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Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 1

SEMIOLOGIA MÉDICA I: AULA T1 (19/09/2023)


CONCEITOS BÁSICOS

Semiologia = “Semeion” (manifestação) e “Logos” (razão). Razão das manifestações, o porquê das manifestações.

alterações morfológicas ou funcionais resultantes de agressão orgânica, de origem


Doença
externa ou endógena.
Agentes etiológicos
Compreende radiações, pressão atmosférica, magnetismo terrestre, temperatura,
Cosmo
humidade do ar, vento, etc.
Enjoo do movimento. Desencadeada por estimulação excessiva do sistema vestibular ou
Cinetose por conflito entres as impressões sensoriais propriocetivas, visuais e vestibulares,
causadas pela variação do movimento e velocidade.
Trabalho exercido; Aspetos civilizacionais (do ambiente envolvente e daqueles com que é
Trabalho/Civilização
partilhado).
Fatores endógenos Inerentes, podendo ser congénitos (espécie, raça, sexo) ou adquiridos.
Pode referir intoxicações acidentais, eutanásia, vocação produtiva, medicação (produto,
Agentes químicos
dose, via de contacto, indivíduo).
Sensibilização Reações de hipersensibilidade (tipos I, II, III, IV).
Remete para patogenicidade/suscetibilidade, virulência, invasibilidade; Reação orgânica
Agentes infecciosos
celular e humoral.
Agentes parasitários Têm ação patogénica, mecânica, tóxica, espoliadora, inflamatória, infeciosa secundária.
• Sinal ou grupo de sintomas pouco específicos que pode indicar o início de doença
Pródromo
antes que sintomas específicos surjam.
Uma manifestação. Variam em vários aspetos:
• No seu modo de expressão – podem ser objetivos (uma fratura) ou subjetivos
(intensidade da dor; não são clínicos, passando despercebidos a menos que
relatados).
Sintoma
• Cronologicamente – iniciais, tardios e residuais (sequelas).
• Extensão – locais, gerais e reflexos.
• Natureza – orgânicos, funcionais, químico e físicos.
• Valor de diagnóstico – unívocos ou patognomónicos e plurívocos.
Sinal Sinal clínico = sintoma objetivo.
Sinal, enquanto sintoma unívoco (“A manifestação x é sinal da doença y”).
Síndrome Conjunto de sinais (clínicos) e sintomas, independentemente da causa, com mecanismos
fisiopatotológicos semelhantes – p.e. febre, diarreia (cada uma poderá ter várias causas,
mas manifesta-se da mesma forma).

METODOLOGIA DA EXPLORAÇÃO SEMIÓTICA – MARCHA GERAL DA EXPLORAÇÃO SEMIÓTICA

Um dos métodos que utilizamos é o interrogatório – questiona-se o tutor – em conjunto com outros métodos de
exploração semiótica, baseados nos sentidos, que podem ser diretos ou mistos (mediante a utilização ou não de
equipamentos para a recolha de informação):
• Inspeção (suporta-se na visão; misto quando usamos, p.e. um otoscópio, oftalmoscópio, lupa)
• Palpação (tato; possibilidade de uso de sondas) e Percussão (com a mão ou com recurso a martelo e plexímetro)
• Auscultação (audição; possibilidade de uso de estetoscópio, fonendoscópio e sistemas eletrónicos
amplificadores)
• Olfação (suporta-se no olfato; o único que não pode ser misto)

Em suma, a marcha geral da exploração semiótica é um procedimento de recolha de sintomas.

01. HISTÓRIA PREGRESSA/ANAMNESE


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• Doenças anteriores e imunizações


• Início e duração da afeção
• Carácter individual ou generalizado
• Condições de vida ou maneio
• Alimentação e apetite
• Respiração, defecação e micção
• Tratamentos ensaiados

02. EXAME CLÍNICO


• Exame do estado geral
• Exames especiais dos aparelhos e sistemas

02.1. EXAME DO ESTADO GERAL

1 – Identificação: espécie, raça, idade, sexo

2 – Exame do hábito externo:

└ Pele e faneras
✓ Cor, integridade, brilho e queda de pelo ou penas
✓ Cheiro
✓ Humidade (hiperidrose, anidrose, seborreia, esteatose, hematidrose)
✓ Espessura
✓ Aumentos de volume (edemas, hematomas, neoplasias, enfisemas, pápulas, nódulos, vesículas, pústulas, escamas,
crostas).
✓ Perdas de substância (feridas, ulcerações, fístulas, necrose, cicatriz)
✓ Elasticidade (permite aferir sobre o grau de desidratação – tempo de retração da prega cutânea – porém não é
totalmente objetivo, uma vez que varia consoante a idade e condição corporal do animal).
✓ Temperatura
✓ Se tem prurido
✓ Unhas, cascos e cornos
└ Mucosas
✓ Cor e tonalidade (um tom mais azulado indica cianose; amarelo indica icterícia)
✓ Secreções
✓ Integridade
✓ Cheiro (aplica-se à mucosa oral – p.e. cheiro a acetona, a ureia; halitose)
└ Linfonodos e vasos linfáticos (avaliam-se os linfonodos palpáveis)
✓ Submandibulares, retrofaríngeos laterais, pré-escapulares, inguinais superficiais e poplíteos
✓ Perceber se tem alterações como adenite ou linfangite
A dilatação ou hipertrofia
anormal dos linfonodos
ocorre na maioria dos
processos inflamatórios e
infeciosos, bem como
processos neoplásicos.

De notar que as alterações


que ocorrem a este nível no
sistema linfático permitem
identificar o órgão ou a
região que está acometida.
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NOTA: os linfonodos, ao serem palpados, devem ser avaliados consoante: volume, consistência, temperatura, mobilidade
e regularidade da superfície, sempre bilateralmente.

3 – Constantes vitais
└ Temperatura interna
└ Pulso arterial e frequência respiratória
✓ A frequência respiratória pode ser determinada por observação (durante 15s x4).
✓ Tipo respiratório costoabdominal: há distensão do tórax porque os pulmões aumentam de volume, e também do
abdómen, com a movimentação do diafragma.
✓ Sons pulmonares mais craniais são de origem brônquica.
✓ Sons pulmonares mais caudais são de origem alveolar (murmúrio vesicular).
✓ Sopro laringotraqueal: corresponde ao ar a passar na traqueia e laringe, ouve-se bem.
✓ O pulso arterial pode ser determinado por auscultação (durante 15s x4) ou ao tato, sentindo-se o choque pós-prandial,
nas artérias femorais; em cavalos, na transversa da face ou digital palmar; em bovinos, na coccígea.

4 – Exame geral do tórax e abdómen


└ Uma das abordagens é através da percussão em diferentes regiões – 3 sons principais:
✓ Som claro (tórax)
✓ Som timpânico (abdómen)
✓ Som maciço (músculos, ossos)

02.2. EXAMES ESPECIAIS DOS APARELHOS OU SISTEMAS

02.3. EXAMES COMPLEMENTARES

1 – Hematológicos, bioquímicos, histológicos, anatomopatológicos, parasitológicos, microbiológicos, sorológicos.

2 – Imagiológicos (rX, ecografia, TAC, ressonância magnética)

3 – Eletrocardiografia

4 – Provas funcionais (digestivas, metabólicas, de excreção, de esforço)

03. NECRÓPSIA
Quando já em post mortem.

Tudo isto serve para que, posteriormente, se possa alcançar um diagnóstico:

DIAGNÓSTICO

Pode ser atribuído in vitam:


• Colheita de elementos – clínico, laboratorial e misto.
• Elementos do diagnóstico – completo (sintomático, causal, fisiopatológico e anatómico), ou incompleto.
• Método – Direto/intuitivo; Comparativo/dedutivo; Por exclusão.
• Positivo, hipotético e reservado.

Ou post mortem:
• Necrópsico – anatomopatológico
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• Microscópico – histopatológico Pode acontecer que se cumpram todos os passos da marcha semiótica e
• Toxicológico acabar por não se chegar a um diagnóstico completo – fizemos todos os
• Microbiológico exames possíveis e não conseguimos encontrar a etiologia de, p.e., uma
• Misto insuficiência renal; chamamos a isso um processo de caráter idiopático.

PROGNÓSTICO

Consiste na previsão da evolução da doença e das suas prováveis consequências. É orientado a partir de três aspetos:
• Perspetiva de salvar a vida do paciente;
• Perspetiva de recuperar a saúde ou de curá-lo;
• Perspetiva de manter a capacidade funcional dos órgãos acometidos.

Fatores a observar: evolução da afeção, meio ambiente, terapêutica, o próprio indivíduo.


Quad vitam – quanto à vida; pode ser benigno, grave, reservado e fatal.
Quad functionem – quanto à função.

Indicações clínicas:
• Natureza da afeção e individuo;
• Meios: higiénicos, dietéticos, farmacológicos, cirúrgicos;
• Finalidade: etiológica, sintomática, profilática, confirmadora, económica, eutanásia (o termo implica interesse
para o animal, enquanto “abate” só tem interesse para quem manda abater e o animal não beneficia disso).

AULA T2 – TERMOMETRIA CLÍNICA

Avaliaremos, clinicamente, a evolução da temperatura.

Animais homeotérmicos – com capacidade de regulação térmica, independentemente (ou quase) da temperatura do
meio externo.
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LEGENDA:

Ativação do centro simpático do calor → ativam-se mecanismos de produção de calor, por exemplo, vasoconstrição
periférica, tremores, etc → produção de calor.

Ativação do centro parassimpático do frio → ativam-se mecanismos parassimpáticos de vasodilatação e metabolismo


basal → perda de calor.

Músculos esqueléticos – contração e relaxamento.


Fígado – glicogenólise.
Vasos sanguíneos – vasoconstrição e vasodilatação.
Aparelho respiratório – hiperventilação para perda de calor (sobretudo em espécies sem mecanismo de sudorese),
Glândulas sudoríparas – sudorese (+ eficiente que a hiperventilação).

TEMPERATURA RETAL FISIOLÓGICA:


Equinos 37 – 38,5 oC
Bovinos 38,5 – 39/40 oC
Ovinos 38,5 – 39/40 oC
Caprinos 38,5 – 40,5/41 oC
Suínos 38/39 – 38,5/41 oC
Cães 38 – 39 oC
Gatos 38 – 39,5 oC
Coelhos 38,5 – 39,5 oC
Aves 39,5 – 44 oC

NOTA: a amplitude destes intervalos significa que o metabolismo funciona, de forma eficiente, entre os valores referidos.

Variações fisiológicas mediante…


• Hora do dia
• Ingestão de alimentos (poderá estar aumentada em até 1oC após a ingestão, devido ao aumento da atividade
metabólica e enzimática).
• Idade
• Sexo (associado a alterações endócrinas).
• Raça
• Estado de nutrição (animais subnutridos tendem a apresentar temperaturas mais baixas).
• Gestação
• Parto
• Temperatura ambiente
• Exercício físico (o aumento da taxa metabólica tem como consequência o aumento da temperatura).

SÍNDROME FEBRE:

Registo de temperatura:
➢ Exacerbações vesperais
➢ Remissões matinais
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Existem causas variáveis para a febre, exógenas ou endógenas.


Toxicidade (intoxicação por pirogénicos do centro termorregulador).
Disfunção termorreguladora – devido a microrganismos, toxinas e/ou metabolitos. Gera-se uma redefinição do intervalo
térmico ideal pelo sistema termorregulador.
Há uma elevação térmica, elevação catabólica (glucídica, lipídica e/ou proteica).
Até certo ponto, isto faz com que haja um aumento da capacidade funcional/reatividade (temperaturas ótimas).
Hipertermia + (…) = Febre

PATOGENIA:
Febres asséticas: insolação, desidratação, hipertiroidismo, nervosas, inflamação, intoxicações.
Febres séticas/infeciosas: agentes pirogénicos.

PROCESSO FISIOPATOLÓGICO DA FEBRE:

1º Há uma reação adrenérgica (mecanismo simpático):


• Vasoconstrição
• Arrepios
• Palidez
└ O hipotálamo transmite a informação de que a temperatura do organismo é inferior à que deveria, iniciando-se
processos de produção de calor metabólico (tremores p.e.).

2º Reação colinérgica:
• Oligúria (diminuição da diurese)
• Hemoconcentração (eliminação de água por hiperventilação/sudação, retenção de sódio e cloro).

SINTOMATOLOGIA GERAL:

• Mal-estar
• Astenia
• Anorexia Sintomatologia geral
• Arrepios
• Hiperidrose
• Náusea
• Vómito Sintomatologia
• Coprostase (devido a desidratação) digestiva
• Dispepsia
• Taquipneia/Dispneia (hiperventilação para perda de calor e acrescer o aporte de oxigénio)
• Alterações da frequência e ritmo cardíacos
• Alteração dos sons cardíacos Sintomatologia
• Sopros circulatória
• Pulso
• Apatia
• Cefaleias Sintomatologia nervosa
• Alucinações
• Diminuição da diurese
• Albuminúria (devido a alteração da permeabilidade glomerular)
Parâmetros urinários
• Creatinúria (+ produção e também devido a + concentração da urina)
• Hiperazotúria
• Cilindrúria (solutos precipitam dentro dos tubos contornados, matriz de precipitação com base proteica forma
um molde interior dos tubos contornados, podendo acabar por sair na urina)
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• Hemoconcentração
o Aumento do hematócrito, das proteínas totais e do azoto não proteico
• Hemólise e alterações leucocitárias A nível humoral
• ↓ Relação albumina/globulina
• ↑ Fibrinogénio
• ↑ VS
• ↑ Metabolismo basal Sintomatologia
• ↑ Glicogenólise metabólica
• ↑ Catabolismo proteico

INTENSIDADE DA FEBRE:

Febrícula = aumento de até 0,5 oC acima do limite fisiológico.


Medianamente intensa ou moderada = 0,5-1,5oC acima do limite.
Alta = 1,5 a 2,5 oC acima do limite.
Muito alta ou hiperpirética = mais de 2,5oC acima do limite (geralmente com duração mais prolongada, e não em picos).

EVOLUÇÃO DA FEBRE:

1. Fase de ascensão (correspondente à fase adrenérgica)


2. Período anfíbolo, de estado ou fastígio (é o que confere a designação do caráter agudo, subagudo ou crónico)
3. Fase de declínio (em crise, quando é uma descida de temperatura muito rápida, ou em lise, mais lenta)

TIPOS DE FEBRE:

Contínua = mantém-se sempre acima do limite fisiológico, com oscilações diárias abaixo de 1oC.
Remitente = oscilações diárias superiores a 1oC, sem que a temperatura atinja o limite fisiológico.
Intermitente = há uma alternância diária de períodos febris com períodos de apirexia.
Recorrente = alternância de períodos febris de vários dias, com períodos de apirexia.
Atípica = não é caracterizada por nenhum dos tipos anteriores.
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GOLPE DE CALOR

Acontece quando a perda de calor não consegue superar o estímulo externo que o gera (p.e. quando um cão fica
fechado no interior de um carro, num dia quente), podendo haver uma combinação da diminuição da dissipação com
aumento da produção de calor.

Caracterizado por um estado de hipertremia extrema: > 41-43oC.

Se as temperaturas forem superiores a 43oC, pode resultar em lesões generalizadas.

Resposta orgânica:
• Coagulação – lesão endotelial e consequente trombocitopenia e CID
– surgimento de petéquias e equimoses
• Cardiovascular – vasodilatação periférica
– hipotensão/hipovolemia/hipoperfusão
– colapso cardiovascular
• Renal/hepática/gastrointestinal – lesões de origem térmica e de hipoperfusão

HIPOTERMIA

Acontece quando há uma produção de calor insuficiente (seja por diminuição do aporte nutritivo, ou insuficiência de
órgãos produtores) para a perda excessiva que se verifica.
NOTA: o termo “hipotermia de convalescença” não refere uma verdadeira hipotermia, mas sim a uma evolução em sentido
hipotérmico, após um processo febril, enquanto a temperatura corporal desce até atingir o valor normal.

A síndrome hipotermia pode derivar de várias causas, entre elas:


• Hemorragias
• Neurogénica
• Intoxicações
• Colapso cardíaco ou vasomotor (que, por si só, leva a hipotensão, cianose, arrefecimento periférico, sudação fria,
dissociação termoesfigmométrica, relaxamento muscular e hipotermia).
Dissociação termoesfigmométrica
Resposta orgânica: tem um mau prognóstico (cruz da
morte):
• Comportamental/neuromuscular
• Cardiovascular – vasoconstrição e taquicardia (casos de hipotermia ligeira) Quando a temperatura desce e a
frequência cardíaca sobe (hipotermia
– vasodilatação e bradicardia (hipotermia moderada a severa) e taquicardia).
– diminuição da sensibilidade à norepinefrina
Subida de temperatura e descida da
– hipovolémia por efeito diurético do frio FC é raro (processos cardiovasculares
• Respiratória – diminuição de CO2 com depressão respiratória ou toma de alguma medicação).

