zero e mais da metade no BAU -
deriva de economias que estão se
urbanizando rapidamente.
As taxas médias de crescimento da
energia primária em Rapid (0,3% aa) e
Net Zero (0,3% aa) são significativamente
mais lentas do que nos últimos 20 anos
(2,0% aa), refletindo uma combinação de
crescimento econômico mais fraco e
melhorias mais rápidas em intensidade
energética (energia utilizada por unidade do PIB). A energia primária em ambos os cenários atinge amplamente os platôs na
segunda metade do Outlook.
A eficiência energética medida em termos de consumo final de energia melhora em mais em Zero Líquido do que em
Rápido, mas esses ganhos são compensados em termos de energia primária pelo maior uso de eletricidade e hidrogênio,
que requerem quantidades consideráveis de energia primária para produzir.
O crescimento da energia primária em BAU (0,7% a.a.) é mais rápido e sustentado do que nos outros dois cenários,
refletindo ganhos mais lentos em eficiência energética.
Os declínios mais rápidos na intensidade de energia em relação à história em Rápido e Net Zero são um fator crítico
na mitigação do crescimento das emissões de carbono. Mantendo as outras coisas iguais, se a intensidade energética em
relação ao Outlook melhorasse na mesma taxa dos últimos 20 anos, as emissões de carbono em 2050 seriam mais de um
quarto mais altas no Rápido e Net Zero.
Políticas e ações para promover melhorias na eficiência energética são fundamentais para alcançar uma transição de
baixo carbono.

Presume-se que a Covid-19 tenha um impacto persistente na atividade econômica e na demanda de energia

A pandemia de Covid-19 é antes de tudo uma crise


humanitária, mas a escala do custo econômico e da
ruptura também deve ter um impacto significativo e
persistente na economia global e no sistema de energia.
No momento em que este artigo foi escrito, o número de
novos casos da pandemia ainda está aumentando e,
portanto, a avaliação de seu eventual impacto é
altamente incerta.
A visão central utilizada nos principais cenários é
que a atividade econômica se recupera parcialmente do
impacto da pandemia nos próximos anos conforme as
restrições são atenuadas, mas que alguns efeitos
persistem. O nível do PIB global é estimado em cerca de
2,5% menor em 2025 e 3,5% em 2050 como resultado da
crise. Esses impactos econômicos afetam de maneira
desproporcional as economias emergentes, como Índia,
Brasil e África, cujas estruturas econômicas estão mais expostas às ramificações econômicas da Covid-19.
137
A pandemia também pode levar a uma série de mudanças comportamentais; por exemplo, se as pessoas optarem
por viajar menos, mude de transporte público para outros meios de transporte ou trabalhe em casa com mais frequência.
Muitas dessas mudanças comportamentais provavelmente se dissiparão com o tempo, conforme a pandemia for controlada
e a confiança pública for restaurada. Mas algumas mudanças, como o aumento do trabalho em casa, podem persistir.
Em Rapid, presume-se que o impacto da pandemia reduza o nível de demanda de energia em cerca de 2,5% em 2025
e 3% em 2050. Os impactos são mais pronunciados sobre a demanda de petróleo, que é cerca de 3 Mb / d menor em 2025
e 2 Mb / d em 2050 como resultado da pandemia. A maior parte desta redução reflete o ambiente econômico mais fraco,
com cerca de 1 Mb / d de redução em 2025 como resultado de várias mudanças de comportamento. Os impactos marginais
em BAU e Net Zero são semelhantes.
Existe o risco de que as perdas econômicas da Covid-19 sejam significativamente maiores, especialmente se houver
novas ondas de infecção. Essa possibilidade é explorada em um caso de 'maior impacto', no qual a Covid-19 reduz o nível
do PIB global em 4% em 2025 e quase 10% em 2050. Neste caso de 'maior impacto', a crise causa o nível de demanda de
energia em Rapid em 2050 a ser 8% menor, com o nível de demanda de petróleo em torno de 5 Mb / d menor.

O desenvolvimento econômico depende tanto do acesso à energia quanto da qualidade desse acesso
Existe uma forte ligação entre o acesso à energia e o bem-estar e prosperidade econômicos. A importância do acesso
à energia está consubstanciada no
Objetivo de Desenvolvimento
Sustentável (ODS) 7 da ONU, que visa
“garantir o acesso a energia acessível,
confiável, sustentável e moderna para
todos”.
Uma medida monitorada pelo
ODS 7 é o acesso global à eletricidade,
onde o número de pessoas sem acesso
é estimado ter diminuído de 1,2 bilhão
em 2010 para 790 milhões em 2018 *.
A prosperidade e o
desenvolvimento econômico dependem
não apenas da capacidade de acesso à
eletricidade, mas também da
quantidade e qualidade do
fornecimento de eletricidade.
A estrutura de vários níveis do
Banco Mundial fornece uma medida de
qualidade de acesso, em que o acesso
de Nível 1 equivale a níveis muito
básicos de fornecimento (iluminação
com disponibilidade limitada), embora para Nível 5, que denota acesso a suprimentos abundantes e confiáveis.
Há uma forte ligação entre o desenvolvimento econômico e a qualidade do acesso à eletricidade: cerca de três quartos
dos países de renda baixa e média-baixa em 2018 tinham acesso relativamente limitado à eletricidade (Nível 3 ou inferior);
enquanto mais de 90% dos países de alta renda tinham acesso ao Nível 5.
Embora se estima que a parcela da população mundial sem qualquer acesso à eletricidade tenha diminuído para 10%
em 2018, cerca de 45% da população mundial vivia em países com acesso Tier 3 ou inferior. Em todos os três cenários,
cerca de um quarto da população mundial em 2050 vive em países ou regiões em que os níveis médios de consumo de
eletricidade ainda são equivalentes ao acesso Tier 3 ou inferior.
Melhorar a qualidade do acesso à eletricidade - e o acesso à energia de forma mais geral - em todo o mundo
provavelmente exigirá uma série de diferentes abordagens de políticas e tecnologias, incluindo o desenvolvimento de
geração de energia descentralizada e fora da rede.

* Fonte: Tracking SDG7: The Energy Progress Report 2020


https://www.bp.com/en/global/corporate/energy-economics/energy-outlook/introduction.html. Acesso em 22
fev 2021

7.2 - A matriz energética mundial


Na era pré-industrial, as forças humana e animal representaram as fontes de energia dominantes, assim como os ventos,
que moviam embarcações e moinhos; a água corrente, que movia rodas d'água; e a madeira, cuja combustão servia para
aquecimento doméstico, preparo de alimentos e fundição de metais.
A era industrial baseou-se numa revolução energética. As tecnologias mecânicas e, mais tarde, elétricas e eletrônicas
apoiaram-se essencialmente nos combustíveis fósseis. No século XIX, o carvão mineral foi o alicerce energético da indústria e dos
modernos meios de transporte. No século XX, o petróleo somou-se ao carvão e acabou tornando-se a principal fonte energética.

138
O predomínio do petróleo consolidou-se ao longo das últimas quatro décadas. Nesse período, o consumo de gás natural
multiplicou-se por quatro, aproximando-se do consumo de carvão. A tríade dos combustíveis fósseis é responsável por 90% da
energia comercial consumida no mundo. O restante divide-se quase totalmente entre as fontes hídrica e nuclear.
Com a alta do preço do barril de petróleo entre 1980 e 1985, consequência da situação política do Irã, principal produtor, o
consumo desse recurso experimentou retrocesso, mas depois voltou a crescer. O ritmo dessa expansão deve se reduzir, em virtude
do encarecimento do produto, que reflete uma forte redução na descoberta de novas reservas em condições de extração comercial.
O consumo de carvão mineral apresenta uma dinâmica inversa à do petróleo. Quando os preços do segundo sobem,
aumenta a produção de carvão, com a intensificação da exploração de minas antigas e a abertura de minas novas. Esse é o motivo
da expansão de consumo de carvão no início do século XXI, que foi impulsionado pelo forte crescimento econômico da China.
O consumo de gás natural segue outra lógica.
A sua expansão persistente decorre das qualidades
ambientais do recurso, que gera emissões menores de gases
de estufa. Alguns analistas narram a história dos combustíveis
na era industrial como uma sequência que se inicia num “ciclo
dos sólidos” (carvão e madeira), continua num "ciclo do líquido"
(petróleo) e chega ao "ciclo do gás" (gás natural).
A produção de energia em usinas nucleares decolou na
década de 1970, mas enfrentou forte oposição dos movimentos
ambientalistas. Em consequência, inúmeros projetos foram
abandonados, principalmente na Europa, e o crescimento da
produção perdeu velocidade desde 1990. Atualmente,
governos e lideranças ambientalistas descobrem as virtudes da
fonte nuclear, que não gera emissões de gases de estufa, o
que parece indicar um novo ciclo de construção de usinas.
A produção hidrelétrica cresce lentamente, em
virtude das limitações naturais do potencial dos rios. Nas
antigas potências industriais, o aproveitamento hidrelétrico atingiu há décadas um ponto próximo do máximo. A expansão
da produção ocorre, atualmente, em países em desenvolvimento que possuem significativo potencial explorável. O Brasil
destaca-se no panorama mundial por sua elevada produção hidrelétrica.
O balanço energético global não se circunscreve às fontes comercializadas no mercado internacional. Além delas, são
utilizados combustíveis renováveis, um item que abrange os biocombustíveis e combustíveis tradicionais. Os
biocombustíveis apresentam amplas perspectivas de crescimento, mas ainda não são comercializados internacionalmente
em larga escala. Combustíveis tradicionais, como a lenha e excrementos de animais, têm baixa eficiência energética, mas
são bastante utilizados para o aquecimento doméstico e para o preparo de alimentos em regiões rurais pobres.
Finalmente, há fontes alternativas, como a eólica, a solar e a geotérmica, que prosperam apenas em algumas áreas
do mundo, sob o impulso de condições naturais particularmente favoráveis ou de subsídios governamentais. Em conjunto,
elas respondem por uma fração quase insignificante do consumo mundial.

Estratégias energéticas
A transição da economia pré-industrial para a economia industrial representou um salto vertiginoso no consumo de
energia mundial. Mas o salto inicial representou apenas o primeiro de uma série de saltos que acompanharam o
desenvolvimento tecnológico das sociedades, a urbanização da população e a difusão da indústria e dos transportes
modernos pelo mundo.

139
Do ponto de vista econômico e social, energia e desenvolvimento estão estreitamente ligados. Em 2004, nos Estados
Unidos, o consumo anual de energia era de 7,9 toe (abreviatura, em inglês, de ton of oil equivalent, ou seja, toneladas
equivalentes de petróleo - tep) per capita e, na França, situava-se em torno de 4,4 toe per capita. Existem diferenças
importantes nos padrões de consumo energético entre os dois países, mas em ambos o consumo médio é bastante elevado.
Os contrastes entre os países desenvolvidos e os demais são
marcantes: no México, o consumo anual per capita de energia era
de 1,6 toe; na China, de 1,2 toe; no Brasil, de 1,1 toe; na Bolívia, de
0,6 toe.
Os níveis de desenvolvimento econômico e os contingentes
demográficos explicam a distribuição do consumo de energia
comercial pelas grandes regiões e países. Os Estados Unidos
figuram, isoladamente, como o maior consumidor de energia do
mundo. A União Europeia e a China ocupam as posições seguintes.
Juntos, eles respondem por metade do consumo energético global.
A Ásia/Pacífico consome um terço da energia comercial do
mundo. Na região, além da China, Japão e Índia figuram como
grandes consumidores. Não há relação direta entre o tamanho do
PIB e o consumo energético: a Rússia é o terceiro maior consumidor
mundial de energia, à frente do Japão, que possui PIB maior.
O consumo energético baseia-se, em quase todos os lugares,
principalmente, na queima de combustíveis fósseis. Isso significa
que os níveis de consumo se associam aos níveis de emissões de
gases de estufa decorrentes do uso de petróleo, carvão mineral e
gás natural. Contudo, a relação não é direta, pois depende da
composição das matrizes energéticas nacionais.
Os Estados Unidos figuraram, até 2005, como o maior emissor
de gases de estufa, devido ao seu elevado consumo energético.
Mas, em 2006, a China assumiu a dianteira e lançou na atmosfera
cerca de 6,2 bilhões de toneladas de CO2, contra os 5,8 bilhões dos
Estados Unidos. O consumo de energia chinês ainda é menor que o
norte-americano, mas a sua matriz assenta-se fortemente sobre o
carvão mineral, que gera emissões de CO2 ainda maiores que as do
petróleo.
As matrizes nacionais refletem as estratégias energéticas de
cada país, ou seja, as decisões políticas sobre produção, consumo
e importação de energia. Essas decisões, por sua vez, são
influenciadas pelas características do meio natural e pelas
disponibilidades de recursos no território nacional. Uma comparação
entre as matrizes energéticas de quatro países esclarece os fatores
que orientam as decisões estratégicas.

Os Estados Unidos destacavam-se como o maior produtor mundial de petróleo até a década de 1970 e organizaram
sua matriz em torno desse combustível, o que hoje provoca dependência em relação aos fornecedores externos. O país
dispõe também das maiores reservas comprovadas de carvão mineral. Os combustíveis fósseis dominam a matriz norte-
americana, embora a energia nuclear desempenhe papel de destaque.
A China apresenta matriz assentada sobre o carvão. Ela dispõe de amplas reservas carboníferas, que abastecem
quase todas as suas usinas termelétricas. O país, que exportava petróleo, tornou-se na década de 1990 o terceiro maior
importador mundial do produto, atrás dos Estados Unidos e do Japão. Atualmente já supera os EUA como importador. A
importância da biomassa no seu consumo energético deriva do uso intenso de lenha e excrementos animais no meio rural.
A França baseia a sua matriz nas usinas nucleares, em virtude de depender de petróleo importado e da decisão de
dominar a tecnologia nuclear para finalidades militares. Os investimentos na geração elétrica convencional concentram-se
em modernas usinas a gás natural. A sua matriz energética é uma das mais limpas do mundo, o que se reflete em baixas
emissões per capita de gases de estufa.
O Brasil, por motivos diferentes, também apresenta uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo. Apesar do
elevado consumo de petróleo, o país desenvolveu estratégias baseadas na exploração intensa de seus vastos recursos
hídricos para a geração de eletricidade. Além disso, desde a década de 1970, voltou esforços para a produção comercial de
biocombustíveis, que é favorecida pela amplitude da área agrícola e pelas condições climáticas adequadas ao cultivo de
cana-de-açúcar.
Nas últimas décadas, houve grande desenvolvimento tecnológico e aumento nos investimentos em prospecção de
petróleo que resultaram, entre outras, na descoberta de grandes reservas na camada pré-sal, uma formação geológica da
140
plataforma continental brasileira de aproximadamente 150 milhões de anos que se formou com o afastamento dos
continentes, em profundidades superiores a 5 mil metros.
O petróleo continua a ser a principal fonte de energia do planeta, seguido pelo carvão mineral e pelo gás natural. Essa
situação é preocupante, já que aproximadamente 80% da energia consumida mundialmente provém dessas três fontes não
renováveis, que um dia se esgotarão. Será necessário um período de transição para nos adaptarmos à utilização de novos
tipos de energia. Essa transição envolverá reformas e reestruturações, principalmente no sistema de transportes (seja ele
rodoviário, ferroviário, hidroviário ou aéreo) e na produção industrial, por meio da adaptação de máquinas e motores a outro
tipo de energia; assim como a readequação das usinas termelétricas (hoje acionadas predominantemente pela combustão
de petróleo, gás ou carvão) a uma nova fonte de energia primária. Isso já vem ocorrendo em vários países para diminuir a
dependência externa e evitar os impactos ambientais decorrentes.
Em qualquer país, a estrutura energética é um dos elementos mais decisivos da economia e da geopolítica, por isso
esse setor é considerado estratégico. A produção industrial, os sistemas de transportes e de telecomunicações, a saúde, a
educação, o comércio, a agricultura, todas as atividades, enfim, dependem de energia. Qualquer sobressalto no setor
energético interfere na posição do país no comércio mundial, já que, na composição dos custos de produção, a energia é
um fator que pode tornar a mercadoria mais ou menos competitiva no comércio internacional. Por isso o setor energético
geralmente é controlado pelo Estado, que atua diretamente na produção de energia, por meio de empresas estatais ou pela
concessão dessa produção a empresas privadas.
Todos os países almejam a autossuficiência energética e baixos custos na produção de energia para que as atividades
econômicas não fiquem sujeitas às oscilações de preço das fontes importadas. A busca por uma matriz energética
diversificada constitui estratégia de planejamento adotada por várias nações para evitar desabastecimento ou enfrentar
crises econômicas, como aconteceu com os aumentos do preço do petróleo em 1973, 1980, 1990 e 2007. Até recentemente,
a grande preocupação ao optar por determinada fonte de energia se restringia ao preço, mas, atualmente, em muitos países,
essa opção também está voltada à busca de fontes que sejam renováveis e limpas.
Para atingir esses objetivos há a necessidade de racionalizar o uso de energia observando as estratégias que causam
menos impactos econômicos, sociais e ambientais. Deve-se combater o desperdício de energia, aumentar a eficiência dos
equipamentos (residenciais, industriais, de serviços, etc.), promover a reciclagem de materiais, valorizar produtos e serviços
que consumam menos energia para ser disponibilizados, reorganizar a localização e o transporte de mercadorias e de
pessoas, e controlar as emissões de poluentes.
Além da busca pela maior eficiência energética, a intensificação do aquecimento global provocado pelo efeito estufa tem
levado os países a buscar fontes de energia menos poluentes, como a hidreletricidade, a nuclear, a eólica, a solar, a geotérmica e
a biomassa, entre outras. Nesse contexto, a utilização crescente de fontes renováveis de energia é a melhor alternativa na busca
da sustentabilidade ambiental, econômica e social.

7.3 - Petróleo
O petróleo é um hidrocarboneto fóssil de origem orgânica encontrado em bacias sedimentares resultantes do soterramento
de antigos ambientes aquáticos. Seus diversos subprodutos se apresentam em todos os estados de agregação: sólido (asfalto e
plásticos, entre outros), líquido (óleos lubrificantes, gasolina e outros combustíveis) e gasoso (gás combustível). Em suas formas
de ocorrência natural, é utilizado há muito tempo: na vedação dos reservatórios de água construídos pelos incas; na pavimentação,
em conjunto com pedras, das estradas romanas e na vedação de antigas embarcações.
Desde a década de 1930, com a construção das primeiras indústrias petroquímicas, o petróleo é uma matéria-prima
importantíssima, presente de forma constante em nosso cotidiano nas mais diversas formas: materiais de construção e de
embalagem, ingredientes de tintas, de fertilizantes e de produtos farmacêuticos, além de inúmeros tipos de plásticos.
Sua utilização como fonte de energia iniciou-se em 1859, na Pensilvânia, Estados Unidos, quando Edwin Drake, um
perfurador de poços, encontrou petróleo a apenas 21 metros de profundidade e passou a comercializá-lo com as cidades – para
ser utilizado na iluminação pública –, com as indústrias e com as companhias de trem – em substituição ao carvão mineral usado
nas máquinas a vapor.

O petróleo, por ser líquido e apresentar maior facilidade de transporte que o carvão mineral, passou a ser consumido
em quantidades crescentes a cada ano. O carvão foi a fonte de energia que impulsionou o crescimento industrial e econômico
de diversos países desde o final do século XVIII, na Primeira Revolução Industrial. No entanto, no século XIX, com a Segunda
Revolução Industrial, esse papel foi assumido pelo petróleo. O incremento do consumo foi acompanhado pelo surgimento
de centenas de companhias petrolíferas atuando em todas as quatro fases econômicas de sua exploração: extração,
transporte, refino e distribuição.
Com a invenção do motor a explosão interna e seu uso em veículos, o consumo mundial de petróleo disparou. As
empresas do setor petrolífero cresceram no mesmo ritmo do consumo, principalmente nos Estados Unidos e na Europa.
Algumas dessas empresas tornaram-se transnacionais e deram oportunidade para a formação do cartel e do oligopólio no
setor petrolífero em escala mundial. Em 1928, as sete maiores empresas do setor formaram um cartel, conhecido como “sete
irmãs”, que dividiu o planeta em áreas de influência, controlando a extração, o transporte, o refino e a distribuição da principal
fonte de energia dos sistemas de transportes e da produção industrial do globo. Esse fato causou forte reação em diversos
países, principalmente nos que dependiam da importação do produto.
Na tentativa de controlar tanto o comércio como as demais atividades petrolíferas, começaram a se desenvolver,
principalmente a partir da década de 1930, diversas empresas estatais, que passaram a atuar diretamente nas quatro fases
141
econômicas de exploração do petróleo, ou pelo menos em uma delas, segundo as prioridades estabelecidas internamente.
Entre os exemplos mais significativos estão a Pemex (México), a PDVSA (Venezuela), a Indian Oil (Índia) e a ENI (Itália).
No Brasil, com a criação da Petrobras em 1953, a extração, o transporte e o refino foram estatizados. Em 1995, foi extinto o
monopólio da Petrobras, uma empresa de capital aberto que tem o governo federal como sócio majoritário (28,5% das ações,
em 2012) e com o controle de sua estrutura administrativa; toda a regulamentação do setor petrolífero no Brasil continua sob
a responsabilidade do Estado.
A segunda ação na tentativa de desmobilização do poder das “sete irmãs” concretizou-se em 1960, com a criação da
Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), fundada por Irã, Iraque, Kuwait, Arábia Saudita e Venezuela.
Em 1973, os países da Opep promoveram um drástico aumento no preço do barril (159 litros) – de 2,70 para 11,20
dólares –, aproveitando-se de uma situação política criada pela guerra do Yom Kippur (quando Egito, Síria e outros países
atacaram Israel, dando início ao quarto conflito armado entre árabes e israelenses). Esse foi o chamado “primeiro choque
do petróleo”, que provocou crise econômica em muitos países. Boa parte dos dólares que movimentavam o comércio
internacional foi para o Oriente Médio, onde se localizam as maiores reservas e os maiores exportadores mundiais do
produto.
Nos anos de 1979 e 1980, com a ocorrência da revolução islâmica no Irã e a eclosão da guerra com o Iraque, os
países importadores ficaram preocupados com a possibilidade de ingresso de outras nações árabes no conflito. Se isso
acontecesse, a oferta mundial de petróleo estaria comprometida, o que levou muitos países a comprar o produto para
aumentar seus estoques estratégicos. Com esse brusco aumento da procura, a Opep elevou o preço do barril a 34 dólares
(como vimos, em 1973, o preço era de apenas 2,70 dólares).
Essas bruscas elevações do preço do petróleo agravaram a crise econômica do mundo desenvolvido, que já se
arrastava desde o final da década de 1960. Essa crise, porém, atingiu de forma mais severa os países importadores de
petróleo, notadamente os mais pobres, que tiveram sua balança comercial seriamente comprometida. Para enfrentar esse
problema e diminuir a dependência energética, muitos países importadores estabeleceram duas estratégias
complementares: aumentar a produção interna e substituir o petróleo por outras fontes de energia.
No mesmo período, vários países
produtores de petróleo que não integravam a
Opep – principalmente a antiga União Soviética
(com destaque para a Federação Russa), o
México e a Noruega – incrementaram sua
produção e tornaram-se grandes exportadores.
Com o petróleo custando 34 dólares o barril,
justificavam-se os investimentos em prospecção e
os custos de extração em qualquer local do
planeta. A então União Soviética foi extraí-lo na
Sibéria; os Estados Unidos, no Alasca; e o México,
o Brasil e os países do mar do Norte, em suas
plataformas continentais.
Com o aumento da produção mundial e a
substituição do petróleo por outras fontes, a lei da
oferta e da procura entrou em ação e, em 1986, a
cotação do barril caiu para 12 dólares. Essa queda
nos preços pôs em dúvida a viabilidade
econômica de muitas fontes alternativas, já que a
criação de novos modelos energéticos previa
constantes elevações no preço do petróleo. Além
disso, tornou pouco competitiva, e às vezes até ineficiente, a extração em águas profundas. Com a queda vertiginosa do
preço do barril de petróleo, algumas fontes alternativas – como o etanol, no caso brasileiro – tornaram-se inviáveis
economicamente no contexto daquela época, quando ainda não havia preocupação em diversificar a matriz energética e
combater o aquecimento global.

A partir de 1986, disputas internas na Opep tornaram cada vez mais difícil estabelecer um acordo de preços e cotas
de produção entre os países-membros. Os Estados Unidos conseguiram aprofundar a fragilização da organização por meio
de favorecimentos comerciais à Arábia Saudita e ao Kuwait, que passaram a aumentar suas produções, causando sérios
problemas internos à Opep.
Em dezembro de 1990, o Iraque, economicamente abalado com os gastos de oito anos de guerra com o Irã, invadiu
o Kuwait e ameaçou invadir a Arábia Saudita, sob o pretexto de disputa territorial, mas a verdade é que esses países estavam
extrapolando as cotas de produção de petróleo estabelecidas pela Opep e forçando uma queda no preço do barril no mercado
mundial. A fim de defender seus interesses comerciais, os Estados Unidos, liderando uma coalizão de vários países e com
o apoio da ONU e de várias nações árabes, intervieram imediatamente no conflito enviando tropas ao Oriente Médio. Isso
obrigou o Iraque a se retirar do território do Kuwait em janeiro de 1991. Durante o conflito, conhecido como Guerra do Golfo,
o barril de petróleo chegou a custar quase 40 dólares; com o fim do conflito, o preço voltou a cair e chegou a 20 dólares.
142
Em 2003, contrariando resolução da ONU, os Estados Unidos invadiram militarmente o Iraque, derrubaram o regime
de Saddam Hussein (1937-2006) e passaram a controlar as reservas petrolíferas desse país, que estão entre as maiores do
mundo. No início de 2004, o preço do barril estava em torno de 30 dólares, mas com os problemas enfrentados pelas forças
de ocupação, sobretudo como resultado da resistência armada iraquiana e o impulso no consumo causado pelo crescimento
econômico mundial, chegou a 93 dólares no início de 2008. Em janeiro de 2012, seguindo uma tendência de alta no preço
internacional das matérias-primas, estava cotado em 109 dólares o barril.
Podemos dividir os maiores produtores de petróleo em dois subgrupos: exportadores e importadores. No primeiro
estão os detentores de grandes reservas – portanto, de excedentes exportáveis. Os maiores representantes desse grupo
são a Arábia Saudita e a Rússia. No segundo estão países como os Estados Unidos e a China, que, apesar de grandes
produtores, são também grandes consumidores e dependem de importações para o abastecimento de seu mercado interno.
Embora os Estados Unidos sejam o terceiro produtor mundial de petróleo, ocupam a primeira posição entre os importadores;
a China é o quarto maior produtor, mas é o segundo maior importador. O Japão, terceiro maior importador, não é produtor
de petróleo, importa praticamente 100% de seu consumo.

7.4 - Carvão mineral e Gás natural


O carvão mineral e o gás natural ocupam, respectivamente, a segunda e a terceira posições no consumo mundial de
energia: o carvão mineral é responsável por aproximadamente 40% da geração de eletricidade, e o gás natural, por cerca
de 20%. Isso significa que mais da metade da energia elétrica produzida no planeta é obtida em usinas que utilizam carvão
mineral ou gás natural como fonte primária de energia.
Entre as fontes não renováveis de energia, o carvão mineral é a mais abundante, principalmente nos países do
hemisfério norte. Além disso, segundo estimativas, quando o petróleo se esgotar, as reservas de carvão ainda terão uma
vida útil muito longa. Isso o torna hoje o substituto imediato do petróleo em situação de crise e aumento de preço.
O uso do carvão mineral, porém, acarreta sérias agressões ambientais, pois sua estrutura molecular contém enorme
quantidade de carbono e enxofre que, após a queima, são lançados na atmosfera na forma de gás carbônico (CO2), que
agrava o efeito estufa, e de dióxido de enxofre (SO2), o grande responsável pela chuva ácida.
O carvão mineral é uma rocha metamórfica de origem sedimentar e não deve ser confundido com o vegetal, obtido
da madeira carbonizada em fornos. No que se refere à sua utilização prática, o carvão mineral é muito mais eficiente, pois
possui grande poder calorífero e sua queima libera muito mais energia que a do carvão vegetal, o que amplia suas
possibilidades de utilização em atividades siderúrgicas e na produção de energia em usinas termelétricas.
Além de constituir fonte de energia, o carvão mineral é importante matéria-prima da indústria de produtos químicos
orgânicos, como piche, asfalto, corantes, plásticos, inseticidas, tintas e náilon, entre outros.
Já o gás natural, além de ser mais barato e facilmente transportável por meio de dutos, apresenta uma queima quase
limpa (pouco poluente) em comparação ao carvão e ao petróleo.
Trata-se de uma fonte de energia muito versátil, pois pode ser utilizada na geração de energia elétrica (em usinas
térmicas), nas máquinas e altos-fornos industriais, nos motores de veículos, nos fogões e no aquecimento das residências,
entre outros. Em razão disso, vem sendo cada vez mais empregado nos transportes, na termeletricidade, na produção
industrial e no consumo doméstico.
A partir da década de 1980, o
consumo de gás natural vem
apresentando forte expansão.
Segundo a Agência Internacional de
Energia, entre 1973 e 2011, a
produção mundial mais que dobrou,
passando de 1,2 bilhão para 3,3
bilhões de metros cúbicos, mas,
mesmo assim, manteve a terceira
posição na matriz energética mundial.
Entre as fontes utilizadas em usinas
termelétricas, saltou do quarto para o
segundo lugar, ficando atrás apenas
do carvão.

7.5 - Energia elétrica


A energia elétrica é produzida principalmente em usinas termelétricas, hidrelétricas e termonucleares. Em qualquer
dessas usinas, ela é produzida por uma turbina, que consiste essencialmente num conjunto cilíndrico de aço que gira em
torno de seu eixo no interior de um receptáculo imantado. Na turbina, portanto, a energia cinética (de movimento) é
transformada em energia elétrica. Nos diferentes tipos de usinas, o que difere é a energia primária utilizada para mover as
turbinas, como veremos a seguir.

143
Hidreletricidade
Os rios que apresentam desnível acentuado em seu percurso tendem a apresentar potencial hidrelétrico aproveitável,
principalmente se seu suprimento de água for garantido por clima ou hidrografia favoráveis. Não é necessária a ocorrência
de quedas-d’água, mas de desníveis que possibilitem a construção de uma barragem que forme uma represa e crie uma
queda artificial. Trata-se de uma forma não poluente, barata e renovável de obtenção de energia, embora o alagamento de
grandes áreas por causa da construção das barragens e do represamento da água cause impacto ambiental. Em terrenos
mais planos, ocorre inundação de enormes áreas, enquanto em terrenos que possuem desnível acentuado, a superfície
inundada é menor. A energia tende a ser produzida com maior eficiência quanto maior for o desnível obtido entre o nível de
água e a turbina. Em terrenos com maior declividade é possível obter maiores desníveis com menor superfície de água
represada.
Dessa forma, a construção de uma barragem deve ser precedida de minucioso estudo do impacto ambiental e
arqueológico, para que se avalie a viabilidade técnica, social, ambiental e econômica do represamento.
Na prática, a produção de energia hidrelétrica depende da energia solar, pois a água, em seu ciclo, é transportada
para compartimentos mais elevados do relevo pela evaporação e posterior precipitação. Por isso, os países de relevo
acidentado, grande extensão territorial (portanto, maior área de insolação) e muitos rios contam com grande potencial
hidráulico. É o caso do Brasil, do Canadá, dos Estados Unidos, da China, da Rússia e da Índia.
Observe, na tabela abaixo, que o Brasil
ocupa posição importante na produção total
de energia elétrica e percentual da
hidreletricidade na geração total de energia
elétrica.
Grandes represas - a formação de grandes
represas apresenta aspectos positivos e
negativos:
Aspectos positivos
• Geração de energia elétrica mais limpa e
barata que a obtida por outras fontes.
• Possibilidade de controle de enchentes a
jusante.
• Melhora das condições de abastecimento de
água para a população.
• Maiores possibilidades de instalação de
projetos de agricultura irrigada.
• Incremento da utilização do transporte
fluvial.
• Estímulo à piscicultura.
• Incentivo à instalação de equipamentos de esporte, turismo e lazer.
Aspectos negativos
• Possível necessidade de desmatamento prévio da área a ser inundada e/ou de resgate de animais ilhados durante o
preenchimento da represa.
• Possível necessidade de deslocamento de cidades, povoados ou comunidades indígenas.
• Salinização da água dos reservatórios em regiões de evaporação intensa.
• Mudança no fluxo dos sedimentos e no volume de água do rio.
• Assoreamento da represa e consequente comprometimento de sua capacidade geradora.
• Inundação de sítios arqueológicos.
• Perda de solo agricultável.
• Redução da vegetação nativa e da biodiversidade.

Termeletricidade
A obtenção de energia elétrica pela termeletricidade é feita com maiores custos e com maior impacto ambiental, mas
a construção de uma usina desse tipo requer investimentos menores que a de uma hidrelétrica. O que faz a turbina de uma
usina termelétrica girar é a pressão do vapor de água obtido pela queima de carvão mineral, gás ou petróleo (entre vários
outros combustíveis possíveis, como o bagaço de cana-de-açúcar, muito utilizado no Brasil), que aquece uma caldeira
contendo água. Enquanto a fonte primária de energia das usinas hidrelétricas é a água, disponível no local onde é instalada,
a das termelétricas tem de ser extraída e transportada (e por vezes importada), o que encarece o produto final: a energia
elétrica. Sua vantagem em relação à hidreletricidade é que a localização da usina é determinada pelo mercado consumidor,
e não pelo relevo e hidrografia, o que possibilita sua instalação nas proximidades da área onde há demanda, acarretando
gastos menores na transmissão da energia elétrica obtida.

144
Energia atômica
Desde o início deste século, em razão do agravamento do aquecimento global, a utilização da energia nuclear para
obtenção de energia elétrica voltou à agenda internacional como importante alternativa à queima de combustíveis fósseis.
Em 2010, as usinas nucleares foram responsáveis por cerca de 10,3% de toda a energia elétrica produzida no mundo.
Assim como nas termelétricas, o que movimenta a turbina de uma usina nuclear é o vapor de água, só que neste caso
o aquecimento da água para produzir o vapor é feito a partir da fissão nuclear, realizada a partir da quebra de átomos de
urânio.
Em vários países é grande a produção de energia elétrica em usinas nucleares, apesar do alto custo de instalação,
funcionamento e conservação. Em muitos deles houve o esgotamento das possibilidades de produção hidrelétrica e há
carência de combustíveis fósseis para a produção de energia em centrais termelétricas.
Apesar de apresentarem algumas vantagens em relação aos outros tipos de usinas, como, por exemplo, o custo do
quilowatt-hora produzido, que é menor que o obtido em usinas termelétricas que utilizam carvão como fonte primária, a
opinião pública mundial tem exercido forte pressão contrária à instalação de novas centrais. As usinas nucleares são
potencialmente muito mais perigosas por utilizarem fontes primárias radiativas, e demandam um alto custo para a destinação
final dos seus rejeitos – o lixo atômico. Em caso de acidentes (como o de Tree Mile Island, nos Estados Unidos, em 1979; o
de Chernobyl, na Ucrânia, em 1986; e o de Fukushima, no Japão, em 2011, causado por terremoto seguido de tsunami), a
radiatividade leva anos ou mesmo décadas para se dissipar. Nos Estados Unidos, por exemplo – país responsável por quase
30% da geração mundial de energia elétrica em centrais nucleares –, não se constroem novas usinas desde o acidente de
1979. Diversas outras formas de obtenção de energia elétrica vêm sendo pesquisadas por vários países, como a energia
solar, a geotérmica, a eólica, a variação das marés, a fusão nuclear (de átomos de hidrogênio), etc., mas a instalação dessas
usinas e a produção em larga escala ainda dependem da redução dos custos.

Energia solar
A energia solar é utilizada na geração de eletricidade e no aquecimento da água, ou seja, basicamente como fonte de
luz e de calor, sendo uma boa opção para atender a população que mora em localidades rurais sem acesso à rede de energia
elétrica. Nas cidades, seu uso vem se intensificando em residências, hotéis, hospitais, clubes e outros, que buscam redução
dos custos da eletricidade. Sua captação é realizada por coletores para o aquecimento e por células fotovoltaicas para
converter a energia solar em eletricidade.

Energia eólica
A energia eólica é obtida do movimento dos ventos e das massas de ar, que por sua vez resultam das diferenças de
temperatura existentes na superfície do planeta. É uma forma limpa e renovável de obtenção de energia que está disponível
em muitos lugares do planeta.

7.6 - Problemas ambientais


Embora não sejam poluentes, as turbinas eólicas também provocam impactos: as hélices emitem ruídos de baixa
frequência que incomodam moradores, animais, turistas e outros; quando instaladas em rotas de migração de pássaros,
podem matar muitos deles.
No Brasil as usinas eólicas são viáveis em regiões onde a velocidade média dos ventos é superior a 6 m/s. O maior
potencial eólico disponível e instalado no país está localizado na região Nordeste.

Biomassa
Biomassa é qualquer tipo de matéria orgânica não fóssil, vegetal ou animal, que possibilite obtenção de energia. Entre
os produtos mais utilizados destacam-se o etanol obtido da cana-de-açúcar, da beterraba, do milho e da madeira; o lixo
orgânico (cuja decomposição nos aterros produz biogás); a lenha; o carvão vegetal; e os diversos tipos de óleos vegetais
que podem ser transformados em biodiesel (soja, dendê, mamona, algodão e trigo, entre outros). A utilização de biomassa
como fonte de energia é muito antiga, remonta ao tempo em que o ser humano controlou o fogo e começou a queimar lenha
para se aquecer e cozinhar os alimentos. Atualmente, vem aumentando bastante seu consumo por causa da instabilidade
do preço do petróleo e, em geral, por sua queima produzir menos poluentes do que a dos combustíveis fósseis.
Hoje em dia ela é considerada uma das principais alternativas na busca por maior diversificação na matriz energética,
visando reduzir a dependência dos combustíveis fósseis, porque possibilita a obtenção de energia elétrica e de
biocombustíveis. O etanol e o biodiesel são combustíveis não tóxicos e biodegradáveis, cuja queima em substituição aos
derivados de petróleo reduz de 40% a 60% a emissão de gases que provocam o efeito estufa. Além disso, por serem isentos
de enxofre em sua composição, não causam chuva ácida.
Desde 2005, quando entrou em vigor o Protocolo de Kyoto, muitos países aceleraram a busca por fontes de energias
renováveis e menos poluentes, cujo consumo está em expansão em escala mundial. A produção de biocombustíveis vem
apresentando grande possibilidade de crescimento econômico e geração de empregos na agricultura e nas usinas, com
efeito multiplicador nos demais setores que integram sua cadeia produtiva (máquinas, equipamentos, fertilizantes, setores
de serviços, comércio e transporte).
A expansão da produção e do consumo dos biocombustíveis depende muito do preço do barril de petróleo, que, como
vimos, sofre grandes oscilações em função da ocorrência de guerras e crises econômicas. Quando aumenta o preço do
145
barril de petróleo, há tendência de busca de fontes mais baratas e os biocombustíveis ganham competitividade; ao contrário,
nas épocas em que cai o preço do barril de petróleo, os biocombustíveis perdem mercado.
Porém, independentemente das oscilações no preço do petróleo, o setor de biocombustíveis e toda sua cadeia
produtiva têm recebido incentivo governamental em alguns países, como Estados Unidos, Brasil, Alemanha e França,
embora sua produção e consumo sejam mais caros que a utilização de óleo diesel e gasolina. Isso ocorre graças às
vantagens que ele oferece em termos sociais, estratégicos e ambientais, como a geração de empregos, a segurança
energética, a redução na emissão de poluentes e o declínio no volume das importações, o que melhora o resultado da
balança comercial.
Muitos países possuem legislação que obriga a mistura de álcool e biodiesel na gasolina e no óleo diesel (derivados
de petróleo). Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma, Unep Yearbook 2008), na Europa,
até 2020, 10% dos combustíveis usados no setor de transportes deverão ter origem agrícola, percentual que já é adotado
na Colômbia, Venezuela e Tailândia. Na China, é obrigatória a mistura de 10% nas cinco províncias com maior volume de
transporte de carga e pessoas. O Brasil, em 2012, misturava 20% de álcool à gasolina, 5% de biodiesel ao diesel de petróleo,
e era o único país do mundo com carros flex, movidos a etanol ou gasolina, ou com a mistura dos dois combustíveis em
qualquer proporção.
Essas exigências provocaram redução nos índices de poluição atmosférica, sobretudo nos centros urbanos,
entretanto, geraram uma grande demanda por matéria-prima agrícola. O aumento no consumo de óleo de palma no Sudeste
Asiático, por exemplo, provocou desmatamento na região, e a alta no preço de alguns cereais – principalmente o milho – é
atribuída ao aumento de sua utilização para produzir etanol.
Como o milho é utilizado como ração na criação de gado e aves e constitui matéria-prima para produção de vários
tipos de alimentos industrializados, há grande receio de aumento de preços nos alimentos, principalmente carne bovina,
suína e de aves, leite e seus derivados, ovos, farinha - matéria-prima de pão, macarrão, bolachas etc. - e outros.
Em 2007, um consórcio de vinte agências da Organização das Nações Unidas (UN – Energy) divulgou um relatório
apontando algumas preocupações sobre o aumento no consumo de biocombustíveis em escala mundial: sua produção
poderá comprometer a disponibilidade e elevar os preços de alimentos e, consequentemente, agravar a subnutrição e a
fome pelo mundo? Haverá maior degradação dos biomas em consequência da expansão da área cultivada? O que
acontecerá com os pequenos produtores agrícolas?
Caso a produção de biocombustíveis seja planejada para contemplar o desenvolvimento sustentável, poderá ser algo
muito positivo. Para isso, deve-se pensar nos benefícios que resultam da redução na emissão de gás carbônico, mas,
também, na preservação dos biomas e na geração de empregos e renda, enfim, na sua sustentabilidade ambiental e
socioeconômica.

7.7 - Energia e Meio Ambiente


Os sistemas de transportes, a produção industrial e a termeletricidade utilizam predominantemente combustíveis
fósseis, cuja queima é altamente poluente, com indesejáveis consequências sobre a saúde, além de acentuar o efeito estufa
e causar outros sérios problemas ambientais, como as chuvas ácidas e a intensificação das ilhas de calor. A hidreletricidade,
a fissão nuclear e as formas de produção energética que utilizam diversos tipos de biomassa também têm, em maior ou
menor grau, impactos ambientais.
Somente algumas fontes alternativas, como a energia solar, a eólica, a geotérmica e a da variação das marés quase
não causam impactos ambientais, mas seu aproveitamento, embora crescente em vários países, é restrito a locais que
apresentam condições ideais e, até o momento, a escala de utilização é pequena, por causa do alto custo de instalação das
unidades captadoras e transformadoras. Segundo a Agência Internacional de Energia, a participação dessas fontes no
consumo mundial de energia, embora baixo, aumentou de 0,1% para 0,9% entre 1973 e 2010.
Em 2010, somente 13,1% da energia consumida no planeta era proveniente de fontes renováveis, e a participação
das fontes eólica, solar e geotérmica era bastante reduzida.
Quanto ao aumento no consumo mundial de energia, há um fato interessante a destacar: nos países desenvolvidos, esse
consumo, embora alto, está praticamente estabilizado. Nesses países o aumento, quando há, ocorre no mesmo ritmo do
crescimento populacional, ou seja, com índices inferiores a 1% ao ano, uma vez que a maioria da população atingiu padrões de
consumo que se estabilizaram em níveis bastante elevados. Além disso, segundo estimativas da Agência Internacional de Energia,
o aumento esperado tende a ser anulado pela eficiência energética cada vez maior dos aparelhos domésticos, pelo consumo cada
vez menor de combustível nos automóveis e máquinas industriais, e pelo crescente volume de reciclagem de materiais, entre outras
medidas que provocam economia no consumo de energia.
O aumento do consumo mundial de energia, portanto, tem ocorrido nos países em desenvolvimento, sobretudo nos
emergentes, em virtude do crescimento populacional e do crescimento econômico, que provocam crescimento na produção e venda
de produtos, principalmente automóveis e eletrodomésticos.
O maior incremento na participação percentual do consumo mundial de energia ocorreu na China e em outros países
asiáticos, onde a produção industrial vem crescendo em ritmo acelerado. Segundo estimativas, entre 2015 e 2020, os países em
desenvolvimento, sobretudo os emergentes, estarão, em termos absolutos, consumindo mais energia que os desenvolvidos, o que
torna ainda mais urgente a necessidade de um planejamento energético que considere os impactos ambientais. Se a matriz
energética atual e o padrão mundial de consumo forem mantidos, a emissão de gases provocada pela queima de combustíveis
fósseis tenderá a aumentar, agravando ainda mais os problemas ambientais no planeta. A solução envolve a substituição de fontes
não renováveis e altamente poluentes por outras renováveis e menos agressivas ao meio ambiente.
146
EXERCÍCIOS

01. Um dos maiores problemas da atualidade é o aumento desenfreado do desemprego. O texto abaixo destaca esta situação.
O desemprego é hoje um fenômeno que atinge e preocupa o mundo todo. [...] A onda de desemprego recente não é
conjuntural, ou seja, provocada por crises localizadas e temporárias. Está associada a mudanças estruturais na economia,
daí o nome de desemprego estrutural. O desemprego manifesta-se hoje na maioria das economias, incluindo a dos países
ricos. A OIT estimava em 1 bilhão – um terço da força de trabalho mundial – o número de desempregados em todo o mundo
em 1998. Desse total, 150 milhões encontram-se abertamente desempregados e entre 750 e 900 milhões estão
subempregados.
Almanaque Abril 1999 [cd-rom]. São Paulo: abril.

Pode-se compreender o desemprego estrutural em termos da internacionalização da economia associada:

(A) a uma economia desaquecida que provoca ondas gigantescas de desemprego, gerando revoltas e crises institucionais.
(B) ao setor de serviços que se expande provocando ondas de desemprego no setor industrial, atraindo essa mão de obra
para este novo setor.
(C) ao setor industrial que passa a produzir menos, buscando enxugar custos, provocando, com isso, demissões em larga
escala.
(D) às novas formas de gerenciamento de produção e novas tecnologias que são inseridas no processo produtivo, eliminando
empregos que não voltam.
(E) ao emprego informal que cresce, já que uma parcela da população não tem condições de regularizar o seu comércio.

02. Os textos a seguir relacionam-se a momentos distintos da nossa história.


A integração regional é um instrumento fundamental para que um número cada vez maior de países possa melhorar a sua inserção
num mundo globalizado, já que eleva o seu nível de competitividade, aumenta as trocas comerciais, permite o aumento da
produtividade, cria condições para um maior crescimento econômico e favorece o aprofundamento dos processos democráticos. A
integração regional e a globalização surgem assim como processos complementares e vantajosos.
“Declaração de Porto”, VIII Cimeira ibero-americana, Porto, Portugal, 17 e 18 de outubro de 1998.

Um considerável número de mercadorias passou a ser produzido no Brasil, substituindo o que não era possível ou era muito caro
importar. Foi assim que a crise econômica mundial e o encarecimento das importações levaram o governo Vargas a criar as bases
para o crescimento industrial brasileiro.
Pomar, W. Era Vargas – a modernização conservadora.

É correto afirmar que as políticas econômicas mencionadas nos textos são:

(A) opostas, pois, no primeiro texto, o centro das preocupações são as exportações e, no segundo, as importações.
(B) semelhantes, uma vez que ambos demonstram uma tendência protecionista.
(C) diferentes, porque, para o primeiro texto, a questão central é a integração regional e, para o segundo, a política de substituição
de importações.
(D) semelhantes, porque consideram a integração regional necessária ao desenvolvimento econômico.
(E) opostas, pois, para o primeiro texto, a globalização impede o aprofundamento democrático e, para o segundo, a globalização
é geradora da crise econômica.

03. A atividade industrial e a industrialização brasileira estão desigualmente distribuídas pelas regiões do país. Construídas
predominantemente no século XX, elas são componentes da modernização urbana que reinventa nossa sociedade e dinâmica
espacial.
Sobre a indústria e industrialização brasileira, é correto afirmar:

(A) a industrialização tem suas raízes fincadas na economia da cana-de-açúcar e do café, que possibilitou a acumulação de capital
necessária para a diversificação em investimentos no setor industrial, e esse fato permitiu a produção de bens de consumo
duráveis, sobretudo automóveis e eletrodomésticos.
(B) a indústria nasce dos capitais restantes do declínio da economia da cana-de-açúcar e do café. Esses capitais impulsionaram
uma diversidade de pequenas indústrias de produção de bens de consumo não duráveis, tais como perfumaria, cosméticos,
bebidas, cigarros, que apoiadas pelo estado se difundiram pelo país.
(C) a ação do estado foi fundamental para desencadear o processo de industrialização brasileira, por exemplo, criando empresas
estatais, como a antiga companhia Vale do rio doce e a companhia siderúrgica nacional, para investir na indústria de base.
Sem elas não seria possível a implantação de indústria de bens de consumo duráveis.
(D) a industrialização brasileira é fruto da capacidade inovadora do estado e do empresariado nacional. Este último não mediu
esforços para construir em todo o território nacional sistemas de transporte, comunicação, energia e portos, necessários à
circulação de bens, serviços e pessoas por todas as regiões.
(E) a industrialização brasileira se tornou possível a partir de investimentos do capital internacional, que não mediu esforços para
construir em todo o território nacional sistemas de transporte, comunicação, energia e portos, necessários à circulação de
bens, serviços e pessoas por todas as regiões.
147
04. Leia os trechos da letra da canção a seguir:
Três apitos
Quando o apito da fábrica de tecidos
Vem ferir os meus ouvidos
Eu me lembro de você.
[…]
Você que atende ao apito
De uma chaminé de barro,
Por que não atende ao grito tão aflito
Da buzina do meu carro?
[…]
Mas você não sabe
Que enquanto você faz pano
Faço junto do piano
Estes versos pra você.
Nos meus olhos você vê
Que eu sofro cruelmente,
Com ciúmes do gerente impertinente
Que dá ordens a você.
(Noel Rosa)
Disponível em: <http://tresapitos.noelrosa.letrasdemusicas.com.br>. Acesso em: 2 abr. 2010.

Cm base na letra da canção e nos conhecimentos sobre industrialização brasileira, é correto afirmar:

(A) trata-se de um processo destituído de relevância social, porque passou despercebido pela população das metrópoles,
cujo cotidiano manteve-se inalterado.
(B) alterou as relações campo-cidade, as paisagens urbanas, os hábitos de consumo das pessoas, as relações sociais e
criou novas profissões e postos de trabalho.
(C) a indústria têxtil prejudicou o desenvolvimento do setor automobilístico, porque em ambos havia grande necessidade de
mão de obra especializada.
(D) os apitos das fábricas foram proibidos nas grandes metrópoles industrializadas, porque provocavam poluição sonora que
era potencializada pelas buzinas dos carros.
(E) manteve inalterado o equilíbrio populacional entre campo e cidade, porque as indústrias têxteis demandavam pouca mão
de obra, dado o seu alto grau de mecanização.

05. Após a 2ª GM, a maioria dos países latino-americanos implementou políticas de industrialização por substituição de importações que
tiveram resultados diversos. Considere as seguintes afirmações sobre os efeitos que a implementação dessas políticas teve no Brasil.
I. ela acelerou a migração campo-cidade.
II. ela favoreceu a industrialização nas regiões sudeste e sul.
III. ela reforçou o papel do estado brasileiro nas políticas territoriais.

Quais estão corretas?

(A) apenas I.
(B) apenas II.
(C) apenas III.
(D) apenas II E III.
(E) I, II e III.
06. [...] Liberalismo, o Neo, bateu à porta da quitinete onde morava o Estado Mínimo e sua numerosa família. O Estado Mínimo – diga-se
de passagem – já fora o máximo no passado, requisitado por todos, vivia confortavelmente em uma cobertura duplex no edifício Keynes.
A partir dos anos 1980, seu prestígio começou a declinar diante da campanha orquestrada pelo Liberalismo que avançou no seu patrimônio
e privatizou suas empresas sob o pretexto de que ele, Estado, não entendia nada de economia, cobrava altos impostos e impedia a
maximização dos seus lucros. Empobrecendo, o Estado teve que se mudar para um apartamento menor e depois para outro menor ainda
e hoje vive em uma modesta unidade no conjunto habitacional Milton Friedmam. [...]
Novaes, Carlos Eduardo. Liberalismo e estado mínimo. Jornal do Brasil, rio de Janeiro, 1º mar. 2009.

A opção que apresenta exemplos, no Brasil, que confirmam a explicação contida no trecho da crônica é:

(A) privatização de bancos, aumento das barreiras alfandegárias, aplicação dos planos Quinquenais.
(B) desestatização de empresas, desregulamentação da economia, criação de agências reguladoras.
(C) redução da concentração do poder administrativo federal, redução das taxas de juros, criação dos Órgãos de planejamento regional.
(D) ampliação da esfera de atuação das secretarias de governo, reforma fiscal, implementação de programas de desenvolvimento nacional.
(E) nacionalização de empresas, redução das tarifas alfandegárias, implementação dos programas nacionais de desenvolvimento.

148
07. É possível afirmar através de uma visão de síntese do processo histórico da industrialização no Brasil entre 1880 a 1980,
que esta foi retardatária cerca de 100 anos em relação aos centros mundiais do capitalismo. Podemos identificar cinco fases
que definem o panorama brasileiro de seu desenvolvimento industrial: 1880 a 1930, 1930 a 1955, 1956 a 1961, 1962 a 1964
e 1964 a 1980.

Leia com atenção as afirmações a seguir, identificando-as com a sua fase de desenvolvimento industrial.

I. Modelo de desenvolvimento associado ao capital estrangeiro, sem descentralizar a indústria do Sudeste de forma
significativa em direção a outras regiões brasileiras; corresponde ao período de Juscelino Kubitschek, com incremento
da indústria de bens de consumo duráveis e de setores básicos.
II. Modelo de política nacionalista da Era Vargas, com o desenvolvimento autônomo da base industrial demonstrado através
da construção da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Ressalta-se que, neste período, a Segunda Guerra Mundial
impulsionou a industrialização. III. Período de desaceleração da economia e do processo industrial motivados pela
instabilidade e tensão política no Brasil.
IV. Implantação dos principais setores da indústria de bens de consumo não duráveis ou indústria leve, mantendo-se a
dependência brasileira em relação aos países mais industrializados. O Brasil não possuía indústrias de bens de capital
ou de produção.
V. Período em que o Brasil esteve submetido a constrangimentos econômicos, financeiros e sociais devido a seu
endividamento no exterior com o objetivo de atingir o crescimento econômico de 10% ao ano. Mesmo assim, não houve
muitos avanços na área social. Modernização conservadora com o governo militar.
Adaptado de: São Paulo (estado). Secretaria da Educação. Geografia, Ensino Médio. São Paulo, 2008.

A sequência das fases do desenvolvimento industrial brasileiro descritas nas afirmações é

(A) IV, II, I, III, V.


(B) I, II, V, IV, III.
(C) III, IV, V, I, II.
(D) I, III, II, V, IV.
(E) III, IV, II, V, I.

08. A respeito das disparidades regionais do Brasil, é correto afirmar que:

(A) elas sempre existiram na nossa história, com o Nordeste sendo a região mais carente desde os primórdios da
colonização.
(B) elas se tornaram mais graves com a globalização, que ocasionou uma acelerada industrialização do Sudeste e um
retrocesso no Nordeste.
(C) elas foram adquirindo as suas características atuais com a industrialização do país e tornaram-se assunto da política
nacional a partir dos anos 1950.
(D) elas decorrem fundamentalmente das diversidades naturais do nosso território e da distribuição espacial das riquezas
minerais.
(E) elas são um problema nacional desde a colonização, devido às secas do Nordeste, que sempre exigiram políticas
voltadas para o desenvolvimento dessa região.

09. Os chineses não atrelam nenhuma condição para efetuar investimentos nos países africanos. Outro ponto interessante
é a venda e compra de grandes somas de áreas, posteriormente cercadas. Por se tratar de países instáveis e com governos
ainda não consolidados, teme-se que algumas nações da África tornem-se literalmente protetorados.
Brancolli, F. China e os novos investimentos na África: neocolonialismo ou mudanças na arquitetura global?
Disponível em: <http://opiniaoenoticia.com.br>. Acesso em: 29 abr. 2010. (adaptado).
A presença econômica da China em vastas áreas do globo é uma realidade do século XXI. A partir do texto, como é possível
caracterizar a relação econômica da China com o continente africano?
(A) Pela presença de órgãos econômicos internacionais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial,
que restringem os investimentos chineses, uma vez que estes não se preocupam com a preservação do meio ambiente.
(B) Pela ação de ONGs (Organizações Não Governamentais) que limitam os investimentos estatais chineses, uma vez que
estes se mostram desinteressados em relação aos problemas sociais africanos.
(C) Pela aliança com os capitais e investimentos diretos realizados pelos países ocidentais, promovendo o crescimento
econômico de algumas regiões desse continente.
(D) Pela presença cada vez maior de investimentos diretos, o que pode representar uma ameaça à soberania dos países
africanos ou manipulação das ações destes governos em favor dos grandes projetos.
(E) Pela presença de um número cada vez maior de diplomatas, o que pode levar à formação de um mercado comum sino-
africano, ameaçando os interesses ocidentais.
149
10. Em meados de 1980, as estratégias político-econômicas conduzidas pelo novo secretário-geral do Partido comunista,
Mikhail Gorbachev, acabaram contribuindo para o colapso da URSS e de seu regime socialista. Sobre essas estratégias,
considere as seguintes afirmações.

I. A “Glasnost” tinha por finalidade revitalizar o socialismo através, entre outras reformas, de uma relativa democratização
do sistema.
II. A não concessão de maior independência política aos estados-membros da URSS rendeu a Gorbachev o apoio da ala
conservadora do partido.
III. A “Perestroika” buscou reestruturar a economia estatal planificada, com o objetivo de impedir a crescente privatização
dos meios de produção e a concentração fundiária.

Quais estão corretas?

(A) apenas I.
(B) apenas II.
(C) apenas I e II.
(D) apenas II e III.
(E) I, II e III.

11. A China é o país mais populoso do planeta e uma potência militar que tem conseguido atrair investimentos estrangeiros
em grande proporção, sustentando um crescimento econômico que lhe confere um papel estratégico e de crescente projeção
no cenário mundial. Sobre a China, assinale a alternativa INCORRETA.

(A) em 1949 foi proclamada a república Popular da China, sob liderança de Mao Tsé-Tung. O socialismo implantado rompeu
a dominação colonial e imperialista que havia explorado a China por quase cinco séculos.
(B) a partir do final da década de 1970 o governo toma uma série de medidas econômicas liberalizantes que propiciaram a
abertura e a modernização da economia por meio de uma política estatal elaborada e controlada firmemente pelos
líderes do Partido comunista.
(C) em busca de prover a demanda de energia no mesmo ritmo do crescimento econômico do país foi construída, no rio
Yangtzé, a usina hidrelétrica de Três Gargantas, que se encontra entre as maiores centrais hidrelétricas do mundo.
(D) a China caracteriza-se pela maior concentração populacional na sua extensa faixa litorânea, local de maior dinamismo
econômico no país e onde foram criadas as zonas econômicas especiais (ZEEs), áreas específicas para a entrada de
capital internacional que, por intermédio de joint ventures – associação entre empresas estrangeiras e locais – produzem
para a exportação.
(E) no contexto da nova Divisão Internacional do trabalho, a China destaca-se por contar com uma mão de obra abundante,
altamente qualificada e bem remunerada o que favorece seu comércio interno.

12. A partir da década de 1950, verificou-se uma intensificação no processo de industrialização em diversas regiões do
planeta. No caso de países latino-americanos, como, por exemplo, o Brasil, a Argentina e o México, em que se baseou,
fundamentalmente, a industrialização?

(A) nos recursos minerais e no crescimento populacional.


(B) na farta mão de obra barata e na baixa taxa de crescimento vegetativo.
(C) na internacionalização dos mercados, primeiramente, e nas elevadas taxas de reserva cambial.
(D) nas diversidades regionais e na renda per capita da população.
(E) na substituição das importações e, posteriormente, na internacionalização dos mercados.

13. A industrialização do sudeste asiático ocorreu em duas etapas. Na primeira, surgiram os chamados Tigres de primeira
geração, que receberam capital do Japão. Na segunda, eles investiram nos Tigres da segunda geração. Assinale a
alternativa que lista corretamente os tigres asiáticos de primeira e de segunda geração.

(A) Primeira geração: Coreia do Sul, Taiwan e Cingapura - segunda geração: Indonésia, Malaísia e Tailândia.
(B) Primeira geração: Coreia do Sul, Malaísia e Taiwan - segunda geração: Cingapura, Indonésia e Tailândia.
(C) Primeira geração: Taiwan, Tailândia e Malaísia - segunda geração: Coreia do Sul, Cingapura e Indonésia.
(D) Primeira geração: Coreia do sul, Cingapura e Indonésia - segunda geração: Malaísia, Tailândia e Taiwan.
(E) Primeira geração: Cingapura, Indonésia e Tailândia - segunda geração: Coreia do Sul, Malaísia e Taiwan.

150
14. Bangalore, na Índia, Campinas, no Brasil e San Francisco, nos estados unidos, têm em comum:

(A) o fato de serem importantes centros tecnológicos.


(B) a condição de “cidades globais”.
(C) a presença da indústria bélica.
(D) serem importantes centros cinematográficos.
(E) a condição de capitais internacionais de movimentos antiglobalização.

15. O peso econômico dos Brics é certamente considerável. Entre 2003 e 2007, o crescimento dos quatro países representou
65% da expansão do PIB mundial. Em paridade de poder de compra, o PIB dos Brics já supera hoje o dos EUA ou o da
União Europeia. Para dar uma ideia do ritmo de crescimento desses países, em 2003, os Brics respondiam por 9% do PIB
mundial e, em 2009, esse valor aumentou para 14%. Em 2010, o PIB conjunto dos cinco países (incluindo a África do Sul)
totalizou US$11 trilhões ou 18% da economia mundial. Considerando o PIB pela paridade de poder de compra, esse índice
é ainda maior: US$19 trilhões ou 25%.
Disponível em: <www.itamaraty.gov.br/temas/mecanismosinter-regionais/agrupamentobrics>. acesso em: jun. 2012. (Fragmento).

Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul são os países de “economia emergente” que formam o grupo Brics. Este
agrupamento de países representa um bloco político-econômico:

(A) formal, constituído por países com interesses e papéis semelhantes na Organização Mundial do Comércio, integrantes
de uma contemporânea regionalização globalizada.
(B) informal, composto por países com interesses e papéis semelhantes na nova ordem mundial, integrantes de uma
contemporânea regionalização globalizada.
(C) informal, constituído por países do G-8 e com interesses e papéis conflitantes na nova ordem mundial, integrantes de
uma contemporânea regionalização globalizada.
(D) formal, composto por países com interesses e papéis semelhantes no conselho de segurança da ONU, integrantes de
uma contemporânea regionalização globalizada.
(E) informal, originalmente, e formal, posteriormente, composto por países com interesses semelhantes a maior atuação no
cenário global, como alternativa a liderança norte-americana e o G-7.

16. Uma mesma empresa pode ter sua sede administrativa onde os impostos são menores, as unidades de produção onde
os salários são os mais baixos, os capitais onde os juros são os mais altos e seus executivos vivendo onde a qualidade de
vida é mais elevada.
SEVCENKO, N. A corrida para o século XXI: no loop da montanha russa. São Paulo: Companhia das Letras, 2001 (adaptado).

No texto estão apresentadas estratégias empresariais no contexto da globalização. Uma consequência social derivada
dessas estratégias tem sido:

(A) o crescimento da carga tributária.


(B) o aumento da mobilidade ocupacional.
(C) a redução da competitividade entre as empresas.
(D) o direcionamento das vendas para os mercados regionais.
(E) a ampliação do poder de planejamento dos estados nacionais.

17. A evolução do processo de transformação de matérias-primas em produtos acabados ocorreu em três estágios:
artesanato, manufatura e maquinofatura. Um desses estágios foi o artesanato, em que se:

(A) trabalhava conforme o ritmo das máquinas e de maneira padronizada.


(B) trabalhava geralmente sem o uso de máquinas e de modo diferente do modelo de produção em série.
(C) empregavam fontes de energia abundantes para o funcionamento das máquinas.
(D) realizava parte da produção por cada operário, com uso de máquinas e trabalho assalariado.
(E) faziam interferências do processo produtivo por técnicos e gerentes com vistas a determinar o ritmo de produção.

151
18. Considere o papel da técnica no desenvolvimento da constituição de sociedades e três invenções tecnológicas que
marcaram esse processo: invenção do arco e flecha nas civilizações primitivas, locomotiva nas civilizações do século XIX e
televisão nas civilizações modernas.
A respeito dessas invenções são feitas as seguintes afirmações:
I. A primeira ampliou a capacidade de ação dos braços, provocando mudanças na forma de organização social e na
utilização de fontes de alimentação.
II. A segunda tornou mais eficiente o sistema de transporte, ampliando possibilidades de locomoção e provocando mudanças
na visão de espaço e de tempo.
III. A terceira possibilitou um novo tipo de lazer que, envolvendo apenas participação passiva do ser humano, não provocou
mudanças na sua forma de conceber o mundo.
Está correto o que se afirma em:
(A) I, apenas.
(B) I e II, apenas.
(C) I e III, apenas.
(D) II e III, apenas.
(E) I, II e III.

19. Sobre os diferentes tipos de indústrias e a sua dinâmica espacial, assinale o que for correto.

(A) as indústrias de bens de produção ou de base produzem bens para outras indústrias, gastam muita energia e transformam
grandes quantidades de matérias-primas. São exemplos desse tipo de indústrias: petroquímicas, metalúrgicas, siderúrgicas,
entre outras.
(B) as indústrias de bens de capital ou intermediárias produzem máquinas, equipamentos, ferramentas ou autopeças para outras
indústrias, como, por exemplo, as indústrias dos componentes eletrônicos e a de motores para carros ou aviões.
(C) as indústrias de ponta estão ligadas ao emprego de alta tecnologia, elevado capital e de número grande de trabalhadores
qualificados. Elas dependem de inovações constantes para que sejam possíveis modificações rápidas no processo de produção.
(D) a partir de 1990, intensificou-se no Brasil o processo de desconcentração industrial, ou seja, muitas indústrias deixaram áreas
tradicionais e instalaram unidades fabris em novos espaços na busca de vantagens econômicas, como incentivos fiscais,
menores custos de produção, mão de obra mais barata, mercado consumidor significativo e atuação sindical fraca.
(E) as indústrias de bens de consumo estão divididas em duráveis e não duráveis. A primeira se refere à indústria de automóveis,
eletrodomésticos e móveis. Já as não duráveis estão ligadas ao setor de vestuário, alimentos, remédios e calçados.

20. Os fatores locacionais da indústria passaram por


grandes modificações, desde o século XVIII, alterando as
decisões estratégicas das empresas acerca da escolha do
local mais rentável para seu empreendimento.
O esquema ao lado apresenta alguns modelos de
localização da siderurgia, considerando os fatores
locacionais mais importantes para esse tipo de indústria:
minério de ferro, carvão mineral, mercado e sucata.
No caso dos modelos C e D, as mudanças
socioeconômicas que justificam as escolhas de novos
locais para instalação de usinas siderúrgicas nas últimas
décadas são, respectivamente:

(A) dispersão dos mercados consumidores - revalorização


das economias de aglomeração.
(B) eliminação dos encargos com a mão de obra -
generalização das redes de telecomunicação.
(C) diminuição dos preços das matérias-primas -
substituição de fontes de energia tradicionais.
(D) redução dos custos com transporte - ampliação das
práticas de sustentabilidade ambiental.

152
21. A organização do espaço geográfico através de redes de comunicação eliminou a necessidade de fixar as atividades
econômicas num determinado lugar. Isso vale para um grande número de serviços, que podem ser prestados a partir de
qualquer lugar do mundo para qualquer outro, bastando que estes locais estejam conectados.

