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A diversidade é a realidade da vida de todos nós. É a própria


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essência de nossa sobrevivência planetária. Organicamente, a
sobrevivência humana como espécie depende da interdepen-
dência de todas as vidas. O pensamento fundamentalista que dá
Ms suporte à cultura dominadora nega essa verdade,
socializando
cidadãos para acreditar a
que segurança reside em defender a
A O tirania dessa mesma cultura, em proteger a homogeneidade.
nia ee
Descrevendo as intenções do modelo dominador em O poder
tamo fé
+
apetite, du parceria, Riane Eisler escreve: "Famílias e sociedades são
baseadas em um controle explícita ou implicitamente apoiado
na culpa, no medo e na força. O mundo é dividido em gmpos de
dentro e grupos de fora, e aqueles que são diferentes são consi-
derados inimigos a serem conquistados ou destruídos". Quando
a diversidade se tornou uma palavra da moda para a inclusão
da diferença no mundo acadêmico e no mercado de trabalho,
foi apresentada como um conceito bastante benigno, outra
a versão do mito da nossa nação como um genuíno caldeirão em
que as diferenças se encontram e convergem. Esse
conceito de
diversidade tem imperado na maioria dos ambientes institu-
cionais desde escolas de ensino fundamental, faculdades e
universidades até o mundo corporativo.
+

+1 57

Pense por um momento nos alunos do ensino fundamental pensamento e na prática, que pouco a pouco transformará os
aprendendo que Colombo navegou pelo oceano azul e foi sau- mundos que habitamos.
dado por indígenas que ficaram felizes em dar as boas-vindas A diversidade não teve nem pode ter significados transfor-
a colonos brancos. Nessa versão da diversidade, o centro do "madores relevantes em qualquer mundo onde a supremacia
patriarcado supremacista branco capitalista imperialista, tal branca permaneça a base subjacente do pensamento e da prá-
como construído pela cultura dominante, permanece intac- tica. Uma grande maioria de pessoas brancas não esclarecidas
to; inserir a diferença não altera a construção central. Outro acredita que a mera presença da "diferença" mudará o teor das
exemplo, e talvez mais pertinente para essa discussão, é a elei- instituições. E, ainda que não se possa negar seu poder positivo,
ção do primeiro presidente negro dos Estados Unidos. Muitos a representação por si só não é suficiente para favorecer a diver-
cidadãos veem essa mudança como um triunfo da diversidade. sidade duradoura. Embora a integração racial e étnica traga
No entanto, ao longo de seu mandato, muitas das decisões um verniz de diversidade, o racismo continua sendo a norma.
sancionadas por esse presidente negro não parecem diferentes Falamos de viver em uma sociedade diversa, uma vila global,
das de um presidente branco cristão liberal. Muito do sucesso enquanto nos Estados Unidos a maioria das pessoas ainda
dessa presidência se deve ao fato de que sua temida diferen- que trabalhe em ambiente diverso continua escolhendo viver
-

ça, na verdade, não foi tão diferente. Para várias pessoas isso e interagir socialmente com pessoas semelhantes. A maicria
representa um triunfo para a diversidade. Aquelas que refletem dos bairros no nosso país permanece segregada por raça/etnia e
um pouco mais percebem aí apenas um verniz ou maquiagem classe. À nossa volta, pessoas em todas as esferas da vida pública
da diferença, que cria uma mudança enquanto o centro per- falam de mudanças demográficas (em particular da crescen-
manece o mesmo. Hoje é comumente aceita a noção de que? te população hispânica), mas poucas ações são tomadas para
diversidade é vital para habitar uma vila global, na qual a dife- garantir que, se "este mundo não é mais branco, e nunca mais
rença seja verdadeiramente a norma. Essa aceitação é um sinal voltará a ser branco outra vez", como James Baldwin proclamou
de progresso. Contudo, como muitos cidadãos não demorama no ensaio "O estranho no vilarejo", a maioria das pessoas de
aprender (seja nas escolas, seja no local de trabalho), sobretudo cor não continue a ser escravizada pelas práticas cotidianas
aqueles que foram e são verdadeiramente diferentes, é fácil falar do patriarcado supremacista branco capitalista imperialista.
sobre diversidade, mas é dificil torná-la uma realidade concreta. Imaginemos que, a partir do momento em que a demografia em
Esse mais um caso de teoria sem prática. Muitas pessoas de
é
mutação se tornou parte da conscientização pública, as escolas
cor começam a ver a evocação da diversidade como uma cortina públicas tivessem criado um currículo que exigisse que todos
de fumaça que esconde a realidade de que aqueles que ocu- os alunos aprendessem espanhol, de modo que as habilidades
pam o poder dominante não pretendem mudar as estruturas, bilíngues fossem reconhecidas como norma preferencial. Desse
nem mesmo sutilmente, em prol de uma mudança genuína, no modo, a diversidade seria afirmada. Sem alfabetização, leitura