• Hepática e gastrointestinal – diminuição do metabolismo hepático


– ileus
– ulceração/perfuração gástrica
• Renal – diurese fria antes da diminuição da temperatura central
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AULAS T3 e T4: SEMIOLOGIA DO APARELHO DIGESTIVO

Para estudar a semiologia do aparelho digestivo, há que compreender a sua múltipla funcionalidade: motora, secretora
e absortiva, além da sua inter-relação com o aparelho circulatório e o sistema nervoso autónomo.

Particularidades da importância semiótica ao nível do sistema digestivo, mediante as espécies em questão – o que para
um animal é normal ingerir, para outro pode resultar num transtorno alimentar – considerar as diferenças entre diversos
animais: ruminantes, equídeos, roedores, carnívoros.

• Erros alimentares – p.e. não vai ser dada a uma vaca em período seco, uma ração altamente energética.
• Regime de exploração – p.e. rações de cria, recria e engorda.
• Via de administração de fármacos – p.e. pode dar-se um antibiótico por via oral a um vitelo, mas não a um
bovino adulto (disbiose ruminal → problema digestivo).
• Parasitismo – parasitas intestinais, com ação espoliadora ou podendo mesmo causar transtornos mecânicos.

1. Gatos têm um aparelho digestivo muito simples, seguidos (em nível de complexidade) pelos cães.
2. Os equinos e coelhos, apesar de herbívoros, não têm a eficiência alimentar de um bovino; realizam a
fermentação alimentar ao nível do ceco e do intestino grosso.
3. No limite máximo do aproveitamento de matéria de origem não-animal, temos os bovinos.
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Alimentos → Digestão → Absorvíveis


(macromoléculas e componentes insolúveis) (baixo peso molecular, solubilizados)

Para que isto aconteça, o processo de digestão conta com processos físicos e processos químicos:
Vão permitir uma maior eficiência dos processos químicos:
Fenómenos físicos Mastigação, peristaltismo.
Regurgitação, ruminação.

Conta com a ação de proteínases, lípases.


Fenómenos químicos Glucosidase bacteriana – ruminal; cecal
E ainda amílases e polipeptidases.

BREVE REVISÃO ANATOMOFISIOLÓGICA – digestão, digestão intestinal, defecação ––––––––––––––––––––––––––––––

➔ DIGESTÃO NOS MONOGÁSTRICOS


1. Fase cefálica – antes de o alimento chegar ao estômago. Estímulos nomeadamente a nível psicológico e do
paladar fazem iniciar a secreção gástrica.
2. Fase gástrica – presença do alimento parcialmente digerido no estômago estimula a secreção de gastrina,
que por sua vez estimula a secreção enzimática e de HCl.
3. Fase intestinal – começa com a chegada do quimo ao duodeno.

➔ DIGESTÃO NOS POLIGÁSTRICOS


A existência de compartimentos gástricos permite o aproveitamento de alimentos ricos em celulose.
Microflora e microfauna (alterações ao seu equilíbrio poderão constituir problemas do foro digestivo).
Aproveitamento seletivo.
Ruminação (saliva neutralizante dos ácidos gordos voláteis).
Existem variações fisiológicas relativas à digestão, mediante a espécie, raça, idade, alimentação do animal e
condições de exploração.

➔ DIGESTÃO NAS AVES


Particularidades: bico, papo, proventrículo, moela, cecos pilóricos.
Importância do suco pancreático.
Têm dois cecos pilóricos, porém um intestino grosso muito pouco desenvolvido (devido à capacidade de voo).

DIGESTÃO INTESTINAL
Ação física Peristaltismo
• Glucosidases
Suco entérico
• Enteroquinase
• Proteases (ativ. p/ enteroquínases)
• Lipase
Suco pancreático • Amilase
• Estimulação pancreática reflexa (bucal e gástrica)
• Humoral (secretina e pancreozimina-colecistoquinina)
Ação química • Atividade lípase pancreática
• Aceleração da atividade amílase pancreática
• Emulsão de gorduras
• Solubilização de ácidos gordos de cadeia comprida
Bílis • Absorção de vitaminas lipossolúveis
• Estabilização das emulsões intestinais
• Oferta de bases (boas reações intestinais)
• Ação antissética
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➔ INTESTINO GROSSO DE CARNÍVOROS


Dá-se o termo dos fenómenos anteriormente descritos.
Reabsorção de água.
Atividade bacteriana da flora intestinal: síntese vitamínica e degradação proteolítica*.
* As bactérias proteolíticas atuam degradando proteína em amónia (que posteriormente virá a ser transformada em ureia);
por esse motivo, animais com insuficiências renais e hepáticas não deverão ter dietas com excesso de proteína.

➔ INTESTINO GROSSO DE EQUÍDEOS


Ocorre a fermentação, formando ácido acético, butírico e propiónico – se a alimentação for mais rica em feno e
alimento concentrado, isto é, mais rica em amido, irá produzir-se maior proporção de ácido propiónico e
butírico; pelo contrário, uma maior ingestão de palha resultará em maior produção de ácido acético.
Degradação de celulose.
Proteólise e proteossíntese.
Síntese vitamínica.

➔ INTESTINO GROSSO DE SUÍNOS


Digestibilidade da fibra bruta variável com a dieta.

➔ INTESTINO GROSSO DE AVES


Degradação bacteriana nos cecos pilóricos.
O intestino grosso não apresenta grande desenvolvimento, já que o acúmulo de matéria no seu interior
implicaria dificuldades em voar.

DEFECAÇÃO – visão geral:

REFLEXO DA DEFECAÇÃO
Fezes no reto

Dilatação retal

Estímulo de centros da defecação (medula sagrada e pavimento do 4º ventrículo)

Nervo pélvico

DEFECAÇÃO:
Relaxamento do esfíncter;
Contração longitudinal do cólon;
Contração da musculatura abdominal.

ALTERAÇÕES DO APETITE E DA SEDE:


É de compreender que podem existir alterações do foro fisiológico ou patológico, isto é:

VARIAÇÕES FISIOLÓGICAS
NOTA: O stress (de carater
Mediante aspetos como a espécie, raça, idade, indivíduo, ambiente, etc. predominantemente simpático)
VARIAÇÕES PATOLÓGICAS DO APETITE prejudica o processo digestivo
(parassimpático).
Aumento do apetite: bulimia ou polifagia.
Diminuição: hiporexia, anorexia ou inaptência.
Perversão: parorrexia ou alotriofagia – apetência por alimentos não fisiológicos, p.e. um cão que come madeira.
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Picacismo, pterofagismo, pilofagismo, coprofagismo, geofagismo (fisiológico em algumas espécies, como os


suínos, que podem necessitar de ser suplementados em ferro caso não tenham acesso ao solo), xilofagismo.
Taquifagia: comer muito depressa.
Sitiofobia: aversão (medo) aos alimentos.

VARIAÇÕES PATOLÓGICAS DA SEDE

Aumento: Polidipsia
Diminuição ou ausência completa: Adipsia
Perversão: apetência por bebidas não fisiológicas.
Hidrofobia

ALTERAÇÕES NA PREENSÃO DOS ALIMENTOS OU DO ABEBERAMENTO

Lesões musculares dos lábios e/ou língua.


Alterações nervosas (centrais ou periféricas) motoras ou sensitivas.
Anomalias dentárias.
Processos inflamatórios/dolorosos da mucosa bucal.
Presença de corpo estranho.
Fraturas ou luxações (p.e. da articulação temporomandibular).

ALTERAÇÕES AO NÍVEL DA MASTIGAÇÃO E DA INSALIVAÇÃO

Mastigação – influenciada pela dor, pela integridade muscular, etc.

Insalivação – alterações no volume mediante a espécie, tipo de alimento e respetivo conteúdo de água; e alterações no
controlo da produção, por estímulos mecânicos e sensoriais.

Ptialismo ou hipersialia: excesso de produção de saliva, pode levar à ocorrência de sialorreia (saliva a escorrer
da boca). Causado, p.e., por processos bucais e faríngicos (inflamatórios), gastropatias sobretudo secretoras, e
administração de fármacos.

Aptialismo ou assilia: produção deficiente de saliva. Associado a situações de desidratação, choque, cólicas,
fármacos.

ALTERAÇÕES AO NÍVEL DA DEGLUTIÇÃO

Disfagia ou disfagismo: dificuldade em deglutir, devido a algum distúrbio Fases da deglutição:


motor ou lesão anatómica local. As eventuais causas são inflamatórias,
compressivas, dolorosas, nervosas, musculares, osteoarticulares (fraturas 1. Orofaríngica
e luxações), corpos estranhos. 2. Esofágica
3. Gastroesofágica
1. Disfagismo oral e orofaríngico – dificuldade no transporte da
ingesta durante a formação do bolo alimentar; os nervos (Qualquer afeção nestas fases provocará
cranianos envolvidos são o V (trigémio), VII (facial) e XII disfagismo, isto é, dificuldade em deglutir).
(hipoglosso).

2. Disfagismo faríngico – interrupção do transporte do bolo a partir da orofaringe com disfunção da parte
involuntária do reflexo de deglutição; os nervos cranianos envolvidos são o V, VII, X (vago) e IX (glossofaríngeo).

3. Disfagismo faringoesofágico – falha na chegada do bolo alimentar ao esófago através do esfíncter esofágico
proximal; nervos cranianos IX e X.

Sintomas de disfagismo oral:


• Incapacidade de preensão de alimentos sólidos ou água;
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• Sialorreia;
• Diminuição ou ausência do reflexo de deglutição;
• Movimentos exagerados da cabeça;
• Queda de alimento da boca;
• Melhoria com a elevação da cabeça (sobretudo se se tratar de um disfagismo relativo, não tanto absoluto);
• Sem diferença apreciável entre sólidos e água.

Sintomas de disfagismo faríngico:


• Tosse;
• Repetidas e mal sucedidas tentativas de deglutição;
• Diminuição do reflexo de deglutição;
• Pneumonia por falso trajeto;
• Descarga nasal;
• Maior dificuldade relativamente a sólidos, do que líquidos.

A nível esofágico ou gastroesofágico:


• Poderemos deparar-nos com situações de disfagismo relativo: havendo facilidade em deglutir alimentos
pastosos a líquidos, mas não sólidos, devido ao comprometimento do peristaltismo.

Diagnóstico complementar de disfagismo – radiologia com contraste:

Disfagismo oral – dificuldade na formação do bolo alimentar; na base


da língua.

Disfagismo faríngico – aumento de volume de ar na faringe e


pneumonia por aspiração (pode acabar por sair pelas narinas).

Disfagismo faringoesofágico – incompleta deglutição do bolo formado


pelo meio de contraste baritado.

Poderão observar-se alterações ao nível de uma contração fraca ou


anormal da área faríngica; múltiplas tentativas de deglutição, porém
permanecendo o meio de contraste baritado retido na faringe;
músculos cricofaríngeos a funcionar normalmente. Aquando da
retenção do bário, continua a ser impossível diferencial um problema
Disfagismo ao nível do esófago proximal
faríngico de um problema esofágico proximal. (faringoesofágico). Meio de contraste bárico.
Outro meio de diagnóstico importante será a endoscopia (pode até permitir, p.e., realização de biópsia, remoção
de corpo estranho).

ALTERAÇÕES DA MOTRICIDADE DO ESÓFAGO

Espasmo do esófago ou esofagismo


Paralisia do esófago
Megaesófago – felinos são particularmente predispostos.

OUTRAS ALTERAÇÕES DIGESTIVAS A TER EM CONTA

• Eructação – fisiológica, desde que não seja excessiva. Gás pode formar-se devido a hipomotilidade gástrica,
hipocolidria.
• Regurgitação – fisiológica ou patológica.
• Pirose – “azia”.
• Náusea
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• Vómito

VÓMITO VS. REGURGITAÇÃO (É necessário diferenciar)


REGURGITAÇÃO VÓMITO
Associada a situações fisiológicas ou patológicas; O vómito é um processo ativo, com náusea e hipersialia,
Importante sintoma de patologia esofágica; esforço e contração abdominal imediatamente antes da
A ingesta move-se pelo esófago, para a boca; expulsão de alimento do estômago;
Pode ocorrer imediatamente ou horas após a ingestão; Apresenta pH baixo, pode ser biliar e conter alimento
Alimento frequentemente mal digerido, coberto de muco, mais ou menos digerido.
de forma cilíndrica, pH próximo do neutro, isento de bilis.

O estômago pode ter alteração da motilidade e da secreção, ambos prejudiciais.

Fisiopatologia do VÓMITO:

Trata de um mecanismo reflexo, com ação do centro do vómito na formação reticular bulbar e zona
quimiorrecetora no pavimento do 4º ventrículo.

Vias aferentes: nervos vago, trigémeo e glossofaríngeo.

Vias eferentes: nervo vago, frénico e espinhal. Desencadeiam ação de inspiração, encerramento da glote,
contração da região pilórica e piloro, relaxamento cárdico e esofágico, contração abdominal.

Possíveis causas de vómito:


• Nutricionais
• Administração de certos fármacos
• Toxinas
• Alterações metabólicas
• Patologia gástrica
• Patologia da junção gastroesofágica
• Patologias abdominais
• Patologia do intestino delgado
• Patologia do intestino grosso
• Patologia neurológica
• Patologias inflamatórias
• Patologias infeciosas

Classificação:
• Pode ser considerado agudo ou crónico,
• Precoce ou tardio,
• Classificado ainda mediante o conteúdo,
• E expulsão.

PLANO DE DIAGNÓSTICO – aspetos a ter em conta aquando de um quadro de emese:

É importante considerar a apresentação (cor, consistência, etc) do vómito, bem como o facto de ser agudo ou crónico; a
frequência dos episódios e o quadro sintomatológico envolvente (não só gastrointestinal, mas também geral). Outros
aspetos ainda, que residem em meios de diagnóstico complementares: hematologia e bioquímica, raio-X, ecografia para
perceber alguma lesão ou alteração que possa estar na origem do vómito, podendo também ser considerada a realização
de laparotomia exploratória e endoscopia.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 15

ALTERAÇÕES DA MOTILIDADE GÁSTRICA:

Hiperquinésia gástrica – excesso de motilidade.

Hipoquinésia gástrica – principalmente quando aliada a uma hipocloridia, surge grande dificuldade em digerir o
alimento, acabando por haver acumulação no interior do estômago podendo o animal chegar a desenvolver uma
gastrectasia caso aconteça repetidamente ao longo do tempo.

GASTRECTASIA – dilatação gástrica; pode ocorrer devido a um obstáculo ao trânsito digestivo (seja estenose do piloro,
espasmo, retração cicatricial, neoplasia ou compressão) ou devido a parésia muscular (geral – simpaticotonia ou ação
parassimpática deficiente; local – por gastrites, neoplasias, úlceras; sobrecarga alimentar com distensão).

Tem como sintomas (atenção, plurívocos, idênticos aos de dispepsia hipoclorídrica): mau hálito, devido à fermentação
do alimento acumulado no estômago, digestões lentas, vómitos (por vezes tardios), diarreia (devido a má absorção),
cólicas pós-prandiais e dispneia.

ALTERAÇÕES DA SECREÇÃO GÁSTRICA (GASTROPATIAS SECRETORAS – DISPEPSIAS)

Podem ser classificadas mediante a presença de substrato lesional:


• Com substrato lesional.
• Sem substrato lesional.

Ainda, como primárias ou secundárias:


• Primárias – devido a erros de maneio alimentar (dietéticos), falta de higiene alimentar. Polifagia ou taquifagia.
• Secundárias – alteração das condições nervosas, circulatórias, glandulares ou motoras, originando desequilíbrio
funcional (causas tóxicas, nervosas, mecânicas).

Ou como agudas ou crónicas:


• Agudas.
• Crónicas.

A sintomatologia é, possivelmente, comum a outras afeções digestivas:


• Eructação excessiva;
• Regurgitação;
• Náusea;
• Vómito.

01. DISPEPSIAS HIPERCLORÍDRICAS

Sintomatologia associada a um aumento de motilidade; o apetite poderá estar normal ou aumentado; hipersialia;
polidipsia; vómitos ácidos (devido à quantidade de ácido clorídrico); constipação; dor; urina alcalina.

