No contexto da urbanização e industrialização, houve a
mudança dos hábitos de vida, em que as pessoas passaram
a ser mais sedentárias e a se alimentar mal, com alimentos
ultraprocessados, fast foods, dentre outros -> modo de
viver obesogênico.
No Brasil, 60% dos adultos brasileiros apresentaram excesso
de peso em 2019, sendo que 23% dos homens e 30% das
mulheres apresentam obesidade.
Hoje, as populações socioeconomicamente menos
favorecidas evidenciam maiores prevalências de obesidade.
Fatores como fácil acesso aos alimentos ultraprocessados
(mais baratos que os saudáveis) e espaços não seguros e
inadequados para a prática de atividade física constituem os
principais motivos.
Fatores de risco para a obesidade:
• Maus hábitos de vida -> inatividade física e
alimentação inadequada;
Complicações da obesidade e suas comorbidades:
• Maior exposição a poluentes;
• Fatores psicológicos predisponentes;
• Privação do sono;
• Tabagismo;
• Alterações na microbiota intestinal.
Gordofobia: sensação de repulsa ou desconforto em
relação as pessoas com obesidade/sobrepeso que pode se
manifestar por violência emocional e física e assédio moral.
As pessoas obesas têm pior qualidade de vida, a nível
escolar, estado civil e nível socioeconômico.
Patogenia da obesidade:
• Balanço energético -> balanço positivo crônico da
energia corporal combinado a uma falha nos
mecanismos homeostáticos que deveriam
confrontar o ganho de peso.
→ Fatores genéticos, epigenéticos, ambientais
e comportamentais.
• Regulação do peso corporal -> comandada pelo
cérebro. Em situações de mudança de peso, o nosso
corpo tende a regular para voltar ao peso original
(um peso constante = set point). Na presença de um
balanço positivo crônico, o set point é restabelecido
em uma faixa mais elevada de peso e o corpo passa
a defender a manutenção de um peso mais alto.
Isso dificulta também o processo de
emagrecimento em pessoas obesas.
• Adiposidade -> a gordura pode se depositar no
tecido adiposo subcutâneo, no tecido adiposo
visceral e em tecidos não adiposos, como músculo
e fígado (deposição ectópica). Além de atuar como
reserva energética, o excesso de gordura visceral e
ectópica gera um estado de inflamação sistêmica
que induz o desenvolvimento de diabetes melito,
síndrome metabólica e doença cardiovascular.
• Interocepção (processo pelo qual o sistema nervoso
detecta informações visando o funcionamento
homeostático), comportamento alimentar e
padrões emocionais de alimentação.
→ Disfunções interoceptivas na percepção dos
sinais de fome, saciedade e reservas
metabólicas de energia estão presentes em
pessoas com tendência a ganho de peso e
dificuldade para perdê-lo.
→ Em situações que há maior expectativas de
comer (ex: jejum prolongado), há o
aumento da atenção destinada a alimentos
mais “atraentes”.
→ Fome hedônica -> comer por prazer.
→ Alimentação emocional.
• A obesidade aumenta o risco de mortalidade de
forma crescente de acordo com níveis crescentes de
IMC;
• Síndrome metabólica: hiperglicemia, PA elevada e
dislipidemia.
• Risco de diabetes 5x maior.
• O risco de AVC é quase 50% maior em indivíduos
obesos.
• O risco de doença arterial coronariana é quase 70%
maior em indivíduos obesos.
• Mulheres: irregularidades menstruais, hirsutismo,
síndrome dos ovários policísticos, maiores chances
de diabetes gestacional, pré-eclâmpsia e
complicações do parto.
• Homens: níveis reduzidos de testosterona e
elevados de estrogênios, ginecomastia.
• Apneia obstrutiva do sono, síndrome de
hipoventilação, risco de asma, hipertensão
pulmonar, insuficiência cardíaca direita.
• Problemas gastrointestinais: cálculos biliares,
doença hepática gordurosa não alcóolica, cirrose,