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e escrita e capacidade de usar computadores, a demografia em sexualidade, se quisermos criar formas de saber que reforçam a

mutação não garantirá que as pessoas de cor tenham acesso a educação como prática da liberdade.
uma vida de bem-estar máximo. Sem tais habilidades, massas
Aprender a desafiar e transformar o pensamento binário o -

de pessoas de cor que não possuem os recursos espirituais e


materiais necessários para criar uma vida sustentável perma- paradigma nós contra eles é uma maneira de criar uma base
-

necerão na base do totem econômico do nosso país. duradoura. Apegar-se ao pensamento binário na verdade refor-
Sem dúvida, o futuro da diversidade implica criar uma ça a cultura dominadora, pois um dos aspectos dessa cultura é a

sensibilização maior e uma consciência crítica mais ampla projeção em um inimigo, um "outro", sempre que as coisas dão
acerca da importância de acabar com a dominação, de desa- errado, e essa projeção de culpas, por sua vez, ajuda a promover
fiar e modificar a supremacia branca. Riane Eisler insiste, em uma cultura de vitimização.

seu modelo de parceria, que passemos de uma atitude "nós Quando estamos mais estimulados pela prática de culpabili-
contra eles" para outra visão de mundo, segundo a qual sejam zar do que por esforços para criar transformação, não podemos

concedidos "a todas as culturas os mesmos padrões de direi- encontrar alívio para o sofrimento e, além disso, estamos

tos humanos e responsabilidades fornecidos pelo modelo de criando as condições que ajudam a nos manter presos ao status

parceria". Ela argumenta: "Em um mundo onde as tecnolo- quo. Nosso apego a acusações, a identificar o opressor, origina-
-se de um medo: de que, se não conseguirmos afirmar inequí-
gias de comunicação e destruição atravessam o globo quase
instantaneamente, criar um mundo melhor é uma questão de voca é absolutamente quem é o inimigo, não saberemos como
interesse próprio esclarecido". Agora, mais do que nunca, pre- organizar a luta de resistência. No instigante livro Governe
cisamos criar comunidades de aprendizagem que consolidem, seu mundo: estratégias antigas para a vida moderna, Sakyong
como parte essencial do currículo, o aprendizado da teoria e Mipham Rinpoche fala de aprender.a entender os outros em

da prática da diversidade. Em meu livro Ensinando pensamento vez de culpá-los: "Lembro-me de meu pai e outros da geração
ms
crítico: sabedoria prática, chamo atenção para o modo como as mais velha de lamas tibetanos dizerem que não culpavam os
chineses comunistas pela destruição do Tibete. Sentiam que
questões da diversidade, tanto dentro como fora da sala de aula,
estão lentamente sendo empurradas de volta para o âmbito do essa culpabilização não resolveria nada. Isso só prenderia os

silêncio e da desinformação: tibetanos ao passado". Da mesma forma, qualquer exame crí-


tico da história da luta pelos direitos civis nos Estados Unidos
Mais que nunca, alunos precisam aprender a partir de perspectivas mostra que houve um progresso maior quando os líderes enfa-
não enviesadas, sejam elas conservadoras ou radicais. E, mais que tizavam a importância de perdoar o inimigo, de trabalhar pela

nunca, estudantes e professores precisam compreender total- reconciliação e pela formação de uma comunidade amada, em
mente as diferenças de nacionalidade, raça, sexo, classe-social e vez de uma retaliação raivosa.