02. DISPEPSIAS HIPOCLORÍDRICAS

Sintomatologia: anorexia, atonia gástrica, vómito tardio de alimentos não diferidos, fermentações anormais,
meteorismo, diarreia, anemia, halitose (derivada da fermentação de alimento não digerido no estômago) e boca seca.

GASTROPATIAS MISTAS

Indigestões: têm uma componente secretora (interrupção da quimificação) e


motora (parésia), estando este equilíbrio comprometido → embaraço gástrico
(dificuldade da digestão que, se não se resolver, conduz à indigestão).
Falta de higiene
alimentar
Erros dietéticos
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 16

GASTRENTERORRAGIAS

Primárias – a causa está no órgão;


Secundárias – secundária a outra patologia;

Clinicamente, a perda de sangue pode ser:


• Abundante ou escassa;
• Rápida ou lenta;
• Anterior (cranial) ou posterior (caudal);
• Hematemese – perda pelo vómito;
• Hematoquésia (sangue vivo com origem no intestino grosso ou reto, para ser do intestino delgado terá de ser
muito abundante);
• Melena – perda de sangue (digerido, proveniente do trato digestivo anterior) pelas fezes;
• Sangue oculto.

NOTA: prova da benzidina para deteção de sangue.

01. GASTRORRAGIAS

Possíveis causas:
• Gastrite;
• Parasitismo;
• Ulcerações;
• Traumatismos – p.e. ingestão de corpos estranhos (ossos!);
• Estados hemorragíparos – estados que predispõem a hemorragia.
• Esplenopatias;
• Patologia duodenal.

02. ENTERORRAGIAS

Causas:
• Circulatórias
o Estases;
o Torções;
o Tromboses;
• Irritativas:
o Mecânicas;
o Químicas;
o Medicamentosas;
• Tóxicas: exógenas ou endógenas;
• Défices de oligoelementos e vitaminas (C e K);
• Infeciosas;
• Parasitárias.

METEORISMO OU TIMPANISMO

Acumulação anormal de gases no estômago, intestino delgado, ceco e/ou cólon; pode estar relacionada com uma
produção anormal de gases ou com dificuldade de evacuação.

Sintomas:
• Distensão do órgão;
• Aumento do perímetro abdominal;
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 17

• Assimetria abdominal;
• Dispneia;
• Taquicardia;
• Atraso nas defecações;
• Cólicas;
• Morte (em casos extremos – por asfixia, colapso cardíaco ou rotura do órgão).

Causas de meteorismo primário:


• Aerofagia;
• Taquifagia;
• Alterações digestivas;
• Antibioterapia;
• Dificuldade de absorção plasmática de gases;
• Hipertensão portal;
• Desequilíbrios eletrolíticos.

Causas de meteorismo secundário:


• Alterações topográficas;
• Dificuldades de trânsito.

GASTROPATIAS SENSITIVAS (FUNCIONAIS)

Dor gástrica – GASTRALGIA.


Cólicas “da fome”.
Irritação de terminações nervosas gástricas (causas inflamatórias).

ENTEROPATIAS FUNCIONAIS

Causas:
• Alteração da motilidade ou da secreção intestinal;
• Alterações gástricas;
• Alterações hepáticas;
• Alterações pancreáticas;
• Alterações nervosas;
• Alterações circulatórias;
• Alterações da flora intestinal;
• Alterações de absorção;
• Parasitismo.

INDIGESTÕES INTESTINAIS

01. INDIGESTÃO INTESTINAL GASOSA (FLATULÊNCIA)

Causas: Paragem do processo digestivo com excessiva acumulação de gases. Nos ruminantes é raro. Nos carnívoros se
tiverem uma alimentação rica em fibra, porque esta é facilmente fermentescível. Também ocorre em equídeos e em
omnívoros.

02. INDIGESTÃO POR SOBRECARGA

Causas: Paragem do transito intestinal + presença de alimentos de baixa digestibilidade (importância particular nos
equídeos).
Pelota estercoral.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 18

SÍNDROMES DIGESTIVAS

DIARREIA

Caracterizada pelo aumento da frequência e diminuição da consistência das defecações.

Pode der causas funcionais alimentares, secretoras, medicamentosas, nervosas ou ao nível de uma absorção deficiente;
por outro lado, também pode ter causas orgânicas como enterites agudas e crónicas.

• Diarreia serosa;
• Diarreia mucopurulenta;
• Esteatorreia;
• Falsa diarreia;
• Disenteria;
• Diarreia esporádica.

COPROSTASE

Caracterizada pela diminuição da frequência das defecações e aumento da sua consistência.

Causas orgânicas ou funcionais, que podem estar relacionadas com o próprio conteúdo intestinal (ingestão p.e. de
ossos), lesões da parede intestinal, oclusão intestinal, alterações nervosas, causas humorais ou causas medicamentosas.

• Estercorémia.
• Enterotoxémia.

ENTEROPATIAS OCLUSIVAS (OCLUSÃO/OBSTRUÇÃO)

Têm como sintomas: copróstase, cólicas, autointoxicação e síndrome humoral (alterações do equilíbrio hidroeletrolítico).

T5 – EXAME DE ESTADO GERAL E APARELHO DIGESTIVO DE EQUINOS

Pode ser pedido um exame físico de um equino sem que haja necessariamente uma queixa principal, uma espécie de
check-up; acontece frequentemente pré-venda.

Primeiro de tudo, é importante perceber a HISTÓRIA CLÍNICA do animal a examinar.

O seu AMBIENTE – o tipo de exploração e respetivo funcionamento:

• Se estão estabulados (boxe, baia, paddock),


• A campo,
• Exploração fechada ou aberta – se há entrada e saída de animais novos,
• Centro hípico,
• Se é uma exploração de reprodutores.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 19

Onde os animais estão hospedados (estabulados):


• A respetiva ventilação, temperatura, humidade e higiene da exploração.
• As camas – material, higiene (frequência com que são mudadas?)
• Tipo de terreno (se a campo).

Ao nível da ALIMENTAÇÃO:

• Tipo e frequência.
• Existe sempre alimento disponível?
• Onde e como são distribuídos o alimento e a água?

Doenças que possam existir na exploração.

Profilaxia médica e sanitária (p.e. desparasitações que são feitas, dentisteria).

HISTÓRIA DO ANIMAL:

• Identificação
• Idade
• Sexo (e se é inteiro ou castrado)
• Raça
• Aptidão
• Vacinações/desparasitações/ferração
• Vícios (p.e. aerofagia)
• Doenças (p.e. cólicas, claudicação)

QUEIXA CLÍNICA & HISTÓRIA CLÍNICA DA DOENÇA ATUAL:

• Qual a duração?
• Quais os sinais clínicos?
• Qual a evolução dos sinais clínicos?
• Qual o tratamento e resposta? – o facto de um cavalo estar medicado altera muitas manifestações, é importante
ter isso em conta quando se faz a avaliação.
• Existem mais animais afetados?
• Outras doenças?

DEVEREI FAZER EXAME DE TODOS OS APARELHOS?


Saber discernir se trata de um exame mais extenso, que requer todos os aparelhos, ou se há uma queixa principal e é
necessário atuar rapidamente.

EXAME FÍSICO

EXAME À DISTÂNCIA:

Passa pela observação. É importante perceber que o simples facto de alguém estar presente no espaço do animal poderá
fazer com que este mude o seu comportamento, pelo que o exame deverá começar por uma observação, com calma, à
distância.

Avaliar: Identificar problemas de postura –


• Estado nutricional (0-5) podem ser de foro neurológico:
• Assimetrias musculares (ex: atrofias) • Reflexos postura
• Postura (poderá ser indicativa de algum desconforto do animal, ou de • Tónus da cauda
problemas neurológicos) • Coordenação
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 20

• Posição
• Locomoção
• Cabeça: posições anormais, corrimentos, narinas
• Pescoço: tumefações, goteira jugular, posição
• Cavidade torácica: tumefações; respiração
• Cavidade abdominal: distensão
• Zona perineal
• Membros: apoio, supressão, posição, aprumos
• Fezes: se existem ou não, e, se sim, quantidade, aspeto
• Estado mental: se aparenta estar agitado, deprimido
• Se aparenta ou não estar com dor (ligeira, moderada ou severa)

EXAME CLÍNICO:

• Perceber a atitude e comportamento do animal


• Principalmente a primeiro contacto, importante (por questão de segurança) que a abordagem seja feita pelo
lado esquerdo.
• CONSTANTES VITAIS:
o Temperatura retal: 37,5-38,5 oC.
o Frequência cardíaca: 28-46 bpm – nas aa. transversa da face, facial, digital; ao sentir o choque precordial
ou por auscultação.
o Frequência respiratória: 8 a 16 rpm.
o Hidratação: tempo de repleção capilar, retração da prega cutânea, inspeção das mucosas e temperatura
das extremidades.

TEMPERATURA:
• Medição da temperatura corporal – pouco invasivo, rápido e barato.
• Depende da idade (mais elevada em poldros).
• Considerar condições ambientais.
• Em caso de dúvida, repetir e verificar até noutros animais.
• Possíveis erros (entrada de ar no reto).
• Possíveis causas (animal, ambiente, patológicas).

• LINFONODOS REGIONAIS:

• EXAME CLÍNICO DA CABEÇA:


• Orelhas
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 21

• Seio frontal/seios maxilares – através de percussão; palpação pode não ser tão evidente.
• Olhos: corrimento, mucosa conjuntiva.
• Cavidades nasais: corrimento, igualdade das colunas de ar, FR, mucosa, ducto nasolacrimal.
• Cavidade oral: mucosa, TRC, dentes, odor, feridas.
• Observar a simetria.
• A avaliação do pulso arterial pode ser feita através das aa. transversa da face e facial.
• EXAME CLÍNICO DO PESCOÇO:
• Distensão da jugular.
• Tempo de repleção da prega cutânea (TRPC).
• EXAME CLÍNICO DA CAVIDADE TORÁCICA:

Através de:
✓ Inspeção
✓ Palpação
✓ Percussão
✓ Auscultação cardíaca – som “tum-tá” lento; S1, S2, S3 e S4 são
os sons cardíacos normais/fisiológicos
✓ Auscultação pulmonar
• Pulso
• Respiração
o Ruídos (inspiração/expiração)
o Se está ou não dispneico
o Auscultação da traqueia e auscultação pulmonar (neste caso, pode ser necessário usar um saco)
o Secreções
o Tosse espontânea
o Tosse produtiva

• EXAME CLÍNICO DA CAVIDADE ABDOMINAL:


✓ Inspeção
✓ Palpação
✓ Auscultação
• Faz-se uma divisão em 4 quadrantes abdominais (dorsal e ventral esquerdo e direito), e cada quadrante deve
ser auscultado por 1 min.

Aparelho digestivo – lados esquerdo e direito, respetivamente.


Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 22

SEMIOLOGIA DO APARELHO DIGESTIVO DE EQUINOS

PRINCIPAIS SINAIS CLÍNICOS AO NÍVEL DO APARELHO DIGESTIVO:

• Ptialismo
• Disfagia
• Cólica (dor abdominal)
⎯ Úlceras gástricas – intermitente, pode, com alguma frequência, surgir em animais de competição, sujeitos a muito stress.
⎯ Íleo (= Ileus)
⎯ Peritonite
• Diarreia
⎯ Aguda
⎯ Crónica

DIFERENÇAS ANATÓMICAS A CONSIDERAR NO APARELHO DIGESTIVO DE EQUINOS


Estômago de pequena capacidade: 8 a 20L.
São incapazes de vomitar.
Jejuno com mesentério longo.
Ceco funcional.
Transições abruptas de diâmetro no tubo digestivo – sobretudo aquando da flexura pélvica, cólon maior/menor.
Mucosa retal frágil.

Aquando do EXAME CLÍNICO DA CABEÇA, há alguns aspetos a dar maior preponderância quando procuramos afeções do
aparelho digestivo: na boca, inspecionamos os lábios, língua, palato, gengivas, dentes, além de avaliar a preensão e
mastigação (perceber de é capaz de comer a partir do chão, se deixa o alimento cair, se há acumulação de alimento); as
glândulas salivares parótida, mandibular e sublingual, além das glândulas bucal, labial, lingual e palatina; ao nível da
faringe/laringe, foco na avaliação da deglutição (deixa de comer ou beber água? haverá dor, obstrução ou défices
neurológicos?).

ALTERAÇÕES DENTÁRIAS: ALTERAÇÕES DAS GLÂNDULAS SALIVARES:


• Defeitos congénitos • Fístulas
• Traumas • Cálculos (carbonato de cálcio)
• Problemas de erupção dentária • Atresia dos ductos
• Pontas dentárias • Rânula
• Fratura dentária • Neoplasias
• Doença periodontal

Neste contexto, podemos abordar algumas das causas de disfagia/disfagismo, sobretudo de disfagia oral:
• Fraturas (da mandíbula, incisivos, maxilar ou aparelho hioide).
• Paralisia bilateral da língua (nervo XII) ou músculos da mastigação (V).
• Glossite ou estomatite.
• Fenda palatina.
• Abcessos.
• Raiva.

Quando falamos em causas mais caudais, podemos estar perante:


• Presença de corpos estranhos na faringe.
• Empiema das bolsas guturais.
• Dor temporomandibular.
• Alterações ao nível do esófago.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 23

Já no EXAME CLÍNICO DO PESCOÇO, também previamente abordado, além da distensão da jugular e do TRPC, centramos
a nossa atenção no esófago, que pode ser alvo de uma variedade de alterações, tais como:

• Obstrução esofágica.
• Estenose.
• Divertículos.
• Perfurações.
• Esofagite.
• Megaesófago.

Uma disfagia com sede no esófago pode derivar nomeadamente de uma obstrução mecânica ou de alterações na
motilidade – a abordagem passa pela recolha da história do animal, exame físico, exame da cavidade oral,
eventualmente endoscopia e exame neurológico para despistar demais causas.

SINAIS CLÍNICOS DE OBSTRUÇÃO ESOFÁGICA: DIAGNÓSTICO DE OBSTRUÇÃO ESOFÁGICA:


• Salivação • Passagem de tubo nasogástrico
• Corrimento nasal com alimento • Endoscopia das respetivas regiões: distal à
• Tumefação do pescoço faringe, à entrada torácica e até à base do
• Ansiedade coração
• Engasgos • Radiologia
• Posição da cabeça: para baixo, e o pescoço
esticado.

Já no que toca ao EXAME FÍSICO DA CAVIDADE ABDOMINAL, por via da inspeção (observação) procura-se por
assimetrias ou distensão da própria cavidade; por palpação, tentar perceber se o animal tem dor, indicativa de
peritonite; percussão para detetar a presença de gás (linhas de nível) e
auscultação dos 4 quadrantes abdominais.

É possível ainda realizar EXAMES ADICIONAIS AO ESTÔMAGO – para tal,


contamos com a sondagem nasogástrica como meio auxiliar de diagnóstico,
que permite detetar presença de gás e líquido no estômago, proceder à
retirada de conteúdo gástrico para que possa ser examinado
(nomeadamente realização de exames citológicos e bacteriológicos), lavagem
gástrica, etc.

ALTERAÇÕES COMUNS DO ESTÔMAGO E DO DUODENO:


• Gastrite
• Obstruções
• Úlceras

➔ ULCERAÇÃO GÁSTRICA E DUODENAL – SÍNDROME DE ULCERAÇÃO GÁSTRICA EQUINA (SUGE):

A nível de causas, poderá ser multifatorial, derivado de stress, anorexia, do próprio maneio alimentar, agentes (?).

Os sinais clínicos nem sempre correlacionam com a severidade da doença.

Em poldros: Adultos:
• Deixam de mamar. • Diarreia intermitente.
• Cólica; posicionam-se em decúbito dorsal. • Cólica recorrente.
• Bruxismo. • CC fraca.
• Salivação. • Desempenho fraco, letargia.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 24

Diagnóstico por endoscopia ou mediante resposta ao tratamento.

Ao recorrer a exame endoscópico, pode utilizar-se o sistema de classificação Equine Gastric Ulcer Council, que avalia o
dano da mucosa:

Além disso, pode ser feita a distinção dos locais onde as úlceras se distribuem nas diferentes áreas do estômago, tal
como evidencia a figura:

Doença gástrica escamosa equina (DGEE) – mais prevalente.


Doença gástrica glandular equina (DGGE) – indica quebra de defesa na mucosa.