Sobre essas redes de comunicação, é correto afirmar que:

(A) eliminaram as restrições produtivas dos diferentes espaços geográficos, criando condições de trabalho igualitárias em
todos os países do mundo.
(B) contribuíram, pela velocidade da informação e diversidade de serviços, para a dispersão geográfica dos processos
produtivos industriais, cujas etapas estão localizadas em diferentes países.
(C) possibilitaram a disseminação dos lucros das empresas multinacionais, pela interligação de sistemas industriais de
produção.
(D) ampliaram as trocas no comércio internacional, mas não possibilitaram grandes transformações na organização do
espaço geográfico mundial.
(E) diminuíram, por sua ampliação, as desigualdades sociais entre os países, tendência mundial da atualidade.

22. Leia o texto a seguir.


Seguindo uma tendência observada nas empresas européias e americanas, alguns investidores brasileiros estão migrando
parte de seus negócios da China para o Vietnã. Os setores calçadista e têxtil são os que mais observaram esse tipo de
mudança, com a instalação principalmente de fábricas americanas e europeias no Vietnã. Em estudo divulgado em março,
a Câmara de Comércio Americana de Xangai, a AmCham, apontou que 88% das empresas estrangeiras sondadas optaram
inicialmente por operar na China por causa dos baixos custos, porém, 63% dessas afirmaram que se mudariam ao Vietnã
para cortar ainda mais o preço de produção.
<www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2008/07/080709_vietannegociosmw.shtml>. adaptado.

Pode ser associada ao conteúdo da notícia a seguinte afirmação:

(A) atualmente, grande parte das empresas multinacionais é originária dos países subdesenvolvidos e aí estão instaladas.
(B) embora seja objeto de investimentos capitalistas, o sistema socialista chinês ainda afugenta as empresas multinacionais.
(C) a globalização facilitou a mobilidade de capitais e empresas, aumentando a competição entre países.
(D) nos países asiáticos, o alto custo da mão de obra é compensado pela abundância de matérias-primas minerais baratas.
(E) a abertura comercial propiciada pela globalização permitiu às empresas brasileiras concorrerem com as dos países
europeus.

23. Por referência a dinâmica e o desenvolvimento do modo de produção capitalista em relação à organização do espaço
geográfico e aos problemas ambientais, analise:

I. A internacionalização dos problemas ambientais durante a 2ª Revolução Industrial foi uma consequência das disputas
interimperialistas ocorridas a partir da unificação alemã e italiana, que se constituíram como novos países capitalistas.
II. O espaço geográfico mundial, após a crise de 1929, teve uma intensa reorganização produtiva, considerando a aplicação
da política de bem-estar social, o taylorismo/fordismo e o just in time, estruturas administrativas que possibilitam a
produção/reprodução ampliada do capital.
III. Os problemas da organização do espaço geográfico têm relação direta com as categorias de análise central da geografia,
como paisagem, região, espaço, território e lugar, sendo estes, em muitos momentos, adjetivados como meio ambiente.
IV. A produção em série e o consumo de massa, implantados com o New Deal, estão na base da crise pela qual passa a
economia americana nos dias atuais.

São corretas:

(A) I, II, III, IV


(B) II, III, IV
(C) II, IV
(D) II, III
(E) I, II, III

153
24. São as principais características do Vale do Silício, nos Estados Unidos:

(A) localizado no oeste dos Estados Unidos, próximo a importantes centros de pesquisa, forma um complexo industrial com
destaque para os ramos típicos da Terceira Revolução Industrial.
(B) também conhecido por cinturão (belt), constitui-se na principal área produtora de cereais dos Estados Unidos, sobretudo
de milho e trigo, além de pecuária intensiva.
(C) formado por erosão glacial, constitui-se numa área de preservação permanente, onde se destacam as faias, as sequoias
e as bétulas, espécies típicas da floresta boreal.
(D) localizado no nordeste dos EUA, constitui-se numa área de antiga concentração industrial, destacando-se as indústrias
de bens de produção pela abundância de matérias-primas, energia e mão de obra e pela facilidade de transporte.
(E) é uma das principais áreas de extração mineral, sobretudo de silício, cobre e ferro, altamente prejudicada pela
degradação do meio ambiente.

GABARITO

01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24
D C C B E B A A D A E E A A E B B E D D B C D A

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H
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HISTÓRIA MILITAR NAVAL Prof. VAGNER SOUZA

ÍNDICE
Índice ................................................................................................................................................. 01

AS NAÇÕES
(Continuação)
5) Grã-Bretanha ................................................................................................................................ 003
6) Alemanha ...................................................................................................................................... 024
7) Japão ............................................................................................................................................. 032
8) Estados Unidos ............................................................................................................................. 039

Leitura Complementar ................................................................................................................... 047


A História da Navegação .................................................................................................................. 047
Os Navios de Madeira: construindo embarcações e navios .............................................................. 047
O Desenvolvimento da Navegação Oceânica: os instrumentos e as cartas de marear ..................... 048
A Vida a Bordo dos Navios Veleiros ............................................................................................... 048
Os Reflexos da Revolução Industrial na Navegação ........................................................................ 049
A Roda Vai Girando ......................................................................................................................... 053
Da Vela ao Vapor .............................................................................................................................. 057

Artigo: Evolução Tecnológica no Setor Naval na Segunda Metade do Século XIX e as Anx
Consequências para a Marinha do Brasil.

BRASIL
Capítulo I – A Descoberta do Brasil ............................................................................................. 061
1) As Razões da Expansão Marítima ................................................................................................ 061
2) Os Portugueses se Espalham pelo Mundo .................................................................................... 063
3) A América Descoberta .................................................................................................................. 064
4) O Acordo de Tordesilhas .............................................................................................................. 066
5) O Caminho das Índias Decifrado .................................................................................................. 067
6) A Viagem de Cabral ..................................................................................................................... 067

Capítulo II – A Colonização do Brasil .......................................................................................... 069


1) O Período Pré-Colonial (1500 – 1530) ......................................................................................... 069
2) O Período Colonial (1530 – 1808) ............................................................................................... 071
2.1) A Expedição de Martim Afonso de Sousa .............................................................................. 071
2.2) O Projeto Agrícola da Exploração Colonial Portuguesa ........................................................ 073
2.3) O Sistema de Capitanias Hereditárias .................................................................................... 074
2.4) A Centralização do Governo .................................................................................................. 075
2.5) Os Governadores Gerais ......................................................................................................... 076
A) Tomé de Sousa ................................................................................................................... 076
B) Duarte da Costa .................................................................................................................. 077
C) Men de Sá .......................................................................................................................... 077
2.6) A Sucessão de Men de Sá ...................................................................................................... 078
2.7) A União Ibérica (1580 – 1640) .............................................................................................. 079
2.8) A Restauração em Portugal .................................................................................................... 080
2.9) As Invasões do Território Português Brasileiro ..................................................................... 081
A) Os Franceses ..................................................................................................................... 081
A.1) A França Antártica .................................................................................................... 081
A.2) A França Equinocial .................................................................................................. 084
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A.3) As Ações de Corsários Franceses no Rio de Janeiro ................................................. 085


A.4) Nova Ação Francesa .................................................................................................. 087
B) Os Ingleses ......................................................................................................................... 088
C) Os Holandeses .................................................................................................................... 090
C.1) A Invasão da Bahia (1624 a 1625) ............................................................................. 090
C.2) A Invasão de Pernambuco (1630 a 1654) .................................................................. 091
C.3) O Governo de Nassau (1637 a 1644) ......................................................................... 093
C.4) A Luta de Reconquista (A Insurreição Pernambucana) ............................................. 095
2.10) Os Anos do 1700 .................................................................................................................. 098
A) A Descoberta do Ouro ....................................................................................................... 098
B) Os Vice-Reis na Bahia ....................................................................................................... 099
C) Progressos do Rio de Janeiro ............................................................................................. 099
D) A Administração do Marquês de Pombal ......................................................................... 100
E) O Governo dos Vice-Reis no Rio de Janeiro ..................................................................... 101
F) Progresso Econômico ........................................................................................................ 102
G) As Revoltas Coloniais – Inconfidências e Sedições .......................................................... 105
G.1) Conspiração ou Conjura de Nosso Pai ...................................................................... 105
H) As Questões de Fronteiras ................................................................................................. 105
H.1) Tratado de Lisboa (1681) ........................................................................................... 106
H.2) Tratados de Utrecht (1713 e 1715) ............................................................................ 106
H.3) Tratado de Madri (1750) ............................................................................................ 106
H.4) A Guerra Guaranítica (1753-1756) ............................................................................ 107
H.5) O Distrato de El Pardo (1761) ................................................................................... 108
H.6) Perda e Restauração do Rio Grande .......................................................................... 108
H.7) O Tratado de Santo Ildefonso (1777) ........................................................................ 110
H.8) O Tratado de Badajós (1801) ..................................................................................... 110

Bibliografia ...................................................................................................................................... 112

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CAPÍTULO IV

AS NAÇÕES
5) Grã-Bretanha:
A Grã-Bretanha teve sempre seu destino ligado ao mar e aos portos e rios
que desde os tempos primitivos abriram suas regiões interiores ao oceano.
Assim, muito antes que aspirasse dominar os mares, a eles esteve sujeita. Dos
povoadores iberos e celtas aos saxões e dinamarqueses, dos comerciantes pré-
históricos e fenícios aos senhores romanos e normandos, sucessivas vagas de
colonos guerreiros, os mais enérgicos homens do mar, agricultores e traficantes
da Europa vieram pelas águas para habitar a Ilha ou para insinuar os seus
conhecimentos e espírito aos antigos habitantes. Entretanto, os primeiros povos
que habitaram a Grã-Bretanha não se notabilizaram no mar. A Inglaterra vivia
então da agricultura e do pastoreio. Seus homens eram pastores e fazendeiros
antes que mercadores ou marinheiros, e antes da conquista normanda, por longo
tempo, nem o Estado nem a Marinha insular estiveram habilitados a defender a
Ilha. Exceto quando protegida pelas galés e legiões romanas, a antiga Grã-
Bretanha esteve, portanto, particularmente exposta à invasão.
Mas se invadir a Grã-Bretanha era extraordinariamente fácil antes da conquista normanda, tornou-se
extraordinariamente difícil depois. A razão é clara. Um Estado bem organizado, com um povo unido em
terra e uma força naval no mar, podia defender-se por detrás do canal contra qualquer superioridade militar.
Assim, nos tempos antigos, a relação da Inglaterra com o mar foi passiva e receptiva e nos tempos
modernos, ativa e adquiridora. Num e noutro caso é a chave de sua evolução.
Nos séculos seguintes à conquista normanda, embora permanecesse a Inglaterra um país sobretudo
agrícola, o adensamento progressivo de uma população de pescadores, marinheiros e mercadores nos
magníficos e inúmeros portos marítimos e fluviais começou a revelar a futura tendência do povo da Ilha.
Essa classe aumentou em prestígio e em riqueza, primeiro em consequência das Cruzadas e depois em
virtude da Guerra dos Cem Anos.
No decurso da longa série de conflitos com a França nos séculos XIV e XV, é curioso observar, tão
cedo na história, que os principais traços da política inglesa já aparecem impostos pela situação do país. A
Inglaterra tinha necessidade da supremacia no mar, na falta da qual não podia continuar o comércio, nem
enviar tropas ao continente, nem se manter em ligação com as tropas já enviadas. Enquanto a superioridade
naval foi mantida, a Inglaterra manteve-se em solo francês, graças à ligação constante com seus exércitos
desembarcados no continente. Todavia, as comunicações foram perturbadas várias vezes pela investida de
marinheiros gauleses e a reação de um país populoso como a França obrigou, no fim da longa luta, os
ingleses a se retirarem. De qualquer forma, o solo britânico se viu a salvo dos ataques inimigos, a não ser
das suas rápidas e pequenas investidas. A verdadeira expansão marítima inglesa começou, porém, mais
tarde e pode ser datada da criação da Marinha Real.
Na realidade, a Inglaterra, em 1485, era ainda um país pastoril. A fonte principal de riquezas
derivava não da construção naval ou da manufatura de têxteis, mas de fazendas de ovelhas, do crescimento
da lã. Os principais mercados para esses produtos eram as ricas cidades dos Países Baixos no estuário do
Reno. Durante a Guerra dos Cem Anos, o canal da Mancha fora defendido, na medida do possível, pelos
combativos marinheiros da frota mercante, lutando, por vezes, separadamente como piratas, por vezes como
em Sluys, sob comando nomeado pelo rei. Henrique V começara a construir uma esquadra real, mas a sua
obra não passara dos primórdios e foi posteriormente descontinuada.
Henrique VII encorajara a Marinha Mercante; no entanto, não armou uma frota exclusivamente para
fins de guerra. Coube a Henrique VIII criar uma armada efetiva de navios reais de combate, com estaleiros
reais em Woolwich e Deptford; fundou também a corporação da Casa da Trindade. A política marítima de
Henrique VIII teve importância dupla. Não só criou navios especialmente tripulados e apetrechados para o
combate em serviço nacional, como também os seus arquitetos navais planejaram muitos desses navios
segundo um modelo aperfeiçoado. Eram veleiros melhor adaptados ao oceano do que as galés a remos das
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potências mediterrâneas, e mais bem adaptadas à manobra em batalha do que os navios redondos do tipo
medieval, a bordo dos quais navegavam os mercadores ingleses, e os espanhóis atravessavam o Atlântico.
Ao mesmo tempo, o descobrimento da América veio incentivar a atividade comercial da Inglaterra.
As Ilhas Britânicas tinham sido, durante a Idade Média, um setor marginal relativamente pouco
importante do mundo civilizado; um país conhecido, no máximo, como fornecedor de lã ou de estanho. É
verdade que já se achavam nas Ilhas as premissas geográficas de seu poderio ulterior; os magníficos portos
marítimos e abundantes portos fluviais, aos quais, durante a maré alta, podiam chegar as embarcações de
maior calado; a técnica perfeita, a experiência naval que os habitantes da costa tinham adquirido em sua
luta contra os elementos e, sobretudo, a esplêndida posição marítima, a coberto dos ataques do continente
e a posição mercantil posteriormente tão elogiada entre os Estados mais progressivos da Europa e as terras
virgens das colônias americanas.
Gradualmente, durante os reinados Tudors, os ingleses perceberam que a sua remota posição insular
se modificara e passara a ponto central, dominando com vantagem as modernas rotas de comércio e de
colonização. O poder, a riqueza e a aventura os esperavam no longínquo termo de viagens oceânicas
fabulosamente longas. A luta pela supremacia comercial e naval sob as novas condições se travaria
claramente entre a Espanha, a França e a Inglaterra; todos esses países estão voltados para o oceano
Atlântico, que subitamente se tornara o principal centro de comunicações do mundo, e cada um deles
encontrava-se em processo de unificação sob um Estado moderno, com consciência étnica agressiva e sob
uma monarquia poderosa. Dessa forma, dos tempos Tudors em diante, a Inglaterra tratou a política europeia
simplesmente como um meio de firmar a sua própria segurança face à invasão e de levar avante os seus
planos ultramarinos. A sua insularidade, convenientemente aproveitada, deu-lhe imensa vantagem sobre a
Espanha e a França na concorrência marítima e colonial.
Com a sua configuração estreita e irregular, com uma linha de costa grandemente recortada, por fim
em paz com seu único vizinho terrestre, a Escócia, bem fornecida de portos, grandes e pequenos, apinhados
de marinheiros e pescadores, o Estado encontrava-se sujeito à influência e às ideias dos homens de comércio
e da armação naval, que formavam uma única classe com as melhores famílias provinciais nos condados
marítimos. Dado que nenhum ponto na Inglaterra se situa a mais de setenta milhas da costa, uma elevada
proporção dos seus habitantes tinha algum contato com o mar, ou pelo menos com as populações marítimas.
Acima de tudo, Londres está sobre o mar, ao passo que Paris está no interior e Madri fica o mais distante
possível da costa. Por conseguinte, na Inglaterra, embora a população total fosse pequena em comparação
com a francesa ou a espanhola, havia uma grande comunidade marítima acostumada há séculos a sulcar as
tempestuosas vagas do mar no Norte. Em breve, os representantes da comunidade marítima inglesa
começaram a estender o raio de ação de suas atividades, já agora contando com a proteção da Marinha de
Guerra Real, construída e armada segundo princípios modernos, e que dava apoio profissional aos esforços
guerreiros de mercadores e piratas particulares.
A fim de encontrar saída para a nova manufatura têxtil, os mercadores aventureiros da Inglaterra,
desde o princípio do século XV, procuraram vigorosamente novos mercados na Europa, não sem o
constante derramar de sangue, por mar e por terra, numa época em que a pirataria era tão geral que
dificilmente podia ser considerada desonrosa e em que os privilégios comerciais eram frequentemente
recusados e conquistados ao gume de espada. Com o fito de aproveitar uma situação vantajosa, foram
fundadas, com o apoio da Coroa, várias companhias de comércio, e, naturalmente, a Marinha Mercante
inglesa teve forte impulso. Assim, de 76 navios com mais de cem toneladas, que a Grã-Bretanha dispunha
em 1560, o número subiu a 177 em 1582, quase todos pertencentes às quatro principais companhias: a das
Índias, a do Levante, a de Moscou e a da Guiné.
Lado a lado com as mais guerreiras empresas de Drake, roubando aos espanhóis e abrindo o
comércio com as colônias pela força dos canhões, também houve muito tráfego de caráter mais pacífico na
Moscóvia, na África e no Levante (mar Negro). No entanto, era impossível traçar uma clara linha divisória
entre os comerciantes pacíficos e os guerreiros, porque, por seu lado, os portugueses atacavam todos os que
se aproximavam das costas africanas ou indianas. Não raras vezes, na costa africana, repercutiu o estrépito
da batalha entre os contrabandistas ingleses e os monopolizadores portugueses, e, para o fim do reinado de
Isabel I (Elizabeth I – A Rainha Virgem), os mesmos ruídos começaram a quebrar o silêncio dos mares

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indianos e do arquipélago malaio. Um combate naval com um pirata ou com um rival estrangeiro constituía
incidente inevitável na vida do mais honesto comerciante, quer em tempo de paz, quer em tempo de guerra.
Em Londres, formaram-se companhias para suportar as despesas e os riscos das necessárias
hostilidades; a Rainha passou-lhes cartas de concessão de autoridade diplomática e militar para o outro lado
do globo (Cartas de Corso)1, aonde nunca chegaram navios do rei ou embaixadores reais. Os comerciantes
ingleses, viajando para aproveitar as suas oportunidades legais, foram os primeiros a representar o país na
corte do Czar, em Moscou, e do Mongol, em Agra. Os comerciantes isabelinos não hesitavam também em
atravessar o Mediterrâneo, apesar da guerra com a Espanha. A Companhia do Levante comerciava com
Veneza e as suas ilhas gregas, e com o mundo muçulmano mais para além. Dado que os inimigos navais
eram os venezianos e os espanhóis, o Sultão acolheu bem os heréticos ingleses em Constantinopla. Mas na
rota até aí tinham que se defender das galés espanholas, próximo do estreito de Gibraltar e dos piratas da
Barbaria, ao longo da costa argelina. Tais foram os princípios do poder marítimo inglês no Mediterrâneo,
se bem que não fosse antes dos tempos Stuarts que a Marinha Real seguiu até onde a frota mercantil travara
já tantas batalhas.
A guerra entre a Espanha e a Inglaterra, tanto tempo adiante, eclodiu enfim em 1587. Felipe II
enviou no ano seguinte contra a Grã-Bretanha uma grande esquadra, a Invencível Armada, conduzindo um
exército de vinte e dois mil homens que deveria ser reforçado pelos terços espanhóis estacionados nos
Países Baixos (Holanda). Os números das duas esquadras chefiadas, respectivamente, por Howard e pelo
Duque de Medina Sidônia não eram desiguais. Os ingleses, combinando a Marinha Real com a Marinha
Mercante armada, dispunham de esmagadora superioridade de canhões bem como de arte náutica e arte de
artilharia. Os espanhóis só eram superiores em tonelagem de navios secundários e em soldados que
alinhavam no convés, mosqueteiros e piqueiros, esperando em vão que os ingleses se aproximassem,
segundo as antigas regras de guerra naval. Mas os ingleses preferiam o duelo entre a artilharia e a infantaria
à distância. Não admira por isso que a esquadra espanhola sofresse terrível estrago, ao passar pelo Canal.
Já desmoralizados ao chegarem à baía de Calais, manobraram mal os navios, em face dos barcos de
fogo de Drake, e fracassaram em todas as tentativas de embarcar o exército do Príncipe de Parma que os
aguardava.
Depois de outra derrota, em grande batalha diante de Gravelines, os espanhóis deveram a uma
mudança dos ventos conseguirem escapar da total destruição nos baixios arenosos da Holanda; os navios
correram enfunados pela tempestade, sem provisões, sem água e sem abrigo, à roda das costas penhascosas
da Escócia e da Irlanda. Os ventos, as vagas e as rochas do remoto noroeste completaram muitos naufrágios
começados pelo canhão no canal da Mancha. Os grandes navios, às fornadas de dois e de meia dúzia ao
mesmo tempo, amontoaram-se nas costas onde os homens das tribos célticas, que tudo ignoravam e nada
se preocupavam com as lutas dos povos civilizados que arremessavam essa colheita de náufragos para as
suas regiões, chacinaram e esbulharam, aos milhares, os melhores soldados e os mais altivos nobres da
Europa.
A primeira tentativa séria da Espanha para conquistar a Inglaterra foi também a última. O esforço
colossal despendido em construir e equipar a Invencível Armada, filha de tão ardentes preces e expectativas,
não podia, como o futuro mostrou, repetir-se efetivamente, embora daí em diante a Espanha mantivesse no
Atlântico uma frota de guerra mais formidável do que nos dias em que Drake pela primeira vez viajara até
o continente espanhol. Mas o resultado da luta decidira-se logo em princípio por esse acontecimento único
que toda a Europa imediatamente reconhecera como um ponto de inflexão da História. O destino da Armada
demonstrou a todo o mundo que o senhorio dos mares passara dos povos mediterrâneos para as gentes do
Norte.
A Inglaterra não elaborara ainda um sistema financeiro e militar capaz de suportar o seu recente poder
naval. Ao término do reinado de Isabel, com escassos cinco milhões de habitantes, não era bastante rica e
populosa para anexar as possessões espanholas ou fundar um império colonial próprio, mesmo a colônia
estabelecida por Raleigh, na Virgínia, era prematura, em 1587.

1
A diferença entre o pirata e o corsário era apenas que o segundo tinha autorização de um Estado para suas ações, tendo
obrigações com este Estado de partilha dos bens pilhados ou no cumprimento de uma missão em nome do rei.
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Quando na época Stuart, a riqueza acumulada e a população supérflua da Inglaterra lhe permitiram
retomar a obra colonizadora, dessa vez em paz com a Espanha, o rumo dos puritanos e outros imigrantes
levou-os necessariamente às paragens setentrionais da América onde não se encontravam espanhóis.
Enquanto a Marinha espanhola exerceu o exclusivo domínio do Mar das Caraíbas, do oeste do
Atlântico e do leste do oceano Pacífico, nenhuma ocupação britânica foi possível, quer nas Índias
Ocidentais, quer no litoral da América do Norte. Enquanto a Marinha portuguesa dominou o Atlântico Sul
e o oceano índico, o comércio com o Oriente pela rota do Cabo esteve fora de questão. Ao ser destroçado
em conjunto o poderio naval peninsular na guerra que depois da derrota da Armada continuou até 1604,
ficaram abertas ambas, a leste e a oeste, ao comércio inglês e à colonização. Entretanto, por falta de apoio
do Estado, a expansão marítima comercial da Grã-Bretanha não atingiu, nos primeiros anos do século XVII,
toda a pujança de que já era capaz; houve mesmo um período de retrocesso durante o reinado de Jaime I, o
único rei Stuart que desprezou totalmente a Marinha.
Os conflitos entre a Inglaterra e a Espanha diminuíram em 1603, com a morte da rainha Isabel e a
ascensão ao trono de Jaime I, também rei da Escócia e filho de Maria Stuart (que havia sido assassinada
pela prima, a rainha Isabel). Hipnotizado pelo mito espanhol, mais do que Isabel, Jaime logo selou aliança
com o inimigo da véspera. Fazendo isso, abandonou a luta pela independência dos holandeses e lançou
as sementes para futuras hostilidades entre a Inglaterra e a Holanda.
A Inglaterra continuava a ser uma comunidade marítima, mas durante trinta anos deixou de ser uma
potência naval. A incúria com a Marinha anulou alguns dos efeitos benéficos da paz com a Espanha. Os
termos do tratado que encerrou a guerra isabelina davam aos mercadores ingleses liberdade de comércio
com a Espanha e com as suas possessões na Europa, mas não mencionavam as pretensões dos marítimos
isabelinos no tráfego com a América Espanhola e com as regiões monopolizadas por Portugal na África e
na Ásia. O governo inglês não continuou a apoiar tais pretensões e deixou decair a Marinha Real, ao passo
que procurava com toda a sua força não consentir na pirataria. Nestas circunstâncias, prosseguiu a guerra
privada com os espanhóis e portugueses, sem o auxílio do Estado.
Durante o próprio reinado de Jaime I, a Companhia Inglesa das Índias Orientais fundou uma frutuosa
feitoria em Surate e no reinado de Carlos I edificou a fortaleza de São Jorge, em Madrasta, e ergueu outras
feitorias em Bengala. Tais foram as humildes origens comerciais do domínio britânico na Índia. Mas de
início esses comerciantes das Índias Orientais não eram apenas feitores: destruíam o monopólio português
pela ação diplomática nas cortes dos potentados gentios ou pela metralha dos navios no mar.

Ao governo regicida (de Cromwell) cabe o crédito da ressurreição do


poder naval inglês e do estabelecimento da Marinha, numa base de permanente
eficiência que todos os governos subsequentes, qualquer que fosse a sua feição
política, honestamente esforçaram-se por manter. As medidas que se tomaram,
escreve Julius Corbett, transformaram a Marinha, de modo a adaptar-se à sua
finalidade moderna, e estabeleceram a Inglaterra como a grande potência naval
do mundo. O renascimento da Marinha de Guerra, com Blake, e o Governo do
Estado, por uma classe de homens em contato estreito com a comunidade
marítima e especialmente com Londres, fizeram reviver inevitavelmente a
rivalidade com os holandeses.
Durante uma geração, os marinheiros da Holanda tinham dominado,
frequentemente, com bastante insolência, os mares da Europa Setentrional e da
América e os oceanos Atlântico e Índico; tinham pescado nas áreas de pesca
britânicas e quase monopolizado o comércio de transportes da Inglaterra e das
suas colônias americanas. O reaparecimento sério da concorrência inglesa foi
Oliver Cromwell marcado pelo Ato de Navegação e pela Guerra Anglo-Holandesa de 1653-54.

Mas o desfecho da luta contra a supremacia marítima da Holanda não foi decidido antes dos
primórdios do século XVIII. Já há muito, no reinado de Ricardo II, os Parlamentos tinham promulgado Leis
de Navegação, a fim de limitarem a entrada de navios estrangeiros nos portos ingleses, mas devido à
escassez da Marinha inglesa, não foi possível fazê-las cumprir. A situação mudou durante a ditadura de
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Cromwell. O “Ato de Navegação” votado em 1651 pelo Longo Parlamento, por proposição de Cromwell,
e que foi designado pelo nome de Magna Carta da Marinha Inglesa tinha um duplo fim: arruinar o poderio
comercial holandês e por conseguinte desenvolver a Marinha inglesa.
Pelo Ato de Navegação, as mercadorias procedentes dos países extra
europeus e desembarcadas na costa inglesa deveriam ser importadas em
navios de construção e de proprietário inglês ou comandado por comandante
inglês. Pelo menos três quartos das tripulações deveriam ser formados de
marinheiros ingleses. Além do mais, reservavam-se exclusivamente aos
navios ingleses as cabotagens, a relação entre as colônias e as comunicações
entre a Inglaterra e suas colônias. O comércio de importação das mercadorias
europeias não foi permitido senão aos ingleses e aos navios dos países de
origem, isto para evitar os intermediários holandeses. Essas medidas tiveram
por efeito imediato um aumento da navegação britânica e por conseguinte
estimularam a fabricação dos navios. O próprio Estado contribuiu largamente,
encorajado pelos preços dos grandes armadores e dos importadores de trigo,
o que permitiu aos primeiros desenvolver uma grande atividade. Para que os
armadores pudessem facilmente recrutar as tripulações necessárias aos seus
navios, os órfãos foram obrigados a se tornarem marinheiros, facilitou-se a
Carlos I
naturalização de marinheiros estrangeiros, prometeram-se auxílios aos
marinheiros velhos ou doentes, às viúvas e aos órfãos dos desaparecidos no
mar.
Para dar confiança ao público e levar os armadores a aumentarem as frotas mercantes, esquadras
poderosas faziam a política dos mares, e mediante um pagamento módico, um engenhoso sistema de seguro
protegia os negociantes contra todo acidente. Bem cedo os estaleiros nacionais eram impotentes para
atender ao ritmo sempre crescente do tráfego marítimo.
O “Ato de Navegação" foi dessa forma um repto a todas as navegações marítimas e em especial uma
declaração de guerra lançada aos holandeses. O conflito declarado entre as duas potências marítimas
começou em 1653, e, apesar do valor de seus marinheiros, a Holanda foi vencida depois de quase dois anos
de guerra. A Holanda sofreu mais do que a Inglaterra, porque possuía menos recursos em terra e porque,
pela primeira vez, desde que constituía uma nação, defrontava uma potência hostil que bloqueava o canal
da Mancha às frotas mercantes que lhe traziam de longe a vida e a riqueza.
As alterações profundas surgidas na política interna da Grã-Bretanha após a morte de Cromwell já
não mais afetaram o desenvolvimento marítimo do país. A corte e o Parlamento da Restauração aceitaram
as tradições de esquadra de guerra da República. Carlos II e seu irmão Jaime mostraram interesse pessoal
pelas questões navais e o Almirantado continuou a ser bem servido. O Parlamento Cavalheiro e o Partido
Tory consideravam a Marinha com especial favor.
Em breve eclodiu outra guerra marítima com a Holanda, o reacender da luta entre as duas
comunidades mercantes, iniciada durante a República. Por ambos os contendores ela foi conduzida com as
mesmas esplêndidas qualidades de perícia naval combativa e na mesma escala colossal da primeira vez. De
novo a nação maior levou a melhor na guerra, e, pelo Tratado de Breda, a Holanda cedeu Nova Amsterdã
à Inglaterra que passou a chamar a cidade de Nova York.
Ainda mais uma vez, em 1672, a Inglaterra, aliando-se à França, entrou em luta contra a Holanda,
mas dela se retirou um ano e meio após. O Parlamento Cavalheiro acabara por compreender que essa guerra,
bem analisada, não era a continuação da antiga luta entre a Inglaterra e a Holanda pela supremacia naval.
O desaparecimento da Holanda como potência independente encerraria em si a ameaça à segurança
marítima inglesa, porque o delta do Reno cairia nas mãos da França. A França também era um concorrente
marítimo, potencialmente até mais formidável do que a Holanda, e caso se estabelecesse em Amsterdã,
rapidamente poria fim à supremacia naval inglesa.
A partir das guerras anglo-holandesas, a política externa da Inglaterra caiu cada vez mais sob a
influência de considerações mercantis. No fim do período Stuart, a Inglaterra era a maior nação
manufatureira e comercial do mundo. Londres ultrapassara Amsterdã como o maior empório mundial.
Havia um comércio próspero com o Oriente, o Mediterrâneo e as colônias americanas, baseado na venda
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de artigos têxteis ingleses, cujo transporte até o outro lado do globo se efetuava nos grandes navios de
navegação oceânica dessa nova era. Já então as classes governantes estavam resolvidas a gastar o que fosse
necessário na Marinha e o mínimo no Exército.
Ao período da guerra mercantil anglo-holandesa sucedeu o da luta sustentada entre a Inglaterra e a
França pela hegemonia do mar, bem como para manter o equilíbrio europeu. Essa série de guerras,
conhecidas como a segunda guerra dos cem anos perdurou, nos mares, até a batalha de Trafalgar, em 1805,
e, em terra, até Waterloo dez anos depois. Na realidade, o conflito consistiu de sete guerras, separadas umas
das outras por pequenos intervalos de paz indecisa. Cada vez mais se começaram a perceber, especialmente
depois que o gênio iluminado de Pítt tornou claro o fato, que o objetivo supremo era o senhorio dos mares
e a manutenção do império nele baseada.
Desde a guerra dos Trinta Anos o Estado francês, sob a enérgica direção de Richelieu, havia
robustecido seu poder em tais condições, que já podia intervir com probabilidade de êxito nos mares. Tinha-
se apropriado de ricas possessões coloniais, e uma poderosa frota estava disposta a defender o comércio
ultramarino. O conflito entre as duas grandes potências europeias em ascensão tornou-se inevitável. A
primeira guerra da longa série foi a chamada da Liga de Augsburgo, que durou de 1689 a 1697. Graças à
eficiente Marinha criada por Colbert, no início a vitória sorriu às armas francesas. Em 1690, a Esquadra
francesa, sob o comando de Tourville, derrotou a frota aliada anglo-holandesa na batalha de Beachy Head,
mas a vitória não foi devidamente aproveitada. Os cortesãos da terrestre Versailles não tinham o sentido da
oportunidade naval que raras vezes faltou aos estadistas que atentavam ao fluxo e refluxo do mundo através
das marés que batem o Tâmisa.
Dois anos depois, os aliados triunfaram sobre Tourville na batalha naval de La Hougue. La Hougue
mostrou-se tão decisivo quanto Trafalgar, porque Luiz XIV, tendo desafiado com sua política grosseira e
arrogante toda a Europa para uma guerra terrestre, não conseguiu manter a Marinha francesa à altura de
suas necessidades, devido ao esforço despendido com os exércitos e fortalezas necessários à defesa
simultânea de todas as suas fronteiras terrestres. A superioridade temporária da Marinha de Guerra francesa,
em 1690, resultara da política bélica da corte e não se fundara no mesmo grau que as marinhas da Inglaterra
e da Holanda em recursos proporcionalmente elevados de navegação mercantil e riqueza comercial.
Quando, portanto, a política guerreira de Luiz XIV o induziu a descuidar-se da Marinha, a favor das forças
terrestres, o declínio naval francês precipitou-se e tornou-se permanente, com o que sofreram o comércio e
as colônias francesas.
Os marinheiros da França, quando a sua grande esquadra deixou de ter missão a cumprir, voltaram
as suas energias para a pirataria. O Almirante Tourville foi eclipsado por Jean Bart. O comércio inglês
sofreu com a sua ação e a dos outros corsários, mas prosseguiu a despeito desses entraves, ao passo que o
comércio francês desapareceu dos mares. Ao se fecharem as fronteiras da França, devido à posição de
exércitos hostis, essa nação teve de passar a sustentar-se dos seus próprios recursos decrescentes, enquanto
a Inglaterra se abastecia em todo o mundo, desde a China a Massachusetts. Assim, em paralelo com o
desenvolvimento da Inglaterra deu-se a decadência marítima e financeira da França.
A Guerra da Liga de Augsburgo terminou pelo indeciso
Tratado de Ryswick. Após um intervalo difícil de quatro anos,
estalou de novo em escala ainda mais ampla a Guerra de
Sucessão da Espanha, que terminou com o Tratado de Utrecht
em 1713. Esse tratado, que abre o período estável e
característico da civilização do século XVIII, assinala o advento
da supremacia marítima, comercial e financeira da Grã-
Bretanha.
A primeira condição de guerra vitoriosa contra Luiz
XIV, quer no mar, quer em terra, era a aliança da Inglaterra e da
Holanda. A colaboração apresentava-se menos difícil porque a
inveja comercial da Inglaterra pela Holanda diminuía à medida
que os navios holandeses baixavam ante os recursos pela
primeira vez mobilizados de seu aliado.

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A Inglaterra prosperou durante a guerra, ao passo que o fardo das contribuições para a guerra e o
esforço na luta minaram lentamente a grandeza artificial da pequena república. A Grã-Bretanha, em
consequência, acentuou ainda mais sua primazia naval. O fato é tanto mais de espantar por ter sido a guerra
destituída de qualquer ação notável. O domínio anglo-holandês nos mares era tão completo que não pôde
ser desafiado, e isso condicionou todo o curso da guerra. Apenas uma vez grandes esquadras se
encontraram, e os resultados foram indecisos. Desistiram então os franceses da luta pelo mar e se
concentraram na guerra pela destruição do comércio. Os aliados puderam assim enviar seus exércitos,
quando e como quiseram.
O feito mais notável da Marinha durante a guerra foi a captura da cidade de Gibraltar por Rooke e
Shovel, em 1704, e a conquista de Minorca com a magnífica baía de Porto Mahou, por Stanhope e Leake,
em 1708.
O esmagador poderio naval da Inglaterra foi o fator determinante na história europeia durante o
período mencionado, mantendo a guerra no estrangeiro enquanto conservava seu próprio povo em
prosperidade no território metropolitano e construía o grande Império. Mas nenhuma das conquistas
territoriais, ou todas juntas, comparou-se em grandeza e muito menos em solidez com o ganho da Inglaterra
de seu inigualável poderio naval, que começara durante a Guerra da Liga de Augsburgo e que recebeu seu
acabamento na de Sucessão da Espanha. Com ele a Inglaterra controlou o grande comércio oceânico, graças
a navios de guerra que não tinham rivais e que as outras nações, exauridas, não podiam enfrentar. Esses
navios estavam agora seguros, baseados em sólidas posições em todos os cantos disputados do mundo. O
comércio, que havia assegurado sua prosperidade e a de seus aliados e a sua eficiência militar durante a
guerra, embora atacado e perturbado pelos corsários inimigos (aos quais ele só pôde prestar atenção parcial
em vista das constantes exigências noutros setores) começou, com um salto, vida nova quando a guerra
acabou.
O Tratado de Utrecht juntamente com o Tratado suplementar de Raistádt, feito em 1714,
inauguraram um quarto de século de paz quase perfeito. Exaurido pelo sofrimento, em todo o mundo o
povo ansiava pelo retorno da prosperidade e do comércio pacífico. Não havia nenhum país apto como a
Inglaterra, com riqueza, capital e navios, para levar a cabo essa missão e colher as vantagens. Durante a
guerra de Sucessão da Espanha, a eficiência da Marinha Real significara viagens seguras e, mais ainda,
utilização dos navios mercantes. Os navios mercantes ingleses, sendo melhores protegidos que os
holandeses, ganharam a reputação de oferecer mais seguro transporte, e o tráfego naturalmente passara cada
vez mais para suas mãos. Essa conquista de preferência mundial foi mantida em tempo de paz. Mas do que
nenhuma outra potência, a Inglaterra consolidou então as bases sólidas do poderio marítimo, o qual não
residia meramente na sua grande Marinha. A França tivera tal Marinha em 1688, que desaparecera corno
uma folha no fogo. Nem residia só no comércio próspero; poucos anos depois da época em questão, o
comércio da França tomaria magníficas proporções, mas o primeiro tiro de guerra o varreria dos mares
como a Marinha de Cromwell já antes eliminara o da Holanda. Foi com a união dos dois (Comércio e
Marinha), cuidadosamente compensados, que a Inglaterra conquistou o poderio naval sobre e a despeito
dos outros Estados. Assim, essa conquista, se acha associada à Guerra de Sucessão da Espanha. Antes dessa
guerra, a Inglaterra era uma das potências navais; depois dela passou a ser a potência naval, sem uma
segunda. Esse poderio ela alcançou só, sem compartilhar com amigos ou disputar com inimigos. Ela só era
rica e, no seu controle dos mares e da navegação intensiva, tinha a fonte de riqueza já tão segura nas mãos,
que não havia, na época, perigo de um rival no oceano.
Seguiu-se uma era de paz. Uma certa interferência, é verdade, foi causada no começo do período
pelos esforços espanhóis para recobrarem as ilhas de Sardenha e Cicília que, pelos tratados, haviam sido
cedidas à Áustria e à Sabóia, respectivamente. Uma frota inglesa, entretanto, sob o comando do Almirante
George Byng, restaurou a tranquilidade em agosto de 1718, ao largo do cabo Pássaro, graças a uma
esmagadora vitória sobre a esquadra espanhola.
A longa luta só recomeçou em 1739. No começo, a França permaneceu neutra, e a Inglaterra disso
se aproveitou para iniciar uma série de ataques contra a sua secular inimiga, a Espanha. O Almirante Vernon
começou bem a guerra, capturando com apenas seis navios a cidadela fortemente defendida de Porto Bello
(1739), mas esse sucesso preliminar foi contrabalançado pelos fracassos de Cartagena (1740-41) e de
Santiago de Cuba (1741). No Mediterrâneo, uma esquadra combinada franco-espanhola de vinte e sete
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navios chocou-se ao largo de Toulon com a esquadra inglesa de vinte e nove navios do Almirante Mathews.
A batalha foi violenta, mas indecisa. O conflito crucial, entretanto, entre a Grã-Bretanha e a França, ocorreu
não na Europa, mas na Índia e na América do Norte, onde pequenos esquadrões bateram-se com violência
e habilidade.
A paz de Aix-la-Chapelle, que pôs fim a essa guerra chamada de Sucessão da Áustria, marcou
apenas uma trégua de oito anos, e nada decidiu em definitivo.
Mais uma vez o longo conflito recomeçou em 1756. Os ingleses aplicaram seu esforço diretamente
no conflito marítimo, colonial e comercial. A Inglaterra estabeleceu como objetivo precípuo o completo
domínio do mar para expulsar os franceses da América do Norte e para os impedir de estabelecer um
império na Índia. Noutras palavras, eles reconheceram pela primeira vez, claramente, a natureza do conflito
em que estavam mergulhados, intermitentemente, por mais de um século.
A guerra não começou bem para a Inglaterra. A ilha de Minorca foi capturada por tropas francesas
desembarcadas da esquadra de La Galissonière (1757), e uma frota inglesa enviada em socorro da ilha foi
repelida. Dois anos depois, porém, as vitórias navais de Lagos e Quiberon eliminaram a ameaça de uma
invasão das Ilhas Britânicas. Nesse predestinado ano de 1759, os franceses perderam, ao todo, não menos
de trinta e cinco navios de linha e ficaram assim reduzidos à impotência nos mares. A Espanha, entretanto,
que até então se conservara fora da guerra, tinha ainda uma armada de cerca de 50 navios. Em 1762, ela foi
atraída ao conflito pela promessa de recobrar Gibraltar e Minorca. Sua entrada na guerra meramente serviu
para completar o triunfo britânico. Em agosto de 1762, Havana foi capturada e com ela doze navios de
linha, para não mencionar tesouros avaliados em mais de três milhões de libras. Dois meses depois, Manilha
e todas as Ilhas Filipinas foram capturadas por uma expedição enviada da Índia.
A paz de Paris (1763), que pôs fim à Guerra dos Sete Anos, deu à Inglaterra a supremacia absoluta
na América do Norte e na Índia, além da posse de importantes ilhas no mar das Caraíbas. Ao mesmo tempo,
a Marinha Mercante inglesa, que a despeito de todas as guerras crescera de 1.320 navios em 1666 para
5.730 em 1760, alcançou a supremacia que iria durar até o século XX.
Seguiram-se cerca de quinze anos de paz, durante os quais a França reconstruiu sua frota de guerra.
O levante das Colônias Inglesas na América do Norte deu ensejo à França e à Espanha de lutarem
novamente pela posse das rotas marítimas. Na Índia, Souffren, com poucos navios, conseguiu lutar algumas
vezes vantajosamente contra as forças navais inglesas, superiores em número. Em 1781, a supremacia
inglesa nas águas americanas foi perdida. Uma esquadra francesa, sob o comando do Conde de Grasse,
muito mais numerosa e de melhores navios que o esquadrão inglês, sob o comando do Almirante Graves,
cortou as comunicações da Ilha com a força principal britânica, conduzida por Lorde CromwelI, em
Yorktown, e compeliu-a a rendição. A queda de Yorktown marcou o fim virtual da Guerra da Independência
Americana, mas a vitória decisiva alcançada pelo Almirante Rodney na batalha de Santas restituiu em parte
a supremacia naval britânica e permitiu à Inglaterra alcançar melhores termos de paz (1783). As perdas de
suas melhores colônias e o renascimento da Marinha francesa pareceram indicar uma próxima decadência
da Inglaterra. Todavia, as ligações vitais das outras partes do Império Britânico foram mantidas, como
durante todas as guerras do século XVIII, e, após a derrota de 1783, a Inglaterra entrou rapidamente em
fase de recuperação, tirando de suas colônias os recursos necessários.
Em breve, por ocasião da Revolução, a Marinha francesa se auto destruiu, e, quando, em 1792, o
conflito entre as duas potências recomeçou, não havia competidor sério para a Royal Navy.
A guerra final entre a França e a Inglaterra, fechando a secular luta, durou mais de vinte anos (1793-
1815), durante os quais só houve breves tréguas de meses. A supremacia marítima britânica nunca foi
seriamente ameaçada em qualquer ocasião da guerra, salvo, talvez, por um curto período de 1797, quando
uma série de motins irrompeu nas frotas inglesas. Em vão, a França tentou restabelecer o balanço naval,
assumindo sucessivamente o controle, por um meio ou outro, das frotas da Espanha, Holanda e Dinamarca.
Todas elas, uma a uma, foram derrotadas pelos grandes chefes ingleses do tempo: Howe, Jervis, Duncan e
Nelson. Em 1794, Howe derrotou Villaret Joyeuse no canal da Mancha; em 1797, Jervis, ao largo do cabo
de São Vicente, destroçou uma frota espanhola; oito meses depois, Duncan derrotava os holandeses ao
largo de Camperdown, e no ano seguinte, Nelson alcançou a vitória de Aboukir.
Durante os dez anos de guerra da Primeira Coligação (1792-1802), o comércio ultramarino britânico
expandiu-se extraordinariamente a despeito dos corsários franceses. As importações que tinham sido em
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1781, cerca do fim da guerra da América, de 318 milhões de francos, e, em 1792, no começo da Revolução,
de 491 milhões, elevaram-se, em 1799, a 748 milhões. As exportações em produtos manufaturados da
Inglaterra, que tinha sido, em 1781, de 190 milhões, em 1792 de 622 milhões, elevaram-se, em 1799, a 849
milhões. Assim, tudo havia triplicado desde o fim da guerra da América e pouco mais ou menos dobrado
depois da guerra da Revolução. Em 1788, o comércio inglês havia empregado 13.827 navios e 107.925
marinheiros; utilizou, em 1801, 18.877 navios e 143.661 marinheiros. Nesse último ano, a Grã-Bretanha
possuía 814 navios de guerra de todos os tamanhos em construção, em reparos, armando-se ou em
operações. Nesse número, incluíam-se 100 navios de linha e 200 fragatas sob velas, distribuídos por todos
os mares; 20 naves e 40 fragatas de reserva, prontas para sair dos portos. Não se podia, portanto, estimar
sua forca efetiva em menos de 120 vasos de linha e 250 fragatas, guarnecidos por 120 mil marinheiros.

Batalha Naval de Trafalgar, ao Sul da Espanha, na entrada do mar Mediterrâneo.

Ao recomeçar a guerra em 1803, depois da pequena trégua resultante do Tratado de Amiens, a França
procurou não disputar a hegemonia naval, mas obter uma superioridade momentânea no canal da Mancha,
que permitisse a transposição do exército de 150 mil homens reunidos em torno de Boulogne. Napoleão
engendrou vários planos visando reunir diversas esquadras francesas e espanholas bloqueadas em Brest,
Rochefort, Cádiz, La Coruña e Toulon, mas tudo desabou com a esmagadora derrota de Trafalgar.

Com a vitória de Lorde Nelson, a supremacia naval britânica foi


estabelecida, na verdade, em todos os mares, eliminando qualquer ameaça
por mais de um século. Napoleão, contudo, não abandonou a disputa naval,
mas mudou de tática. Foram construídos numerosos bons navios que,
isolados ou em pequenas flotilhas, depredaram o comércio britânico. Os
corsários causaram grandes estragos, pois era extremamente difícil
capturá-los. Entre os anos de 1805 e 1815, os corsários capturaram 5.314
navios ingleses.

Ao todo, de 1792 a 1815, a Grã-Bretanha perdeu nos oceanos cerca


de 9 mil navios de comércio, o que não impediu sua frota mercante
aumentar de 1.540.000 para 2.616.000 toneladas.

Em compensação, os navios franceses obrigaram a esquadra inglesa a se concentrar nas águas


europeias de tal maneira que, quando uma guerra com os Estados Unidos da América irrompeu em 1812,
os pequenos navios ingleses enviados através do Atlântico sofreram certo número de derrotas humilhantes
numa série de ferozes duelos navais. No fim, entretanto, o poderio naval prevaleceu. Todos os portos
americanos foram bloqueados, e o comércio dos Estados Unidos foi inteiramente varrido dos mares.
O completo domínio dos mares, que a grande vitória de Nelson em Trafalgar conferiu à Inglaterra,
teve efeito decisivo nas fases finais da Guerra Napoleônica: frustrou a tentativa de Napoleão para, por meio
do Bloqueio Continental, eliminar o comércio inglês da Europa; quebrou sua projetada colisão naval contra
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a Grã-Bretanha, pela captura da esquadra dinamarquesa em 1807; tornou possível a continuação vitoriosa
da Guerra Peninsular (1808-14) na qual os recursos militares de Napoleão ficaram isolados; cortou a França
das fontes vitais de suprimento. O poderio marítimo também afetou profundamente o desenvolvimento do
Império Britânico durante esses vinte e dois anos gloriosos. Datam de então novas conquistas coloniais
inglesas na América, na África do Sul e na Índia.
A derrota de Napoleão deu à Grã-Bretanha o senhorio sobre os mares, senhorio que não foi
seriamente desafiado durante cem anos. Esse domínio a elevou a proeminência do mundo, de uma forma
que ela nunca antes alcançara. A Inglaterra ficou numa posição comparável à de Veneza na Idade Média
ou a da Holanda na primeira metade do século XVII. Nesses cem anos a Grã-Bretanha esforçou-se para não
se envolver em qualquer conflito de importância, exceto na breve Guerra da Criméia de 1854-56.
Devido à supremacia industrial da Grã-Bretanha vitoriosa, o advento da idade do vapor e do ferro nos
mares redundou inteiramente em sua vantagem, tanto mais que tinha então dificuldades em obter madeiras.
E o frete de ida de carvão, vendável na maioria dos portos de todo o globo, constituiu forte estímulo para a
navegação britânica. Através do resto do século, a Marinha insular continuou a desenvolver-se sem
rivalidade séria. Assim, em 1870 a Grã-Bretanha já dispunha de 1.202.000 toneladas de navios a vapor,
enquanto os Estados Unidos só contavam com 192.000, e a França com 154.000. Entretanto, a revolução
industrial, tornando obsoletos os antigos navios de madeira que por séculos haviam engrandecido o Império
Britânico, permitiu, ao mesmo tempo, às demais potências
industriais consagrarem-se à construção de novos tipos de vasos de
guerra, ameaçando, por conseguinte, o poderio naval inglês.

Depois da Guerra da Criméia, a França iniciou a construção


de navios de guerra de novo tipo, extremamente poderosos.
Também a Rússia, analisando as consequências fatais de sua
importância naval, tanto no mar Negro como no Báltico, durante a
mesma guerra, empenhou-se em construir uma armada do novo A península da Criméia
tipo.

Após 1870, tanto a Alemanha como a Itália começaram a construção de navios, embora as respectivas
atividades não causassem alarma até próximo ao fim do século. As crescentes marinhas dos Estados Unidos
e do Japão, também, a princípio, não causaram inquietação.
A partir de 1897, von Tirpitz, apoiado pelo Kaiser, deu início ao grandioso programa naval alemão.
O alto nível alcançado pela indústria germânica bem cedo fez ver que uma nova potência ia surgir nos
mares. A Inglaterra se alarmou ante essa possibilidade e começou a grande corrida armamentista naval
entre as duas nações. Ao deflagrar a Primeira Guerra Mundial, a Alemanha dispunha da segunda Marinha
de Guerra do mundo, e sua frota de comércio crescia cada ano mais, levando os produtos germânicos a
todos os cantos da Terra. A Alemanha manteve-se, contudo, na defensiva nos mares ante a superioridade
da Marinha Real aliada às Marinhas francesa, russa e italiana. A supremacia na superfície dos mares pela
Grã-Bretanha e seus aliados se deu realmente desde o princípio mais absoluto do que fora em qualquer
guerra precedente. Ao romperem as hostilidades, a Alemanha tinha para mais de dois mil navios a vapor e
cerca de três mil navios à vela empregados no comércio. Em poucas semanas, cada um deles fora capturado
ou internado, e durante o decorrer dos quatro anos de guerra nenhum voltou a navegar como navio mercante.
O imenso e lucrativo comércio exterior da Alemanha foi inteiramente eliminado. A Alemanha teve, é
verdade, um novo e poderoso poder no submarino. O submarino era, e ainda é, um mero instrumento de
destruição. Ele foi completamente incapaz de fazer qualquer coisa para reviver o extinto tráfego da
Alemanha.
Comparadas ao bloqueio inglês dos Impérios Centrais e à campanha submarina alemã, as outras
operações navais de guerra foram relativamente insignificantes, pouco ou nada contribuindo para o
desenrolar do conflito. A Frota Alemã de Alto Mar nunca se atreveu a um teste decisivo e perdeu
oportunidade após oportunidade para influir decisivamente nos acontecimentos. A fuga do Goeben e do
Breslau no Mediterrâneo, a escaramuça ao largo de Heligoland (agosto de 1914), a batalha de Coronel
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(novembro de 1914) com a sua sequência ao largo das Ilhas Falklands (dezembro de 1914), a caça ao largo
de Dogger Bank (janeiro de 1915), a longa e penosa aventura dos Dardanellos (abril de 1915-janeiro de
1916), todos foram meros episódios dramáticos e espetaculares, custosos mas indecisos.
Depois de a Grã-Bretanha, a França, a Alemanha, a Rússia e a Áustria-Hungria estarem engajadas, a
Turquia entrou na guerra, em outubro de 1914, ao lado dos impérios centrais (Alemanha e Áustria-
Hungria). As frentes estavam paralisadas, tanto a ocidental quanto a oriental. Foi nessa oportunidade que a
Rússia pediu socorro a seus aliados ocidentais, França e Grã-Bretanha. A pressão austro-alemã na frente
oriental era grande. Além disso, os turcos invadiram o Cáucaso, obrigando a Rússia a mais um esforço
defensivo naquela área. Assim, pressionados, os russos necessitavam de apoio logístico, especialmente
munições e precisavam também escoar sua produção de cereais, que tinham em excesso desde que os turcos
lhes fecharam o estreito de Dardanelos para exportações.
Decidiu-se apoiar à Rússia pelos Dardanelos, afastando-se todas as demais hipóteses de alcançá-la
pelo mar. A tarefa de coube, porém, exclusivamente à marinha. Winston Churchill, então primeiro lorde do
Almirantado, entusiasmara-se com a ideia de chegar à Rússia pelo estreito de Dardanelos. Os Aliados
fizeram inúmeras tentativas. Os turcos haviam minado o estreito e fortificado suas margens sob a orientação
de um general alemão, Von Saunders.
Os aliados perderam ali alguns navios, até que
perceberam que não podiam tomar os Dardanelos
apenas com navios, porque navios nunca tomaram
posição alguma de terra. Quando, depois de
empregarem até navios novos – como foi o caso dos
super-dreadnoughts classe Queen Elizabeth – o que
resultou no pedido de demissão de lorde Fisher, os
aliados decidiram usar tropas de terra, já sendo tarde
demais. Uma das margens do estreito de Dardanelos
era na península de Galípoli, onde o desastre foi
completo. Tudo aconteceu ao contrário do que se
pretendia. A Turquia (Império Otomano) fortaleceu-se
e a Bulgária entrou na guerra a favor das potências
centrais. Tudo porque se empregou erradamente
o poder naval. Tudo porque os partidários de uma
rígida estratégia terrestre não quiseram renunciar a suas Super-Dreadnought “Queen Elizabeth”
convicções. O mau emprego dos navios resultou numa
custosa lição.
O grande revés experimentado pelos Aliados com a campanha de Constantinopla, como também
ficou conhecida a Campanha dos Dardanelos, foi seguida de uma gigantesca batalha naval, a maior do
mundo até então, a Batalha da Jutlândia (também chamada de Skagerrak pelos alemães). A batalha da
Jutlândia (31/05/1916), de longe a mais considerável ação naval da guerra, poderia bem ter sido decisiva,
mas não o foi. Na verdade, Jutlândia foi seguida por dois anos e meio de agonia desnecessária. No fim,
porém, o poderio naval teve sua parte decisiva, derrotando a campanha submarina, assegurando o trânsito
seguro das forças inglesas e americanas, conservando abertas todas as comunicações aliadas.
A estratégia marítima britânica envolvia uma atividade principal: o bloqueio do inimigo. Esse
bloqueio, muitas vezes furado, não conseguiu impedir que um perigosíssimo elemento aparecesse no
cenário da guerra naval: o submarino.
O submarino era uma arma obscura. Ninguém conhecia exatamente seu valor. Nunca havia sido
experimentado em larga escala. Era conhecido apenas como um navio adequado para a defesa dos portos.
O submarino era, exclusivamente, um navio de emprego defensivo. Sem condições de alcançar cedo uma
vitória que pretendiam obter sobre a França com seis semanas de guerra, os alemães voltaram-se tenazmente
contra os Aliados no mar, especialmente contra a Grã-Bretanha, lançando as campanhas submarinas.
Ao começar a guerra, os ingleses tinham 64 submarinos, os franceses, 73, e os alemães, 23. Quando
a guerra terminou, os alemães haviam construído mais de 800 submarinos, o que mostra a importância que
deram a este tipo de navio. A primeira campanha submarina foi em 1915; a segunda, em
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1916. Ambas, porém, foram restritas, isto é, tinham como objetivo os navios mercantes inimigos,
preferencialmente aos de guerra, quando em águas declaradas como zona de guerra. Dentre os navios
afundados, no entanto, contavam-se frequentemente navios neutros, o que gerava protestos diplomáticos.
A guerra restrita dava poucos resultados, considerando-se, sobretudo, o abuso de bandeiras neutras por
parte dos ingleses.
Por fim, em 1917, o Imperador da Alemanha, Guilherme II, proclamou a campanha submarina
irrestrita. Os alemães afundariam os navios mercantes de qualquer nacionalidade que navegassem na zona
de guerra em torno das ilhas britânicas. Os alemães pretendiam liquidar com a economia inglesa e fazer o
povo inglês padecer de fome, já que a Grã-Bretanha importava alimentos em grande quantidade. Os alemães
calculavam que, em 1917, a comida era transportada para a Grã-Bretanha por 10.750.000 toneladas de
navios mercantes, dos quais dois terços era ingleses. Os alemães pretendiam afundar uma média de 600.000
t de navios mercantes por mês, fazendo com que em pouco tempo a Grã-Bretanha passasse fome. Tudo
teria dado excelente resultado para os alemães, não fossem estudos novos que se fizeram sobre o tráfego
marítimo.
Verificou-se o seguinte: o tráfego no canal da Mancha, realizado em comboio, trazia o índice de
apenas cinco afundamentos em 2.600 viagens, o que significa apenas 0,19% de perdas; nas viagens para a
Noruega, com o uso de comboio, as perdas eram da ordem de 0,24%, enquanto sem comboio elevavam-se
a 25%. Tais resultados induziam ao uso do comboio como medida geral a ser adotada para o
tráfego marítimo durante a guerra.
O Almirantado britânico, contudo, reagia à ideia, fundamentando-se em argumentos aparentemente
razoáveis como:
a) a velocidade do comboio teria que ser reduzida em função do navio mais lento, o que aumentaria
demasiadamente a demora nas travessias;
b) os portos ficariam congestionados em face da chegada simultânea de um número grande de navios
para as operações de carga e descarga;
c) a viagem em grupo aumentava os riscos de colisão e de consequente perda de navios;
d) o emprego de navios de guerra para a cobertura dos comboios retirá-los-ia de missões ofensivas,
com prejuízo para o desenvolvimento das operações navais.
Os oficiais partidários do comboio contra-argumentaram e por fim viu-se que tinham razão, pois:
a) os comboios poderiam ser agrupados de modo a se comporem de navios com velocidade
aproximadamente igual; os muito lentos viajariam escoteiros (isolados); assim, não haveria substancial
prejuízo na rapidez das viagens;
b) a chegada programada, em certa data, de um comboio de navios, permitiu melhor planejamento e
execução das operações de carga e descarga do que a vinda aleatória de navios escoteiros, impossibilitados
de prevenir sua chegada ao porto, por terem que manter silêncio-rádio;
c) os comandantes de navios mercantes mostraram-se hábeis em manter a posição de seus navios em
formatura;
d) a missão de comboio requisitou poucos navios para escolta, muito menos do que se imaginava,
geralmente 5% dos navios engajados em missões operativas, nunca ultrapassando a porcentagem de 15%
destes.
A vitória do emprego do comboio deveu-se, sobretudo, ao Almirante Sims, da US Navy, que tratava,
em Londres, do apoio dos Estados Unidos à Grã-Bretanha. Sims exigiu do Almirantado britânico
a adoção do comboio, pressionando-o a aceitar tal solução, pela qual se entusiasmara ao tomar
conhecimento dos estudos realizados, em função da substancial ajuda que os americanos começavam a
prestar com sua entrada na guerra.
O comboio foi a salvação do tráfego marítimo inglês. Todas as outras contramedidas mostraram-se
fracas em comparação a esta. Depois de usarem minas, redes, hidrofone, mercantes armados, navios-
armadilha (Q-ships), carga de profundidade e comboio, tudo contra os submarinos, apareceu a grande
novidade da época, o avião, também usado em larga escala na proteção à navegação mercante. No final da
guerra, 565 aviões, hidraviões e zepelins apoiaram comboios (últimos seis meses do conflito). Voaram uma
média de 14 mil horas por mês, marca somente ultrapassada em meados de 1943, na Segunda Guerra
Mundial. Tais equipamentos aéreos avistaram 28 submarinos inimigos e atacaram 19. Embora não tenham
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alcançado nenhum afundamento, seu caráter pioneiro foi brilhante, marcando o início de uma tática
antissubmarina que se desenvolveria mais tarde no segundo grande conflito do século. Dentre as centenas
de comboios com proteção aérea e de superfície, apenas seis foram atacados, com cinco afundamentos.
Em 11 de novembro de 1918, a Grande Guerra acabou, e, pouco depois, toda a frota alemã se rendeu;
dezenove encouraçados, cinco cruzadores de batalha, dezesseis cruzadores ligeiros, noventa e dois
contratorpedeiros, cinquenta torpedeiros e cento e cinquenta e oito submarinos. Nessa mesma época, a Grã-
Bretanha dispunha de quarenta e nove navios de linha, oitenta e oito cruzadores de vários tipos e para mais
de trezentos contratorpedeiros. Nunca antes fora tão esmagador o domínio dos mares pela Inglaterra, como
em fins de 1918.
Rapidamente, após a guerra, a Grã-Bretanha recuperou a primazia da Marinha Mercante que
perdera, por efeito da campanha submarina, para a crescente frota de comércio dos Estados Unidos. Em
1925, a Grã-Bretanha já estava com sua frota mercante inteiramente restaurada e voltou a participar do
tráfego mundial mais ou menos na mesma proporção de antes da guerra. Além de atender às permutas do
vasto Império, a Marinha de comércio inglesa cobria deficiências de transporte em regiões afastadas de
todo o mundo. Nos portos brasileiros, argentinos, chilenos, chineses e etc, era a bandeira do Reino Unido
a mais vista; 35% das exportações americanas eram feitas em porões ingleses. Já não era, entretanto, a Grã-
Bretanha a única potência marítima, nem permitiam mais seus recursos financeiros manter a supremacia
absoluta, conservada por cerca de duzentos anos. Entre as duas guerras, ela procurou nas conferências de
desarmamento salvaguardar sua posição, mas foi obrigada a aceitar a paridade naval com os Estados
Unidos.
A par disso, outras potências navais surgiram ameaçadoras: a Itália, no Mediterrâneo, e o Japão, no
extremo Oriente, se bem que contrabalançados pelas Marinhas francesa e americana, respectivamente.
O governo inglês, preocupado com um possível desenvolvimento da marinha de guerra germânica,
iniciou negociações secretas com os alemães, sem qualquer consulta à França. Em 18/06/1935, a Europa
soube, estarrecida, que Londres permitia aos nazistas a construção de uma frota de alto-mar equivalente a
1/3 da marinha britânica, com uma proporção ainda maior de submarinos. Tal acordo equiparava a força
naval alemã à francesa. A notícia provocou em Paris uma profunda irritação contra os ingleses, que haviam
agido em função de seus interesses exclusivos e abandonado a França, diante de uma Alemanha cada vez
mais poderosa. Ressentidos com os britânicos, os franceses procuraram então se aproximar da Itália, como
um meio de barrar o caminho à Alemanha.
Mussolini aceitou com entusiasmo a mão que a França lhe estendia, o que vinha servir seus planos
imperialistas. O Fascismo consolidara-se internamente, e a população italiana atingira um nível de
prosperidade material até então jamais alcançado.
Entretanto, a própria psicologia do fascismo obrigava os dirigentes a estimularem constantemente o
povo, conservando-o sempre excitado, a fim de manter o prestígio de Mussolini. O Duce queria evitar que
a população italiana se habituasse à rotina, diminuindo o apoio ruidoso que lhe prestava e que afagava sua
volúpia de poder. Devido a seu temperamento, era um líder que precisava de grandes gestos e de atos
igualmente grandiosos, para alimentar sua enorme vaidade. Embora houvesse feito uma administração de
incontestável valor na Itália, isso não lhe bastava. Sua concepção histórica impelia-o a imitar Júlio Cesar,
fazendo-o entrar, também, para a galeria dos grandes homens, sob o tríplice rótulo de administrador,
estadista e conquistador.
Desde que começou a Segunda Guerra Mundial, o principal esforço da Alemanha no mar foi
orientado no sentido de cortar as ligações oceânicas do Império Britânico, recorrendo principalmente à
arma submarina e à aviação. A Batalha do Atlântico, que começou no primeiro dia da guerra, foi assim a
campanha naval chave de todo o conflito. Seu desenrolar não pôde ser determinado pelos resultados de um
encontro decisivo, mas pelas listas anotadas numa folha onde figuravam navios perdidos em face de navios
construídos, navios afundados em face de submarinos alemães destruídos. Referindo-se à Batalha do
Atlântico, assim se expressou Winston Churchill: "A única coisa que sempre me atemorizou realmente
durante a guerra foi o perigo dos submarinos. A nossa linha vital mesmo através dos amplos oceanos e
particularmente nas entradas para a Ilha estava em perigo. Sentia-me ainda mais ansioso a respeito dessa
batalha do que me sentira a respeito da gloriosa luta aérea chamada Batalha da Grã-Bretanha”.

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Em maio de 1939, Mussolini havia enviado a Hitler um memorando
ultrassecreto, que foi levado a Berlim por Cavallero, oficial-general que mais
tarde foi chefe do estado-maior e que viria a ter um destino trágico (tendo
recusado seus serviços à Alemanha, foi assassinado pela Gestapo em
setembro de 1943, sendo sua morte camuflada em suicídio). A nota do Duce,
conhecida hoje em dia como "Memorando Cavallero", poderia ter assegurado
alguma tranquilidade à Europa, talvez mesmo a paz, se tal trégua fosse
aproveitada. Mussolini achava que um conflito seria inevitável, mas a Itália
não poderia estar envolvida nele antes de três anos. Ele pedia, então, ao
Fuehrer que evitasse a guerra até 1942. Hitler concordou a princípio com as
sugestões do Duce.