DRGE.
• Infecções fúngicas (dobras), estase venosa de
membros inferiores, acantose nigricans.
• Osteoartrite, dor lombar.
• Hiperuricemia.
• Câncer do trato biliar, do pâncreas, do rim, do
esôfago (adenocarcinoma), de cólon e reto e
endometrial.
• Depressão, ansiedade generalizada e transtornos
alimentares.
Classificação clínica do sobrepeso e da obesidade:
IMC: fornece uma estimativa da massa corporal total, sem
distinguir massa corporal magra de massa gordurosa, e não
reflete o padrão de distribuição da adiposidade.
Circunferência da cintura: reflete o acúmulo de gordura
visceral, que confere risco adicional ao excesso de peso. O
ponto mais utilizado é o ponto médio entre a crista ilíaca e
a margem costal.
Segundo a OMS, a obesidade é definida como um acúmulo
excessivo anormal de gordura corporal capaz de trazes
prejuízos a saúde.
Prevenção populacional e clínica do excesso de peso:
• Ações na comunidade: atividades de promoção nas
escolas e nas igrejas, organização de grupos para
caminhada, organização de feiras com produtos
locais e hortas comunitárias.
• Medidas regulatórias: evitar propaganda danosa e
oferecer rotulagem informativa.
• Prevenir ganho excessivo de peso -> estratégia
principal.
• Gestantes: nas consultas pré-natal, promover
hábitos saudáveis, estimular amamentação no
peito e prevenir ganho excessivo de peso.
Alimentação saudável -> preferir alimentos in natura
(frutas, legumes, verduras, ovos) ou minimamente
processados (leite, farinha, arroz, feijão, carnes resfriadas)
e preparações culinárias (mínima adição de óleos e gorduras
em geral, sal e açúcar) a alimentos ultraprocessados (densos
em calorias e composição nutricional desbalanceada).
Comer de forma tranquila, evitar repetições de prato e
tomar mais água com as refeições.
Obs: sincronização da alimentação com os ritmos
circadianos -> se alimentar durante os períodos de luz e
jejuar à noite.
Prática regular de atividade física -> previnem o sobrepeso,
reduzem a gordura abdominal, melhoram o bem-estar e
aumentam a qualidade de vida e a longevidade.
Monitoramento de peso -> perceber precocemente
alterações no peso e identificar as situações que levaram à
mudança.
Organização dos serviços de saúde para atender
pessoas com sobrepeso ou obesidade:
• Postura acolhedora da equipe e adaptação do
ambiente (portas e cadeiras mais largas, por
exemplo).
• Atendimento individual (para os que desejarem) +
programas estruturados de perda de peso (em
grupo).
• Tecnologias de e-health -> diário alimentar,
programas estruturados de atividade física,
mensagens motivacionais, etc.
Abordagem terapêutica:
• Deve abordar o engajamento, respeitando o tempo
do paciente;
• Os objetivos devem ser claros, realistas e conter
significado;
• As mudanças devem ser sustentáveis a longo prazo;
• O paciente deve se sentir bem.
As Redes de Atenção à Saúde (RAS) promovem cuidados
que visam melhorar a atenção em 3 níveis: micro (indivíduo
e suas famílias), meso (serviço de saúde e comunidade) e
macro (macropolíticas de saúde). O apoio desses pacientes
deve ser continuado e planejado, com atenção integrada e
empoderamento para o autocuidado. Para atenção desses
indivíduos, é necessária uma contínua ação da Vigilância
Alimentar e Nutricional (VAN) para identificação dos casos,
estratificação de risco e organização da oferta de cuidado.
Abordagem multidimensional e cuidado longitudinal:
O tratamento do sobrepeso e da obesidade envolve
mudanças de vida, perda/manutenção de peso de variadas
intensidades, suporte psicológico e, algumas vezes,
tratamento farmacológico e/ou cirúrgico. As escolhas
terapêuticas vão depender da caracterização clínica do