ALTERAÇÕES INTESTINAIS
NÃO OBSTRUTIVAS: OBSTRUTIVAS:
• Enterite proximal Não estrangulantes
• Colites (diarreias) • Impactações
• Tromboembólicas (Strongylus vulgaris) • Corpo estranho
• Lipoma (fase inicial)
• Deslocações
Estrangulantes
• Torções, invaginações, vólvulo
• Encarcerações (mesentério, epiploico)
ALTERAÇÕES DA MOTILIDADE

Na auscultação, ter em consideração que:


⎯ Borborigmos não se correlacionam com motilidade
⎯ Hiperatividade tem pouco significado clínico.
⎯ Por outro lado, ausência de motilidade, é, sim, significativa.

➔ ÍLEO/ILEUS

Podemos estar perante um íleo obstrutivo ou adinâmico (que terá como eventuais causas: infeção, diarreia,
parasitismos, medicamentos, enterite proximal, pós-operatório, desequilíbrios eletrolíticos).
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 25

O EXAME CLÍNICO deverá ser rápido, eficaz e sistemático, inclusive porque o que se pretende é induzir o mínimo de
stresse possível ao animal.

À distância – procurar logo avaliar se o animal tem dor e se existe algum tipo de distensão.
Em proximidade – a prioridade é a recolha de constantes vitais e auscultação abdominal.

EXAMES COMPLEMENTARES:

• Palpação transretal – necessária contenção do animal, +/- sedação. Possibilidade de detetar impactação da
flexura pélvica do cólon.
• Entubação nasogástrica – já mencionada; permite descompressão/lavagem, administração de medicamentos,
diagnóstico e avaliação do refluxo (em quantidade/tempo, cheiro, conteúdo e pH).
Enterite proximal, refluxo característico: 6-20L, cheiro fétido, sanguinolento, de pH alcalino.
• Abdominocentese – a aparência do fluído peritoneal normal deverá ser transparente a amarelo-clara, sem odor
(ver tabela 2.2.)
• Análises de sangue/líquido peritoneal
• Análises bioquímicas (perfil hepático, renal)
• Radiografia
• Ecografia
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 26

AULAS T6 e P6 – EXAME CLÍNICO EM BOVINOS

No caso dos animais de produção, além de examinar o próprio animal, é necessário ter muito em conta o contexto da
produção inteira, não apenas um único indivíduo – até porque, na prática, na maioria das situações o médico veterinário
não é chamado à exploração para ver somente um animal.

HISTÓRIA CLÍNICA DO ANIMAL:

CONTEXTO DA EXPLORAÇÃO – perceber qual o tipo de exploração, como os animais estão organizados, perceber a
dinâmica, profilaxia que é feita etc.

• Clima (temperatura, humidade relativa).


• Instalações.
• Higiene e isolamento higio-sanitário.
• Qualidade da água.
• Maneio do pasto.
• Viteleiro.
• Maneio do colostro.
• Maneio alimentar e composição dos alimentos.
• Comportamento animal.

EXAME CLÍNICO – primeiro de tudo, é necessário proceder à IDENTIFICAÇÃO do animal, e depois à sua CONTENÇÃO.

HISTÓRIA CLÍNICA:
• Principal queixa – doença atual
• Doenças da exploração
• Tratamento/resposta
⎯ Há quanto tempo decorre?
⎯ É a primeira vez neste animal/na própria exploração?
⎯ Se sim, qual o tratamento que foi utilizado previamente?
⎯ O animal (ou animais) afetado(s) está a comer? Continua a ruminar?
⎯ Está isolado ou em grupo?

EXAME À DISTÂNCIA: pode ser feito antes sequer de conter o animal.


• Avalia-se o comportamento do animal, se está ou não alerta.
• Atitude e postura do animal – em estação ou decúbito. NOTA: não pode estar em decúbito lateral (!), uma vez que
resultará em incapacidade de eructar e eventual morte.
• Condição corporal*1 – classificação de 1 (vaca emaciada) a 5 (obesa); eventualmente 1 a 9 em bovinos de carne.
• Locomoção – se claudica ou não, ou se existe algum outro tipo de anomalias.
• Perfil abdominal*2 – simetria e se existe ou não algum tipo de dilatação.
o NOTA: existem dois tipos de timpanismo – timpanismo gasoso, em que há dilatação do quadrante dorsal
esquerdo; e timpanismo espumoso, em que a dilatação observada é mais uniforme, apenas não se notando no
quadrante dorsal direito, onde se encontram os intestinos.
• Grau de repleção ruminal*2 – numa escala de 1 a 5, em que grau 1 corresponde a um rúmen vazio, com
concavidade marcada na fossa paralombar esquerda, e 5 corresponde a uma convexidade muito marcada,
possivelmente associada a timpanismo.
• Defecação e micção.
• Produção e aspeto das fezes.
o Classificação da consistência da matéria fecal e da fração fecal não digerida – de 1 a 5, em que 5 se
assemelham a fezes de equino, o que não é fisiológico.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 27

• Aspeto da genitália externa.


• Glândula mamária. Frequência respiratoria:
• Bovinos: 15 a 35, em vitelos 20 a 50.
• Membros e úngulas.
• Peq. Rum: 12 a 30, em neonatos 20
• Tórax – respiração (tipo, frequência, ritmo e profundidade) e ruídos
a 50.
respiratórios.
• Barbela e pescoço – nomeadamente visualizar se existe edema submandibular.
• Cabeça – simetria e posições anormais.
• Orelhas, olhos, espelho (normal estar húmido, mas não sujo) e narinas, boca – língua de fora + orelhas caídas é
indicativo de hipocalcemia.
• Apetite, preensão, mastigação e deglutição.
• Vocalização.

*1CONDIÇÃO CORPORAL
Obesa (5), normal, magra, emaciada (1)
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 28

*2 PERFIL ABDMINAL E GRAU DE REPLEÇÃO RUMINAL


Primeiro, é importante compreender como se organizam os materiais no rúmen:

Gás livre, mais dorsal – tem que ser eructado (sob risco de
timpanismo, caso não seja possível).

Alimento grosseiro/forragem – é o que será regurgitado; flutua


sobre o fluído.

Fluído e partículas já digeridas.

Ao avaliar o perfil abdominal, traçam-se linhas de nível (por percussão, detetamos a localização de cada um dos
materiais anteriormente descritos), sendo que a presença de cada um desses materiais nos vários quadrantes
abdominais terá significados diferentes, vejamos um por um:
1. Contorno abdominal esquerdo ventral
Presença de gás – indica a existência de abcessos por microrganismos anaeróbios.
Presença de líquido/espuma – acidose ruminal aguda, ascite, peritonite difusa, hidrópsia íleo, invaginação, torção
do mesentério, indigestão vagal.
Conteúdo firme – será forragem não digerível.
2. Contorno abdominal esquerdo dorsal
Presença de gás – timpanismo gasoso, indigestão aguda, acidose lática aguda, hipomotilidade ruminal,
pneumoperitoneu, deslocamento do abomaso à esquerda.
Presença de líquido/espuma – timpanismo espumoso, acidose lática aguda, indigestão vagal.
Conteúdo firme – ingestão de alimento grosseiro pouco digerível.
3. Contorno abdominal direito dorsal
Presença de gás – deslocamento/torção de abomaso à direita, dilatação/torção de ceco, timpanismo de abomaso
(vitelos), pneumoperitoneu.
Presença de líquido/espuma – timpanismo espumoso, enterite aguda, torsão de mesentério.
O GRAU DE REPLEÇÃO RUMINAL avalia o enchimento do rúmen.
Como já mencionado, escala de 1 a 5 – grau 1 corresponde a um rúmen vazio, com concavidade marcada na fossa
paralombar esquerda, e 5 corresponde a uma convexidade muito marcada, possivelmente associada a timpanismo.

Vacas de leite em pós-parto têm pouca fome (anorexia


fisiológica), sendo relativamente normal apresentaram grau
1, o que, apesar de não ser totalmente preocupante, não é
desejável e devemos procurar contrariar a situação.

Há risco de ocorrer deslocamento do abomaso, mais


comummente à esquerda, devido ao esvaziamento do rúmen.
No geral, não se pretende ter graus de repleção ruminal 1
nem 2 (coloca-se água no rúmen para o encher), nem 5
(distensão).
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 29

NOTA: É importante sistematizar! Começar num lado e terminar noutro, sequencialmente por exemplo:
Região caudal → cavidade abdominal → cavidade torácica → pescoço → cabeça
As vacas leiteiras estão habituadas a serem manipuladas por trás (no úbere, inseminações, etc), pelo que se inicia a
abordagem caudalmente. Já nos cavalos, por exemplo, começa-se cranialmente, do lado esquerdo.

EXAME CLÍNICO – começar pela região caudal em bovinos de leite, sempre avisando a nossa presença e fazendo com
que a vaca nos veja primeiro (o seu campo de visão tem um ângulo morto atrás).

Constantes vitais:
• FC – 60 a 80 bpm (na abordagem caudal é possível medir o pulso na artéria coccígea que, fisiologicamente, será
semelhante à FC; uma diferença entre os dois poderá acontecer, p.e., em casos de insuficiência cardíaca).
• FR – 15 a 35 rpm
• Temperatura retal – entre 38 e 39,5oC

Mucosa vulvar:
• Avaliar o tempo de repleção capilar (TRC)
• Secreções – secreções com cheiro intenso desagradável em período pós-parto indicam infeção pós-parto
• Se a zona perineal ao redor está suja ou limpa
• Etc.

Urina: é possível estimular a vaca a urinar, o que permite sempre usar uma tira de urina para avaliar os corpos cetónicos
(o facto de uma vaca estar em cetose poderá indicar que as necessidades energéticas não estão a ser satisfeitas, pelo
que se encontra em balanço energético negativo – vacas em pós-parto têm tendência a entrar em cetose).
O problema das tiras de urina que utilizamos é que elas não detetam todos os tipos de corpos cetónicos, apenas
detetam o acetoacetato, pelo que o melhor indicador será, por análise de sangue, determinar a presença de
betahidroxibutirado, corpo cetónico que surge mais cedo.

Palpação dos linfonodos retromamários.

Temperatura das extremidades.

Cavidade abdominal esquerda:


• Inspeção
• Palpação superficial e profunda
• Percussão – estratificação do conteúdo ruminal
• Auscultação – para auscultar o rúmen, coloca-se o estetoscópio na fossa paralombar esquerda e deverá
auscultar-se por 2 minutos, ouvindo cerca de 3 até 5 (ou 2 a 4 – prof. Pedro Caetano) contrações. Apenas ao
ouvir, não se distingue se são contrações primárias ou secundárias, no entanto:
o Ciclo de contrações primário ou de mistura – 1 contração de mistura/minuto.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 30

o Ciclo de contrações secundário ou de eructação – 1 contração de eructação/2 minutos.


• Auscultação e percussão combinadas – técnica dos “pings” para perceber se existe deslocamento do abomaso:
o som metálico ouvido ao estetoscópio quando se percute a região envolvente indica que a víscera contém gás e
líquido, tudo sob pressão.

Testes de dor: permitem detetar, p.e., uma reticulo-peritonite traumática.

Cavidade torácica:
• Palpação
• Auscultação
• Percussão
└ O CORAÇÃO deve ser auscultado por 30 segundos, e deve ser avaliada a frequência, o ritmo, intensidade e
qualidade dos batimentos. Lembrando que a FC normal de um bovino adulto está entre 60 e 80 bpm.
└ VÁLVULAS CARDÍACAS: tricúspide do lado direito, pulmonar, aórtica e mitral auscultam-se do lado esquerdo.
└ Os PULMÕES devem ser auscultados em prol de ouvir sons respiratórios normais e perceber se existem sons
respiratórios anormais. Atenção região cranio-ventral.

Linfonodo pré-escapular – só se sentirá se estiver aumentado.

No pescoço:
• Palpação da barbela, jugular, esófago cervical e traqueia
• Auscultação da traqueia

Na cabeça:
• Orelhas
• Olhos
o Corrimento ocular
o Pálpebras
o Mucosa conjuntival
o Anomalias da córnea
o Tamanho e posição do globo ocular – retração/afundamento do olho indica desidratação (enoftalmia).
o Reflexo pupilar
o Reflexo de ameaça e de obstáculos
o Estruturas profundas
• Seios nasais – frontal, cornual e maxilares.
o Som maciço à percussão do seio frontal à partida indicará complicações devido à descorna.
o No seio maxilar, alterações poderão estar relacionadas com a infeção de uma raiz dentária.
• Cavidade nasal
o Avaliar a existência ou não de corrimentos
o Regurgitação
o A mucosa
o Odor do ar expirado
o Igualdade das colunas de ar
• Cavidade oral
o Sialorreia
o Ptialismo
o Coloração e lesões da mucosa bucal
o Dentes
o Língua
o Faringe
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 31

• Linfonodos submandibulares e retrofaríngeos laterais (os mediais não se palpam, são internos)

Extremidades distais (membros):

• Perceber se existem afeções podais (claudicação é o indicador mais óbvio).

TERMINADO O EXAME CLÍNICO GERAL – e depois?

• Lista de problemas
• Necessidade de realizar exames complementares?
⎯ Diagnóstico presuntivo
⎯ Diagnóstico definitivo
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 32

AULA T7 (31/10/2023) – SEMIOLOGIA HEPÁTICA

REVISÃO ANATOMO-FISIOLÓGICA – FÍGADO:

Situação anatómica do fígado – caudal ao diafragma, nos animais que o têm; na cavidade celómica de répteis e anfíbios.
O lóbulo clássico tem 6 espaços porta e 1 veia centrolobular. Cada espaço porta tem ramos da artéria e veia hepática.

Funções digestivas, de destoxificação, de síntese proteica, síntese de fatores de coagulação – leque funcional muito
amplo.

• Secreção de bílis.
• Formação e stock de glicogénio.
• Desaminação de aminoácidos e formação de ureia.
• Destruição de ácido úrico.
• Síntese de ácidos gordos.
• Armazenamento de vitamina A.

Conceitos de assinergia e assincronia:


Assinergia – as funções hepáticas não são diretamente dependentes umas das outras (quando uma função está
aumentada, as outras não terão necessariamente de também estar).
Assincronia – nem todas as funções têm de ser desempenhadas em simultâneo; algumas podem estar a
decorrer num dado momento em que sejam necessárias, depois outras.

Capacidade funcional face a lesões – capacidade de aumentar a sua capacidade metabólica quando parte das suas
células está afetada. (NOTA: podem chegar a existir 2/3 de células hepáticas lesionadas, sem que haja sintomatologia visível, uma
vez que a atividade funcional hepática é compensada pelas células intactas).

Por vezes, em condições normais, o animal estará perfeitamente assintomático, mas, procedendo-se a uma prova de
esforço das funções hepáticas, percebe-se a existência de dano hepático – avaliação da funcionalidade hepática.

TESTES BASEADOS NO METABOLISMO DOS PIGMENTOS BILIARES:

Formação e ciclo entero-hepatico dos pigmentos biliares:


Sabemos que a bilirrubina é um produto da degradação da hemoglobina – após a degradação da hemoglobina (por
exemplo, no baço) é lançada na circulação, acoplada a albumina (bilirrubina não conjugada) e, quando passa pelos
hepatócitos, parte dela é assimilada. Os hepatócitos vão então transformar a bilirrubina não conjugada, não
hidrossolúvel, em bilirrubina conjugada com ácido glucorónico, essa sim hidrossolúvel, que é então lançada para as vias
biliares. Acaba por chegar ao intestino, onde a flora microbiana a transformará noutros pigmentos biliares
(urobilinogénio e estercobilinogénio). Parte do urobilinogénio é reabsorvido pelos capilares mesentéricos e pela veia
porta, retornando aos hepatócitos e posteriormente para o intestino. Aquele que não é captado, vai para a circulação
sistémica, acabando por passar pelos rins, onde é filtrado (NOTA: tanto que, se o animal tiver uma obstrução biliar, a urina
também estará clara).
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 33

Quando há uma obstrução biliar:


Não vai haver urobilinogénio nem estercobilinogénio a chegar ao intestino.
Urina mais clara (sem urobilinogénio), porém presença de bilirrubina.
Bilirrubina conjugada vai parar à vesícula biliar e não chega ao intestino. Reflui para os hepatócitos, acaba por circular,
por via linfática, até à circulação sanguínea – bilirrubina conjugada em circulação, acabando por ir parar aos rins →
vestígios de bilirrubina não conjugada na urina.

Quando temos défice funcional hepático (mesmo que ligeiro):


Parte do urobilinogénio reabsorvido acaba por não ser captado pelos hepatócitos (não vão para a via biliar),
permanecendo em circulação e, consequentemente, vindo a estar presente na urina. Urinas não concentradas, porém
com níveis mais elevados de urobilinogénio* → podem indicar um certo grau de insuficiência hepática.
*NOTA: não encontramos bilirrubina não-conjugada na urina pois esta não é hidrossolúvel, logo não é filtrada (a menos que seja de
elevada gravidade, em níveis muito elevados). Por outro lado, sais biliares aumentados na circulação estarão presentes também na
urina. Um aumento dos níveis de bilirrubina conjugada já surgirá na urina.