Em fins de maio de 1939, era assinado o "Pacto de Aço" entre a Itália e a Alemanha. Seu primeiro
artigo especificava que as duas potências se manteriam em contato permanente e concordariam em todos
os assuntos de interesse comum; o artigo terceiro estipulava que, se uma das partes contratantes se envol-
vesse em uma ação militar, a outra devia auxiliá-la com todas as suas forças. Em 11 de agosto, Ribbentrop
anunciava ao Conde Ciano que a Alemanha atacaria a Polônia e lhe solicitava a aplicação do pacto. Os
italianos, não tendo sido consultados previamente, poderiam prevalecer-se do artigo primeiro do pacto para
sofismarem sobre o terceiro. Preferiram, entretanto, agir dentro do espírito do "Memorando Cavallero": a
entrada em guerra três anos antes do que haviam previsto pegava-os desprevenidos.
Em 25 de agosto, Mussolini telegrafava a Hitler dizendo-lhe que a Itália não podia entrar em
campanha, a menos que recebesse uma ajuda substancial em dinheiro e materiais, inclusive combustíveis.
Attolico, embaixador italiano em Berlim, fez ver que a liberação de tais matérias, devia ser imediata, prece-
dendo mesmo a entrada em guerra. No mesmo dia, Hitler respondia que não tinha condições de atender
imediatamente tais exigências. Dizia também que compreendia a situação da Itália e lhe pedia simplesmente
que operasse deslocamentos de tropas com o fim de reter junto a suas fronteiras forças franco-britânicas.
Uma nova troca de mensagens confirmou a neutralidade italiana com a aquiescência de Hitler. A
manobra da Itália poderá ser taxada de oportunista, mas na verdade, como hoje se sabe, era bastante grave
o despreparo de seu Exército, o que justificava sua atitude. A Itália proclamou, então, sua não beligerância,
termo que, para Mussolini, significava neutralidade, favorável à Alemanha. Durante a guerra, os italianos
passariam da não beligerância à guerra contra os Aliados, depois à co-beligerância, ou guerra ao lado destes.
Apesar do termo inquietante de não beligerância, a posição tomada pela Itália em setembro de 1939
nos foi extremamente favorável.
A Espanha, extenuada pela guerra civil e inquieta com o pacto de não agressão germano-russo,
encontrava na decisão da Itália uma razão suplementar para não entrar na luta e proclamou sua neutralidade.
No Mediterrâneo Oriental a situação era ainda melhor. A Turquia, ao contrário do que acontecera em 1914,
era francamente favorável aos Aliados e, em 19 de outubro, foi assinado um tratado entre a Turquia, a
França e a Grã-Bretanha, dando garantias à Grécia e à Romênia, o que foi seguido por contatos entre os
estados-maiores. Assim, todas as costas do Mediterrâneo estavam neutras ou se encontravam sob o domínio
da França ou da Grã-Bretanha. A guerra começava nesse teatro nas condições mais favoráveis, apesar da
necessidade de que tinham as duas potências de manter aí forças de segurança.
Durante muitos anos os estados-maiores franceses haviam tido no primeiro plano de suas
preocupações o transporte rápido de tropas da África do Norte para a metrópole. A Marinha, a quem cabia
grande responsabilidade, havia estudado a questão em todas as suas formas e previsto todas as
eventualidades. As turmas da Escola de Guerra Naval estavam todas dedicadas a este problema e uma
grande parte dos exercícios da Esquadra tinha como motivo o tema da passagem. Tudo se tornou fácil pela
neutralidade da Itália e a impotência das forças navais alemãs.
No começo da guerra, a Alemanha dispunha essencialmente de dois encouraçados - Scharnhost e
Gneisenau; três encouraçados de bolso; três cruzadores pesados; cinco cruzadores ligeiros; uns cinquenta
contratorpedeiros e cinquenta e sete submarinos, dos quais somente vinte e seis eram capazes de agir fora
do Mar do Norte. As forças de superfície alemãs não podiam penetrar no Mediterrâneo devido a sua inferio-
ridade e os submarinos tinham muito que fazer no Atlântico.
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Além do mais, em 7 de setembro, Hitler ordenava aos submarinos alemães que não empreendessem
nenhuma ação ofensiva contra os navios franceses. Ele esperava, então, que a França, após a derrota da
Polônia, aceitasse uma paz de compromisso. Tal ordem foi revogada em 23 de setembro, mas a Marinha
alemã não enviou submarinos ao Mediterrâneo. Somente no verão de 1941 os primeiros U-Boot transporão
Gibraltar.
Assim, a situação do Mediterrâneo em 1939 se apresentava o mais favoravelmente possível. A França
e a Grã-Bretanha puderam destacar para o Atlântico uma grande parte das forças reservadas para combater
a Itália. Somente alguns navios leves, participando do bloqueio, asseguravam a proteção ao tráfego
marítimo no Mediterrâneo contra eventuais corsários inimigos.
Por outro lado, a estratégia aliada pretendia, em longo prazo, realizar uma intervenção nos Bálcãs,
onde a diplomacia preparava o terreno. Ao mesmo tempo, uma divisão argelina foi enviada à Síria. A
manobra de alas, bastante empregada pelos chefes franceses, baseava-se na certeza da cristalização da frente
nordeste, o que infelizmente estava errado. A neutralidade da Itália, que deixava aos Aliados o domínio
inconteste do Mediterrâneo, permitia conceber grandes planos para o futuro, esperando-se conservar as
margens desse mar.
A conservação da supremacia do Atlântico pelos britânicos, a
despeito das forças aéreas e marítimas do Eixo, durante os dois
terríveis primeiros anos de guerra, conta-se entre os feitos mais
extraordinários da História. O principal problema naval das nações
unidas na Segunda Guerra Mundial foi, até pelo menos o meio do
ano de 1943, o de achar um número de navios de guerra para
assegurar a proteção conveniente da navegação comercial.
Ante a destruição gigantesca sofrida pelas marinhas de
comércio aliadas, as disponibilidades de navios de transporte
tornaram-se o fundamento da estratégia de guerra aliada. Os aliados Navio mercante torpedeado
perderam quatro milhões de toneladas de barcos mercantes em 1940
e mais de quatro milhões em 1941.
Em 1942, foram postos a pique quase 8 milhões de toneladas
da navegação aliada, então já aumentada depois que os Estados
Unidos se tinham tornado aliados. Submarino Alemão (U-Boat)
Até fins de 1942, os submarinos afundaram navios mais depressa do que os aliados podiam construí-
los. Em começos de 1943, o nível das novas tonelagens foi subindo nitidamente, e as perdas diminuíram.
Antes do fim daquele ano, a nova tonelagem havia finalmente ultrapassado as perdas marítimas oriundas
de causas diversas.
O segundo semestre presenciou, pela primeira vez, as perdas de submarinos excederem a sua
capacidade de poderem ser substituídos. Logo viria o tempo em que seriam afundados no Atlântico mais
submarinos do que navios mercantes. “A Batalha do Atlântico", afirmou ainda Winston Churchill, foi o
fator dominante durante toda a guerra. Jamais podíamos esquecer que tudo que acontecesse algures, em
terra, no mar ou no ar, dependia em última instância do resultado daquela batalha, e, em meio a todas as
outras preocupações, considerávamos os seus altos e baixos, dia a dia presos de esperança ou apreensão.
No Mediterrâneo, área de grande importância estratégica e econômica devido ao canal de Suez, a
Inglaterra teve brilhante e importante atuação durante a Segunda Grande Guerra. Contra a relativamente
poderosa esquadra italiana, os ingleses colocaram no Mediterrâneo forças consideráveis organizadas
inicialmente em duas esquadras, a do Oriente sob o comando do almirante Cunningham, com base em
Alexandria, e a Força H, com base em Gibraltar, destinada a atuar no Atlântico ou no Mediterrâneo, com a
dupla missão de participar da proteção das rotas oceânicas e de assegurar, dentro do Mediterrâneo
Ocidental, escolta para os comboios com destino a Malta, onde mais tarde foi montada a força K, e a
Alexandria. Seu comandante era o Almirante Somerville, que estava diretamente subordinado ao
Almirantado. Ao todo, os britânicos contavam com seis couraçados, dois porta-aviões e um número
apreciável de cruzadores, 33 contratorpedeiros e alguns submarinos. Graças à arma aérea embarcada
estavam numa posição de equilíbrio ou até de superioridade.

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No início do conflito, em 1940, os italianos acreditavam que podiam destruir unidades navais com
bombardeamentos em altitude praticados pelos seus trimotores Savoia S79, o que se revelou errado.
Posteriormente, estes aviões foram utilizados como torpedeiros aéreos mas ainda com pouca eficácia, já
que nem sempre se aproximavam o suficiente dos navios a atacar para conseguir o êxito pretendido pela
missão.
Os alemães ficaram àquela altura muito admirados com a forte presença naval britânica no
Mediterrâneo, já que então preparavam intensamente aquilo que poderia ter sido a invasão alemã da Grã-
Bretanha. Obviamente, a direção britânica não acreditava na possibilidade de os alemães conseguirem com
as suas reduzidas forças navais atravessar a Mancha, o que foi rapidamente reconhecido pelo próprio
comando alemão que desistiu da operação sem ter verdadeiramente feito mais que juntar em alguns portos
franceses um certo número de navios.
O bloqueio marítimo foi, desde o princípio, mais severo do que durante a Primeira Guerra Mundial.
Foram muito extensas as listas de contrabando absoluto e condicional estabelecidas pelos Aliados. Em 8 de
setembro, já estavam designados os portos de controle. Em 19 de dezembro, foi criado o sistema dos
navicerts: o navio que aceitasse ter a sua carga examinada por um agente aliado em um porto neutro, se não
transportasse contrabando, recebia um certificado que lhe permitia atravessar rapidamente os cruzeiros de
controle. Ele encontrava em tal método uma vantagem certa, enquanto a própria vigilância aliada era mais
fácil e mais segura.
Desde o começo da guerra, as importações dos neutros vizinhos da Alemanha foram limitadas a um
certo valor, com o que se evitavam os desvios para o inimigo, que, na guerra de 1914-18, haviam sido de
vulto. Nos tempos de paz, os países danubianos enviavam suas exportações destinadas à Alemanha pelo
Mar Negro ou pelo Mediterrâneo. Era-lhes preciso usar o Danúbio em contrapartida e, durante os períodos
de gelo, as estradas de ferro, cujo rendimento era ainda menor.
Dispondo de meios para comércio, os Aliados podiam comprar, ainda que a preços elevados, na
Suécia, na Bélgica e no Sudeste da Europa, matérias-primas, que a Alemanha só podia obter com pesadas
dificuldades. A Itália chegou a fornecer material de guerra à França, do que o Reich se queixou
amargamente. O Governo italiano respondeu neste caso que tais vendas lhe permitiam obter fornecimentos
necessários à sua preparação militar e que o aumento de sua força ajudava indiretamente o seu aliado. Tudo
isso podia parecer bastante sutil, mas muitos italianos ainda hesitavam. "Ganhai vitórias e estaremos
convosco", dizia Ciano aos Aliados.
Novas medidas de bloqueio vinham alterar nossas relações com a Itália. Em 21 de novembro de 1939,
os Aliados anunciaram que, em represálias às minagens efetuadas ilegalmente pelos alemães, eles se
apoderariam de todas as exportações da Alemanha, sem levar em conta a bandeira do navio transportador.
Tais medidas contrariavam a Declaração de Paris, de 1856. O Japão, a Bélgica, a Holanda, a Dinamarca e
a Suécia reclamaram. A 27 de novembro, o Rei Jorge assinava a "Ordem em Conselho" e a 28 o Governo
francês publicava um decreto, tudo para aplicar a decisão tomada em comum; sua execução começou em 4
de dezembro. Entretanto, não foram apreendidas as exportações alemãs de carvão para a Itália, que
passassem sob pavilhão neutro. Em dezembro, o Governo italiano enviou à Grã-Bretanha uma nota de
protesto contra o bloqueio, solicitando sobretudo o fim dos desvios das rotas dos navios e a anulação de
todo o controle das comunicações entre a Itália e seu império colonial. Deixando a porta aberta às
discussões, o Governo britânico rejeitou as pretensões da Itália em 9 de janeiro de 1940.

Em fevereiro, fracassaram as negociações entre a Grã-


Bretanha e a Itália para um tratado de comércio e, em 18 desse mês,
Sir Percy Lorraine informava ao Conde Ciano, em Roma, que todos
os transportes de carvão que viessem da Alemanha, por via marítima,
com destino à Itália, seriam detidos.
No início de março, treze carvoeiros italianos partiram da
Alemanha com destino à Península Itálica; foram rapidamente
interceptados no Mar do Norte pela Esquadra britânica, e não
Mussolini e Hitler em desfile surtiram efeito os protestos italianos.

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Por mais severo que fosse o bloqueio, não podia ter senão uma fraca influência sobre o desenrolar do
conflito. A Alemanha havia organizado uma política de autossuficiência que diminuía sua vulnerabilidade.
Por outro lado, ela contava receber da União Soviética as matérias-primas que lhe faltavam. O bloqueio
irritou profundamente os italianos. Embora não tendo sido a causa principal de sua entrada na guerra, serviu
à propaganda de Mussolini para preparar a opinião pública.
Desde a queda da Polônia a Itália estava convencida da vitória alemã. Em 10/03/1940, Ribbentrop
vinha a Roma. Após essa visita, Mussolini encontrou-se com Hitler em Bremer, a 18 do mesmo mês, e lhe
prometeu intervir. Em 31 de março, o Duce enviou ao Rei e aos altos chefes militares uma nota ultra-secreta
sobre a necessidade de se engajar no que chamava de "guerra paralela". A guerra estava, portanto, decidida
no pensamento de Mussolini, em fins de março de 1940. A derrota da França apenas o ajudou a vencer
resistências internas e o levou a antecipar a data das hostilidades.
As intenções dos italianos não eram desconhecidas dos Aliados. Desde fins de abril, a Grã-Bretanha
retirou seus navios mercantes do Mediterrâneo e tomou junto com a França as medidas militares previstas
para ocaso de guerra contra a Itália. Por convenção, a Grã-Bretanha encarregava-se do Mediterrâneo
Oriental e da guarda do Estreito de Gibraltar; a França encarregava-se da bacia ocidental. Um encouraçado
e três cruzadores franceses foram destacados para Alexandria às ordens do alto comando britânico e, por
outro lado, os submarinos de Malta foram colocados à disposição do comando francês. Todas as medidas
de segurança foram tomadas em tempo, no mar, pelos dois aliados e em nenhum momento eles ficaram em
posição de serem surpreendidos por um repentino ataque aeronaval italiano. Em maio, o ritmo dos aconteci-
mentos na frente ocidental conduziu Mussolini a precipitar a entrada em guerra.
A campanha pela imprensa crescia na Península e permitia prever o próximo desencadeamento das
hostilidades. Entre os agravos invocados para arrastar o país à luta, destacava-se o bloqueio. A imprensa
publicou um relatório de Luca Pietromarchi, chefe do escritório da guerra econômica, em que punha em
relevo os prejuízos sofridos pela Itália por causa do bloqueio naval e, sobretudo, devido à maneira como
foi este exercido. Em 8 de junho, um novo relatório proclamava que a Itália não podia mais tolerar tal
situação. No dia 10, às 18 horas, do famoso balcão do Palácio Veneza, Mussolini anunciava a entrada na
guerra, a partir da zero hora do dia 11 daquele mês. Várias corporações e associações haviam dirigido ao
Duce mensagens de calorosa adesão. Assim, eles aprovavam o que o Presidente Roosevelt iria chamar de
punhalada nas costas, e que era pior na realidade, pois era um golpe dado em um combatente já vencido.
Porém, inúmeros italianos reprovavam em silêncio essa agressão contra irmãos de raça. O país entrava em
guerra com a consciência profundamente inquieta e perturbada. Colocavam-se todas as suas esperanças
numa guerra curta, estado de espírito pouco favorável para suportar a longa adversidade que o futuro
reservava.
Em 8 de junho, o Almirantado italiano tinha dado a ordem de refugiarem o mais rapidamente possível
em águas neutras a todos os navios mercantes italianos que não pudessem demandar um porto do Eixo.
Com o fim de melhorar sua balança comercial, a Itália havia deixado navegar sem restrições a sua frota
mercante, e a repentina entrada em guerra não lhe havia permitido recuperar em tempo os seus navios. 218
navios, representando cerca de 1.200.000 toneladas de arqueação, permaneciam no estrangeiro. Esta perda
atingia cerca de um terço da marinha mercante italiana e os navios que ela envolvia estavam entre os
melhores. Isto era um revés do qual não se deu plenamente conta logo, mas que teve mais tarde as piores
consequências. Não existe marinha de guerra forte sem uma correspondente marinha mercante. O
Almirantado italiano sabia disso, mas o governo de Mussolini o ignorava. Depois, o Duce viria lamentar
amargamente o que o pessoal de marinha na Itália chamou de tragédia inicial de sua frota mercante.
O teatro do Mediterrâneo Ocidental caracteriza-se por sua compartimentagem. Ele é esquadrinhado
pela linha das Baleares, orientada do sudeste para o nordeste, e pela linha Córsega-Sardenha-Sicília, que
isola o Mar Tirreno. Tal separação havia conduzido o comando francês a dividir em três grupos suas forças
de alto mar: em Toulon, a Segunda Esquadra; em Oran, a Terceira Eseiiadra, ambas na Argélia; em Argel,
uma divisão de cruzadores. Além disso, havia sido criado um comando de teatro sob as ordens do Almirante
Esteva. Este tinha a missão de assegurar proteção aos comboios e estabelecer dispositivos de segurança:
um dispositivo no Sudoeste para reforçar e escalonar a vigilância exercida pelos britânicos em Gibraltar;
um dispositivo no Sudeste, entre a Sicília e a Tunísia; um dispositivo no Nordeste, no Alto Tirreno.

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O Almirante Esteva dispunha de elementos ligeiros de superfície, de submarinos e de aviões, mas as
esquadras não estavam sob suas ordens, pois eram subordinadas diretamente ao Almirante Darlan, coman-
dante-em-chefe das forças navais francesas, sediado em Maintenon. Esta organização se justificava pela
necessidade de se manterem as comunicações entre as forças de alto mar do Atlântico e do Mediterrâneo,
e também pela excelência das transmissões de que dispunha o comandante-em-chefe em Maintenon, onde
a Marinha havia estabelecido um quartel-general altamente organizado.

Os italianos haviam disposto suas forças no Baixo Tirreno e no


Mar Jônio, podendo elas juntar-se através do Estreito de Messina. A
15 de junho, os italianos declararam perigosa para a navegação uma
zona de 12 milhas em volta das costas da metrópole, da Albânia e das
colônias. A 10 de junho, anunciaram que o Estreito da Sicília devia
ser considerado como minado e que a navegação neutra poderia
demandar o Estreito de Messina. Realizaram operações de minagem
entre a Tunísia e a Sicília, tendo sido estas executadas com a cobertura
de cruzadores e contratorpedeiros, sem terem sido perturbadas por
Bombardeiro Consolidated B-24 forças navais inimigas.

A única operação de certa importância no Mediterrâneo Ocidental foi o bombardeio de Gênova e de


Vado pela Segunda Esquadra francesa. Prevista inicialmente para o dia 12 de junho, ela foi adiada 48 horas
por causa das hesitações do Governo francês. Este estimava, então, que a Itália, em presença de uma
Alemanha poderosa, procuraria evitar o esmagamento da França no tratado de paz, sendo necessário: pois,
não se indispor contra ela. Mussolini, entretanto, pensava sobretudo em arrancar à França e à Grã-Bretanha
o máximo de despojos possível, aos mínimos custos. Em 12 de junho, o bombardeio de Bizerta, realizado
por cerca de vinte aviões italianos, resultou na decisão do Governo francês, e o Almirante Darlan, às 22,50
horas, deu a ordem para se executar a operação. A esquadra regressou a Toulon por volta do meio-dia do
dia 14.
No Mediterrâneo Oriental, compreendendo quatro encouraçados, um navio-aeródromo, cinco
cruzadores e uns tantos contratorpedeiros, a Esquadra de Alexandria explorava o mar até o sul da Itália,
desde o dia 11 de junho, sem encontrar o inimigo. Em 21 do mesmo mês, uma esquadra composta do
encouraçado Lorraine, de quatro cruzadores britânicos e de contratorpedeiros bombardeou os depósitos de
munição e de material em Bardia, sem resposta dos italianos. Os cruzadores franceses de Alexandria
fizeram uma exploração no mar Egeu e, de sua parte, os italianos suspenderam para cruzeiros com a sua
Segunda Esquadra. Em 11 de junho, um submarino italiano havia afundado o velho cruzador inglês
Calypso, junto à Ilha de Creta. As aviações oponentes bombardearam algumas posições: os franceses
atacaram Savona, Gênova, Livorno, Cagliari e Palermo; os italianos, Malta, Bizerta, Toulon e Marselha.
Todas essas operações tiveram pequena envergadura. As operações aeronavais se limitaram, em suma, a
escaramuças.
Em 22 de junho, o armistício franco-alemão foi assinado em Rethondes. Isso implicava no
desarmamento da Esquadra. Os alemães não exigiram bases no Mediterrâneo, mas a cessação da luta estava
subordinada à assinatura do armistício franco-italiano, que teve lugar a 24 de junho, perto de Roma.
Apresentam-se de modo diverso os entendimentos havidos entre Hitler e Mussolini anteriores a esses
acontecimentos. A versão que se segue parece verídica. A 19 de junho, Hitler e Mussolini encontraram-se
em Munique. Ribbentrop aconselhou moderação aos italianos. Contudo, Mussolini reivindica a ocupação
da Córsega, da Tunísia e da França até o Ródano. Hitler aceitou. Tendo refletido sobre os argumentos de
Ribbentrop, Mussolini telegrafou para Berlim em 22 de junho, dizendo que renunciava a suas exigências
para facilitar a aceitação do armistício pelos franceses. Hitler respondeu que os italianos podiam agir como
melhor lhes aprouvesse. Estes, então, limitam-se a exigir, do ponto de vista territorial, a desmilitarização
dos portos franceses do Mediterrâneo, a desmilitarização de uma faixa de 50 quilômetros na fronteira dos

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Alpes, da linha do Mareth e de 200 quilômetros na fronteira da Líbia com a Argélia; finalmente, a utilização
do porto de Djibuti e a parte francesa da estrada de ferro de Adis-Abeba.
A principal razão que levou o Eixo a renunciar a qualquer exigência séria na África do Norte foi o
desejo dos alemães de concluírem rapidamente o seu affaire com a França. Além disso, a existência da
Esquadra francesa pesava grandemente nas decisões do Eixo. Desde que ficou evidente que a Grã-Bretanha
continuaria a luta, o comando alemão decidiu aniquilá-la, primeiro pela invasão, depois pelo bloqueio. Nos
dois casos, a Esquadra francesa podia prestar um precioso auxílio aos ingleses, e uma tentativa dos
germano-italianos sobre a Tunísia ou a Argélia pô-la-ia no lado inglês. Assim, o poderio da Marinha
francesa contribuiu para salvaguardar a África do Norte. O império e a Esquadra permaneceram nas mãos
do Governo francês: dois trunfos que se valorizavam um ao outro.
Desde 15 de julho, os alemães tentaram sair das cláusulas do
armistício. Reivindicaram bases no Sul da França e na África do
Norte, além da utilização da estrada de ferro Túnis-Casablanca, o que
lhes foi negado. Quando a Luftwaffe foi vencida nos céus de Londres,
alemães e italianos compreenderam ainda melhor os seus erros. Além
do mais, eles não estavam de acordo sobre a atitude a ser mantida com
relação à França.
O Almirante Raeder, comandante da Marinha alemã, teve
durante longo tempo a esperança de ver a Esquadra francesa e a
África do Norte, junto com Dacar, passarem para o lado da
Alemanha. Totalmente voltado para a guerra naval, ele via nisso
um elemento decisivo na luta contra a Grã-Bretanha e, para
atingir seus fins, era partidário da ideia de se fazerem grandes
concessões à França. Hitler estava hesitante e Mussolini, cético.
O Duce queria que a Esquadra francesa fosse desarmada
eficazmente, os efetivos, reduzidos, e as munições e o
combustível, desembarcados. Sua vontade não foi atendida.
Objeto da inquietação e da cobiça dos beligerantes, a África do Norte dará lugar a uma longa luta
diplomática, onde a ação, muitas vezes discordante, da Alemanha e da Itália se opôs à dos Estados Unidos.
Com a maior dificuldade, a França conseguiu preservar sua posição contra o Eixo até o momento do
desembarque aliado.
Os ingleses alcançaram esmagadoras vitórias no Mediterrâneo experimentando pequenas perdas. Em
Tarento, em 11 de novembro de 1940, afundaram três encouraçados italianos e perderam apenas dois
aviões. Em Matapan, em março de 1941, destruíram três cruzadores e dois contratorpedeiros e tiveram
apenas um avião abatido e um homem morto. Tais fatos, valorizados pela propaganda aliada, deram ao
grande público a impressão de que a vitória no mar foi fácil no Mediterrâneo.
Ao contrário disso, entretanto, a luta foi bastante dura. As tripulações dos navios de guerra e
mercantes britânicos que transpuseram muitas vezes o perigoso estreito da Sicília, "a alameda de bombas",
à custa de perdas terríveis, disseram, sem disfarçar a verdade, o que foi o combate. As estatísticas são
bastante eloquentes: por ocasião do armistício com a Itália, em setembro de 1943, a Esquadra britânica
havia perdido tantos navios no Mediterrâneo quanto a Esquadra italiana.
A luta foi rude e, durante muito tempo, indecisa. Todos os franceses se lembram das flutuações da
frente na Líbia, com as alternativas de esperança e decepção que elas acarretavam. Viu-se Rommel
ameaçando Suez num momento em que a Esquadra de Alexandria, enfraquecida por pesadas perdas,
reduzira-se à defensiva.

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A princípio, a França após o armistício ficou em uma
situação complicada. De um lado os Alemães os haviam presos ao
tratado, do outro, os Aliados queriam uma reação francesa. O
governo de Sua Majestade ordenou a Royal Navy para empregar a
força que se fizesse necessária para impedir que os navios caíssem
nas mãos dos alemães ou dos italianos. Depois de ter contato com
a Marinha em Vichy, o Almirante Gensoul rejeitou o ultimato. É
difícil aceitar uma exigência estrangeira sob ameaça de força. Tal
consideração, contudo, devia ser relevada. Aceitando o ultimato, o
almirante salvava a esquadra e a reservava para o futuro. Mas isso
violava o armistício, o que podia acarretar consequências
desastrosas, talvez o reinício da luta e a ocupação da África.
Em Mers El Kebir, parecendo esgotadas todas as possibilidades de se chegar a um acordo, a esquadra
britânica abriu fogo. Não era uma batalha, mas uma execução. Os navios franceses não tinham nenhuma
liberdade de manobra, pois estavam reunidos em um lugar restrito. O Almirante Gensoul havia revidado o
fogo com seus canhões, mas não pudera suspender, uma vez que fora informado desde o início que qualquer
movimento poria fim às negociações que estavam ocorrendo entre a França e a Alemanha, o que colocaria
o povo francês diretamente sob mira alemã. Os navios ingleses beneficiavam-se da observação aérea,
enquanto os aviões franceses não estavam em condições de intervir imediatamente.
O bombardeio britânico não durou mais do que um quarto de hora.
Em Alexandria as coisas não eram tão difíceis já que a esquadra francesa se encontrava em conjunto
com as forças britânicas. As opções eram manter-se com a esquadra britânica, desarmar-se no porto ou
afundar-se. As duas primeiras colocariam a França em agravo com a Alemanha e a princípio seriam
afundados os navios, mas quando as notícias de Mers El Kebir chegaram, pensaram os franceses em
combater os ingleses, mas se evitou o pior aceitando o desarmamento da esquadra no porto de Alexandria.
O problema para a Força H era o estreito de Messina com a ilha Pantelária. A inexistência de radares
e de navios aeródromos italianos facilitaram a ações britânicas no Mediterrâneo. No entanto, os engenhos
de assalto conseguiram o forçamento de Alexandria causando um revés na guerra que ainda contou com o
apoio dos alemães aos italianos. O Eixo quase consegue controlar Suez, no entanto as forças conjuntas de
ingleses, americanos e agora de franceses pertencentes ao governo independente sediado em Londres
fazendo parte da resistência, conseguiram rechaçar os alemães. Com o armistício italiano terminou a grande
guerra naval do Mediterrâneo e essa frente passou a ser utilizada para ingressar no território alemão.
Restava a Hitler uma alternativa para destruir a Grã-Bretanha: a invasão, já que não poderia derrotá-
la em seu elemento. Os alemães cuidaram de planejar a grande operação Leão Marinho (Sealion), para
desembarcarem nas ilhas britânicas. Antes da invasão, bombardearam duramente o solo britânico, lançando
uma terrível campanha aérea, conhecida correntemente como batalha da Inglaterra. Os alemães
encontraram, contudo, a defesa impressionante realizada pela Real Força Aérea (RAF) e, embora tenham
tentado durante todo o segundo semestre de 1940 e o primeiro semestre de 1941, acabaram por desistir.
Não haveriam de subjugar a Grã-Bretanha pelo ar. Haviam errado enormemente considerando o avião
como arma absoluta, fazendo eco à doutrina do General Douhet, italiano, que a havia lançado entre as duas
guerras mundiais, exagerando a importância do avião. O poder marítimo ainda não haveria de ceder à nova
e temível arma. Embora até hoje se discuta o problema do avião em face do navio e a Segunda Guerra
Mundial tenha trazido grandes novidades nesse setor, a verdade é que os usuários do mar mais uma vez
venceram.
Ao começar a guerra, ainda em 1939, iniciaram-se os ataques do Eixo à navegação dos Aliados no
oceano Atlântico. Como dito, o principal meio desses ataques foi o submarino. Depois de pequena dúvida,
os ingleses adotaram o sistema de comboios, que tivera tanto êxito no conflito global precedente. Os
alemães, reconhecendo a impossibilidade de uma guerra regular sobre as águas, adotaram definitivamente
a guerra submarina como linha de ação. O comandante da frota submarina alemã, Almirante Doenitz, era
partidário entusiástico desse tipo de navio. Por fim, acabaria por assumir o comando da marinha alemã,
substituindo o Almirante Raeder, que se desentendera constantemente com Hitler em questões estratégicas,
uma delas exatamente sobre o emprego dos submarinos.
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Os submarinos germânicos espalharam-se por todo o Atlântico, chegando até as costas brasileiras,
onde torpedeariam navios nossos, o que resultou no estado de beligerância entre o Brasil e os países do
Eixo Berlim-Roma (depois acrescido de Tóquio, quando do ataque japonês a Pearl Harbor. Embora eficaz,
o sistema de comboios era mais vulnerável do que durante a Primeira Guerra Mundial, devido aos novos
recursos com que contava a guerra sob as águas. O índice de afundamentos era maior onde não chegava a
proteção aérea à navegação, uma vez que as distâncias eram superiores ao raio de ação dos aviões
encarregados dessa cobertura. Mesmo depois da entrada dos Estados Unidos da América na guerra, com a
utilização de bases em ambas as margens do Atlântico, na Groenlândia e nas ilhas de Cabo Verde, persistia
uma grande área ao norte daquele oceano, conhecida como “black pit”, onde não alcançava a cobertura
aérea aos comboios. Aí davam-se grandes perdas.
Foi uma invenção norte-americana que liquidou com o “Black pit”: o navio-aeródromo de escolta,
dos quais os EUA construíram nada menos do que 121 unidades durante o conflito. Tais navios faziam
a cobertura aérea próxima ao comboio, integrando sua escolta. Com eles organizaram-se os grupos
de caça e destruição (hunter killer groups), que reduziram consideravelmente o efeito dos submarinos
inimigos. A partir de então os mares podiam ser completamente cobertos pelos aviões destinados à proteção
da navegação mercante. Ao todo, os U-boats alemães (U-booten) afundaram 2.775 navios mercantes
aliados, dos quais apenas 28% navegavam em comboio. De um total de perdas de 23.351.000 t pelas mais
variadas causas, os submarinos alemães foram responsáveis por 14.573.000 t, ou seja, 62,4% dos
afundamentos. A Alemanha empregou 1.175 submarinos em toda a guerra, tendo perdido 781 deles,
enquanto a Itália perdeu apenas 85 submarinos, sendo que 21 desses navios no oceano Atlântico. É de se
notar, no entanto, que os Aliados realizaram mais de 300 mil viagens marítimas com êxito através do oceano
Atlântico, ao mesmo tempo que muitas outras centenas de milhares de viagens se realizaram sem danos nas
águas costeiras da Grã-Bretanha. Tais dados motivam-nos a crer na importância das comunicações
marítimas e na necessidade de protegê-las. Daí a relevância do controle do tráfego marítimo. Foi dentro de
todo esse esquema, na defesa da navegação mercante dos Aliados, que se empenhou a Marinha do Brasil
na campanha do Atlântico.
Quando terminou a Segunda Guerra Mundial, a Grã-Bretanha havia sido ultrapassada nos mares
pelos Estados Unidos. Entretanto, enquanto os Estados Unidos encostavam uma grande parte de seus navios
mercantes construídos em regime de urgência durante a guerra, a Inglaterra mantinha seus estaleiros em
plena atividade. Tendo perdido 12 milhões de toneladas de navios de comércio durante o conflito, já estava
em 1946 com 90% da tonelagem de 1939 e três anos depois com 100%. Mais uma vez voltou assim a
recuperar sua posição a frota de comércio inglesa, mas em quase todos os mares encontrou a concorrência
de novas bandeiras.
O período de pós-guerra viu a Grã-Bretanha perder a posição que ocupara no cenário marítimo
durante três séculos.
Ao mesmo tempo em que diminuía a percentagem da participação da Marinha Mercante inglesa no
tráfego marítimo, era perdida a supremacia naval para os Estados Unidos e União Soviética, e
desmembrava-se o antigo Império Colonial.

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6) Alemanha:

Abstraindo a intensa atividade marítimo-


comercial desenvolvida nos fins da Idade Média e nos
primórdios da Idade Moderna pelas cidades hanseáticas, a
participação alemã nos empreendimentos oceânicos foi
diminuta até época bem recente.
O povo alemão, habitando dezenas de
diferentes Estados, muitos dos quais não dispunham de limites
marítimos, dizimado por seguidas e prolongadas guerras, não
participou da investida para os mares iniciada pelos portugueses
e prosseguida depois pela Espanha, Holanda, Inglaterra e
França. O comércio alemão para o além-mar caiu assim nas
mãos dos holandeses.

A partir do século XVIII, a Prússia começou a emergir como o mais poderoso dos Estados
germânicos, mas, cercada por nações rivais, também ela não pôde cogitar do desenvolvimento marítimo,
nem sequer empreender a construção de uma esquadra que protegesse o litoral do Báltico contra os ataques
inimigos. Assim, durante todo o século XVIII, não se encontra nenhum traço da Marinha de Guerra da
Prússia. A necessidade de haver uma se fizera sentir no país por várias vezes durante esse período
perturbado, mas o estado precário das finanças do reino fez sempre adiar a realização dessa empresa. Suecos
e dinamarqueses disso se aproveitaram para levar a bom termo várias campanhas em solo da Alemanha, no
decorrer dos séculos XVII e XVIII.
Em meados do século XIX, a Prússia criou uma pequena Marinha de Guerra. Ela surgiu por força
da guerra contra a Dinamarca e foi planejada levando em conta as peculiaridades da campanha contra aquele
país nórdico. Terminada a guerra, seguiu-se novamente um período de esquecimento para a nascente
Marinha prussiana. Os recursos militares que se davam aos navios alemães em serviço eram fracos. Era o
resultado pouco brilhante de uma política naval sempre entravada e sacrificada. Por conseguinte, antes de
1870 a esquadra alemã aumentou apenas por golpes. Como a Marinha Mercante era pouco desenvolvida
para poder incrementar a construção naval, acompanhando os novos processos, a Marinha de Guerra era
obrigada a recorrer quase sempre ao estrangeiro.
Decorreram assim longos anos antes que a Alemanha se convertesse em potência naval. Somente
quando várias circunstâncias favoráveis coexistiram surgiu a Marinha que iria disputar à Grã-Bretanha a
supremacia dos mares. A razão principal desse retardamento pode ser atribuída à posição geográfica do
país. Com efeito, o território alemão é quase todo fechado por terra e onde ele toca o mar este é dominado
por potências situadas mais favoravelmente. Em terra, a Alemanha dispunha sobre os seus vizinhos das
facilidades de milhares de comunicações interiores. No mar, os territórios das potências inimigas,
ocupavam posições estratégicas mais favoráveis, permitindo o controle dos acessos oceânicos aos portos
germânicos.
Dentro de uma estratégia nitidamente continental, a Prússia iniciou em meados do século XIX uma
série de guerras expansionistas, visando firmar-se como grande potência europeia. Nas guerras de 1864
(contra a Dinamarca) e 1866 (contra a Áustria), não houve encontro naval de qualquer espécie, e na guerra
franco-prussiana de 1870-71 houve apenas um combate no mar, entre dois pequenos navios.
Depois, porém, que a Alemanha constituiu um Império, em 1871, pela união dos vários Estados
germânicos, a necessidade de um poder naval capaz de defender os interesses alemães no ultramar tornou-
se patente.
O rápido desenvolvimento do comércio alemão sob o estímulo das indenizações francesas e tarifas
protetoras exigia novas fontes de matéria-prima e novos mercados. O maior incremento da população, por
outro lado, indicava a necessidade de lugar para a expansão germânica no ultramar. Por muitos anos a
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emigração de alemães da terra-pátria, em média cerca de dois mil por dia, dirigira-se em grande fluxo para
os Estados Unidos, para o Brasil, para a Argentina e outras regiões onde o Governo Imperial não tinha
controle. Parecia claro que colônias eram desejadas e mesmo necessárias. Em 1884, a Alemanha, sem
mover um navio ou disparar um canhão, achou-se possuidora de território na África, cuja área combinada
excedia a mais de quatro vezes a área do Império Germânico na Europa. Depois da Inglaterra, da França e
dos Estados Unidos, a Alemanha ocupava, enfim, posto eminente no comércio internacional, posição essa
que se consolidou com o passar dos anos.
Entre todas as potências mercantis foi a Alemanha a que relativamente acusou o mais grandioso
desenvolvimento até a Primeira Guerra Mundial.
A indústria metalúrgica, que já na primeira metade do século avançava com sucesso, no fim dos
oitocentos e no primeiro decênio do século XX, prosperou a passos gigantescos, graças à descoberta de
jazidas de minério de ferro no subsolo da Alemanha. Em 1871, a produção de ferro alemã não superava
1.563.000 toneladas e mantinha 23 mil operários, e em 1904, a produção passava a 10 milhões de toneladas
e ocupava 35 mil pessoas. A produção de aço aumentou da mesma maneira. Em 1912, ela era avaliada em
17 milhões de toneladas contra 1.100 mil em 1887.
Desse modo, se antes de 1880 a Alemanha ocupava o quarto lugar no comércio mundial, em 1914
ocupava o segundo. De 1898 a 1914 o comércio externo da Alemanha aumentou em 100%, dos quais três
quartos eram de comércio marítimo cuja escala era em Roterdã (Alemanha) e Antuérpia (Bélgica).
As cidades costeiras do mar do Norte e do Báltico beneficiaram-se amplamente do cuidado
incessante dado à Marinha e da expansão comercial alemã no ultramar. Hamburgo, na embocadura do Elba,
agigantou-se. Porto franco desde 1881, possuía em 1914, 1.087 navios que deslocavam 1.362.000
toneladas. Todo ano entravam e frequentavam seu porto mais de 30 mil navios. A importação subia a 12
milhões de toneladas, e a exportação a nove. Naturalmente as companhias marítimas de Hamburgo
cresceram em número e como entidade, de modo extraordinário. A partir de 1885, Bismarck começou a
autorizar fortes subvenções do Governo Imperial à Marinha Mercante germânica.
Em 1870, uma só companhia existia, a Hamburg Amerika Line; em 1914, depois de quarenta anos,
portanto, havia não menos de quarenta companhias orgulhosas. Só a Hamburg dispunha de um capital não
inferior a 125 milhões de marcos, sendo proprietária de 388 navios com uma tonelagem que, em 1910,
subia a 1.021.963 toneladas.
Nas vésperas da Primeira Guerra Mundial, a frota mercante alemã era a segunda do mundo. Ela
compreendia mais de quatro mil navios com mais de cinco milhões de toneladas. Oitenta mil marinheiros
guarneciam esta frota. A percentagem da Alemanha na frota mercante mundial, que era, em 1874-75,
somente 5,2%, elevou-se até o começo da guerra a 10,8%.
Estimulados pelo desenvolvimento da Marinha Mercante e
amparados por uma sólida indústria siderúrgica, os estaleiros alemães
proliferaram. Em 1870, havia no país apenas sete estaleiros. Esse
número elevou-se a 107 em 1912. Enquanto até o nono decênio do
século XIX os grandes navios transatlânticos só procediam da
Inglaterra, as conhecidas firmas de armadores de Hamburgo e Bremen
fizeram daí por diante suas encomendas aos estaleiros alemães,
estimulando-os com isso a desenvolverem uma capacidade de produção
cada vez mais elevada. Em poucos anos, converteram-se esses
estaleiros em empresas construtoras de primeira categoria, e a contínua
ampliação de suas explorações demonstrou o desenvolvimento
crescente dessa indústria.

Kaiser Guilherme II

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O aumento do comércio alemão depois de 1871 e o crescimento da Marinha Mercante mostraram a
necessidade de uma Marinha de Guerra. Essa necessidade foi posteriormente acentuada pelo
estabelecimento do Império Colonial. Contudo, somente quando o jovem Kaiser Guilherme II subiu ao
trono é que a construção de uma forte Marinha foi encarada. A impotência da Alemanha devido à falta de
Marinha foi amplamente demonstrada em 1896, quando o Kaiser foi incapaz de enfrentar o Presidente
Krueger, do Transvaal, com outro meio que não mais telegramas. Ainda mais efetivamente foi demonstrada
em 1889, quando começou a guerra Anglo-Bôer.
O Kaiser se enfurecia quando os navios mercantes alemães, carregados de armas e munições para os
Bôeres, eram detidos pelos cruzadores ingleses e condenados ao confisco por tribunais britânicos. Usando
a experiência sul-africana como um meio para inflamar a opinião pública alemã (que é altamente
inflamável), ele conseguiu as duas primeiras das quatro Ligas Navais sob as quais foi construída a grande
frota que custou ao povo alemão 200 milhões de libras. O zelo do Kaiser pela construção naval foi
posteriormente estimulado pela Guerra Hispano-Americana de 1898, na qual a influência decisiva do
poderio naval foi demonstrada conspicuamente. Depois de 1896, o Kaiser passou a contar com o concurso,
na pasta da Marinha, do Almirante Von Tirpitz, que foi a alma do desenvolvimento naval da Alemanha.
Ao raiar o século XX, a Alemanha reunia as condições fundamentais necessárias a uma potência
naval: comércio, atividade industrial, sentido militar, aptidão para a organização, amor ao trabalho, poderio
do Estado e patriotismo. Bem cedo os programas modestos das duas primeiras Ligas Navais foram
abandonados (1898 e 1900). O segundo ato naval acelerou e quase dobrou o programa de 1898, procurando
criar uma frota de combate com 34 encouraçados, 38 grandes cruzadores e 106 pequenos cruzadores. A
Inglaterra evidentemente não deixou de considerar o desenvolvimento da Marinha alemã e, sob o pulso
firme de Lord Fisher, ampliou, por seu turno, o programa de construção naval. As duas grandes potências
europeias iniciaram então uma corrida armamentista que durou até o início da Primeira Guerra Mundial.
Em agosto de 1914, a Alemanha tinha a segunda Marinha de Guerra do mundo. Sua esquadra
compunha-se de 13 encouraçados modernos, 30 encouraçados antiquados, 5 cruzadores de batalha, 60
cruzadores pesados, 12 cruzadores ligeiros, 152 contratorpedeiros, 45 torpedeiros e 40 submarinos. O
emprego dessa formidável força naval no conflito de 1914-18 presta-se até hoje a controvérsias. A Marinha
alemã bateu-se com denodo, e a alta qualidade de seus navios foi comprovada por mais de uma vez. Ela
não impediu, contudo, que a Marinha Mercante alemã abandonasse todos os mares, com exceção do Báltico.
A supressão do comércio germânico no além-mar teve consequências funestas para as armas do
Kaiser. Ao contrário da guerra de 1870, relativamente curta, o domínio das rotas oceânicas foi adquirindo,
com o correr dos meses, cada vez maior importância, uma vez perdido o elã inicial do avanço dos exércitos
alemães na França. Com a estabilização dos exércitos beligerantes na luta de trincheiras, a guerra assumiu
um aspecto de desgaste que tornava problemática a vitória da Alemanha, cortada das principais fontes de
suprimento do mundo. A guerra de corso começou a ser considerada, por certo círculos na Alemanha, como
o único recurso capaz de quebrar o esforço da guerra aliada. O submarino tinha-se revelado capaz de
ameaçar a vida econômica da Inglaterra malgrado a proteção de sua esquadra. A íntima dependência que a
Inglaterra se achava de sua Marinha Mercante permitia a esperança de ver o Estado insular tão
profundamente atingido que não pudesse prosseguir na luta. Quatro quintos dos víveres e das matérias-
primas que consumia, com exceção do carvão e da metade do minério de ferro, procediam do além-mar.
Levou muito tempo, porém, para felicidade dos aliados, antes que a Alemanha se empregasse a fundo na
guerra de corso submarina. Todo o esforço naval do país, antes da guerra, tinha sido consagrado a Forças
de Alto-Mar e relativamente pouca atenção se tinha dado à Força de Submarinos. Além do mais, havia os
problemas políticos, que eram os principais. A guerra submarina irrestrita fatalmente arrastaria para o
campo aliado outras potências.
No decorrer de 1915, a média mensal de afundamento de navios mercantes por submarinos foi de
120 mil toneladas. Antes de iniciada a guerra submarina, o comércio marítimo procedente da Inglaterra ou
a ela destinado não tinha sofrido apreciavelmente. O encarecimento do frete mantinha-se em limites
razoáveis, e o povo inglês, em suma, sofria pouco. Não havia carência, e o encarecimento da vida era
suportável. A guerra submarina, ao contrário, modificou sensivelmente as condições de vida na Inglaterra.
O frete se elevou notavelmente. De janeiro a maio de 1915, dobrou; em janeiro de 1916, era em média dez
vezes mais elevado que antes da guerra (janeiro de 1914). Os preços do comércio, grosso modo, seguiram
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a ascensão antes mesmo que as importações tivessem sofrido reduções bastantes para se falar em penúria
de mercadorias. No fim de 1916, a perda de tonelagem tornara-se já sensível. Era evidente que o problema
da guerra submarina se reduzia a uma questão de tonelagem. Os argumentos a favor da campanha submarina
irrestrita eram fortes em face dos resultados já alcançados com a campanha moderada empreendida até
então. No entender de von Tirpitz e von Scheer não se poderia atingir a Inglaterra senão no seu comércio
marítimo. O meio para se alcançar o objetivo era a guerra submarina sem restrições à qual a Inglaterra não
poderia sustentar por mais de seis a oito meses, considerando os recursos de que os aliados dispunham
então
Os estaleiros tinham estado bastante ativos em 1915 para fornecer um número de submarinos
satisfatório, mas tinha-se perdido um ano precioso. Durante o ano de 1916 a Inglaterra teve tempo para
tomar, metodicamente, as contramedidas. O resto do ano de 1916 se passou em discussões entre o Estado-
Maior Geral, a Marinha e o Governo do Império; o Chefe do Estado-Maior Geral procurando forçar o
Governo a empreender a guerra submarina sem restrições, enquanto tentava fazer o Comandante-Chefe
recomeçar a guerra comercial restrita.
A guerra submarina sem restrições começou enfim a 1º de fevereiro de 1917. Tratava-se de quebrar
a resistência da Inglaterra, destruindo seu comércio marítimo, malgrado a superioridade de sua esquadra.
Dois anos e meio de guerra se tinham passado sem ter sido iniciada essa tarefa, até que as autoridades
responsáveis se viram na obrigação de utilizar os meios de que dispunham para evitar o desastre ameaçador.
Começou então a fase crucial da guerra marítima, e todas as nações beligerantes compreenderam que o seu
resultado seria talvez mais importante ainda que a decisão da batalha do
Maine. Nunca potência alguma colocou tal empenho e tantos recursos em
cortar as vias marítimas da nação inimiga como fez a Alemanha em
relação à Inglaterra em 1917 e 1918. Esforço semelhante só viria a ser
empreendido em idênticas circunstâncias na Segunda Guerra Mundial.

Nenhuma campanha mobilizou tantos recursos no mundo todo


quanto essa primeira Batalha do Atlântico. Enquanto a guerra de corso,
realizada pelos franceses nos conflitos dos séculos XVII, XVIII e XIX,
não chegou a impedir o crescimento da Marinha Mercante inglesa, a
campanha submarina irrestrita em poucos meses causou uma diminuição
sensível na tonelagem mundial.
O número de submarinos cresceu sempre mesmo com as
contramedidas aliadas. No começo do ano de 1915, o número de unidades
consagradas à guerra no comércio era de 24. A tonelagem afundada
durante o ano de 1915 não atingiu o número de seis semanas de guerra
sem restrições. Em 1916, o número de submarinos foi acrescido para 87
entre os vários tipos, mais 14 estavam em experiência e 151 em
construção. Trinta e cinco submarinos não haviam regressado às bases
desde o início das hostilidades. No primeiro dia de guerra submarina sem restrições havia já no mar do
Norte 57 submarinos, no Báltico, oito, em Flandres, 38, e as bases do Mediterrâneo dispunham de 31.
A tonelagem afundada aumentou brutalmente, atingindo a mais de um milhão de toneladas nos meses
de abril a junho de 1917, fato não registrado em nenhum mês na Segunda Guerra Mundial.
As potências aliadas tomaram uma série de contramedidas eficazes não só organizando comboios de
navios mercantes fortemente escoltados como também aperfeiçoando a técnica do combate ao submarino
e realizando, em todos os países possíveis, principalmente nos Estados Unidos, um programa de construção
naval em massa capaz de compensar as perdas experimentadas. Tais medidas lograram sucesso, e os
submarinos alemães pagaram pesado tributo. Durante a guerra foram utilizados ao todo 360 submarinos;
184 não regressaram.
O sucesso da campanha submarina achava-se comprometido. Os alemães procuraram reunir todos
os seus recursos industriais para aumentar a produção de submarinos. Cento e vinte haviam sido
encomendados em dezembro de 1917 e mais duzentos e vinte em janeiro de 1918, mas destes, até setembro
de 1918, apenas 74 haviam sido entregues.
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Enquanto isso a poderosa frota alemã realizara poucas saídas depois da batalha de Jutlândia em maio
de 1916 (de 31/05 à 01/06/1916, indecisa apesar do vulto). Os navios parados nas bases, em contato com
as forças desmoralizantes que grassavam na retaguarda, acabaram contaminados, e já em 1917 os primeiros
indícios de indisciplina surgiram nos encouraçados.
Ante a ameaça do colapso na Frente Ocidental, o Alto Comando Alemão decidiu realizar uma
surtida desesperada com toda a esquadra, mas a 29 de outubro de 1918, ao ser conhecida a ordem,
explodiram desordens em vários navios, sobretudo nos encouraçados. A surtida teve que ser suspensa.
Com o fim da guerra, a frota alemã foi enviada para Scapa Flow onde se auto afundou ao se difundir
a suspeita de que os navios seriam entregues aos vencedores. Em águas inglesas, foram dessa forma
afundados 19 encouraçados, 5 cruzadores de batalha, 16 cruzadores, 92 contratorpedeiros, 50 torpedeiros e
152 submarinos.
Sem frota de guerra e com a Marinha Mercante reduzida a 600 mil toneladas, assim terminou a
primeira fase da expansão alemã nos mares.
Embora derrotada de forma esmagadora e malgrado as dificuldades sem conta surgidas em
consequência do conflito, revolução, inflação, indenização etc., a estrutura sólida da economia alemã
permitiu uma rápida volta do país às transações comerciais. O renascimento do comércio acarretou,
logicamente, o incremento da Marinha Mercante. Em 1923, só a Companhia Norddenstcher Lloyd tinha já
em construção 28 novos navios com 232 mil toneladas, e 34 grandes transatlânticos de outras companhias
estavam sendo construídos numa série de estaleiros. A Marinha de Guerra, porém, não pôde acompanhar o
crescimento da frota de comércio em virtude de cláusulas do Tratado de Versailles e permaneceu reduzida
até o advento do nazismo.

No começo da terceira década do


século, a Alemanha já era novamente uma das
três importantes nações comerciais do mundo.
Sua Marinha Mercante ultrapassava cinco
milhões de toneladas. Com a subida dos nazistas
ao poder, a Alemanha iniciou febrilmente seus
preparativos para a guerra. Todavia Hitler e seus
auxiliares imediatos não encararam o aspecto
naval do futuro conflito com grande zelo. Faltou
à Alemanha a firme vontade de um Von Tirpitz,
bem como a megalomania de Guilherme II. Em
confronto com o rápido desenvolvimento do
Exército e da Força Aérea, a Marinha germânica
A única tentativa de construção de um porta-aviões alemão:
o KMS Grafe Zeppelin. Sua construção foi iniciada em 1938, aumentou pouco. Também não foi considerada
mas nunca foi concluído devido às rixas de Goering e Raeder. no começo pelo Alto-Comando a eventualidade
de uma guerra contra a Inglaterra.
O Almirante Raeder, contudo, não aceitou esses pontos de vista e, apontando a Von Blomberg a
expansão da Marinha francesa, conseguiu maiores verbas. Com esses fundos ele iniciou os fundamentos de
uma pequena e equilibrada esquadra.
O Tratado de Londres, assinado em 1935, permitiu à Alemanha possuir uma esquadra equivalente
a trinta e cinco por cento da frota de superfície inglesa, e acordos posteriores estipularam que a força de
submarinos germânicos poderia ser igual à britânica. A Alemanha podia construir, pelos tratados, cinco
navios de linha, dois porta-aviões, vinte e um cruzadores e sessenta e quatro destróieres. Na verdade, porém,
tudo o que possuíam por ocasião do começo da guerra eram 2 encouraçados, 11 cruzadores e 25 destróieres.
Cinquenta e sete submarinos estavam já construídos quando a guerra começou.
Em 1937, Hitler alterou os planos da expansão alemã, tornando a guerra com a Inglaterra quase uma
certeza. Para a Marinha alemã tornou-se preciso uma revisão dos planos estabelecidos noutras hipóteses.
Era necessário tempo, e Hitler prometeu que não haveria guerra contra a Inglaterra até 1944 ou 1945. Foi
elaborado, então, com base nessa hipótese, um plano para aumentar o poderio naval tanto quanto possível.
Esse plano, conhecido como Plano Z, foi baseado na capacidade total dos estaleiros alemães e no tipo de
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guerra a ser engajada. A concepção do Almirante Raeder da guerra naval contra a Inglaterra visava evitar
grandes ações e concentrar os ataques contra a Marinha Mercante.
Submarinos e rápidos e poderosos navios de superfície, operando independentemente ou com porta-
aviões, eram encarados como os melhores meios de levar adiante essa linha de ação. O desenvolvimento
da Aviação Naval, também cogitado, foi fortemente combatido por Goering.
Na primavera de 1939, a anexação da Tchecoslováquia e as ordens preliminares para a invasão da
Polônia tornaram claras a Raeder e ao Estado-Maior da Armada que a guerra com a Inglaterra teria lugar
muito antes do previsto. Raeder mostrou a Hitler a falta de preparo naval da Alemanha, mas a invasão da
Polônia não foi adiada, deflagrando o conflito.
No mesmo dia da declaração de guerra foi afundado o primeiro navio mercante inglês, dando início
à campanha que, conhecida como batalha do Atlântico, tornou-se a maior, mais importante e mais monótona
batalha da guerra. Em essência, foi ela uma luta entre a Alemanha e os Aliados, visando cada qual
estrangular a linha de suprimento do inimigo. Começada no dia da abertura das hostilidades ela durou até
dois dias antes do armistício, cinco anos e oito meses mais tarde, mas antes de chegar ao fim, 4.783 navios
mercantes com mais de 21 milhões de toneladas e 635 submarinos foram afundados.
Em linhas gerais, a guerra no Atlântico foi repetição da
do Primeiro Conflito Mundial. Em poucos dias, a bandeira de
comércio germânica desapareceu dos mares exceto no Báltico.
A frota de superfície alemã empreendeu algumas investidas
sem grandes resultados, a não ser na Campanha da Noruega,
onde, à custa de pesadas perdas, atingiu plenamente seu
objetivo. Pouco a pouco os navios de superfície alemães
deixaram de constituir preocupação séria, e o submarino
cresceu cada vez mais em importância.
A orientação seguida pelos dirigentes alemães na guerra
naval também foi a repetição da política obedecida pelo
Governo do Kaiser na Primeira Guerra Mundial. No começo, Produção nos EUA de navios para
durante mais de um ano, confiança ilimitada nos resultados das os aliados durante a 2ª GM
fulminantes campanhas terrestres. Com o prolongamento da
guerra, maior atenção à guerra naval, e, por fim, concentração angustiosa dos recursos disponíveis no ataque
às comunicações aliadas, visando a uma decisão já impossível.
Nos oito primeiros meses da guerra, a Alemanha, dispondo de menos de sessenta submarinos, não
causou grandes danos à navegação aliada. As perdas sofridas foram compensadas pelas novas construções
e pelos navios do Eixo capturados.
Depois da queda da França e com a entrada em serviço de um número crescente de submarinos, a
devastação das frotas mercantes atingiu ritmo alarmante. Em maio de 1942 havia, operando nos oceanos,
124 submarinos alemães e mais 114 estavam em experiência no Báltico. No decorrer de 1942, o pior ano
da batalha do Atlântico, foram afundados 1.570 navios mercantes com quase oito milhões de toneladas. A
Alemanha estava vencendo a batalha, tendo perdido, até agosto de 1942, 105 submarinos, ou seja, uma
perda mensal de 4,9% das unidades em operação. Todavia, em fevereiro de 1943, foram afundados 19 U-
Boats, em março, 15 e em abril, 16. Essas perdas já eram elevadas, mas, em maio, uma série de ataques
aeronavais no golfo de Gasconha afundou 37 submarinos, ou seja, aproximadamente 30% de todos os
submarinos no mar.
A batalha do Atlântico assumiu aspecto mais animador para os aliados que no decorrer desse ano de
1943 perderam menos da metade dos navios afundados no ano anterior. A Alemanha procurou elevar a
produção de submarinos de 30 para 40 por mês com sacrifício da produção numa série de setores
importantes. O número de submarinos em operação cresceu sempre, mas as escoltas aliadas eram cada vez
mais eficientes.
Em dezembro de 1943, a frota submarina consistia em 419 unidades, das quais 161 para operações,
168 em experiência e 90 usadas para treinamento.
Em junho de 1944, havia 181 U-Boats em atividade, número que caiu para 140 em dezembro, em
virtude de perdas no mar e dos bombardeios aéreos dos estaleiros.
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Entretanto, a produção de submarinos fez uma recuperação espetacular apesar de todas as
dificuldades, e, em fevereiro de 1945, Doenitz informou a Hitler que 237 U-Boats estavam sendo
preparados. O total de 450 submarinos em comissão foi o máximo que a Alemanha possuiu, mas esse
máximo, coincidiu justamente com um dos mínimos na destruição de navios aliados. Na última ofensiva
submarina, em abril de 1945, 57 submarinos foram destruídos, 33 no mar e 24 nos portos, por bombardeio
aéreo, ao passo que apenas 13 navios mercantes aliados foram afundados.
A frota de superfície alemã durante todo o conflito viu o número de seus navios diminuir. Uma a
uma as principais unidades foram sendo destruídas: primeiro o Graf Spee, ainda em 1939, depois a
campanha da Noruega desfalcou a esquadra de vários cruzadores e de mais de uma dezena de
contratorpedeiros. Em 1941, o Bismarck foi afundado; em 1943 o Schanhorst, em 1944 o von Tirpitz. No
final da guerra, os bombardeios aéreos afundaram ou danificaram outros navios mais. As perdas não foram
substituídas, em virtude de a Alemanha ter consagrado aos navios de superfície baixa prioridade no esforço
de guerra, depois de 1942. Dessa forma, a construção do navio-aeródromo Graf Zepelim foi suspensa, e
depois do fracasso de um ataque de cruzadores germânicos a um comboio inglês escoltado por
contratorpedeiros por ordem de Hitler, não se cogitou mais da construção de navios de superfície de porte
alentado. Hitler chegou mesmo, na sua ira, a determinar a retirada dos canhões de grosso calibre dos navios
maiores, para utilizá-los como artilharia de campanha.
No final da guerra, os marinheiros dos navios de superfície alemães foram reunidos em divisões
especiais e marcharam para lutar nas trincheiras em defesa do solo ameaçado, tal como os franceses haviam
feito em 1870, e os russos em 1854.
Ao terminar a guerra, 156 submarinos germânicos renderam-se aos aliados e 221 foram destruídos
pelas próprias guarnições. Os poucos navios da Marinha de Guerra alemã, encontrados nos portos
ocupados, foram distribuídos pelas nações vencedoras. Da Marinha Mercante também restava pouca coisa.
Assim, pela segunda vez, em menos de trinta anos, a Alemanha perdeu a expressão como país
marítimo; como depois da Primeira Guerra Mundial, a vitalidade da economia germânica iria permitir em
poucos anos o renascimento da Marinha Mercante.
Na Guerra Fria iniciada em 1949 são criadas a República Federal da Alemanha (RFA, ou Alemanha
Ocidental), capitalista, e a República Democrática Alemã (RDA, ou Alemanha Oriental), socialista. No
governo do primeiro-ministro Konrad Adenauer (de 1949 a 1963), da União Democrata-Cristã (CDU), a
RFA vive uma fase de prosperidade, estimulada pelo Plano Marshall, projeto de reconstrução da Europa
capitalista, comandado pelos EUA.
As duas repúblicas alemãs tornam-se o centro do conflito entre EUA e URSS durante a Guerra Fria.
Em 1948, os soviéticos ordenam o bloqueio de Berlim, que é rompido por uma gigantesca ponte aérea dos
EUA. Em 1955, a Alemanha Ocidental ingressa na Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), a
aliança militar ocidental. A Alemanha Oriental reage e adere, no mesmo ano, ao Pacto de Varsóvia, bloco
militar liderado pela URSS. Em 1961, autoridades orientais constroem o Muro de Berlim, com a finalidade
de deter o fluxo de refugiados para o Ocidente. A aproximação entre as duas Alemanhas inicia-se no fim
dos anos 1960. Em 1973, RDA e RFA entram na Organização das Nações Unidas (ONU) como dois Estados
soberanos.
A queda do Muro de Berlim: o dirigente alemão oriental Erich Honecker, no poder desde 1971,
resiste à liberalização no bloco comunista, deflagrada em meados da década de 1980, pela URSS. Em 1989,
milhares de alemães orientais fogem para a Alemanha Ocidental pela Hungria e pela Áustria. Em outubro,
manifestações pró-democracia levam à substituição do linha-dura Honecker por Egon Krenz. No mês
seguinte, sob pressão, Krenz ordena a abertura do Muro de Berlim, que logo é derrubado pela população.
O episódio dá início ao processo de reunificação.
Na primeira eleição livre da RDA, em 1990, vence a Aliança pela Alemanha, pró-unificação.
Impulsionada pelo chanceler da RFA, Helmut Kohl (da CDU), realiza-se a união monetária (julho) e
política (outubro). O novo Parlamento confirma Kohl no cargo de chanceler.
Alemanha reunificada: o país paga um preço alto pela reunificação, com aumento do desemprego.
Num clima social tenso, imigrantes sofrem atentados de grupos neonazistas. O governo impõe, em 1996,
um programa de austeridade, com corte de benefícios previdenciários. A vitória do Partido Socialdemocrata
(SPD) nas eleições de 1998 representa a maior derrota eleitoral da CDU no pós-guerra. Como não obtém
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maioria parlamentar, o SPD coliga-se com o Partido Verde e elege chanceler o líder socialdemocrata
Gerhard Schröder. Um dos compromissos da coalizão é fechar as usinas nucleares alemãs até 2021.
Fatos recentes: como consequência dos atentados de 11 de setembro de 2001 nos EUA, o Parlamento
alemão aprovou em novembro a participação do país na intervenção militar no Afeganistão. As
investigações revelam que os atentados foram planejados na Alemanha, na chamada célula de Hamburgo.
Em dezembro, o Parlamento aprova um pacote de medidas antiterrorismo. Suspeitos são presos, grupos
radicais islâmicos banidos e dezenas de milhões de euros são confiscados de contas suspeitas de financiar
o terror.
Imigração: nas últimas décadas, a Alemanha atrai milhares de imigrantes, o que alimenta um
crescente sentimento xenofóbico. Ao mesmo tempo, a estagnação demográfica – marcada por baixas taxas
de natalidade e o envelhecimento da população – torna o país dependente de mão-de-obra estrangeira.
Depois de intensos debates, em março de 2002 o Parlamento aprova uma lei de imigração que favorece a
entrada no país de estrangeiros altamente qualificados e impõe ações mais rigorosas contra a imigração
ilegal. O projeto é criticado pela oposição, que teme o aumento da xenofobia. Oficialmente, mais de 7
milhões de estrangeiros, na maioria turcos, vivem em solo alemão, mas estima-se que haja mais 1,5 milhão
de ilegais. Os atentados de extremistas de direita contra imigrantes aumentam a cada ano.
A vitalidade do povo alemão novamente demonstrou ao mundo sua capacidade de superação e a
economia alemã é uma das mais fortes na atualidade, mesmo frente às diversas crises políticas e econômicas
que têm colocado a União Europeia em cheque.

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7) Japão:
Até a restauração Meiji (1868), o Japão era quase unicamente
um país agrícola. A terra japonesa é, entretanto, muito estéril, havendo
pouco espaço para o desenvolvimento progressivo das lavouras, pois a
natureza montanhosa das ilhas e as rígidas temperaturas na grande ilha
nórdica de Yeso impedem a expansão agrícola. Assim sendo, as terras
disponíveis no Japão nas quais se pode colher com aproveitamento
oscilam apenas entre 15 a 20%. Em grande parte, as terras aproveitáveis
destinam-se às culturas do arroz e da cevada que, com a pesca
abundante nos mares circunvizinhos, constituem a base da alimentação
japonesa.
A restauração Meiji marcou uma mudança de época, transformando completamente o Japão numa
moderna nação industrial. A restauração teve lugar cerca de um século após a revolução industrial inglesa.
A visita dos navios negros conduzidos pelo Comodoro Perry à Uraga levantou a nação japonesa do estado
sonolento que havia durado mais de dois séculos devido à reclusão do mundo exterior. A abolição dos clãs
governamentais e a completa mudança de todas as instituições políticas, sociais e econômicas introduziram
o Japão no período de industrialização capitalista. Durante dez anos, porém, a agitação interna provocada
pelo novo estado de coisas impediu o progresso do país.
Com o término da Rebelião Saigo em 1877, várias indústrias surgiram em rápida sucessão, e pouco
a pouco o comércio exterior se desenvolveu.
A navegação japonesa era então quase inteiramente costeira, e o comércio exterior era feito em
porões estrangeiros. Entretanto, com o correr dos anos, o desenvolvimento do intercâmbio comercial com
as outras nações conduziram à fundação de várias companhias de navegação, todas elas amparadas pelo
Governo.
Querendo ampliar cada vez mais o campo das
atividades nacionais, o Japão adotou uma política de
linhas imperialistas, cuja finalidade principal era a
conquista de novos mercados consumidores e fontes
de matérias-primas. Em consequência, o Governo
japonês procurou desde cedo criar uma Marinha de
Guerra capaz de atender à sua política exterior.
A primeira manifestação concreta do
imperialismo japonês foi a inesperada agressão à
China em 1894 (Primeira Guerra Sino-Japonesa,
1894-95). A recém-criada Marinha logo alcançou o
domínio absoluto do mar Amarelo, com a vitória de
Yalu, abrindo caminho às forças terrestres que não
tiveram grande dificuldade em derrotar o Exército
chinês. O efeito dessa guerra vitoriosa nos negócios
foi extraordinário. A guerra não só chamou a atenção
do mundo para o Japão, como estimulou seu
comércio exterior. Além do mais, o Japão recebeu
uma indenização da China de 400 milhões de taels
para não mencionar a aquisição de Formosa e a
hegemonia na Coréia. Acima de tudo, a guerra deu
confiança ao país na própria força e capacidade. O encouraçado Matsushima, construído pela
França e montado no Japão, carro-chefe da
Marinha Imperial Japonesa durante o conflito sino-
japonês.