excesso de peso, da motivação das pessoas para realizar
mudanças e do contexto biopsicossocial.
Avaliação clínica inicial:
• Domínios de uma abordagem multidimensional ->
história de ganho de peso, tentativas de perda de
 peso e hábitos alimentares e de atividade física
atual.
• A pessoa já nasceu grande? Adquiriu peso na
infância, adolescência, vida adulta, gestação,
menopausa, momento estressante, mudança no
ciclo da vida? “Me conte a história do seu peso ao
longo da vida”.
→ Uso de medicamentos, gravidez recente e
mudanças de vida.
→ Alguns fármacos obesogênicos:
antidepressivos tricíclicos, paroxetina,
mirtazapina, olanzapina, risperidona,
valproato, carbamazepina, insulina,
sulfonilureias, coritoides, anti-histamínicos
de primeira geração e anticoncepcionais
medroxiprogesterona de depósito.
• Revisão dos sistemas -> direcionada para condições
que potencialmente contribuíram para o ganho de
peso. Pesquisar hipotireoidismo, síndrome de
Cushing e SOP.
• Comorbidades e fatores de risco que influenciam
na priorização terapêutica:
• Exame físico -> ajuda a caracterizar a suspeita de
excesso de peso secundário a outro problema de
saúde.
• Exames complementares:
→ Glicemia de jejum, perfil lipídico, função
hepática, função renal e função tireoidiana.
→ Insulina de jejum, TOTG e ultrassonografia
de abdome para investigar esteatose.
• Lista de problemas.
Abordagem motivacional:
A entrevista motivacional utiliza técnicas cognitivo-
comportamentais, promovendo motivação para a mudança
e evitando resistências.
• A comunicação deve ter uma linguagem
colaborativa e sensível às dificuldades do paciente.
• Grau de motivação e prontidão do paciente; grau de
importância que o paciente percebe sobre suas
necessidades de mudança; grau de confiança; grau
de prioridade. Ex: em uma escala de 0 a 10, qual sua
necessidade de perder peso agora?
• Evitar suposições sobre hábitos alimentares e de
atividade física.
A comunicação deve direcionar o paciente a um estado de
mudança, e não de resistência. O paciente deve ouvir-se
firmando planos para mudar.
Estabelecimento de metas e plano individualizado de
acompanhamento:
As metas devem ser individualizadas e realistas. Perguntar
sempre o que o paciente pode estabelecer como meta.
O plano deve ser dinâmico e reavaliado de forma periódica,
com reajustes nas estratégias adotadas.
Alteração do balanço energético e perda de peso:
As abordagens tradicionais para perda de peso visam alterar
o balanço energético, seja produzindo um déficit calórico
alimentar, aumentando a atividade física ou ambos. Um
déficit calórico diário de cerca de 500 kcal pode induzir
perdas de peso de cerca de 4 kg (500 g/semana) em um
período de 8 semanas.
Após cerca de 8 semanas, para manter o grau de perda de
peso anteriormente obtido, será necessário ampliar
significativamente o déficit calórico e/ou aumentar a
atividade física. Em torno de 24 semanas, a perda de peso
alcançará um platô; a partir desse ponto, o melhor é focar a
manutenção do peso perdido.
Obs: a perda de peso mais lenta (em comparação com a
perda mais rápida) produz maior redução de massa gorda e
do percentual de gordura corporal.
Intervenções alimentares:
Elemento central na perda de peso.
O ideal é começar com uma orientação mais qualitativa
sobre o padrão alimentar saudável. Para obter perda inicial
de peso, é necessário reduzir o aporte calórico em cerca de
400 a 500 kcal (ou menos, se acompanhado de aumento de
atividade física). Não há necessidade de quantificar essas
calorias, o que torna a estratégia mais simples para ser
orientada por profissional da equipe que tenha empatia e
habilidade de comunicação.