SÍNDROME ICTERÍCIA:

Presença de excesso de bilirrubina em circulação – hiperbilirrubinémia, que dá origem a uma síndrome, icterícia.
• Icterícia pré-hepática – associada muitas vezes a um aumento da hemólise. Presença de bilirrubina não
conjugada (BNC) na circulação, e hematócrito baixo. A nível de sintomas, não haverá bilirrubinúria, mas poderá
haver hemoglobinúria.
• Icterícia hepatocelular – associada a lesões hepatocelulares, insuficiência hepática. Aumenta a
bilirrubina não conjugada e ALT (enzima hepática) aumentada. NOTA: o aumento da ALT em circulação indica uma
alteração da permeabilidade celular dos hepatócitos. Não haverá bilirrubinúria nem hemoglobinúria; eventualmente
poderão haver alterações do fígado detetáveis por diagnóstico de imagem.
• Colestase – poderá haver obstrução ou oclusão parcial/total do fluxo biliar (por causas inflamatórias,
neoplásicas, parasitárias, litíase) ou distúrbios metabólicos (hepatotoxicidade, septicemia, atresia congénita).
Haverá um aumento da bilirrubina conjugada, bem como de sais biliares e fosfatase alcalina sérica, ou seja, dos
conteúdos da bílis (NOTA: um aumento da FAS não é patognomónico, também poderá existir em animais em
crescimento, gestantes, com processos de enterite, p.e.).
o Pode ser intrahepática – aumento de bilirrubina conjugada, ALT (aumento superior ao que se
verifica nos níveis de FAS) e eventualmente também bilirrubina não conjugada (devido à agressão da
parede dos hepatócitos por parte dos sais biliares – uma colestase intra-hepática pode levar a lesões
hepatocelulares, aumentando, como já visto, também a BNC).
o Ou extrahepática – aumento da bilirrubina conjugada e FAS. Não haverá necessariamente lesão
hepatocelular.

Cada uma destas será, adiante, vista em pormenor.

A síndrome icterícia caracteriza-se pela coloração amarela dos tecidos por impregnação de pigmentos biliares.

Causas, sumariamente:
• Lesões difusas (de mais de 2/3) das células hepáticas, a comprometer a capacidade metabólica do fígado
– icterícia hepatocelular.
• Processos obstrutivos ou oclusivos das vias biliares – icterícia obstrutiva.
• Associadas a hemólise, havendo excesso de formação de bilirrubina por aumento da destruição de
eritrócitos – icterícia hemolítica. NOTA: o fígado não será capaz de a conjugar toda, não devido a
insuficiência hepática, mas sim por excesso de bilirrubina. Haverá excesso de bilirrubina não conjugada.

01. BILIRRUBINÉMIA – hiperbilirrubinémia, icterícia (tal como acabámos de ver).


Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 34

02. BILLIRRUBINÚRIA – bilirrubina na urina (ausente na maioria das espécies; em bovinos, cães e gatos normalmente
apenas se encontram vestígios).

O limiar renal de excreção é aprox. 0,4 mg/dL.

Causas:
• Icterícia hemolítica (conjugação renal ou lesão hepática secundária).
• Reações febris (cão e gato).
• Icterícias hepatocelulares e obstrutivas.

03. BILIVERDINEMIA – (em aves, falta de biliverdina redutase) é uma elevação rara, mas existe presença de uratos
corados de verde, nas afeções hepáticas.

04. SAIS BILIARES – síntese hepática a partir do colesterol + ciclo entero-hepático.


Importância em proceder a duas determinações → antes e 2h após a refeição (cavalo: apenas uma toma)
Aumento em circulação: shunts portossistémicos, insuficiência hepática, colestase, distúrbios de contratilidade
da vesícula biliar.
Diminuição em circulação: má absorção ileal.
Presença na urina.

Numa eventual colestase – os ácidos biliares permanecem no fígado, não vão para o intestino, e acabarão por, através da
veia hepática, refluir para a circulação sistémica.

Shunt portossistémico – os sais biliares que vão para o intestino e, através da veia porta, acabam por ser levados para a
circulação sistémica.

Insuficiência hepática – um animal insuficiente hepático (contando que a insuficiência hepática não o mate) terá maior
capacidade de produzir sair biliares do que assimilá-los quando retornam do intestino. Pelo que se gera um acúmulo.

05. AMÓNIA – é o produto neurotóxico da degradação/metabolismo das proteínas que se encontram na dieta. No caso
de insuficiência hepática, o fígado perde a capacidade de absorção da amónia e outras toxinas pelo que estas chegam à
circulação sistémica. No fígado, a amónia é transformada em ureia (um produto menos tóxico) que é excretada pelos
rins.

Produzida no trato GI pela degradação de aminoácidos e ureia, levada a cabo pela microflora; pelas células somáticas por
desaminação de aminoácidos. NOTA: nas aves, níveis sanguíneos superiores aos dos mamíferos.

Para dosear: separar o plasma de imediato, refrigerar a amostra e determinar em 15 a 30 min ou congelar o plasma até
48 h (caráter volátil da amónia).
→ Usar heparina amonia free.

Hiperamoniémia:

Insuficiência hepática – aumento da amoniémia com diminuição da urémia, contando que exista perda de 2/3 da massa
funcional hepática.

Shunts portossistémicos – a amónia deveria passar pelo fígado para ser transformada em ureia, no entanto, em vez
disso, vai diretamente para a circulação sistémica.

Defeitos metabólicos congénitos do ciclo da ureia (raros nos cães).

Toxicidade ureica nos ruminantes.

Presença de cristais de biurato de amónio da urina (amónia na urina devido a p.e. um shunt ou insuficiência hepática):
importância da prova de tolerância à amónia (dosear a amónia e perceber se está a ser degradada em ureia ou não).
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 35

06. FOTOSSENSIBILIDADE HEPÁTICA – filoeritrina (porfirina, fisiologicamente produzida por degradação da clorofila pela
microflora gastrointestinal dos herbívoros, é absorvida, removida pelos hepatócitos e excretada pela via biliar).

Muitas vezes, um dano hepáJco primário conduz a uma alteração de outros sistemas ou partes do corpo, como nos casos
de fotossensibilidade hepática, que aqui abordamos, em que se verifica o aparecimento de dermatites, principalmente
em regiões desprovidas ou pouco pigmentadas, tais como orelhas e faces laterais do úbere e das tetas: aquando de uma
insuficiência hepática, a filoeritrina entra na circulação sistémica e acumula-se na pele, libertando radicais livres sob ação
da luz solar → inflamação e necrose cutâneas.

07. UROBILINOGÉNIO URINÁRIO

Diminuído ou ausente: por obstrução biliar completa; diminuição da eritrólise; alterações da absorção intestinal; poliúria
(diluição do urobilinogénio); alterações da flora intestinal.

Aumentado: devido a lesão hepatocelular (diminuição da captação) ou icterícia hemolítica.

08. ESTERCOBILINA

Aumentada: icterícia hemolítica (fezes laranja-escuro).

Diminuída: obstrução biliar (fezes claras).

TESTES BASEADOS NA ATIVIDADE ENZIMÁTICA:

01. ALT/GPT (Alanina aminotransferase/Transaminase glutâmico-pirúvica)

Libertada em casos de lesão de hepatócitos (alteração de permeabilidade de membrana ou necrose) em cães e gatos.
Grandes animais apresentam baixa atividade de ALT nos hepatócitos, que não apresenta sensibilidade adequada como
marcador de lesão nessas espécies.

Enzima citoplásmica:
Alanina + Ác. α-cetoglutárico → Ác. Pirúvico + Ác. Glutâmico
O fígado é a fonte principal no cão, gato e primatas.
Pequenas quantidades fígado de equinos, bovinos, ovinos e suínos.

Aumentada: devido a alteração da permeabilidade celular; necrose hepatocelular/toxinas; doenças específicas,


nomeadamente infeciosas (leptospirose, hepatite, PIF, esteatose hepática, diabetes, hipotiroidismo, hipóxia hepática);
neoplasias hepáticas; certos fármacos (corticosteroides, estrogénios, androgénios, antibióticos como cloranfenicol,
gentamicina e eritromicina, salicilatos, primidona).

02. AST/GOT (Aspartato aminotransferase/Transaminase glutâmico-oxalacética)

Localização hepatocelular; libertada por lesão aos hepatócitos. Eleva-se em menor magnitude que a ALT nos processos
agudos. Usada em grandes animais (ruminantes e equinos).

Enzima mitocondrial:
Ác. Aspártico + Ác. α-cetoglutárico → Ác. Oxalacético + Ác. glutâmico
A fonte principal é o músculo estriado → sem especificidade hepática.
Presente também no rim, pâncreas, cérebro, eritrócitos.

Aumentada:
No cavalo – quando o músculo estriado domina os níveis séricos; paralelamente relacionado com lesão hepática,
enfarte do miocárdio, afeções intestinais, septicemia.
Em bovinos e ovinos – miopatias (sobretudo com necrose); hepatopatias (necrose, cetose, congestão passiva,
abcesso).
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 36

No cão e no gato – miopatias; necrose hepática; miocardiopatias (miocardite, enfarte, insuficiência); fármacos,
como salicilatos, corticoides, estrogénios, antibióticos..., fenotiazina, halotano.

03. FAS (Fosfatase alcalina sérica)

Participa nos processos bioquímicos de transporte de açúcares e fosfato, em todos os tecidos que utilizam a glucose para
produção de energia. Pouca especificidade hepática.
Enzima microssomal: sobretudo intracelular.
Fontes principais: condroblastos e osteoblastos; sistema hepatobiliar; mucosa gastrointestinal; túbulos renais; baço;
placenta.

Aumentada:
Devido a processos de ossificação e osteólise
└ Crescimento
└ Osteossíntese pós-fratura
└ Gestação
└ Osteomalácia
└ Hiperparatiroidismo
Patologia hepatobiliar
└ Colestase (intra- e extra-hepática)
└ Necrose hepática
└ Degenerescência gorda (diabetes, hipotiroidismo)
└ Congestão passiva
└ Lesões hepáticas infiltrativas
Afeção renal
Afeção gastrointestinal
Fármacos
└ Corticoides, fenotiazinas, estrogénios e androgénios, eritromicina.

04. LDH (desidrogenase lática)

Lactato + NAD+ ←→Piruvato + NADH + H+


Presente nos tecidos que utilizam glucose para produção de energia.
Especificidade hepática apenas da isoenzima 5.

05. SDH (sorbitol desidrogenase)

Sorbitol → glucose
Pouca especificidade hepática para a maioria das espécies.
No cavalo é a enzima de eleição para a avaliação de lesões hepáticas.

06. GDH/GLDH (desidrogenase glutâmica)

Mitocondrial.
Já tem maior especificidade hepática, e, inclusive, no bovino tem maior sensibilidade para detetar lesões hepáticas que
as transaminases.

07. ARGINASE

Especificidade hepática no cavalo, porém baixa especificidade noutras espécies.

08. OCT (ornitina-carbamil transferase)

Tem especificidade hepática maior, porém, sem valor diagnóstico superior ao da ALT, exceto em grandes animais.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 37

TESTES BASEADOS NOUTRAS FUNÇÕES METABÓLICAS HEPÁTICAS:

01. Excreção de BSP (bromossulfaleína)

Metabolismo semelhante ao da bilirrubina. Permite a avaliação da função hepática e fluxo biliar.

Aumentada: devido a possível lesão hepatocelular, obstrução biliar, neoplasia, amiloidose, degenerescência
granulomatosa.

Contraindicações: hiperbilirrubinémia.

02. COLESTEROL

Hipercolesterolemia:
Devido a colestase (intra e pós-hepática)
Ou por causas não hepáticas:

└ Diabetes
└ Síndrome de Cushing
└ Hipotiroidismo
└ Síndrome nefrótico
└ Gravidez

03. METABOLISMO PROTEICO

03.1. PROTEÍNAS TOTAIS:

Pouco específico.
Hipoproteinemia geralmente associada a diminuição da albuminémia.

03.2. ALBUMINÉMIA:

Semivida plasmática da albumina corresponde entre 7 e 10 dias → normoalbuminemia nas afeções hepáticas agudas.

Diminuída: devido a lesão hepática difusa crónica (sobretudo cirrose); nefropatia (com albuminúria); fome e
desequilíbrios nutricionais; processos digestivos (má digestão ou absorção); parasitismo intestinal; queimaduras e
efusões proteicas extensas; inflamação e dermatite exsudativa intensa; gluconeogénese (diabetes, síndrome de
Cushing); hemorragia.

03.3. GLOBULINÉMIA:

α 2 - diminuída na insuficiência hepática


β - diminuída na insuficiência hepática
γ - aumento na doença hepática crónica, associado com β globuninemia → redução A / G

04. GLICEMIA:

Passam a verificar-se alterações da homeostase glicémica a partir de uma redução igual ou superior a 70% da massa
funcional hepática.

Redução da função de reserva de glucogénio e clearance da insulina → conduz a uma rápida hipoglicemia.

Poderá ainda verificar-se prolongamento da hiperglicemia pós-prandial por diminuição da assimilação hepática de
glucose.

05. HEMOSTASE:
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 38

Diminuição da síntese hepática de fatores de coagulação dependentes da vitamina K (II, VII, IX e X, entre outros) por
perda de massa hepática funcional. (Semivida plasmática pequena, pelo que existirá uma deficiência notória nas afeções
agudas).

Redução da atividade dos fatores de coagulação em 30% → aumento dos tempos de protrombina e de tromboplasJna
parcial ativada.

PROVAS DE EXCREÇÃO HEPÁTICA (esq.) e PROVAS FUNCIONAIS HEPÁTICAS (dir.)

SÍNDROME ICTERÍCIA – já brevemente abordada, consiste na aquisição de coloração amarela por parte dos tecidos,
devido à impregnação de pigmentos biliares.

Essencialmente, as causas de icterícia são:


• Lesões difusas das células hepáticas → icterícia hepatocelular
• Obstrução de vias biliares → icterícia obstrutiva
• Excesso de formação de bilirrubina por aumento da destruição de eritrócitos → icterícia hemolítica

ICTERÍCIA HEPATOCELULAR – também como já mencionado, devido a alterações difusas lesando mais de cerca de 2/3 do
parênquima hepático.

Causas:
• Hepatites infecciosas (víricas, bacterianas). Lembrando – principais enzimas hepatocitárias
• Hepatites tóxicas (barbitúricos, micotoxinas, fármacos). aumentadas quando há estas lesões hepatocelulares:
• Cirrose hepática. • ALT (alanina aminotransferase) e AST (aspartato
• Congestão hepática (p.e. estase por insuficiência aminotransferase)
cardíaca). • Desidrogenase glutâmica – bovinos.
• Sorbitoldesidrogenase – equinos.
Hiperbilirrubinémia não conjugada (indireta*).
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 39

Fezes tendencialmente pouco coradas (devido a menor quantidade de bilirrubina conjugada a chegar ao intestino para
ser degradada em pigmentos intestinais).
(*) O nome direto ou indireto para referir a bilirrubina conjugada e a não conjugada (respetivamente) relaciona-se com o método
de diagnóstico: no sangue, doseamos a bilirrubina conjugada diretamente (porque é hidrossolúvel), sem que haja qualquer
manipulação da amostra; para determinar a não conjugada é necessário fazer um processamento da amostra, normalmente com um
reagente alcoólico, que solubiliza a bilirrubina não conjugada, para que possa ser doseada juntamente com a conjugada (doseamos
as duas em conjunto, sem distinção entre elas); posteriormente, por cálculo matemático, calcula-se a não conjugada isoladamente,
daí ser considerada indireta.

ICTERÍCIA OBSTRUTIVA – existência de uma obstrução que impede a passagem da bilirrubina conjugada passe para o
intestino, isto é: ocorre estase biliar a montante do obstáculo, seja ele qual for, e isso causará alteração da
permeabilidade dos canalículos biliares. Há refluxo biliar e, por consequência, aumento da bilirrubinemia conjugada e
direta.