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Não é, pois, de estranhar que o comércio e os meios industriais, inativos por muitos anos, de súbito
entrassem em período de grande animação e desenvolvimento. A vitalidade da nação, adormecida nos anos
de depressões, surgiu com energia durante a guerra e depois de seu término transladou-se para o comércio
e para os empreendimentos industriais. O comércio exterior recebeu impulso considerável, e o seu
desenvolvimento continuou nos anos seguintes.
A lei de apoio à navegação, promulgada em 1896, acelerou o crescimento da navegação ultramarina
pelas Companhias Japonesas. Até 1887, cerca de 87% das exportações japonesas e 88% das importações
eram feitas em navios estrangeiros. Em 1901, as exportações em navios mercantes estrangeiros eram de
apenas 48%. A partir dessa época, a posição da navegação na economia nacional do Japão tornou-se muito
importante, ocupando lugar de destaque, na balança internacional de pagamentos do país.
Com interesses no ultramar acrescidos e não
pretendendo abandonar as linhas-mestras de sua
política imperialista, o Japão não se deteve, após a
guerra contra a China, na ampliação de sua frota de
guerra. Em 1895, foi estabelecido e aprovado pelo
Parlamento um programa naval com uma despesa
global de 95 milhões de iens para a construção de
navios e o equipamento dos portos. No ano seguinte,
desde que se soube da intenção da Rússia de
concentrar uma frota poderosa no oceano Pacífico,
um programa suplementar foi estabelecido o qual Base Naval de Porto Arthur após o ataque japonês

subia a 118 milhões de iens.


O parlamento sancionou sem explicações esse esforço que impunha um fardo extremamente pesado
a todo o povo japonês. A maior parte dos navios foi encomendada no estrangeiro, principalmente na
Inglaterra, pois o estado da indústria de construção naval no Japão, que apenas nascia, não permitia contar
com a execução rápida e perfeita demanda.
Percebendo que os interesses antagônicos russo-japoneses só tenderiam a aumentar com o tempo, o
Governo japonês, assim que se sentiu forte no mar e em terra, determinou o ataque, sem declaração de
guerra, à esquadra tzarista fundeada em Porto Arthur.
Os japoneses assumiram vigorosamente a ofensiva em terra e no mar, desde o início das
hostilidades, não dando oportunidade aos russos para se recobrarem dos golpes iniciais ou concentrarem
recursos.
Bem treinados e bem comandados, os nipônicos pouco a pouco cercaram de perto a Base Naval de
Porto Arthur, por terra e mar. As diversas tentativas russas para romper o cerco fracassaram. Depois de
uma prolongada resistência, a praça se rendeu em janeiro de 1905. Já então a esquadra russa no Pacífico
praticamente deixara de existir. Os combates e as minas tinham destruído um grande número de navios. As
unidades restantes foram sabotadas em Porto Arthur quando a queda da Base se tornou certa.
Num esforço supremo, a Rússia reuniu os navios das esquadras
do mar Báltico e do mar Negro e os enviou, sob o comando do
Almirante Rodjestvensky, para o Extremo Oriente. Essa força naval,
heterogênea e desorganizada, empreendeu uma longa e exaustiva
viagem do norte da Europa aos mares do Japão, contornando o sul da
África. A esquadra russa sofreu esmagadora derrota no estreito de
Tsushima, onde o Almirante Togo a interceptou com seus navios
mais rápidos, mais bem comandados. Apenas três navios russos
conseguiram escapar à destruição e ao cativeiro e atingir
Vladivostok. Com essa vitória naval, o Japão se colocou entre as
grandes potências mundiais. A vitória deu nova vida aos negócios, e
em 1906 o povo tomou-se de febre por novos empreendimentos.
O comércio de exportação mostrou um incremento notável. As
indústrias expandiram-se em ritmo mais acelerado ainda. Em 1892, o número de operários nas fábricas era
de aproximadamente 300 mil. Em 1897, já eram 440 mil e, em 1911, setecentos e noventa mil. De todas as
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indústrias as que mais se desenvolveram foram a de construções navais e as relacionadas com as atividades
marítimas para fins pacíficos ou não. Desde a guerra russo-japonesa, quando constituíra e armara a maior
parte de sua esquadra em estaleiros estrangeiros, o Japão procurou desenvolver as próprias construções
navais de maneira a não depender de ninguém no futuro.
Esse objetivo foi alcançado completamente, e em breve o Japão conseguiu não somente utilizar os
próprios aços, pólvoras, carvão e víveres, mas também as próprias produções técnicas para o Exército e
para a Marinha. Daí por diante o progresso não cessou, e já na Primeira Grande Guerra a maioria dos navios
japoneses era de construção nacional. Osaka, Kioto, Yokoama, Nagasaki, Kobe, Wakudate transformaram-
se em centros marítimos e industriais de importância mundial. A capacidade anual dos estaleiros japoneses
já então ultrapassava 600 mil toneladas, facilitando o rápido desenvolvimento da Marinha Mercante que de
528 navios com 330 mil toneladas em 1895 alcançou 1.390 unidades em 1905 com 930 mil toneladas, para
atingir em 1929 mais de quatro bilhões de toneladas.
Da segunda década do século XX até a Segunda Guerra Mundial, o Japão teve a terceira Marinha
Mercante do mundo, só sendo ultrapassada pela Inglaterra e pelos Estados Unidos. De todos os
empreendimentos levados a cabo no país desde a restauração Meiji, nenhum tivera maior sucesso, embora
o progresso noutros setores também fosse notável, bastando notar que o número-índice de produção geral
do Japão foi 475 em 1931, tomando como base 100, em 1905, ao término da guerra russo-japonesa com o
número de fábricas aumentando de 32.390, em 1909, para 67.318 em 1932.
Outro setor de atividade em que o povo japonês se distinguiu foi na pesca marítima. A linha da costa
nipônica é irregular e daí ser longa em comparação com a área das ilhas. As ilhas também são cercadas em
alguns lugares por correntes marítimas quentes e noutros por correntes frias o que favorece, sobremodo, o
aparecimento de espécies diversas. A posição natural e as proximidades dos centros de consumo fizeram,
naturalmente, a pesca se desenvolver desde a Antiguidade. Antes, porém, de se ocidentalizar, a pesca no
Japão era, sobretudo, costeira, enquanto mais recentemente a esfera de atividade de pesca dos japoneses é
muito grande, ocupando um terço das áreas de pesca do mundo. Ela cobre o estreito de Behring, a Austrália,
a Nova Zelândia e o oceano índico.
Premido pela pobreza do solo e pelo aumento da população a buscar no mar os recursos
indispensáveis à vida, nenhum povo retira das águas tantas riquezas quanto o japonês. A pesca fornece mais
de cinco milhões de toneladas de peixe, anualmente. A pesca em águas russas foi um importante direito
concedido ao Japão pelo Tratado de Portmouth, que pôs fim à guerra de 1904/05, o que revela a
preocupação constante do Governo nesse particular. Ainda é do mar que os japoneses retiram algas
utilizadas na alimentação do povo e uma série de outras riquezas para a exportação, Outrossim, a
participação de produtos marítimos na exportação japonesa é realmente notável, oscilando em torno de 10%
do total.
Por conseguinte, tanto para a subsistência do povo como para manter sua atividade econômica, o
Japão dependia do mar e de fontes de matéria-prima externas. A gigantesca industrialização do país e o
aumento da população tornaram cada vez maior a dependência do exterior. Em relação a carvão, cobre,
depósito de ferro sulfuroso, enxofre, o Japão era autossuficiente, mas os depósitos eram inadequados. Por
essa razão, o Japão procurou ansiosamente fontes permanentes de
suprimento.
A China, a Rússia, as Índias Orientais Holandesas e os
Estados Unidos forneciam ao Japão a maior parte das matérias-
primas que faltavam, mas todas essas nações ou eram possíveis
inimigas, ou controladas por potências rivais.
Prosseguindo na sua política imperialista, o Japão invadiu
a Manchúria em 1931 de onde passou a extrair ferro e carvão. Em
1937 atacou a China, ocupando as regiões mais ricas daquele pais.
Em 1940, depois da queda da França, ocupou a Indochina e, por
fim, aproveitando as dificuldades das potências anglo-saxônicas
na Europa, lançou as vistas para as Índias Orientais Holandesas,
ricas em petróleo, borracha e muitas outras matérias-primas.

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A Holanda, a Inglaterra e os Estados Unidos evidentemente não estavam inclinados a cederem as
ricas áreas da Indonésia, e o Japão decidiu pela guerra.
Os japoneses tinham, no começo, a intenção de fazer uma guerra relâmpago. O plano fundamental
consistia em avançar rapidamente para o sul, a fim de se apoderarem das regiões onde se encontravam os
recursos cuja importância estratégica era vital.
Eles contavam estabelecer, em seguida, um perímetro em defesa, a leste e a oeste, ao abrigo do qual
esses recursos poderiam ser explorados. Esperavam organizar assim uma defesa escalonada em
profundidade, cuja ruptura se poderia mostrar tão difícil que os Estados Unidos seriam susceptíveis de
cessar a guerra e procurar uma paz de compromisso.
A condição fundamental para o sucesso desse plano era a
realização de uma batalha decisiva com a esquadra americana no início
das hostilidades, a fim de destruí-la antes que o imenso poderio
industrial da América se fizesse sentir no teatro de guerra. Para levar a
cabo o plano, o Japão dispunha da terceira Marinha de Guerra do mundo
a qual, entre as duas guerras, fora notavelmente desenvolvida com
pesados sacrifícios para o povo.
A primeira parte do plano foi executada ultrapassando as
previsões mais otimistas. As Filipinas, as Índias Orientais Holandesas
e a Malásia, com a Base Naval de Singapura, caíram antes das datas
previstas. A Marinha japonesa expulsou ou destruiu em sanguinolentos USS Nevada após o bombardeio
em Pearl Harbour
encontros as forças navais holandesas, americanas e inglesas.
A segunda parte do plano foi cumprida apenas em parte. A Marinha americana sofrera um rude
golpe em Pearl Harbour, mas impunha-se outro encontro para reduzi-la à impotência. A batalha do mar de
Coral não trouxe, também, a decisão almejada.
Essa esperança desvaneceu-se em junho de 1942, em Midway, Alasca (EUA)
em consequência de uma operação imaginada pelo Almirante
Yamamoto para criar a ocasião almejada para a batalha. No decorrer da
operação, os japoneses perderam quatro de seus melhores navios-
aeródromo e com eles a melhor oportunidade que tiveram de conseguir
a batalha final.
O que Midway começara foi terminado pela Campanha das ilhas
Salomão que, de agosto de 1942 até fins de 1943, causou desgaste
considerável à Marinha japonesa. Tolhida pelo número de seus navios
e tendo falta de pilotos treinados, a força de navios aeródromos
japoneses se encontrou reduzida à impotência. A ideia de apoiar a
defesa do perímetro, pela Marinha, foi abandonada no fim de 1943, e
quando os americanos desembarcaram nas Marshall, a esquadra deixou
Truk pelas Carolinas Ocidentais, abandonando à sua sorte as guarnições Japão
avançadas. Cada vez mais inferiorizado face à Marinha americana em
meios de superfície e aéreos, o Japão perdeu a iniciativa no Pacífico.
Além da perda de poderio ofensivo de sua esquadra, dois outros graves problemas pesavam na
estratégia marítima japonesa. Em primeiro lugar, era preciso proteger seu tráfego marítimo, sangue do
Império. Fato estranho: os japoneses negligenciaram completamente a ameaça submarina a despeito dos
sucessos alcançados pela Alemanha no decorrer das duas guerras mundiais, erro tanto mais grave em
virtude de o Japão não poder construir navios senão em número limitado. As consequências dessa falta
capital foram agravadas pelas perdas em contratorpedeiros e outros navios de escolta no decorrer da longa
campanha das Salomão, o que colocou o Comando Naval na impossibilidade de proteger eficazmente a
Marinha Mercante. O acréscimo súbito da destruição ocasionada pelos submarinos, no fim de 1943,
prometia levar ao desastre uma nação cuja capacidade de continuar a guerra repousava unicamente no
intercâmbio marítimo.
Enfim, os japoneses foram terrivelmente prejudicados pela falta de combustível, falta essa que
aumentou consideravelmente suas dificuldades militares. Eles tinham entrado na guerra com uma
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tonelagem completamente insuficiente de petroleiros, e os sucessos logrados pelos submarinos americanos
agravaram rapidamente a situação. Se o Japão pôde conquistar no primeiro arranco as regiões mais ricas
em petróleo do mundo, não resolveu jamais o problema dos transportes e dos suprimentos de combustível
líquido, elemento essencial à guerra moderna. Os estoques disponíveis não cessaram de diminuir até o fim
do conflito.
Entretanto, a despeito de todas as dificuldades, a ameaça criada pela invasão de Saipan obrigou o
Japão a arriscar a esquadra. A aviação dos navios-aeródromo estava mais ou menos reconstituída e treinada.
Reinava um grande otimismo a respeito do resultado que ela poderia obter. Na batalha do mar das Filipinas,
a 19 e 20 de junho de 1944, os japoneses registraram, entretanto, a perda de três navios-aeródromo (dos
quais dois foram afundados por submarinos que furaram a barreira insuficiente dos contratorpedeiros), mais
outro navio-aeródromo foi avariado, e a aviação embarcada foi quase totalmente destruída.
Pelo meio do verão de 1944, o Japão se encontrava em grande perigo. Enfraquecido intensamente
pelas perdas experimentadas em certas categorias de armas, cambaleando sob os golpes sucessivos e
incessantes dos americanos, os japoneses não tinham realizado o desejo de travar uma batalha naval
decisiva. A destruição de navios de comércio realizada pelos submarinos e pelos aviões dos navios-
aeródromo paralisava cada vez mais eficazmente a economia de guerra, e os laços que ligavam a metrópole
às regiões do Sul, onde encontravam os recursos indispensáveis, afrouxavam dia a dia.
Em outubro de 1944, ante o desembarque americano nas Filipinas, que ameaçava cortar
definitivamente as comunicações marítimas da metrópole com as fontes de matéria-prima do Sul, o Japão
lançou todos os navios e aviões remanescentes de sua Marinha em busca de uma batalha decisiva. De 21 a
26 de outubro, feriu-se a grande batalha do Golfo de Leste que praticamente pôs fim à Marinha do Micado
como força combativa. Em cinco dias o Japão perdeu quatro navios-aeródromo, três encouraçados, seis
cruzadores pesados, quatro cruzadores ligeiros e onze contratorpedeiros. Muitos outros navios foram
gravemente avariados. A derrota causou uma confusão e uma desorganização que tornaram os navios
remanescentes presas fáceis para as aeronaves dos porta-aviões americanos, para os submarinos e navios
ligeiros. No fim de janeiro novas perdas haviam custado ao Japão um encouraçado, dois grandes navios-
aeródromo, um navio-aeródromo de escolta, três cruzadores e vinte e um contratorpedeiros.
Ao todo, no decorrer da guerra, a Marinha Imperial japonesa perdeu 328 navios dos 489 que
estiveram em serviço. Quanto à Marinha Mercante, perdeu 4.780.000 toneladas de navios, a maior parte
dos quais, 63%, afundados pelos submarinos americanos. Restava apenas pouco mais de 1 milhão de
toneladas de navios mercantes, em agosto de 1945. Os vinte e dois estaleiros existentes no Japão não
conseguiram construir mais do que um milhão de toneladas por ano, o que não bastou para compensar as
perdas.
No final da guerra, o Japão tinha seus exércitos
praticamente intactos e ainda uma grande Força Aérea,
mas a Marinha de Guerra, a Frota Mercante e as áreas
industriais estavam devastadas. Sem Marinha para
proteger as linhas de suprimentos, sem navios para
carregar as matérias-primas e sem fábricas para efetivar a
transformação desse material em equipamento, a nação
japonesa era incapaz de continuar a luta. Seria erro supor
que a sorte do Japão foi determinada pela bomba atômica.
Sua derrota era coisa certa antes mesmo que tivesse caído
a primeira bomba e foi provocada pelo esmagador poderio
naval. Somente isso é que tornou possível o domínio das
bases oceânicas de onde se desfecharia o ataque final e
forçaria o exército metropolitano a capitular sem tardança.
O Japão assina a capitulação a bordo do encouraçado Missouri

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No pós-guerra, o Japão, desmembrado de suas antigas possessões em Formosa, na Manchúria, na
China, na Coréia e nas ilhas do Pacífico, atirou-se mais uma vez para o mar em busca do amparo econômico.
Em agosto de 1945, quando o imperador anuncia ao povo japonês a capitulação, um quarto das
cidades encontravam-se destruídas pelos bombardeamentos e a frota mercantil, que era a terceira no mundo,
tinha sido afundada.
Em 1948 a produção agrícola tinha diminuído 60%, o consumo 55% e a produção industrial 65%,
relativamente aos valores que detinham no período anterior à guerra. A inflação tornou-se praticamente
incontrolável e o mercado negro expandiu-se.
Apesar de ter perdido 2 milhões de soldados e 700 mil civis durante a 2ª Guerra Mundial, o Japão
teve de suportar a pressão demográfica originada pelo acolhimento de 6,2 milhões de japoneses repatriados
da Manchúria, da Coréia e da Formosa, e pelo "baby-boom" provocado pelo regresso dos soldados a casa.
A miséria e o desemprego aumentavam, enquanto o iene, a moeda nacional, deixou de ser cotada
no mercado mundial. A par desta situação econômica e social catastrófica, o Japão vai ter de pagar
indenizações de guerra, encontrando-se à mercê dos vencedores.
Ocupado pelos EUA que lhe impõe a sua Constituição, o Japão esqueceu o seu passado militarista
e concentra-se exclusivamente na sua reconstrução. Os EUA vão proteger militarmente o Japão e prestar-
lhe auxílio econômico. A ajuda americana tem como objetivo promover a recuperação da economia
nipônica e simultaneamente garantir um aliado na região, num período em que se verificava a expansão
soviética ao Sudeste Asiático e ao Extremo-Oriente.
A reconstrução do Japão foi, sobretudo, conduzida pelo Comando Supremo das Forças Aliadas
(SCAP).
São-lhe atribuídas várias tarefas:
Desarmamento - Renunciando o Japão a usar a guerra como meio de regular conflitos.
A democratização da sociedade japonesa - Através da atribuição de uma relativa autonomia ao poder
local, da aplicação de uma legislação sindical menos rígida, de um ensino mais democrático, etc.
A reforma agrária - Baseada na redistribuição pelos camponeses (42% da população ativa no final
da guerra) de terras confiscadas aos proprietários pouco produtivos - a alteração da estrutura fundiária
conduziu à modernização da agricultura no Arquipélago.
A eliminação do poder de alguns Zaibatsus - Em nome da "livre concorrência", em particular
daqueles que tiveram um papel importante durante o conflito mundial, contribuindo para alimentar a
máquina de guerra japonesa.
Os Zaibatsus são grupos econômico-financeiros, pertencentes a famílias e regidos pela tradição, que
tem vindo a desenvolver-se desde a época Meiji (1868-1912). Inicialmente, apoiaram-se na existência de
uma mão-de-obra barata e abundante, passando depois a dominar a indústria pesada, a navegação comercial
e o comércio externo.
Em quatro décadas (1950-1990), o Japão conheceu um processo de desenvolvimento econômico e
social consistente, transformando-se na segunda maior potência econômica do mundo. Durante a década
de 50, o PNB aumentou 150% em termos constantes.
Entre 1958 e 1961 foram criados três milhões de novos empregos, enquanto o subemprego e o
desemprego deixaram de ser significativos. A estrutura da população ativa e do PIB alterou-se, acentuando-
se o peso das atividades associadas aos setores secundário e terciário.
Os japoneses tiveram de responder com eficácia, uma vez que necessitavam de multiplicar as suas
exportações para pagar as crescentes importações de bens energéticos, de produtos alimentares e de
matérias-primas.
A estrutura das importações era dominada pelos hidrocarbonetos, o carvão e o ferro, em vez do
algodão, e as exportações passaram a ser constituídas por aço, navios e máquinas, em substituição dos
tecidos de algodão e de outros bens de menor qualidade. Os mercados abastecedores e de destino também
sofreram alterações. Embora o comércio externo Japonês continue a se concentrar na região da Ásia, os
EUA passaram a ser o principal país cliente e fornecedor.
A afirmação do poderio econômico, comercial e financeiro do Japão só foi possível pela conjugação
de fatores que atuaram simultaneamente:
O papel do Estado;
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Uma base industrial sólida e variada, orientada para os setores de ponta; e
As características dos recursos humanos.
O papel desempenhado pelo Estado em matéria econômica foi bastante importante. Canalizando os
recursos financeiros para as empresas e efetuando vultosos investimentos nas telecomunicações, nos
caminhos-de-ferro e na engenharia rural, o governo fomentou uma política de obras públicas que chegou a
representar 20% do PNB. Deste modo, criou emprego e estimulou a procura interna ao construir
importantes infraestruturas – como as planícies roubadas ao mar ou os túneis ferroviários.
Simultaneamente, o Estado Japonês desenvolveu uma planificação indicativa, incentivou a
inovação, limitou os fatores de riscos de certas atividades consideradas importantes apoiando as
reestruturações industriais, controlando o volume das importações e protegendo as empresas nipônicas da
concorrência.
Para além do importante papel do Estado, o outro fator que fez com que o Japão saísse da crise,
foram os recursos humanos.
O povo japonês foi muito importante para o desenvolvimento do país, a sua qualidade baseia-se
num sistema escolar muito competitivo - Desde o nível de escolaridade mais elementar, que exige um
grande esforço por parte dos estudantes, mas que garante um elevado grau de qualificação e permite o
acesso a empregos garantidos nas grandes empresas a todos os lugares da hierarquia. Num nível de
formação elevado - Que permite que todos os trabalhadores possam estar permanentemente capacitados
para exercer com competência a sua atividade.
A qualidade de mão-de-obra permite implementar nas empresas processos de produção com níveis
de exigência muito elevados, como os círculos de qualidade, e generalizar a produção "sem defeitos". A
adoção rápida da inovação e a capacidade de invenção, que são geralmente reconhecidas como importantes
atributos para o sucesso do Japão, devem-se em grande parte à qualidade da mão-de-obra.
Na pesca e sobretudo na construção naval voltaram os japoneses a se destacar no cenário mundial.
Não é de crer, entretanto, que a China ou a URSS permitam o ressurgimento do Poder Marítimo japonês na
sua antiga plenitude.

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8) Estados Unidos:

A América colonial era basicamente um país de


fazendeiros. Havia também criadores, alguns artífices,
mercadores e funcionários, mas seu número não representava
senão uma pequena minoria em face da massa considerável de
fazendeiros. Na Nova Inglaterra, contudo, o solo não era fértil.
Um fazendeiro podia, por seu
trabalho, ganhar o sustento e
talvez economizar um pouco,
mas não lhe era possível
prosperar e acumular reservas.
Por outro lado, o avanço para o interior era dificultado por
formidáveis barreiras geográficas. Esta razão e o litoral com seus
magníficos portos e angras e a vizinhança de farta pesca prenderam a
população à costa. Assim, nessa parte da América os colonos orientaram-
se, desde o início, para o mar, tornando-se pescadores, marinheiros,
construtores de navios e mercadores, contrastando com a população
agrícola das outras regiões da Colônia.
Portanto, desde cedo a Nova Inglaterra converteu-se numa
comunidade anfíbia cuja capital era Boston, uma cidade comercial junto
ao oceano. As florestas que vinham até a beira-mar facilitavam a As 13 colônias iniciais
construção naval. O oceano era fonte de alimentos para os colonos, e
algumas espécies de peixe seco mais abundante eram vendidas na Europa,
fornecendo a base de um prospero comercio externo.
Com o tempo, outros produtos da colônia, tais como peles, fumo, cereais e carne defumada, foram
acrescidos à exportação, transformando o comércio com o além-mar no fator principal da vida econômica
da região. A maior parte das exportações destinava-se às Índias Ocidentais, à Inglaterra e à Espanha. As
colônias, em troca, recebiam melaço e numerosos produtos manufaturados que não fabricavam.
As transações comerciais, entre as próprias colônias também dependiam das vias líquidas, pois as
longas distâncias e as florestas tornavam sumamente difíceis as comunicações terrestres, enquanto o mar,
juntamente com suas numerosas baías e rios navegáveis, oferecia um meio rápido e mais fácil de transporte
interno.
Por mais de duzentos anos, as vias aquáticas naturais constituíram as únicas vias dignas de menção
na América, não somente para o transporte de mercadorias, mas também para os viajantes de longas
jornadas.
A necessidade do transporte interno e o crescimento do comércio externo favoreceram a aparição
de uma próspera indústria de construções navais à qual as magníficas florestas forneciam excelentes
madeiras.
Depois de 1676 mais de setecentos navios foram construídos somente no Massachusetts. Em 1775,
dos 7.694 navios empregados no comércio da Grã-Bretanha, 2.342 eram de construção americana. Cerca
de 1.769, o volume do comércio colonial no além-mar beirava um milhão de toneladas com o valor
aproximado de 5.500.00b libras. O comércio externo tornara-se a verdadeira razão de ser da Nova
Inglaterra. Era um assunto de primordial importância do Hudson ao Chesapeake. Mais para o sul, o povo
dedicava-se principalmente à agricultura de produtos exportáveis, mas também lá a economia dependia de
forma vital do transporte no oceano. Por essa época, os navios da colônia, carregando produtos coloniais e
guarnecidos por marinheiros americanos, frequentavam os principais portos da Europa e das Índias
Ocidentais, então uma importante região comercial. Cerca de mil navios da colônia trafegavam nos
Domínios Britânicos. Além disso, um número substancial era encontrado em toda parte. Mais de trezentos
navios eram empregados na pesca da baleia e muitos mais, menores, dedicavam-se à pesca do bacalhau.

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Tão íntima era a conexão entre o comércio marítimo e a prosperidade das Colônias que elas se aprestavam
a lutar mesmo contra a Mãe-Pátria quando esta interferiu fortemente no intercâmbio marítimo.
Ao longo de todo o período colonial, a partir do século XVII, a grande causa de irritação dos colonos
contra a metrópole eram as Leis de Navegação. O famoso “Ato de Navegação" posto em vigor por
Cromwell, em 1660, interditou às colônias inglesas a importação e exportação de toda mercadoria, a não
ser em navios ingleses ou coloniais. Proibiu, além disso, que certos artigos, tais como o fumo, açúcar,
algodão, lã, madeiras comuns, madeiras de tintura etc., fossem encaminhados para outros países que não a
Inglaterra ou domínios seus. A essa lista juntaram-se mais tarde outros artigos. Havia ainda outras leis do
mesmo gênero: as leis sobre os cereais e as leis contra as manufaturas; as primeiras, feitas para favorecer o
fazendeiro inglês, entraram em vigor cerca de 1666. Elas interditavam, praticamente, o mercado inglês aos
cereais cultivados nas colônias. Esse procedimento levou Nova Inglaterra e Nova York a fabricarem objetos
manufaturados, ao que a Inglaterra respondeu, interditando a produção industrial nas colônias.
A lei inglesa mais dura nessa campanha de
supressão do comércio colonial foi provavelmente a sobre
o açúcar, em 1733. O Governo britânico procedia dessa
forma baseado no princípio, então admitido por todas as
nações europeias, de que as colônias existiam para
enriquecer a Mãe-Pátria. Esse princípio levava a
subordinação dos interesses coloniais aos interesses da
metrópole.
O fim da Grã-Bretanha era exportar para a América
produtos manufaturados e ao mesmo tempo importar
matérias-primas, fazendo inclinar a balança comercial a seu Boston Téa Party: revolta colonial americana
favor. Em 1759, o total de exportações da Nova Inglaterra contra as leis inglesas sobre o comércio
para a Grã-Bretanha elevou-se a 38.000 libras e as externo.
importações a 600.000 libras.
Num ponto a política inglesa estimulou grandemente a indústria americana: a construção de navios
da Nova Inglaterra em virtude das Leis de Navegação colocou os navios construídos nas colônias no mesmo
pé dos navios de origem inglesa.
Essas leis exclusivistas motivaram a insatisfação dos colonos com o domínio da metrópole, e bem
cedo, sobretudo depois da Guerra dos Sete Anos, outras causas vieram aumentar o mal-estar. A irritação
foi crescendo com o correr dos anos, e por fim, eclodiu a rebelião aberta. Com a guerra surgiu a necessidade
de ser criada uma força naval, mas os colonos preferiram, na luta no mar, dedicar-se sobretudo à rendosa
guerra de corso. Numerosos navios particulares foram empregados como corsários e destruíram um número
muito grande de navios mercantes ingleses. Quase todos os Estados enviaram corsários contra o inimigo.
Massachusetts forneceu mais de quinhentos, a Pensilvânia quase o mesmo número.
Em 1775, o Congresso ordenou a construção de uma frota nacional, e um ano depois treze navios
estavam terminados. Alguns desses navios não chegaram a se fazer ao mar; quase todos os outros foram
capturados ou queimados antes do fim da guerra, não, todavia, sem terem prestado antes grandes serviços
ao país.
A Revolução Americana (1776-1783) viu nascer a
marinha dos Estados Unidos da América. Seu ideário liberal
influenciou cabeças no Brasil, resultando na Conjuração das Minas
Gerais (1789) conhecida como Inconfidência Mineira. As lutas
desenvolveram-se no mar e em terra. O apoio da França, ressentida
com a perda do Canadá para a Inglaterra alguns anos antes, foi
decisivo para os norte-americanos. Repetiu-se nessa campanha
memorável uma situação análoga à de Xerxes na Grécia, após a
Batalha de Salamina. Tendo os britânicos perdido a Batalha de
Assinatura da Independência dos EUA
Chesapeake (05/09/1781), o General Cornwallis ficou isolado na
América sem poder receber o apoio de que necessitava e acabou
rendendo-se às tropas de Jorge Washington.
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Concluída a aliança com a França, a poderosa frota desse país foi empregada no serviço da causa
patriota. Juntou-se a ela, posteriormente, a Frota espanhola com a declaração de guerra da Espanha à
Inglaterra em 1779. A Inglaterra iria contar, ainda, com um outro inimigo. Pelo fim de 1780, arrebentou a
guerra com a Holanda, e, desde então, foi necessário à Grã-Bretanha lutar contra três grandes potências
europeias além da América.
Nos mares, coube à Marinha francesa o papel preponderante. Com a Royal Navy dispersa por todo
o mundo, lutando contra três grandes potências navais, a Inglaterra perdeu para a França o controle dos
mares junto às colônias revoltadas, e suas forças de terra, desamparadas da metrópole, foram obrigadas à
rendição, face ao Exército franco-americano.
A Grã-Bretanha vencida assinou a paz em 1783. Também nesse Tratado percebe-se a importância
que os dirigentes britânicos sempre deram aos assuntos marítimos. O Mississipi ficava aberto aos navios
americanos e ingleses. Os americanos continuavam com direitos de pesca nas costas da Terra Nova e do
golfo de São Lourenço.
Foi assim que no decorrer da Guerra da Independência surgiu a Marinha americana, mas a massa
heterogênea que a constituía (corsários particulares, navios pertencentes às colônias e navios armados pelo
Congresso) dissolveu-se no caos que se seguiu à guerra. Em 1785, ano da venda do último navio, os Estados
Unidos não possuíam um só navio de guerra. Entretanto, muito pouco tempo depois do fim da Guerra da
Independência, a necessidade de uma marinha fez-se sentir em virtude da captura de navios mercantes
americanos pelos corsários do Bei de Alger. Em 1793, os corsários argelinos espalhavam-se no Atlântico e
em um mês capturaram onze navios americanos. Essa situação vergonhosa levou enfim o Congresso a
tomar medidas, e no ano seguinte foi iniciada a construção de várias fragatas.
Os navios recém-construídos não tiveram, porém, o batismo de fogo em luta contra os piratas do
Norte da África e sim na guerra contra os corsários franceses das Antilhas. As operações navais contra a
França duraram ao todo cerca de dois anos e meio. A guerra nunca foi formalmente declarada,
desenrolando-se apenas nas Antilhas e foi muito proveitosa à jovem Marinha americana. O grande
acréscimo das exportações, devido à proteção dada pelos cruzeiros de navios americanos e os brilhantes
sucessos obtidos nos combates navais deram à Marinha uma popularidade necessária naqueles dias em que
a manutenção de um navio de guerra parecia a muitos ameaça de monarquismo.
Mal terminadas as lutas contra os corsários franceses, a Marinha americana levou a cabo uma série
de operações navais no Mediterrâneo contra o Bei de Trípoli. A guerra contra os norte africanos serviu para
proporcionar certa expansão à Marinha. A duração relativamente longa da luta (1801-05) nesse teatro
afastado de operações, aprimorou o valor combativo das guarnições. Estas vantagens seriam apreciadas
devidamente cerca de dez anos depois na guerra contra a Inglaterra.
Apesar do contratempo representado pelas operações nas Antilhas e no Mediterrâneo, o comércio
marítimo americano expandia-se rapidamente. As guerras napoleônicas absorveram de tal forma as
populações da Europa que uma parte sempre crescente do comércio marítimo coube à América. Durante
vinte anos os lucros desse comércio foram enormes, e a navegação mercante progrediu a passos de gigante.
Em 1790 o valor total das exportações dos Estados Unidos elevara-se a 19 milhões de dólares; cinco anos
mais tarde, 26 milhões de dólares de mercadorias procedentes somente das possessões francesas,
holandesas e espanholas foram importadas para serem em seguida reexportadas. Em 1806, o valor das
reexportações elevou-se a 60 milhões de dólares. Não é de estranhar que a Inglaterra se tenha sentido
alarmada quanto ao futuro de sua supremacia marítima e, dedicando-se ainda à fase econômica de sua luta
contra Napoleão, ela pôs em vigor medidas restritivas.
A Inglaterra declarou então bloqueio geral da França, desde o Elba até Brest, com um bloqueio
cerrado do Sena e Ostende (ato do Conselho de 16 de maio de 1806). Napoleão respondeu com o famoso
decreto de Berlim (21 de novembro de 1806), o qual declarou as Ilhas Britânicas, dali por diante, em estado
de bloqueio.
O comércio americano encontrava-se assim entre as duas pedras de mó. O remédio previsto pelo
Presidente Jefferson para todos esses problemas foi a coerção pacífica. Em 1807, ele decretou para todos
os navios empregados no comércio exterior um embargo que durou quinze meses e que custou oito milhões
de dólares só aos comerciantes da Nova Inglaterra. O embargo foi extremamente impopular nos Estados
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Unidos que sofreram bem mais que a Europa. O espetáculo oferecido pelo país era o mais desolador. Os
navios ficavam a apodrecer nos portos. Cereais, algodão, fumo e outros produtos acumulavam-se nos
celeiros dos fazendeiros do Norte, dos plantadores do Sul e ao longo do cais nos portos de mar. A maior
parte dos historiadores vê no voto e na aplicação do embargo um grande erro de Jefferson. As consequências
do embargo para a França foram mínimas. Napoleão lançou o decreto de Bayonne que determinou a captura
de todos os navios americanos encontrados nas águas francesas, espanholas e italianas. Ele confiscou assim
mais de duzentos navios americanos. O embargo afetou mais a Inglaterra, mas mesmo lá os efeitos foram
inferiores aos esperados. A guerra contra a Inglaterra foi, contudo, adiada para o período presidencial
seguinte.
Durante a presidência de Madison, no quatriênio que se seguiu, ante a inquietante situação
internacional, foi proposta no Congresso a construção de uma esquadra relativamente poderosa de 10 navios
de linha e 20 fragatas, porém o Congresso, dominado pela oposição Jeffersoniana contrária à política
armamentista naval, julgou a proposta custosa e perigosa para a liberdade pública. Em consequência, ao ser
iniciada a guerra contra a Inglaterra em 1812, a Marinha americana compunha-se de apenas dezesseis
navios em estado de servir. Além disso, havia 257 chalupas canhoneiras construídas nos anos precedentes,
pois Jefferson, que se opunha tão violentamente à Marinha, tinha grande confiança nesse tipo de
embarcação, destinada à defesa das costas. Tais embarcações, entretanto, se mostrariam sem valor.
Durante esse conflito, também chamado de Segunda Guerra de Independência dos EUA, as fragatas
americanas, mais bem construídas, venceram uma série de combates singulares contra congêneres ingleses.
Esses êxitos parciais, todavia, não puderam evitar o absoluto controle dos mares pela esmagadora
superioridade naval dos britânicos. O comércio americano foi banido dos oceanos, e os ingleses
desembarcaram tropas a seu bel prazer no litoral dos Estados Unidos, chegando mesmo a incendiar
Washington. O que restava da pequena Marinha americana ficou bloqueado nos portos. A retaliação
americana foi a guerra de corso.
A perda que sofreu o comércio marítimo inglês durante os dois anos e meio de guerra foi
incalculável. O Congresso autorizou cerca de duzentos e cinquenta corsários que varreram os oceanos à
cata dos infelizes navios mercantes, capturando centenas deles. Estima-se em 600 o número de navios
mercantes ingleses vítimas dos corsários e dos navios de guerra americanos. Um grande número deles,
porém, foi retomado pelos ingleses, antes de atingir portos americanos.
Com o fim da guerra em 1815, a Marinha Mercante
americana voltou à senda do progresso. Na Nova Inglaterra, a
construção naval atingiu elevados índices de perfeição, e de suas
carreiras saíram os famosos Clippers, os navios mais velozes da
Marinha a vela, os quais chegavam a navegar mais de 420 milhas
em 24 horas.
A partir de meados do século, a Marinha de Comércio
americana entrou em decadência. Vários fatores concorreram para
esse fim, mas o principal foi o fracasso da construção naval do país
em acompanhar a evolução da vela para o vapor e da madeira para
o ferro. Outra razão foi a marcha para o Oeste que então se
processava, absorvendo todas as atenções e todos os interesses,
com o correspondente crescimento das estradas de ferro.
O deflagrar da Guerra Civil foi o sopro que acabou com a
fase áurea da Marinha Mercante dos Estados Unidos.
Paralelamente, a Marinha de Guerra dos Estados Unidos não fez
grandes progressos após a paz de 1815. Ela foi empregada numa
série de operações secundárias, tais como na guerra contra o Bei de
Alger e nas operações que suprimiram a pirataria nas Antilhas. Sua
ação contra o México foi muito restrita em face da não existência
de oposição nos mares. Digna de nota foi a ação do Comodoro
Perry no Japão em 1854, abrindo aquele país ao comércio mundial.

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Ao começar a Guerra Civil, a Marinha dos Estados Unidos estava em precário estado. A 4 de março
de 1861, quando o Presidente Lincoln prestou juramento assumindo as funções, ela tinha em serviço,
compreendendo navios de transporte e auxiliares, 42 navios, dos quais apenas 23 movidos a vapor poderiam
ser considerados de algum valor. Por sua cegueira e indiferença, o Congresso havia desorganizado a
Marinha quase tanto quanto havia feito a administração. Em seguida ao desastre financeiro de 1857, a renda
da Nação tinha diminuído, e, nos esforços de economia, o Congresso havia destruído a Marinha. A oposição
às construções e mesmo aos reparos dos navios vinha tanto dos Estados do Norte quanto dos Estados do
Sul, os membros do Congresso pelo Ohio e o Ilinois conduziam o ataque ao orçamento da Marinha e à
Marinha propriamente dita. No seu conjunto, o Congresso era apático.
A Guerra Civil começou com o bombardeio do Forte Sumter a 12 de abril de 1861. O novo Ministro
da Marinha, capaz, ocupou-se logo com vigor da direção dos assuntos navais. Foram estabelecidos
rapidamente planos para o rearmamento naval. O orçamento da Marinha votado pelo Congresso precedente,
que era de 13 milhões de dólares, foi elevado para 43.500.000.

Os Arsenais do Norte, onde o trabalho tinha sido quase


inteiramente suspenso durante os anos que precederam a guerra,
tornaram-se o teatro de grande animação. Alguns meses depois do
bombardeio do Forte Sumter, o Norte tinha onze mil homens ocupados
em recolocar em atividade velhos navios desarmados, a reparar os navios
chegados das estações longínquas e a construir novos navios adaptados
especialmente para os serviços previstos. Ao mesmo tempo, o Ministro
da Marinha, apelando para todas as fontes, comprava e adaptava navios
mercantes. Os navios incorporados à esquadra exigiam guarnições para
armá-los, e, antes do fim do ano, o número de marinheiros elevava-se de
7.600 para 22 mil.

Durante a guerra, as duas grandes tarefas da Marinha dos estados do Norte (federados) foram o
bloqueio das costas confederadas (do Sul) e a separação em duas porções da confederação pelo domínio do
rio Mississipi. Essas duas operações eram essenciais para impedir a chegada de munições e
aprovisionamento aos exércitos confederados, batendo-se no Leste. A captura de Port Royal, o bizarro
combate de Hampton Road, as operações no baixo Mississipi, a batalha da baía de Mobile, os encontros da
baía de Albermale marcaram o desenrolar das duas ações fundamentais.
A rigor, o bloqueio e a ocupação dos portos confederados puseram fim ao comércio do Sul. Durante a
guerra, a esquadra bloqueadora capturou ou destruiu 1.150 navios com as respectivas cargas,
representando um valor total de 30 milhões de dólares. Por outro lado, a Marinha Mercante americana
sofreu forte redução no decorrer da guerra. De 2.500.000 toneladas em 1861, ela caiu para 1.500.000 em
1865, ao acabar o conflito, concorrendo para o declínio não só a destruição oriunda das operações bélicas,
mas também a perda do mercado de transporte para a Marinha inglesa.
Em condições normais, a navegação comercial americana poderia renascer após a Guerra de
Secessão como se restabelecera depois da guerra de 1812. A razão pela qual ela não retomou vida, residiu
na mudança das circunstâncias econômicas acarretadas, ao menos, em parte, pelo aumento dos impostos
que tornaram impossível construir e armar navios de forma barata, como faziam os rivais estrangeiros.
Também foram nocivas certas leis de navegação que interditavam a compra de navios estrangeiros para
navegar sob pavilhão americano. Essas medidas tiveram efeito penoso sobre a Marinha Mercante e levaram
o capital americano a não mais ser empregado em navios, mas de preferência nas empresas ferroviárias,
usinas e minas. Em consequência, rapidamente a percentagem do tráfego marítimo efetuado em porões de
navios americanos decaiu. Ela era de 66,5% ainda em 1860. Em 1865 caíra a 27,7% e cerca de 1901 baixara
a 8,2%.
O desenvolvimento da ciência da Guerra Naval que tinha sido tão rápida nos Estados Unidos durante
a guerra de Secessão, parou bruscamente com ela. Durante vinte anos os Estados Unidos não tiveram um
só navio encouraçado. No decorrer do período do Presidente Hayes, a Marinha americana era inferior à de

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qualquer nação europeia, e mesmo os dois encouraçados do Chile, bem guarnecidos, teriam constituído
uma força superior a todos os navios de guerra americanos reunidos.
A Marinha nessa época parecia não ter
nenhum defensor junto ao Governo, e o país, em
geral, parecia inteiramente indiferente às suas
necessidades. Todos os créditos arrancados ao
Congresso eram destinados à manutenção dos navios
existentes, e uma boa parte desse dinheiro era
esbanjado porque os parlamentares estavam bem
mais interessados em atender aos casos de seus
eleitores do que em fazer reparar os navios. A sombra
da negligência havia quase completamente obliterado
a Marinha em 1881, quando dificilmente um único
navio estava preparado para missões de guerra e
poucos estavam em condições para um cruzeiro
normal.
O ano de 1881, em que Garfield assumiu a
presidência, marca o ponto mais baixo atingido pela
Marinha desde os dias em que os Estados Unidos
tinham pagado tributo ao Bei de Argel. Não é de
espantar que os comandantes americanos dessa época
tivessem vergonha de levar seus navios às águas
europeias.
Se o ano de 1881 marca o mínimo atingido
pela Marinha americana, também marca o início da
recuperação. Embora dificultado pela má vontade do
Congresso, o Presidente Arthur conseguiu dar início
à regeneração da Marinha americana. Em 1885, ainda
foi preciso recorrer ao estrangeiro para a montagem
de canhões modernos nos navios em construção, mas USS Monitor - 1862
cinco anos depois a criação de um mercado
americano de navios de guerra e de canhões fez desenvolver nos Estados Unidos estabelecimentos
industriais capazes de fabricar os modelos mais aperfeiçoados de equipamentos bélicos. As perspectivas de
um conflito próximo com a Espanha vieram acelerar o renascimento da Marinha de Guerra americana e
quando a guerra deflagrou, em 1898, ela não teve dificuldades em esmagar em Manila, em Santiago de
Cuba, as frotas obsoletas da Espanha.
Em lugar de declinar depois da assinatura da paz, como acontecera nas outras vezes, a Marinha de
Guerra americana progrediu a passos de gigante, contrastando com a decadência da frota de comércio.
Embora o comércio externo houvesse aumentado enormemente entre 1880 e 1914, o número de navios
empregados nesse tráfego continuara a diminuir. Em 1880, cerca de 1.200.000 toneladas eram registradas
como se dedicando ao comércio com o estrangeiro; em 1914 só havia um milhão de toneladas.
A Primeira Guerra Mundial forçou a terceira expansão da Marinha Mercante americana. A ameaça
da interrupção das rotas marítimas aliadas por parte dos submarinos alemães obrigou os Estados Unidos a
dedicarem à construção de navios mercantes uma parte considerável de seus recursos.
O programa gigantesco de construções da Emergency Fleet Corporation permitiu o lançamento ao
mar em 1917 de três milhões e meio de toneladas. Graças a esse esforço, em poucos anos os Estados Unidos
passaram a contar com a segunda frota mercante do mundo a qual só era sobrepujada pela inglesa. Ela
passou de pouco mais de quatro milhões de toneladas, em 1914, para 14.574.000 em 1920, ou seja, de 4%
para 23% da tonelagem mundial. Também a Marinha de Guerra americana sofreu grande expansão em
virtude da Primeira Guerra Mundial e bem cedo ocupou o segundo posto.

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Entre as duas guerras, a frota
mercante americana declinou ante a
concorrência europeia. Embora
continuando a ocupar o segundo
posto, sua participação na tonelagem
mundial caiu de 22%, em 1923, para
14% em 1939, quando dispunha em
serviço de 6 milhões de toneladas, ou
seja, menos da terça parte da Marinha
de Comércio britânica. Apenas 25%
das transações mercantis com o além-
mar eram efetuados em porões
americanos. A construção naval
ultrapassava de pouco a cifra de cem
mil toneladas anuais. A Marinha de
Guerra, entretanto, não foi descuidada
e permaneceu em nível próximo ao da
Grã-Bretanha.
Contraste dos anos de depressão nos EUA

A Segunda Guerra Mundial elevou os Estados Unidos à primazia incontestável nos mares. O perigo
crescente de um conflito na Europa levou o governo de Roosevelt a pôr em execução um gigantesco
programa naval que já ia bem adiantado quando do ataque a Pearl Harbour. Empregando-se a fundo em
dois oceanos, a Marinha dos Estados Unidos rapidamente se recuperou dos golpes iniciais e empreendeu
ação decisiva tanto na batalha do Atlântico como contra o Japão. No Atlântico, a quantidade fabulosa de
navios de escolta e aeronaves que a América colocou na luta antissubmarina teve efeitos decisivos. No
Pacífico, a esmagadora superioridade americana bem cedo varreu os nipônicos das principais áreas por eles
conquistadas na arrancada inicial da guerra e por fim atingiu o próprio território metropolitano japonês.

Os estaleiros dos Estados Unidos, nos quais


chegaram a trabalhar mais de novecentos mil operários em
1944, produziram navios para a América e para quase
todos os países aliados, conseguindo compensar as perdas
tremendas oriundas da campanha submarina. Só em 1942
foram lançados ao mar mais de oito milhões de toneladas
de navios mercantes e, em 1943, dezenove milhões.
No fim das hostilidades, a Marinha de Guerra dos
Estados Unidos ultrapassava três milhões de toneladas, e
a Marinha Mercante cinquenta milhões.
No pós-guerra, mais uma vez a Marinha Mercante
americana cedeu ante a recuperação das frotas de
comércio europeias. A Grã-Bretanha voltou ao primeiro
posto em tonelagem de navios de comércio com a
passagem para a reserva de um grande número de
unidades americanas. Em 1946, já 33% do comércio
exterior americano eram transportados em porões
estrangeiros, proporção que se elevou a 50% em 1950.
Nesse mesmo ano, a frota mercante dos Estados Unidos,
em serviço, estava reduzida a 11 milhões de toneladas,
cerca da metade do Reino Unido, sendo bem verdade que
os armadores americanos também dispunham de mais USS Iowa em 1982, encouraçado lançado
alguns milhões de toneladas sob as bandeiras do Panamá, em 1943, com participação na 2ª GM, no
Vietnã e na Coréia.
Libéria e outros países.
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Onde os Estados Unidos conservaram a primazia absoluta, sem mostrar a mínima intenção de perdê-
la, foi na Marinha de Guerra. Se depois da Guerra de Sucessão da Espanha restou apenas uma grande
potência naval, a Inglaterra, depois da Segunda Guerra Mundial coube aos Estados Unidos essa situação
privilegiada.

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Leitura Complementar

A HISTÓRIA DA NAVEGAÇÃO
Os rios, lagos, mares e oceanos eram obstáculos que os seres humanos do passado muitas vezes
precisavam ultrapassar. Primeiro, eles se agarravam a qualquer coisa que flutuasse. Depois, sentiram a
necessidade de descobrir como transformar materiais, para que estes, flutuando, pudessem se sustentar
melhor sobre a água. Assim, ao longo do tempo, em cada lugar surgiu uma solução, que dependeu do
material disponível: a canoa feita de um só tronco cavado; a canoa feita da casca de uma única árvore; a
jangada de vários troncos amarrados; o bote de feixes de juncos ou de papiro; o bote de couro de animais
e outros.
Durante o século XV, os portugueses decidiram que deveriam prosperar negociando diretamente
com o Oriente, por meio do mar. Para alcançar bom êxito nesse ambicioso projeto de interesse nacional,
foi necessário: explorar a costa da África no Oceano Atlântico e encontrar a passagem, ao sul do continente
africano, para o Oceano Índico; chegar às Índias e lá negociar diretamente as mercadorias; trazê-las para
Portugal em navios capazes de transportar quantidades relativamente grandes de carga e defender esse
comércio. Isso exigiu desenvolvimentos científicos e tecnológicos para os navios e para a navegação.
Todas essas soluções simples, no entanto, não transportavam muita coisa, ou eram difíceis de
manejar, ou mesmo perigosas em águas agitadas. Era necessário desenvolver embarcações construídas a
partir da junção de diversas partes, para que fossem maiores e melhores.
Os portugueses desenvolveram e utilizaram: caravelas2 para explorações; naus3 como navios
mercantes para o comércio e galeões4 como navios de guerra. Mas isso só não bastava para chegar com
sucesso ao porto de destino.
A navegação, quando se mantém terra à vista, é feita pela observação de pontos geográficos de terra
determinando a posição do navio em relação à costa. Quando não se avista mais a terra e quando o mar e o
céu se encontram no horizonte a toda volta, é necessário saber em que direção o navio segue e a posição
em que se está em relação à superfície do globo terrestre.
Foi necessário, portanto, desenvolver instrumentos capazes de indicar a direção do navio (bússola),
a latitude (astrolábio) e a longitude (cronômetro).

OS NAVIOS DE MADEIRA:
CONSTRUINDO EMBARCAÇÕES E NAVIOS
As caravelas provavelmente tiveram sua origem em embarcações de pesca, que já existiam na
Península Ibérica3 desde o século XIII. Tinham, em geral, velas latinas4. Essas velas são muito boas para
navegar quase contra o vento, contribuindo para que as caravelas fossem muito úteis na costa da África.
Foi principalmente com elas que os portugueses exploraram o litoral africano durante o século XV. As
caravelas foram os navios mais importantes para Portugal até a descoberta do Cabo da Boa Esperança, que
permitiu contornar a África, passando do Oceano Atlântico para o Oceano Índico. A partir de então, o
transporte de mercadorias por naus passou a ser o mais importante.

2
CARAVELA – de caravo, do inglês caravel, do francês caravelle, navio de casco alto na popa e baixo na proa, de proa aberta
ou coberta, arvorando de um a quatro mastros de velas bastardas (latinas e triangulares) e armado com até dez peças de artilharia.
Sua tonelagem variava de 60 a 160t. Algumas caravelas tinham velas redondas no mastro do traquete; foram os navios mais
utilizados pelos portugueses nos descobrimentos marítimos dos séculos XV e XVI.
3
NAU – Até fins do século XV, navio de porte relativamente grande, com acastelamentos à proa e à popa, arvorando geralmente
um só mastro com vela redonda (ou “pano”). Daí até fins do século XVI, princípios do XVII, as naus foram aumentando de
tamanho, tornaram-se muito bojudas (boca com cerca de 1/3 do comprimento da quilha), passaram a arvorar até três mastros
(traquete, grande e mezena) envergando pano redondo e uma vela latina quadrangular à popa, além de gurupés, e tinham até três
ou quatro cobertas com duas a três baterias de canhões. Com o passar dos anos, foi-se modificando o seu velame. Eram
embarcações imponentes, em geral ricamente ornamentadas, mas de difícil manejo
4
GALEÃO – do inglês galeno, do francês galion – embarcação de alto-bordo, dois ou três mastros envergando velas redondas
e gurupés com velas de proa, empregada no transporte de ouro e prata da América para Espanha e Portugal, nos séculos XVI,
XVII e XVIII. Era armado com numerosos canhões.

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A nau era um navio mercante com grandes espaços nos porões para carregar as mercadorias do
Oriente. Essa ênfase na carga, no entanto, fazia com que as naus fossem mal armadas. Levavam poucos
canhões para carregar mais mercadorias e eram presas fáceis para os navios dos países que começariam a
desafiar o monopólio português do comércio com o Oriente pelo Cabo da Boa Esperança, da chamada
Carreira da Índia. Até então, Portugal vinha utilizando caravelas bem armadas como navios de guerra, mas,
desde o início do século XVI, sentira a necessidade de desenvolver o galeão, um navio de guerra maior e
com mais canhões, para combater turcos no Oriente e corsários e piratas europeus ou muçulmanos no
Atlântico. O galeão foi a verdadeira origem do navio de guerra para emprego no oceano. Foi construído
para fazer longas viagens e combater longe da Europa.

O DESENVOLVIMENTO DA NAVEGAÇÃO OCEÂNICA:


OS INSTRUMENTOS E AS CARTAS DE MAREAR
Um dos instrumentos mais importantes que, no passado, permitiram as Grandes Navegações foi a
bússola, inventada pelos chineses. A bordo ela é chamada de agulha magnética e, antigamente, de agulha
de marear. Basicamente, ela consta de uma agulha imantada que se alinha em função do campo magnético
natural da Terra, podendo-se, então, saber a direção em que está o polo norte magnético. Assim, é possível
saber a direção em que o navio segue, ou seja, seu rumo.
Para saber exatamente a posição em que se está em relação ao globo terrestre, é necessário calcular
a latitude e a longitude do lugar. O cálculo prático da longitude depende de se saber, com precisão, a hora.
Porém, a inexistência de relógios (cronômetros) que não fossem afetados pelos movimentos do navio,
causados pelas ondas, fez com que a hora não pudesse ser calculada no mar até o século XVIII, quando
foram desenvolvidos cronômetros adequados à utilização a bordo dos navios, para o cálculo da longitude.
A latitude não era difícil de calcular e, por ela e pela estimativa de quanto o navio havia se deslocado, os
navegadores da época das Grandes Navegações sabiam aproximadamente onde estavam. Evidentemente,
erros de navegação ocorreram, com consequências desastrosas.
Outros instrumentos utilizados mais tarde, como o quadrante e o sextante, mediam a altura do Sol
pelo ângulo em relação ao horizonte, permitindo estimar a hora e o cálculo de longitude.
As cartas náuticas, mapas do mar, eram muito imprecisas e passaram por difícil processo de
desenvolvimento. As que foram inicialmente feitas pelos portugueses eram conhecidas como portulanos.
A partir do final do século XVI, passou-se a utilizar a Projeção de Mercator, usada até os dias de hoje nas
cartas náuticas. Nela os meridianos e os paralelos são representados por linhas retas que se interceptam
formando ângulos de 90 graus. Isso causa consideráveis distorções nas latitudes mais elevadas, porém tem
a vantagem de os rumos e as marcações de pontos de terra serem linhas retas, facilitando a plotagem nas
cartas. Como a Terra é aproximadamente esférica (na verdade um geóide), a distância mais curta entre dois
pontos não é uma linha reta na Projeção de Mercator, mas isso é somente um pequeno inconveniente, e a
curva que representa a menor distância pode ser calculada pelo navegador.

A VIDA A BORDO DOS NAVIOS VELEIROS:


A vida a bordo dos navios veleiros era muito difícil. A Idade da Vela representou para os
marinheiros muito sacrifício. O trabalho a bordo, manobrando com as velas, muitas vezes durante
tempestades, exigia bastante esforço físico e era arriscado. A comida, sem possibilidade de contar com
uma câmara frigorífica, era deficiente, principalmente em vitaminas, o que causava doenças como o
beribéri (pela carência de vitamina B) e o escorbuto (pela carência de vitamina C). Durante os longos
períodos de mau tempo, não havia como secar as roupas. A higiene a bordo também deixava muito a
desejar. Muitos morreram nas longas viagens oceânicas.
O escorbuto, no entanto, merece destaque, pois foi uma doença que causou a morte de muitos
marinheiros nas longas travessias no mar, quando a dieta dependia apenas de peixe, carne salgada e biscoito
(feito de farinha de trigo, o último alimento que se deteriorava a bordo dos veleiros). Ele é causado pela
falta de vitamina C na dieta. As gengivas incham e sangram, os dentes perdem sua fixação, aparecem
manchas na pele, sente-se muito cansaço. Com o tempo, vem a morte. Em uma viagem da Marinha inglesa
(força naval comandada pelo Comodoro George Anson), em 1741, dos dois mil homens que partiram da
Inglaterra, somente 200 regressaram. A maioria morreu por causa do escorbuto. Ele foi responsável por
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mais mortes na Idade da Vela do que os combates, os naufrágios, as tempestades e todas as outras doenças
juntas.
A prevenção do escorbuto obtém-se bebendo, frequentemente, um pouco de suco de limão (que é
rico em vitamina C), como parte da dieta. Essa solução surgiu no final do século XVIII, tornando mais
saudável a vida a bordo nos navios.
Agora é possível deduzir porque a maioria dos piratas representados em filmes não possui alguns
dentes.

OS REFLEXOS DA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL NA NAVEGAÇÃO:


O navio a vela surgiu praticamente junto com a navegação e os homens estavam já habituados a
manobrar com ela. Sua manutenção implicava apenas a conservação de seus aparatos, com materiais
relativamente fáceis de encontrar. Seu emprego dependia apenas do adestramento da tripulação e das
condições da natureza, tornando seu uso quase ilimitado.
As bases e os portos mundiais serviam para facilitar o provimento aos navios dos meios necessários
à subsistência de seus homens, provimentos estes que em sua maioria – água e comida – também poderiam
ser obtidos junto à costa, ou para a obtenção de mercadorias para o comércio, aí, o papel de relevo estava
nas mãos dos comerciantes locais em cada empório.
Todo o espaço de bordo destinava-se exclusivamente ao transporte de carga e ao alojamento da
guarnição, exceto no caso dos navios de guerra, em que cabiam ainda os canhões e sua respectiva munição.
O navio à vela tinha se mostrado ao longo de séculos como um meio mais eficiente, barato e rápido
para o comércio do que os meios terrestres, e para as marinhas de guerra, era um instrumento de poder a
circular em todos os oceanos.
O século XVIII modificou estes parâmetros. Tramava-se o fim da vela como aparelho propulsor dos
navios sob a força dos ventos.
No começo do século XVIII um francês chamado Papin tentou adaptar uma máquina a vapor numa
embarcação. Não que isso fosse totalmente uma novidade. Desde épocas remotas os mais brilhantes
cientistas já tinham feito projetos, muitos dos quais provaram-se ser totalmente impraticáveis, para
máquinas autossuficientes de força, tanto a terra quanto para navegar ou voar.
Mais tarde, James Watt, no final do século XVIII, construiu a primeira máquina propriamente a
vapor. A Grã-Bretanha estava sendo transformada em seu sistema de produção com a adoção de um
elemento inteiramente novo, que modificaria as relações de trabalho e as estruturas. A introdução da
mecanização fabril, substituindo quase toda a mão-de-obra humana, viria a trazer tantas e tão grandes
transformações em todos os campos das atividades humanas que, ao conjunto dessas modificações cada
vez mais aceleradas e profundas, deu-se o nome de Revolução Industrial.
A máquina proveu maior rendimento do trabalho, reduziu custos e aumentou a produção, mas
solicitou muito maior dispêndio de energia. A grande fonte energética logo utilizada foi o carvão.
O aperfeiçoamento desses mecanismos entre o final do século XVIII e início do XIX levou as
sociedades a um processo de desenvolvimento técnico crescente. Como não podia deixar de ser, as marinhas
mercante e de guerra sofreram o impacto da Revolução Industrial, não de forma igualitária, tendo em vista
as características e o emprego de cada uma.
De um modo geral, as vésperas da Revolução Industrial, o navio de comércio e o de guerra muitas
se confundiam, por isso, as desconfianças quanto às transformações da vela para o vapor foram em ambas
as esferas.
Até a Revolução Industrial (e científica), todas as transformações ocorridas nos meios navais foram
oriundas das próprias experiências, necessidades e possibilidades dos homens do mar. Com a Revolução
Industrial, os “cientistas” passaram a determinar essas transformações, ou seja, as modificações na forma e
no emprego das embarcações não ocorriam mais do mar para os estaleiros e arsenais em terra, mas das
oficinas e laboratórios em terra forçando seu uso no mar. A máquina a vapor era, portanto, invenção do
homem de terra, estranho ao ambiente marítimo e às lides marinheiras.
No entanto, os cientistas acompanhando as novas transformações tecnológicas e mercantilistas,
projetavam suas máquinas a fim de desenvolverem cada vez mais capacidade de gerar riquezas às suas
nações, quer pela melhoria da capacidade comercial quer pelo aumento do poder militar. Como não podia
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deixar de ser, foi no campo comercial, mais especificamente no transporte de passageiros, em que a
navegação a vapor se desenvolveu mais rapidamente.
Em comparação com o emprego inicial em outras atividades, a propulsão a vapor para o transporte
de passageiros foi mais atraente, pois trouxe a regularidade nas viagens. A dependência dos fatores externos
como vento e correntezas marítimas foi superada e, agora navegando em linha reta, as distâncias eram
encurtadas e o tempo otimizado. Outra área bastante atraente era a da navegação fluvial. Vencer as curvas
dos rios, desviando de bancos de areia e contra a correnteza, era extremamente difícil para a navegação à
vela. A autopropulsão removia estes entraves e era tudo o que mais se queria em uma época de grandes
transformações.
Foi o engenheiro norte americano Robert Fulton que começou o emprego do vapor como elemento
de propulsão para o transporte marítimo. Aos treze anos de idade, Fulton que era filho de irlandeses,
desenvolveu seu primeiro aparato de propulsão para embarcações, adaptando-o a um barco pesqueiro. Em
1807, Fulton fez o seu navio Clermont subir o rio Hudson, de Nova Iorque até Albany, em 32 horas, o que
favoreceu mais tarde uma linha regular de transporte fluvial entre as duas cidades.
O transporte a vapor fluvial e lacustre logo proliferou nos Estados Unidos da América,
desenvolvendo-se mais do que na Europa. Enquanto que os EUA estavam desenvolvendo seus meios de
transporte e de ligação entre as cidades, com longas e difíceis distâncias a percorrer, a Europa já tinha toda
uma rede de comunicação terrestre interligando pontos relativamente curtos. Outra característica geográfica
é que os EUA têm uma rede de grandes e pequenos rios, canais e lagos que facilitavam a comunicação.
No entanto, na Europa a navegação a vapor também prosperou. Em 1816, o Élise, francês, fez a
travessia marítima do canal da Mancha em 17 horas, sob forte tempestade, alcançando Paris por via fluvial.
Fora da Europa, o Brasil foi um dos primeiros países a compreender a importância do navio a vapor;
já em 1826, o Marquês de Barbacena obteve concessão para estabelecer uma linha regular de navegação a
vapor no recôncavo baiano.
Em 1838, dois navios a vapor atravessaram o oceano Atlântico da Europa para a América do Norte.
Partindo de Londres, o primeiro a chegar foi o Sirius a Nova Iorque, inaugurando a travessia oceânica de
passageiros. Em sua viagem, o combustível que levara foi pouco, o que o obrigou a usar móveis, portas e
até um dos mastros como lenha para as caldeiras. A viagem, porém, foi feita toda a vapor. Quatro horas
depois do Sirius, chegou a Nova Iorque o segundo navio a vapor, o Great Western, que maior em tamanho
e capacidade de acomodação de passageiros e carga e com uma viagem mais bem planejada, chegou ainda
com os porões cheios de carvão.
Estas viagens inauguraram as travessias atlânticas a vapor, mas demonstraram que o navio a vapor
precisava de estoques de carvão para suas viagens, o que exigia paióis de armazenamento que, juntamente
com as máquinas, diminuía o espaço útil para a carga. Essas foram as duas grandes objeções que se
levantaram contra os navios a vapor para a marinha mercante. Aplicado, no entanto, com grandes vantagens
para o transporte de passageiros, o vapor logo se consagrou para a carga, sendo as dificuldades iniciais
superadas com o maior dimensionamento dos navios e o melhor aproveitamento do espaço a bordo.
Logo apareceram as primeiras companhias de navegação a vapor. A primeira delas foi a Cunard
Line, inaugurada em 1840 com a viagem do Britannia entre a Inglaterra e os Estados Unidos da América.
Em 1843, apareceu a grande novidade, o casco de ferro do Great Britain, construído pelo famoso
engenheiro naval Isambard Brumel. O Great Britain era dotado de hélice, o que também era novidade, pois
até então os navios de vapor eram de madeira, propulsados por rodas de pás laterais. Houve também,
frequentemente, navios com rodas de pás à popa, destinados mais à navegação fluvial, pois as rodas na
popa estavam protegidas de impactos em bancos de areia, pedras submersas ou de troncos, galhos, e outros
materiais flutuantes.
Durante a revolução do vapor, a marinha à vela atingiu o apogeu. Em 1845, apareceu nos Estados
Unidos da América o primeiro clipper, de casco longo e fino, com enorme superfície vélica, que lhe permitia
atingir alta velocidade. Em 1851, apareceu o Flying Cloud, o mais belo e mais rápido veleiro de todos os
tempos. O Clipper atravessava o Oceano Atlântico em aproximadamente 14 dias, fazia a ligação entre Nova
Iorque e São Francisco via cabo Horn, extremo sul da América do Sul, em 89 dias. Esse tipo de navio foi
amplamente usado no transporte de chá da Índia para a Europa, através do cabo da Boa Esperança até a
abertura do canal de Suez, em 1869.
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A Revolução Industrial também começou a mudar o porte das embarcações. Para atender à
crescente demanda de passageiros entre a Europa e a América, navios maiores começaram a aparecer,
dotados de grande conforto. O maior e mais revolucionário de todos os navios a vapor do século XIX foi o
Great Eastern, lançado ao mar em 1858, com 230 metros de comprimento, todo de ferro e deslocando
22.600 toneladas e que, além das pás laterais tinha um hélice. Sua velocidade alcançava 25 nós, podendo
transportar quatro mil passageiros ou dez mil soldados.
A supremacia do hélice sobre as rodas de pás laterais determinou a transformação das embarcações
e seus cascos começaram a ser feitos de ferro e depois de aço. O início do século XX já viu os grandes
liners, que majestosamente singravam o oceano Atlântico num intenso movimento mercante. Todas essas
transformações não se fizeram, entretanto, sem grandes implicações. A principal delas disse respeito ao
próprio homem que guarnecia os navios. Houve necessidade de todo um processo de formação de gente
apta para conduzir as novas máquinas. Não apenas formar, mas acostumar os marinheiros à nova paisagem
técnica que pouco a pouco tomou conta de suas vidas. A profissão especializou-se e qualificou-se de modo
diverso do que se fazia até então. O simples contato com o mar não credenciava mais um profissional
marítimo; era preciso mais: uma perfeita familiarização com os equipamentos mecânicos com que lidaria
dali em diante. A máquina tomou conta do navio, mas não alterou aquele espírito romântico e nostálgico
com que até hoje se experimentam as singraduras dos longos mares da Terra.
A marinha de guerra sempre foi conservadora. No livro Fatos da História Naval, os autores
descrevem que Napoleão já se queixava de seus almirantes, porque estes dificilmente aceitavam qualquer
ideia de inovação e que isso é uma peculiaridade dos homens do mar, particularmente dos que lutam no
mar, e que dificultou ainda mais a adoção do vapor nos navios de guerra.
No entanto, outros fatores pesaram muito na adoção dessa forma de propulsão para as marinhas de
guerra. Primeiro que as nações marítimas, dentre elas principalmente a Grã-Bretanha, tinham feito vultosos
investimentos em navios de madeira e à vela. Adotar o vapor àquela altura significava jogar fora todo o
investimento feito, já que novas táticas e novos métodos haveriam de surgir. Além disso, o vapor trazia
necessidades logísticas diferentes. O raio de ação reduzir-se-ia consideravelmente. Fazia-se imprescindível
o estabelecimento de toda uma rede fornecedora de combustível, lubrificantes e sobressalentes espalhada
pelo mundo, sem contar nos gastos com formação de pessoal e adoção de maquinários para dotar estaleiros
e oficinas.
Outro critério que pesava na escolha do vapor para os navios de guerra estava na confiança, ou
melhor, na falta de confiança na nova tecnologia. Os prejuízos ocorridos a um navio mercante, de cargas
ou passageiros, são mínimos em comparação a um navio de guerra. Não é apenas a integridade física das
pessoas a bordo que está ameaçada pela incapacidade de reparo e pronto emprego de um navio de guerra,
mas toda a capacidade dissuasória de uma nação. Sem credibilidade, uma marinha de guerra não é capaz
de cumprir com sua missão, e a credibilidade está diretamente condicionada pela capacidade da marinha
em demonstrar mobilidade, permanência, versatilidade e flexibilidade. Se qualquer um desses itens faltar,
faltará a credibilidade. As máquinas ainda não ofereciam a desejada segurança.
Um dos maiores problemas relacionados com a confiança dos navios a vapor por ocasião de seu
surgimento estava justamente nas pás laterais. Primeiro porque eram um alvo fácil, expostas não apenas ao
risco de acidentes com qualquer material flutuante acima ou fixo abaixo d’água, mas aos possíveis tiros
certeiros do inimigo. Segundo é que as rodas de pás laterais ainda tiravam muito espaço das laterais para a
colocação de canhões, pois a artilharia da época era disposta pelos bordos. Isso implicava a redução do
poder de fogo dos navios, ou seja, de seu poder ofensivo.
Aos poucos as marinhas começaram a construir alguns navios de vapor para a guerra. O Brasil
adquiriu na Grã-Bretanha, em 1825, a primeira unidade a vapor para sua marinha de guerra, a barca Correio
Imperial, um navio-auxiliar. Em dezembro de 1847, foi lançado ao mar na Inglaterra o primeiro navio de
combate a vapor que o Brasil teve, a fragata Dom Afonso, com rodas laterais.
Com a invenção do hélice em 1836, pelo inglês Francis Smith e o sueco John Ericson, as questões
foram mudando. Os inconvenientes das rodas de pás desapareceram. A vulnerabilidade da própria máquina
em relação ao inimigo também diminuiu quando passou a ser construída sob a linha-d’água, onde ficava
mais protegida. Em 1850, a França lançou ao mar a primeira belonave movida a hélice, o Napoléon,
construído pelo notável engenheiro naval francês Dupuy de Lôme. Em 1852, os ingleses lançaram o
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Agamêmnon, também a hélice. Era apenas mais um capítulo da corrida armamentista entre a Inglaterra e a
França após as Guerras Napoleônicas do início do século.
A Guerra da Criméia (1853-1856), envolvendo russos, turcos, gregos, ingleses e franceses serviu
para consagrar os navios a vapor, mas também trouxeram uma novidade: o navio dotado de couraça. Para
tomar o Forte de Kimburn, Napoleão III mandou construir cinco baterias flutuantes dotadas de proteção de
ferro (couraça). Destas, três (Lave, Tonnante e Dévastation) tomaram parte no assalto, com grande êxito.
Bombardearam duramente a fortaleza e quase não sofreram danos materiais. Isso chamou a atenção de
todas as marinhas do mundo para o valor da couraça. Em 1859, os franceses lançaram ao mar a fragata
Gloire, de madeira, mas dotada de couraça. Foi o primeiro navio propriamente couraçado que apareceu. No
ano seguinte, sob pressão da opinião pública, o Almirantado britânico lançou ao mar o Warrior of de Seas,
couraçado com o casco todo de ferro.
A Guerra de Secessão dos Estados Unidos da América (1861-1865) também serviu para demonstrar
o valor dos navios a vapor e dotados de couraça. No combate de Hampton Roads, em 1862, defrontaram-
se dois navios de couraça: a fragata confederada, sulista, Virginia (ex-Merrimac), com uma casamata, e o
navio novo federal, nortista, Monitor, que possuía uma torre giratória. A Merrimac tinha borda alta, toda
fechada. O Monitor tinha o convés ao nível d’água, sem borda-livre. A luta durou mais de duas horas, em
que esteve à prova a resistência das novas proteções, tendo sido o primeiro combate entre navios
encouraçados na história. O resultado tático foi indeciso, já que não houve vencedor neste combate. O
Monitor viria a consagrar a torre giratória e deu nome à toda uma classe de navios que existe até hoje, e
que teve pleno uso em várias guerras pelo mundo, como na Guerra do Paraguai ou da Tríplice Aliança,
entre Brasil, Uruguai, Argentina e Paraguai, logo após a Guerra de Secessão Americana, e mais
recentemente na guerra do Vietnã (1961-1972). O navio encouraçado estava consagrado depois de Hampton
Roads. O estrago feito pela Virginia nos navios de madeira que estavam no ancoradouro mostrou que a
madeira era impotente contra o ferro.
No Brasil, a oficialidade estava a par das grandes modificações que então ocorriam no mundo.
Nossas dificuldades na produção energética implicavam a importação do carvão, o que onerava bastante a
operação dos navios a vapor. O emprego dos navios mistos (a vapor e vela), porém, que ainda se fazia em
grande escala pelos mares, foi um recurso bastante usado aqui. Os ministros da Marinha frequentemente
recomendaram aos comandantes de navios que, nos cruzeiros ao longo da costa, apenas usassem velas,
empregando o vapor somente nos casos de manobras ou quando a necessidade assim o exigisse.
A última grande batalha naval brasileira com navios de madeira foi a do Riachuelo, em 1865. Esta
também foi a primeira batalha naval no mundo em que só se usou vapor. O navio encouraçado fez sua
aparição no Brasil durante a Guerra do Paraguai (1864-1870), por necessidade tática e estratégica do teatro
de operações. Os rios paraguaios estavam poderosamente defendidos pelas fortalezas e demais posições
armadas por Solano López. Para vencê-las era preciso contar com navios encouraçados. O governo imperial
encomendou navios encouraçados na França e na Inglaterra, ao mesmo tempo que mandou construí-los
aqui, no Arsenal de Marinha da Corte, hoje do Rio de Janeiro.
Durante a Guerra do Paraguai chegamos a possuir 17 navios encouraçados, dos quais seis monitores,
além de corvetas e fragatas. O primeiro navio dotado de couraça que possuímos foi a corveta Brasil, de
1864. Ela foi comprada na França, durante o período em que estivemos com as relações cortadas com a
Inglaterra devido a chamada Questão Christie, que está abordada na apostila de História do Brasil.
Os progressos dos recursos defensivos dos navios foram acompanhados pelos meios ofensivos. O
projetil passou a ser explosivo, o que definitivamente desabilitava os navios de madeira, como acontecera
com os navios turcos, impiedosamente destruídos pelos russos na Batalha de Sinope (1853) durante a
Guerra da Criméia.
Tal foi a preocupação com a defesa dos navios, que as couraças cresceram exageradamente de
espessura, variando de 8, 12, 14 e até 24 polegadas. Isso as tornou impenetráveis para os projetis, pois o
desenvolvimento do canhão não alcançara recursos capazes de fazer a penetração de tais peças de ferro.
Assim, apareceu, ou melhor, reapareceu uma arma antiga, o esporão. A massa do navio aliada à velocidade
de aproximação poderia levar o navio atacante a afundar o navio inimigo pelo impacto de seu esporão sobre
o casco adversário.