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Projetar a culpa e pedir vingança era um aspecto dos movi- simplesmente superar essa questão?". Além disso, uma política
mentos militantes black power que realmente fracassaram em de responsabilização enfatizaria que todas as pessoas brancas
sustentar o clima de desaprendizado do racismo outrora forjado se beneficiam dos privilégios advindos da exploração racista do
pela luta antirracista não violenta, Como resultado da rebelião passado e do presente, e, portanto, são responsáveis por alterar
dosanos 1960, quanto mais as pessoas negras eram encorajadas e transformar a supremacia branca eo racismo.
a expressar sua raiva, "culpando" todos os brancos pela A responsabilidade é um conceito mais abrangente, por-
explo-
ração e pela dominação raciais e refutando qualquer noção de que abre um campo de possibilidades em que somos todos
perdão, mais um senso internalizado de vitimização se tornava a obrigados a ir além da culpa e entender de que modo somos
norma. Em comparação a outros momentos históricos similares, responsáveis. Ao perceber nitidamente que vivemos dentro de
*

quando a agressão da supremacia branca era mais ameaçadora uma cultura dominadora do patriarcado supremacista branco
à vida, muitas pessoas negras estão hoje, tragicamente, mais capitalista imperialista, sou compelida a localizar minha res-
desesperançosas em relação a qualquer possibilidade de que o ponsabilidade. Em algumas circunstâncias, estou mais próxima
racismo possa ser efetivamente desafiado e alterado. Indivíduos de me tornar vítima de algum aspecto desse sistema; em outras,
brancos não esclarecidos que proclamam ou que o racismo aca- estou em posição para ser a opressora. Se eu reivindicar somen-
bou ou que não são responsáveis pela escravidão acionam uma te aqueles aspectos do sistema que me definem como oprimida

política de culpa por meio da qual rejeitam a realidade política ealguma outra pessoa como meu opressor, então continuo
ao insistir que as pessoas negras nunca são realmente vítimas anão ter a visão do todo. Qualquer esforço que possa fazer
do racismo, mas agentes de seu próprio sofrimento. para desafiar a dominação provavelmente falhará se eu não
O pensamento dualista, que está no centro do pensamen- observar com precisão as circunstâncias que criam sofrimento,
to dominador, ensina às pessoas que há sempre o oprimido enxergando assim a totalidade da situação. Depois de mais
e o opressor, uma vítima e um agressor. Portanto, há
sempre
detrinta anos conversando com as pessoas sobre dominação,
:
alguém para culpar. Passar da ideologia da culpa para uma posso afirmar que muitas delas em nossa sociedade tanto -

política de responsabilidade ética é um movimento difícil de negras quanto brancas resistem avero todo.
-

se estabelecer em uma sociedade na qual quase toda


organi-
Ao trabalharmos em prol da justiça, devemos entender as
zação política, seja conservadora, seja radical, foi estruturada raízes do pensamento dominador, pois compreendê-las esclare-
em torno do binário dos mocinhos e dos bandidos. A respon- ce as ações que devemos tomar para resistir. As feministas refor-
sabilidade é uma questão muito mais complexa. Uma políti- mistas continuam sugerindo que a cultura dominadora começa
ca de culpa permite que uma pessoa branca contemporânea com a subjugação das mulheres pelos homens. Contudo, esse
faça declarações como "Minha família nunca possuiu escra- entendimento de como a dominação se tornou a norma está
vos" ou "A escravidão acabou, por que os negros não podem totalmente enraizado no pensamento dualista, o qual define