Causas: Colémia = aumento, na circulação, de


• Litíase biliar pigmentos biliares.
• Neoplasias Colúria = presença de pigmentos
biliares na urina.
• Cirrose biliar (há espessamento da parede dos canais biliares).
Colalémia = aumento, na circulação,
Além da hiperbilirrubinémia conjugada (direta), vai correr colémia e colalémia. Esta de sais biliares.
colémia, da bilirrubina conjugada (direta), como é hidrossolúvel, vai causar colúria; Colalúria = presença de sais biliares
na urina.
também ocorre colalúria, além de aumento da fosfatase alcalina sérica (FAS).

Sintomas:
• Pele e mucosas – cor amarela, quase esverdeada.
• Cardiovasculares – bradicardia.
• Intestinais – esteatorreia com fezes descoradas (diminuição da absorção de gorduras, incluindo vitaminas
lipossolúveis).
• Inicialmente, as provas hepáticas hão de surgir normais.

NOTA: Um processo de icterícia obstrutiva pode causar lesões hepatocelulares, havendo por isso agravamento da
icterícia.

ICTERÍCIA HEMOLÍTICA – devido a um aumento da eritrólise.

Causas:
• Heteroanticorpos (= antiespécie) ou isoanticorpos eritrocitários.
• Agentes infecciosos e parasitários.
• Produtos químicos hemolíticos (tóxicos).

Sintomas:
• Hiperbilirrubinemia indireta.
• Colémia sem colúria.
• Sem colalémia nem colalúria.
• Anemia com aumento de reticulócitos.
• Pele e mucosas – palidez/amarelecimento.
• Intestinais – fezes intensamente coradas (devido ao aumento da bilirrubina conjugada e aumento de
estercobilinogénio).
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 40

ICTERÍCIA HEMOLÍTICA – EXEMPLO HUMANO (BÁSICO) DA ISOAGLUTINAÇÃO APÓS TRANSFUSÃO SANGUÍNEA:


O sangue contém alugotinogénios A e B (mucopolissacaridos eritrocitários) e aglutininas α e β.
• Aglutinogénio A / Aglutinina α.
• Aglutinogénio B / Aglutinina β.
E existem 4 tipos sanguíneos fundamentais:
• AB – com os aglutinogénios A + B e sem aglutininas.
• A – com aglutinogénio A e aglutinina β (reage, provocando aglutinação, na presença de antigénios B).
• B – com aglutinogénio B e aglutinina α (reage, provocando aglutinação, na presença de antigénios A).
• 0 – sem aglutinogénios, com aglutininas α e β.
Com isto, sabemos que o grupo AB é recetor universal, ao passo que o grupo 0 é dador universal.
Além dos aglutinogénios, o fator Rh também é relevante na espécie humana, e também existe um fator análogo nos
equinos. É responsável pela eritoblastose (isoimunização e heteroimunização).
Acontece que se um recetor tiver Ac contra o dador, não há nada a fazer, mas se o dador tem anticorpos contra o
recetor pode ser feita uma espécie de lavagem, removendo o plasma.
ICTERÍCIA DO POLDRO RECÉM-NASCIDO, POR ISOIMUNIZAÇÃO:
Achados frequentes: anemia hemolítica em poldros de égua coberta pelo mesmo garanhão, visto que o soro materno,
aquando do contacto repetido com os eritrócitos do garanhão pai dos poldros, passa a aglutiná-los. Mudança de
garanhão para cobrições evita a icterícia do recém-nascido.
HETEROIMUNIZAÇÃO EQUINO/ASINO, COM HETEROAGLUTINAÇÃO DOS ERITRÓCITOS DOS HÍBRIDOS:
1 – Égua imuniza-se contra o feto mulo
2 – Nasciturnos sãos
3 – Ingestão do colostro com anticorpos contra o pai
4 – Heteroaglutinação eritrocitária

Além da síndrome icterícia, outras afeções hepáticas podem ocorrer, entre elas:

INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA:

Ocorre quando há uma lesão intensa generalizada, afetando mais de 2/3 do parênquima hepático (menos do que isso, os
hepatócitos são capazes de aumentar a sua atividade para compensar):

Causas:
• Víricas (HIC,PIF)
• Bacterianas (Leptospirose, abcesso, sepsis,...)
• Fúngicas (sistémicas – histoplasmose)
• Tóxicas (aflatoxinas, metais pesados,...)
• Medicamentosas (halotano, ketoconazole, tetraciclinas, mebendazole, griseofulvina,...)
• Nutricionais
• Biliares obstrutivas
• Vasculares (choque, hipotensão arterial, shunts portossistémicos).

INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA e HEPATITE AGUDA – quando uma súbita agressão hepática causa pelo menos 70 a 80% perda
de massa funcional, excedendo a reserva funcional e produzindo sinais clínicos de insuficiência hepática.

Achados histopatológicos mais frequentes: necrose hepática difusa.

Sintomas clínicos e laboratoriais: inespecíficos de causa – deficiências metabólicas ao nível de glúcidos, gorduras,
proteínas, destoxificação e excreção de drogas, toxinas e metabolitos, hemostase.

HEPATITE CRÓNICA – engloba um conjunto de afeções inflamatórias e necróticas do fígado. Tende a evoluir para cirrose.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 41

Raças caninas com predisposição hereditária: WHWT, Bedlington Terrier, Doberman, Cockers, Skye Terrier, Labrador
Retriever, Caniche.

Sintomas clínicos e laboratoriais: Hepatite crónica, ativa ou não. Acumulação de α1-antitripsina nos hepatócitos
(importante na génese da cirrose?).

Achados histopatológicos: inflamação moderada a severa e focos de necrose. Independente da causa.

A realização de biópsia é essencial ao diagnóstico e prognóstico de uma hepatite crónica, com provável reversibilidade
ou progressão para uma cirrose.

ENCEFALOPATIA HEPÁTICA – manifestações neurológicas associadas à insuficiência hepática grave.

Astenia; neurolépsia; excitação motora → Atonia muscular; arreflexia; coma...

As causas não estão claramente definidas.


Intoxicação aguda hepatogénica com grave incidência sobre o SNC → Sintomatologia sobreponível à da insuficiência
hepátia grave de base.

Patogenia: não está bem definida.


• NH3 e compostos fenólicos e indólicos.
• Desequilíbrio hidroeletrolítico.
• Edema vasogénico com alteração da permeabilidade da barreira hematoencefálica.

Sintomatologia: instalação brusca ou insidiosa e reversível, e evitável com a recuperação da condição funcional hepática;
alguns animais ficam mentalmente deprimidos e letárgicos de forma crónica, outros assintomáticos entre exacerbações;
astenia, anorexia, vómito, polidipsia, ptialismo, letargia, depressão, desorientação, agressividade, andar errante ou em
círculos, colapso, coma.

Histopatologia: edema cerebral vasogénico, alterações da permeabilidade vascular e das bombas de membrana.

HIPERTENSÃO PORTAL – com ocorrência de ascite associada.

Patogenia: quando o normal fluxo sanguíneo venoso abdominal, através da veia porta, fígado e veia cava, até ao coração
direito, está comprometido.

Pode ser:
• pós-hepática;
• hepática;
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 42

• pré-hepática.

Causas hepáticas:
• Alteração da proteinémia
o Diminuição da relação albumina/globulina.
o Diminuição da pressão oncótica.
• Dificuldade na circulação de retorno pela veia porta (obstáculos supra-, intra- ou sub-hepáticos).
o Aumenta a pressão hidrostática.

Sintomatologia: varizes abdominais, meteorismo, diarreia, taquipneia, oligúria, edemas, abdómen dilatado com macicez
de nível horizontal.

Diagnóstico:
1. Existência de líquido peritoneal?
2. Natureza do líquido – transudado/exsudado.
3. Causa.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 43

T(21/11) e T(28/11/2023) SEMIOLOGIA PANCREÁTICA

REVISÃO ANATOMOFISIOLÓGICA:
Relembrar que o pâncreas é constituído por uma componente exócrina (auxiliar na digestão) e endócrina (hormonal,
sobretudo ligada à glicose).

Parênquima glandular exócrino – glândula serosa tubulo-alveolar >98% parênquima.


Parênquima glandular endócrino – ilhéus de Langerhans.
Estroma com rede vascular – artérias celíaca e mesentérica cranial e veias pancreáticas → veia porta.
Inervação – nervo vago.

Controlo da secreção exócrina:


Nervosa – nervo vago, fase cefálica.
Hormonal – colecistoquinina, secretina, gastrina.

Localização: caudal ao estômago, aderente às primeiras ansas duodenais.

Secreção: através do ducto pancreático ou ducto acessório.

FUNÇÕES:
Endócrina – metabolismo glucídico.
Exócrina – digestiva.

PÂNCREAS EXÓCRINO

Suco pancreático rico em enzimas, entre elas proteases, amílase, maltase e lipases.
Proteases:
Tripsina – segregada na forma de tripsinogénio e ativada pela enteroquinase;
Quimiotripsina - segregada na forma de quimotripsinogénio;
Carboxipeptidase - para proteínas de grandes dimensões;
Nucleases;
Tripsina + Quimiotripsina + carboxipeptidade + nuclease - forma o complexo proteolítico pancreático;
Elastase e colagenase: digerem tecido elástico e colagénio;
Amilase: transforma amido em dextrina, e posteriormente em maltose e glucose.

NOTA: numa situação em que se “perca” o pâncreas além de ter de administrar insulina é necessário fornecer ao animal
as enzimas digestivas.

As enzimas encontram-se sob uma forma não ativa no pâncreas (a ativação enzimática intra-pancreática leva a uma
pancreatite aguda – há autodigestão); são posteriormente ativadas, ao chegarem ao meio intestinal.

Alterações de hipercloridia causam, não só alterações gástricas, mas também a nível intestinal, uma vez que haverá
dificuldade em tamponar a acidez proveniente do estômago.

ETIOLOGIA DAS ALTERAÇÕES PANCREÁTICAS:


O pâncreas é uma estrutura relativamente frágil, e tudo o que sejam reações inflamatórias pode trazer problemas.

• Afeção dos canais excretores


• Causas infecciosas
• Alérgicas
• Tóxicas Pancreatite aguda ou necrose asséptica
• Nutricionais
• Circulatórias
• Traumáticas
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 44

• Predisposição hereditária – algumas linhas genéticas com predisposição a pancreatites, certas neoplasias.

INSUFICIÊNCIA PANCREÁTICA EXÓCRINA

Etiopatogenia:

A causa mais frequente é a atrofia acinar, sendo de considerar que existem raças com maior predisposição para tal
(Pastor Alemão, Collie, Setter Inglês); pode, em alternativa, dever-se a pancreatite crónica com extensa destruição de
ácinos secretores, do estroma (com fibrose) e dos ilhéus de Langerhans (por vezes); ou então, também devido a
neoplasias.

Fisiopatologia:

Insuficiência pancreática exócrina pode estar relacionada com a falta de enzimas digestivas.

Falta de bicarbonato de sódio resulta num défice da neutralização


do HCl, e esse tamponamento deficiente do quimo vai afetar a
atividade enzimática, o que vai, por sua vez, afetar a digestão.

Este défice de neutralização do HCl também levará à precipitação


de sais e pigmentos biliares, e sem sais biliares há uma
consequente má digestão, porque não há correta digestão dos
lípidos, novamente afetando as enzimas digestivas.

Uma má digestão resulta em má absorção, tendo como possíveis


consequências: amilorreia, esteatorreia e perda de vitaminas
solúveis → aumenta a osmolaridade intestinal, aumenta o volume
de fezes e diarreia osmótica.

EXAMES COMPLEMENTARES LABORATORIAIS:

• Doseamento de enzimas pancreáticas (amilase, lipase) no sangue e na urina.


• Doseamento da FAS, bilirrubinas (despiste de obstrução de canais biliares extra-hepáticos).

Pacientes com insuficiência pancreática exócrina:


Deverão ter dietas de alta digestibilidade, com pouca gordura, evitar hidratos de carbono complexos.
Ingestão de açúcares de libertação lenta.
Devem fazer várias refeições ao dia para evitar sobrecarregar o pâncreas quando efetivamente se alimentam.

PANCREATITE AGUDA

Consiste em inflamação aguda ou hiperaguda do pâncreas, com ativação de enzimas intracelulares e rápida
autodigestão.

Etiologia:
• Idiopática
• Predisposição genética
• Trigliceridémia
• Dieta
• Obesidade
• Trauma
• Isquémia
• Farmacológica
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 45

Sintomatologia pouco específica, típica de processo inflamatório agudo.


Caracterizada por dor abdominal localizada na região de projeção topográfica do órgão, podendo irradiar e apresentar-se
como paroxismos dolorosos (dor aguda intensa, cólicas).
Náusea, vómito agudo, anorexia, depressão, febre, edemas e hemorragias, choque e colapso circulatório.
Choque de distribuição – défice de oxigenação e da nutrição de órgãos vitais. Vasodilatação periférica, o sangue fica
mais retido na periferia, sem chegar aos órgãos centrais.

Fisiopatologia:

Alteração da permeabilidade dos canais pancreáticos, fazendo com que haja extravasamento do suco pancreático com
proenzimas para o interstício do órgão, eventualmente para o peritoneu e estruturas adjacentes.

O facto de as enzimas se encontrarem em estruturas que não o pâncreas vai promover a sua ativação (tripsinogénio →
tripsina) e ocorrerá autodigestão enzimática. Libertação de histamina e consequente vasodilatação com aumento da
permeabilidade capilar → congestão → colapso circulatório

Há destruição progressiva do parênquima glandular e dos vasos do estroma → Hemorragia intraglandular.

A posterior passagem do exsudado sanguíneo rico em enzimas para o peritoneu irá desencadear uma peritonite;
desencadeiam-se processos autodigestivos em vários órgãos do organismo, o que vai levar a uma reação inflamatória
sistémica (verificando-se hipotensão, agravamento do colapso circulatório, estado febril, etc.).

Anatomopatologia, histopatologia e exames complementares imagiológicos:

Visualmente, o pâncreas apresentar-se-á tumefacto, com zonas hemorrágicas.

Histologicamente, infiltração neutrofílica, com áreas de edema e necrose.

Como exames complementares, pode recorrer-se a radiografia, ecografia, TAC e endoscopia.


Em ecografia, passa-se a ver hipogenecidade (devido à presença de sangue), possivelmente rodeado de algumas zonas
hiperecogénicas (devido necrose gorda peripancreática) na região do órgão; num raio-x com contraste há radiopacidade,
que fisiologicamente não se distinguiria.

Alterações laboratoriais:

Leucocitose com neutrofilia, monocitose (os monócitos aumentam, porém de forma mais discreta que os neutrófilos)
Aumento do hematócrito e das proteínas totais (vómitos, diarreia, febre levam a perdas de água, desidratação),
trombocitopenia (há processos hemorrágicos ou potencialmente hemorrágicos, pelo que há maior ativação das
plaquetas para os contrariar), vitamina K diminuída (porque é usada na síntese de fatores de coagulação) hiperglicemia
associada ao processo inflamatório, aumento da amílase e lípase em circulação, azotemia, ALT, FAS, bilirrubina (tudo
aquilo que são enzimas de outros órgãos também estarão aumentadas devido à lesão dos mesmos).
NOTA: HEMATÓCRITO e PT aumentam quando há desidratação.

PANCREATITE CRÓNICA

Inflamação progressiva do pâncreas (com maior ou menor grau de reversibilidade), ou então processo insidioso,
resultante de uma recuperação não completa de uma pancreatite aguda; crónica, mas também pode agudizar.
Existência de alterações funcionais e alterações orgânicas.

Etiologia:
• Inflamação primária ou remanescente de processos agudos.
• Processos imunomediados e autoimunes.

Sintomatologia: gastrointestinal, ocorrendo sobretudo em crises.


• Dispepsias,
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 46

• Diarreias (esteatorreia),
• Náuseas e vómitos,
• Dor localizada,
• Anorexia,
• Emaciação progressiva,
• Subicterícia

Anatomopatologia e histopatologia:

Pâncreas diminuído de tamanho, com produção reduzida de enzimas digestivas.

Histologicamente, observam-se alterações irreversíveis da arquitetura: fibrose, e infiltração por células mononucleares
(linfócitos).

Alterações laboratoriais:

Níveis enzimáticos no sangue:


α-amilase: origem no fígado, pâncreas e intestino delgado (a principal fonte em animais saudáveis). Isoenzima 3 (>
50% pancreática, maior responsável pela elevação sérica durante a pancreatite).
Aumentos ligeiros e moderados da amílase sérica apresentam pouca correlação com patologia pancreática.

