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UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL – UFFS

CAMPUS CHAPECÓ
CURSO DE LICENCIATURA EM HISTÓRIA
COMPONENTE CURRICULAR: HISTÓRIA DA FRONTEIRA SUL
DOCENTE: SARA MUNIQUE NOAL
DISCENTE: LUMA LETICIA TONELLO

A QUESTÃO INDÍGENA NA COLONIZAÇÃO DO SUL DO BRASIL

O Brasil, desde o seu “descobrimento”, foi considerado uma terra paradisíaca que,
diferente do que é comumente proposto nos livros clássicos de história, foi colonizado e não
descoberto, pois já era habitado por povos indígenas das mais diversas origens, que tem migrado
para a região há milhares de anos. (Cunha, 1992) Assim, quando Cunha (1992) propõe que os
navegadores, ao chegarem ao Brasil, “pensaram que haviam atingido o paraíso terreal” (p.09)
expressa ao mesmo tempo uma idealização da terra e dos nativos, e também a dominação
eurocêntrica a partir da apropriação do local e subjugação dos povos originários.
Quando se considera as questões referentes à colonização do Sul do Brasil, não se
diferencia em muito da história do país. O Sul começou a ser colonizado a partir do século XIX
e, para a as principais fontes historiográficas clássicas, a história do Sul inicia-se a partir desse
momento, inclusive omitindo e/ou desconsiderando uma parte essencial do processo histórico
de colonização, a presença indígena em toda a região.
O que geralmente se vê muito presente na historiografia clássica regional são narrativas
e interpretações do processo histórico baseadas na lógica de progresso e pioneirismo, tornando
as temáticas referentes aos povos originários, que compreendem os modos de vida numa relação
sustentável com o meio ambiente, desvalorizadas e irrelevantes. (Zarth, 2016) Porém,
atualmente, as questões indígenas no processo histórico brasileiro se mostram temas muito
relevantes na perspectiva historiográfica contemporânea. A região da Fronteira Sul do país
possui um longo processo de colonização, que resultou na ocupação das terras que
originalmente eram habitadas pelos povos indígenas.
As críticas acerca da história tradicional regional são, atualmente, refletidas em muitos
estudos contemporâneos como forma de enfatizar a parcialidade com que eram retratados os
fatos históricos nos escritos clássicos. Zarth (2016) aponta um conjunto de quatro problemas
referentes às narrativas clássicas:
(a) a história regional seria marcada pela centralidade étnica com tendência
eurocêntrica e, por isso, a história dos povos tradicionais, dos negros e dos povos
indígenas ficaria em segundo plano e, com frequência, desconsiderada ou minimizada
e estigmatizada; (b) a história é marcada pela ideologia do progresso e do pioneirismo;
(c) a história ambiental é pouco considerada e as florestas são vistas como objeto de
conquista; (d) não considera os novos temas historiográficos, tais como história das
mulheres, da sexualidade, das crianças, entre outros. (p.14)

Não é difícil identificar o caráter eurocentrista da perspectiva histórica regional


tradicional, o que resulta na marginalização da história dos povos originários, e assim, deixa as
narrativas indígenas em segundo plano, ou mesmo, às desconsidera. É uma perspectiva que
permeou a história regional por muito tempo, caracterizando a lógica do desenvolvimento
progressista como pauta principal. (Zarth, 2016)
Lino (2016) evidencia a maneira como “os mundos indígenas foram sendo destruídos,
física, e etnicamente, devido às guerras, à escravidão, às doenças e com as mudanças de traços
culturais originais” (p.103), considerando o quanto a colonização europeia influenciou na vida
dos povos originários. O autor explica que

os europeus os foram classificando e nomeando-os de acordo com um olhar ocidental,


contaminado pelas mentalidades etnocêntricas típicas do continente europeu, na qual
os outros povos eram no mais das vezes desclassificados, justificando então a
dominação colonial, como se houvesse graus diferentes de desenvolvimento humano,
como no caso da dicotomia entre seres superiores e inferiores. (Lino, 2016, p.103-
104)

No processo de colonização do Sul do Brasil, essa perspectiva de superioridade


eurocêntrica ganha força ao considerar que a região foi colonizada em geral por imigrantes
europeus e que, ainda hoje as culturas e mentalidades europeias são bastante reafirmadas pelos
descendentes de imigrantes. Wenczenovicz (2019) trata o tema do racismo relacionando à
colonização europeia, ela afirma que “diversos autores identificam o colonialismo europeu
como a origem histórica do racismo na América Latina, como consequência do interesse de
legitimar, justificar e outorgar a exploração e a escravidão de diversas categorias sociais.” (p.19)
Outro ponto a ser considerado acerca dos povos indígenas é sua relação com a terra, que
sempre foi considerada inadequada pelos colonizadores, desconsiderando desta forma, suas
culturas, modos de viver e compreensão do mundo e atribuindo a eles arquétipos de
incivilizados e/ou selvagens, o que desvaloriza toda sua história e seus conhecimentos. Assim
ressalta Wenczenovicz (2019) apontando que em “virtude da exploração colonial, os indígenas
perderam suas referências materiais/estruturais – terras, fonte de sua sobrevivência e imateriais
– aspectos artísticos, linguísticos e religiosos.” (p.18)
Atualmente, a luta pela terra é uma das principais demandas indígenas em todo país, e
não difere nessa região. Os povos indígenas buscam reivindicar seus direitos ancestrais e
garantir a preservação de sua cultura. No entanto, ao longo dos anos, a visão deturpada desses
povos tem levado a uma desvalorização de suas vidas e culturas pela sociedade. Com o passar
do tempo a busca pela reconstrução identitária dos povos nativos se tornou uma necessidade
para garantir sua sobrevivência. “A soma desses elementos de exclusão e vulnerabilidade,
assentado no processo de desterritorialização colocou-os em uma condição de marginalização
social.” (Wenczenovicz, 2019, p.19)
Por esses motivos, é fundamental que se reconheça a importância dos povos originários
e inclusive se busque promover a valorização de suas culturas, garantindo o respeito aos seus
direitos e a preservação de suas terras e tradições. É essencial a ressignificação da historiografia
regional, reavaliando e interpretando todos os processos históricos de maneira a integrar o
conhecimento dos povos antes omitidos e valorizar a história da região e experiências dos povos
indígenas, assim como uma maior consideração da história ambiental, a fim de construir uma
narrativa mais completa e real.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CUNHA, Manuela Carneiro da. Introdução a uma história indígena. In: CUNHA, Manuela
Carneiro da. (org). História dos índios no Brasil. São Paulo: Companhia das letras, 1992, p.09-
24

LINO, Jaisson Teixeira. O povoamento indígena no Sul do Brasil: as contribuições da


arqueologia e da história. In: In: RADIN, José Carlos; VALENTINI, Delmir José; ZARTH,
Paulo A. História da Fronteira Sul. Chapecó: Ed. UFFS, 2016, p.92-108

WENCZENOVICZ, Thais Janaina. À escuta da aldeia: marcadores sociais e a memória nas


comunidades indígenas no Brasil Meridional. Joaçaba: Editora Unoesc, 2019

ZARTH, Paulo A. Fronteira Sul: História e historiografia. In: RADIN, José Carlos;
VALENTINI, Delmir José; ZARTH, Paulo A. História da Fronteira Sul. Chapecó: Ed. UFFS,
2016, p.09-42

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