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os machos como bandidos e as fêmeas como mocinhas. Tal que definia o relacionamento da pessoa com o mundo natural

pensamento levou até mesmo muitas mulheres brancas a ver o também definia sua relação com oo sagrado.
racismo como uma simples extensão do pensamento machista.
É óbvio que pensar desse modo permite a perpetuação de uma Nesse mundo, as relações de gênero eram mais justas, pois não

hierarquia de dominação em que o machismo é considerado o havia demarcações claras entre o trabalho das mulheres e o dos
sistema mais relevante a ser desafiado e transformado. De fato, homens. De acordo com Flinders, foi mundo da agricultu-
o

evidências recentes sugerem que os primeiros humanos foram ra e do território fixo que trouxe grandes divisões de gênero,

provavelmente pessoas de pele mais escura, o que não dá cre- paradigmas artificialmente construídos de nós contra eles,ea
guerra. Não é difícil enxergar como
dibilidade à noção de que o machismo veio primeiro e, depois, essas primeiras distinções

o racismo, Teorias de dominação que nos levam para além da entre nós e eles desembocaram no patriarcado supremacista
culpabilização de um grupo em detrimento de outro postu- branco capitalista imperialista.
lam a ideia de que a dominação começa com a passagem de, A disputa por território levou os brancos a desenvolver
uma sociedade pré-agrícola para uma na qual aagricultura novos comportamentos: uma população minoritária cuja dis-
desenvolvida. A interdependência era a norma no mundo antes tinção de cor e privilégio é perdida quando copulam com aque-
da agricultura. Em Rebalancing the World [Reequilibrando o les de pele mais escura e se tornam mais agressivos e bélicos;

mundo], Carol Lee Flinders explica: a acumulação de recursos materiais, a subjugação das mulheres
fortes.
pelos homens; a exploração e a opressão dos fracos pelos
Os seres humanos pré-agrícolas não se viam como nitidamen- Em tal sistema mundial, o pensamento e a prática dominadora
te separados do mundo natural, ou superiores a ele, mas como se tornam a norma.
membros de uma família ou povo entre muitos outros, fazen- Em O poder da parceria, Eisler explica:
do o melhor que podiam para se manter vivos. [...] Antes que a

agricultura produzisse excedentes de comida, a maioria dos seres No modelo de dominação, alguém tem que estar no topo e alguém
humanos era nômade, coletando em um local e avançando em tem que estar na base, Aqueles no topo controlam os que estão

poucos dias para outro, dentro de um território definido. Viajavam abaixo de si. As pessoas aprendem, desde a infância, a obedecer às
em bandos, mas os bandos eram pequenos, refletindo os recursos ordens sem questionar. Aprendem a carregar uma voz autoritária
alimentares limitados da maioria dos lugares. A interdependên- em sua cabeça dizendo-lhes que não são boas, que não merecem
cia era a lei básica da vida: o que se encontrava ou matava era amor, que precisam ser punidas.
compartilhado, e quem tivesse sorte no dia seguinte retribuiria
o gesto. [...] Povos pré-agricolas não se imaginavam mestres do A doutrinação para o pensamento dominador em uma cultura
mundo que observavam, [...] O senso aguçado de reciprocidade governada pelos ditames do patriarcado supremacista branco