Hiperamilasémia: numa pancreatite, pode verificar-se um aumento de 3-4x, até 7-10x em 12-48h.
Associada a processos de degenerescência acinar ou mesmo de necrose pancreática.
Pode também ter origem na obstrução de ductos pancreáticos, ou então o próprio processo inflamatório pode
levar a essa obstrução (pode estar na origem ou ser uma consequência).
Afeção renal, gastrointestinal, hepatobiliar.
A corticoterapia continuada também leva alterações a nível do metabolismo celular do organismo e, em
consequência, pode resultar numa predisposição para a pancreatite.

Lipase: origem no pâncreas e mucosa gástrica.


Podem existir situações em que a lípase esteja em níveis normais (em cerca de 1/3 dos cães com pancreatite –
dificulta o diagnóstico).
Por vezes é difícil de detetar a lipase, pelo que recorremos a péptidos de degradação da lípase na circulação, e
utilizamos métodos imunológicos para os detetar (cPLI = pancreatic lipase immunoreactivity, teste com
especificidade pancreática no cão).
↑ cPLI – ocorre com pancreatite.
↓ cPLI – redução da massa funcional pancreática
hepática.

Hiperlipasémia: aumento em até ou mais 3x em 24h, em casos de pancreatite.

Outras causas: afeção renal, corticoterapia, peritonite, gastrite, obstrução intestinal, manipulação visceral em
laparotomia*, afeção hepática e neoplasia (desconhece-se a fonte da lípase aumentada – Duncan & Prasse, 2011);
carcinoma hepático (desenvolvimento de massa que faça compressão sobre o pâncreas e respetivos canalículos) e
pancreático.

NOTA (*): Quando se fazem cirurgias abdominais, é necessário ter cuidado de preservação das estruturas, sob risco
de causar algum dano manipulativo – causa iatrogénica de uma pancreatite.

TLI (trypsin-like immunoreactivity): métodos imunológicos.


• Insuficiência pancreática exócrina.
• Pancreatite necrótica (inconsistente).

Meia-vida curta (≈ 30 min.)


Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 47

Estes péptidos podem não estar tão aumentados quanto seria de esperar em situações de pancreatite – recorrer a
ambos, TLI e CPLI para diagnóstico, e os próprios doseamentos da amílase e lípase pancreática.

Péptidos de ativação da tripsina:


A sua elevação no soro é um possível indicador de elevação sérica da tripsina.
Apenas em pancreatites graves no cão, ou casos de afeção renal severa.

PÂNCREAS ENDÓCRINO

Composto por ilhéus de Langerhans, constituídos por células produtoras de hormonas (sendo a insulina a mais
importante destas*). Esta porção glandular endócrina do pâncreas funciona em estreita relação com a circulação.
Células α – glucagon.
Células β – insulina.
Células Δ – somatostatina (efeito endócrino, com papel regulador da libertação de insulina).
Células PP – polipéptido pancreático (efeito exócrino – antagonista da CCK, inibindo a secreção pancreática e
estimula a secreção gástrica).
NOTA (*): Tanto que quando há necessidade de retirar o pâncreas, aquilo que é necessário suplementar é sobretudo insulina.

INSULINA: hormona com efeito hipoglicemiante. É produzida em resposta a concentrações elevadas de glicose na
circulação (hiperglicemia), promovendo a permeabilidade da membrana celular à glicose e a glucogénese,
primordialmente sobre o fígado, músculo esquelético e gordura. Por oposição, o glucagon tem efeito hiperglicemiante.

Quando existe excesso de glucose em circulação, o que se pretende é armazená-la no fígado.


Assim sendo, a insulina promove o anabolismo de glúcidos, gorduras, proteínas e ácidos nucleicos, ao potenciar a
entrada de glucose nas células.

Não é, contudo, necessária para a translocação de glucose para o interior de eritrócitos, neurónios, enterócitos, células
β, células tubulares renais e células do cristalino.

Há hipoglicémia quando há uma falha no feedback negativo células β – não cessa a produção de insulina e continuam a
reduzir os níveis de glicose em circulação.

BREVE REVISÃO da atividade metabólica da insulina e de outras hormonas com efeitos opostos:
INSULINA GLUCAGON GLUCOCORTICOIDES CATECOLAMINAS SOMATOSTATINA PROGESTERONA
Efeito Efeito Promovem a Aumentam a Inibe a secreção de Oposição à insulina
hipoglicemiante. hiperglicemiante. gluconeogénese, a gluconenolise, a glucagon e insulina. ao estimular a
Promove a glucogénese, a gluconeogénese e secreção de
glucogenolise lipólise e inibem a a hormona de
hepática e a síntese de proteína lipólise. crescimento pelo
gluconeogénese,
muscular. epitélio dos ductos
elevando o nível de
mamários.
glucose circulante.
Lipólise, cetogénese.

DIABETES MELLITUS
NOTA: abordamos de forma simplificada (bases).

Temos dois tipos principais:

Tipo I – há falta de produção de insulina, podendo ser devida a uma alteração destrutiva das células β, com progressiva
(ou rápida, p.e. quando há uma agressão autoimune) perda de produção de insulina. Predisposição genética comum no
cão.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 48

Tipo II – de dois subtipos:


a) Resistência tecidular periférica à insulina – alteração conformacional dos recetores ou inexistência de número
suficiente de recetores, que não permite fixar insulina. O organismo continua a produzir insulina porque a
glicémia se mantém, porém de forma ineficaz. Este tipo de diabetes, com alteração do número de recetores,
surge comummente devido ao ambiente (hábitos alimentares). Predisposição genética comum no gato.
b) Disfunção das células β – produção de insulina deficiente/ineficaz (codificada por genes que dão uma
conformação alterada da própria hormona).

Tanto em diabetes tipo I, como IIb, a administração de insulina exógena é solução.

DIABETES MELLITUS TIPO I

DMID (insulino-dependente) – há uma perda intensa e brusca da produção de insulina, sendo necessário fornecer
insulina.

DMNID (não-dependente) – há uma perda de produção gradual ou primeiras fases, sendo possível estimular a produção
de insulina em vez de administrar insulina exógena, recorrendo a fármacos hipoglicemiantes não insulínicos (na verdade,
nos nossos animais, os únicos casos em que recorremos a isto são em aves; nos mamíferos domésticos, normalmente
conseguimos regular situações de diabetes NID através de uma dieta equilibrada, com glúcidos de libertação lenta; se for
ID, com administração de insulina).
NOTA: fármacos com substâncias hipoglicemiantes não insulínicas não revelaram bons resultados nos mamíferos
domésticos – picos de hipoglicemia muito extremos.

DIABETES MELLITUS TIPO II

Podemos ter uma secreção de insulina baixa, normal ou aumentada (aumentada quando há alteração dos recetores ou
produção de insulina alterada – continua a haver hiperglicemia e o há tentativa de compensar, produzindo mais insulina).

Resistência tecidular periférica à insulina – processo não é dependente da insulina (DMNID).

Disfunção das células beta – a insulina produzida não é eficaz, sendo o problema resolvido com administração de doses
de insulina exógena (DMID).

Etiologia da Diabetes Mellitus:

• Genética (predisposição hereditária)


• Insulite imunomediada (inflamação dos ilhéus de Langerhans – processo autoimune)
• Pancreatite (autodigestão do pâncreas pelas enzimas ativadas)
• Obesidade (associada a DM tipo II)
• Infeções (processos infecciosos sistémicos ou pancreáticos)
• Fármacos (hormonas glucocorticóides e, p.e., acetato de megestrol, que era muito utilizado como anovulatório
nas gatas)

Sintomatologia:

• Polidipsia
• Poliúria hiperdensa (mas não mais escura) e glucosúria – a glicemia aumenta para além do limiar de absorção e a
glucose persiste nos tubos contornados, apresentando ação osmótica.
• Polifagia
• Emaciação
• Desidratação
• Hepatomegalia com esteatose
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 49

• Lesões oculares (nomeadamente cataratas)


• Vómito e diarreia
• Taquipneia
• Arritmias cardíacas

NOTA: doença dos 3P’s (polidipsia, poliúria e polifagia).

Formação de cataratas associada a diabetes:


Nos humanos e nos cães o nível de aldose redutase é mais elevada comparativamente à dos gatos, por isso é que estes
últimos não desenvolvem cataratas diabéticas (nem senis).
Esta enzima, através da redução da glucose (→ sorbitol), provoca a formação de grupos alcoólicos em excesso (formam-
se poliálcoois), causadores de instabilidade do cristalino (por degradação das proteínas na sua constituição), levando à
sua opacidade.
O uso de fármacos inibidores da aldose-redutase tem sido benéfico, retardando a formação da catarata por
degenerescência da proteínas do cristalino.

Alterações laboratoriais:

• Hiperglicemia
• Glucosúria
• Cetonúria
• Proteinúria
• Acidémia
• Hiperlipémia
• Prova / curva de glicemia
• gHb e frutosamina (*)

(*) Hemoglobina glicada e frutosamina:


Para avaliarmos o histórico do controlo da glicemia (ou seja, se o controlo da glicemia tem sido bem feito), é importante
dosearmos a hemoglobina glicada/glicosilada (níveis de hemoglobina glicada elevados significam que nas duas semanas
anteriores, terão havido sistematicamente níveis de glicémia elevados devido a uma má conjugação das administrações
de insulina e da dieta).
✓ A ligação da hemoglobina glicada é estável e permite avaliar o histórico de glicemia.

Frutosamina é o composto que se liga a proteínas plasmáticas (designadamente a albumina) – a glucose ao ligar-se aos
grupos aminados dos aminoácidos das proteínas, vai formar um grupo frutose.
Quando há dificuldade em determinar a hemoglobina glicada, podemos avaliar a frutosamina em circulação, cujos níveis
elevados significam que, no período prévio de 5/6 dias antes, houve sistematicamente níveis de glicémia elevados,
resultando numa maior ligação da glucose à albumina.

Diagnóstico diferencial:

• Nefropatias
• Hiperadrenocorticismo
• Polidipsia não diabética
• Diabetes insípida (↓ ADH ou recetores T. Contornados)

DIAGNÓSTICO POSITIVO: doseamento de glucose sérica + glucosúria + cetonúria.


Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 50

HIPERINSULINISMO

Etiologia: neoplasias de células β funcionais – podem produzir insulina funcional, para além de outras hormonas.

Sintomas: afeção neurológica convulsiva grave, por hipoglicemia.

Diagnóstico: doseamento da glucose + doseamento de insulina


Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 51

MATÉRIA DAS AULAS PRÁTICAS:

P5 (17/10/2023) – PROVAS LABORATORIAIS

Dentro da prática clínica, muito frequentemente, é necessária a realização de diagnósticos complementares para
conseguir um diagnóstico completo.

Citologia – analisa-se conteúdo proveniente de punção aspirativa de agulha fina. Perde-se a arquitetura do tecido, apesar
de estarem presentes os mesmos tipos de células. (Tem a vantagem de ser rápido).

Histologia – a arquitetura dos tecidos mantem-se nos cortes observados. (Processo mais demorado).

Análises de sangue, urina, etc…

IDENTIFICAÇÃO DE AMOSTRAS:

• Remetente
• Proprietário
• Animal (resenho)
• Material (tipo, momento da colheita e conservação)
• Determinações requeridas (hematologia, bioquímica, bacteriologia, etc.)
• Elementos clínicos.

A urina do bovino, no momento da recolha, é límpida. Com o arrefecimento, precipita carbonato de cálcio e torna-se
turva.
A urina do cavalo é sempre turva, mesmo aquando da colheita.

COLHEITA DE AMOSTRAS:

✓ O que colher? Sangue, urina, fezes, cerúmen, líquido cefalorraquidiano, líquidos de derrame, transudados,
exsudados, tecidos de biópsia ou exérese, pelos, penas, raspados cutâneos.
✓ Técnica de colheita
✓ Material

└ COLHEITA DE SANGUE:

Espécie Onde?
Bovinos Veias jugular, coccígea.
Equinos Veia jugular
Pequenos ruminantes Veia jugular
Porcos Adultos Veias jugular e marginal da orelha.
Leitões Veias cefálica, safena e jugular.
Cão e gato Veias cefálica safena e jugular.
Aves Veia cubital, tarso-metatársica, jugular direita, coração e pela via cervical.
(as veias, no geral, não são muito boas para a colheita de sangue)

PREPARAÇÃO DAS AMOSTRAS:

Utilização de material bem lavado, passado por água destilada e seco, ou, preferencialmente, material descartável.

Amostras de sangue total – obtido com recurso a anticoagulantes.

Plasma – sobrenadante do centrifugado de sangue (cerca de 500g, 10 min) com anticoagulante (90% água + 10%
substâncias em solução).
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 52

Soro – sobrenadante sanguíneo, após coagulação (= plasma sem fibrinogénio nem protrombina, com trombina).
Volumes previstos, por cada 10 ml sangue:
• Equídeos = 5-6 mL
• Suínos = 5 mL
• Bovinos = 3-5 mL
• Cão = 4-5 mL

NOTA: Plasma ≠ Soro: o plasma é a fração líquida do sangue com fibrinogénio, e o soro sem.

ESTABILIDADE DAS AMOSTRAS:

Caso não se faça análise precoce, necessidade de conservação.

Estabilidade por poucas horas Velocidade de sedimentação (VS), amoníaco, bilirrubinas, glucose, SDH.
Hemoglobina, creatinina – até 24h.
Estabilidade a +4oC
Ureia, triglicéridos – 2 a 3 dias.
A maioria dos parâmetros aguentam várias semanas (exceções: hemoglobina,
Estabilidade em congelação (-20oC)
LDH, SDH).

p.e. amónia é muito volátil, evapora rápido; a bilirrubina é um pigmento fotossensível, degradando-se se deixada à luz.

NOTA: cuidado com a apresentação das amostras: tampas mal fechadas = fonte de contaminação.

INFLUÊNCIA DA HEMÓLISE E HIPERLIPÉMIA NAS PROVAS LABORATORIAIS:

Soros hemolisados ou hiperlipémicos interferem na determinação de proteínas totais, glucose, lípidos totais,
colinesterase.

Soros hemolisados interferem na determinação de colesterol, fosfatase alcalina, bilirrubina, creatinina, ferro, ALT, AST,
LDH, ureia, fósforo inorgânico.

INFLUÊNCIA DOS ANTICOAGULANTES NAS PROVAS LABORATORIAIS:

EDTA (1mg/mL sangue): útil para toda a hematologia.

Heparina (75 U/mL sangue): inadequada para VS e provas de coagulação.

Citrato de sódio (38 mg/mL/sangue): apenas para VS. Inadequado para provas com participação de iões Na, K, Ca e Mg
(creatinina, ferro, lípidos totais, glucose e ácido úrico).

• Contagem – hemograma; utiliza-se EDTA em vez de heparina sódica, fazendo com que os eritrócitos adotem uma
conformação esférica sem que o volume se altere (esferificação isovolumétrica), e tornando assim a contagem
mais fiável.
• Doseamentos de anticorpos
• Complement function tests
• Provas da função celular – ao utilizar sangue, é necessário que ele não coagule; usa-se, para tal, heparina sódica
como anticoagulante (menos tóxica; impede o desdobramento da protrombina em trombina e não coagula).
• Provas bioquímicas – baseadas em reações enzimáticas. Utiliza-se soro; com plasma, as provas estão limitadas à
utilização de anticoagulante que se use (utilizar heparina).
└ Se as provas bioquímicas são de base enzimática, há 3 cuidados a ter:
• pH da amostra
• temperatura
• se o paciente comeu ou não antes (p.e. valores de glucose; lipidémia, que interfere nas determinações)
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 53

FIABILIDADE DAS AMOSTRAS:

• É importante saber de alguma eventual toma de fármacos do paciente (p.e. inibidores enzimáticos poderão
comprometer algumas provas).
• Via de administração intramuscular e enzimas músculo-específicas.
• Outras condicionantes: alimentares, ambiente, exercício físico.

SEGURANÇA:

Manipulação de amostras e reagentes nas condições adequadas (p.e. hotte).

CONTROLO DE QUALIDADE:

Normas de certificação de qualidade ISO.

Controlos internos e externos ao laboratório.

Média (M) e Desvio Padrão (SD)


Limite inferior e superior do intervalo de referência: geralmente calculados como, respetivamente, M-2SD e M+2SD
• Os valores de aproximadamente 95% dos animais dentro da população de referência estarão incluídos nesse
intervalo.
• Os valores de cerca de 5% dos animais da mesma população cairão fora do intervalo de referência.

P (21/11/2023) – ANÁLISES SANGUÍNEAS


NOTA: não foi disponibilizada nenhuma apresentação – apenas anotações da aula.

