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2.

CONCEITOS CONTABILÍSTICOS FUNDAMENTAIS

2.1. O PATRIMÓNIO E A DINÂMICA PATRIMONIAL


De uma forma muito simples, podemos dizer que o património de uma entidade corresponde ao conjunto dos seus bens, direitos e
obrigações. Sendo que os bens e direitos contribuem positivamente para o valor do património, enquanto as obrigações contribuem
negativamente para o valor do património.
Em resumo, sabendo o que temos (ativos), deduzido o que devemos (passivos), obtemos o valor do património ou situação líquida
(capital próprio).
Deste modo, a dinâmica patrimonial estuda as variações ocorridas no património, com a finalidade de demonstrar o impacto dos diversos
factos ocorridos na situação líquida da entidade durante um determinado período de tempo.
2.1.1. Conceito de ativo, de passivo e de capital próprio
Neste ponto abordamos os conceitos relevantes para avaliar a Posição Financeira de uma entidade.
Neste sentido, e no que diz respeito aos conceitos de ativo, de passivo e de capital próprio estes encontram-se definidos na Estrutura
Conceptual (EC) do SNC2.
A EC não é uma norma contabilística, mas sim um documento que estabelece os conceitos que estão subjacentes à preparação e
apresentação das demonstrações financeiras. Deste modo, a EC é um documento de extrema importância e de leitura obrigatória para
todos os que se interessam pela área da contabilidade.
Conceito de ativo
Voltando ao conceito de ativo, de uma forma simplista, este é muitas vezes apresentado como correspondendo ao conjunto de bens e
direitos de uma entidade. No conjunto de bens falamos dos bens materiais ou físicos com que a entidade desenvolve a sua atividade
(por exemplo: inventários, viaturas, edifícios, dinheiro entre outros). Relativamente aos direitos, enquadram-se os direitos sobre terceiros,
nomeadamente dos direitos a receber (por exemplo: direito a receber dos clientes, dos colaboradores, dos sócios, entre outros).
Contudo, para uma definição mais adequada, é importante ter presente que o parágrafo 49 da EC apresenta a definição de ativo, a qual é
um pouco mais abrangente e específica, sendo definido como:

Ativo é um recurso controlado pela entidade como resultado de acontecimentos passados e do qual se espera que fluam para
a entidade benefícios económicos futuros (BEF);

De acordo com a definição apresentada na EC para ativo, temos de ter presente o conceito de recurso controlado, ou seja, representa a
possibilidade de restringir o acesso a outros. Também temos de ter presente que o ativo é sempre resultado de acontecimentos
passados (por exemplo uma aquisição) e do qual se espera que fluam para a entidade benefícios económicos futuros (Os benefícios
económicos futuros incorporados num ativo são o potencial de contribuir, direta ou indiretamente, para o fluxo de caixa 3 e equivalentes de
caixa para a entidade).
Deste modo, percebemos que o conceito de ativo é abrangente e assenta nos três pontos identificados anteriormente, nomeadamente:
Controlo, resultado de acontecimentos passados e expectativa de gerar benefícios económicos futuros.
Conceito de passivo
Tal como referido anteriormente, de uma forma simplista, o passivo é definido como sendo o conjunto de obrigações da entidade (dívidas
a pagar). Contudo, o parágrafo 49 da EC apresenta a definição de passivo, a qual é um pouco mais abrangente e específica, sendo
definido como se segue:

Passivo é uma obrigação presente da entidade proveniente de acontecimentos passados, cuja liquidação se espera que
resulte num exfluxo de recursos da entidade que incorporem benefícios económicos

Na prática o passivo representa uma obrigação presente (e não compromissos futuros, como sejam a decisão de vir a adquirir um ativo),
da qual se espera uma saída de recurso, os quais podem ocorrer de diversas maneiras, por exemplo:

Pagamento a dinheiro;
Transferência de outros ativos;
Prestação de serviços;
Substituição dessa obrigação por outra;
Conversão da obrigação em capital próprio;
Credor abdicar ou perder os seus direitos.