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No começo do emprego dos navios encouraçados, as obras-vivas dos navios não eram protegidas
pelas couraças, o que facilitava a penetração do esporão, já que este ficava sob a água. O esporão veio
modificar radicalmente a tática naval, que voltou a ser a do abalroamento, como era dois mil anos antes.
Foi em 1866 que se deu a primeira batalha contemporânea em que o esporão foi empregado com
êxito. Somente com o advento da artilharia pesada nos fins do século XIX, é que o canhão retomou seu
lugar na tática naval. Isso se deu particularmente a partir de 1905, na Batalha de Tsushima, após o
afundamento de um encouraçado por tiros de canhão durante a Guerra Russo-Japonesa (1904- 1905).
Mesmo assim, a arquitetura naval ainda conservou as proas dos grandes encouraçados com a forma de
aríete durante muito tempo.
Outra grande novidade da Revolução Industrial na marinha de guerra foi o advento do submarino.
Surgido já na Guerra da Revolução Americana (1776-1783), quando fracassou em sua missão de adaptar
uma carga explosiva no casco de um navio de guerra inglês, o submarino teve maior impulso a partir de
meados do século XIX, quando apareceram o Brandtaucher dos prussianos (1850) e o Plongeur dos
franceses (1863).
A técnica de construção deste tipo de navio só foi propriamente dominada no fim do século XIX.
Foi então que se manifestou uma intensa atividade, cujos princípios básicos tinham sido elaborados por
John P. Holland e Simon Lake, dos Estados Unidos, Nordenfeldt, da Suécia, Garret, da Inglaterra, e Isaac
Peral, da Espanha. A França tomou a chefia do movimento com os submarinos Gymnote, Gustave Zedé e
Narval, bem como com suas flotilhas de pequenos Goubet elétricos. Mas o Holland, adotado pela marinha
norte-americana em 1900, devido ao construtor John P. Holland, é tido geralmente como o protótipo do
submarino moderno, que, hoje em dia, impulsionado por um potente reator atômico e armado com mísseis
balísticos, ameaça tornar-se o autêntico navio de guerra do futuro próximo.
No Brasil, nossos primeiros submarinos vieram em 1913, construídos na Itália, os famosos classe F
(F 1, F 3 e F 5).
Foi, porém, o começo do século XX que trouxe o orgulho das esquadras. A Grã-Bretanha lançou ao
mar em 1906 o Dreadnought, encouraçado que tornou imediatamente obsoletos todos os demais
encouraçados que não eram de sua classe. Ele tinha dez canhões de 12 polegadas dispostos em cinco torres
duplas, com poder de fogo duas vezes e meia maior do que os navios de linha de seu tempo. Sua velocidade
alcançava 21,5 nós, com máquinas de 27.500 HP. Deslocava 17.900 toneladas, com 183 m de comprimento
e 8,5 m de calado. Seu custo foi a terrível realidade de £ 1.813.100, preço astronômico para a época. O
Dreadnought revolucionou tanto as marinhas de guerra, que, assim como o Monitor norte-americano, deu
nome a um tipo de navio, passando a ser também substantivo comum. Daí em diante, os navios de linha
passaram a ser pré-dreadnought, dreadnought, ou, pouco depois, super-dreadnought. Dentre estes estava o
Queen Elizabeth, construído em 1914, com 25 nós de velocidade, oito canhões de 15 polegadas e 16 de 6
polegadas.
O Brasil também acompanhou o grande progresso dos navios de linha, recebendo, em 1909 e 1910,
os dreadnoughts Minas Gerais e São Paulo, de 19.300 toneladas, com 12 canhões de 13 polegadas (305
mm). Deixamos de receber o Rio de Janeiro, de 1912, maior navio do mundo em sua época, com 27.500 t
e 14 canhões de 12 polegadas, que foi vendido à Turquia pelo governo do Marechal Hermes da Fonseca e,
durante a Grande Guerra, arrecadado pela Grã-Bretanha com o nome de Agincourt.

A RODA VAI GIRANDO:


O navio de madeira tinha conduzido a guerra nos mares durante mais de dois séculos. O encouraçado
pesado apenas conseguiu manter sua supremacia durante 50 anos. Qual teria sido o único e verdadeiro
inimigo? A marcha do progresso, que quebra a associação de ideias já concebidas, pois nunca houve nas
grandes questões marítimas, como em qualquer outro assunto, uma época de aperfeiçoamento mais rápido
do que na primeira metade do século XX.
No entanto, durante certo tempo, o navio de guerra ficou como a expressão suprema do poderio
nacional, não apenas para as potências navais clássicas da Europa, mas também para as novas nações em
ascensão, como os Estados Unidos da América, o Japão e a Alemanha, cujas vitórias no mar anunciaram
pela primeira vez que o equilíbrio das forças ia ser quebrado. Deste modo, em 1898, os Estados Unidos da
América, com sua esquadra incipiente, triunfaram facilmente da Espanha, em águas ocidentais e, em 1905,
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os japoneses, que já tinham mostrado dez anos antes seu poderio marítimo numa guerra curta com a China,
puseram em xeque as ambições orientais dos russos numa grande batalha naval no estreito de Tsushima.
Os navios japoneses de Tsushima eram, em sua maioria, de construção britânica, visto que a Grã-Bretanha
se mantinha a senhora incontestável dos mares. No ano seguinte, o Dreadnought britânico, com seus
canhões de 12 polegadas e sua velocidade de 21 nós, superara todas as outras belonaves e inaugurava a
corrida dos armamentos que deveria conduzir à Primeira Guerra Mundial.
Desde 1914 que a Alemanha, nova potência naval, tinha começado a ameaçar a Grã-Bretanha com
uma esquadra de alto-mar (hoch see flotte) que era considerada a segunda do mundo. Além disso, no
decorrer dos primeiros anos de guerra, enquanto os exércitos se atolavam na frente ocidental, tornou-se
evidente para muitos espíritos que a decisão teria que ser tomada no mar. As esquadras francesa e britânica
mantinham um precário domínio nos oceanos, encerrando a Alemanha num bloqueio que ela seria obrigada
a quebrar caso não quisesse perder a guerra. A Batalha da Jutlândia, em 1916, pôs frente a frente, no mar
do Norte, as duas esquadras mais poderosas do mundo, mas, não obstante todas as perdas sofridas pelos
britânicos durante esse combate, não conseguiram afrouxar o nó corredio britânico. No ano anterior (1915),
os ingleses desesperando de romper a frente ocidental, tinham tentado atacar a Alemanha pelo flanco,
organizando um ataque anfíbio nos Dardanelos. Ambas as operações falharam e a partida continuava
empatada. Como poderia a Alemanha quebrar o cerco? A única resposta possível estava no submarino.
O submarino, utilizado pela primeira vez pelos alemães no mar alto, já tinha mostrado suas
possibilidades, ao afundar, em 1914, três cruzadores britânicos com suas tripulações, e ao torpedear, em
1915, o paquete Lusitânia, o que muito contribuiu para envenenar as relações com os Estados Unidos da
América. Em 1917, as perdas aliadas ascendiam a meio milhão de toneladas por mês. No entanto, a partir
de 1918, com a entrada dos Estados Unidos da América na guerra e, ao mesmo tempo, a reorganização do
sistema de comboios, o vento começava a virar.
A Segunda Guerra Mundial foi fértil em surpresas. O navio-aeródromo destronou irrevogavelmente
o encouraçado. No princípio das hostilidades, os ingleses perderam o Royal Oak, torpedeado por um
submarino e, mais tarde, no Pacífico, duas belas unidades, o Prince of Wales e o Repulse, destruídas por
aviões japoneses. Os alemães tinham construído maravilhosos e modernos vasos de guerra: Graf Spee,
Bismarck, Scharnhost, Gneisenau e Prinz Eugen, mas, depois de alguns ataques mortíferos contra as
unidades aliadas, foram reduzidos à impotência, a partir de 1942. Os franceses não tiveram possibilidades
de utilizar sua esquadra, que renascia. Parte dela foi, em 1940, impiedosamente destruída pelos ingleses em
Mers el Kébir, tendo quase todo o resto afundado por vontade própria em Toulon, em 1942, para evitar que
caísse nas mãos dos inimigos. Por seu lado, os italianos, como não tinham radar, foram surpreendidos e
vencidos pelos ingleses em 1941 na Batalha do Cabo Matapã. Em seguida, por falta de carburante, seus
navios viram-se ignominiosamente obrigados a permanecer no porto. Foi, no entanto, a inexistência de
navios-aeródromos e de radar que levou os italianos a perderem a guerra naval. Em 1941, os norte-
americanos sofreram o desastre de Pearl Harbor, mas, daí até 1945, afundaram a maior parte da esquadra
japonesa, compreendendo alguns monstros de 64.000 t, como o Yamato.
Como é natural, as unidades de superfície entraram frequentemente na luta, principalmente no
Pacífico. No entanto, o equilíbrio das forças foi sempre salvaguardado pelo navio-aeródromo e pelo
submarino. No Atlântico, a guerra submarina foi um pouco menos espetacular do que tinha sido durante o
primeiro conflito mundial, se bem que, no auge da campanha, os alemães dispusessem de 400 submarinos.
Para mais, as medidas tomadas contra os submarinos mostraram-se eficazes e, a partir de 1943, com o
aparecimento de navios norte-americanos pré-fabricados, dos tipos Liberty e Victory, a ameaça estava
conjurada. No Pacífico, os submarinos norte-americanos desempenharam um papel decisivo na derrota
japonesa, afundando mais de metade da tonelagem comercial nipônica e perto de 30% de suas unidades de
guerra. Mais tarde, de colaboração com outros navios, levaram, gradualmente, a guerra de ilha em ilha, até
atingirem o arquipélago nipônico. Em 1945, operavam no Pacífico 150 navios-aeródromos britânicos e
norte-americanos.
A Segunda Guerra Mundial viu o desenvolvimento de ataques anfíbios altamente organizados, os
quais começaram em 1940 com a invasão alemã da Noruega e continuaram com a extraordinária retirada
anfíbia, levada a cabo, no decorrer desse mesmo ano, pelo Exército inglês em Dunquerque, sob o fogo
inimigo. Numerosos engenhos especializados para o desembarque foram aperfeiçoados para facilitar a ação
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aliada nas costas do norte da África, da Sicília, da Normandia e da Provença. O desembarque na Normandia,
apoiado por mais de 2 mil aviões, 800 navios de guerra e 4 mil barcos das mais variadas espécies, viu
generalizar-se o uso de portos artificiais. Similares técnicas de desembarque deveriam, daí em diante, vir a
ser empregadas no Pacífico.
Também os paquetes tiveram um papel importante na guerra, funcionando como transportes de
tropas. Levaram, dum continente a outro, 1,5 milhão de soldados, e há mesmo quem afirme que os
gigantescos Queen Mary e Queen Elizabeth conseguiram, graças a seus serviços, abreviar as hostilidades
pelo menos em um ano. Esta estatística mostra, por si só, como o paquete evolucionou desde a época do
Great Western em 1838, com suas 1.755 t de arqueação e seus 8 nós de velocidade. Em comparação, o
Queen Elizabeth andava a 30 nós, deslocando 86.673 toneladas.
A era dos transatlânticos gigantes, autênticos palácios flutuantes, rivalizando entre si na velocidade,
no tamanho, no conforto e no prestígio nacional, iniciou-se em 1907, com o Mauretânia e seu infeliz gêmeo
Lusitânia. O Mauretânia, com suas linhas puras, suas quatro imponentes chaminés e sua velocidade (os
quatro hélices permitiam-lhe atingir 25 nós), conservou a bandeira azul durante mais de 22 anos, efetuando
o percurso Europa–América em 4 dias e 16 horas, o que ainda atualmente se pode considerar honroso. Tanto
ele como o irmão foram os primeiros grandes navios mercantes a turbinas, se bem que ainda fossem
alimentados a carvão e não a nafta, o que implicava em 324 homens à fornalha, para padejarem por dia
cerca de 1.000 t de combustível para suas caldeiras. No tempo dos grandes transatlânticos, o público tinha
seus favoritos. Foram surgindo o Olympic, construído em 1912, e seu irmão gêmeo Titanic, que afundou ao
chocar com um iceberg na viagem inaugural; o maravilhoso Aquitania, de 1914, que viria a ser reformado
em 1950; em 1927, o inesquecível Île de France; em 1929, o alemão Bremen; em 1933, o italiano Rex; em
1935, o Normandie, obra-prima de arte decorativa, mas que viria a arder no porto de Nova Iorque, em 1942;
em 1939, o holandês New Amsterdam etc.
Apesar das grandes perdas motivadas pelas duas grandes guerras, a frota mercante mundial foi
sempre aumentando com regularidade, à medida que ia se especializando. Uma grande variedade de
transportes, desde os pequenos navios de cabotagem aos petroleiros gigantes, percorre todos os mares, todos
os portos e todos os rios navegáveis do mundo e, pouco a pouco, vai substituindo os clíperes e os veleiros
do cabo Horn. O desenvolvimento mais espetacular diz respeito aos petroleiros. Tendo começado em 1886
com algumas pequenas unidades de menos de 3.000 t, a frota petroleira atingiu a proporção de 16% da
totalidade da tonelagem mundial, às vésperas da Segunda Guerra Mundial. Hoje, principalmente graças ao
espírito empreendedor de certos ricos armadores de nacionalidade grega, tem aumentado constantemente.
Por exemplo, o petroleiro francês Esso Parentis, de 1958, colosso de 38.000 t, pode navegar a 17 nós. Cada
vez há maior tendência para equipar tanto cargueiros como paquetes com diesel, dando assim o golpe de
misericórdia no navio a vapor, que não chegou a reinar um século. Os navios comerciais mais
especializados, os de pesca, tornaram-se oficinas flutuantes, principalmente os baleeiros, capazes de
capturar e acomodar toneladas e toneladas de sua carga em cada viagem. Hoje em dia, muitas nações lançam
suas frotas de pesca em todos os oceanos, encontrando-se ainda algumas delas representadas pelos últimos
veleiros.
Os últimos veleiros! Não poderemos fazer tal afirmação, pois o veleiro de recreio subsiste. Sempre
houve barcos de recreio, mas foi Carlos II da Inglaterra, grande apaixonado pelo mar, quem inaugurou a
moda do iatismo. O iate dos holandeses era um rápido e pequeno veleiro, bom marinheiro, armado com
pouco pano e utilizado frequentemente no transporte do correio diplomático ou de passageiro de marca.
Carlos II mandou construir 26 iates desse tipo, utilizando-os não só nos negócios de Estado, mas também
para seu prazer e para regatas. No século XVIII, quando a guerra naval se tornara uma arte de bem manobrar,
o iatismo popularizou-se pela força das circunstâncias. As regatas de Cows começaram em 1810 e, em
meados do século, esse tipo de desporto tinha conquistado vários países, de tal forma que as grandes regatas
passaram a fazer parte de seus costumes.
Os tipos de iates de competição eram tão diversos que, em 1878, foi necessário adaptar o handicap
ou abono. A partir de 1907, com a função da International Yacht Racing Union, foram prescritos
regulamentos uniformes para todos os gêneros de regatas e todas as classes de embarcações. O iate a vapor,
que apareceu a partir de 1825 e foi em parte desprezado pelos verdadeiros marinheiros até cerca de 1850,
em breve se tornou uma necessidade na vida dos reis e dos milionários, como os Astor e os Vanderbilt nos
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Estados Unidos da América. O barco a motor, também chamado por graça de “o iate do pelintra”, estreou-
se no começo do século XX com frágeis engenhos, impulsionados pelos primeiros motores de automóvel.
Em 1920, a grande burguesia adotava-o. Atualmente, os grandiosos veleiros tornaram-se acessíveis a quem
possua alguns rendimentos e grande amor ao mar.
Depois da Segunda Guerra Mundial, as marinhas de guerra sofreram rápidas transformações e seu
futuro ainda hoje, nessa última terça parte do século XX, é incerto. A Grã-Bretanha, outrora senhora dos
mares, já só nos aparece em terceiro lugar, depois dos Estados Unidos da América, que estão à cabeça com
grande avanço, e da União Soviética. A natureza e a função do navio de guerra evoluíram igualmente. Desde
que a artilharia clássica perdeu sua importância, o encouraçado cedeu lugar ao navio-aeródromo.
Cruzadores, contratorpedeiros e unidades menores dependem atualmente do navio-aeródromo, como
antigamente dependiam do encouraçado. O avião com cargas nucleares tornou-se arma naval e os EUA
aumentam, cada vez mais, a frota de enormes navios-aeródromos, tipo Forrestal (60 mil toneladas),
suscetível de lançar para o ar 32 bombardeiros em quatro minutos. O navio-aeródromo funciona à maneira
de uma base naval, de forma a poder operar em qualquer parte do mundo. A arma do cruzador e de outras
unidades de superfície é o míssil teleguiado, capaz de assegurar a defesa antiaérea, de alvejar outro navio,
ou ainda de destruir instalações portuárias. Para aumentar o alcance e a mobilidade de suas unidades de
superfície, os EUA empreenderam um programa de navios atômicos, como o navio-aeródromo Enterprise,
gigante de 85.350 t, e o Long Beach, cruzador lança-mísseis teleguiados. Os navios-aeródromos classe
Nimitz são, no início deste século XXI, os maiores navios de guerra do mundo; podem levar 100 aviões e
seus reatores desenvolvem mais de 260 mil cavalos-vapor.
Na hora em que todas as grandes nações dependem, para sua defesa, de mísseis atômicos
intercontinentais e de bombardeiros estratégicos, o papel duma frota de superfície parece contestável. Pode
ser principalmente útil nos conflitos menores, onde a mobilidade é primacial, e igualmente na caça a
submarinos. Com efeito, o submarino, engenho outrora desprezado, revestiu-se de novo e terrível
significado. Os russos não têm navios-aeródromos, mas possuem a maior frota de submarinos do mundo,
compreendendo vários de propulsão nuclear. Os EUA, no entanto, mantêm-se à frente no que respeita a
submarinos atômicos. Sua frota aumenta com monstros pisciformes e rápidos, capazes de operarem imersos
durante meses e daí lançarem 16 mísseis balísticos Polaris sobre os objetivos.
O primeiro submarino de propulsão nuclear foi o Nautilus, lançado ao mar em 1954, criado pelo
Almirante Hyman Rickover, personalidade energética que, apesar das enormes dificuldades, conseguiu
terminar o projeto em tempo recorde. Desde aí os EUA lançaram à água uma importante frota de submarinos
atômicos de vários modelos. Dentre estes encontra-se o Triton, unidade impulsionada por dois reatores e
dispondo de um radar tão aperfeiçoado que parece um verdadeiro laboratório eletrônico flutuante. O
submarino atômico, com seu enorme potencial de guerra, tem o futuro à frente, mas talvez venha a se tornar
no paquete ou no cargueiro do futuro. Em 1958, o Nautilus, imitado mais tarde pelo Skate, passou do
Atlântico para o Pacífico sob a calota polar ártica, navegando a maior parte do tempo debaixo de bancos de
gelo e reconhecendo, pela primeira vez, a passagem noroeste, de enorme importância prática.
Tanto na superfície como nas profundidades, o futuro é assunto para conjecturas. Os franceses
arriscaram muito no seu magnífico e moderno paquete France; os italianos fizeram entrar em serviço, em
1964, duas grandes unidades; mas na Inglaterra, a Companhia Cunard decidiu não substituir
apressadamente o Queen Mary, já envelhecido. O futuro será, certamente, do paquete de tonelagem média,
de utilização mais elástica, que responderá também não só à procura de passageiros regulares, mas à voga
crescente dos cruzeiros oceânicos. Experiências feitas com novos tipos de embarcações, talvez no futuro,
venham atingir realizações revolucionárias.
O hidrodeslizador, do tipo hovercraft, que avança sustentado por uma almofada de ar, poderá ser
utilizado para travessias rápidas no Mancha. Além disso, a técnica da asa imersa, que levanta a quilha do
barco por cima das vagas para aumentar a rapidez, aperfeiçoa-se incessantemente. Quanto à investigação
submarina, o batiscafo do Professor Augusto Piccard e de seu filho Jacques (Jaime) permitiu, em 1960,
atingir o máximo absoluto de profundidade, ou seja, 12.600 m numa fossa do Oceano Pacífico. Tudo isso
é o prelúdio dum programa de investigação, cuja importância aumentará com o advento do submarino
atômico.

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DA VELA AO VAPOR:
Os melhores veleiros dependiam do capricho dos ventos. Consequentemente, não é para admirar
que, no decorrer dos séculos, tenham surgido numerosos projetos para substituir essa fonte de energia por
qualquer outra mais segura e mais constante. A grande ideia era a roda acionada por animais de tração ou
por músculos humanos. Assim foi na China, no tempo dos romanos e na Idade Média. Em 1798, quando
Napoleão planejava invadir a Inglaterra, um inventor propôs-lhe uma “fortaleza flutuante”, enorme jangada,
munida de rodas com pás, postas em movimento por quatro aparelhos acionados pelo vento e instalados um
em cada canto. As fragatas inglesas ter-lhe-iam chamado um figo!
Quando apareceu pela primeira vez no século XVIII, o navio a vapor era quase tão primitivo como
esse engenho. Ele também foi igualmente desprezado, pois, ao contrário do veleiro que tinha seguido uma
evolução contínua, o navio a vapor era concebido por gente de terra e, como tal, apresentava-se como um
subproduto, não do oceano, mas da Revolução Industrial. Os verdadeiros marinheiros desprezavam-no ao
mesmo tempo que o temiam. Durante vários anos, o navio a vapor sulcou as águas dos rios que o tinham
visto nascer, longe dos mares tumultuosos onde combatiam os navios de linha e onde os navios de longo
curso ligavam incessantemente à Europa as Índias Orientais e Ocidentais. Pouco a pouco, o vapor foi-se
aventurando no mar alto, especializando-se em primeiro lugar no transporte de passageiros, onde a
regularidade era motivo de recompensa. Depois, nos meados do século XIX, foi adotado pela marinha de
guerra e, finalmente, pela marinha mercante, onde então reinava o clíper, o último e o mais belo de todos
os veleiros.
A máquina a vapor tinha dado o poderio e o impulso à Revolução Industrial. Construído à volta de
seu motor, o navio a vapor estava ligado ao progresso de sua central térmica. A primeira máquina, chamada
atmosférica, de Newcomen (cerca de 1700), era demasiadamente fraca para movimentar um barco. O
mesmo se pode dizer da marmita de Denis Papin que, pela mesma época, seu autor parece ter querido
adaptar a um navio de pás.
Isto, porém, ficará para sempre um mistério, pois o protótipo de Papin foi destruído em 1707 por
marinheiros ciumentos. Papin desistiu. Depois de Jaime Watt, por volta de 1770, ter inventado a primeira
máquina a vapor digna deste nome, outras tentativas foram feitas em França para a aplicar à navegação. Os
Condes de Auxiron e Follenay construíram um navio a vapor, que foi afundado no Rio Sena (quem sabe se
por barqueiros alarmados), mesmo antes de ter sido experimentado. Foi o Marquês de Jouffroy d’ Abbans
quem, em 1783, fez a primeira demonstração dum vapor viável. O seu pyroscapho conseguiu subir a
corrente do rio Saona durante 15 minutos.
A América do Norte sucedeu à França. A imensidade de suas distâncias, a mediocridade de suas
estradas e a abundância de rios favorecia a navegação a vapor. Cerca de 1760, o industrial Guilherme Henry
tentou lançar um navio a vapor no rio Conestoga e, em 1802, Olívio Evans, da Filadélfia, um dos primeiros
inventores da caldeira a alta pressão, construiu uma enorme draga anfíbia, capaz de avançar com
exasperante lentidão, tanto em terra como no mar. Mais ou menos na mesma época, João Stevens construiu
vários navios a hélice e, em 1808, efetuou com o Phoenix, por meio de seu engenho de pás, o primeiro
trajeto marítimo de Nova Iorque a Delaware. Os mais célebres desses pioneiros, porém, foram Fitch e
Fulton, duas personalidades completamente diferentes. Com efeito, enquanto Roberto Fulton provocou
admiração por seu talento de engenheiro e de homem de negócios, João Fitch não passava de um sonhador
quimérico e sempre sem dinheiro. No entanto, foi o primeiro a construir uma série de navios providos de
remos mecânicos que trabalhavam nos bordos ou à popa. Um desses engenhos efetuou um serviço regular
no rio Delaware durante o verão de 1790, cobrindo mais de 3.200 km. Fitch, porém, tinha o complexo da
adversidade. Depois de alguns anos de miséria, suicidou-se em 1798.
Foi Fulton, com seu espírito de assimilação universal, que finalmente transformou o brinquedo de
seus predecessores num meio de transporte prático. Sofreu a influência de Guilherme Henrique, aliás como
Fitch a sofrera também e, em 1793, partiu para a Inglaterra, com o intuito de falar de navios e de motores
com alguns pioneiros, tais como Watt e Boulton. Depois de 1797, mandou construir em França um pequeno
submarino, o Nautilus, acionado por uma vela à superfície e por um hélice manual quando imerso. Em
1802, associou-se a Roberto Livingston, ministro dos Estados Unidos da América em Paris, com o fim de
construírem navios a vapor. Em 1803, experimentaram no rio Sena, com pleno êxito, um primeiro e pequeno
engenho. Depois, tendo encomendado a Watt e a Boulton um conjunto de máquinas com peças
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desmontáveis, regressaram à América do Norte, onde construíram o seu Clermont. Este começou por ser
conhecido como “o capricho de Fulton”, mas, quando em agosto de 1807, subiu o rio Hudson até Albany
em 32 horas e tornou a descer em 30 horas, os céticos tiveram que se render à evidência. Estava demonstrada
a possibilidade de navegação a vapor. O Clermont iniciou a 1o de outubro uma linha regular entre Nova
Iorque e Albany transportando em cada viagem perto de 100 passageiros Nos Estados Unidos da América
a navegação a vapor expandiuse rapidamente. Em 1809, o Lago Champlain viu resfolegar seus primeiros
vapores. O New Orleans, de Fulton, Livingston e Nicolau Roosevelt entrou em serviço em 1812 no rio
Mississipi. Em 1822, esse rio e seus afluentes orgulhavam-se dos 35 vapores que, com o pequeno calado,
altas chaminés, balanceiros e enormes rodas de pás iriam se tornar característicos desses cursos d’água.
Na Europa, onde as estradas eram boas, a navegação a vapor progrediu mais lentamente. Houve
tentativas isoladas. Na Escócia, cerca de 1780, Patrício Miller equipou com um motor construído por
Guilherme Symington dois dos seus navios a pás e duplo casco. Um outro desses motores acionou em 1802
o rebocador Charlotte Dundas. Os serviços comerciais começaram na realidade com o Comet, de Henrique
Bell, que desde 1812 servia o rio Clyde, de Glasgow até Greenock. Cada viagem custava cerca de 3 a 4
xelins. A partir de 1815, o rio Clyde era percorrido por 15 navios a vapor e havia muitos mais em serviço
na Grã-Bretanha. A França, neste capítulo, estava muito atrasada e, em 1835, tinha apenas 82 vapores contra
os 500 da Inglaterra. Daí por diante, os navios começaram a pulular em todos os lagos e rios da Europa,
arriscando-se em seguida a afrontar os oceanos. Em 1816, o Élise efetuou uma perigosa viagem de 17 horas,
em pena tempestade, através do canal da Mancha, tendo depois subido o rio Sena para ser aclamado em
Paris. Três anos mais tarde, um magnífico veleiro norte-americano, o Savannah, equipado com rodas de
pás e com um motor auxiliar, realizou a travessia de ida e volta do oceano Atlântico.
No entanto, o veleiro continuava a ser o rei dos mares. As potências europeias, esgotadas pelas
guerras contra Napoleão, estavam dispostas a manter o statu quo. Para isso, utilizavam suas formidáveis
esquadras a vela, que intimidavam os revoltosos, quer fosse pela simples exibição de suas bandeiras, ou por
um bombardeamento, ou até por uma guerra em miniatura, se tal se tornasse necessário. De tempos em
tempos, as marinhas davam-se ao luxo de uma pequena aventura. Em 1827, as esquadras de França,
Inglaterra e Rússia juntaram-se para esmagar os turcos na batalha de Navarino, e assegurarem a
independência da Grécia. Em 1830, os franceses atacaram Argel e começaram a construir um império na
outra margem do mar Mediterrâneo. Entretanto, as potências tradicionalmente coloniais, em especial a
Inglaterra e a Holanda, consolidaram as vastas possessões que tinham, mantendo as rotas comerciais por
meio de seus navios de longo curso da Ásia. Foi então que começaram a aparecer, quase por toda a parte,
as graciosas embarcações da Nova Inglaterra, transportadoras de bacalhau para a Europa e para as Antilhas,
de gelo para os portos importantes, e que trocavam peles do Alasca por chá, seda e porcelana do Celeste
Império. Quando, depois de 1820, a indústria britânica de baleias sucumbiu, os marinheiros da Nova
Inglaterra, que caçavam baleias desde épocas coloniais, redobraram seus esforços, penetrando, segundo as
palavras de Melville, “mesmo através dos estreitos de Bering e nos cantos e recantos mais secretos do
planeta”. Os exploradores avançaram ainda mais longe; João Ross e Eduardo Parry penetraram no Ártico,
em busca da passagem do Noroeste, enquanto Jaime Ross (sobrinho do precedente) e o francês Dumont
d’Urville partiam para o oceano Antártico.
Na altura do aparecimento da navegação a vapor, a marinha a vela atingiu o apogeu de sua glória.
O clíper, com o casco comprido e estreito, a roda da proa afilada e sua enorme superfície vélica, era feito
para a velocidade. Tinha sido concebido para responder à procura de chá fresco, vindo das Índias, e teve
sua consagração quando a descoberta do ouro na América e na Austrália incitou as multidões a emigrar.
Parece ter sido inventado na América, tendo o primeiro verdadeiro clíper, o Rainbow, de 1845, sido
desenhado por João Griffiths, de Nova Iorque. O veleiro mais rápido e certamente o mais belo de todos os
tempos foi o Flying Cloud, de Donald McKay, construído em 1851. Quanto ao seu Great Republic, de 108
metros de comprimento, foi provavelmente a maior unidade jamais construída em madeira. Os melhores
clíperes atravessavam o Oceano Atlântico em 14 dias, ligando Nova Iorque a São Francisco via cabo Horn
em 89 dias. Quando a Guerra de Secessão interrompeu o tráfego dos clíperes norte-americanos, os clíperes
ingleses, com o famoso Cutty Sark, sucederam-lhes até o momento em que se abriu o canal de Suez. Essa
obra, terminada em 1869, assegurava aos vapores o comércio do Oriente e tocava o dobre de finados para

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a marinha dos veleiros. Os navios do cabo Horn, de casco metálico, com quatro ou cinco mastros,
sobreviveram até o século XX, mas desapareceram completamente a seguir.
Enquanto os clíperes navegavam através dos oceanos, os pesados vapores, tal como a tartaruga da
fábula, avançaram de forma lenta mas segura. Em abril de 1838, dois vapores chegaram à baía de Nova
Iorque, inaugurando o serviço de passageiros através do oceano Atlântico. O pequeníssimo Sirius,
carregado com 94 passageiros (especialmente construído para o mar da Irlanda), fez toda a viagem a vapor,
mas, tendo pouco carvão, a tripulação viu-se obrigada a queimar móveis, beliches, portas de cabines e, por
fim, até um dos mastros. Quatro horas depois, o Great Western, construído pela companhia ferroviária do
mesmo nome, sob desenho do notável arquiteto naval Isambard Kingdom Brunel, chegava a Nova Iorque
com oito passageiros a bordo e os paióis cheios de carvão. Foi este o primeiro autêntico navio transatlântico,
ao qual se seguiram numerosos navios do mesmo tipo. Entre estes, contava-se o Great Britain (1843), que
Brunel tinha dotado com um revolucionário casco de ferro com hélice. Podia transportar 260 passageiros e
1.200 toneladas de carga. Depois do êxito do Great Western, começaram a formar-se as primeiras
companhias de navegação a vapor. A primeira foi a Cunard Line, inaugurada em 1840 por Samuel Cunard,
com a primeira viagem do Britannia, da Inglaterra a Boston. Depois apareceram, a partir de 1849, a Collins
Line (EUA); de 1858, a HamburgAmerika Linie; de 1858, a Norddeutcher Lloyd; e, finalmente, a
Companhia Geral Transatlântica, inaugurada em 1864. Pela mesma época, steamers norte-americanos
começavam a atravessar o Oceano Pacífico e, em 1839, a Peninsular and Oriental Line enviava seus navios
subindo o mar Vermelho até Alexandria, ao encontro dos da Companhia das Índias Orientais.
Nesses primeiros navios, o conforto dos passageiros era bem superior ao que os veleiros podiam
oferecer. Já em 1809, o Clermont tinha 54 beliches destinados à viagem noturna para Albany. No entanto,
os esplendores dourados das últimas unidades do rio Mississipi, com roda à popa, raramente foram
ultrapassados. Em 1840, uma companhia francesa oferecia “todas as comodidades desejadas, cabines
espaçosas, salões ricamente decorados, mobiliados com gosto e embelezados com espelhos e tapetes...” Isto
apenas dizia respeito à primeira classe. Os passageiros da terceira, na sua maioria emigrantes, apenas
dispunham de uma rede para se deitarem ou de um simples lugar na coberta. Cerca de 1850, a emigração,
principalmente para os Estados Unidos da América, aumentou desmesuradamente.
O mais famoso e mais azarento dos navios da época foi o gigantesco Great Eastern, de Brunel,
lançado à água em 1858. Matou Brunel de desgosto, arruinou a companhia que o mandara construir e, como
navio de passageiros, foi um fiasco completo, se bem que, finalmente, tenha prestado bons serviços no
assentamento de cabos submarinos. Seu duplo casco era de ferro; duas rodas de pás e um hélice o
propulsionavam. Podia transportar 4 mil passageiros, se bem que isso não tivesse acontecido com
freqüência, pois logo que foi posto no serviço, em 1860, verificou-se que balançava horrorosamente.Foi
reformado dois anos mais tarde. No entanto, o Great Eastern tinha meio século de avanço sobre sua época.
Sua tonelagem manteve-se inigualada até 1904.
Transatlânticos de modelo mais vulgar progrediram rapidamente durante a segunda metade do
século XIX. Os cascos passaram a ser construídos apenas de ferro e, por fim, de aço. Se bem que a roda de
pás inspirasse grande confiança aos passageiros, o hélice acabou por se impor. As velas desapareceram. O
tamanho e a velocidade aumentavam em cada nova unidade e, a partir de então, dois ou três hélices e uma
máquina de tripla expansão entravam no domínio público. Foi então que o cargueiro especializado começou
sua carreira, primeiramente como navio para transporte de carvão; depois da abertura do canal de Suez,
para fornecer os portos de escala; por fim, como navio de carga universal.
Depois de 1850, a Revolução Industrial europeia começou a estender-se a todo o mundo. Ao cabo
de meio século, uma boa parte da Ásia e da África estava colonizada, enquanto os imigrantes afluíam às
duas Américas, à Austrália e à Nova Zelândia. Por fim, os portos do Japão, depois de tanto tempo
aferrolhados, cederam após o Comodoro M. C. Perry ter estabelecido relações comerciais com o império
nipônico em 1854. O instrumento dessa expansão tinha sido a marinha a vapor, tanto mercante como de
guerra. No entanto, os almirantados só adotaram o vapor como último recurso, supondo que as rodas de pás
eram demasiadamente vulneráveis para os combates. Começaram por utilizar pequenas fragatas mistas,
como a Sphynx, construída em França em 1829, mas foi apenas em 1836, quando o inglês Francisco Pettit
Smith e o sueco João Ericsson inventaram um hélice prático, que os navios de guerra passaram a usar
completamente a nova força motora. Brunel, com seu navio experimental Rattler, construído em 1841,
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obteve um verdadeiro triunfo sobre o Alecto, navio a rodas de pás, numa autêntica prova de força disputada
em 1841. Igualmente convertidos ao hélice, os franceses laçaram seu Napoléon em 1850, concebido por
Dupuy de Lôme.
Em 1852, os ingleses lançaram à água o Agamemnon. Esses dois navios eram ainda veleiros com
amuradas de madeira e canhões apontados para bordadas, mas, pela primeira vez, a vela estava subordinada
ao vapor. Tempos antes, João Ericsson, que tinha partido para a América, construíra o Princeton, por conta
dos Estados Unidos da América.
A guerra da Criméia (1853-1856) tinha posto em foco a superioridade das marinhas a vapor e das
embarcações couraçadas. Esse fato deu a Dupuy de Lôme a ideia de construir seu navio, o Gloire (1859),
cujas chapas tinham 10 a 12 cm de espessura. Alarmada, a Inglaterra lançou o Warrior no ano seguinte
(1860), mas foi no combate entre os navios Merrimac ou Virginia (sulista) e Monitor (nortista) em 1862,
durante a Guerra de Secessão que foram mostradas as vantagens do navio couraçado. O Merrimac, fragata
transformada, atacava a irrisória esquadra nortista, na baía de Hampton Roads, quando o Monitor,
recentemente lançado por Ericsson, fez sua aparição. Era um navio de pequenas dimensões, baixo,
semelhante a uma jangada dominada por uma torre revolucionária. Essa famosa batalha não teve resultado
decisivo, mas levou à utilização das canhoneiras couraçadas durante todo o resto do conflito, principalmente
no rio Mississipi, quando da campanha de Vicksburg e durante a Batalha de Mobile Bay. Para o resto, foram
utilizados navios de madeira, a vela ou a vapor.
O couraçado estava cada vez mais em moda. Os espanhóis lançaram à água seu Numancia, em 1864,
e os austríacos, uma fragata encouraçada em 1865. Depois da invenção do obus, a torres com canhões
substituíram as baterias laterais e as portinholas de outrora. Os couraçados engrossaram e as velas
desapareceram, como no caso do navio britânico Devastation, de 1873.
Em 1876, os italianos apareceram com navios de guerra desenhados pelo genial Benedito Brin. O
Duílio e o Dandalo eram motivo de orgulho por seus quatro grandes canhões de 50 t dispostos em duas
torres. A Inglaterra respondeu com o Inflexible, equipado com canhões de 80 t. Em 1892, surgiu o
encouraçado pesado, com o Royal Sovereign, da Marinha Real britânica, inteiramente revestido de aço,
dotado de quatro canhões de grande calibre, tendo também um arsenal de artilharia ligeira e de
metralhadoras destinadas a interceptar torpedeiros. Estes navios pequenos e rápidos (torpedo boats) foram
postos na carreira em 1870, depois de o torpedo de R. Whitehead ter sido terminado.
O torpedeiro teve numerosos adeptos, mas seu êmulo, o submarino, continuava a ser considerado
um “brinquedo perigoso”. Depois do Nautilus de Fulton, tinham-se feito grandes esforços para aperfeiçoar
o submarino. Apareceram então o Brandtaucher dos prussianos (1850), o Plongeur dos franceses (1863) e,
por fim, o Hunley dos estados norte-americanos do Sul, que afogou sucessivamente quatro de suas
tripulações durante a Guerra de Secessão, e foi para o fundo com uma fragata nortista, sua única vítima.
Só no fim do século XIX a técnica estava suficientemente avançada para solucionar os
complexos problemas postos à navegação submarina. Foi então que se manifestou uma intensa atividade,
cujos princípios básicos tinham sido elaborados por João P. Holland e Simão Lake, dos Estados Unidos da
América, Nordenfeldt, da Suécia, Garrett, da Inglaterra e Isaac Peral da Espanha. A França tomou a chefia
do movimento com os submarinos Gymnote, Gustave Zedé e Narval, bem como com suas flotilhas de
pequenos Goubet elétricos. Mas o Holland adotado pela marinha norte-americana em 1900, devido ao
construtor João P. Holland, é tido geralmente como o protótipo do submarino moderno que hoje em dia,
impulsionado por um potente reator atômico, ameaça tornar-se, armado com mísseis balísticos, o autêntico
navio de guerra do futuro próximo.

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BRASIL

CAPÍTULO I

A “DESCOBERTA” DO BRASIL

Antes de qualquer coisa, é necessário explicar o termo


descobrimento para a “invenção do Brasil”. Diferente da
conotação de achado, de ocasional, o termo descobrimento está
mais relacionado à “destampamento”, a retirar a cobertura,
demonstrando ao mundo as propriedades aqui pertencentes à
coroa portuguesa.
Pedro Álvares Cabral recebeu a incumbência, dentre
todas as ordens que compunham sua missão de navegar até às
Índias e obter mercadorias, de realizar uma pequena exploração
da terra a descobrir e registrar a presença portuguesa na “Terra
Nova”. Para tal, após cumprir esta parte da missão, mandou
escrever uma extensa carta, através de seu escritor oficial Pero
Vaz Caminha, contando e descrevendo os achados na terra, a qual
juntou com diversos suvenires como aves, plantas e pequenos
objetos das tribos indígenas, e mandou de volta a Portugal em um
dos seus treze navios recebidos para a empreitada.
Para uma melhor compreensão, vamos descrever os
fatores que preexistiram ao descobrimento do Brasil.

1) As Razões da Expansão Marítima:


Durante o século XIII, a população europeia redescobriu o comércio e o valor da moeda,
consequência do melhor emprego das técnicas agrícolas e consequentemente da alimentação dos homens.
Cresceram os bens de consumo e as trocas se reanimaram, permitindo aparecer um novo tipo de
profissional: o mercador, e uma nova classe social: a nobreza mercantil, ou simplesmente, a burguesia.
Abrindo suas próprias rotas, os comerciantes acampavam em locais de sua escolha e exibiam suas
mercadorias. Nasciam, assim, as feiras, sendo famosas as de Flandres e Champagne. Aos poucos, esse
comércio foi sendo transferido para as cidades (burgos), que cresceram em tamanho e população, tornando
o europeu mais exigente e refinado.
A busca de novas mercadorias provocou o aparecimento das especiarias (produtos destinados as
classes mais abastadas), que vinham principalmente das Índias. Os mercadores organizavam caravanas e as
transportavam até Constantinopla ou Alexandria, onde eram apanhadas pelos navegantes italianos,
especialmente os de Gênova e Veneza, que as distribuíam no mercado europeu. Ao lado do cravo, canela,
gengibre, açúcar, pimenta e etc., usados na farmácia e culinária, misturavam-se o incenso, mirra, tecidos e
tapetes, pérolas, pedras preciosas, tudo em pequena quantidade e por preços elevados, tendo em vista os
impostos (pedágios, câmbio monetário e tarifas alfandegárias) que nelas incidiam, nos diversos lugares por
onde passavam. Existia, assim, uma ligação comercial com as Índias, que ninguém sabia bem onde ficavam,
mas que todos falavam de suas fabulosas riquezas e costumes extravagantes. As viagens de Marco Polo,
fantasiosamente descritas em seu “Livro das Maravilhas do Mundo”, excitavam o espírito dos aventureiros.
Assim, os mercadores acumularam riquezas e se agruparam em associações de proteção ao seu
desenvolvimento. Essas associações eram chamadas de Guildas. Alguns mercadores conseguiram edificar
impérios econômicos fabulosos. Um vasto circuito se originou, abrangendo do mar Mediterrâneo ao mar
Báltico, passando pelo oceano Atlântico e o mar do Norte. No Báltico, a presença de comerciantes alemães
(prussianos, teutões, germânicos, etc.) permitiu surgir uma das mais famosas formas de associação de

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comércio: a HANSA, que congregava várias cidades, como Lübeck, Hamburgo, Antuérpia, Leipzig,
Bremen etc., provocando o enriquecimento dos portos intermediários, como Lisboa.
Mas esse progresso viria a ser bruscamente afetado. As migrações dos povos mongóis
convulsionaram a Ásia no século XIII. Seus parentes próximos, os turcos, procuraram o ocidente,
estabelecendo-se na Ásia Menor, fazendo de Brussa sua capital. Atravessaram os Dardanelos, em 1354, e
ocuparam Galípoli. Invadiram a Trácia, comandados pelo Sultão Murad, que enfrentou, com êxito, os
sérvios na batalha de Kosovo (15/06/1389). Bajazet I, filho de Murad, completou essa conquista e venceu
os cristãos na batalha de Nicópolis (1396). Restava o Império Bizantino, quase restrito à área da cidade de
Constantinopla, último reduto de cristianismo encravado nessas conquistas turcas. O Sultão Maomé II
dispôs-se a conquistá-lo, entrando em Constantinopla em 29 de maio de 1453 (queda de Roma Oriental).
Esses eventos perturbaram o comércio europeu, ocasionando uma crise na segunda metade do século
XIV. Dificuldades climáticas e ebulição política causada pela Guerra dos Cem Anos contribuíram para essa
crise, agravada pela presença da peste bubônica proveniente da Ásia nos porões dos navios desde a época
dos Cruzados. Enquanto a população enfurecida caçava bruxos e endemoniados, proliferavam
tranquilamente os ratos portadores de pulgas contaminadas por uma bactéria que provocava a doença. Os
camponeses, irrequietos, pilhavam as caravanas, reduzindo a segurança das rotas terrestres. Na França ficou
conhecida a Jacquerie, que era uma associação de ladrões. A tríade guerra-peste-fome reduziu
drasticamente a população europeia em aproximadamente 1/3 e foi um duro golpe no comércio que se via
prejudicado na fonte fornecedora e, agora, no mercado consumidor.
O estabelecimento turco em Constantinopla, transformada em capital das terras conquistadas e
rebatizada de Istambul, provocou a ruína do comércio mediterrâneo, dificultando a obtenção das especiarias
que se tornaram menos abundantes e, portanto, mais caras. Era necessário encontrar um meio de se chegar
às Índias, fontes das especiarias, e impedir o avanço turco. Como o ideal de cruzada ainda se encontrava
latente, o desejo de difundir o cristianismo mesclou-se aos interesses econômicos. Igualmente, tornava-se
urgente, para a Europa, achar ouro. As raras minas europeias desse metal se exauriram no mundo antigo e
o progresso exigia o ouro como base das transações comerciais modernas.
Esse plano simples esbarrava em vários e complicados problemas para a ciência da época, amarrada
em falsas noções, especialmente quanto ao formato da Terra e às verdadeiras distâncias geográficas, e ao
misticismo religioso. Tais desconhecimentos levaram os homens a acreditarem em muitas fantasias,
relativas às Índias e ao mar Tenebroso (oceano Atlântico), achando que era povoado por monstros e com
abismos em suas bordas (a cultura da época pregava que a Terra era reta e quadrada), ou no fabuloso reino
cristão do Preste João, situado no centro da África, que seria cheio de riquezas incontáveis.
Com o progresso comercial, surgiram nas cidades mais ricas redutos de saber chamados de
“Universidades”. Nestes redutos, o conhecimento dos antigos estudiosos gregos e romanos começou a ser
reencontrado e analisado (citemos, em especial, a Geografia, de autoria do grego Claudio Ptolomeu),
associado aos conhecimentos de matemática e astronomia, adquiridos dos árabes.
Alguns sábios chegaram a sustentar a esfericidade da Terra, principiaram a observação das estrelas,
verificaram mapas antigos. Pierre d'Ailly, bispo de Cambrai, resumindo o que se conhecia da geografia da
época, escrevia “Imago Mundi” (1483).
Ao mesmo tempo, penetravam no continente europeu, provenientes da China através dos árabes,
várias invenções que, em conjunto, marcariam o início dos tempos modernos: a bússola, que permitia a
orientação para os navegantes, a pólvora, que provocou a invenção das armas de fogo, facilitando a defesa
dos aventureiros e intensificando as ações dos usurpadores, e o papel que, aliado à descoberta da técnica
tipográfica (Gutenberg entre 1440 e 1450), difundiu os conhecimentos. A mais importante dessas invenções
ocorreu em Portugal. Partindo das antigas embarcações mediterrâneas, os portugueses aperfeiçoaram
lentamente a caravela, comprida, leve, popa quadrada, proa levantada, utilizando três velas latinas, que mais
tarde foram trocadas por velas redondas, capaz, assim, de viagens arrojadas em alto-mar. O astrolábio,
círculo de bronze graduado (provavelmente uma invenção grega, adaptada por Martin Behaim, de
Nüremberg), servia para medir a altura dos astros e estrelas e determinar a posição do viajante, utilizando-
se, para o mesmo fim, o quadrante e a balestilha.
A figuração dos continentes se aperfeiçoa com a presença de “cartas”, contendo inúmeras fantasias,
chamadas “portulanos” (as primeiras cartas náuticas). Granjearam fama o alemão Martin Behaim e o
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holandês Mercator (Gerhard Kremer), que vinculou seu nome ao primeiro sistema científico de
representação cartográfica.
O grande problema da náutica da época consistia em não se conhecer qualquer processo que
permitisse a determinação da longitude a bordo.

2) Os Portugueses se Espalham pelo Mundo:


Foi Portugal, pequeno país ibérico, com privilegiada posição em frente ao oceano Atlântico, que
tomou a dianteira nas navegações. Barrado em suas pretensões a Este, pelo crescente poderio de Castela, o
mar apresentava-se como seu destino natural.
No reinado de D. Sancho II (1223-1245) podem ser assinaladas as primeiras tentativas de
implantação de uma frota naval pertencentes ao estado, ordenando inclusive a construção de locais
específicos nas praias para reparo de embarcações.
D. Dinis (1279-1325) criou mecanismos de desenvolvimento da marinha e do comércio português.
Realizou os primeiros tratados de comércio com os ingleses, instituiu a Marinha Real, criou o primeiro
posto de Almirante, Nuno Fernandes Cogominho, e plantou florestas para a indústria naval.
No reinado de D. Fernando I (1367-1383) a construção naval ganhou grande incentivo com isenções
de impostos, criação de vantagens e garantias (seguros feitos pela Companhia das Naus) aos construtores
navais.
A expansão ultramarina portuguesa começou quando D. João I (1385-1433), por desejos de seus
filhos, os infantes D. Duarte (mais tarde D. Duarte I de 1433-1438), D. Pedro e D. Henrique (o Navegador),
ordenou a conquista da cidade marroquina de Celta, que caiu em seu poder a 21 de agosto de 1415. A
cristandade acompanhava com grande interesse a atividade do único povo cristão que começou a lutar
contra os infiéis (árabes, mulçumanos ou mouros) e a obter vitórias.
D. Henrique, o Navegador (assim chamado porque se dedicou às navegações e não porque tenha
navegado), foi a alma da expansão marítima portuguesa. A partir de 1418, exerceu a função de governador
da Ordem de Cristo: tornava-se quase um sacerdote. Provavelmente em 1418, fixou a sua residência em
Sagres, longe da Corte, onde mais facilmente poderia dedicar-se à sua cruzada: a descida pelo litoral
africano e a sua consequente identificação. Ele sentiu a necessidade de conseguir boas informações, quase
todas obtidas em Celta, local de concentração caravaneira. Ele juntou mapas, narrativas de pilotos, velhos
manuscritos, livros da época. Rodeou-se de vários personagens, como Jaime de Maiorca e o astrônomo
Abraão Zacuto, autor do “Almanach Perpetuum”, na tentativa de aperfeiçoar os conhecimentos geográficos
para que a sua empresa não representasse mera aventura, mas traduzisse o resultado de investigação
científica, matemática... Ele não tinha interesse em descobrir riquezas; o seu desejo era apenas expandir a
Fé de Cristo.
Lançaram-se, então, os portugueses (e todos os estrangeiros que em Portugal oferecessem os seus
serviços) na descoberta do desconhecido litoral africano. Desde 1418, quando João Gonçalves Zarco e
Tristão Vaz Teixeira encontram a ilha de Porto Santo, ao alcançaram a Madeira e os Açores, por Diogo de
Silves. Em 1434, Gil Eanes dobrou o Cabo Bojador. Em 1441, Antão Gonçalves atingiu um rio que chamou
do Ouro. Logo depois (1442), Nuno Tristão chegou ao Cabo Branco e ilha de Arguim. Em 1445, Lançarote,
Gonçalo de Sintra e Dinis Dias acharam o Cabo Verde. Nesse mesmo ano, o veneziano Alvisse Da Mosto
atingiu o Rio Gâmbia; nova viagem fez em 1457, quando, então, divisou uma desconhecida constelação,
batizando-a de Cruzeiro do Sul. Em 1460, Pedro de Cintra navegou até Serra Leoa.
Este período coincide com o advento do humanismo em Portugal, em decorrência do intenso
relacionamento com as cidades comerciais italianas e o Papado. Vários intelectuais, procedentes de distintas
regiões europeias, procuram o reino português. A expansão ultramarina permitiu uma convergência de
interesses entre os setores mercantis, clero e nobreza, ficando ao Estado o papel de controlador. Essa aliança
garantia aos comerciantes as possibilidades de riqueza sem o bloqueio do Estado, ao clero a secular luta
contra os infiéis e o controle religioso das áreas conquistas, ampliando os domínios da Santa Sé, aos nobres
a riqueza advinda do poder e ao Estado a riqueza na cobrança de impostos e tributos.
A morte do infante D. Henrique, ocorrida em 13/11/1460, arrefeceu o ritmo das navegações, dando
uma esfriada nos ânimos dos navegadores que, timidamente, continuaram por meios próprios os estudos do

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oceano. Prosseguiram mais tarde os portugueses, orientados pelo próprio Rei D. João II que somente subiu
ao trono em 1481, indo até 1495.
Nesta oportunidade, já estava maduro e definido um plano sistemático para serem alcançadas as
Índias. Revestindo as viagens de cauteloso sigilo, substituindo as cruzes de madeira por padrões de granito,
o rei desdobrou a ideia dedicando-se a descobrir a rota para lá.
Em 1482, Diogo Cão aportou no Rio Zaire. Pouco depois (1485), em nova viagem, descobriu o
Cabo do Padrão. Como Diogo Cão não encontrara o término do continente africano, o rei resolveu
solucionar esta questão incumbindo Bartolomeu Dias para prosseguir na rota marítima, a Pero da Covilhã
de ir, por terra, até o Mar Vermelho e a Afonso de Paiva para encontrar o suposto reino do Preste João.
Partiram os dois últimos de Lisboa em 8 de maio de 1487.
Covilhã alcançou Sofala e percorreu as costas da África Oriental. Finalmente, em janeiro de 1488,
Bartolomeu Dias dobrou a ponta terminal do continente africano, chamando-a de Cabo das Tormentas,
denominação essa trocada pelo monarca para Cabo da Boa Esperança.
Essa expansão vinha ao encontro de desejos cristãos. A cristandade estava apreensiva, desde a
derrota de Nicópolis (1396) e da queda de Constantinopla (1453), com o avanço turco. Por isso, Portugal
obteve, da Santa Sé, seguidas e proveitosas concessões que, em resumo, doavam todas as terras, descobertas
e por descobrir, para os portugueses (Bulas Rex regnume, Et sisuscepti, de Eugênio IV; Cuncta mundi, de
Nicolau V, Interccetera quée, de Calisto III; Aeterni regis, de Xisto IV, e Orthodoxóe fidei, de Inocêncio
VIII).

3) A América Descoberta:
O reino português transformou-se num centro de aventureiros, sábios e navegantes de várias
nacionalidades que se empenhavam na tarefa da descoberta do caminho para as Índias. Entre eles, destacou-
se Cristóvão Colombo, uma das figuras mais discutidas da História.
Genovês de origem, talvez nascido em 1451, pouco sabemos de seus primeiros anos de vida. Não
parece ter feito grandes estudos (Eu, que não sou um sábio... escreveu), mas, com certeza, impressionou-se
pelo movimento das descobertas, nas quais vários compatriotas seus participavam. Lançarote, Usodimare,
os irmãos Vivaldi, Antonio da Noli, eram todos genoveses a serviço do Infante. O livro de Marco Polo
devia ser sua leitura preferida, especialmente este trecho o impressionava: "Cipango (Japão) é uma ilha do
Oriente que está no mar alto, longe da terra firme 1.005 milhas... chamam a este mar o de Cin, mas ele é o
grande mar do Ocidente".
É possível que Colombo tenha navegado à Islândia, onde entrou em contato com as notícias que os
descendentes dos vikings guardavam de Vinland, a futura América, reunidas na Erik Saga Rhauda (seus
drakkars já foram encontrados nas costas americanas). Depois dessa viagem, estabeleceu-se em Portugal.
Mas, os conhecimentos ou ignorâncias deste genovês ainda constituem um enigma para os
estudiosos de sua vida. Para sobreviver, realizou algumas viagens comerciais por conta de firmas
genovesas. Nessa oportunidade, 1481, casou-se com Filipa Moniz, herdeira do rico comerciante
Bartolomeu Perestrelo. Esse casamento lhe permitiu refletir sobre seu grande projeto; Colombo passa a
viver na ilha de Porto Santo, próxima da Madeira, onde nasceu seu filho Diego. É possível, também, que
tenha efetuado algumas viagens em caravelas portuguesas pelo litoral africano. Aos poucos, foi
amadurecendo a ideia de chegar às Índias pelo caminho do Ocidente, ao mesmo tempo em que muito
aprendia com os portugueses.
Incentivado pelo conteúdo da carta do sábio florentino Paolo Toscanelli (por alguns tidos como
apócrifa), que acreditava na esfericidade da Terra, enviada ao cônego Fernão Martins, em Lisboa, da qual
deve ter tomado conhecimento, Colombo instalou-se em Lisboa onde já vivia seu irmão Bartolomeu e,
certamente em 1484, conseguiu que o Rei D. João II examinasse o seu projeto para chegar às Índias por
meio mais rápido: atravessaria o mar Tenebroso. Para melhor convencer o soberano, argumentou com a
redondeza da Terra e determinou que cada grau tivesse 56,5km (o certo é 111km), tornando pequena a
distância entre Lisboa e a costa da Índia. Ouvido por um conselho de homens de saber foram seus planos
desaprovados e recusados em seguida pelo rei, não propriamente porque os portugueses não aceitassem as
suas ideias, nessa fase das navegações bem válidas, mas porque Colombo exigia demais, podendo muitos
portugueses fazer o mesmo pelo amor à Pátria.
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Colombo não queria tentar a sua aventura sem o respaldo de um soberano. Em 1485, dirigiu-se para
Castela. Passou um tempo no convento franciscano de La Rabida, causando forte impressão a Frei Antonio
de Marchena, que o encorajou. Dirigiu-se a Sevilha, ligando-se ao banqueiro florentino Berardi. Este o
apresentou ao Duque de Medinaceli, que se propôs financiar o projeto. Mas Colombo desejava o apoio real.
Fernando e Isabel, reis de Aragão e Castela, empenhavam-se em vencer o último reduto mouro: o reino de
Granada. Auxiliado, também, pelo Duque de Medinasidonia. Colombo conseguiu uma entrevista com a
rainha em Córdoba e uma promessa para o futuro.
Colombo instalou-se junto à Corte, que se fixara em Córdoba, e aguardou até que se se transferiu
com a Corte para Salamanca no final do ano de 1486. Nesta cidade, os reis católicos fizeram reunir uma
comissão de sábios visando a apreciar o projeto de Colombo. Esta comissão conclui ser o mesmo inviável.
Desanimado, Colombo retornou a Lisboa e tentou retomar as conversações com o Rei D. João II, sem
qualquer êxito. No final do ano de 1489, encontrava-se em terras espanholas, no acampamento real diante
de Baza.
O tempo passou; suas esperanças iniciais diminuíram. O prior do convento, Padre Luan Pérez,
convenceu-o a ter paciência, ao mesmo tempo em que enviava uma carta à rainha, que convocou Colombo
à sua presença. Novamente expôs seus planos. Meses depois, em 2 de janeiro de 1492, Granada rendeu-se:
estava aberto o caminho para Colombo.
Os reis católicos aceitaram as suas imposições nas Capitulações de Santa Fé (17 de abril). Com
dinheiro adiantado à Coroa pelos banqueiros Luis Santángel e Francisco Pinelo e alguma ajuda dos
armadores de Palos, Martim e Vicente Pinzón, totalizando 1.170.000 maravedis (pequena moeda de cobre
em uso), Colombo reuniu duas caravelas, a Pinta (140t) e a Nina (100t) e a nau Santa Maria (250t),
guarnecidas com 110 homens.
Partiu de Palos a 3 de agosto. A 8 de setembro, suspendeu das Canárias e entrou no desconhecido.
Descobrindo no percurso o fenômeno da declinação magnética, Colombo chegava, a 12 de outubro, na ilha
de Guanaany, por ele chamada San Salvador (hoje Watling Island, uma das Bahamas).
Como não se acharam sinais de civilização, a viagem prosseguiu; Colombo encontrou Cuba
(chamada de Joana) e Haiti (batizada de Espanhola); nesta ilha, construiu um forte com os restos da Santa
Maria, chamado Navidad, deixando uma guarnição sob o comando de Diego Arana. Ao regressar, Colombo
aportou primeiro em Lisboa, comunicando ao Rei D. João II que descobrira o caminho para as Índias.

