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. Na Crónica de D.

João I emerge um sentimento coletivo do povo


português que se traduz na consciência de se pertencer a uma mesma nação. A
consciência nacional dos portugueses advém, em grande medida, de temerem a
invasão estrangeira (castelhana) e de sentirem a independência do reino e a sua
liberdade ameaçadas durante a Crise de 1383-1385. Por isso, Fernão Lopes faz a
apologia do rei, mas, principalmente, da resistência ao inimigo castelhano, dando
voz a uma coletividade que não aceita o lugar que lhe é destinado dentro do
direito senhorial, que cria o seu direito novo, fundado no sentimento nacional, o
«amor da terra», e defende-o de armas na mão. A palavra “Portugal” define, não
já um território, mas um corpo de gente animado de um pensamento, expressão
ainda apenas em esboço do direito pelo qual um novo povo se levantou contra um
rei, o direito nacional.

. O sentimento nacional afirma-se porque, nessa ameaça, se fortalece a noção de


comunidade. O povo de Lisboa manifesta-se contra a regente D. Leonor e contra
a influência estrangeira (Cap. XI) e sofre em conjunto a dureza e as privações do
cerco que João de Castela monta à capital (cap. CXLVIII). Contudo, são também
portugueses de várias terras e regiões que se mobilizam para preparar a
resistência a essa invasão e que enfrentam o exército castelhano nas batalhas de
Atoleiros e de Aljubarrota.

. A ideia de ser português está enraizada na «arraia-miúda», isto é, o povo;


porém, dela comungam também a burguesia e a nobreza que se mantém fiel à
causa patriótica. De facto, o povo ganha a consciência coletiva de que tem um
papel mais ativo e quer participar na vida política do reino e na condução dos
destinos da nação: intervém para «salvar» o Mestre, mobiliza-se para enfrentar os
castelhanos e quer decidir quem será o próximo rei de Portugal.

. Em termos narrativos, a consciência de grupo e o sentimento nacional são


representados através da noção de personagem coletiva, quando se trata da
multidão de Lisboa, que revela uma vontade comum (cap. XI), que se organiza
em conjunto para defender a capital (cap. CXV) e que sofre em conjunto o cerco
imposto pelos castelhanos à capital do reino (cap. CXLVIII). Por outro lado, a
enumeração de grupos sociais e profissionais (soldados) chama a atenção também
para o facto de a unidade nacional se fazer a partir da motivação e do
desempenho dos grupos que a compõem.

. No plano da escrita da história, a Crónica de D. João I contribui, ao mesmo


tempo, para representar o sentimento coletivo vivido durante a Crise de 1383-
1385 e para afirmar essa consciência nacional. A obra foi encomendada pelo rei
D. Duarte, filho de D. João I. Um dos objetivos de Fernão Lopes foi demonstrar o
patriotismo dos portugueses e valorizar o papel do Mestre de Avis, fundador da
Casa de Avis, na defesa da independência do reino e na construção do novo
Portugal, que nasce na segunda dinastia. Fernão Lopes ajuda a legitimar
(justificar) o direito de D. João I ao trono do reino português.

. Fernão Lopes coloca-nos perante a existência do povo como sujeito da História,


do povo que se sente senhor da terra onde nasce, vive, trabalha e morre e que
ganha consciência coletiva contra os que querem senhoreá-lo, do povo que é a
fonte última do direito. O povo é aquele que ganha a sua vida quer com o
trabalho manual (mesteirais e lavradores), quer com a «indústria», isto é, a
atividade, habilidade e iniciativa em qualquer ramo produtivo e pacífico. Ou
seja, uma das grandes novidades da crónica de Fernão Lopes é o aparecimento
do povo como força que se quer afirmar, saindo da passividade medieval,
do direito senhorial.

Crise política de 1383-1385


(período do país sem rei / período de tomada de consciência de liberdade e
responsabilidades)

. papel decisivo na fase de nomeação do Mestre (cap. XI)
. vivência heroica dos grandes momentos da revolução:
- preparação do cerco, de forma empenhada e valorosa (cap. CXV)
- vivência da miséria associada à falta de mantimentos durante o cerco (cap. 148

Na Crónica de D. João I, de Fernão Lopes, está presente um sentimento coletivo do povo


português que se traduz na consciência de pertencer a uma mesma nação. A consciência
nacional advém do facto dos portugueses temerem a invasão castelhana e de sentirem a
independência do reino e a sua liberdade ameaçadas durante a crise de 1383-1385.
O povo, "a arraia-miúda", ganha a consciência coletiva de que tem um papel ativo e quer
participar na vida política do reino e na condução dos destinos da nação: manifesta-se contra a
regente D. Leonor Teles; intervém para defender o Mestre e decidir quem será o próximo rei de
Portugal; atira o bispo de Lisboa da torre da Sé por ter corrido o boato de que era traidor;
resiste ao cerco que João de Castela monta à capital e sofre, em conjunto, as privações desse
cerco; enfrenta o exército inimigo nas batalhas como a de Aljubarrota...
A consciência de grupo e o sentimento nacional são representados através da noção de
personagem coletiva. Corajoso ou irracional, resistente ou apavorado, forte ou a sucumbir à
fome, o povo de Lisboa é uma personagem a quem Fernão Lopes confere um estatuto
incontornável na afirmação de um patriotismo dinâmico e, sobretudo, na afirmação da
consciência coletiva.

O povo de Lisboa é uma das personagens da Crónica de D. João I que se reveste de uma
importância capital para o desenrolar dos acontecimentos que culminarão no início da dinastia
de Avis para o que teve se ultrapassar provações de grandes proporções. Por isso, é considerado
uma personagem épica e coletiva.
Uma personagem épica é aquela que realiza ações em grande escala, de superação, e uma
personagem coletiva é aquela que representa um grupo de indivíduos que age por uma só
vontade e é animada por sentimentos, interesses e objetivos comuns.
No capítulo 11 da Crónica, encontramos a população de Lisboa a agir corajosamente e em
comunidade para tentar salvar o Mestre de Avis, que, aparentemente, se encontrava em perigo,
ameaçando incendiar os Paços da Rainha e mostrando, de seguida, uma enorme alegria por ele
estar salvo.
No capítulo 115 é mostrado mais uma vez o seu espírito do comunidade, quando os habitantes
da cidade se reparam para o cerco castelhano e oferecem a sua ajuda militar e civil para o que
for necessário.
Ainda no capítulo 148, em “Esforçavom-se uus por consolar os outros, por dar remedio a seu
grande nojo…”, observamos também que, apesar de todas as gentes de Lisboa atravessarem um
período muito complicado com o cerco do inimigo, tentavam, porém, ajudar o próximo nem que
fosse com algumas palavras de consolo.
Podemos, então, concluir da leitura dos diversos capítulos da Crónica de D. João I que o povo de
Lisboa tem um papel ativo e decisivo neste período da História de Portugal, e que Fernão Lopes
evidencia isso, mostrando a enorme consciência de comunidade deste povo, e que o desfecho
dos acontecimentos advém do empenho, da sua força defensiva e anímica e da sua motivação
coletiva, que levam esta massa de gente anónima a prevalecer sobre tanto sobre o inimigo
quanto sobre a sua própria humanidade

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