Conceito de capital próprio


De parágrafo 49 da EC, o conceito de Capital Próprio é o interesse residual nos ativos da entidade depois de deduzir todos os seus
passivos.
Deste modo, se ao valor dos ativos, subtrairmos o valor dos passivos, obtemos o valor do Capital Próprio. Em boa verdade, o Capital
Próprio (Situação Líquida) corresponde à expressão numérica do valor do património.
Exemplo:
Determinada entidade tem a seguinte informação disponível:

Edifícios no valor de 160 000 €;


Viaturas no valor de 22 500 €;
Dinheiro num depósito à ordem no valor de 3 500 €;
Dívida a receber de clientes no montante de 20 000 €;
Dívidas ao Banco no montante de 95 000 €;
Dívida a diversos fornecedores no montante de 13 000 €.

Perante a informação apresentada, identifique os ativos, os passivos e o valor do capital próprio da entidade.
Resolução:
De acordo com as definições, verificamos que a entidade apresenta os seguintes ativos:

Edifícios no valor de 160 000 €;


Viaturas no valor de 22 500 €;
Dinheiro num depósito à ordem no valor de 3 500 €;
Dívida a receber de clientes no montante de 20 000 €.

De acordo com as definições, verificamos que a entidade apresenta os seguintes passivos:

Dívidas ao Banco no montante de 95 000 €;


Dívida a diversos fornecedores no montante de 13 000 €.

Para encontrarmos o valor do Capital Próprio (Situação Líquida) da Entidade, teremos então de ao valor do ativo, subtrair o valor do
Passivo, ou seja, aplicar a Equação Fundamental de Contabilidade:
Ativo = Passivo + Capital Próprio Capital Próprio = Ativo - Passivo

F
Assim, concluímos que a entidade apresenta ativos no montante de 206 000 €, passivos no montante de 108 000 € e assim o seu Capital
Próprio é de 98 000 €.
2.1.2. Conceito de rendimento, de gasto e de resultado
Neste ponto abordamos os conceitos relevantes para avaliar o desempenho (resultados) de uma entidade.
O resultado de uma entidade surge da diferença entre os rendimentos obtidos e os gastos incorridos. Assim, de uma forma simplista, os
rendimentos correspondem aos montantes que contribuem positivamente para o resultado e os gastos correspondem aos montantes
que contribuem negativamente para o resultado.
Contudo, o parágrafo 69 da EC apresenta a definição de rendimentos e gastos, a qual é um pouco mais abrangente e específica, sendo
definidos como se segue:

Rendimentos são aumentos nos benefícios económicos durante o período contabilístico na forma de influxos ou aumentos de
ativos ou diminuições de passivos quePONTO resultem em aumentos no capital próprio, que não sejam os relacionados com
as contribuições dos participantes no capital próprio; Exemplos: vendas, honorários, juros, dividendos, royalties, rendas, entre
outros.
Gastos são diminuições nos benefícios económicos durante o período contabilístico na forma de exfluxos ou deperecimentos
de ativos ou na incorrência de passivos que resultem em diminuições do capital próprio, que não sejam as relacionadas com
distribuições aos participantes no capital próprio. Exemplos: Custo das vendas, gastos com o pessoal, depreciações, entre
outros.

Assim, quando o valor dos rendimentos é superior aos gastos a entidade obtém Lucro. Por outro lado, quando a entidade incorre em mais
gastos do que rendimentos, irá obter prejuízo.
2.1.3. Receitas e Despesas vs Rendimentos e Gastos vs Recebimentos e Pagamentos
No que diz respeito aos fluxos da empresa, temos de ter presente que existem três óticas distintas:

Ótica Económica [Rendimentos/Gastos] (associada ao desempenho da entidade)


Ótica Financeira [Receita/Despesa] (associada à posição financeira da entidade)
Ótica de Caixa/Tesouraria [Recebimento/Pagamento] (associada aos fluxos de caixa da entidade)