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capitalista imperialista é um processo que afeta a todos nós essencial para qualquer esforço de transformação da cultura
em maior ou menor grau. Entender o pensamento dominador dominadora. Pessoas progressistas, sobretudo proeminentes
aumenta a consciência de que não existe maneira simples de teóricos e ativistas de esquerda do sexo masculino, denunciam
iden tificar vítimas e opressores, embora haja, de fato, graus abertamente o imperialismo, o racismo e o capitalismo, mas
de responsabilidade. quase nunca falam sobre a necessidade de desafiar o patriarca-
Uma das narrativas contra-hegemônicas mais poderosas, do. Apesar de todas as pessoas de cor, inclusive pessoas negras,
gue pode levar muitos de nós ao caminho da consciência crítica, serem socializadas para adotar o pensamento supremacista
é a ideia de democracia. Antes dos anos 1960, aprender sobre a branco, poucos indivíduos desses grupos defendem abertamen-
importância global da democracia (ou seja, que todos tinham te o racismo. Indivíduos negros que alisam os cabelos porque
direitos, que as pessoas foram criadas em igualdade, que pode foram ensinados a acreditar que sua textura natural é feia estão
haver justiça para todos) foi a base da radicalização para muitos perpetuando a estética supremacista branca, mesmo que sejam
cidadãos no nosso país. E esse processo de radicalização geral- inflexivelmente antirracistas. Essas contradições revelam as
mente começava no início da infância. Muitas vezes, iniciava-se incontáveis formas como a cultura dominadora molda nossos
questionando por que uma visão tão inspiradora da democracia pensamentos e nossas ações de maneira inconsciente. É pre-
não era plenamente realizada. Hoje, quando crianças brancas cisamente porque o pensamento dominador está enraizado
no meu bairro aprendem sobre os indígenas que moravam aqui de modo tão profundo em nossa psique que o esforço para
antes dos brancos, algumas, não todas, começam questionar:
a descolonizar a mente através do cultivo da consciência crítica
"Por que as pessoas brancas tinham armas?"; "Por que mataram precisa ser um aspecto essencial da luta de resistência. Quando
os indígenas ou os forçaram a deixar suas casas"; "Por que os indivíduos psicologicamente confusos se envolvem em alguma
brancos tomaram a terra que já estava ocupada?". Na minha luta de resistência, muitas vezes se desestruturam e podem atuar
infância, o direito de perguntar "por que" era um privilégio de maneiras que prejudiquem ou neguem seus esforços para
central de viver sob o mito da democracia. E esse mito era criar uma transformação construtiva. Uma vez que a cultura
forte, apesar de a realidade mais vital de nossa vida ser a da dominadora depende de sistemas in terligados (imperi alismo,
se
dominação patriarcal. supremacia branca, capitalismo, patriarcado) para sustentar,
As histórias que localizam na invenção do patriarcado a raiz ela procura encobrir as conexões entre esses sistemas, ou então
dominação podem parecer imprecisas, mas, na cultura domi-
"da permite que se desafie apenas um aspecto do sistema por vez:
nadora, a família é de fato uma das principais esferas pedagó- por exemplo, permitindo críticas antirracistas enquanto silencia
gicas para o ensino do pensamento e da prática de dominação as vozes anticapitalistas ou antimachistas.
por meio da aceitação e da perpetuação do patriarcado. Assim, E o patriarcado começa em casa. Novamente, esse é um
trabalhar para desafiar e transformar o patriarcado continua aspecto da cultura dominadora que tendemos a aprender com

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violência. Nenhum movimento contemporâneo em prol de
nossa família, com pessoas que alegam se importar conosco.
como vivemos, com exceção
No passado, o pensamento patriarcal aprendido na família justiça social transformou o modo
do movimento feminista . O reconhecimento, por meio de leis
tefletia-se nos ensinamentos patriarcais da igreja ou de outras
e políticas públicas, de que as mulheres são iguais aos homens
foi uma instância principal
instituições religiosas. A religião já alterou a natureza do trabalho, da
é mais e merecem direitos iguais
para o ensiname nto do pensamento racista, mas essa não
Pessoas brancas cristãs não são abertame nte economia e da vida doméstica. E, ainda que o movimento
uma norma aceita.
feminista seja acusado de muitas coisas, é por causa dele, na
ensinadas na igreja que deus determinou que são superiores
acesso à equidade
verdade, que mulheres e homens têm maior
É
às pessoas de outras cores e, por isso, deveriam governá-las.
de gênero em todas as esferas da vida. precisamente a mul-
É
Até mesmo entre os cristãos mais fundamentalistas existe um
feminista que levou a uma
de cor para se unir a eles tiplicidade de sucessos da reforma
esforço comum de recrutar pessoas
no culto. Essa postura acolhedora existe, embora as igrejas nos retaliação antifeminista.
O desafio e a transformação do patriarcado ameaçam uma
c Estados Unidos sejam, antes de tudo, racialmente segregadas.
ora. Se meninos não
Contudo, todas as principais religiões do mundo
continuam fundação central da cultura dominad
o l. Ao mesmo forem socializados para aceitar a masculinidade patriarcal e
a ensinar abertame nte pensamento patriarca
de cor denuncia m de maneira global sua violência correspondente, então não terão a mentalidade
tempo, massas de pessoas
necessária para travar a guerra imperialista. Se mulheres e
a supremacia branca e o racismo enquanto perpetuam ativa-
a homens forem ensinados a valorizar a reciprocidade, então
mente o patriarcado. a.
a parceria, em vez da ética da dominação, será valorizad
Ea
mf