Colombo ainda realizou mais


três viagens ao Novo Mundo:
em 1493, com 17 navios e
tripulação de 1.500 homens,
de caráter colonizador;
algumas ilhas foram
descobertas e Colombo
fundou Isabela, na Espanhola;
em 1498, tendo atingido terras
continentais americanas e, em
1502, quando explorou o
litoral da América Central,
morrendo pouco depois
(20/05/1506), em Valladolid,
sem saber que achara um
continente novo.

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4) O Acordo de Tordesilhas:
A existência de diversas bulas papais assegurando aos
portugueses terras não descobertas, fez com que os reis da
Espanha logo recorressem ao Papa Alexandre VI, pertencente à
família aragonesa dos Bórgias (portanto parente dos reis), para que
lhes confirmasse a posse das terras encontradas por Colombo.
Através das bulas Eximin e Devotionis (de 03/05/1493) e das duas
Inter Coetera (de 04/05/1493), o papa estabeleceu uma
demarcação para a soberania de Castela, imaginando um
meridiano que, distante 100 léguas das ilhas de Açores e Cabo
Verde, daria início às posses castelhanas.
D. João II não se conformou e disse: “ficou mui confuso e
creo verdadeiramente que esta terra descoberta lhe pertencia”.
Tentou, diplomaticamente, a anulação das Bulas, sem resultado.
Mandou que Ruy de Sande propusesse um paralelo, o das
Canárias, para servir de divisão entre as posses de Castela e
Portugal, que guardaria o domínio meridional. Recusada essa
proposta, enviou a Castela Rui de Pina e Pero Dias, os quais não
obtiveram resultados satisfatórios. Apelou, então, para a ameaça,
aparelhando forte esquadra que disputaria, pelas armas, as terras
descobertas.
Os reis católicos espanhóis não se interessaram, porém, em
medir forças com Portugal; a fatigante luta contra os mouros e os
negócios da Itália aconselhavam uma política pacífica. Assim,
Castela procurou negociações diretas. Na pequena cidade
castelhana de Tordesilhas, reuniram-se os negociadores (D.
Gutierrez de Cárdenas, D. Enrique Enriquez e o Dr. Rodrigo Maldonado, por parte de Castela, e Rui de
Sousa, seu filho João de Sousa, Ayres de Almada e Duarte Pacheco Pereira, representando Portugal), que
assinaram, a 7 de junho de 1494, a Capítulacíon de La
Partícion del Mar Oceano, por meio da qual ficavam fixadas
as áreas de influência dos dois países, através de um meridiano
(em toda a extensão da Terra) que passasse a oeste de 370
léguas do arquipélago de Cabo Verde: as terras não europeias
a leste seriam de Portugal e as situadas a oeste ficavam
espanholas.
Esse tratado representou uma grande vitória da
diplomacia lusa, pois defendia a rota africana que os nautas
portugueses há tantos anos perseguiam. Por outro lado, sem
esclarecer de qual ilha partiria a contagem e nem qual o tipo
de légua a ser usado, o tratado nunca pôde ser realmente
demarcado, nem respeitado por ambos os países, que se
interessavam na persistência da dúvida.
A Capitulação de Saragoza (22/04/1529),
consequência da descoberta das Molucas por Fernão de
Magalhães, procurou solucionar esse problema. Reconheceu
Portugal, governado por D. João III, serem as Molucas
pertencentes à Espanha, adquirindo-as por 350 mil ducados.
Com isso, firmava-se o meridiano de Tordesilhas, na América,
entrando na posse portuguesa a Banda Oriental do Uruguai, as
terras do Chaco Paraguaio e grande parte da região amazônica.

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5) O Caminho das Índias Decifrado:


A viagem de Pero de Covilhã permitiu ao Rei D. João II entrar na posse de um cálculo de distância
entre a costa da África e o Malabar (costa ocidental da Índia); isso em 1491. Estava completada, embora
empiricamente, a triangulação do caminho para as Índias: Lisboa, Cabo da Boa Esperança e Calecute.
Morreu D. João II em 1495. Seu substituto, D. Manuel I, o Venturoso, reuniu homens (160) e armas
usuais e artilharia em quatro embarcações (S. Gabriel, S. Rafael, Bérrio, e um transporte para mantimentos
chamado de São Miguel), cujo comando deu a Vasco da Gama, "experimentado nas coisas do mar, em que
tinha feito muito serviço a El-Rei D. João".

A 8 de julho de 1497, a armada partia da praia do


Restelo, pequena língua de areia colada à Torre de
Belém. A viagem foi penosa. Depois de dobrarem o
Cabo da Boa Esperança, as naus de Vasco da Gama
alcançaram a Baía de S. Brás, onde destruíram a nau
transporte; chegaram a Moçambique a 22 de março e
em Mombaça a 7 de abril. Nestes locais observaram
a hostilidade dos habitantes. Em Melinde, Vasco da
Gama conseguiu um prático, Ahmad lbn Madjid, que
conduziu os portugueses a Calecute, chegados neste
local a 20 de maio de 1498. Durante três meses, Vasco
da Gama demorou-se em Calecute, esforçando-se, em
vão, por atar relações amigáveis com o governante
Vasco da Gama chega em Mombaça, no Quênia, em 7/4/1498 local, o Samorin.

A 29 de agosto, resolveu regressar a Portugal. Em Cananore, adquiriu muitas especiarias. Atacada


de escorbuto, a tripulação ficou reduzida; somente a 7 de janeiro (1499) a expedição aportou a Melinde,
confiando o nauta português ao potentado local um padrão (Monumento de pedra que os portugueses
erguiam em terras por eles descobertas) "por nome Santo Espírito". Em fins de agosto, dava entrada em
Lisboa, com metade dos navios e da tripulação, rendendo, a aventura, mais de 5.000 %.

6) A Viagem de Cabral:
As riquezas que as Índias ofereciam afiguravam-se imensas. Era necessário, porém, que os
portugueses se impusessem aos habitantes e aos monopolizadores do comércio das especiarias. Resolveu,
então, D. Manuel reunir uma tripulação escolhida em uma forte esquadra, entregando o seu comando, com
o título de capitão-mor, a Pedro Álvares Cabral, que, além de pequenos conhecimentos náuticos, possuía
provada capacidade de administração. Secundava-lhe no comando Sancho de Tovar. Serviam-lhe de
orientação instruções escritas sob a inspiração de Vasco da Gama (o original, incompleto, acha-se no
Arquivo Nacional da Torre do Tombo em Lisboa).
A expedição partiu de Lisboa a 9 de março de 1500. Nela embarcaram hábeis pilotos, como
Bartolomeu Dias e seu irmão Diogo, Gaspar de Lemos, Nicolau Coelho, Simão de Miranda, Duarte Pacheco
Pereira; destacava-se, ainda, o mestre João, físico de bordo, Pero Vaz de Caminha, escrivão da feitoria a
ser fundada, frei Henrique Soares, que arcava junto com poucos religiosos com a tarefa de evangelização
dos infiéis, e Aires Correia, que ia ser o feitor. Somavam 1500 homens em 10 naus e três navios menores.
Dificuldades entravaram a viagem. Perto de Cabo Verde, desapareceu a nau comandada por Vasco
de Ataíde, "comida pelo mar” como se dizia. Afastando-se da costa da África, os portugueses tomaram a
direção sul-sudoeste, com a intenção de achar terras. A 21 de abril, pressentiram sinais de terra; no dia
seguinte, viram pequena elevação, que recebeu o nome de Monte Pascoal. A 23, chegaram junto à praia, na
foz do Rio Caí, onde foram travados os primeiros contatos com os indígenas. Procuraram um ancoradouro
mais ao norte, fundeando numa enseada, por eles batizada de Porto Seguro (hoje Baía Cabrália, no litoral
do Estado da Bahia). Verificaram-se novos contatos amigáveis com os naturais; rezaram-se duas missas,
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uma no ilhéu da Coroa Vermelha e outra em terra firme, e tomou-se posse da terra levantando-se uma
grande cruz de madeira. Batizou-se a terra, que se supunha ser uma ilha, com o nome de Vera Cruz. Pedro
Álvares resolveu notificar ao rei o acontecido. Extensa carta foi escrita por Pero Vaz de Caminha, levada
por Gaspar de Lemos, que, a 2 de maio, retornava a Portugal. No mesmo dia, Cabral partia para as Índias,
onde cumpriu a sua missão.
Sobre o “achamento” do Brasil existem três documentos importantes: a carta de Caminha
(encontrada no Arquivo da Torre do Tombo por José de Seabra da Silva e publicada em 1817 por Aires do
Casal), a carta do mestre João ao Rei D. Manuel I e a carta deste aos reis católicos, verdadeira comunicação
oficial. Ainda podemos citar a Relação do Piloto Anônimo (publicada no livro Paesi Nuovamente Ritrovatí,
de Montalbocido) e o manuscrito Valentím Fernandês, publicado em 1940, pela Academia Portuguesa da
História.
Não há hoje dúvida de que a expedição, de quatro caravelas, comandada por Vicente Yanez Pinzón
atingiu, em janeiro de 1500, o litoral do atual Estado do Ceará (ponta de Mucuripe), dando, assim, a
prioridade do descobrimento aos espanhóis. Pinzón prosseguiu a sua viagem para o Rio Oiapoque. Na sua
esteira navegou outro espanhol, Diego de Lepe, com dois navios, tendo reconhecido as regiões do atual
Amapá, após haver alcançado Pinzón na foz do Rio Amazonas.

Vasco da Gama entrega a carta de D. Manuel I, rei de Portugal, ao Samorim


(governante) de Calecute na Índia.

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CAPÍTULO II

A COLONIZAÇÃO DO BRASIL

1) O Período Pré-Colonial (1500 – 1530):


De 1500 a 1530, Portugal preocupou-se exclusivamente em desvendar a terra encontrada,
inexistindo um plano de colonização. Por isso, se chama de Pré-Colonial a esta fase.
Não se sabe ao certo em que data, em 1500, a Carta do Descobrimento chegou a Lisboa com as
notícias da terra achada, mas foram estas notícias, sem dúvida, que motivaram o monarca a organizar uma
expedição com destino à terra descoberta, no ano seguinte, com três naus; nela embarcou Américo Vespúcio
como observador comercial. Ela percorreu grande parte do litoral, batizando e mapeando os acidentes, de
acordo com as festas do calendário religioso. As informações obtidas ocasionaram a mudança do nome da
terra descoberta para Terra de Santa Cruz, mas decepcionaram o rei: ela não passava de uma região vasta e
sem possibilidades econômicas imediatas. Nesse mesmo ano de 1501, ainda foi armada a expedição de João
da Nova, sobre a qual pouco sabemos, mas que, possivelmente, encontrou a Ilha de Ascensão. Em 1502,
percorreu a costa Estevão da Gama, tendo achado a ilha da Trindade. Entre 1502 e 1503, Fernão de Loronha
esteve no Brasil, tendo descoberto a ilha que chamou de São João ou Quaresma (hoje Fernando de
Noronha).
A instauração de uma colônia portuguesa no território americano não se deu imediatamente após a
tomada de posse por Pedro Álvares Cabral em 1500. Portugal mantinha seus recursos voltados para o
comércio oriental, deixando o Brasil, por alguns anos, numa posição secundária, visto que aqui não haviam
sido encontrados metais preciosos ou produtos similares aos do rentável comércio afro-asiático. A única
preocupação com o território recém-conquistado era a de garantir a sua posse diante das contínuas
investidas de outros países europeus.
A primeira expedição exploradora enviada ao Brasil, em 1501, além de nomear diversas localidades
litorâneas, como a baía de Todos os Santos e o lugarejo de São Sebastião do Rio de Janeiro, confirmou a
existência do pau-brasil, madeira da qual se extraía um corante já utilizado na Europa para tingimento de
tecidos. Em 1503, outra expedição chefiada por Gonçalo Coelho fundou feitorias no litoral fluminense,
visando à armazenagem da madeira e ao carregamento de navios. Administrados pelos feitores, muitos
desses entrepostos eram fortificações que garantiam a posse lusa em detrimento de outros conquistadores.
Ao formarem plantios e dedicarem-se à criação de animais para o sustento, transformavam-se, também, em
núcleos colonizadores.
Devido à abundância do pau-brasil no litoral brasileiro, Portugal estabeleceu o estanco, ou seja, o
monopólio real sobre a exploração do produto. Mais à frente, diante da inexistência de braços europeus
suficientes nas embarcações e nas feitorias, e devido à extração adentrar ao território em algumas
localidades, utilizou-se mão-de-obra dos nativos indígenas para garantir a extração das madeiras. Por meio
do escambo (troca) os indígenas realizavam o corte e o transporte da madeira e recebiam por isso objetos
vistosos, mas de pouco valor, como espelhos e miçangas.
A extração do pau-brasil atraía também os contrabandistas estrangeiros, o que levou o governo
português a enviar, sob o comando de Cristóvão Jacques, expedições militares ao litoral brasileiro, em 1516
a 1519, 1521 a 1522 e 1526 a 1528 com práticas de extrema violência contra qualquer navio ou pessoa não
portuguesa encontrados em águas brasileiras.
Concluía-se que a região encontrada aparecia em época inoportuna para Portugal, apesar de possuir
um pau-de-tinta, logo declarado monopólio da Coroa. Desprezá-la não traduzia uma boa política, pois era
conveniente manter sempre garantida a rota marítima para as Índias. Por isso, o rei resolveu alugar a terra.
Foi feito, então, o “Trato”, isto é, uma concessão por três anos a Fernão de Loronha, Bartolomeu Marchione
e Benedito Morelli (provavelmente cristãos novos), para explorar as riquezas da terra, mediante o
pagamento de 4.000 cruzados anuais e o compromisso de enviar à nova terra seis navios pelo mesmo espaço
de tempo. Concedia-se ao primeiro comerciante uma capitania hereditária: o arquipélago por ele
descoberto. Pouco sabemos hoje dos aspectos jurídicos desse Trato e o seu funcionamento.
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Esses arrendatários armaram, então, a expedição de 1503, sob o comando de Gonçalo Coelho,
integrando-a Américo Vespúcio, que, assim, retornava ao Novo Mundo. Dividida em duas esta expedição,
depois das ilhas de Fernando de Noronha, onde naufragou o navio capitânia, ignora-se por onde andou o
seu comandante, que só reapareceu em Portugal quatro anos depois. Parece que Vespúcio explorou a costa
até Cabo Frio, onde fez uma entrada e construiu um pequeno reduto fortificado (primeira feitoria em terras
brasileiras).
O fato de a América ter hoje esse nome prende-se a este
personagem e suas viagens na costa brasileira. Um grupo de
humanistas da cidade de Saint-Dié, França, protegido por Renato,
Duque da Lorena, imaginou reimprimir a Geografia de Ptolomeu,
com uma introdução que ilustrasse aos leitores sobre a importância
desse geógrafo antigo. Incumbido dessa introdução,
Waldseemüller compôs uma primeira parte de cosmografia geral e
uma segunda, formada pela narrativa das viagens de Vespúcio
contidas nas cartas enviadas a seu amigo Soderini (consideradas
por muitos como apócrifas) e a Lourenço de Médicis. O mapa que
acompanhava o estudo de Waldseemüller trazia o nome América
colocado na costa brasileira, passando depois a designar todo o
continente, em detrimento do seu verdadeiro descobridor.
Pormenor do mapa de Waldseemüller de 1507

Em 1511, situa-se a viagem da nau Bretoa (cujo nome provém de sua construção em algum estaleiro
da Bretanha), comandada por Cristóvão Pires e tendo por piloto João Lopes de Carvalho, provavelmente
ainda pertencente ao Trato. Do Brasil arrecadou 5.008 toros de pau-de-tinta, 35 indígenas e 70 animais. A
expedição de Estevão Fróis, que navegou no litoral norte em 1513, acabou por ser apreendida pelas
autoridades espanholas nas Antilhas. Em 1514, esteve em nossas costas a expedição armada por D. Nuno
Manoel (pilotava um dos dois navios João de Lisboa), conhecida pela Nova Gazeta da Terra do Brasil
(publicada na Alemanha e sem data sob o título original Newveil Zeytungauss Pressillglandt) e que, talvez,
tenha percorrido o rio da Prata antes dos espanhóis.
Acredita-se que, por essa ocasião, terminou o Trato com Fernão de Loronha ou que o mesmo
possuísse novo arrematante, o armador Jorge Lopes Bixorda.
Diversos navios ou armadas aportavam nas costas brasílicas em demanda das Índias ou delas, de
retorno, paravam para se abastecerem de água e alimentos.
Foram essas expedições que, por vezes, largaram degredados ou que, sofrendo naufrágios,
proporcionaram o aparecimento, em diversos pontos da costa, de portugueses que representaram o traço de
união entre os indígenas e a futura colonização. Destacaram-se Diogo Álvares Correia, apelidado
Caramuru, João Ramalho, Cosme Fernandes, conhecido como o Bacharel de Cananéia, Antônio Rodrigues,
Francisco de Chaves e Aleixo Garcia, que chegou a terras hoje pertencentes ao Paraguai e Bolívia
precedendo, nessas regiões, os espanhóis, encontrando a morte nas mãos dos índios guaranis.
Por essa época, a terra descoberta começou a ser chamada de Brasil. A origem desse nome pode se
prender à cor de brasa da madeira (vermelha) que existia em abundância no litoral, pode ser uma corruptela
do italiano versino ou versil, nome de madeira de tinta proveniente do Oriente ou da geografia medieval
que havia inventado uma ilha no mar Tenebroso (oceano Atlântico) chamada Barzil ou Bersil, onde
existiam muitas riquezas, inclusive e sobretudo o versil. Ora, fácil foram os navegantes identificarem a terra
encontrada com a lendária ilha. Lá, em 1503, Giovani da Empoli dizia: "... la terra della Vera Croce ouer
del Bresil cosi nominata" (in Viaggio Fatto nell’India, Venetia, 1554). Denominavam-se brasileiros todos
aqueles que comerciavam com o pau-de-tinta.
Durante esse período, andou velejando em nosso litoral o português João Dias de Solís (1515 a
1516) a serviço de Castela, na tentativa de encontrar uma passagem para as Índias. O mesmo fez outro
português (igualmente a serviço de Castela), Fernão de Magalhães (1519), o qual, tendo permanecido 13
dias na Baía de Guanabara, nos últimos dias de dezembro, batizou involuntariamente a região com o nome
de Rio de Janeiro, e, mais feliz que seus antecessores, descobria a tão cobiçada passagem no extremo sul
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da América. Mais tarde, 1526, o veneziano Sebastião Caboto percorreu a costa brasileira (suas viagens de
ponto a ponto da costa deu origem ao estilo de navegação que foi batizado mais tarde de cabotagem).
O pau-de-tinta atraiu também os franceses, corsários a mando do Rei Francisco I (este monarca
desconhecia o "Testamento de Adão” que havia dividido o mundo em duas partes entre os reis de Portugal
e Espanha, seus primos). Ele enviou corsários (entrelopos) com o objetivo de apanhar a madeira.
Conhecemos bem a expedição do navio Espoir, comandado por Binot Paulmier de Gonneville, que
percorreu a Baía de Todos os Santos, em 1504. Jean Parmentier, francês de Dieppe, velejou do Amazonas
ao Prata, por volta de 1525 (citado em Ramúsio: Delle Navigationi ed viaggi, III); mas muitos outros navios
dos estaleiros de Jean Ango certamente aqui estiveram. Hábeis no trato com os indígenas, esses mairs (como
eram chamados os franceses pelos indígenas) gozavam de maior simpatia. Por isso, D. Manuel I determinou
que Cristóvão Jaques, descendente de ilustre família aragonesa e fidalgo da Casa Real, e os dois navios a
seu comando policiassem o litoral, o que pouco adiantou. Essa viagem durou de 21 de junho de 1516 a 9
de maio de 1519; Jaques fundou uma feitoria na Ilha de Itamaracá (em Pernambuco).
De novo, o rei enviou Cristóvão Jaques ao Brasil, com dois navios, em 1521, em uma viagem de
reconhecimento pela costa meridional: a crítica história moderna, baseada em documentação irrefutável
(carta de Juan de Zúniga ao Imperador Carlos V, existente no Arquivo Geral de Simancas), conclui que
Jaques penetrou no rio da Prata e explorou o rio Paraná.
Morrendo D. Manuel I em 1521, subiu ao trono D. João III; as notícias que chegavam à Corte de
Lisboa de que navios franceses estavam sendo armados para efetuarem o corso nas terras brasileiras levaram
o monarca a incumbir o mesmo Cristóvão Jaques, em 1527, de idênticas funções policiadoras, com uma
nau e cinco caravelas, mas Jaques procurou desincumbir-se da missão. Sabemos ter havido cruento combate
na baía de Todos os Santos. É possível que tenham ocorrido outros encontros com corsários, mas, sozinho,
pouco podia fazer. Em 1528, Jaques regressou a Portugal, Substituiu-o Antônio Ribeiro, sobre o qual nada
sabemos. E, finalmente, exerceu esta atividade Duarte Coelho, entre 1530 e 1531, tendo combatido os
índios caetés que favoreciam os franceses.
Durante esses trinta anos, os portugueses (pêros para os indígenas) mantiveram contatos amistosos
com os naturais, os quais se prestaram bem na exploração da madeira. O homem de pele branca despertava
curiosidade e um irresistível atrativo para a mulher indígena. Ele significava superioridade.
Algumas feitorias, escassamente habitadas, começaram a povoar a costa: havia a de Cabo Frio, uma
na Baía de Todos os Santos, cujo feitor chamava-se João de Braga, e outra no litoral de Pernambuco.

2) O Período Colonial (1530 – 1808):

2.1) A Expedição de Martim Afonso de Sousa:


Tendo em vista a rápida decadência das Índias, nas qual
Portugal estava perdendo homens e dinheiro e não mais
adquirindo os fabulosos lucros iniciais, resolveu D. João III
voltar-se para o Brasil. O próprio Cristóvão Jaques propunha ao
rei começar a colonização.
Passados 30 anos da chegada de Cabral, diante da
progressiva crise do comércio com o Oriente e das ameaças
estrangeiras ao domínio sobre seu território na América,
Portugal voltou-se para a efetiva colonização dessas terras.
Foram organizadas expedições colonizadoras, sendo a primeira
delas a comandada por Martim Afonso de Souza, que aqui
chegou em 1531.
Nomeado capitão-mor da esquadra e das terras coloniais
pelo rei de Portugal, Martim Afonso chegou trazendo homens,
sementes, plantas, ferramentas agrícolas e animais domésticos.
Estava imbuído de amplos poderes para descobrir novas
riquezas, combater estrangeiros, policiar, administrar e povoar
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as terras coloniais. Consigo embarcaram cerca de 400 colonos, entre os quais Vicente Lourenço, piloto-
mor, Pedro Anes, que conhecia a língua dos indígenas, Pero Cápico, depois escrivão em S. Vicente,
Henrique Montes, que acompanhara Solis na expedição ao Prata e regressara a Portugal com Caboto, e o
seu irmão Pero Lopes de Sousa. Todos em duas naus, um galeão e duas caravelas.
Partiram de Lisboa, a 3 de dezembro de 1530. Em janeiro chegaram ao cabo de S. Agostinho, onde
apresaram três navios franceses, sendo os mesmos incorporados à armada portuguesa. Diogo Leite recebeu
incumbência de, com as duas caravelas, percorrer o litoral norte, acreditando-se que, provavelmente,
velejou até a foz do rio Gurupi. A esquadra continuou viagem rumo sul, parando na Baía de Todos os
Santos, onde os portugueses entraram em contato com Caramuru. Prosseguindo, em meio a fortes ventos e
chuvas, aportaram, a 30 de abril, na Baía de Guanabara, onde Martim Afonso permaneceu três meses.
Reaparelhou os navios, ordenou a confecção de dois bergantins de 15 bancos, fez pequenas explorações
perto do litoral e mandou construir uma casa sólida na embocadura de um rio, a qual foi chamada pelos
índios de carioca (a casa do branco).
Além de organizar expedições que penetraram no território para reconhecimento e busca de
riquezas, Martim Afonso dirigiu-se à foz do rio da Prata, no sul, para efetivar o domínio luso diante da
crescente presença espanhola na região. Lá aprisionou vários navios piratas franceses.
Colocando em prática sua política colonizadora, iniciou a distribuição de sesmarias (lotes de terra)
aos novos habitantes que se dispusessem a cultivá-las, bem como a plantação da cana-de-açúcar e a
construção do primeiro engenho da colônia. Um ano antes de partir para Portugal, havia fundado, em 1532,
as vilas de São Vicente e Santo André da Borda do Campo, respectivamente, no litoral e no interior do atual
estado de São Paulo.
Suspenderam em direção sul até a ilha de Cananéia (atual ilha de Bom Abrigo), onde ficaram 44
dias. Instado por Francisco de Chaves e pelo Bacharel de Cananéia, que afirmavam serem grandes as
riquezas do interior, o capitão-mor mandou que alguns homens (talvez 80), chefiados por Pero Lobo,
penetrassem em busca delas guiados por Chaves, mas eles nunca voltaram. Continuaram rumo sul. Na
entrada da Lagoa dos Patos um bergantim desapareceu, em virtude do mau tempo. Tendo o capitânia
naufragado, na Punta del Este de Maldonado, pararam na ilha da Palma. Martim Afonso determinou que
seu irmão inspecionasse o rio da Prata, com um bergantim e 30 homens. Pero Lopes nada encontrou de
importante. Martim Afonso aguardou o retorno do irmão e, juntos, rumaram para o norte. No dia 20 de
janeiro, entraram na enseada de São Vicente. A terra pareceu tão convidativa que decidiram erigir neste
local uma povoação. Assim, no dia 22 de janeiro de 1532, Martim Afonso fundou uma vila na ilha de São
Vicente. Nessa região vivia um português entre os índios chamado Antônio Rodrigues. No alto da serra
onde João Ramalho, também português, vivia, Martim Afonso lançou as bases de outra povoação:
Piratininga (de curta vida). Iniciou-se a agricultura de tipo europeu e aclimatou-se a cana-de-açúcar.
Tendo em vista o mal estado dos navios, resolveu-se que Martim Afonso permaneceria em São
Vicente e que Pero Lopes retornaria a Portugal (utilizando as melhores embarcações), a dar conta ao rei do
que se havia passado. A 22 de maio, partiu Pero Lopes.
No litoral de Pernambuco deu combate e se apoderou de duas embarcações francesas; em seguida,
atacou poderoso fortim francês, comandado pelo Senhor de La Motte, guarnecido com 70 homens,
conseguindo dominar seus ocupantes, depois de 18 dias de lutas. Pero Lopes fez erigir uma fortificação
(em Igaraçu), na qual deixou homens comandados por Vicente Martins Ferreira.
Nessa mesma ocasião, a esquadra portuguesa de Antônio Correia aprisionava, na costa espanhola
da Andaluzia, a nau La Pélerine (15/08/1532), contendo muitos toros de pau-brasil, algodão, papagaios e
outras mercadorias. D. João III amadurecia os planos de colonização mais abrangente.
O Dr. Diogo de Gouveia, que dirigia em Paris o Colégio de Sainte Barbe, argumentou a necessidade
de uma colonização mais eficaz; sua carta ao soberano português, escrita em Rouen, é datada de 01/03/1532.
Em carta enviada a Martim Afonso (por João de Sousa), escrita em 28 de setembro, o rei lhe comunicava
o propósito de dividir o Brasil em capitanias hereditárias. Martim Afonso regressou ao reino depois de 13
de março de 1533, deixando o Padre Gonçalo Monteiro para dirigir os negócios de sua capitania.

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2.2) O Projeto Agrícola da Exploração Colonial Portuguesa:


A partir do século XV, políticas colonizadoras diferenciadas marcaram a integração do continente
americano à vida política e, principalmente, econômica europeia. Parte da América do Norte foi colonizada
por ingleses como uma região de povoamento, embora o Sul do território dos atuais Estados Unidos fosse
uma região de exploração.
Já a colonização ibérica na atual América Latina caracterizou-se por basear-se no domínio
monopolista metropolitano, a serviço do Estado e de sua classe mercantil, que tinha interesse em assegurar
a posse e a exploração colonial e executar a administração e a fiscalização.
Pelas características peculiares tanto da realidade da colônia portuguesa quanto da expansão lusa, a
colonização optou pela agricultura. Também diferentemente das colônias espanholas, caracterizadas pela
atividade mineradora, não foi possível a utilização em larga escala da mão-de-obra indígena. Pelo menos
não em longo prazo, visto que na colônia (a essa altura já denominada Brasil), a população nativa era
relativamente pouco numerosa e foi rapidamente exterminada na faixa litorânea.
Para viabilizar a ocupação e o povoamento da colônia, a Coroa portuguesa recorreu ao cultivo da
cana-de-açúcar, pois aqui, ao contrário do que ocorrera nas áreas de dominação espanhola, não foram
descobertas jazidas de metais preciosos.
Levado da Ásia para a Europa por árabes e cristãos engajados nas cruzadas durante a Idade Média,
o açúcar era uma especiaria das mais valiosas no início do século XV. Chegou a fazer parte de dotes de
rainhas e princesas e era comercializado a preços elevados, garantindo alta lucratividade aos mercadores.
Embora Portugal já conhecesse a agricultura da cana-de-açúcar desde o século XIII, foi só na
segunda metade do século XIV, com D. Henrique, o navegador, que a atividade açucareira ganhou
amplitude e deixou de ser uma produção limitada e isolada. Essa mudança deu-se graças à instalação de
engenhos na ilha da Madeira, seguida de avanço das técnicas de cultivo e grande utilização da mão-de-obra
escrava, trazida das regiões conquistadas da costa africana. Assim, as lavouras de cana espalharam-se pelos
arquipélagos atlânticos, ganhando importância também nos arquipélagos dos Açores, de Cabo Verde e nas
ilhas de São Tomé e Príncipe.
A consequente aproximação de Portugal com os mercadores e banqueiros de Flandres (norte da
Europa), responsáveis pelo financiamento, refino e distribuição do açúcar, possibilitou o acesso dos
portugueses à infraestrutura comercial europeia, controlada pelos holandeses, bem como ao seu abundante
capital, para o financiamento do empreendimento agrícola brasileiro.
De posse dessas condições, Portugal tinha ainda a solução para o problema da mão-de-obra,
podendo dar início a um empreendimento de tão vastas proporções. A escravidão era a muito praticada por
europeus e árabes na África negra. Foi considerada uma instituição justa, quando, no seu início, os
portugueses escravizavam os mouros, considerados infiéis pelos cristãos. A "infidelidade" religiosa acabou
sendo também estendida aos negros africanos não islâmicos, legitimando sua escravização.
Os negros africanos compunham
mão-de-obra compulsória e abundante,
fundamental para a implantação da
indústria canavieira em um extenso
território. Dois fatores explicam, em
resumo, o emprego do trabalho escravo
africano em maior escala quando
comparado ao indígena: os interesses
ligados ao tráfico negreiro, que logo se
tornou um empreendimento altamente
lucrativo para a Coroa e mercadores
portugueses, e o simples
desaparecimento da população indígena
da área açucareira.

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2.3) O Sistema de Capitanias Hereditárias:


Os resultados proveitosos que o sistema de capitanias
alcançou em diversas ilhas portuguesas, especialmente
na Madeira, levaram o rei a empregá-lo igualmente no
Brasil. Resumia-se em doar o uso de pedaços de terra a
cidadãos escolhidos, que possuíssem fortuna própria e
que pudessem correr os riscos existentes.
Devemos, hoje, admirar a notável estratégia empregada
pelo governo português: destituído de recursos
pecuniários para empreender a ocupação da terra
brasileira, acenou com largas perspectivas para que
alguns empresários arcassem com o ônus e
enfrentassem o incógnito, permanecendo a Coroa à
espera dos lucros futuros.
Foi, então, o Brasil dividido em 15 grandes lotes de
terra, mediante várias paralelas que partiam de ponto
conhecido da costa (na verdade 14 capitanias) e
terminavam na incerta linha de
Tordesilhas, entregues a 12 homens de confiança
durante o ano de 1534. Pertenciam à baixa nobreza e já
haviam prestado importantes serviços ao rei. É possível
que o mapa de Gaspar Viegas tenha servido de base para
as divisões territoriais.

Cada donatário recebia uma Carta de Doação, documento pelo qual se efetivava a doação do uso,
com a descrição da terra e a outorga da governança da mesma, com o título de capitão-mor, explicitando
seus direitos e deveres; e um Foral, que fixava os direitos, deveres, foros, tributos e coisas que os futuros
colonos deviam ao rei ou ao capitão-donatário.
O capitão-donatário não se tornava proprietário da capitania: ficava na sua posse, que era transmitida
hereditariamente em linha masculina, preferentemente, sem ser objeto de negociações ou partilha. Exercia
a justiça, podendo até condenar à morte, nomeava funcionários, doava terras para cultivo (sesmarias),
mantinha propriedade plena em determinada área escolhida, cobrava impostos à população (5% do pau-
brasil e do pescado, 1% dos impostos pagos à Coroa, postagens e 500 reis anuais dos tabeliães). Podia
acoitar e homiziar réus julgados e condenados no reino e em outras capitanias, com a finalidade de facilitar
o povoamento. Tinha o direito de fundar vilas, o que, em Portugal, era atribuição exclusiva do rei. Era-lhe
permitido reduzir os naturais ao cativeiro e vendê-los em Portugal até o máximo de 39 por ano. A Coroa
reservava-se o direito de cunhar moedas e estipulava como rendas o quinto (20%) dos metais e pedras raras,
a dizima das colheitas (10%), a vintena do pescado (5%) e o monopólio do pau-brasil (estanco).
Aos donatários cabia ocuparem as suas terras e iniciarem o povoamento e a obtenção de lucros. Os
que se aventuraram em plagas americanas tiveram de enfrentar dificuldades enormes com os índios, que
não compreenderam, com o ambiente geográfico hostil e com a falta de recursos. Por isso, formou-se a
opinião que o sistema resultou em um fracasso, que é um erro. Foram as capitanias que iniciaram a ocupação
efetiva do litoral e mantiveram um estado de alerta, impedindo a conquista estrangeira, ao mesmo tempo
em que o português impunha a sua cultura ao gentio.
Vejamos como os donatários se houveram com suas capitanias. Antônio Cardoso de Barros não se
preocupou com sua terra. João de Barros, Fernão Álvares de Andrade e Aires da Cunha associaram-se e
enviaram uma expedição que alcançou poucos resultados, perdendo a vida este último no naufrágio da
capitânia. A vila de Nazaré desapareceu em três anos. A tentativa de Luis de Melo em 1554 acabou
fracassando, motivo pelo qual as capitanias ao norte da de Itamaracá ficaram sem colonização.

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A capitania de Pero Lopes (que, como seu irmão, não regressou ao Brasil, desaparecendo em
naufrágio na costa de Madagascar), em Itamaracá, permaneceu vítima das incursões de franceses que
instigavam os indígenas contra os portugueses; administrou-a Francisco de Braga e, após a morte de Pero
Lopes, João Gonçalves. As lutas contra os selvagens não permitiram o seu progresso e o da pequena vila
de Conceição. Os outros quinhões de Pero Lopes não receberam atenção. Pero Góis da Silveira erigiu na
sua capitania de São Tomé a vila da Rainha, mas não conseguiu a paz com os índios goitacás, e a região
permaneceu no abandono. Vasco Fernandes Coutinho emigrou com toda a sua família para sua capitania
do Espírito Santo; fundou uma vila (Vila Velha) e iniciou a plantação do açúcar. Em 1558, fundou a vila
de Vitória. Retirou-se para a Europa (Lisboa), deixando em seu lugar D. Jorge de Menezes, que não soube
evitaras dissensões com os indígenas. Coutinho renunciou, após vinte anos, os seus direitos. Em Porto
Seguro, Pero de Campos Tourinho fundou a vila do mesmo nome e, facilitado pela acolhida dos índios
tupiniquins, pôde expandir o povoamento em direção ao interior com o nascimento de núcleos, como Santo
Amaro e Santa Cruz. Essa harmonia foi quebrada em 1550 quando morreu Tourinho, e seu filho, Fernão,
mostrou-se incompetente e despertou a fúria dos índios aimorés. A irmã de Fernão, Isabel, vendeu os
direitos da capitania ao Duque de Aveiro. A capitania da Bahia possuía habitantes antes da criação das
donatárias; seu capitão, Francisco Pereira Coutinho, transportou-se para ela com colonos em sete navios e
teve o apoio de Diogo Álvares. Foi levantada uma vila, chamada do Pereira (1535). Após os primeiros
momentos de tranquilidade, os abusos dos portugueses provocaram a revolta indígena, e Coutinho e sua
gente morreram nas mãos dos tupinambás. Em 1548, esta capitania reverteu à Coroa. Jorge de Figueiredo
Correa, donatário de Ilhéus, mandou instalar uma povoação com o nome de São Jorge dos ilhéus, mas nunca
pisou em suas terras, deixando a sua administração para o castelhano Francisco Romero. Seus filhos e
herdeiros, Jorge e Jerônimo, venderam-na ao comerciante italiano radicado em Lisboa, Lucas Giraldes.
Duas capitanias, a de Pernambuco, de Duarte Coelho, e a de São Vicente, de Martim Afonso (que
não mais retornou ao Brasil), prosperaram, tendo em vista o êxito da plantação de cana e a aliança com os
índios locais. Engenhos moíam a cana, e o português ia substituindo a simples exploração do pau-brasil
pela produção açucareira. Duarte Coelho fundou, na sua capitania, a vila de Olinda, em 9 de março de 1535,
recebendo muitos colonos do reino e de outras capitanias; Recife, à beira d'água, nasceu no ano seguinte.
Na de São Vicente, Braz Cubas deu início ao povoado de Santos (1545) que se desenvolveu com rapidez.
Alguns estrangeiros (os Adorno de Gênova e os Schetz da Holanda) contribuíram para o progresso da
capitania. Um engenho, chamado de São Jorge dos Erasmos, foi o primeiro existente. Enfrentaram, também,
as suas dificuldades: a primeira, o ataque a Igaraçú pelos índios, descrito por Hans Staden, e a segunda, a
desconhecida "guerra do Iguape", motivada pelo Bacharel de Cananéia e espanhóis de Ruy Mosqueira,
foragido da expedição de Caboto, que naquele local passaram a residir (1534), expulsos todos pela gente
de São Vicente. Seus habitantes compreenderam a necessidade de organizarem uma defesa; seguindo o
modelo português, a ordenança foi formada em 9 de setembro de 1542, integrada por portugueses e
tupiniquins amigos. Nesse mesmo ano, a primitiva vila mudou-se para terra firme.
Durante 15 anos uma nova paisagem se criara. Onde antes existiam matas e algumas feitorias para
arrecadação do pau-brasil, agora frutificavam povoados e vilas. Em 1539, Belchior Camacho recebeu em
capitania a ilha da Trindade.
Apesar de iniciado o povoamento, os corsários não tinham desistido do Brasil, edificando feitorias
nos locais abandonados pelos portugueses. Em muitos pontos, como o êxito da colonização dependia de se
organizar a luta contra os indígenas a fim de permitir o desenvolvimento da agricultura. Esses fatos e mais
a decadência do comércio com as Índias levaram o Rei D. João III ao estabelecimento de uma administração
centralizada na terra do Brasil.

2.4) A Centralização do Governo:


Diante das dificuldades existentes, os donatários e vários colonos apelaram ao rei, pedindo o seu
auxílio. D. João resolveu atendê-los, dando um corretivo no sistema instituído, sem, contudo, modificá-lo.
Encarregou D. Antônio de Ataíde, Conde da Castanheira, de organizar uma regulamentação que,
aprovada a 17 de dezembro de 1548, criava um governo no Brasil, sem extinguir o sistema de Capitanias
Hereditárias, antes, completava-o, centralizando-o. O “Regimento Castanheira” possuía 41 artigos e sete
suplementares regulando as funções do governador.
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Ao governador (que só foi denominado geral depois de 1577) incumbia “dar favor e ajuda as outras
povoações e se ministrar justiça e prover nas cousas que comprirem a meu serviço e aos negócios de minha
fazenda e a bem das partes”. Colocava-se acima dos donatários, pois representava a própria pessoa do rei.
Ficava assim com a alçada judicial, única modificação expressiva na autoridade dos donatários. Estes
continuavam a comandar as forças militares em suas respectivas capitanias; mas o governador detinha a
autoridade militar sobre todo o território brasileiro.
O governador não devia interferir nas capitanias a não ser quando solicitado, para restabelecer a
ordem ou por desrespeito do donatário. Ao governador cabia desenvolver a economia e aumentar a
produção açucareira. O mesmo regimento criava os cargos de ouvidor geral, superior aos magistrados
existentes, provedor-mor da Fazenda, para fiscalizar a arrecadação de impostos de todas as capitanias, e
capitão-mor da Costa, para comandar as operações navais contra invasores. Tais cargos deviam melhor
prover a administração. Finalmente, proibiu a escravização do silvícola, exceto para os que fossem
capturados em "guerra justa".
Para a sede do governo, D. João III
escolheu a Capitania da Bahia,
retomada pela terça (pensão) de
400 mil réis anuais ao filho de
Francisco Pereira Coutinho,
falecido. Surgia, assim, a primeira
Capitania Real ou da Coroa. Ao
mesmo tempo, estabelecia que nela
fosse fundada a primeira cidade,
Salvador, capital da Colônia.

2.5) Os Governadores Gerais:

A) Tomé de Sousa:
O primeiro governador tinha de reunir boas qualidades de administração e comando. A Carta Régia
de 7 de janeiro de 1549 nomeava Tomé de Sousa (primo de Martim Afonso e do Conde da Castanheira)
para exercer o difícil encargo; fidalgo austero, adquirira fama nas guerras da África como militar de valor.
A 29 de março, aportava na vila do Pereira trazendo Pero Góis da Silveira como Capitão-mor da Costa,
Antônio Cardoso de Barros, como Provedor-mor da Fazenda, Pero Borges, Ouvidor-geral, e o Padre
Manoel da Nóbrega, chefiando seis jesuítas, além de colonos, seiscentos soldados, quatrocentos degredados
e operários sob as ordens do mestre Luis Dias.
Escolheu um sítio elevado, em frente à vila do Pereira, e nele ergueu Salvador, que permaneceu a
capital da Colônia por dois séculos. Dedicou os primeiros momentos da sua administração a essa tarefa,
recebendo ajuda de Caramuru, de um castelhano chamado Filipe Guilhem e dos índios tupinambás, aos
quais apavorou com os canhões que trouxera.
Desenvolveu a cultura da cana-de-açúcar, introduziu o gado vindo de Cabo Verde, doou sesmarias,
tendo-se tornado famosa a Casa da Torre de Garcia d'Ávila, que se dedicou à criação extensiva de bovinos.
Organizou uma entrada em busca de metais preciosos, comandada pelo castelhano Francisco Brueza de
Espiãosa, que nada encontrou.

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Tomé de Sousa revelou-se um sábio administrador: a todos cativou, apesar de, algumas vezes, ter
sido muito enérgico. Fez uma viagem demorada pelas capitanias; encantou-se com a beleza selvagem da
Guanabara; admirou o progresso de São Vicente, acabando de erguer a fortaleza da Bertioga; reconheceu a
fundação das vilas de Santos e Santo André de Borda do Campo (08/04/1553), iniciativa de João Ramalho,
e criou a vila de Itanhaém. Durante o seu governo, em 1551, o Papa Júlio III criou o primeiro bispado,
vindo exercer a função D. Pero Fernandes. Os jesuítas iniciaram a catequese e o ensino, tendo sido fundado
o colégio da Bahia, ao lado da igreja da Ajuda, por eles construída. Em 1551, diversas moças órfãs
chegaram a Salvador.
Entregou a administração ao seu sucessor, em 13 de julho de 1553. Por essa época, esteve Hans
Staden, pela segunda vez, em terras brasileiras, Embarcado na armada de Diego de Senabria que se dirigia
ao Prata, naufragou, sendo acolhido em São Vicente na casa de seu patrício Heliodoro Eoban. Foi
contratado para servir na Bertioga, mas se descuidou e caiu prisioneiro dos indígenas. Outro alemão, Uirich
Schmidel, natural de Straubing, acompanhou D. Pedro de Mendonça ao rio da Prata, aventurando-se,
depois, em nossas terras, atingindo São Vicente em junho de 1553, deixando interessante relato muito
elucidativo desta fase de nossa história.

B) Duarte da Costa:
Para substituir Tomé de Sousa, o rei escolheu Duarte da Costa, Armeiro-mor do reino, nomeado a
1º de março, mas só a 13 de julho de 1553 chegava a Salvador, trazendo 260 pessoas, entre as quais estava
um filho seu, Álvaro, herói das lutas nas Índias, e o jesuíta Luis da Grã, com alguns padres e o irmão José
de Anchieta.
Talvez animado de bons desejos, Duarte da Costa não pôde demonstrá-los. Faltava-lhe a prática do
mando e a experiência da guerra. O seu governo foi logo agitado pelo desentendimento entre seu filho, mais
liberal, e o bispo, intransigente. A população dividiu-se, prejudicando a administração, diminuindo a
autoridade do governador. O rei chamou o bispo a Lisboa, a fim de pessoalmente lhe relatar os
acontecimentos. Embarcou no navio N. S da Ajuda, e, quando este passou nos Baixios de D. Rodrigo,
naufragou; apanhado pelos caetés (onde hoje é a praia do Francês, Maceió, Alagoas), junto com os 95 que
se salvaram, sofreu suplício, a 15 de junho de 1556, em ritual mágico-religioso (escaparam um português,
"língua", e dois escravos índios, portadores das notícias). A atitude dos caetés valeu-lhes represália
implacável e uma mudança política em face das populações indígenas.
Difícil, hoje, concluir quem estava com a razão; contudo, sem o concurso de D. Álvaro, os indígenas
não seriam expulsos do Recôncavo (1555).
A 25 de janeiro de 1554, os jesuítas, tendo à frente Nóbrega, Provincial da Companhia, fundavam
o Colégio dos Meninos de São Paulo, em Piratininga, origem da cidade de São Paulo.
Sem que Duarte da Costa pudesse impedir, os franceses, comandados por Nicolau Durand de
Villegagnon, instalavam-se, em 1555, na Baía de Guanabara. Amargurou-o a impossibilidade de reagir,
bem como a morte do rei D. João III, seu protetor (11/06/1557); na vila do Pereira, morria Diogo Álvares,
o Caramuru. Duarte da Costa terminou o seu governo (1558) enfrentando revoltas indígenas em
Pernambuco, no Espírito Santo, em Porto Seguro, bem como, no sul, os tamoios, liderados pelo feroz
Cunhambeba, ameaçaram os colonos.

C) Men de Sá:
Para substituir Duarte da Costa, o Rei D. João III escolheu um homem (Carta régia de 23/07/1556)
considerado virtuoso e de grande cultura jurídica (era desembargador da Casa de Suplicação e irmão do
poeta Francisco Sá de Miranda). Men de Sá aportou em Salvador a 28 de dezembro de 1557 (mas só
assumiu o cargo a 3 de janeiro), sabendo que teria dois problemas graves a enfrentar: pacificar a população
da capital, agitada com os eventos do governo anterior, e expulsar os franceses da Guanabara.
Começou por adotar diversas medidas repressivas contra os abusos do povo, especialmente o jogo.
Desenvolveu a agricultura da cana-de-açúcar, em parte negligenciada. Construiu um engenho real, a fim de
atender aos lavradores mais modestos. Incentivou a formação de aldeamentos indígenas, proibindo que se
dessem aguardente e armas aos índios. Combateu os goitacás (do Espírito Santo), que se submeteram após
vários combates (sendo mais importante a batalha dos Nadadores), num dos quais faleceu seu filho Fernão.
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Ao mesmo tempo, Vasco Rodrigues Caldas reduziu à obediência as tribos do Rio Paraguaçu, e Braz Fragoso
amansou os aimorés. Organizou duas entradas, confiando uma à direção de Vasco Rodrigues Caldas (1561)
e outra a Martim Carvalho (1568).
Os caetés, declarados "fora da lei", acabaram desaparecendo, vítimas da “Guerra Justa”. E muitos
outros índios também sucumbiram em decorrência da epidemia de varíola, que, trazida por embarcadiços
portugueses, alastrou-se entre as povoações do litoral e interior próximo.
Men de Sá chefiou uma expedição contra os franceses alojados na Baía de Guanabara; em virtude
de persistirem esses estrangeiros na mesma região, a metrópole enviou reforços, sob o comando de Estácio
de Sá, que trazia instruções para fundar um núcleo português, a cidade de São Sebastião, na área cobiçada
pelos franceses, o que foi executado em 1º de março de 1565. Permaneceram em lutas intermitentes cerca
de dois anos. Men de Sá resolveu, então, retornar à Guanabara, em 1567, participando da expulsão dos
franceses e transferindo a cidade para local mais adequado, visando ao seu desenvolvimento.

2.6) A Sucessão de Men de Sá:


A tarefa de Men de Sá estava cumprida, e ele pediu que o substituíssem. Estava velho, enfermo e
saudoso da pátria. Numa carta desabafava: "... não parece justo que por servir bem, a paga seja terem-me
degredado em terra de que tão pouco fundamento se faz".
Em 1570, o Rei D. Sebastião (governando desde 1568) designou D. Luiz Fernandes de Vasconcelos.
Este, porém, não chegou ao Brasil. Suas seis naus, com colonos e 40 jesuítas, chefiados pelo Padre Inácio
de Azevedo, foram atacadas por piratas franceses sob o comando de Jacques Sore (13/09/1571), na altura
das Canárias. Conseguiu, o futuro governador, escapar (o mesmo não acontecendo com parte dos jesuítas
atirados ao mar), tomando a direção das Antilhas, rumando, em seguida, para os Açores. Com alguns
reforços, dirigiu-se novamente para o Brasil, encontrando-se no caminho com outro pirata francês, Jean
Capdeville. O governador morreu no combate que se travou, bem como outros portugueses, sendo
martirizados os jesuítas, em número de 13, que ainda restavam. Esses jesuítas foram todos beatificados com
o título de “Os 40 Mártires do Brasil”.
Men de Sá prosseguiu governando, não mais contando com um auxiliar valioso: o Padre Manoel da
Nóbrega falecia no Rio de Janeiro em 18 de outubro de 1570.
Em 2 de março de 1572, morria Men de Sá em Salvador, deixando apreciável fortuna pessoal e rica
em paz a terra que por tanto tempo governara. Foi sepultado na igreja dos padres da Companhia de Jesus.
O Ouvidor-geral, Fernão da Silva, passou a responder interinamente. A vastidão territorial da
Colônia levou o governo português a uma nova experiência para melhor administrar. Assim, por ato de 10
de dezembro de 1572, o Brasil foi dividido em duas partes: o norte, com capital em Salvador, e estendendo-
se até o Porto Seguro, e o sul, tendo por sede o Rio de Janeiro.
Recebeu o governo do norte Luis de Brito e Almeida, ficando com o do sul Antônio Salema, ambos
experimentados na administração. Luis de Brito preocupou-se com a exploração do interior, organizando
diversas entradas com o objetivo de encontrar riquezas. Valeu-se de Sebastião Fernandes Tourinho, que
subiu o Rio Doce, e de Antônio Dias Adorno, que entrou pelo Rio Caravelas. Nada, porém, descobriram.
Os metais continuavam escondidos, desafiando a argúcia e o apetite dos colonizadores. Lutou contra os
potiguares de Itamaracá, com pouco êxito. Iniciou, também, a conquista de Sergipe, obtendo resultados
negativos, como antes já ocorrera com Garcia d'Ávila. Antônio Salema expulsou os franceses de Cabo Frio,
numa audaz expedição de quatrocentos homens e setecentos índios, ao mesmo tempo em que submeteu os
tamoios. Isso permitiu a tranquilidade para a população carioca,
Por regresso ao reino de Antônio Salema (1577), Luis de Brito assumiu o governo voltando-se à
administração unificada, por Alvará de 12/04/1577, nomeado, nessa mesma data, Lourenço da Veiga. Foi
então, por isso, denominado de Governo Geral.
Luis de Brito exerceu o governo por mais alguns meses, passando-o a 1º de janeiro de 1578, Durante
a administração de Lourenço da Veiga houve tentativas de conquista da Paraíba e verificou-se a União
Ibérica. Veiga faleceu em Salvador, a 04/06/1581.

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2.7) A União Ibérica (1580 – 1640):


O rei D. Sebastião (1557 a 1578), que substituía seu avô D. João III (que nove filhos tivera sem que
algum tenha sobrevivido) aos três anos de idade, representou para os portugueses uma esperança. O
monarca, envolvido por uma educação anacrônica, acalentou a conquista do Marrocos. Seus conselheiros
tentaram, em vão, demovê-lo. O jovem rei arregimentou voluntários, alugou mercenários em Flandres,
obteve homens da Espanha, sob o comando do Coronel Alonso Aguilar. Aprestou, assim, um exército de
18 mil homens que, sem algum preparo militar, desembarcava em Tânger, na África. Caminharam a pé até
Larache, seu objetivo. Contra eles Mulei Abdel-Malek reuniu grandes forças e os cercou em Kar-el-Kebir
(Alcazer-Quebir) a 04/08/1578. A luta foi sangrenta, e o rei sucumbiu com o seu exército.
Portugal ficava sem a O Cardeal de 66 anos
sua mocidade, sem conseguiu governar
dinheiro, sem o seu rei e Portugal durante dois
sem a vitória para anos, cercado de gente
compensar tão grandes malévola e
perdas. O único possível inescrupulosa. Morreu
herdeiro de D. Sebastião sem indicar um
era seu tio-avô, o cardeal sucessor, extinguindo-
D. Henrique, que dos 13 se com ele a dinastia
filhos de D. Manuel I o de Avis (31/01/1580).
único que ainda estava
vivo.
Declarada a vacância do trono, diversos pretendentes apareceram, emergindo três candidatos com
possibilidades concretas, por serem netos do Rei D. Manuel I: D. Catarina, Duquesa de Bragança, filha de
D. Duarte I, Duque de Guimarães; D. Antônio, Prior do Crato (isto é, chefe do ramo português da Ordem
de Malta), filho de D. Luís, Duque de Beja; e Filipe II, que reinava na Espanha, filho de D. Isabel.
As pretensões da duquesa se esmaeceram, preferindo o povo a D. Antônio; mas este tinha contra si
ser filho natural de mãe judia, pois D. Violante Gomes era uma cristã-nova. Venceu o rei da Espanha,
inicialmente corrompendo com ouro a nobreza portuguesa e, depois, com um rápido argumento: um
exército de 25 mil infantes invadiu o reino luso sob o comando do Duque d'Alba.
Aclamado em Santarém, aceito na capital, D. Antônio, que chegou a ter um curto reinado de um
mês, esboçou uma fraca reação, com forças minguadas e irregulares, no encontro da Ponte de Alcântara.
D. Antônio perdia e fugia para os Açores. A 16 de abril de 1581, as Cortes reunidas em Tomar reconheceram
Filipe II (de Espanha), rei de Portugal, com o título de Filipe I (em Portugal). Abria-se uma nova fase
histórica, comumente denominada de DOMNIO ESPANHOL. Na verdade, a designação é imprópria, uma
vez que existiu, apenas, uma UNIÃO REAL ou UNIÂO IBÈRICA, não se concretizando a anexação de
Portugal à Espanha.
Dos Açores, D. Antônio tentou uma
reação. Pediu auxílio à rainha-mãe de França,
Catarina de Médicis, que lhe enviou o primo,
Filipe Strozzi, conhecido nauta florentino, com
50 navios. O prêmio para essa ajuda francesa
era a parte sul do Brasil, sempre cobiçada pela
França. O mesmo florentino rondou, com três
navios, o Rio de Janeiro: portava o título de
vice-rei ... mas não conseguiu apoderar-se da
cidade graças à habilidade da mulher do
governador, Salvador Correia de Sá, ausente na
ocasião. De Sevilha e Lisboa, lançou-se ao seu
encontro D. Álvaro de Bazán, Marquês de
Santa Cruz, com 34 galeões.
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A batalha ocorreu perto da Ilha Terceira (25/06/1582), com a derrota de D. Antônio e a morte de
Strozzi e de D. Francisco Portugal, ativo auxiliar do Prior do Crato. O Brasil seria mesmo da Espanha, por
algum tempo.
A promessa de Filipe II (de Espanha) de preservar relativa autonomia de Portugal e manter suas
colônias sem submetê-las à Espanha, garantiu à colônia portuguesa na América poucas mudanças políticas
significativas. Houve apenas substituição da metrópole que exercia o monopólio comercial e o controle
administrativo. No entanto, o domínio espanhol acabou por abolir, na prática, as determinações do tratado
de Tordesilhas, o que favoreceu o avanço dos colonos portugueses em direção ao interior, permitindo a
expansão do território, estimulada principalmente pela busca de metais preciosos.
Como se pode constatar, durante a União Ibérica, o Brasil teve governantes exclusivamente
portugueses. Contudo, uma nova paisagem se criara como consequência do período dos “Filipes”: o
Nordeste e o Norte integravam-se ao território luso; a penetração para o interior se intensificara; criou-se
um intercâmbio comercial no Cone Sul com os centros espanhóis localizados no Rio da Prata; nasceram
diversos povoados e vilas; e expeliram-se os estrangeiros em quase todos os pontos litorâneos que tentaram
se estabelecer.

2.8) A Restauração em Portugal:


O domínio dos Filipes reduzira, gradualmente, Portugal à miséria. Conduzido pelo Conde-duque de
Olivares, mantinha-se dócil província de Espanha. A cobrança do imposto extraordinário de quinhentos mil
cruzados fez explodir tumultos populares em Évora que se alastraram no Alentejo e Algarve, passando ao
Minho, atingindo o Porto e Lisboa. Tropas espanholas investiram sobre terras lusas cometendo os mais
reprováveis atropelos.
O envolvimento da Espanha em diversos conflitos militares na Europa, porém, pôs seus inimigos
contra a colônia portuguesa. Inglaterra, França e Países Baixos realizaram várias invasões ao território da
colônia. Isso enfraqueceu a economia lusitana, acarretando um movimento pela restauração da autonomia.
Uma revolução na Catalunha, tendo por fulcro Barcelona, ajudou os portugueses. Em 1639,
começou a fervilhar uma conspiração que encontrou apoio na nobreza e no clero, em especial os jesuítas.
O povo aceitou satisfeito, pois jamais compactuara com o domínio espanhol.
Depois de alguns momentos de indecisão, o Duque de Bragança foi aclamado rei, em 1º de
dezembro de 1640, com o nome de D. João IV, após uma rebelião vitoriosa em Lisboa. Os restauradores
só se libertaram do domínio inaugurando o governo da dinastia de Bragança.
Para combater as dificuldades econômicas herdadas do período anterior, o novo monarca
intensificou a exploração e reforçou a administração colonial, criando o Conselho Ultramarino. A
centralização política colonial e a rigidez fiscalizadora da metrópole intensificaram-se com a ampliação dos
poderes administrativos dos governos-gerais, que subordinaram colonos e donatários, e a eliminação
progressiva das capitanias particulares. Os inúmeros choques entre a Coroa e os interesses locais semearam
as primeiras manifestações contra a autoridade metropolitana.

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O Brasil recebeu com alegria as notícias da restauração do governo em Portugal em fevereiro de
1641. O Marquês de Montalvão tratou de reconhecer o novo monarca (embarcando as poucas tropas
espanholas e napolitanas existentes), o mesmo fazendo Salvador Correia de Sá e Benevides no Rio de
Janeiro. Em São Paulo, a aclamação de Amador Bueno5 não tem maior expressão: ela reflete as ligações da
capitania com as terras platinas.

2.9) As Invasões do Território Português Brasileiro:

A) Os Franceses:
Durante o século XVI, os corsários franceses frequentavam o litoral brasileiro, retirando o
ibirapitanga nativo (pau-brasil), atividade que se mostrava cada vez mais arriscada, tendo em vista o
progresso da colonização portuguesa. Melhor seria empenharem-se na fundação de um núcleo permanente.
A França vivia dias agitados; católicos e calvinistas (huguenotes) não se entendiam, e a intolerância desses
grupos antagônicos provocava distúrbios políticos. Uma colônia na América serviria de refúgio a todos que
desejassem viver e prosperar em paz. Constituíram, estas, as razões que nortearam a criação da França
Antártica.

A.1) A França Antártica:


Henrique II, reinando na França, resolveu enviar às terras brasileiras o piloto e cartógrafo do Havre,
Le Testu, com o objetivo de colher informações sobre a costa. Essa viagem, ocorrida em 1551, teve a
duração de seis meses. Le Testu confeccionou 56 portulanos (cartas náuticas primitivas).
Concebeu a expedição colonizadora o Vice-Almirante da Bretanha (cargo político e não militar).
Nicolas Durand de Villegagnon, cavaleiro de Malta, senhor de Tercy, Marquês de Villegagnon e
personagem de destaque na corte francesa. Com habilidade, despertou o interesse do cardeal de Lorena,
acenando-lhe com a difusão do catolicismo, e do Almirante Gaspard de Coligny, simpático à Reforma
Protestante, possuidor de valimento junto ao rei Henrique II. Uma viagem exploratória foi realizada por
Villegagnon ao Brasil (com um ou dois navios), tendo os franceses visitado a área de Cabo Frio e
adjacências. Villegagnon concluiu ser a Guanabara o melhor sítio para instalar a sua colônia. Ao retornar
para a França, conseguiu a aprovação de seu plano e a dotação de dez mil francos.
Com dois navios de 200t e um menor para carga e quatrocentos homens, católicos e huguenotes da
ralé de Paris e Rouen, a expedição largou do Havre em agosto de 1555 e entrou na Baía de Guanabara a lº
de novembro do mesmo ano, instalando-se numa ilha que os índios chamavam de Serigipe (hoje
Villegagnon, onde funciona a Escola Naval). Todos ajudaram a levantar um forte, que tomou o nome de
Coligny, para servir de abrigo e defesa da posição.

5
O primeiro fato histórico significativo e pitoresco do Brasil se deu por ocasião da proclamação do paulistano Amador
Bueno de Ribeira como rei de São Paulo. Após a separação das coroas lusa e espanhola, e iniciada a restauração
do Reino de Portugal, em 1640, parte da população da cidade, em geral de origem espanhola, decide proclamar rei
um de seus filhos mais ilustres. Alguns desejavam continuar fiéis ao reino de Castela, pois acreditavam que em
breve estariam de novo sob sua autoridade. Mas, para não dar mostras de seu intento, esse grupo dizia apenas
proclamar um filho de São Paulo como seu rei. Amador Bueno, entretanto, consciencioso e percebendo a artimanha
das famílias espanholas, declinou o convite. Porém, chegaram a jurá-lo de morte, caso ele não aceitasse a coroa
paulistana. Ele, então, já seguido pelos gritos de muitos, refugia-se no Mosteiro de São Bento. O Abade e a
comunidade monástica saíram para deter a multidão, que logo se conteve em respeito aos religiosos. Bastava gritar
ao lado de fora do mosteiro sua aclamação. Aos poucos, os religiosos foram convencendo a população da falacidade
o intento, até acalmarem-se e desistirem de vez do que planejavam fazer.

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Villegagnon desenvolveu uma grande atividade. Impôs uma


disciplina férrea entre os colonos que, por isso, passaram a
detestá-lo, urdindo mesmo uma conspiração para matá-lo que,
descoberta, levou à morte na forca dos dois responsáveis.
Conseguiu, porém, o chefe francês o desenvolvimento da colônia,
a implantação de uma agricultura e a amizade dos índios tamoios
(que o chamaram de Paicolás), por ele cativados com astúcia.
Em 1557, chegou à Guanabara Bois-le-Comte, sobrinho de
Villegagnon, com três navios, neles embarcados trezentos
colonos, cinco mulheres e teólogos calvinistas (Pierre Richer e
Guillaume Chartier), provocando muitas discussões, bem ao sabor
da época. Alguns insatisfeitos preferiram retirar-se do forte,
estabelecendo-se na Carioca, construindo, ao lado, uma olaria: 1ª
Briqueterie. Outros se embrenharam pelas matas.

Desiludido, Villegagnon retornou à Europa (em 1559), prometendo voltar, o que nunca cumpriu,
ganhando, assim, dos calvinistas, o apelido de “Caim da América”. Conseguiu, no entanto, uma indenização
por parte do governo português e, do governo francês, uma carta de corso contra os portugueses; mas não
a usou, preferindo negociá-la com Portugal, recebendo a soma de trinta mil ducados.
O Governador Men de Sá encontrava-se em Ilhéus quando recebeu notícias dos franceses por um
que desertara: Jean de Coynta, senhor de Bouléz, que, em troca da liberdade, lhe forneceu as informações
que precisava sobre a posição militar de seus patrícios e do Forte de Coligny.
A situação não permitia delongas; os jesuítas aconselhavam a fundação de um núcleo na Guanabara:
Nóbrega, em carta de 2 de setembro de 1557 ao padre Miguel de Torres, em São Vicente, afirmava esse
ponto de vista, "como sempre se desejou".
Chegados, enfim, os reforços tão insistentemente pedidos, a 30 de novembro de 1559, chefiados por
Bartolomeu de Vasconcelos da Cunha, Men de Sá reuniu mais homens, em duas naus e três navios menores,
e dirigiu-se para a Guanabara. O ataque ao Forte de Coligny verificou-se a 15 de março de 1560; resistiram
os intrusos por dois dias. Orientados por Bouléz, dois portugueses (Manoel Coutinho e Afonso Martins
Diabo) conseguiram entrar no forte e explodir seu paiol de pólvora, causando grande confusão. Os franceses
se retiraram escondendo-se nos matos próximos, com a ajuda dos tamoios; 74 renderam-se, Esse combate
é historiado em carta do padre Nóbrega, que o assistiu, datada de 01/06/1560, ao Cardeal D. Henrique.
Men de Sá limitou-se a arrasar o forte. Não dispunha de gente nem meios para criar um núcleo de
povoamento permanente, o que seria aconselhável. Da Guanabara, dirigiu-se a São Vicente e, depois, para
Salvador. No Espírito Santo, aceitou a renúncia do donatário Vasco Fernandes, nomeando Belchior de
Azevedo para administrar a região. Bouléz ficou em São Vicente, mas, hostilizado pelos habitantes, foi
remetido para Salvador onde enfrentou processo como herege e mandado, em seguida, preso para a
Inquisição de Lisboa onde foi desterrado para a Índia.
Os franceses, orientados pelos tamoios, tomaram novas posições na Ilha de Paranapuan (hoje
Governador). Insuflando os indígenas, conseguiram que o chefe Cunhambeba os reunisse para o ataque a
São Vicente e ao Colégio dos Meninos de São Paulo. Compreendendo o perigo que se avizinhava das
povoações portuguesas, o padre Manoel da Nóbrega e o irmão José de Anchieta entrevistaram-se com os
chefes indígenas. Duraram cinco meses as negociações, três dos quais Anchieta ficou como refém (quando
então compôs o poema à Virgem), terminando com o armistício de Iperoig (próximo de Ubatuba): os
portugueses não mais seriam atacados (14/09/1563).
Da terra do Brasil não cessavam de chegar a Lisboa pedidos no sentido de se fundar uma povoação
no Rio de Janeiro. Constitui documento valioso a carta de Brás Cubas a D. Sebastião de 25 de abril de 1562.