Ótica Económica
Nesta ótica estamos perante os conceitos de rendimentos e gastos, os quais foram abordados no ponto 2.1.2 deste e-book.
Os rendimentos referem-se assim ao aumento dos benefícios económicos da atividade, por exemplo, quando ocorre a venda, o montante
corresponde ao rendimento a reconhecer.
Os gastos surgem no momento do consumo, ou seja, são a expressão monetária do consumo de meios se exploração. Por exemplo,
quando consumimos a matéria-prima para incorporar no processo produtivo.
Ótica Financeira
Nesta ótica estamos perante os conceitos de receita e despesa, os quais estão diretamente associados à posição financeira da
entidade (Ativo e Passivo).
A receita verifica-se quando nasce o direito a receber, correspondendo assim ao ativo. Por outro lado, a despesa verifica-se quando
nasce a obrigação de pagar e corresponde ao passivo.
Ótica de Caixa/Tesouraria
Nesta ótica estamos perante os conceitos de recebimento e pagamento, os quais estão diretamente associados aos fluxos de caixa.
O recebimento verifica-se quando dá entrada dos meios monetários (dinheiro ou equivalente) enquanto o pagamento se verifica quando
se dá a saída dos meios monetários.
Exemplo do conceito de despesa, pagamento e gasto:

Quando compramos um caldo de galinha incorremos na despesa, o pagamento ocorre no momento em que pagamos e o
gasto é incorrido quando chegamos a casa e o adicionamos ao cozinhado.

Exemplo do conceito de rendimento, receita e recebimento:

Quando vendemos uma mercadoria a um cliente, obtemos um aumento dos benefícios económicos durante o período, a que
chamamos rendimento. Este facto origina ainda um ativo a que chamamos receita (direito a receber). Por fim, quando o cliente
líquida a sua dívida, temos um influxo de caixa, a que chamamos recebimento.

Exemplo:
Identifique os seguintes fluxos (tesouraria, económicos e financeiros) e valores:
1. Compra de mercadorias ao Fornecedor XPTO, Lda., no montante de 1 900 €;
2. Transferência bancária para pagamento de 50% da dívida ao fornecedor XPTO, Lda.;
3. Venda a crédito de mercadorias no valor de 3 500 €, as quais estavam valorizadas em armazém em 1 500 €;
4. Aquisição de 80 € de material de escritório, tendo nessa data sido pago 25% desse montante.
Resolução:
1. Corresponde a uma despesa (dívida a pagar) no montante de 1 900 €;
2. Corresponde a um pagamento (saída de fluxos de caixa) no montante de 950 €;
3. Corresponde a um rendimento de 3 500 € (pelo valor da venda), a uma receita de 3 500 € (direito a receber do cliente) e um gasto
de 1 500 € (pelo reconhecimento do custo com a venda);
4. Corresponde a uma despesa (dívida a pagar) de 80 €, a um pagamento (saída de fluxos de caixa) de 20 € e a um gasto (consumo
do material) no montante de 80 €.
2.1.4. Factos patrimoniais e sua classificação
Entende-se por factos patrimoniais todos os eventos suscetíveis de alterar o património.
Assim, no conceito de factos patrimoniais podemos falar de factos permutativos e factos modificativos.
Consideram-se factos patrimoniais permutativos os factos que provocam uma alteração na composição do património, mas não alteram
o seu valor. Um exemplo de um facto desta natureza é por exemplo a situação de uma entidade ter um direito a receber de um cliente
(ativo), o qual se transforma em dinheiro quando o cliente líquida a sua dívida. Este facto é permutativo pois apenas altera a composição
do património (passamos de um direito a receber para um valor de dinheiro em caixa), mas não altera o valor do património (Capital
Próprio).
Consideram-se factos patrimoniais modificativos aqueles que alteram a composição e o valor do património (valor do Capital Próprio). Um
exemplo de um facto desta natureza é por exemplo a venda de mercadorias. Ao vender mercadorias por um valor superior ao seu custo
de aquisição, a entidade obtém um rendimento superior ao gasto, ou seja, o valor do seu património (Capital próprio) aumenta, ou seja, a
situação líquida sofre uma variação positiva.

2 https://www.cnc.min-financas.pt/pdf/SNC/2016/Aviso_8254_2015_29Jul_EC.pdf
3 Os fluxos de caixa são na prática os influxos (recebimento e entradas de caixa) na entidade.

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