mais
Hoje, muitos cidadãos do nosso país não frequentam sofrimen to
Como o pensamento patriarcal cria psicológi co,
a igreja, de modo que a família se tornou a principal insti-
entre novos modelos de parceria oferecem a promessa de bem-estar
tuição para a disseminação do pensamento patriarcal
cuidador as primá- e, portanto, minam a cultura de consumo capitalista, que
as crianças. Fêmeas patriarcais, enquanto
criadas
rias de crianças, são as pessoas que ensinam papéis de gênero explora a dor psicológica. As transformações positivas
movimen to feminista foram tão difundidas que a reação
homens e mulheres de pelo
patriarcais. Entretanto, a maioria dos
foi feroz. A grande mídia, em especial aquela voltada para
nossa sociedade raramente usa a palavra patriarcado ou sequer
reinscreve
entende seu significado. O patriarcado é um sistema político crianças pequenas, adolescentes e jovens adultos,
continuamente o pensamento machista acerca dos papéis
e social que insiste que os machos são inerentemente domi-
considerados de gênero. Essa tem sido a principal ferramenta a retratar
nantes, superiores a tudo e a todos que sejam
Eles seriam dotados do direito feministas e/ou mulheres poderosas de maneira negativa.
fracos, especialmente mulheres.
os bem como de manter esse Em O poder da parceria, Eisler enfatiza que uma forma de
de dominar e governar fracos,
tem promovido "dominação
domínio por meio de várias formas de abuso psicológ ico e retaliação midiática antifeminista

