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ALFABETIZAÇÃO E ESCOLARIZAÇÃO
Introdução
1
Celina Maria Ramos Arruda Macedo
Doutora em Lingüística – PGL/CCE/UFSC
celina@ca.ufsc.br
pgl@cce.ufsc.br
viva em sociedade. No entanto, o indivíduo que não sabe ler nem escrever,
normalmente, é visto como marginalizado no sentido de não exercer plenamente a
própria cidadania (Scliar-Cabral, 2003, p.29).
Entre a linguagem oral e escrita há diferenças, como exemplo, a linguagem oral
é temporária, a linguagem escrita é permanente; a linguagem oral é mais coloquial, a
linguagem escrita requer uso de convenções ortográficas, sintáticas, semânticas e
pragmáticas. Neste sentido, todos os indivíduos, ditos normais, têm a predisposição à
linguagem oral. O mesmo não se pode afirmar em relação à linguagem escrita que,
geralmente, é aprendida na escola. É na escola que os indivíduos desenvolvem, por
exemplo, habilidades de aplicação de regras de correspondência grafêmico-fonológica,
ou seja, de decodificação do sistema alfabético. Assim, para ler e escrever, os
indivíduos devem aprender a desmembrar o continuum da cadeia da fala em seus
constituintes mínimos - os fonemas -, e relacioná-los aos grafemas - uma ou duas letras
correspondentes-. Uma das dificuldades encontradas em crianças para aprender a ler e a
escrever, no que tange à consciência fonológica, reside no fato de que os fonemas não
existem enquanto entidades separadas no continuum da fala. É por esta razão, segundo
Scliar-Cabral (2003, p.39), que a criança quando começa a escrever passa por uma fase
em que escreve vários símbolos sem espaços entre eles e, depois, por outra fase em que
é atribuído um símbolo para cada sílaba. Num estudo sobre a consciência fonológica
realizado por Scliar-Cabral, Nepomuceno, Morais e Kolinsky (1997), observou-se que
adultos analfabetos não conseguem distinguir fonemas de maneira intencional, explicita,
apesar de associarem as palavras à referência. Essa consciência fonológica só ocorrerá
se houver a internalização dos princípios do sistema alfabético, no caso do português do
Brasil.
Numa sociedade predominantemente letrada, o aprendizado da leitura e da
escrita, sem dúvida, influi no desenvolvimento cognitivo dos indivíduos.
2. Pressupostos teóricos
A escrita é um produto cultural por excelência (Tfouni, 2002, p.10) e, como tal,
ela precisa ser apreendida e o processo pelo qual essa apreensão ocorre, nos sistemas
alfabéticos, é chamado de alfabetização.
A maior parte das crianças de 5 e 6 anos de idade apresenta as capacidades
cognitivas e lingüísticas necessárias para a leitura, ou seja, conhecem um vasto
vocabulário oral; utilizam estruturas sintáticas freqüentes na língua; têm um pensamento
operacional que lhes permite analisar e sintetizar informações. No entanto, para a
habilidade de leitura, ainda não foi comprovado cientificamente se a criança pode
descobrir, por si mesma, o princípio alfabético (Morais, 1996, p.73). Ao contrário,
experimentos (Morais, Cary, Alegria e Bertelson, 1979) sugerem que é importante
ajudar a criança a associar letras a fonemas e isto ocorre por meio da alfabetização.
Desta forma, a alfabetização constitui-se em uma das importantes
preocupações da escola. Segundo Scliar-Cabral (1998, p.25), “a chamada alfabetização
não se resume à apreensão da leitura e da escrita, ela começa em muitas crianças antes
da entrada na escola e não se encerra na 1a. ou 2a. séries. A alfabetização envolve o
desenvolvimento de capacidades para compreender e produzir textos escritos sem a
presença, no primeiro caso, de quem o produziu e, no segundo, de quem o vai
ler”. Neste sentido, num primeiro momento, para apreender a língua escrita, é
necessário desenvolver nos educandos as capacidades de decodificar e codificar o
sistema alfabético. Isto é, possibilitar que o educando descubra e distinga o princípio
alfabético e o código alfabético (conjunto de correspondências fonema-grafema de uma
língua particular), analisando expressões da linguagem oral em fonemas e os associe a
letras. Num momento seguinte, o processo de alfabetização não só desenvolve no
aprendiz habilidades de identificação, compreensão e produção da escrita, mas também
favorece que ele se familiarize com diferentes tipos de textos, como por exemplo, o
informativo e o literário. Concomitantemente ao ensino progressivo da decodificação e
codificação do sistema alfabético em direção à aprendizagem de um léxico, o exercício
constante da leitura, utilizando uma sintaxe mais simples, a motivação e exemplo dos
pais e dos professores promoverão o prazer da leitura destes aprendizes.
A descrição dos objetivos a serem alcançados durante a alfabetização é mais
um requisito de controle da escolarização do que da alfabetização. Entretanto, apesar de
a alfabetização estar estreitamente ligada à escolarização, não se pode restringir o
processo de alfabetização à escolarização, tampouco a uma visão de leitura e de escrita
compreendida como codificação e decodificação de sinais gráficos. A linguagem é um
fenômeno social, estruturada de forma dinâmica e, sendo assim, a escrita também deve
ser entendida sob a perspectiva cultural e social.
Segundo Pelandré (1998), alfabetizar é mais do que ensinar os alfabetizandos a
decodificar e a codificar o sistema lingüístico: é necessário que se lhes oportunizem
experiências com diferentes gêneros discursivos e lhes propiciem o domínio da
variedade lingüística que se quer que aprendam. É preciso ensinar a língua em toda a
sua variedade de usos, partindo dos conhecimentos internalizados dos falantes para que,
conscientes de sua identidade lingüística, se disponham a observar e conhecer aquelas
variedades que não dominam.
A partir das concepções de Scliar-Cabral e Pelandré, entende-se que
alfabetização é um processo de aquisição individual de habilidades requeridas para a
leitura e a escrita.
Referências bibliográficas