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O Governador Men de Sá confiou a Estácio de Sá (seu sobrinho) a delicada tarefa de obter, na Corte,
novos recursos contra os franceses e a licença para a fundação de uma cidade.
A metrópole, compreendendo o perigo que representavam os franceses na Guanabara, resolvia
enviar reforços sob o comando de Estácio de Sá, igualmente incumbido de fundar uma cidade, ponto de
apoio para garantir o êxito da empresa.
Com seis caravelas e duzentos homens, Estácio de Sá aportou em Salvador no dia 1º de maio de
1563, onde obteve alguns voluntários. Logo, iniciou viagem para o sul, passando no Espírito Santo, ali
apanhando o chefe Araribóia e seus temiminós, que se incorporaram à expedição com a finalidade de se
vingarem dos tamoios. Estácio de Sá entrou na Guanabara, apresou uma nau francesa, tendo permanecido
por dois meses observando as posições (janeiro/fevereiro de 1564). Seguiu, depois, para São Vicente, onde
passou o resto do ano em preparativos. No princípio do ano de 1565, reuniu todos e, a 1º de março, chegou
ao Rio de Janeiro, desembarcando em ponto estratégico previamente escolhido (hoje é a praça de esportes
da Escola de Educação Física do Exército, na Urca), fundando, assim, a cidade de São Sebastião do Rio de
Janeiro. Ergueram-se casas rústicas em torno do marco da fundação, cercadas por um muro artilhado de
madeira e barro; no centro instalaram a câmara e cadeia, a casa do governador e a capela, sob a orientação
do Padre Gonçalo de Oliveira e do irmão Anchieta, abrigando a estátua do Padroeiro. Nada de grandioso,
apenas um estabelecimento militar. Os primeiros funcionários receberam suas incumbências.
Durante dois anos, ficaram portugueses e franceses em luta, sem haver, contudo, um encontro
aberto. Famoso ficou o Combate das Canoas, durante o qual se diz ter aparecido o próprio São Sebastião
em auxílio dos lusos.
Instado por Anchieta que, passando pelo Rio de Janeiro, observara quão frágil era a posição dos
portugueses, resolveu o governador dar uma ajuda pessoal. Aproveitando estar no porto de Salvador a
esquadra (três galeões) de Cristóvão de Barros, nela embarcou-se, acompanhado do bispo D. Pero Leitão,
do padre Inácio de Azevedo (visitador da Companhia) e de muitos voluntários. Chegaram ao Rio a 18 de
janeiro de 1567. Acertaram iniciar o ataque a 20, dia do Santo Guerreiro, protetor da cidade e do Exército
de Portugal. Em Uruçu-Mirim (hoje Glória/Flamengo), os franceses perderam heroicamente. Alvejado no
olho por uma seta ervada, Estácio de Sá entrou em agonia, morrendo um mês depois. A raridade de
documentos não nos permite hoje conhecer esse personagem; situa-se entre os muitos jovens idealistas que
Portugal produziu, plasmando com sua presença os instantes decisivos do nascimento da cidade (a Igreja
de S. Sebastião guarda seus restos mortais). Seguiu-se o ataque ao reduto de Paranapuan (hoje Ilha do
Governador), com dois dias de duração.
Expulsos os estrangeiros, resolveu o Governador Men de Sá garantir a posse da região contra outros
ataques. Assim, no primeiro dia de março de 1567, transferiu a cidade para o Morro do Descanso, depois
chamado do Castelo (já demolido), porque todo o conjunto lembrava um castelo medieval, excelente sob o
ponto de vista estratégico e livre dos ares pouco salubres da baixada. Nomeando seu sobrinho Salvador
Correa de Sá (04/03/1568) para o governo da cidade, rumou satisfeito para o norte. Para Araribóia deu
terras onde hoje é o Rio Comprido: em 1573, o chefe índio mudou-se, com sua gente, para o lado oposto
da baía, conhecido por Praia Grande, fundando o aldeamento de São Lourenço, que deu origem a Niterói
(= água escondida). Toda a região foi erigida em capitania da Coroa, a segunda portanto. Apesar de
pertencer a Martim Afonso de Sousa, que ainda vivia, por ele não foi reclamada.
Os corsários franceses fixaram-se, então, em Cabo Frio. E não tardaram em investir sobre a
desguarnecida cidade do Rio de Janeiro. Em 18 de maio de 1568, surpreenderam os seus habitantes
entrando, de imprevisto, na baía com quatro naus, oito lanchas e várias canoas e se prepararam para o ataque
à taba de Araribóia que ainda não se havia transferido para a Praia Grande. Contando com pequeno reforço
(35 homens) enviado pelo Governador Salvador Correa de Sá, Araribóia optou por desferir um ataque de
surpresa. O êxito obtido foi notável: em pouco tempo os invasores partiram confusos e envergonhados.
Os habitantes da cidade, animados por essa vitória, resolveram persegui-los. Embarcaram em canoas
e, a 8 de junho, avistaram o reduto francês em Cabo Frio, protegido por uma nau de 200t. Iniciou-se o
combate que pendeu para os lusos após a morte do comandante francês atingido na viseira de sua armadura
por certeira flecha. A nau, abordada em seguida, caiu em mãos portuguesas; conduzida para o Rio de
Janeiro, teve a artilharia aproveitada para as defesas da cidade.

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No segundo governo de Salvador Correa (1577 a 1598), o Rio de Janeiro sofreu outra incursão de
franceses como resultado da ajuda que a Rainha Catarina de Médicis prestou a D. Antônio, Prior do Crato,
a fim de que este pudesse obter o trono português vago com a morte do Cardeal D. Henrique em 1580. O
florentino Filippe Strozzi, primo da rainha, recebeu o título de vice-rei do Brasil e se apressou em vir
apoderar-se do Rio de Janeiro. Três naus apresentaram-se à entrada da Baía de Guanabara (1583). O
governador achava-se ausente; mas a população, liderada por sua mulher, D. Inês, acendeu fogueiras e
iludiu os intrusos com falsos movimentos que deram a impressão de grande número de pessoas. O ataque
não chegou a se consumar.
Poidemil de Soson, capitão da nau Le Volant, guarnecida de 116 homens, aportou (1595) em Sergipe
no desejo de retirar madeira; capturados por Diogo de Quadros, foram na condição de prisioneiros para
Salvador, morrendo todos enforcados. No mesmo ano, Elisee de La Tramblade, capitão da nau Le Saige,
com 75 homens, visava igualmente ao comércio do pau-brasil; o Governador D. Francisco de Sousa, que
os capturou, concedeu-lhes a liberdade. Ainda no mesmo ano, outros franceses desembarcaram em Ilhéus,
afugentando os moradores e procuraram saquear as casas; alguns poucos destemidos, liderados pelo mestiço
Antônio Fernandes, alcunhado de Catucadas, organizaram-se e revidaram contra os intrusos, logrando
eliminar vários, inclusive o chefe, motivo pelo qual os gauleses se retiraram.
Entre 15 e 18 de agosto de 1597, uma armada francesa, composta de 13 navios, investiu sobre o
Forte do Cabedelo, na Paraíba; o comandante, contando com 20 homens e cinco peças de artilharia, resistiu,
morrendo heroicamente. Os franceses retiraram-se para o norte.
Para os franceses seria mais seguro o estabelecimento de uma empresa definitiva onde lançariam as
bases de uma ocupação permanente. A costa equinocial do Brasil servia aos seus intentos.

A.2) A França Equinocial:


Entre 1596 e 1597, o Capitão Jean Guerard, de Dieppe, andou explorando a costa norte. É quase
certo que outros marujos franceses comerciaram com os tupinambás. Acredita-se que em 1594, Jacques
Riffault, bom conhecedor desta costa norte do Brasil, imaginou criar uma colônia na região que permanecia
abandonada. Regressando ao seu país, Riffault cativou um gentil-homem de Saint Maure de Touraine,
chamado Charles des Vaux com o projeto de um estabelecimento duradouro no Maranhão. Armaram três
navios e partiram em 15 de março de 1594, mas acabaram perdendo um deles em frente à Ilha Upaomeri
(depois batizada de São Luís). Os franceses deixaram-se ficar nela, misturando-se aos gentios, obtendo a
sua estima. Desgostoso com seus companheiros, Riffault, reduzido a um único navio, retornou à França
deixando ainda vários colonos sob a orientação de Charles des Vaux. Depois de alguns anos aproveitando
um dos navios de Dieppe, des Vaux conseguiu regressar à Europa e procurou interessar a Corte francesa
no sentido de erguer uma colônia naquelas paragens.
O Rei Henri IV determinou a Daniel de La Touche, senhor de La Ravardière, de seguir para o
Maranhão para assegurar-se do que dizia des Vaux. La Ravardière deixou Cancale em 12 de janeiro de
1604 regressando em agosto. E, com o posto de Vice-Almirante da Costa do Brasil, velejou, outra vez, para
a América, em 1607, estando entre os seus tripulantes des Vaux. Após 18 meses, retornou à França
acreditando ser possível a colonização francesa na costa equinocial.
O assassinato do rei Henri IV (14/05/1610) impediu um apoio oficial e rápido. Parece que La
Ravardière se entusiasmou com as possibilidades da região. Mas a empresa exigia dinheiro. Depois de
alguns meses, La Ravardière obteve o amparo de François de Rasilly, senhor de Aumelles, que obteve os
bons ofícios do Conde de Soissons, Charles de Bourbon, príncipe de sangue, bem como do banqueiro
Nicolas de Harlay de Sancy, Barão de Bolle e de Gros-Boís. Em 1612, concluíam-se os aprestos da
expedição. Em três navios (Régent, Charlotte e Sainte Anne), Daniel de La Touche embarcou colonos,
soldados, fidalgos e quatro padres capuchinhos.
Partiram de Cancale a 19 de março de 1612; passaram por Fernando de Noronha, costearam o
Nordeste e, a 26 de julho, aportaram à ilha do Maranhão. A 6 de agosto começaram a erguer um povoado
fortificado, com a ajuda indígena, inaugurando-o no primeiro dia de novembro de 1612, com o nome de
São Luís.
Na verdade, os franceses não alcançaram as riquezas prometidas nem encontraram metais e pedras
com os quais sonhavam. Doenças e dificuldades várias geraram descontentamentos, diante das regras
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estabelecidas pelos chefes, em observância aos desejos dos padres capuchos. A ausência da continuidade
do amparo oficial contribuiu para o desânimo geral, apesar de Rasilly, que retornou à França em 7 de
dezembro, ter pelejado pela empresa do Maranhão, conduzindo consigo alguns índios que receberam
batismo diante de Luís XIII. A ajuda que recebeu, de seis mil escudos, da rainha-mãe serviu apenas para
armar de novo o Régent e fazê-lo retornar ao Maranhão com alguns reforços (15/07/1614) e transportando
dez padres capuchinhos sob o comando do padre Archange Pembroke.
Sabedores, os portugueses, desse estabelecimento francês, procuraram logo eliminá-lo antes que
aumentasse. O Governador Gaspar de Sousa organizou uma expedição com oito navios e a confiou a
Jerônimo de Albuquerque – brasileiro nato, que por sua condição é considerado o primeiro brasileiro a
comandar uma força naval –, neto do tuxaua Arcoverde, tendo como segundo o Sargento-mor Diogo de
Campos Moreno (que, em 1615, escreveu Jornada do Maranhão); a esta expedição agregou-se Martim
Soares Moreno quando passou pelo Ceará. Nessa região, em Jericoacoara, construíram um forte costeiro
(N. S. do Rosário) e exploraram a terra e a marinha em direção ao Maranhão. Em cumprimento desta
missão, Martim Soares fez-se tanto ao largo com o seu navio que se viu arrastado pelas correntes até as
Antilhas de onde se passou à Europa.
Com segurança, avançou Albuquerque e desembarcou com seus homens em Guaxenduba (hoje
Tajuaba), a 26 de outubro de 1614; construíram um reduto, sob orientação de Francisco de Frias de
Mesquita, e lhe deram o nome de S. Maria; contavam com trezentos soldados e duzentos índios.
Não perderam tempo os franceses em atacá-los, a 11 de novembro, tomando três embarcações e
fazendo prisioneiros, e a 19 (Combate de Guaxenduba) com duzentos homens brancos e 1.500 índios, todos
em sete naus e 46 canoas, combatendo-se com água pela cintura a maior parte desse dia. Ficaram mortos
115 franceses e prisioneiros, nove; Albuquerque teve 11 mortos e 18 feridos, entre estes um filho.
Apesar da superioridade numérica, os franceses sofreram derrota tão grande que La Ravardière
solicitou um armistício (com a intenção de obter reforços na França ou um acordo diplomático), aceito
imprudentemente por Albuquerque, mas que, no entanto, permitiu tempo para se conseguir reforços no
Brasil. Seguiram representantes diplomáticos para as respectivas cortes europeias (Capitão Du Prats e
Gregório de Albuquerque para Paris e Sargento-mor Diogo Moreno e Mathieu Maillard para Lisboa), onde
não despertaram interesse. Albuquerque passou-se para a ilha, nela fundando o Fortim de S. José de Itapari.
Ignorando a autorização do Rei Filipe II permitindo que os franceses permanecessem em terras do
Maranhão, o Governador Gaspar de Sousa determinou que Alexandre de Moura, Capitão-Mor de
Pernambuco, se preparasse para repelir os franceses. O próprio governador deslocou-se para Recife a fim
de, pessoalmente, incentivar os derradeiros aprestos.
Assim, em outubro de 1615, grossos reforços (seiscentos soldados em nove navios) portugueses
aportaram ao Maranhão, chefiados por Alexandre de Moura, que, juntando as suas forças com as de
Jerônimo de Albuquerque, cercou a fortificação francesa (São Luís), guarnecida com duzentos homens e
17 peças de artilharia. Com medo de ser tratado como pirata, o que representaria a forca, La Ravardière
optou pela capitulação firmada no dia 4 de novembro de 1615; no dia imediato, o forte foi entregue aos
portugueses. Os franceses retiraram-se quase todos. La Ravardière e des Vaux foram conduzidos a
Pernambuco e desta capitania para Lisboa, onde permaneceram encarcerados na Torre de Belém, nela
morrendo des Vaux. La Ravardière foi solto após três anos.
Jerônimo de Albuquerque, que apôs ao seu nome o de Maranhão, foi designado governador das
terras conquistadas.

A.3) As Ações de Corsários Franceses no Rio de Janeiro:


Nascera a Cidade do Rio de Janeiro da luta contra os franceses de Villegagnon. Nascera militar.
Encastoara-se numa elevação estratégica, logo conhecida como Morro do Castelo, provendo a sua defesa
na construção de baterias e pequenas fortificações. Eliminado o perigo francês, alijados estes do litoral sul,
pôde os cariocas procurar os terrenos secos da várzea, onde se desenvolveu a cidade durante o século XVII.
Caminhos e ruas se foram formando sem ordem, à medida que as casas iam sendo construídas ou que se
erguiam as igrejas e conventos, maciços trabalhos que até hoje afrontam o tempo. Dedicando-se ao cultivo
da cana-de-açúcar, à pesca da baleia dentro da baía, mas, principalmente, ao comércio, sendo importante o
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de escravos, a população da cidade prosperou e aumentou no decorrer do século XVII, atingindo a casa dos
dez mil. A descoberta do ouro no planalto trouxe a euforia a todos, sacudindo seus moradores da mansa
vida que por mais de cem anos desfrutavam. Trazia notoriedade para a cidade.
E constituiu essa a razão principal que moveu Jean François Duclerc a tentar tomar o Rio de Janeiro
em 1710. A cobiça do ouro. Auxiliou-o a política europeia: Portugal aliara-se à Inglaterra pelo célebre
Tratado de Methuen (1703), contrário à subida de Filipe d'Anjou, neto de Luis XIV de França, ao trono
espanhol, como Filipe V.
Com uma nau (L'Oríflame), quatro fragatas (L’Atlante, La Díane, La Valeur e La Venus) e 1300
homens, decidiu o Capitão-de-Navio Duclerc tomar o Rio de Janeiro. Soubera quão fracas eram a tropa e a
defesa da praça sob o governo de Francisco de Castro Moraes, o qual, em vão, havia clamado junto ao rei
sobre a necessidade de reaparelhamento geral. A 17 de agosto, surgiram os franceses na entrada da barra,
arvorando bandeiras inglesas, estratagema que não funcionou. Tiros cruzados impediram maior
aproximação. Rumaram para o sul, desembarcando na ilha Grande; nela saquearam fazendas e obtiveram
quatro escravos de Bento do Amaral da Silva que, daí por diante, lhes serviram como guias. A tentativa de
atingirem as areias de Sacopenapan (Copacabana hoje) foi frustrada pelo Tenente Rodrigo de Freitas e por
alguns populares. Mas, a 11 de setembro, entraram por Guaratiba sem serem molestados.
Duclerc caminhou, com seus comandados, pelos capinzais da Tijuca, pilhando e depredando.
Tocada a rebate na cidade, acorreram os homens a se apresentarem aos seus oficiais. Somavam dois mil,
ao todo, e mais alguns voluntários. Em conjunto levantaram uma trincheira que ia do Morro da Conceição
ao de S. Antônio (já demolido) e aguardaram o invasor. Na Lagoa da Sentinela, houve combate com a
Companhia dos Estudantes, comandada por Bento do Amaral Coutinho, sem resultados. Os franceses
prosseguiram pelo caminho de Mata-Cavalos (hoje Rua Riachuelo), encontrando, na Lagoa do Desterro,
um punhado de homens liderados por Frei Francisco de Menezes. Mas o frade, que já fora militar, não
logrou barrar o passo do invasor, que avançou em direção do Morro do Castelo. Não puderam subi-lo e
tomar o Forte de S. Sebastião, dada a resistência movida por populares. Desistiu Duclerc de se apoderar
desse morro, embrenhando-se pelas ruas até chegar ao Largo do Carmo (hoje Praça XV), desnorteado e
com a sua formação militar dispersa. No largo, se generalizou o combate. Tentou o chefe francês abrigar-
se no Convento do Carmo, desconhecendo que os seus ocupantes eram exímios na arte da pancadaria. O
governador, oficiais e suas praças chegavam ao largo, procedentes da trincheira, cuja defesa não mais se
fazia necessária. Quase bloqueado, Duclerc invadiu o trapiche de Luis da Mota, esboçando uma resistência
anulada pela presença de canhões apontados contra a construção. Preferiu capitular: 220 ficaram feridos;
mortos, 450. Por parte da cidade as perdas tinham se elevado a trezentos, com igual número de feridos.
Alguns prédios estavam em chamas.
Distribuíram-se os soldados franceses nas guarnições militares em regime de prisão (600
provavelmente); os comandantes dos navios que conduziram os invasores, inteirando-se do sucedido por
um aviso mandado pelo próprio Duclerc, deliberaram rumar para a Martinica. Dias depois, os oficiais
franceses receberam ordem de embarcar para Salvador. E o Capitão Duclerc ficou encerrado no Colégio
dos jesuítas, de onde saiu, para uma casa da Rua da Quitanda, com a cidade por menagem; apesar da guarda
que o protegia, quatro mascarados invadiram-na e o assassinaram (18/03/1711), constituindo esse crime,
até hoje, um mistério.

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A.4) Nova Ação Francesa:


Homem habituado ao mar (era Capitão-de-Navio), Duguay-Trouin já havia concebido o ataque ao
Rio de Janeiro e encontrava-se em preparativos, quando as notícias do malogro de Duclerc, e logo depois
de seu assassinato, ecoaram na Corte francesa. Esses fatos lhe deram um pretexto emocional.

Reunindo navios dados pelo rei ao capital de


acionistas (1.200.000 francos obtidos com de
Coulange, de Beauvais, de La Sandre-le-Fer, de
Belle-Isle-Pepin, de L'Espine d'Anican, de
Chapdelaine e do Conde de Toulouse) que
acreditavam nas riquezas que devia possuir a
cidade do Rio de Janeiro, Duguay-Trouin pôde
compor uma esquadra de 17 navios (capitânia
Le Lys, de 74 peças de artilharia) e obter 5.764
homens. Durante a viagem ele apresou mais um
navio de origem inglesa.

Prevenido pela metrópole, o Governador Castro Moraes organizou a defesa, concitando o General-
de-Batalha-do-Mar Gaspar da Costa Ataíde, apelidado "o Maquines", a que colaborasse, utilizando os
homens e os recursos de seus quatro navios, que estavam casualmente no porto do Rio. O efetivo total da
cidade atingia 3.270 homens, muitos dos quais índios, ou populares, pouco afeitos à profissão das armas.
A 12 de setembro de 1711, despontaram os franceses na entrada da barra, forçando-a, graças a um
pequeno nevoeiro. Os tiros dos fortes litorâneos não impediram a entrada dos franceses, apesar de terem
provocado trezentas baixas. Navegaram, lentamente, em direção da ilha de Villegagnon, sem serem
molestados, pois a fortificação nela instalada encontrava-se inoperante por causa da explosão do paiol de
pólvora. Bombardearam a cidade, ao mesmo tempo em que procuraram tomar as naus do Maquines,
conseguindo apenas uma, pois as outras foram inutilizadas por ordem de seu comandante.
Solicitou, o governador, que o Maquines garantisse, com seus homens, a ilha das Cobras, ponto
vulnerável. Mas não sabemos até hoje porque esse militar, tão famoso em guerras passadas, negligenciou
a sua parte, permitindo que os franceses tomassem a ilha nessa mesma noite. Tiros foram trocados com
peças assestadas no Mosteiro de S. Bento, mas sem proveito algum. Na manhã de 14, Duguay-Trouin
desembarcou seus homens na praia de S. Diogo, perto da Bica dos Marinheiros, e ocupou os morros de S.
Diogo, Livramento e Conceição, instalando, neste último, na casa do bispo, o seu quartel general. Do dia
15 ao 18, os invasores fustigaram a cidade com seus canhões. Castro Moraes procurou resistir, ao mesmo
tempo em que pedia ajuda às capitanias vizinhas. Apenas de Parati chegavam 580 homens, sob o comando
de Francisco do Amaral Gurgel.
No dia 19, um emissário francês exigia a rendição. Castro Moraes respondeu: "... Enquanto a
entregar-vos a cidade pelas ameaças que me fazeis, havendo-me ela sido confiada por El-Rei, meu Senhor,
não tenho outra resposta a dar-vos senão que a hei de defender até a última gota de meu sangue". Mas na
tarde do dia seguinte, os militares e notáveis da cidade, reunidos em conselho pelo governador, votaram
unanimemente pelo abandono da praça e a concentração em outra posição, com o auxílio de reforços, para
se proceder a um contra-ataque. Ordenada a retirada, esta se verificou no correr da noite, transformando-se
numa fuga desordenada e vergonhosa, em meio a um temporal fantástico, onde não foram poucos os saques
às propriedades da área rural. Concentraram-se todos em Moxambomba (hoje Nova Iguaçu).
Os próprios prisioneiros da expedição anterior, logrando evadirem-se, avisaram na manhã de 21 ao
comandante francês que a cidade se encontrava em suas mãos. Os fortes se renderam.
Donos da cidade, os franceses procederam a uma completa pilhagem, enquanto se calavam as
últimas resistências esparsas, momento em que morreu Bento do Amaral Coutinho. Duguay-Trouin não
ficou satisfeito com o saque: exigiu do governador um resgate, para não terminar de destruir a cidade.
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Tentou ganhar tempo Castro Moraes, mas, pressionado pelos principais, que temiam perda de suas
propriedades, acabou cedendo em pagar a soma de 610.000 cruzados, além de cem caixas de açúcar e
duzentos bois. Como se imaginava, chegaram os reforços do planalto, comandados por Antônio de
Albuquerque Coelho de Carvalho, que, inexplicavelmente, não se empenhou em nenhuma ação militar com
os seus seis mil companheiros.
A 13 de novembro, partia Duguay-Trouin com uma expressiva presa, cujos lucros foram fixados
em 95%. Pensou atacar Salvador a pretexto de livrar os oficiais de Duclerc ainda presos. Ventos difíceis o
impediram, perdendo, mesmo, dois navios. Do rei francês, recebeu a promoção a Chefe-de-Esquadra e a
comenda de S. Luis e, da História, a fama de marujo audaz. Escreveu depois um livro de memórias.
O povo do Rio de Janeiro atribuiu a Castro Moraes a sua desventura. Alcunhou-o de grosseiro nome
e instou para que Albuquerque assumisse. Realmente, o governador não estava à altura de exercer um
comando militar; tivera êxito em 1710, como consequência do malogro do adversário, não por sua tática
militar. A sua incapacidade se demonstrava diante de um chefe como Duguay-Trouin. Castro Moraes foi
preso, bem como outros oficiais, abrindo-se logo uma devassa, com ouvidores da Bahia, que concluíram
pela culpabilidade de todos, remetidos, em seguida, para o Reino. O governador perdeu seus bens e partiu,
deportado, para o Indução, somente reabilitado em 1730; os militares receberam castigos severos e destinos
semelhantes. Menos o Maquines, contra quem nada se imputou. Uma segunda devassa aberta em Lisboa e
terminada em 1716 concluiu pela culpabilidade de Gaspar da Costa, condenado à prisão, pena que não se
aplicou por falecimento do réu. Antônio de Albuquerque foi, também, censurado pela sua atitude, perdendo
a governança.

B) Os Ingleses:
Os ingleses interessaram-se pelas riquezas nativas do Brasil ainda no século XVI. William Atkins,
em comando do navio Paul of Plymouth, realizou três viagens proveitosas à costa brasileira em 1530, 1536
e 1540. Mas, as correrias de flibusteiros ingleses nos mares brasileiros ocorreram quando o Brasil, seguindo
o destino de Portugal, passou a ser administrado pela Espanha. A rivalidade existente entre esta potência e
o reino de Elizabeth I, que projetava a Inglaterra nos mares, explica as incursões inglesas nos lados
meridionais do Oceano Atlântico. Devemos, também, assinalar a existência das cartas de John Whithali,
inglês radicado em Santos, enviadas a parentes, narrando a presença de pepitas de ouro; elas aguçaram os
corsários, contribuindo, assim, para as viagens de alguns deles.
Em 1583, Edward Fenton, com dois navios, investiu sobre a vila de São Vicente, travando combate
com três galeões espanhóis, comando de André de Equino, que se encontravam no local. Depois de cinco
dias, Fenton desistiu da empresa, apesar de ter afundado um dos galeões. Um dos navios ingleses,
capitaneado por Luke Ward, rumou imediato para a Inglaterra; Fenton ainda fez aguada no Espírito Santo
e tentou comerciar com o donatário Vasco Fernandes Coutinho.
Em 21 de abril de 1587, Robert Withringhton e Christopher Lister, cada um comandando uma nau
de guerra e contando com mais duas embarcações, entraram na Baía de Todos os Santos, apresando
pequenos navios mercantes. A cidade de Salvador resistiu, mas os dois corsários saquearam as fazendas do
recôncavo até junho. Durante esse período, houve diversos pequenos combates com perdas de ambos os
lados.
Quando Thomas Cavendish (o corsário elegante) resolveu excursionar no Brasil, já havia realizado
a famosa viagem de circunavegação do globo, a terceira que se tinha notícia. Sua esquadra era composta
de um galeão, duas naus e dois navios menores, com quatrocentos homens de guarnição. Em Cabo Frio,
apresou um navio português; desembarcou na ilha Grande, onde fez aguada e provocou desordens. Em
seguida, atacou a Vila de Santos (15/12/1591) e dela se apoderou, saqueando-a. O mesmo destino encontrou
a Vila de São Vicente. Cavendish as deixou parcialmente destruídas e incendiadas. Satisfeito, levantou
ferros em 03/02/1592, velejando litoral sul. Atingiu o Estreito de Magalhães. Dificuldades várias o
pressionaram a regressar pelo Oceano Atlântico. Perto de Santos obteve alguns víveres. Resolveu atacar,
de novo, a vila, mas os habitantes repeliram os intrusos. Cavendish rumou para o norte, atingiu Vitória e
desembarcou uma força de ocupação. Em renhido combate, os habitantes e mais índios guerreiros
destroçaram o contingente inglês. Na ilha de São Sebastião abandonou 20 feridos, dos quais apenas dois

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sobreviveram, sendo um deles Antony Knivet, que escreveu curioso relato de suas aventuras. Cavendish
faleceu, com 37 anos, nessa viagem de retorno à Inglaterra.
James Lancaster, tendo como colaborador Edward Fenner, se apresentou diante de Recife e Olinda
com uma armada de 12 navios em abril de 1595. Os moradores não dispunham de forças para efetuar uma
resistência. Recife foi tomada. Quatro dias depois, chegaram três naus e dois navios menores sob o comando
do francês Jean Noyer que se associou aos ingleses. Durante 31 dias, a vila do Recife foi saqueada. Os
recifenses hostilizaram os corsários com táticas de guerrilhas e muitos foram mortos, inclusive Jean Noyer.
Mas o resultado econômico da empresa mostrou-se excelente para os invasores.
Os ingleses ambicionaram se estabelecer na região amazônica, com visíveis interesses de
colonização. Em 1604, Charles Leigh comerciou com os indígenas locais; o mesmo ocorreu com Robert
Harcourt em 1609. A partir de abril até o final do ano de 1610, Sir Thomas Roe realizou minucioso
reconhecimento hidrográfico, visando à descoberta de riquezas. Retornou à Inglaterra, mas enviou duas
expedições até 1614, época em que deve ter sido construído pequeno reduto na embocadura do rio
Amazonas. Sabedor que a região amazônica podia proporcionar muitas vantagens, o Capitão Roger North
obteve uma concessão real (1619) e formou, com nobres e pessoas de dinheiro, uma companhia de
exploração. North, escolhido governador da colônia a ser implantada, organizou uma expedição que se
lançou ao mar em 30/04/1620. Em sete semanas, alcançou a foz do Amazonas navegando até a confluência
do rio Jenipapo, onde já existiam ingleses. Nesse local estacionou. North regressou, depois, à Inglaterra.
Na Amazônia, o posto avançado da colonização portuguesa era o Forte do Presépio; governava-o,
desde 18 de junho de 1621, Bento Maciel Parente, que tudo informava à metrópole do avanço dos ingleses.
De Lisboa, chegava ao Brasil uma nau artilhada, de reforço, sob o comando de Luiz Aranha de Vasconcelos.
Aranha penetrou no Rio Amazonas até o Xingu, tendo destruído os fortes holandeses de Maturu e Nassau;
retornou a Belém com muitos prisioneiros. Na mesma ocasião, Parente excursionou no Rio Amazonas
combatendo o posto inglês fundado por North. Pouco depois, as duas expedições, de Parente e de Aranha,
juntaram-se, ocasião em que foi atacada uma nau holandesa comandada por Pieter Adriaansz, que preferiu
atear fogo ao seu navio para que o mesmo não caísse em mãos dos portugueses. Parente erigiu um forte no
Gurupá e o guarneceu com 50 homens.
Os estrangeiros não desistiram das luxurientas terras amazônicas. Em 1625, o irlandês James Purcell
e o holandês Nikolaas Ouclaen fixaram-se na foz do Xíngu (Mandiutuba). Tão logo as notícias chegaram
ao Forte do Presépio, Parente determinou que Pedro Teixeira, Jerônimo de Albuquerque e Pedro da Costa
Favela, conduzindo cinquenta soldados e trezentos índios, desalojassem os intrusos. Participava desta
expedição Frei Antônio da Marciana. Atacaram o inimigo no dia 23 de maio de 1625, bipartindo as forças
por terra e embarcadas em canoas. Durante a noite, os ingleses e holandeses fugiram agasalhando-se em
outras duas casas-fortes que possuíam rio abaixo. Pedro Teixeira perseguiu-os, juntamente com Costa
Favela, matando alguns e fazendo muitos prisioneiros, inclusive Purcell, que obteve a liberdade em seguida.
No meio do ano de 1627, Roger North, Robert Harcourt e mais 55 associados fundaram a Companhia da
Guiana. No início do ano de 1628, 112 colonos deslocaram-se para a Amazônia, chefiados por James
Purcell. Sem serem incomodados, ergueram fortim de madeira no Tucuiu, nas vizinhanças do
estabelecimento que Pedro Teixeira arrasara quatro anos antes. Pedro Teixeira recebeu a incumbência de
combater os estrangeiros; em setembro de 1629, fortificou-se perto dos inimigos. Teixeira contava com 120
soldados e 1.600 índios. Com essa gente cercou o forte que tinha o nome de Torrego. Em 24 de outubro, os
do forte se entregaram. Teixeira fez 180 prisioneiros incluindo James Purcell que, pela segunda vez, caía
em mãos dos portugueses. A Companhia da Guiana não esmoreceu: em outubro, logo após a rendição do
Forte Torrego, e perto dele, duzentos colonos ergueram o Forte North e prosperaram. Somente em 1631,
mês de janeiro, pôde o Governador do Pará, Jácome Raimundo de Noronha, organizar uma expedição
contra estes ingleses. O combate foi sangrento em razão da resistência oferecida pelos ingleses. Com a fuga
e morte destes, Noronha desmanchou o reduto e retomou a Belém.
A última tentativa inglesa ocorreu ainda nesse mesmo ano de 1631, financiada pelo Conde de
Berkshire. O Capitão Roger Fry, conduzindo um navio e quarenta homens, erigiu o Forte de Cumau,
próximo à foz do Rio Matari. Contra eles partiu Feliciano Coelho de Carvalho, com 240 soldados e cinco
mil índios, utilizando 127 canoas. Fry morreu nos combates que se travaram. Os ingleses retiraram-se, e
Feliciano Coelho arrasou o forte.
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Os atos portugueses para garantir a posse das terras amazônicas foram de extrema crueldade. Os
estrangeiros presos geralmente eram enforcados e as tribos indígenas que apoiassem os não portugueses
eram aprisionadas e escravizadas. Para impedir a reentrada de estrangeiros, foi concebida uma flotilha
permanente na região, apoiando as ações e patrulhando os rios.

C) Os Holandeses:
A inabilidade com que o Rei Filipe II tratou o problema religioso nos Países Baixos e debilidade da
coroa espanhola após a derrota da Invencível Armada para a Inglaterra, originaram uma guerra de libertação
que acabou sendo vitoriosa para os holandeses. Nascia um novo país, a República das Províncias Unidas
dos Países Baixos, a futura Holanda, e em franca rivalidade com a Espanha. Esta fechou seus portos aos
navios batavos, cônscia do poderio marítimo que desfrutava. Para a Holanda que surgia afigurava-se
indispensável à libertação dos mares, mas só a iria obter através de lutas. Desenvolvendo-se rapidamente,
graças aos capitais judeus provenientes da Península ibérica, a Holanda organizou empresas mercantis que
deram origem ao seu império. A primeira foi a Companhia das Índias Orientais (1602), seguindo-se a das
Índias Ocidentais, criada por Willen Usselinx. A sua administração compunha-se de 19 diretores, o
chamado Conselho dos Dezenove, que funcionava em Amsterdã e Midelburg. Essas duas companhias
constituíam empresas mercantis paraestatais, de amplos poderes, pouco influindo nelas os “stathouders”
(governantes) dessa República das Províncias Unidas dos Países Baixos durante esse período que interessa
ao Brasil (Moritz, de 1584 a 1625, Frederich-Henrich, de 1625 a 1647, Willen II, de 1647 a 1650, e Johan
van Witt, de 1650 a 1672). Para justificar a expansão marítima de sua pátria, Hugo von Groot escreveu
Maré liberum, em 1609, tendo provocado uma grande polêmica na Europa.
Deduz-se, portanto, que o procedimento de Filipe II atiçou os holandeses a procurarem nas próprias
fontes os produtos que distribuíam na Europa; a paralisação do mecanismo de revenda dos mesmos
representaria a morte da nação, que fundamentava a sua economia no comércio. O desejo de dominar as
terras produtoras de açúcar não consistiu a única razão das invasões holandesas em terras do Brasil;
desestabilizar o império espanhol (e português) no Atlântico consistia o objetivo primordial.
Por isso, alguns holandeses andaram investigando o nosso litoral. Os quert, comandando uma urca
holandesa, participou do assalto à Bahia impetrado pelos corsários ingleses Withringhton e Lister. Em 9 de
fevereiro de 1599, Olivier van Noortt, utilizando as boas qualidades do seu navio Eendracht, tentou
desembarcar no Rio de Janeiro, mas foi repelido. No mesmo ano, Hartman e Broer, com sete embarcações,
assolaram o recôncavo baiano conseguindo alguma presa. Em 1604, Paulus van Carden, com sete navios,
aventurou-se na Bahia, apoderando-se de muito açúcar. Dez anos depois, Joris van Spilberg, com seis
navios, ocupou a ilha Grande, efetuando depredações em São Vicente e em Santos. Pouco depois, em 1615,
o Governador do Rio de Janeiro, Constantino Menelau, afugentou holandeses que se encontravam em Cabo
Frio, logrando fazer alguns prisioneiros, enviados para o governador geral.
Os holandeses interessaram-se, também, pela Amazônia; sabe-se que Pieter Adriaansz fundou, em
1616, uma colônia na margem do Rio Paru. Um comércio intenso e regular se estabeleceu. Os portugueses
reagiram enviando uma expedição sob o comando de Luís Aranha de Vasconcelos, que destruiu redutos
holandeses e apresou uma nau capitaneada por Adriaansz. Outro holandês, Nikolaas Ouclaen, associou-se
ao irlandês Purcell e fundou um núcleo na foz do Rio Xingu (Mandiutuba) arrasado por Pedro Teixeira,
Jerônimo de Albuquerque e Pedro da Costa Favela. Ouclaen escapou levando muitos em sua companhia.
Teixeira e seus companheiros perseguiu-os atingindo os fortes da ilha dos Tucujus, que combateram e
tomaram no dia seguinte, regressando a Belém com prisioneiros. Ouclaen morreu no campo de batalha.
Afigurava-se melhor, concluíram, ocupar a Zuickerlând, isto é, a terra do açúcar. Foi o que
aconselhou à Companhia, em 1624, Jan Andries Moerbeeck no escrito que intitulou “Motivos porque a
Companhia das Índias Ocidentais deve tirar ao rei da Espanha a terra do Brasil”.

C.1) A Invasão da Bahia (1624 a 1625):


O Governador do Estado do Brasil, Diogo de Mendonça Furtado, prevenido pela metrópole da
iminente invasão, recebera ordens de preparar a defesa. Organizaram-se milícias e todos aguardavam os
holandeses, que não apareceram. Mas o Bispo D. Marcos Teixeira, cioso da Sé que estava construindo, não
admitiu a paralisação dos trabalhos; desentendeu-se com o governador prejudicando a defesa.
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Quando, na manhã de 09/05/1624, chegaram os holandeses, Salvador estava desguarnecida.
Apresentaram-se com um total de 26 navios e 3.300 homens, sob o comando do Almirante Jacob Willekens,
sendo o Coronel Joan van Dorth o encarregado do desembarque e ocupação.
Os holandeses pisaram em terra entre o Forte de Santo Antônio e a cidade; a população masculina,
armada em guerra, procurou resistir. Sentindo a inutilidade de barrar o passo do inimigo, fugiram todos
para o interior e ergueram o Arraial do Rio Vermelho, permanecendo o governador e 17 auxiliares, bem
como os jesuítas, que foram aprisionados e enviados para a Holanda. Estavam vitoriosos os intrusos.
Haviam conquistado com facilidade a capital da Colônia. Apesar de uma proclamação democrática e do
apelo que fez para que todos voltassem aos seus afazeres, van Dorth governou uma cidade vazia. A
população havia se reunido em torno do bispo e decidiu cercar Salvador e empregar o método de
emboscadas, levando em conta o conhecimento melhor do terreno. Formaram 27 companhias de ataque,
com vinte a quarenta homens em cada, que apareciam nos lugares mais diversos e mantinham o inimigo
assustado. Numa dessas emboscadas (17 de junho), Francisco Padilha e seu primo, Francisco Ribeiro,
mataram van Dorth, e, noutra, o seu sucessor, Albert Schouten (3 de setembro).
Durante quase um ano permaneceram em luta; o bispo, esgotado pelas duras fainas, durante as quais
se procurara redimir de suas atitudes iniciais, faleceu a 8 de outubro, substituído, em 3 de dezembro, por
Francisco de Moura, que apertou o cerco contra Salvador.
Com morosidade, o Rei Filipe IV (e III de Portugal) organizou uma expedição militar de libertação,
conhecida como Jornada dos Vassalos, composta de 38 navios espanhóis, 20 portugueses e 4 napolitanos,
todos sob o comando de D. Fadrique de Toledo Osório, Marquês de Villanueva de Valdueza; os napolitanos
achavam-se dirigidos pelo Marquês de Coprani, sendo seu Sargento-mor Giovani Vicenzo Sanfelice, feito
depois Conde de Bagnoli com notável atuação na invasão holandesa em Pernambuco. A Jornada dos
Vassalos, assim chamada por ter entre seus nobres fidalgos espanhóis, portugueses e italianos, todos
voluntários para defender a causa da coroa ibérica. A Jornada dos Vassalos foi também a maior força naval
que havia atravessado o Atlântico até aquela data.
Entraram na Baía de Todos os Santos em 29 de março, exatamente 86 anos depois da chegada de
Torné de Sousa. Durante o mês de abril, procedeu-se o desembarque das tropas e se destruiu ou apresou o
material flutuante inimigo; alguns combates ocorreram no centro de Salvador. Cercados, os holandeses,
pela mão de seu chefe, Johann Errist Kijf, assinaram a paz e se retiraram do Brasil no primeiro dia de maio
de 1625. A armada de socorro holandesa chegou depois da retomada de Salvador.
A Companhia das Índias Ocidentais não obtivera os lucros que sonhara. Antes, só adquirira
prejuízos advindos dos graves erros de planejamento da empresa. Pensou que atacando a capital
conquistaria toda a Colônia; menosprezou o adversário, supondo que ele não teria competência ou que não
se unisse; não conservou sua força naval, perdendo, assim, o domínio do mar. Contudo, aprendera que o
melhor ponto da costa era Pernambuco.
Nesse mesmo ano de 1625, nos dias 12 e 13 de março, Pieter Hein investiu sobre Vitória, no Espírito
Santo; mas os habitantes repeliram os intrusos. Em 1627, o mesmo Hein, com nove navios e 1.500 homens,
efetuou uma sortida contra Salvador (já sem a presença da Jornada dos Vassalos) apresando diversos navios
mercantes. Hein continuou assolando o recôncavo; em um desses combates, no Rio Pitanga (12 de junho),
com os habitantes perdeu a vida o Capitão Francisco Padilha. No ano seguinte, Hein conseguiu apreender
15 naus componentes da esquadra da Prata, comandada por D. Juan de Benavides. Foi com o lucro dessa
presa, calculado em 15 milhões de florins, que a Companhia pôde preparar outra expedição contra o Brasil.
Mas, Pieter Hein não ganhou as glórias do comando: morreu em 1629.

C.2) Invasão de Pernambuco (1630 a 1654):


Entretanto não se acreditava em uma segunda invasão, nem nas advertências de Frei Antônio
Rosado, que clamava que “de Holinda para Holanda não havia mais que uma diferença de um i para um
a” (segundo a grafia da época que escrevia os dois nomes com H). Os espanhóis, tomando conhecimento
que se tramava a ocupação de Pernambuco, determinaram que o seu Capitão-mor, Matias de Albuquerque,
regressasse ao Brasil, concedendo-lhe uma ajuda de 27 soldados e três caravelas. Albuquerque fez o que
pôde para a defesa da capitania.

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Em 14 de fevereiro de 1630, surgiram os
holandeses em frente a Olinda. Era uma armada de 69
velas, entre as quais 35 grandes naus, e 7.280 homens,
entre marujos e soldados. Todos comandados pelo
Almirante Wendrich Comeliszoon Lonck e do Coronel
Diederik van Waerdenburch. Forçaram o porto sem
conseguir entrar, por estar a barra obstruída, preferindo
desembarcar 2.948 homens mais ao norte, na praia do
Pau Amarelo, guiados pelo judeu Antônio Dias, que
morara em Pernambuco. Matias de Albuquerque, com
850 homens, ofereceu combate junto ao Rio Doce,
perdendo, apesar da bravura de seus comandados.
Ainda houve resistência em Olinda, mas Matias de
Gravura neerlandesa mostrando o cerco a Olinda em 1630
Albuquerque retirou-se para Recife onde ainda
esboçou um contra-ataque.

Percebendo que a permanência em Recife se mostrava arriscada, destruiu os armazéns, navios com
preciosas cargas e se retirou para as margens do Rio Capiberibe, a igual distância entre os dois núcleos,
fundando o Arraial do Bom Jesus (04/03/1630), formado com todos aqueles que fugiam dos holandeses.
Com a capitulação do Forte de São Jorge, comandado por Antônio Lima, os holandeses ocuparam Recife
(03/03/1630).
Enquanto o arraial se tornava uma fortificação capaz de resistir aos inimigos, os nossos
organizaram-se no sistema de guerrilhas que bons resultados dera na primeira invasão. Os mais diversos
elementos se confraternizaram para combater os intrusos, destacando-se os índios do bravo Poti (depois
batizado de Antônio Filipe Camarão) e diversos negros sob o comando de Henrique Dias.
As guerrilhas predispunham os invasores a um permanente estado de sobreaviso, causando, assim,
intenso nervosismo nos holandeses, que se viram em situação constrangedora. Por isso, construíram as
fortificações do Brum, de Cinco Pontas e Três Pontas.
Logo receberam reforços: 16 navios e cerca de mil homens sob o comando de Adriaen Iansen Pater.
Por isso, animaram-se a ocupar a ilha de Itamaracá, onde ergueram o Forte Orange. Entretanto, o governo
espanhol aprestou uma esquadra que visava a compelir os invasores a uma capitulação. Comandava-a D.
Antonio de Oquendo. Este atingiu Salvador em 13 de junho (1631); em setembro, fez-se ao mar para
conduzir reforços para Matias de Albuquerque. Os holandeses estavam, porém, vigilantes; Oquendo tentou
safar-se se dirigindo para o sul; Pater seguiu-o.
Encontraram-se as duas esquadras em setembro de 1631, em Abrolhos, travando o primeiro combate
naval de larga envergadura da história brasileira (Combate Naval de Abrolhos) e de toda a América até
aquele momento. Outra grande batalha só terá lugar em 1640. Oquendo dispunha de vinte navios de guerra,
com 439 peças, comboiando navios que transportavam açúcar e 12 caravelas com tropas de apoio, sob o
comando do Conde de Bagnoli. Pater tinha 16 navios com 472 peças. Às nove horas de manhã, começou a
batalha que durou até o anoitecer. Oquendo repeliu o ataque adversário provocando a sua fuga, tendo sido,
portanto, o vencedor, apesar de ter tido tantas perdas quanto Pater, que morreu nesse dia, afundando com
sua capitânia Prinz Wíllen. Complementando a sua missão, Oquendo conseguiu desembarcar o
destacamento militar comandado pelo Conde de Bagnoli; pouco depois, esta força juntou-se aos que
seguiam Albuquerque.
A posição dos holandeses estabilizara-se. Dispunham, nesse momento, de sete mil homens. Seu
comandante, Coronel Waerdenburch, firmou-se na Ilha de Itamaracá; a direção do Forte Orange foi
entregue ao Coronel Crestofle d'Artischau Arciszewsky, mercenário polonês.
Por ordem de Albuquerque, Bagnoli e trezentos napolitanos dirigiram-se para o Cabo de Santo
Agostinho, onde erigiram o Forte de Nazaré.
Em 25 de novembro, Waerdenburch incendiou Olinda e se concentrou no Recife. Tentou conquistar
o Forte Cabedelo, na foz do Rio Paraíba, sem sucesso; a pequena expedição do Capitão Smient atingiu o
Forte Ceará e não foi mais feliz; e a investida sobre o Forte dos Reis Magos redundou em fracasso.
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Mas, a traição de Calabar (20 de abril de 1632) mudou a sorte dos acontecimentos. Domingos
Fernandes Calabar era um natural da terra, nascido em Porto Calvo; seu interesse residia na ambição de
enriquecer. Desentendendo-se com Albuquerque, talvez por causa do contrabando de alimentos, foi expulso
do arraial. Os holandeses, agora dirigidos por um homem de valor, o General Sigmund von Schkoop, e
tendo o apoio de um conhecedor da terra, conseguiram desarticular as guerrilhas e alcançar inúmeras
vitórias: partindo do Forte de Orange, na Ilha de Itamaracá, dominaram toda a ilha, expulsando o Capitão
Salvador Pinheiro e sua gente; assaltaram Igaraçu; cercaram o forte do Rio Formoso, onde o Capitão Pedro
de Albuquerque e vinte homens resistiram a quatro ataques mas morreram 19; o capitão, ferido, foi
conduzido ao Recife e se restabeleceu, seguindo para as Antilhas e daí para a Europa. Waerdenburch
retirou-se para a Europa, sendo substituído (24/03/1633) pelo Major Rembach. Ainda com a participação
de Calabar, uma expedição, sob o comando de Lichtardt, ocupou Natal e cercou o Forte dos Reis Magos,
no Rio Grande do Norte, capitulando a sua guarnição (12/12/1633). Em 16 de dezembro (1634), os
holandeses conquistaram o Forte de Cabedelo na Paraíba; em seguida, assaltaram o Forte de Santo Antônio,
situado na margem esquerda do Rio Paraíba, e investiram sobre Filipéia, que passou a se chamar Frederícia.
Continuando sob a orientação de Calabar, os holandeses ocuparam Porto Calvo e obtiveram a rendição do
Forte de Nazaré (02/07/1635). Em seguida, cercaram o Arraial do Bom Jesus, que se rendeu em 8 de julho,
apesar dos esforços de seu comandante, Coronel André Marin.
Cerca de sete mil pessoas encetaram penosa marcha para o sul, em direção a Alagoas. Reagiu
Sebastião do Souto cercando Porto Calvo e obrigando a render-se o Major Picard, com seus 402 homens,
entre os quais se encontrava Calabar. Albuquerque, sabedor deste episódio vitorioso, acorreu em Porto
Calvo e ordenou o enforcamento de Calabar, que, assim, ocorria, por ironia da História, na terra que nascera
(22 de julho de 1635).
Esses fatos sacudiram a Corte do rei espanhol que mandou um reforço de 1.700 soldados, sob o
comando do General D. Luis de Roias y Boria, Duque de Gandía, substituto de Albuquerque, recolhido
preso ao Reino. Resolveu o afoito duque oferecer combate aberto. Em Mata Redonda, próximo a Porto
Calvo, alinhou seus combatentes, 1.100, contra 1.300 do Coronel Arciszewsky, perdendo espetacularmente,
sendo morto logo aos primeiros tiros (18/01/1636). Seu exército contou duzentas baixas e recuou para Porto
Calvo; os holandeses tiveram quarenta mortos e 85 feridos, mas não souberam aproveitar a vitória. O duque
foi substituído por Bagnoli, que prudentemente volveu ao sistema de guerrilhas.

C.3) Governo de Nassau (1637 a 1644):


Firmava-se, assim, o Domínio Holandês. As exportações de açúcar aumentavam gradativamente,
bem como o pau-brasil e outros produtos; a população voltava aos seus afazeres normais. Por isso, a
Companhia procurou um homem que reunisse o gênio militar à capacidade administrativa para consolidar
seus domínios. A escolha recaiu no Conde Johan Mouritz von Nassau-Siegen, natural de Dilenburg
(17/06/1604), dotado de aguda inteligência e educação humanista esmerada; falava alemão, holandês,
francês e latim com fluência. Contava, então, com 33 anos de idade. O príncipe alemão chegou ao Recife a
23 de janeiro (1637), com o título de governador geral, capitão-general e almirante, enfeixando, assim,
todos os poderes militares e civis. Trouxe soldados, colonos, artesãos, cientistas e artistas.
Desenvolveu-se logo uma atividade militar. Expulsou Bagnoli de Alagoas, após a vitória de
Comandatuba (18/02/1637), ribeiro que deságua no Rio das Pedras, ao sul de Porto Calvo, Alagoas. Nassau
atacou, com 4.400 homens, o destacamento de 1.180 do Tenente-Coronel Alonso Ximenes de Almirón, que
sofreu grandes perdas (Henrique Dias teve a metade de seu braço esquerdo amputada). Bagnoli retirou-se
para o sul com sua gente, deixando ainda alguns no forte de Porto Calvo que capitulou em 6 de março.
Em Penedo, à margem do São Francisco, Nassau levantou um forte; devastou Sergipe e absorveu
parte do Ceará até Fortaleza, No ano seguinte, 16 de abril, uma esquadra holandesa, comando de Joan van
der Mast, contando com a presença do Conde de Nassau, entrou na Baía de Todos os Santos desejando
ocupar Salvador. Desembarcaram em praia deserta e avançaram sobre a cidade defendida pelo Conde de
Bagnoli e sua gente. O Governador geral, Pedro da Silva, depois cognominado “o Duro”, a tudo proveu,
Verificaram-se vários combates isolados, salientando-se ataque, noturno, de Nassau em 18 de maio, ganho
pelos nossos graças à investida que Luis Barbalho fez na retaguarda do inimigo. No dia 25, Nassau desistiu
de ocupar Salvador: regressou com sua gente aos navios velejando para Pernambuco. O Rei Filipe IV
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recompensou o governador dando-lhe o título de Conde de São Lourenço e ao Conde de Bagnoli, a
dignidade de príncipe e o feudo do Monteverde. Nassau dirigiu, então, o seu interesse para a costa da África:
conquistou São Jorge da Mina, de onde obteve muitos escravos. Recife foi feita sua capital, com o nome
de Cidade Maurícia (Mouritzstadt). Nela levantou o seu palácio, o Vriburg (Retiro), cujo chão é ocupado
hoje pela sede do governo de Pernambuco (Palácio das Princesas).
Nassau caracterizou o seu governo pela inteligência, sobriedade e bom senso. Procurou logo
embelezar a sua capital a fim de dotá-la de todo o conforto, melhorando o padrão de vida da população.
Diversas ruas e praças receberam calçamento de tijolos esmaltados à moda holandesa; pontes foram
construidas e os alagados foram drenados por meio de canais, muitos dos quais projetados pelo engenheiro
Frederik Pistor. Fundou o primeiro observatório astronômico da América, dirigido por Georg MarcGrave.
Nele, também, atuou o cosmógrafo Michiel de Reyter. MarcGrave associou-se a Willen Piso, que era
médico do conde e ambos escreveram a História Naturalis Brasiliée (Leyclen, 1648). Algumas expedições
procuraram devassar o interior e descobrir riquezas, destacando-se aquela que Gidean Morris de Jorge
dirigiu.
As artes floresceram, com os pintores Franz Post (irmão de Pieter), o alemão Zacharías Wagener, o
desenhista Albert Ekhout.
Estabeleceu a liberdade de fé, cada qual podia ter a religião que quisesse. Com essa política, Nassau
conseguiu atrair muitos brasileiros e portugueses, chegando a conceder-lhes assentos nos conselhos de
Escabinos (Schepenen), que substituíram as câmaras de vereadores, cujo presidente, o escolteto, defendia
os interesses da Companhia e possuía o poder de polícia. Os judeus abriram sinagogas, sendo duas na capital
do Brasil Holandês: Zur Israel e Maguen Abrahan.
A lavoura da cana renasceu, permitindo lucros fabulosos, graças ao funcionamento de engenhos,
cujos antigos senhores receberam atenções e mercês. Um desses, João Fernandes Vieira, nascido na Ilha da
Madeira, obteve importante posição. Nassau preocupou-se com a plantação da mandioca, alimento popular,
e impediu a derrubada de cajueiros, cujos frutos serviam para alimentação dos pobres.
A importância que Recife atingiu no século XVII como sede do Brasil Holandês explica,
igualmente, a presença de estrangeiros, devendo-se registrar o comerciante francês Louis Heins, católico,
mas existiram alguns calvinistas, como Joachim Soler (franceses aderiram aos luso-brasileiros contra os
holandeses, sendo interessante lembrar a figura de François Dumont, que se especializou em artifícios
militares de fogo). Diversos ingleses viveram no Recife como mercenários da Companhia das Índias. Os
irlandeses dedicaram-se ao comércio ambulante. Numerosos, também, foram os alemães, alguns
mercenários, como o Coronel Von Schkoppe. Muitos israelitas se estabeleceram no Recife, aproveitando-
se do clima de liberdade; é o caso do médico Abraão Mercalo e do rabino Isaac da Fonseca.
Não haviam desanimado os nossos. Da metrópole, vinha o Conde da Torre, D. Fernando de
Mascarenhas, novo governador, com 26 galeões e outros navios menores transportando reforços. Era 20 de
janeiro de 1639. André Vidal de Negreiros e Antônio Dias Cardoso dirigiram-se para a Paraíba, para
organizarem guerrilhas contra os holandeses. Nessa oportunidade, diversos paulistas, incluindo Antônio
Raposo Tavares, atingiram Salvador a fim de integrar a força do Conde da Torre.
O conde preparou-se por quase um ano, fazendo-se ao mar em novembro, com 48 navios de guerra
e vários transportes, levando uma tropa de reforço de diversas capitanias brasileiras, todas sob o comando
do Príncipe de Bagnoli. Nassau mandou-lhe ao encontro uma esquadra de 41 navios, dirigida pelo
Almirante Willem Cornellizoon Loos, A 12 de janeiro, encontraram-se ao norte de Itamaracá, na altura da
Ponta de Pedras, morrendo Loos nesse mesmo dia; o segundo combate travou-se no dia seguinte em frente
ao Cabo Branco; o terceiro, no dia 14, ocorreu na altura da Paraíba, havendo perda de ambos os lados; o
último encontro verificou-se no dia 17, perto da baía Formosa, tendo o Conde da Torre repelido os
holandeses que perderam três navios. O conde determinou o desembarque de 1.400 soldados em Touros
(Rio Grande do Norte). Estes, conduzidos por Luis Barbalho, atravessaram território inimigo, travando
vários combates, atingindo, enfim, Salvador após quatro meses de marcha.
A Batalha Naval de 1640, a segunda grande batalha em águas brasileiras, foi uma derrota para os
hispano-luso-brasileiros. Após cinco dias de combates intermitentes, as tropas não haviam sido
desembarcadas, a força naval estava cada vez mais ao norte de onde deveriam estar e com resultados
insatisfatórios, a força holandesa muito pouco sofrera e, por conseguinte, os holandeses continuavam a
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manter o domínio dos mares, e se aproveitando desse domínio expandiram sua conquista ao longo da costa
nordestina.
Substituído o Conde da Torre, mandado preso para Lisboa onde findou nos cárceres de S. Julião,
chegava D. Jorge de Mascarenhas, Marquês de Montalvão, o primeiro a possuir o título de vice-rei do
Brasil, empossado a 26/05/1640, sem que o Brasil fosse elevado à categoria de vice-reinado. Em
01/12/1640, ocorreria a restauração da coroa em Portugal, com o Duque de Bragança sendo empossado rei
com o título de D. João IV.

C.4) A Luta de Reconquista (A Insurreição Pernambucana):


Devido aos elevados custos das guerras europeias, principalmente com a Inglaterra, a Companhia
das Índias Ocidentais adotara nova política financeira e administrativa para a região nordestina. A nova
estratégia impunha crescentes restrições aos gastos e cobranças dos empréstimos feitos aos senhores de
engenho, o que contrariava o caminho escolhido por Nassau. Em junho de 1641, Holanda assinou uma
trégua de dez anos com Portugal, mas antes de assinar este armistício, trataram de alargar suas conquistas,
ocupando no Brasil as regiões de Sergipe e Maranhão e, na África, São Tomé e Angola. Nassau não
concordava com essa política e seu descontentamento levou-o a ser destituído do cargo e a regressar ao seu
país em 1644.
Os últimos anos da administração de Nassau foram de crescentes dificuldades na economia
açucareira nordestina, com o declínio de preços no mercado europeu, a perda de safras por incêndios, pragas
e inundações, a elevação dos juros dos empréstimos e a consequente falência de muitos senhores, de
engenho.
Com a saída de Nassau, foi retomado o confronto com a Companhia das Índias Ocidentais. Antes
mesmo que ele deixasse o Brasil, a luta havia-se reacendido no Maranhão, culminando com a expulsão dos
holandeses de São Luís. A insurreição alastrou-se por todo o Nordeste, atingindo, em 1645, Pernambuco,
onde a situação se tornava cada vez mais tensa, dada a intensificação da cobrança das dívidas contraídas na
época de Nassau. Logo depois, eclodiu o movimento que determinou a expulsão definitiva dos holandeses
da região, a Insurreição Pernambucana.
A inteligente administração de Nassau afastou a possibilidade de uma grande reação contra os
holandeses. Sua saída provocou o desejo de expulsar os intrusos. Um conselho de três negociantes fanáticos
(Hamel, de Amsterdã, Bas, de Harlen, e Bullestrate, de Midelburg) substituía Nassau, direcionando-se por
restringir a liberdade religiosa. A repulsa ao luteranismo embasou um forte sentimento popular contra os
holandeses.
Cumpre consignar, porém, que os eventos que culminaram com a saída dos holandeses principiaram
no Maranhão, a 30/09/1642, ainda na administração nassoviana. Antônio Muniz Barreiros tomou, aos
invasores, o Forte do Calvário, no Itapecuru, e derrotou-os em Cotim; Antônio Teixeira de Melo, que passou
a exercer o comando, venceu a batalha do Outeiro da Cruz, em 22/02/1644, obrigando os batavos a se
retirarem no dia 28, atravessando o Ceará. André Vidal de Negreiros coordenou a insurreição: ele conseguiu
atrair o rico português João Fernandes Vieira. Vários senhores de engenho aderiram à causa que não podia
ser oficial, tendo em vista o Tratado de Paz.
Os colonos não contaram inicialmente com a ajuda direta de Portugal (sem finanças pelo desastroso
período de União Ibérica, preso à Trégua dos Dez Anos com a Holanda e em guerra de libertação com a
Espanha) e defendiam interesses próprios discordantes da política oficial lusa. Após as primeiras vitórias
dos colonos, o movimento foi ganhando apoio metropolitano, com o envio de reforços. O fortalecimento
da luta, que tinha entre seus líderes o negro Henrique Dias e o indígena Felipe Camarão, ganhou mais força
com o apoio dos grandes senhores de engenho às forças populares.
De tudo sabia o Governador Geral Antônio Teles da Silva, que recebera instruções secretas do rei
no sentido de desencadear uma guerra subversiva nos domínios holandeses.
O Sargento-mor Antônio Dias Cardoso recebeu incumbência de penetrar na região da Paraíba e
Pernambuco para treinar homens. Seu nome, hoje, emerge como figura exponencial na atividade militar,
que precede à ação propriamente dita.
Assim, a "guerra brasílica", que teve tão bons resultados iniciais, cedeu lugar à presença de
profissionais com bom nível de treinamento. E como não era possível alcançar uma vitória somente com a
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tropa de linha, procedeu-se a um amplo recrutamento nos interiores próximos e distantes. Um relatório
holandês resume como se afiguravam as forças luso-brasileiras: "É um exército composto tanto de soldados
como de moradores, mamelucos, índios e negros".
Sob o pretexto de vencer índios em revolta, ardilosamente provocada por Filipe Camarão com seus
seguidores, atingiu Pernambuco uma força sob o comando de Henrique Dias, e, para "prenderem" João
Fernandes Vieira, uma tropa de infantaria foi mandada para Pernambuco, comando de André Vidal de
Negreiros e Martim Soares Moreno. O plano contava, ainda, com a adesão de Dirk Hoogstraten, que
comandava o Forte de Nazaré, e Gaspar van der Ley, casado com uma brasileira. Marcou-se o início da
conjura para 24 de junho de 1645. Os insurgentes se denominaram de independentes.
Souberam de tudo os batavos por causa das denúncias de Sebastião Carvalho e Fernando Vale,
obrigando os nossos a se apressarem e a deflagrarem o movimento a 13 de junho. Encontraram-se, perto
do monte das Tabocas (03/08/1645), os 1.600 homens conduzidos por Antônio Dias Cardoso contra os
1500 homens comandados pelo Coronel Hendríck van Haus, resultando em uma vitória dos independentes.
Vieira recebeu o comando geral e marchou sobre Recife, compelindo os batavos a uma capitulação no
Engenho de Nassau (Casa-forte) em 17 de agosto.
Os êxitos dos independentes conduziram à organização, na Bahia, em 1644, de uma força naval para
auxiliá-los. Inicialmente esta Força foi encaminhada para Pernambuco, fundeando em frente à Recife.
Tentando camuflar suas intenções eles declararam que estavam ali para apoiar os holandeses na pacificação
da praça, no entanto, receberam como resposta às suas cartas o pedido de se retirarem Dalí, e não sendo
favorável a ação por estarem em número reduzido, em posição inferior e devido a tempestades que
ocorreram durante sua estadia, acabaram se retirando sem ter havido qualquer combate. Este episódio ficou
conhecido como “A Jornada do Galeão”. Esta força improvisada, comandada pelo Coronel Jerônimo
Serrão de Paiva, acabou por se separar das forças de Salvador Correa de Sá devido às tempestades e abrigou-
se na Baía de Tamandaré, litoral de Pernambuco. No dia 09/09/1645, o Almirante Lichthardt resolveu atacá-
la. Os navios portugueses (sete naus, três caravelas e quatro menores) estavam fundeados. Os holandeses
investiram com oito navios. Os marujos e soldados portugueses atiraram-se na água e fugiram: uma derrota
completa de Serrão de Paiva.
Apesar deste revés, Fernandes Vieira e seus seguidores prosseguiram em direção a Recife e
fundaram o Arraial Novo do Bom Jesus, na Várzea. Sua construção começou a partir de 15/10/1647. A luta
foi intensa naquele ano, Sigmund von Schkoop assolou a ilha de Itaparica e obteve algumas vantagens. A
possível ameaça a Salvador motivou o rei português a preparar uma força naval. Denomina-a "Armada de
Socorro do Brasil", dando o comando a Antônio Teles de Menezes, feito Conde de Vila Pouca de Aguiar.
Em 24 de dezembro de 1647, os vinte navios dessa armada chegavam a Salvador.
Von Schkoop não aguardou a presença deste reforço; abandonou Itaparica em 15 de dezembro. E
qual seria o efetivo holandês nesta oportunidade? Os holandeses deviam contar com uma força de,
aproximadamente, cinco mil homens, além de uns mil indígenas. Excetuando estes, os homens estavam
treinados segundo o sistema europeu, próprio da Guerra dos 30 Anos. Mas o moral da tropa já começava a
enfraquecer.
Desejando evitar o prolongamento das hostilidades, o Rei D. João IV efetuou gestões diplomáticas
neste ano de 1647. Enviou à Holanda o Padre Antônio Vieira com a oferta de três milhões de cruzados em
troca da devolução das terras, o que não foi aceito. Pensou o jesuíta em oferecer a Holanda, a título precário,
a capitania de Pernambuco, pela desistência das outras terras; expôs suas ideias em documento que o rei
português apelidou de "Papel Forte" (14/03/1647). Mas a sugestão do Padre Vieira foi recusada pelo
Conselho da Coroa,
O mesmo jesuíta, então, elaborou o plano de uma companhia de comércio, no estilo holandês, que
deveria colaborar para a expulsão dos holandeses em troca de vantagens comerciais futuras. A Companhia
Geral de Comércio do Brasil somente se constituiu com capitais dos cristãos-novos que obtiveram do rei a
suspensão do confisco de seus bens (06/02/1649).
Não havendo como escapar da luta armada, o rei deliberou enviar um experimentado militar para
comandar os independentes. Escolheu Francisco Barreto de Menezes (que tinha 30 anos de idade), que
recebeu o posto de Mestre-de-Campo-General. Após acidentada viagem, Barreto conseguiu chegar ao
Arraial Novo, onde tomou posse de seu cargo em 16 de abril de 1648. Barreto soube valer-se de André
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Vidal e Dias Cardoso, prováveis planejadores dos movimentos que precederam os combates nos arredores
de Recife, Percebendo a intenção do comando holandês de impor à população civil, que apoiava o
movimento insurrecional, pesadas perdas, Barreto se antecipou e se postou em local favorável a uma
batalha, isto é, nos Montes Guararapes (cuja significação é: nos tambores).
Em 19 de abril de 1648, Barreto obteve uma vitória expressiva nesse local. Contava com 2.220
homens provenientes da Paraíba, de Igaraçú, de Goiana e da Bahia. Os holandeses deviam contar com 4.500
homens e, talvez, 500 indígenas. A batalha travou-se mais precisamente no Boqueirão, abaixo do Morro do
Telégrafo. A batalha durou cinco horas: holandeses tiveram 515 mortos e 523 feridos; os independentes
sofreram 80 baixas (contando-se entre estas o índio Poti, que veio a falecer em 24 de agosto). No dia
seguinte, Barreto apoderou-se de Olinda e estreitou o cerco sobre Recife.
No Rio de Janeiro, o seu governador, Salvador Correa de Sá e Benevides, aprestou expedição com
a finalidade de reconquistar Angola. Com novecentos homens e guarnições distribuídos em 21 navios,
Benevides partiu para a África em 12 de maio de 1648, logrando êxito em sua missão. Devido a base desta
ação ter sido o Rio de Janeiro e ainda contar com a participação de brasileiros, inclusive índios, a libertação
de Angola em favor da coroa lusa em 1648 é considerada a primeira projeção brasileira de poder para o
exterior. A evidência da necessidade da manutenção das rotas de navegação entre Portugal, a África e o
Brasil, levou a criação da Companhia Geral do Comércio do Brasil, ainda em 1648.
A impossibilidade de continuar sustentando o domínio do mar conduziu a situação difícil para os
invasores. Por isso, o Coronel Van den Brinck deliberou desferir outra batalha. Com 4.200 homens e seis
canhões, ocupou os Montes Guararapes. Os nossos, dispondo de 2.600 infantes e 150 cavalarianos, tentaram
desalojá-los, sem conseguir; às 13 horas do dia 19 de fevereiro (1649), os holandeses desceram das posições
que se encontravam, travando-se a luta na planície, decidindo-se favoravelmente para os independentes.
Brinck faleceu na refrega, juntando-se às mil baixas inimigas.
A guerra ainda prosseguiu por mais cinco anos; os holandeses não se expunham além de Recife, e
os independentes não dispunham de artilharia de sítio nem de engenheiros para acometer as fortificações
da cidade.
Ao mesmo tempo em que os holandeses sofriam
derrotas na colônia, como na batalha do monte
das Tabocas e nas duas batalhas de Guararapes,
enfraqueciam-se também no cenário europeu
diante da Inglaterra, que se transformara na sua
principal concorrente no comércio internacional.