e submissão nas relações entre pais e filhos e entre mulheres interligados que moldam a cultura dominadora em que vive-
e homens". Ela explica: mos, as pessoas diziam que a expressão era apenas uma frase
muito austera. Nos últimos dez anos, sempre que a usava em
O motivo é que nessas relações íntimas aprendemos, pela primeira palestras, na maioria das vezes o público respondia com risadas.
vez, a aceitar a dominação e o controle como fatores normais, De início, achei que o riso era uma expressão de desconfor-
inevitáveis e corretos. [...] Por isso, muitos dos regimes moder- to, pois a verdadeira natureza da política de nosso país esta-
nos mais repressivos [...) surgiram onde as relações familiares va sendo exposta. Mas, como a risada me seguiu de palestra
e degênero baseadas na dominação e na submissão estão bem em palestra, comecei a vê-la como uma maneira de desviar a
estabelecidas. É também por isso que, uma vez no poder, esses atenção da seriedade dessa designação. Repetidas vezes, a teo-
regimes impulsionaram vigorosamente políticas que têm como ria crítica ternos ensinado o poder de nomear com precisão
meta a recuperação de um pai punitivo em total controle de sua aquilo que estamos desafiando e esperamos transformar. Mas
família. Vemos esse padrão de forma muito nítida em um dos uma forma de silenciar a nomeação precisa é fazer com que ela
aspectos mais sérios da regressão dominadora do nosso tempo: pareça ridícula, muito estridente, dura demais. Raramente me
o surgimento do chamado fundamentalismo religioso. Eu digo perguntam qual é o valor de chamar a atenção para os sistemas
"chamado" porque, olhando de perto, fica óbvio que o que muitos de dominação interligados. No entanto, quando examinamos
líderes fundamentalistas pregam seja no Oriente Médio, seja as circunstâncias culturais que forneceram a base para o fas-
nos Estados Unidos não é fundamentalismo religioso, mas o
-
cismo no século xx (olhando particularmente para as raízes do
modelo de dominação/controle com uma pitada religiosa. fascismo na Alemanha, na Espanha e na Itália), encontramos
traços semelhantes nos Estados Unidos (isto é, poder patriar-
Dado o papel que o patriarcado cumpre como sistema que cal, nacionalista, racista, religioso e econômico controlado por
explora as relações familiares para ensinar valores dominadores, uma minoria interessada em riqueza, religião etc.). Nos regimes
desafiá-lo e transformá-lo gera benefícios evidentes para todos -
fascistas, ensinar as populações a temer o "terrorismo" é um
homens e mulheres, adultos e crianças. Ainda assim, transformar meio de obter apoio para o sistema. Ao mesmo tempo, vozes
o patriarcado não colocará fim à cultura dominadora enquanto dissidentes que desafiam o status quo tendem a ser silenciadas
os outros sistemas interligados permanecerem intactos. Quando por inúmeras formas de censura. Mais recentemente, no nosso
o movimento feminista estava trazendo mudanças revolucio- país, a mídia tem sido usada para sugerir que qualquer um que
nárias para o status de mulheres e homens, o imperialismo, o critique o governo é um traidor, que merece reprovação e até
capitalismo e o racismo ganhavam força globalmente. E prisão
-0
que silencia, efetivamente, muitas vozes.
Quando comecei a usar a expressão patriarcado supremacis-
-
sistência significativa à cultura dominadora exige
ta branco capitalista imperialista para caracterizar os sistemas de todos s disposição para identificar com precisão os vários

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sistemas que trabalham juntos para promover a injustiça, a
exploração e a opressão. Nomear esses sistemas é uma maneira
de romper nossa dependência equivocada do pensamento dualis-
ta. Ao serem evidenciados, esses sistemas interligados tendem a
nos delatar de alguma forma, tornando impossível para qualquer
um de nós afirmar que somos absolutamente e sempre vítimas,
chamando a atenção para a realidade de nossa responsabilidade,
ainda que relativa. Quando somos responsáveis, evitamos o papel
de vítima e somos capazes de reivindicar o espaço de nossa atua-

ção individual e coletiva. Para muitas pessoas, sobretudo aque-


las submetidas a exploração e/ou opressão, essa atuação pode
parecer inadequada. No entanto, afirmá-la, mesmo de modo
sutil, é sempre o primeiro passo para a autodeterminação. É o
lugar da esperança.
f
À
medida que nos afastamos da cultura dominadora em
direção a uma cultura libertadora, que valoriza a parceria e a
reciprocidade, criamos uma cultura na qual todos podemos
aprender a amar. Não pode haver amor onde há dominação.
E, sempre que fazemos o trabalho do amor, estamos fazendo
o trabalho de acabar com a dominação. O desenvolvimento
de práticas de escuta ativa possibilita a formação de laços para
além das diferenças. Quando abraçamos a diversidade como
uma prática que pode enriquecer, libertar e transformar hossa
vida, mostramos, através de nossas ações, que a.afirmação da
diversidade pode revitalizar modos de saber, trazer novas,
energias à aprendizagem nos capacitar para trabalhar pela
e>»

justiça conforme tornamos a educação uma prática da Jiber-


dade. Ao adotar a diversidade, podemos trabalhar juntos por
mudanças que nos auxiliem a viver mais plenamente, a viver
uma vida significativa.

HR

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