Mnemônico RASO -> reduzir, aumentar, substituir e

observar.

Reduzir o consumo de alimentos ultraprocessados e outros

alimentos de alta densidade energética. Reduzir as porções
alimentares;

Aumentar o consumo de alimentos não processados ou

minimamente processados e/ou de baixo valor energético,
aumentando o caráter saudável da dieta;
Quando surgirem deslizes, tratá-los naturalmente,
Substituir alimentos por versões menos processadas e mais
refletindo sobre suas causas, sem recriminações e
saudáveis – por exemplo, grãos refinados por grãos
lamentos.
integrais, sobremesas industrializadas por sobremesas
caseiras, frituras por versões assadas ou grelhadas, Manejo farmacológico:
refrigerante por água ou chá;
Medicamentos podem complementar mudanças de estilo
Observar a qualidade da alimentação, o comportamento e de vida quando é necessária maior perda de peso. Isso pode
a forma de se alimentar. Por exemplo, comer devagar, ocorrer em pessoas com IMC ≥ 30 kg/m2 ou na presença
mastigando bem e reconhecendo os sinais de fome e de comorbidades que se beneficiem de perda de peso.
saciedade; se está comendo sem pensar, por exemplo,
assistindo à televisão ou verificando o telefone celular.

Para pacientes motivados a uma perda maior de peso, pode

estar indicado prescrever dieta hipocalórica.

Planos para aumento da atividade física:

O mnemônico RASO pode ajudar na orientação da

atividade física:

Reduzir hábitos sedentários – por exemplo, assistir à

televisão por menos tempo, reduzir o tempo que fica
sentado sem levantar;

Aumentar períodos regulares de atividade física – por

exemplo, fazer compras a pé, caminhar diariamente, descer
do transporte público regularmente antes do destino e
caminhar o restante do trajeto, participar de atividades em
academias, dançar, jogar bola, fazer atividades esportivas;

Substituir atividades sedentárias por atividades físicas – por

exemplo, fazer o churrasco de domingo em parques para
fazer atividades esportivas associadas;

Observar – facilitadores, barreiras, alternativas possíveis.

Manejo cirúrgico:
Manutenção do peso perdido:
Segundo a Portaria nº 424 de 19 de março de 2013 do
Ministério da Saúde, a cirurgia é indicada para:

→indivíduos com IMC ≥ 50 kg/m2;

→indivíduos com IMC ≥ 40 kg/m2 sem sucesso no

tratamento clínico convencional por no mínimo 2 anos;

→indivíduos com IMC > 35 kg/m2 na presença de

comorbidades (como alto risco cardiovascular, diabetes
melito, hipertensão arterial sistêmica de difícil controle,
apneia do sono, doenças articulares degenerativas) e com
insucesso no tratamento clínico convencional realizado por
no mínimo 2 anos.

Contraindicações para o procedimento incluem: limitação

intelectual significativa e ausência de suporte familiar
adequado; transtorno psiquiátrico não controlado
(incluindo uso de substâncias); doença cardiopulmonar
grave e descompensada; doenças que predisponham o
indivíduo a sangramento digestivo ou outras condições de
risco e síndrome de Cushing por hiperplasia suprarrenal não
tratada e tumores endócrinos.

Bariátrica: é um método efetivo para perdas substanciais,

rápidas e duradouras de peso e para melhora de algumas
comorbidades. As duas técnicas de maior uso são o by-pass
gástrico (gastroplastia com desvio intestinal em “Y de
Roux”) e gastrectomia vertical (também denominada
cirurgia de sleeve ou gastrectomia “em manga de camisa”).
Uma terceira técnica utilizada é a banda gástrica ajustável.

Referências:
DUNCAN, Bruce B.; SCHMIDT, Maria I.; GIUGLIANI, Elsa R J.;
e outros Medicina ambulatorial: condutas de atenção
primária em prova . 5ª edição. Porto Alegre: Grupo A, 2022.
E-book. ISBN 9786558820437. Disponível em:
https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/978655
8820437/. Acesso em: 15 ago. 2023.