Batalha de Guararapes (1879), Victor Meirelles. Museu


Nacional de Belas Artes, Brasil

Vários holandeses compreenderam que a luta estava próxima do fim e, amotinados, buscaram
refúgio nas Antilhas. E as guerras navais que se abriram entre a Holanda e a Inglaterra, em decorrência do
Ato de Navegação, de Cromwell, concorreram para apressar o desfecho. Os Atos de Navegação, decretados
pelo governo inglês de Oliver Cromwell a partir de 1650, protegiam os mercadores ingleses e suprimiam a
forte participação holandesa no comércio inglês. As tensões crescentes deram início à guerra entre Países
Baixos e Inglaterra (1652-1654), o que favoreceu a maior aproximação entre ingleses e portugueses. Diante
da derrota militar para os britânicos, os holandeses, enfraquecidos e desgastados, também perderam para
as forças luso-pernambucanas, que, em 1654, puseram fim à sua dominação sobre o Brasil.
Schkoop e seus homens se viram reduzidos ao Recife, perdendo as suas praças fortes, cercados por
mar pelos 64 navios mercantes e 13 de guerra, comando do Almirante Francisco de Brito Freire, armados
pela Companhia Geral de Comércio do Brasil. Assim, capitulou o Forte do Rego (14/01/1654). Na margem
esquerda do rio Capibaribe, rendeu-se o reduto Altenar (Major Berghen e 180 homens); no dia 23, pediu
armistício o Forte Cinco Pontas, comandado por Waulter van Loo. Três dias depois, Cilbert de With e
Huybrecht Brest assinaram com Francisco Álvares Moreira, o Capitão Manoel Gonçalves Correa e o
Capitão Afonso de Albuquerque uma capitulação, com 27 artigos, no local chamado Campina do Taborda

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(nome de um pescador residente no local). Barreto recebeu as chaves de Recife no dia 28. Os holandeses
retiraram-se, em seguida, das terras brasileiras; alguns, porém, permaneceram misturando-se à população
local.
A Companhia das Índias Ocidentais não se deu por vencida: em 1657 declarou guerra a Portugal e
formalizou o bloqueio naval à entrada do Rio Tejo. Diante da resistência portuguesa, as hostilidades se
abriram, passando em seguida às negociações diplomáticas graças à interferência do Rei da Inglaterra,
Carlos II. Tantas exigências impôs o governo holandês que, somente a 06/08/1661, o Rei Afonso VI
conseguiu a assinatura do Tratado de Haia, pelo qual a Companhia das Índias Ocidentais desistiu do Brasil,
indenizada com quatro milhões de cruzados e a posse do Ceilão, Málaca e Molucas.

2.10) Os Anos do 1700:

A) A Descoberta do Ouro:
A pobreza da inicialmente próspera capitania de São Vicente, frente ao sucesso do empreendimento
açucareiro no Nordeste, levou à organização de bandeiras, expedições cujo objetivo era procurar riquezas
no interior da colônia e apresamento de nativos, além de ataques contratados a quilombos, como ocorreram
posteriormente.
Diante da ocupação de Pernambuco e da região africana de Angola pelos holandeses, as demais
capitanias não tinham acesso a carregamentos de escravos. Assim, embora as primeiras bandeiras de
apresamento de índios visassem obter mão-de-obra para a pequena lavoura paulista ou a venda para regiões
próximas, progressivamente passaram também a sanar as dificuldades dos senhores de engenho do
Nordeste, onde se localizava a maior produção agrícola baseada em mão-de-obra escrava.
Muitas bandeiras atacaram as missões jesuíticas do Oeste e Sul da colônia, capturando milhares de
nativos e cobrando um valor mais alto pelos aculturados por estarem adaptados ao trabalho agrícola.
A atividade apresadora de índios entrou em decadência, com o fim do domínio espanhol e a
retomada do comércio de africanos pelos portugueses, normalizando o abastecimento de escravos para a
colônia. Os paulistas organizados em bandeiras dedicaram-se, então, a atacar aldeamentos de nativos
insubmissos e de negros fugidos que viviam em quilombos. Essas expedições, a serviço dos fazendeiros ou
da administração colonial, eram chamadas de bandeiras de contrato, destacando-se a de Domingos Jorge
Velho, que venceu a resistência dos cariris e janduís e destruiu o quilombo de Palmares, em fins do século
XVII.
As mais importantes bandeiras foram, contudo, as destinadas à procura de metais preciosos,
incentivadas pela metrópole devido ao declínio da economia açucareira nordestina na segunda metade do
século XVII devido ao sucesso do empreendimento exercido pelos holandeses nas Antilhas após a expulsão
do Brasil. O financiamento das expedições paulistas trouxe a descoberta de ouro na região de Minas Gerais
– como em Vila Rica, atual Ouro Preto, e Sabará –, depois Mato Grosso e Goiás, dando início à atividade
econômica mineradora na colônia.
Portugueses, estrangeiros e colonos de
outras áreas, apelidados pelos paulistas de
emboabas (forasteiros), foram atraídos para a
região das minas, entrando em conflito
armado com os descobridores das jazidas e
terminando por expulsá-los da região. Os
bandeirantes paulistas dirigiram-se, então,
para a região central da colônia; em 1719,
Pascoal Moreira Cabral descobriu ouro em
Cuiabá e, em 1722, Bartolomeu Bueno Filho
achou riquezas em Goiás.

A área de mineração no início do século XVII


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Apesar de terem dizimado e submetido à escravidão muitos grupos indígenas, é inegável a
contribuição das bandeiras para a ocupação e povoamento do interior do Brasil, fundando povoados,
criando vilas, dando início à exploração mineradora e, sobretudo, ampliando as fronteiras da colônia além
dos limites estabelecidos pelo tratado de Tordesilhas.

B) Os Vice-Reis na Bahia:
A descoberta do ouro e dos diamantes e o consequente progresso da Colônia despertaram a
administração portuguesa, que passou a olhar com maior interesse para o Brasil, Coincidiu com o
desabrochar do iluminismo cartesiano entre os pensadores europeus, que influenciaram os governantes a
assumir atitudes mais justas para com os povos. Reinou D. João V de 1706 a 1750.
A partir de 1714 os governadores gerais, que tinham por capital Salvador, ostentam o título de vice-
rei, sem, contudo, existir qualquer ato de elevação do Brasil a vice-reino; foram enviados ilustres homens
e administradores capazes, que empreenderam obras de vulto.
O Marquês de Angeja (D. Pedro Antônio de Noronha) realizou ótimo governo (1714 a 1718); serviu-
se do Brigadeiro Jean Massé, calvinista francês, que ergueu fortificações no estilo Vauban e reformou e
ampliou os fortes de S. Marcelo e do Barbalho, ambos em Salvador. Reabriu a Casa da Moeda, aumentou
a Sé, enquanto a população ia construindo suas casas sem regularidade alguma. La Barbinnais, francês,
visitou Salvador nessa época deixando interessante descrição da cidade e de seu povo devoto e indolente.
O Conde de Vimieiro (D. Sancho de Faro) sucedeu-lhe (1718) e, já doente, morreu a 13 de outubro
de 1719, ficando uma Junta a exercer a administração. Conseguiu celebridade em razão do castigo aplicado
aos piratas ingleses, cujo navio encalhara na costa fluminense, em Macaé, enforcando 27.
Trazia a experiência, por ter sido vice-rei da Índia, o Conde de Sabugosa (Vasco Fernandes Cesar
de Menezes), que assumiu em 1720, estendendo, por 15 anos, o seu governo. Completou as obras de
fortificações e visitou diversas capitanias; severo e disciplinador, condenou sete soldados à morte,
consequência de um motim em Salvador (10/05/1728); esclarecido, criou a Academia Brasílica dos
Esquecidos, a 7 de março de 1724, em dependências de seu palácio, tendo se reunido 18 vezes. Iniciou a
cobrança do donativo para perfazer o dote da Infanta D. Maria Bárbara (1727), num total de sete milhões
de cruzados (a serem pagos em 25 anos).
Substituiu-o Conde das Galveias (André de Meio e Castro), assumindo a 11 de maio de 1735;
favoreceu a capital, concorrendo para a construção de três conventos de freiras: Lapa, Mercês e Soledade,
este, iniciativa do jesuíta Gabriel Malagrida.
Sucedeu-lhe o Conde de Antouguia (D. Luis Pedro Peregrino de Carvalho de Menezes e Ataíde) em
1749, permanecendo como vice-rei até 1755.
Governou, em seguida (primeira intervenção do Marquês de Pombal), o 6º Conde dos Arcos (D.
Marcos de Noronha), de 1755 a 1760. O conde reedificou o fortim do Rio Vermelho, bem como cobrou
impostos que facilitaram Pombal na reconstrução de Lisboa, vitimada pelo terremoto de 1755. O 1º
Marquês do Lavradio (D. Antônio de Almeida Soares e Portugal), último dos vice-reis que teve Salvador
como capital, exerceu sua atividade por apenas seis meses, porque logo faleceu, ficando uma junta em seu
lugar até 1763, quando houve a transferência da capital para o Rio de Janeiro.

C) Progressos do Rio de Janeiro:


A tomada da cidade por Duguay-Trouin repercutiu fundo no espírito de seus habitantes: sacudiu-os
da letargia do século anterior, fez-lhes nascer ideias patrióticas. A metrópole, por sua vez, preocupou-se
com a defesa da praça, escoadouro natural da riqueza do planalto. Enviou o Brigadeiro João Massé com a
incumbência de relatar as falhas militares e propor os meios de saná-las. O brigadeiro imaginou cercar o
centro urbano de forte muro, o qual o protegeria dos lados de terra, mas deixaria indefesa a marinha.
Contudo, a sua construção começou a ser feita.
Em 1719, começa a governança de Ayres de Saldanha e Albuquerque, em cuja administração foi
erguido o Aqueduto da Carioca, uma dupla fila de arcos ligando o morro do Desterro (depois Santa Teresa)
ao de S. Antônio (já demolido), para que pudesse ser conduzido o precioso líquido até o chafariz, na ocasião
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construído, que se chamou da Carioca, dando nome também ao largo e à Rua do Piolho, que dele saía em
direção ao Campo dos Ciganos (hoje Praça Tiradentes).
Substituiu-o (1725 a 1732) Luis Vahia Monteiro, o Onça, assim apodado pela sua valentia pessoal
e ousadia no combate à marginalidade que proliferava na cidade. Opôs-se com tenacidade ao descaminho
do ouro; ergueu uma fortaleza na ilha das Cobras, retomada aos padres bentos; abandonou a construção do
muro de defesa por entender que ele nada defendia. Suas atitudes contrariaram a muitos notáveis que
começaram a lhe mover oposição. Desgostou-se e adoeceu, momento em que a Câmara se aproveitou para
afastá-lo do cargo.
Inicia-se, então, o longo governo de Gomes Freire de Andrade, depois, em 1758, feito Conde da
Bobadela. Servindo-se do engenheiro e artista, Brigadeiro José Fernandes Pinto Alpoim, levantou a Casa
do Trem (trem = conjunto de apetrechos militares), hoje servindo de sede do Museu Histórico Nacional,
ergueu a casa do governador, no Largo do Carmo (hoje Praça XV de Novembro), construiu o Convento de
S. Teresa (onde se encontra enterrado), acreditando nos ideais religiosos de Madre Jacinta de São José.
Perto da Lagoa do Boqueirão, mandou levantar o Convento da Ajuda (demolido em 1913). Na Ilha de
Villegagnon, arrasou pequena elevação para edificar uma imponente fortificação, da qual ainda se guardam
restos encastoados na Escola Naval. Seu devotamento à cultura lhe permitiu apadrinhar a criação das
Academias dos Felizes e dos Seletos, bem como a instalação da tipografia de Antônio Isidoro da Fonseca.
Incumbido pelo Marquês de Pombal de chefiar a comissão demarcadora meridional do Tratado de Madri,
esteve ausente da governança por vários anos, empenhando-se arduamente na tarefa que lhe fora confiada.
Faleceu no Rio, a 12 de janeiro de 1763. Já estava amadurecida a ideia de transferir a capital de Salvador
para o RJ, onde melhor se atenderia à mineração e às fronteiras platinas.
Durante esse período, a cidade se alargou em direção norte, ocupando terras pertencentes aos
jesuítas, ou em direção de Botafogo, onde João de Sousa Pereira Botafogo possuía extensa propriedade.
Lagoas vão sendo aterradas, transformadas em largos e praças, Mas as ruas, tortuosas, ainda não tinham
iluminação nem calçamento. Apresentava-se florescente a vida econômica, quer por causa dos contratos
das baleias, quer pelo mercado de "peças" da África, ou mesmo pela produção de açúcar e aguardente. A
indústria naval encontrava-se em franco progresso. A crescente prosperidade de seus habitantes, aliada ao
forte espírito religioso, permitiu a construção de suntuosas igrejas.

D) A Administração do Marquês de Pombal:


Grandes mudanças se operaram no início do reinado de D. José I, que ascendeu ao trono português
em 1750. Nomeando Sebastião José de Carvalho e Melo, antigo representante em cortes da Inglaterra, 1738,
e Áustria, 1744, onde se casou com Leonor Daun (da nobreza austríaca), ministro do Estrangeiro e Guerra,
o rei depositou, gradativamente, em suas mãos confiança e poderes. Dignificou-o como Conde de Oeiras e
Marquês de Pombal. Sua presença e atuação apagaram o rei: o verdadeiro monarca foi Pombal.
O Iluminismo forneceu o respaldo para a atuação do Marquês de Pombal, em Portugal e no Brasil.
Percebeu, o esclarecido ministro, que os padres inacianos dificultavam a execução dos acordos
diplomáticos no Sul do Brasil, agitado pela Guerra Guaranítica. Por isso, determinou a liberdade dos índios
(Carta-régia de 04/04/1755 para o Estado do Grão-Pará e Maranhão e 08/05/1758 para o Estado do Brasil),
acabando com a administração dos sacerdotes nas aldeias.
Mas os jesuítas desfrutavam de grandes poderes. Chegaram mesmo, conforme entendeu a
investigação da época, a conspirar contra a vida do rei, junto com o Duque de Aveiro (D. José I escapou
com ferimentos de um atentado à bala em 03/09/1758, ocorrido perto do Palácio da Ajuda, quando voltava
à noite da casa de uma amante. Condenados diversos implicados, em um processo um pouco obscuro, entre
os quais os marqueses de Távora, fortes opositores políticos do primeiro ministro, Pombal conseguiu o
assentimento do rei para expulsar os jesuítas de terras portuguesas (03/09/1759). Os 550 inacianos
residentes no Brasil foram compelidos a sair.
O prosseguimento da Guerra Guaranítica conduziu a acertar com a Espanha o Tratado de El Pardo
(1761): a guerra indígena chegava ao fim, mas novos conflitos se abriam nas fronteiras sulinas tendo por
antagonistas os aliados anteriores. Pombal anulou todas as regalias dos antigos capitães donatários,
acabando por abolir as primitivas capitanias, em 1759, através de concessões aos donatários existentes.
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Conservou-se apenas o nome, como divisão administrativa. Reuniu as capitanias de Porto Seguro e Ilhéus
à da Bahia. Criou as de São José do Rio Negro, Rio Grande de São Pedro e Piauí. Tendo em vista a extração
do ouro e o cuidado com a fronteira sulina, achou o marquês ser melhor transferir a capital para o Sul,
escolhendo a cidade do Rio de Janeiro. Elevou a Colônia à categoria de vice-reino (1763), abrindo uma
época faustosa para o Brasil.
Extinguiu, em 1774, o estado do Maranhão, centralizando a administração. Numerosas vilas
nasceram e se desenvolveram em todo o território. Instalou-se, no Rio de Janeiro, um Tribunal da Relação
(1751), bem como diversas juntas de justiça, nas capitanias. Pombal preocupou-se com a situação
econômica do Brasil, criando as Companhias de Comércio do Grão-Pará e Maranhão e de Pernambuco e
Paraíba. Acabou com os contratos de diamantes. Dos Açores, conseguiu enviar perto de vinte mil colonos
a fim de contrabalançar a medida de liberdade dos índios. Ao mesmo tempo, estimulou os casamentos entre
portugueses e nativas. Aboliu a discriminação entre cristãos velhos e novos, estes de procedência judia
(25/05/1773). Diminuiu os poderes do tribunal da Inquisição (01/09/1774).
A morte do Rei D, José I (24/02/1777) interrompeu a atuação do Marquês de Pombal. A nova
soberana, D. Maria I, derrubou o marquês, perseguiu-o e condenou-o a viver a vinte léguas de Lisboa; esse
movimento ficou conhecido como a "Viradeira". D. Maria I governou somente até 1792, quando, pela
insanidade que a perturbou, ocupou a regência seu segundo filho, D. João (mais tarde D. João VI).

E) O Governo dos Vice-Reis no Rio de Janeiro:


A transferência da capital para o Rio de Janeiro e a elevação a vice-reino, medidas tomadas pelo
Marquês de Pombal, em 1763, marcaram uma nova etapa para o Brasil: um amadurecimento, lento, mas
decisivo, caracteriza o governo dos vice-reis no Rio de Janeiro.
Homens de reconhecida capacidade administrativa e militar, dedicados funcionários, pertencentes à
nobreza e ligados à monarquia, os vice-reis conduzem o Brasil a uma época de esplendor dentro do período
colonial, encerrada com a chegada da Corte, em 1808.
O Conde da Cunha (D. Antônio Álvares da Cunha), primeiro desses vice-reis, preocupou-se com a
organização militar. Recebeu o Tenente-General João Henrique Böhm, com seus auxiliares, Jacques Funck
e Francesco Roscio, e os regimentos portugueses, para os quais construiu quartéis. Criou uma companhia
de dragões de cavalaria, para a guarda do vice-rei. Reaparelhou diversas fortificações costeiras,
especialmente as do Rio de Janeiro e a de S. Antônio do Monte Frio, em Macaé. Como ponto alto de sua
administração, criou o Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro. Teve, também, de executar a Carta-régia de
1766, que extinguiu o ofício de ourives em Minas, Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro. Substituiu-o, em
31/08/1767, o Conde de Azambuja, D. Antônio Rolim de Moura, continuador de sua obra.
A partir de 1769, comanda os destinos do Brasil o Marquês do Lavradio (D. Luis d'Almeida
Portugal). Durante nove anos, foi um incansável administrador, incrementando as atividades agrícolas,
introduzindo as culturas do chá, do arroz, da anileira (para a fabricação do anil ou índigo), do cânhamo,
protegendo as primeiras plantações de café, despertando o interesse pela amoreira e a cultura do bicho-da-
seda e da cochonilha, pequeno inseto nativo do México capaz de produzir matéria tintorial (ácido
carmínico). Mandou arruar parte da capital, dando origem ao bairro da Glória, que dotou de um chafariz
que se conserva até hoje. Reaparelhou as defesas do Rio de Janeiro e edificou o Forte do Leme. Durante
sua gestão partiram as tropas luso-brasileiras para o sul, obtendo, o Tem-General Böhm, a restauração do
Rio Grande. Houve, contudo, a perda da ilha de Santa Catarina. Não se descuidou o marquês da instrução,
criando uma Aula de Comércio, para caixeiros.
Sucedeu-lhe outro grande estadista: Luis de Vasconcelos e Sousa (30/04/1778 a 09/05/1790),
dedicado ao embelezamento da capital. Preparava-a, sem o saber, para receber a monarquia. Ajudado por
Mestre Valentim (Valentim da Fonseca e Silva), construiu o Passeio Público, onde se espalhava, pestilenta,
a Lagoa do Boqueirão, com terras do morro das Mangueiras, que desapareceu; ganhava a cidade um salão
ao ar livre. E, em frente ao portão principal, nascia a rua das Belas Noites (Marrecas, depois), em aclive
suave, a encontrar-se com a dos Barbonos (hoje Evaristo da Veiga). Inaugurou a iluminação pública a óleo
de baleia ou peixe, com 73 lampiões e povoou a cidade de chafarizes, em especial o da Pirâmide, da lavra
de Mestre Valentim. Criou a Casa dos Pássaros, origem do Museu Nacional. Reedificou a Igreja e
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Recolhimento do Parto, vítima de grande incêndio (1789). Perseguiu os contrabandistas de ouro e conseguiu
encarcerar o famoso bandido Mão-de-Luva, alcunha de Manoel Henriques, que desencaminhava o ouro
que encontrara em um arraial (hoje cidade de Cantagalo - RJ). Uma conjuração, tendo por cenário Vila
Rica, pretendeu emancipar parte do Brasil; seus líderes, denunciados, acabaram presos, sendo o mais
famoso Tiradentes.
O Conde de Resende (D. José Luis de Castro), que assumiu em seguida (até 14/10/1801), não se
tornou bem-visto pela população, que lhe deu o apelido de “Conde da Resinga”; levantou o segundo andar
do palácio dos vice-reis; abriu algumas novas ruas na capital. Apressou a devassa contra os conjurados
mineiros, que se concluiu em sua gestão. Fechou a Sociedade Literária, crendo ter esta implicações com o
movimento de Minas. Ocorreu, também, a Conjuração Baiana.
Seguiram-se D. Fernando José de Portugal e Castro e D. Marcos de Noronha e Brito, 8º Conde dos
Arcos (até 22/01/1808).

F) Progresso Econômico:
O século XVIII corresponde ao ciclo do ouro, consequência lógica do encontro das minas e veios
auríferos pelos bandeirantes e desbravadores. Os mineradores e tropeiros vão lentamente sedimentando a
conquista obtida, também, graças ao aventureiro ávido de riquezas, que termina por se fixar no interior após
a dissolução de seus sonhos de grandeza.
Em 1702, 19 de abril, a metrópole organizou o Regimento dos Superintendentes, Guardas-Mores e
Oficiais-Deputados para as Minas de Ouro e, para cumpri-lo, instituiu a Intendência das Minas.
Qualquer descoberta devia ser comunicada à intendência; os guardas-mores demarcavam o local e
distribuíam as "datas" (porções de terra), exclusão de uma, do descobridor, e de outra, da Coroa. As demais
entravam em sorteio para os candidatos possuidores de, no mínimo, 12 escravos.
A princípio, os mineradores apenas afastavam o cascalho da margem dos ribeirões com toscos
instrumentos; passo importante representou a adoção da bateia, de origem africana. A presença da água
consistia em necessidade elementar: apanhava-se ouro nos córregos (ouro da água), nas margens dos rios
(ouro de tabuleiro) e nas encostas secas (ouro de grupiara), utilizando-se a água para o desmonte do
cascalho. A "cata" do ouro era simples nos dois primeiros casos, mas complicava-se no terceiro, devendo-
se levar a água, por força humana ou animal, a regos de madeira, provocando, pela atuação da gravidade, a
lavagem das faldas dos montes e a formação de uma "cata" artificial. Daí a importância das águas ser origem
de muitas desavenças. Obtinha-se o ouro de veio talhando a rocha e triturando os pedaços em pilões.
Ao rei cabia 20% do ouro encontrado: consistia no "quinto", imposto que aparece nas Ordenações
e Regimentos mineiros, desde os primeiros tempos coloniais. Em virtude das dificuldades de arrecadação
e de fiscalização, a Intendência estipulou, em 1713, por proposta dos mineradores, a finta, anuidade fixa
cobrada ao distrito mineiro, montante em trinta arrobas de ouro; em 1718, reduziu-se para 25. Esta fórmula
não suprimia a sonegação; por isso, a metrópole criou as Casas de Fundição em 1720, mas com atuação
efetiva a partir de 1725, destinadas a converter o ouro minerado em barras seladas, proibindo-se,
igualmente, a circulação do ouro não quintado, A produção diminuiu tanto que a Intendência das Minas
aplicou a capitação, a partir de 1º de julho de 1735, sem eliminar a arrecadação dos quintos. A capitação
consistia numa taxa fixa (quatro oitavas e 3/4) que o minerador pagava por cada escravo de mais de 14 anos
empregado na sua lavra; as lojas, vendas e boticas da região mineira contribuíam com uma capitação que
variava entre oito e 24 oitavas (cada oitava equivalia a 3,586 gramas). Avolumaram-se os protestos contra
esse sistema, injusto, pois devia ser pago mesmo nas fases de pesquisa ou ainda que nenhum resultado se
chegasse, Assim, a Coroa retomou ao quinto, depois de 3 de dezembro de 1750, exigido sob a forma de
finta, equivalente a cem arrobas. Somaram-se os déficits por causa da exaustão dos veios auríferos,
arrecadados compulsoriamente sob a forma de derrama, a qual não consistia em novo imposto.
Mas o contrabando do ouro ou o "descaminho", bem como a falsificação dos selos reais para a
fabricação de barras sem a retirada do imposto, floresceu em todo o século XVIII, apesar das medidas
repressivas e da vigilância dos registros, postos de fiscalização nos caminhos das Minas. Através de trilhas
pouco frequentadas, o ouro era levado a Salvador ou ao Rio de Janeiro e, desses portos, para outros lugares,
como Açores, Buenos Aires, Antilhas, de onde se transportava para a Europa. Contribuía a venalidade de
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muitos funcionários públicos, mesquinhamente pagos. Utilizava-se qualquer fardo para esconder o ouro,
tendo ficado famosos os “santos-de-pau-oco”. O governador do Rio, Luis Vahia Monteiro, sobre tudo isso
preveniu a Coroa, não tendo desta recebido apoio devido. Célebre ficou a quadrilha de Inácio de Souza
Ferreira que tinha uma fundição clandestina na serra de Paraopeba e agentes espalhados nas principais
cidades.
Calcula-se a produção aurífera em 982t, o que representa boa parte do ouro circulante no mundo.
Entretanto, a condição política do Brasil não lhe permitiu aproveitar-se dessa riqueza para próprio
desenvolvimento. Serviu para Portugal levar uma vida luxuosa e de ócio, adquirindo produtos
manufaturados ingleses e entregando à Inglaterra, aos poucos, o ouro brasileiro. Mas o sonho das minas
não durou muito: antes de terminar o século XVIII, o ouro já estava esgotado. Deficiências técnicas e
ignorância dos mineradores aliaram-se para impedir a extração de depósitos profundos.
As primeiras notícias de diamantes datam de 1714, Pouco depois, em 1727, Bernardo da Fonseca
Lobo achou as primeiras pedras no sítio de Morrinhos, em Cerro Frio. Vários mineradores acorreram à
região. Em 1734, Portugal criou a Intendência dos Diamantes, submetida a uma legislação especial, o
Regimento das Terras Diamantinas (conhecido como Livro da Capa Verde), datado de 1771. Até 1740,
permitiu-se a livre exploração; depois, contratou-se com particulares a obtenção dos diamantes,
delimitando-se o Distrito Diamantífero, cujo centro localizava-se no Arraial do Tijuco (hoje Diamantina).
O contratador devia pagar, aproximadamente, £40.000 anuais. Famosos ficaram Felisberto Caldeira Brant,
que encontrou falência depois de vários infortúnios, e João Fernandes Oliveira, que não mediu dinheiro
para contentar Xica da Silva. Calcula-se em três milhões de quilates o fornecimento durante a época
colonial, provocando uma baixa de 75%, por quilate, na venda de diamantes em mercados da Europa.
A exploração das minas acarretou um rápido povoamento do interior. Sendo o ouro a preocupação
maior, ninguém pensou em plantar e criar, o que gerou uma grande dificuldade de vida, pela deficiência
dos meios de subsistência. A comida vinha de muito longe e chegava às Minas por preços absurdos. Assim,
surgiram as fortunas alicerçadas no comércio e na criação de gado. O ouro mudou o posicionamento social:
nos séculos anteriores importavam as grandes sesmarias agora, a situação social fundamentava-se nas
riquezas móveis. Com o tempo, dispersam-se os mineradores, arraiais, povoados e vilas se formavam, se
desenvolveu o comércio com o litoral, ao mesmo tempo em que são abertos caminhos percorridos pelos
tropeiros. A parte Sul, com o Rio de Janeiro à frente, progrediu muito, enquanto o Nordeste entrou
lentamente em decadência.
Corria o dinheiro português quer cunhado no Reino, quer produzido nas casas de moeda em Minas.
De ouro existiam: a dobra de oito escudos e valor de 12,800 réis, a dobra de quatro escudos, com valor de
6.400 réis, a meia-dobra, de 3.200, o escudo, de 1.600 réis, o meio-escudo e o quarto de escudo, chamado
cruzado. De 1724 a 1727, existiram os cruzados-novos, com valor de 480 réis. A unidade da moeda de prata
chamava-se tostão, com valor de 100 réis. Havia moedas de cobre de 40 e 20 réis, A diversidade de moedas
e a variedade de cunhagens produziram um sistema monetário verdadeiramente anárquico, isso sem contar
com a presença de moedas falsificadas pelas próprias casas de moedas ou por particulares.
O açúcar, grande riqueza do século XVII, ocupou, no século XVIII, lugar secundário. Fazendas se
despovoaram por causa das minas, coincidindo com a baixa do preço do produto que já começava a
enfrentar a concorrência do produzido nas Antilhas. Contudo, a Bahia exportava, em 1798, de 14 a 18 mil
caixas de açúcar, e Pernambuco, de 12 a 13 mil.
O cultivo do tabaco intensificou-se pelo desenvolvimento do vício de fumar. Antonil dedicou 12
capítulos de seu livro ao tabaco. Havia, em Lisboa, uma Alfândega do Tabaco, reorganizada por Pombal
em 1751. Em certos anos, o lucro com o tabaco subia ao dobro do que se obtinha com o ouro. Provavelmente
em 1757, Pombal enviou à Vila de Cachoeira, na Bahia, André Moreno com a incumbência de preparar o
tabaco em folhas para a fabricação de charutos. O cacau conseguiu um lugar de destaque, existindo
plantações em Ilhéus, sul da Bahia.
Somente no final do século, renasceu a economia agrícola vinculada ao algodão, vegetal têxtil nativo
da América. O nascimento de indústrias fabris mecanizadas, resultado da descoberta da máquina a vapor
(James Watt em 1769), ofereceu ao Brasil a oportunidade de produzir algodão e vendê-lo à Inglaterra, que
começou a encontrar dificuldades de extrair de suas próprias colônias americanas. Em 1775, a produção
atingia cinco milhões de libras (peso), aumentando, em 1791 para 26 milhões. O cultivo do algodão
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concentrou-se no Maranhão, espalhando-se, depois, em outros pontos do litoral. As atividades ficaram
vinculadas ao escravo, usando-se o descaroçamento manual; a máquina inventada por Eli Whitney, em
1793, não chegou a ser conhecida no Brasil.
Os colonizadores se aproveitaram de muitas espécies vegetais indígenas, neste século XVIII, já
participando da alimentação dos habitantes, como procuraram plantar os vegetais que normalmente
integravam a sua dieta europeia; o trigo e a uva não chegaram a se desenvolver, apesar dos esforços
despendidos; diversas árvores frutíferas se deram bem e passaram a ser cultivadas, Merece citação especial
o coqueiro, proveniente da Ásia e da Oceania. O vice-rei, 2º Marquês do Lavradio, iniciou o cultivo do
arroz e do chá, este plantado com sucesso nos arredores do Rio de Janeiro. Não sendo alimentícias, mas de
alto interesse, lembremos o cultivo da amoreira, da anileira e do cânhamo. Utilizou-se, também, o mate,
proveniente das missões guaraníticas.
O café, introduzido no Pará, em 1727, pelo ajudante Francisco Xavier Palheta, que transportou a
planta da Guiana Francesa, cumprindo ordem do governador do Estado do Maranhão, João Maia da Gama,
ainda estava em fase de aclimatação.
Percorrendo a costa norte do Brasil lentamente e sem muito sucesso, o café chegou ao Rio de
Janeiro, trazido pelo desembargador do Maranhão João Alberto Castelo Branco, ocasião em que governava
a Repartição do Sul Gomes Freire de Andrade (1760). Apenas duas mudas foram plantadas em chãos do
Convento dos Barbonos, na rua do mesmo nome (hoje Evaristo da Veiga). Apesar dos desvelos dos padres,
uma delas morreu, mas a outra se desenvolveu dando frutos que, apanhados pelo holandês J. Hoppman,
este os plantou em suas terras de Mata Porcos (hoje Estácio), formando extenso cafezal, protegido pelo
vice-rei Marquês do Lavradio. Rapidamente, os pés de café se espalharam na terra carioca, principalmente
na fazenda do Mendanha (Campo Grande – RJ), de propriedade do Padre Antônio Couto da Fonseca, que
os plantou na vila de Resende, fundada pelo vice-rei Conde de Resende. Ao final do século, podiam ser
vistas plantações de café em São Paulo e Minas Gerais.
Durante o século XVII, o gado bovino subiu morosamente pelas duas margens do Rio São Francisco
até as suas nascentes. Criado extensivamente, ele se multiplicou em terras mineiras, atingindo, neste século
XVIII, o planalto goiano e mato-grossense. De São Vicente, foi o gado levado para Paranaguá, e de tal
maneira ele se desenvolveu, que os criadores procuraram os "campos de cima", fundando Curitiba. De
Curitiba, o gado caminhou para o sul, encontrando bons pastos nos pampas sulinos. Nessa região, o gado
cavalar começou a ser criado com bastante proveito, barateando o preço da montaria até então acessível a
poucos, No fim do século, a área sulina produzia excelente charque, distribuído para todo o Brasil,
ocasionando a decadência parcial do gado nordestino.
A circulação de riquezas, resultado da descoberta das minas, provocou o nascimento de pequenas
manufaturas: cerâmica, metalurgia, ourivesaria, tecelagem e outras menores, o que não foi bem-visto pela
metrópole. Em 1766, ficava proibida a profissão de ourives. O alvará de 5 de janeiro de 1785 proibiu a
instalação de estabelecimentos fabris. Em consequência, as tecelagens paralisaram-se, com exclusão
daquelas destinadas ao fabrico de tecidos para os escravos e sacaria. Bastante desenvolvida mostrou-se a
pesca da baleia, cetáceo abundante no litoral sul, em especial na Baía de Guanabara. No Rio de Janeiro
funcionaram armações que industrializavam a carne, o azeite, as barbatanas e o espermacete (cera branca
existente na cabeça de baleias e cachalotes empregada na fabricação de cosméticos). Os curtumes
necessários a obtenção de couro, utilizável para a exportação, existiram em vários centros urbanos. E as
fábricas de anil, no Rio e no Pará, chegaram a exportar para a metrópole até quinhentas arrobas anuais.
Continuamos, neste século XVIII, a enviar para a metrópole os produtos nativos brasileiros,
recebendo, em troca, os manufaturados de origem portuguesa ou estrangeira, através de comerciantes
portugueses. Chamava-se, esse intercâmbio, de Pacto Colonial, estando vedado a qualquer nação fazer o
comércio direto em portos brasileiros. Mas, em algumas vezes, navios ingleses burlavam esse acordo e,
alegando arribada forçada, efetuavam trocas comerciais diretas, com alguns subornos às autoridades locais.
O comércio interno, por via terrestre com as terras espanholas, tornou-se muito importante e até hoje pouco
conhecido, dado o seu caráter de contrabando. Muitos “peruleiros” embrenhavam-se pelas regiões
desconhecidas, visando lucros com as populações andinas, brancas ou nativas.
Apesar de a Companhia Geral de Comércio do Brasil ter sido extinta em 1720, a ideia renasceu
durante a época de Pombal, que criou, em 1755, a Companhia de Comércio do Grão-Pará e Maranhão
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e, em 1759, a Companhia de Pernambuco e Paraíba. Ambas conseguiram altos lucros praticando abusos
na venda de produtos que monopolizavam. Foram extintas por D. Maria I em 1778 e 1779, respectivamente.
O comércio negreiro mostrou-se ativo e compensador durante este século XVIII, graças às
necessidades das minas, onde o africano não vivia muito tempo. Havia um trânsito permanente de tumbeiros
para os mercados brasileiros, enriquecendo a quantos a esse negócio se dedicavam.
Relativamente ao comércio interno, não possuímos dados suficientes. Tratava-se de mercadorias
destinadas à exportação e que eram transportadas aos portos de embarque; e os produtos estrangeiros que,
a partir desses mesmos portos, se distribuíam no resto do país. Tropas de muares percorriam os caminhos
conhecidos solidificando a conquista que os bandeirantes haviam iniciado.

G) As Revoltas Coloniais - Inconfidências e Sedições:


No final do século XVII, o Brasil começou a entrar numa fase de profundas transformações. Reinóis,
nativos e escravos amalgamavam-se nas duras tarefas de conquistar a terra, domesticar o gentio e,
sobretudo, expulsar invasores. Formava-se lentamente a argamassa do povo brasileiro, provocando
movimentos sediciosos ainda inconsistentes e de fundo nitidamente econômico, uma reação contra o
fiscalismo exagerado. A amplitude territorial e a heterogeneidade da população não permitiram a presença
de movimentos amplos e sim regionais.
Estão entre as principais revoltas a Aclamação de Amador Bueno (SP), A Sedição do Rio de Janeiro,
A Revolta de Beckman (MA), A Guerra dos Emboabas (SP/MG), A guerra dos Mascates (PE), O Motim
do Maneta (BA), A Revolta de Vila Rica e A Conjuração do Rio de Janeiro, todas de caráter nitidamente
terrestre e sem participação de fatos marítimos.
Houve também movimentos de Emancipação como a Conjuração ou Inconfidência Mineira e a
Conjuração Bahiana.
Nesta parte veremos apenas as revoltas que tiveram alguma participação naval, e ao longo da
apostila as demais como nos combates no Pará (Cabanagem), no Rio Grande do Sul (Guerra dos Farrapos
ou Revolução Farroupilha), na Bahia (Sabinada), no Maranhão e Piauí (Balaiada) e em Pernambuco
(Revolta Praieira – após a coroação de D. Pedro II).

G.1) Conspiração ou Conjura de Nosso Pai:


Logo depois da expulsão dos holandeses de Pernambuco, verificou-se um motim popular no Recife
contra a pessoa do seu terceiro capitão-general, Jerônimo de Mendonça Furtado, o “Xumberga" (assim
apelidado por usar bigodes iguais a von Schomberg), que todos sabiam tirano e desonesto.
O pretexto surgiu quando o governador ofereceu festejos ao Marquês de Mondevergue, comandante
de uma esquadra francesa de 12 velas procedente de São Lourenço em direção a Madagascar. A
cordialidade pareceu traição. Conspiraram o ouvidor André de Barros Rego, os vereadores de Olinda,
Lourenço Cavalcanti, João Ribeiro e alguns principais.
Organizada uma falsa procissão de Nosso Pai ou Viático (destinada à extrema-unção dos
moribundos), na tarde de 31 de agosto (1666), esta tomou a direção da casa do governador, que não hesitou
em acompanhá-la. Em determinado momento, os conjurados dominaram a escolta do governador, o
colocaram no Forte do Brum, remetendo-o preso, no dia seguinte, para o Reino (em Portugal, recebeu
condenação de cárcere perpétuo na Ásia). No mesmo dia, a população depredou casas e atacou aos marujos
franceses.
O vice-rei não castigou o delito; nomeou André Vidal de Negreiros para prover o cargo, nele
permanecendo seis meses.

H) As Questões de Fronteiras:
A fronteira do Sul do Brasil demorou a ser definida devido à ferrenha disputa travada entre Portugal e
Espanha que tinham interesse em dominar a estratégica região platina. Para consolidar o domínio da região, os

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dois reinos travavam diversas batalhas –nas quais o poder naval de ambos os lados foi muito empregado –e
vários acordos foram firmados.

H.1) Tratado de Lisboa (1681):


Já no primeiro ano de sua fundação, 1680, a Colônia do Sacramento foi atacada e reconquistada aos
espanhóis pelo governador de Buenos Aires, sendo devolvida aos portugueses em 1683 após a assinatura
do Tratado de Lisboa, em 1681.

H.2) Tratados de Utrecht (1713 e 1715):


Desde o século XVI, corsários franceses farejaram as costas brasílicas contrabandeando o pau-de-
tinta. Suas tentativas de fixação na terra, em toda a região do Atlântico Sul, foram frustradas pelos
portugueses, que sempre conseguiam alijá-los, empurrando-os para o Norte. Localizados bem acima da foz
do Amazonas, empenharam-se em uma expansão em terras, não bem definidas, de Portugal. Invadiram o
Amapá, chamado de Guiana brasileira. O Governador do Estado do Maranhão, Antônio de Albuquerque,
apressou-se em enviar tropas que iniciaram difícil e prolongada luta, solucionada pelo Tratado de Utrecht
de 1713.
A morte do rei de Espanha Carlos II, em novembro de 1700, sem deixar um sucessor, acabou por
colocar toda a Europa em adversidade. A tentativa de se colocar no trono espanhol um rei de origem
francesa propiciava um desequilíbrio nos pesos da balança do poder europeu, já que os dois maiores e mais
poderosos exércitos da época eram justamente os francês e espanhol. As negociações diplomáticas de
Utrecht representaram o fim dessa Guerra de Sucessão da Espanha. Delas fez parte Portugal por ser aliado
da Inglaterra, enviando João Gomes da Silva, Conde de Tarouca, e D. Luis da Cunha, que obtiveram com
a diplomacia o que teria sido muito dispendioso com a força das armas. No Tratado de 11 de abril, a França
renunciava as suas pretensões às terras do Cabo do Norte, situadas entre os rios Amazonas e Oiapoque ou
Vicente Pinzón (como ainda é chamado pelos franceses), aproveitando-se este último para servir de
fronteira entre as duas nações. Representou um êxito diplomático português.
No segundo Tratado de Utrecht, 6 de fevereiro de 1715, a Espanha restituiu a Colônia do Sacramento
a Portugal, sem, contudo, provocar a calma na região. A reabertura das lutas luso-espanholas europeias,
entre 1735 e 1737, predispôs Portugal a se desfazer da Colônia.

H.3) Tratado de Madri (1750):


O conflito ocorrido entre as cortes portuguesa e espanhola entre 1735 e 1737 motivou a terceira
investida hispânica sobre a Colônia de Sacramento. Cumprindo ordem do governador de Buenos Aires, em
junho de 1735, navios espanhóis já empreendiam um bloqueio naval à colônia lusa enquanto quatro mil
soldados realizavam um sítio por terra.
No Rio de Janeiro, o governador interino, Brigadeiro José Silva Paes, preparou e enviou, às pressas,
uma força naval para socorrer a colônia. Assim que chegou à região do Prata, essa força naval dissipou o
bloqueio que os navios espanhóis vinham impondo à Colônia de Sacramento. Em Portugal, o recebimento
da notícia do assédio espanhol à colônia lusa levou o rei a ordenar o preparo de uma força naval que foi
constituída por duas naus e uma fragata. Essa força suspendeu de Lisboa em março de 1736 e, ao chegar
ao Rio de Janeiro, recebeu reforços. Juntou-se a ela o Brigadeiro Silva Paes, contendo ordens de socorrer a
Colônia de Sacramento e, se possível, reconquistar Montevidéu (fundada e abandonada pelos luso-
brasileiros e novamente fundada pelos espanhóis) e fortificar o Rio Grande de São Pedro.
A força naval portuguesa no Prata combateu os espanhóis, apoiou a Colônia de Sacramento e
estabeleceu o domínio do mar na região. Após alcançar seus objetivos, parte dessa força regressou ao Rio
de Janeiro.
O Brigadeiro Silva Paes permaneceu no Sul e, após ameaçar um ataque a Montevidéu – que não
ocorreu devido ao grande risco dos navios ficarem encalhados –, decidiu partir para o Rio Grande de São
Pedro e cumprir a missão de fortificá-lo. Ao chegar, tratou o Brigadeiro de organizar suas defesas e mandou
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construir o forte que denominou Jesus, Maria e José. Estavam assim criadas as condições para o início da
povoação da região, que recebeu, mais tarde, casais açorianos para ocupar a terra.
Mesmo após a assinatura por portugueses e espanhóis do armistício de 1737, o cerco terrestre à
Colônia de Sacramento continuou, demonstrando a grande instabilidade que existia nas relações entre as
duas colônias. Procurando solucionar suas questões de limites, Portugal e Espanha resolveram assinar, em
1750, o Tratado de Madri, que, dentre outras medidas, estabeleceu a posse da Colônia de Sacramento para
a Espanha e a de Sete Povos das Missões para Portugal. Esse tratado foi fruto do trabalho de Alexandre de
Gusmão, secretário de D. João V, junto ao qual teve grande influência. Foram nomeadas duas comissões
para demarcarem a fronteira, uma para o norte – onde Portugal teve como representante Francisco Xavier
de Mendonça Furtado (irmão do Marquês de Pombal) – e outra para o sul, sendo o representante português
Gomes Freire de Andrade. A troca estabelecida pelo Tratado não foi efetuada, pois os índios que viviam
nas Missões se recusaram a deixar o local, empreendendo uma resistência armada, levando os luso-
espanhóis a responderem com ação militar conjunta que, em 1756, por meio da força, ocuparam a região

H.4) A Guerra Guaranítica (1753-1756):


Duas comissões mistas se constituíram com o propósito de demarcar as novas fronteiras. A comissão
do sul iniciou os seus trabalhos em 1752. Achava-se integrada pelo Marquês de Valdelirios, delegado
espanhol, e pelo Conde da Bobadela, representando Portugal. O Conde fez-se acompanhar de numerosos
técnicos e homens de saber. A região a ser percorrida era apreciavelmente conhecida.
Os demarcadores do norte, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, irmão do Marquês de Pombal,
e D. José de Iturriaga, depararam com imensas dificuldades telúricas. Seus trabalhos mal começaram, tendo
sido quase nulos os resultados. D. Antônio Rolim de Moura Tavares, que substituiu Mendonça Furtado,
fundou um destacamento militar, em 1760, origem do Forte de Nossa Senhora da Conceição (Rondônia).
Apesar da clareza do Tratado, os colonos do Sacramento negaram-se a abandonar a Colônia, ao
mesmo tempo em que os índios guaranis se rebelavam na localidade de Santa Tecla, instigado pelos jesuítas.
Gomes Freire, com o objetivo de cumprir a sua missão, mandou levantar, 1752, na confluência dos rios
Pardo e Jacuí, uma fortificação, denominando-a de Jesus-Maria-José (esse forte deu origem à cidade do
Rio Pardo).
Portugueses e espanhóis combinaram um ataque conjunto às Missões, mas que redundou em
fracasso, já que o Governador de Buenos Aires, D. José de Andonaegui, não prosseguiu em sua marcha
envolvente. Gomes Freire, exposto ao ataque dos índios tapes e goanoas (ou minuanos), travou algumas
escaramuças sangrentas e se retirou, em novembro de 1754, para o reduto de Jesus-Maria-José.
Inutilmente o Padre Luis Altamirano, enviado do Geral dos jesuítas, instava para que a luta cessasse
e que todos (deviam somar uns trinta mil) abandonassem as novas posses portuguesas; obedeceram os
Povos de S. Borja, S. Luís e S. Lourenço, recusando-se os demais. Alegavam a importância geográfica dos
Povos e a perda das extensas plantações de erva-mate, fonte substancial da riqueza da região, que os
portugueses iriam se apoderar e controlar daí por diante.
A teimosia dos jesuítas repercutiu mal nas Cortes Ibéricas, provocando o aparecimento de um
acentuado espírito anti-jesuítico. O rei da Espanha afastava o seu confessor, o Padre Rábago, poderoso
advogado da Companhia. Ordens expressas chegavam a Gomes Freire e a Valdelirios para que tomassem
a região das Missões e acabassem com a Guerra Guaranítica. No primeiro dia de fevereiro de 1756, as
forças conjuntas se reuniram ao lado do arroio Jaguari: somavam 2.500 infantes, dirigidos por Bobadela,
Andonaegui, D. José Joaquim de Viana, Governador de Montevidéu, e Tomás Luis Osório, Coronel de
Dragões do Rio Grande. Os indígenas aglomeravam-se em torno da liderança de Neenguiru, que havia sido
batizado com o nome de Nicolau.
Combateram em Vacacaí no dia 7 e em Caiboaté no dia 10, onde a mortandade indígena
transformou-se em verdadeira hecatombe (1.500 mortos). Em 10 de maio, foi vencida a última resistência
dos índios no combate de Churieby; a 17 de maio, conquistava-se o Povo de S. Miguel, submetendo-se os
demais. Os nativos que sobraram refugiaram-se nos matos.
Empossado governador de Buenos Aires, em 4 de novembro 1756, D. Pedro de Cevallos, inimigo
do Tratado de 1750, prometeu aos jesuítas sua simpatia, ao mesmo tempo em que permitiu que os índios
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retornassem aos Povos. Por isso, Gomes Freire retirou-se para o Rio de Janeiro (aonde chegou a 20 de abril
de 1759), permanecendo precária a posse das Missões. Na Colônia, a luta prosseguia sem solução.

H.5) O Distrato de El Pardo (1761):


Já tinha começado na Europa a Guerra dos Sete Anos (1756-1763) entre Inglaterra e França, diante
da qual Portugal permanecera neutro. Mas a tendência de Carlos III de Espanha ligar-se à França no
chamado Pacto de Família e a consequente necessidade para o reino português de manter a aliança inglesa,
somando-se ao incômodo que a Guerra Guaranítica ocasionava em terras americanas, embasaram a
proposta do Marquês de Pombal ao Rei D. José I de anulação do Tratado de Madri. O Tratado de El Pardo,
assinado a 12 de fevereiro de 1761, não foi outro tratado de limites, mas um simples distrato. E nem por
isso sobreveio a paz. No ano seguinte, combatiam espanhóis e portugueses em sua fronteira europeia, estes
ajudados por Lorde Abermale. Pombal estava certo: a Inglaterra não lhe faltara.
Essa campanha europeia não se revestiu de grande importância; serviu, porém, para demonstrar a
fraqueza da organização militar portuguesa e, logo em seguida, para melhorá-la a contratação de um famoso
militar de Frederico da Prússia, o Conde reinante de Schaumburg-Lippe.

H.6) Perda e Restauração do Rio Grande:


D. Pedro de Cevallos, oficial de excelente reputação, pôs cerco à Colônia, com cerca de seis mil
homens e cinco navios de guerra, obrigando-a a rendição, em 27 de outubro de 1762. Depois de 26 dias de
assédio, o Brigadeiro Vicente da Silva da Fonseca, que a comandava, capitulou (Fonseca foi preso no Rio
de Janeiro e remetido nesta condição a Lisboa; faleceu nove anos depois na prisão do Limoeiro).
Tentou uma reação o corsário inglês John Macnamara, que se encontrava a serviço de Portugal, com
dois navios ingleses, uma fragata portuguesa e mais oito transportes incorporados no Rio de Janeiro.
Macnamara dirigiu-se para o sul e atacou Sacramento; mas sua capitânia, a fragata Lord Clive, incendiou-
se, nela falecendo. Diante da investida espanhola, o Coronel Tomás Luis Osório partiu do Rio Pardo com
quatrocentos dragões e dez canhões rumo sul, fundando (04/12/1762) a fortificação que batizou de Santa
Teresa.
Após cinco meses, a 8 de abril de 1763, Cevallos avançou pelo litoral atlântico com um efetivo de
três mil homens e 24 peças de artilharia; conquistou os fortes de Santa Teresa, comandado pelo Coronel
Tomás Luis Osório, que capitulou com seus 150 homens no dia 19 (posto em liberdade pelos espanhóis,
Osório foi preso, em seguida, pelos portugueses, encontrando a morte na forca, em Lisboa), e de S. Miguel,
defendido pelo Capitão João Alves Ferreira. Cevallos apoderou-se da vila do Rio Grande e da margem sul
do canal (12/05/1763), retirando-se, os habitantes, para Viamão acompanhados do Governador Coronel
Inácio Elói Madureira.
A paz europeia, assinada em Paris em 10 de fevereiro de 1763, determinou a devolução dessas
conquistas; mas Cevallos só entregou a Colônia, conservando a posse do Rio Grande, tentando transformar
em definitiva aquela ocupação transitória.
Contra os invasores, os habitantes locais, reforçados por aventureiros paulistas, abriram uma guerra
de guerrilhas, Em março de 1764, o novo governador da região, José Custódio de Sá e Faria, concluiu o
Forte de São Caetano e erigiu o do Tebiquari (Taquari atual). A guarnição militar do Rio Grande
desejava uma ação imediata contra os espanhóis; aumentada com contingentes vindos do Rio de Janeiro
em comando do Coronel José Marcelino de Figueiredo (cujo nome verdadeiro era Manoel Jorge de
Sepúlveda), acordaram, os chefes, desfechar um ataque contra a vila do Rio Grande. Atravessaram o canal
de acesso da Lagoa dos Patos na noite de 28 de maio de 1767; pressentidos pelos inimigos, manobrando
mal o desembarque, optaram pela retirada. Não esmoreceram; realizaram uma segunda investida em 5 de
junho com êxito. Os portugueses firmaram-se em São José do Norte.
O Marquês de Pombal, governando efetivamente Portugal, não pensava em desamparar a região:
transferiu a capital do Brasil para o Rio de Janeiro (1763) e deu minuciosas instruções ao Conde da Cunha,
primeiro vice-rei. Em 1767, a 5 de outubro, desembarcava no Rio de Janeiro o Tenente-General João
Henrique Böhm, alemão, trazendo consigo o Brigadeiro Jacques Funck, sueco, o Capitão italiano Francesco
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Giovanni Roscio, além de 70 oficiais portugueses de todos os postos hierárquicos e três regimentos
(Estremós, Bragança e Moura). Böhm desenvolveu notável atividade para realizar a campanha no Sul.
Os espanhóis não se mostravam inativos. Em novembro de 1773, D. Juan Vértiz y Salcedo,
governador de Buenos Aires, deslocou-se de Montevidéu com 574 infantes em três colunas, em direção da
vila do Rio Pardo, onde se encontrava o Coronel José Marcelino, nomeado governador da região
conflagrada. No caminho, Salcedo ergueu as fortificações de Santa Tecla (está localizada próxima da atual
cidade de Bagé) e São Martinho. Uma dessas três colunas invasoras chocou-se com as forças comandadas
pelo Capitão Rafael Pinto Bandeira (em 2 de janeiro), obtendo esta importante vitória (Santa Bárbara).
Segunda derrota (em 14 de janeiro) em Tabatinga, perto de Rio Pardo, acrescido do desgaste de suas
cavalhadas, obrigaram a Salcedo a desistir da empresa. Ele recuou para a vila do Rio Grande, atingindo-a
em 9 de fevereiro.
Chegara o momento da reação luso-brasileira. Pombal preparou um minucioso plano político-militar
e o enviou, sob sigilo, ao Marquês do Lavradio. Em dezembro de 1774, Böhm concentrou forças em Santa
Catarina, transportadas pelos navios comandados pelo Capitão-de-Mar-e-Guerra irlandês Robert
MacDouall (duas fragatas, cinco corvetas, quatro sumacas e um bergantim, guarnecidos com 1.050 homens
e 172 canhões). Seu efetivo era de 6.717 homens. Acamparam em São José do Norte.
Comandados por D. José de Molina, os espanhóis aguardavam o combate com 2.200 homens
aquartelados na vila do Rio Grande e distribuídos nos fortes da Barra, de Santa Bárbara, Trindade,
Mangueira e Ladino. Uma força naval, liderada por D. Francisco Xavier de Morales, completava a defesa.
O Tenente-General Böhm articulou o seu ataque determinando, primeiro, que o Capitão Rafael Pinto
Bandeira investisse sobre o entrincheiramento de S. Martinho localizado em frente a Rio Pardo. Pinto
Bandeira optou pelo ataque de surpresa pela retaguarda: em 31 de outubro de 1775 obteve êxito. Segundo,
que o mesmo capitão dominasse o Forte de Santa Tecla; com 619 homens, Bandeira iniciou o combate em
10 de março (1776). Os espanhóis (comando do Capitão Luiz Ramirez) resistiram, mas preferiram capitular
no dia 26.
Livre, assim, o interior, Böhm passou a desencadear a terceira fase, em parte desenvolvida ao
mesmo tempo: MacDouall tentou um desembarque (19/02/1776) que redundou em fracasso. Os espanhóis
passaram a denominar o Forte de Santa Bárbara de Triunfo em homenagem a esta vitória.
MacDouall retirou-se para Santa Catarina deixando no comando naval o Capitão-de-Mar-e-Guerra
George Hardcastle. Mas Böhm não se deu por vencido. Aguardou o momento oportuno.
Às 2 horas da madrugada de 1º de abril, depois de iludirem os adversários com demonstrações
festivas (comemoração do aniversário da Rainha D. Mariana Victória), os luso-brasileiros atravessaram o
canal em jangadas organizados em dois destacamentos. O primeiro dirigiu-se para o Forte do Mosquito,
conquistando o seu objetivo às 4h30min; o segundo encaminhou-se para o Forte da Trindade, dominando-
o com alguma dificuldade. Obtidas essas cabeças de ponte, o assalto dos luso-brasileiros passou a ser total.
O Forte da Barra caiu ao amanhecer, o mesmo ocorrendo com o da Mangueira. A esquadra portuguesa, sete
navios, passou a combater contra as posições espanholas; o Forte Ladino cedeu ao peso do ataque, na
madrugada do dia 2. Os navios espanhóis tentaram a fuga; metade deles, três, encalharam, safando-se os
outros em comando de D. Francisco Moralles, para o Rio da Prata. Somente às 17 horas, rendeu-se o Forte
do Triunfo. Pela madrugada do dia 3, os espanhóis abandonaram a vila do Rio Grande e as últimas posições
que detinham.
Esses sucessos militares ecoaram fortemente na Europa. Carlos III, rei espanhol, armou poderosa
esquadra de 19 navios de guerra e 97 mercantes, guarneceu-a com 13 mil homens, e a entregou a D. Pedro
de Cevallos, com o título de vice-rei do Prata. Na madrugada de 20 de fevereiro (1777), surgiu Cevallos
em frente à Ilha de Santa Catarina, provocando pânico na população e no seu comandante militar, o
Marechal-de-Campo Antônio Carlos Furtado de Mendonça, que não reagiu frente ao inimigo. Diante da
força espanhola, MacDouall retirou-se, cauteloso... Dispara alguns tiros o Forte de S. José da Ponta Grossa.
Diante da inexistente reação, Cevallos ocupou as diversas fortificações, a maioria das quais abandonada.
Em 5 de março, o Brigadeiro Custódio de Sá e Faria, mais inclinado aos espanhóis, assinou uma
capitulação; alguns militares se internaram no continente, indo à procura do Exército do Sul.
Cevallos mandou, embarcados, o governador da ilha, Pedro José Gama de Freitas, e o tíbio Marechal
Furtado de Mendonça para o Rio de Janeiro. Cevallos permaneceu 22 dias na ilha, velejando, depois, para
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a vila do Rio Grande no desejo de retomá-la, mas fracassou por causa de ventos contrários que dispersou a
sua esquadra. Dirigiu-se, então, para Sacramento. Com sete mil homens, sitiou a praça (29 de maio), que
estava sob o governo do Coronel Francisco José da Rocha, exigindo a rendição, o que ocorreu em poucos
dias. Cevallos demoliu tudo que encontrou.

H.7) O Tratado de Santo Idelfonso (1777):


A morte de D. José I (24/02/1777) conduziu ao trono português sua filha D. Maria I. Neste momento
delicado da política europeia, estando Portugal entre a França napoleônica, a Espanha de Carlos IV e os
tratados com a Inglaterra, acabou sendo invadido pela Espanha a mando de Napoleão em episódio
conhecido como Guerra das Laranjas. A rainha D. Maria pensou em obter um definitivo acordo de
fronteiras. Depois das confabulações diplomáticas de D. Francisco Inocêncio de Souza Coutinho com o
Ministro Marquês de Florida Blanca, as Coroas Ibéricas assinaram, a 1º de outubro de 1777, o 2º Tratado
de Santo Idelfonso (o 1º foi assinado em junho e Napoleão não o aprovou, obrigando a um novo tratado
mais desfavorável a Portugal). A área da Colônia do Sacramento e os Sete Povos ficavam em poder da
Espanha, reconstituindo-se, acima do Rio Pepiri-Guaçu, a linha do Tratado de 1750. A Ilha de Santa
Catarina foi devolvida sem dificuldades (artigo 22) ao Coronel Francisco Antônio da Veiga Cabral
(23/03/1778). Apresentando erros geográficos, esse Tratado aduziu mais benefícios para Espanha, graças à
inteligência de Florida Blanca, digno representante da Ilustração e a força de Napoleão.
As quatro comissões demarcadoras iniciaram a sua difícil tarefa em meio a muitas discussões e
desavenças pessoais. A primeira partida, no sul, esteve a cargo de Sebastião da Veiga Cabral e D. José
Varela y Ulloa, destacando-se o matemático Dr. José de Saldanha, que escreveu importante relato; dirigiu
a segunda partida o Coronel Francesco Roscio e D. Diogo de Alvear, não conseguindo encontrar o Rio
Igurei; as outras duas ocuparam-se de Mato Grosso e Amazonas.
Os trabalhos demarcatórios se estenderam de 1780 a 1790, época em que se obteve a pacificação
dos índios muras, habitantes da região do Alto Amazonas.
Mais uma vez não chegaram a completar a sua incumbência: desentendimento entre as Coroas
Ibéricas. D. Lázaro de Ribera, governador do Paraguai, invadiu o sul de Mato Grosso e atacou o Forte de
Nova Coimbra (16/09/1801), sem conseguir intimidar o Tenente-Coronel Ricardo Francisco de Almeida
Serra e suas 40 praças.
José Borges do Canto e Manoel dos Santos Pedroso, campeadores que percorriam as coxilhas
sulinas, reuniram aventureiros e invadiram, em 1801, os Sete Povos, logrando anexar a disputada região.
Ao mesmo tempo, o Governador do Rio Grande, Sebastião da Veiga Cabral, determinou a ocupação de
Cerro Largo (povoação fortificada que deu origem à atual cidade uruguaia de Melo) por tropas do Coronel
Manuel Marques de Souza: o forte espanhol capitulou em 30 de outubro, tendo sido desmantelado. Outra
coluna, comando do Tenente-Coronel Patrício José Correia da Câmara, perseguiu os espanhóis rumo sul;
encontrou o Forte de Santa Tecla abandonado e, em três semanas, o arrasou para que não pudesse ser mais
ocupado.

H.8) O Tratado de Badajós (1801):


A estabilidade entre as relações luso-espanholas foi afetada quando Napoleão Bonaparte, desejoso
de castigar Portugal por participar, com seus navios, de cruzeiros ingleses no Mediterrâneo e visando a
trazer os portugueses para zona de influência francesa, forçou a Espanha a declarar guerra a Portugal em
1801. O rompimento das relações entre os dois países na Europa durou poucas semanas, sem ações militares
dignas de registro, ficando o episódio conhecido como a Guerra das Laranjas. Na América, porém, a
chegada da notícia sobre o conflito entre as duas coroas desencadeou o rompimento de hostilidades entre
as populações da fronteira. No Rio Grande de São Pedro, tropas foram aprestadas para defenderem as
fronteiras, ainda em processo demarcatório, e os luso-brasileiros invadiram e conquistaram os Sete Povos
das Missões, do lado espanhol, enquanto os hispano-americanos invadiram o Sul de Mato Grosso. O
Tratado de Badajós pôs fim à guerra de França e Espanha contra Portugal, tendo a Espanha por direito de

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guerra, conservado a praça de Olivença, na Europa, e a Colônia de Sacramento. Portugal recuperou no sul
da América o território dos Sete Povos das Missões.

A família real portuguesa embarca para o Brasil no cais de Belém (Portugal) em 29/11/1807.

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BIBLIOGRAFIA:

Esta apostila de História do Brasil, com enfoque em História Marítima (Civil e Militar) Brasileira, foi
desenvolvida com dados dos seguintes meios:

Fontes Impressas:

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Rio de Janeiro, 1989.
BELOT, R. de, A Guerra Aeronaval no Mediterrâneo. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Record, 1939-1945.
CAMINHA, Vice-Almirante João Carlos. História Marítima. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército
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FROTA, Guilherme de Andrea, Quinhentos Anos de História do Brasil. Rio de Janeiro: Biblioteca do
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GOMES, Laurentino, 1808: como uma rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta
enganaram Napoleão e mudaram a história de Portuga e do Brasil. São Paulo: Ed. Planeta, 2007.
HART, B. H. Liddell, As Grande Guerras da História. 3º Ed. São Paulo: IBRASA, Instituição Brasileira
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_____ Introdução à História Marítima Brasileira. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação da Marinha,
2006
LIMA, Roberto Luiz Fontenelle. Guerra e Desarmamento: Duque de Caxias: Imprensa Naval.
SCHWARTZ, Stuart B., Segredos Internos: engenhos e escravos na sociedade colonial, 1550 - 1835. 1ª
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VIANA FILHO, Vice-Almirante Arlindo, Estratégia Naval Brasileira. Abordagem à História da Evolução
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Coleção General Benício, 1995.
VICENTINO, Cláudio e DORIGO, Gianpaolo. História para o Ensino Médio – História Geral e do Brasil.
São Paulo: Scipione, 2000, vol. único.

Fontes Eletrônicas:

Arquivos Diversos, em www.mar.mil.br e seus sítios correlatos.


Brasil Império (e outros períodos), em http://www.professordehistoria.com/imperio.htm
O Arquivo Nacional e a História Luso-Brasileira, em http://www.historiacolonial.arquivonacional.gov.br

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