Análises sangue (é o que focamos) Análises urina


Hematologia e bioquímica Citologia e bioquímica

Hemograma: faz-se contagem de leucócitos (brancos totais, linfócitos, neutrófilos, basófilos, monócitos; e depois faz
uma conta percentual*), eritrócitos, constantes eritrocitárias, dosear hemoglobina.
(*) Existem variações da quantidade total de leucócitos, mas a proporção tem muito a ver com o tipo de afeção.

└ Como é que a máquina faz a contagem?

Citometria de fluxo: técnica utilizada para contar, examinar e classificar partículas microscópicas suspensas em meio
líquido em fluxo. Basicamente, as células passam “em fila indiana” umas atrás da outras por um fluxo laminar, no
meio de uma luz laser e um fotodetetor. Se uma célula for maior, faz uma sombra maior, sendo assim detetada.
Forward scatter.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 54

Particularidades morfológicas dos diferentes tipos de células são identificadas por outros detetores, laterais, que
captam as dispersões da luz (refratada) que derivam das variações morfológicas das células. Side scatter.

Situação não fisiológica – situações em que eritroblastos (eritrócitos imaturos mais pequenos) são alocados, e máquinas
mais simples não os distinguem, contabilizando-os como linfócitos. Máquinas mais modernas até chegam a dar a
informação (alarme) de possibilidade de presença de eritroblastos. Fazer um esfregaço e contar 100, descontando à
contagem de linfócitos a proporção de eritroblastos para aí sim obter um valor correto.

NOTA: estas máquinas dificilmente distinguem agregados plaquetários.

Como é que a máquina diferencia entre populações de leucócitos?


Para se visualizar os leucócitos, é necessário lisar os eritrócitos → liberta-se hemoglobina, que pode inclusive ser
doseada pela máquina.
Os leucócitos vão ser colocados numa solução com um substrato que vai penetrar neles e reage com os grânulos
contendo peroxidase (nas células que os têm) – ficam mais coradas as células que têm mais grânulos com
peroxidase. Perante granularidades iguais, a distinção é feita pela dimensão.

Hematócrito por centrifugação, usando tubos capilares (microhematócrito): é um método melhor, mais preciso porque
dá exatamente o volume de células no volume de sangue (o outro método, do contador hematológico é apenas uma
amostra, sabe o volume de sangue e sabe a diluição, depois multiplica a contagem para fazer a proporção – está sempre
sujeito a erros de calibração da máquina).

MCV = volume globular medio


MCH = hemoglobina globular media (quanto de hemoglobina tem, em média, cada eritrócito)
MCHC = concentração media de hemoglobina corpuscular

P (07/11/2023) – EXAMES COMPLEMENTARES DIGESTIVOS

Síndrome diarreia: consistência das fezes diminuída, aumento da frequência das defecações, cor poderá ser amarelada.
Podemos ter diarreia por má digestão, consequentemente, má absorção; enterite.

01. PESQUISA DE GORDURA NAS FEZES


Fezes esteatorreicas têm aspeto brilhante, mais claras por estarem diluídas, por vezes vê-se um aspeto mais gelatinoso.
Encontrar-se-á, em flutuação, a gordura a flutuar.

1. Visualização macroscópica – flutuação.


2. Visualização microscópica
2.1. A fresco
2.1.1. Misturar igual volume de fezes com solução salina
fisiológica.
2.1.2. Sobre uma lâmina, aplicar 1-2 gotas da suspensão obtida,
cobrir com uma lamela e observar com pequena
ampliação.
2.2. Com coloração – podemos corar as gorduras com solução de Sudan
saturada.
2.2.1. Gorduras totais (triglicéridos e gorduras neutras)
2.2.1.1. Sobre uma lâmina misturar igual volume de fezes
frescas com solução saturada de Sudan III ou IV em
etanol a 95 %, até obter uma suspensão mais ou
menos homogénea.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 55

2.2.1.2. Observar ao microscópio com a objetiva de 40x. Gotículas de gordura não digerida presentes
aparecem com dimensões variáveis, refringentes, coradas de laranja avermelhado. Mais de 3 a 5
gotículas sudanófilas/campo significam esteatorreia.
2.2.2. Gorduras digeridas – ácidos gordos livres (significa que ou houve digestão e não absorção; ou que o
animal tem, p.e. um problema de pele e está a fazer tratamento com ácidos gordos, como ómega-3 e
tem excesso derivado disso).
2.2.2.1. Misturar pequeno volume de fezes com igual volume de solução de ácido acético a 36%, sobre
uma lâmina.
2.2.2.2. Juntar algumas gotas de solução de Sudan III ou IV e cobrir
com uma lamela.
2.2.2.3. Levar a suspensão à ebulição 2/3 vezes, por passagem à
chama.

A gordura digerida presente aparece como gotículas de cor


vermelha-alaranjada, formando espículas ou fitas da mesma cor ao
arrefecer. Má absorção de gorduras, com esteatorreia, origina
pesquisa negativa de gorduras não digeridas (2.2.1) e presença de
10 ou mais gotículas neste teste.

02. PESQUISA DE AMIDO NAS FEZES

Faz-se uma suspensão com lugol (extrato aquoso de iodo; cora o amido de azul, e como
é denso, fica muito escuro, quase preto), e o amido, quando presente, surge na forma de
grânulos negros azulados. NOTA: a ingestão de papel pode originar falsos positivos. A
interpretar em conjunção com outros testes de má digestão.

1. Misturar partes iguais de fezes e solução de Lugol a 2%.


2. Colocar algumas gotas sobre uma lâmina, cobrir com uma lamela e observar ao
microscópio.

03. PESQUISA DE PROTEÍNA (FIBRAS MUSCULARES NÃO DIGERIDAS) NAS FEZES

Efetua-se apenas em animais com dieta cárnea (manda-se o tutor dar carne crua ao animal). Se tiver um défice
proteolítico, vão surgir fibras musculares não digeridas nas fezes.

1. Fazer um esfregaço de fezes frescas


2. Corar durante alguns minutos com solução de azul de metileno a 1% e observar
ao microscópio, pesquisando fibras musculares não digeridas, que apresentam a
estriação típica.
Positivo → creatorreia.

04. PROVA DE PESQUISA DE TRIPSINA NAS FEZES (Prova de digestão da gelatina)


Tripsina é produzida no pâncreas a lançada com o suco pancreático – em situações de défice do pâncreas exócrino,
normalmente há deficiência das 3 enzimas pancreáticas (tripsina, amílase e
Propriedades das enzimas:
lípase); raras são as situações de origem genética em que há inativação de
apenas uma delas. • Têm temperaturas e pH ótimos.
• Atuam em meios hidrossolúveis.
Défice pancreático exócrino → falta tripsina nas fezes.
• Atuam em concentrações baixas.
• São catalisadoras, não se gastam nas
reações (não são reagentes nem
produtos de reação).
• …
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 56

Importante o uso de fezes recém-emitidas, porque senão a ação da tripsina pode ser confundida com a das protéases
bacterianas, conduzindo a resultados erróneos.

1. Diluição, nunca mais de 1g de fezes (muito frescas ou congeladas) para 10 de solvente, em bicarbonato de sódio
a 5%. O objetivo é alcalinizar a massa fecal diluída porque a tripsina funciona a pH 8,3.
2. Juntar 1mL da suspensão fecal a 4mL de gelatina a 5%, aquecida a 37oC (primeiro funde-se a gelatina, depois é
que se leva aos 37oC).
3. Incubar 1h a 37oC, e mais 20 minutos a 4oC – inicialmente, a 37oC para potenciar a atuação da tripsina,
posteriormente, os 4oC servem para que a gelatina, caso não tenha sido digerida, gelifique.

A não gelificação da mistura indica a presença de protéases fecais. A principal é a tripsina (presente nas fezes em
condições fisiológicas) → se houver uma deficiência pancreática exócrina, a amostra fica sólida; se houver presença de
tripsina, a amostra fica líquida.

NOTA: como mencionado, também as enzimas proteolíticas bacterianas estão presentes nas fezes, que se não frescas, podem
atingir teores capazes de falsear os resultados. As fezes podem ser diluídas até 1:2000 para confirmação da presença de tripsina.

P(28/11/2023) PROVA DE EXCREÇÃO DA BROMOSULFOFTALEÍNA (BSP)

Após administração intravenosa, a BSP liga-se à albumina sérica, sendo captada pelo fígado e eliminada pela via biliar.
Contudo, em situações de insuficiência hepatocelular (p.e. hepatite, cirrose, intoxicações, esteatose ou estase
circulatória), a taxa de eliminação da BSP diminui, persistindo uma concentração sérica mais elevada que seria de
esperar para os tempos de determinação padrão.

Assim sendo, este teste permite avaliar a capacidade excretora hepatocelular, sendo de especial interesse nas afeções
pré-ictéricas.

PROTOCOLO:

1. Cateterizar uma veia e colher uma amostra de sangue para tubo seco ou com gel retractor, antes da
administração da BSP.
2. Pelo mesmo cateter, administrar a dose adequada de solução de BSP (lipossolúvel, dada com solvente
hidrossolúvel; a suspensão deve ser muito bem homogeneizada antes da administração).
Dose:
Em grandes animais = 5 mg/Kg de peso vivo.
Em cães = 2 mg/Kg de peso vivo.
3. Cateterizar outra veia e proceder às colheitas de sangue para doseamento no soro:
Equino e bovino – aos 3 e 15 minutos após a administração.
Cão – aos 3 e 30 minutos após a administração.
NOTA: 3 minutos → concentração máxima em circulação.
30 minutos → fisiologicamente, não deverá existir mais que 10% em circulação.
4. Deitar 1 mL do soro obtido de cada amostra (aos 0, 3 e 30 minutos, no caso do cão) em cada um dos tubos de
ensaio.
5. Adicionar a cada tubo 8 mL de soro fisiológico e 0,5 mL de hidróxido de sódio a 10%. Homogeneizar.
6. Medir as extinções em espetrofotómetro com comprimento de onda de 578 ou 580 nm, tendo como absorção 0
a da amostra antes da administração da BSP.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 57

6.1. Em alternativa, em caso de necessidade por indisponibilidade de um espetrofotómetro, a leitura pode ser
efetuada por método visual simples (à vista desarmada) ainda que a mensuração assuma um caráter pouco preciso
(apenas se é positivo ou negativo).

Protocolo alternativo:

Após a separação das amostras de soro, adicionam-se diretamente (ao soro) algumas gotas de uma solução de NaOH a
10%.

Se ocorre apenas turvação significa que a retenção da BSP se encontra entre 10 e 20% (limite fisiológico máximo), em
retenções superiores, a amostra cora de violeta.

Esta técnica pode apresentar resultados falsos, positivos ou negativos, sobretudo nas seguintes situações:

Falsos positivos: Falsos negativos:


Hiperbilirrubinémia, por inibição da excreção da BSP (a BSP Sobretudo em situações de administração de tolbutamida,
é degradada praticamente pela mesma via metabólica que sulfonamidas, esteroides não estrogénios e ácido
a bilirrubina). sulfonúrico.
Administração de contrastes iodados para imagiologia.
Diminuição da circulação sanguínea intra-hepática.
Administração de estrogénios ou barbitúricos.

P (14/11/2023) – SEMIOLOGIA DOS PRÉ-ESTÔMAGOS DE RUMINANTES E ANÁLISE DO LÍQUIDO RUMINAL

O pH ruminal depende da composição e quantidade de ácidos gordos voláteis (AGV) produzidos, da sua absorção e da
produção de saliva (também importante, rica em substâncias tampão: fosfato e bicarbonato).

A proporção das concentrações ruminais dos ácidos acético (C2), propiónico (C3) e butírico (C4) varia:
→ 70:20:10 em dietas ricas em alimentos fibrosos.
→ 60:30:10 em dietas ricas em alimentos concentrados.
NOTA: pode estar presente ácido láctico em situações de acidoses subagudas graves.

Uma dieta com elevada concentração energética produz uma quantidade total de AGV superior à obtida com uma ração
rica em fibras.

90% dos AGV produzidos são absorvidos no rúmen.

O pH ruminal ótimo varia de acordo com a aptidão do animal:


→ 6,1 - 6,6 para bovinos leiteiros
→ 5,5 - 6,1 em bovinos de engorda

O pH tende a baixar quando as dietas são mais ricas em alimento concentrado, pelo que bovinos de engorda
(tendencialmente mais suplementados com dietas ricas em concentrado, cujo principal elemento é o amido, muito
frementescível) têm um pH fisiológico mais ácido.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 58

Por outro lado, alimentações predominantemente fibrosas também serão influenciadas:

Aumento do consumo de carboidratos estruturais (celulose, Aumento do consumo de carboidratos não estruturais (amido e
hemicelulose, pectina e lenhina) estimula o crescimento e açúcares solúveis) estimula o crescimento e a multiplicação de
multiplicação de microrganismos celulolíticos (capazes de microrganismos amilolíticos, com fermentações propiónicas e
degradar a celulose), com fermentações predominantemente butíricas (ou mesmo láticas se pH < 5,5), o que estimula menos
acéticas e maior produção de saliva → aumento do pH ruminal. a produção de saliva → diminuição do pH ruminal.

A temperatura ruminal ronda os 38 a 42 oC, mantendo-se próxima da temperatura corporal devido aos mecanismos
termorreguladores do animal, e correspondendo a valores adequados à multiplicação dos microrganismos ruminais.

A osmolaridade ruminal é normalmente de 280 mOsm/L (ronda os 240-300 mOsM), sendo, portanto, inferior à do
plasma e líquido extracelular (300mOsm/L). NOTA: fisiologicamente, o fluxo osmótico de água é para fora do rúmen.

População microbiana do rúmen: densa população microbiana, variável na sua composição e número, em função,
sobretudo, do regime alimentar. Estéril à nascença, o rúmen começa a ser povoado desde o nascimento por bactérias e,
mais tarde, protozoários e fungos, apresentando o vitelo, uma população microbiana normal às 6 semanas.

Importante reter que todos os microrganismos no rúmen são anaeróbios (estritos, se bactérias):

Bactérias: Protozoários: Fungos:


8 11 5 6 5 6
10 - 10 / mL de conteúdo ruminal (>200 10 – 10 / mL de conteúdo ruminal. 10 – 10 / mL de conteúdo ruminal.
espécies). Anaeróbios. São anaeróbios e segregam enzimas com
Predominam, fisiologicamente, bactérias Na maioria, ciliados. atividade celulolítica e hemicelulolítica
Gram (-), e cocos. Capazes de degradar grande variedade de Aumentam a fragilidade da estrutura
Classificação de acordo com o substrato substratos alimentares e ingerir grande fibrosa dos alimentos, favorecendo a
que são capazes de degradar (celulolíticas, número de bactérias, as quais colonização microbiana e subsequente
hemicelulolíticas, amilolíticas, utilizadoras transformam em componentes da sua digestão pelas bactérias ruminais, e
do açúcar, proteolíticas e lipolíticas). célula e em metabolitos, alguns dos quais reduzem o tamanho das partículas
serão posteriormente aproveitados pelo alimentares, influenciando o tempo de
animal hospedeiro. permanência do alimento no rúmen.

01. Bactérias que degradam carboidratos estruturais


Bactérias celulolíticas, de crescimento lento, mais sensíveis às variações de pH (atividade a intervalo de pH 6,3-7)
Utilizam o NH3 como fonte de azoto.
O principal AGV produzido é o acético, contribuindo para o aumento do teor de gordura do leite.

02. Bactérias que degradam carboidratos não estruturais (facilmente fermentescíveis)


Bactérias amilolíticas, de crescimento rápido, menos sensíveis à diminuição do pH.
Utilizam como fontes de azoto, aminoácidos e péptidos (66%), e NH3 (33%).
O principal AGV produzido é propiónico (glucogénico) contribuindo para o aumento da glucose e lactose e,
consequentemente, da quantidade de leite produzida.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 59

NOTA – ACIDOSES:
Quando surgem, estas situações devem ser abordadas num contexto de “medicina de grupo”, é provável que existam
mais animais afetados, devido ao arraçoamento do alimento.
NOTA2: Protozoários têm capacidade de degradar alguns substratos que as bactérias não, sendo, por isso, muito
importantes.

COLHEITA DE FLUÍDO RUMINAL

INDICAÇÕES PARA COLHEITA DE FLUÍDO RUMINAL:

• Diagnóstico de disfunção microbiana (indigestão).


• Diagnóstico de refluxo ruminal / abomasal.
• Pesquisa de tóxicos ingeridos / fármacos.
• Esvaziamento ruminal (em caso de sobrecargas ou impactações; geralm. casos em que a dieta é muito fibrosa).
• Colheita de conteúdo ruminal fresco de animais saudáveis, com finalidade terapêutica.

PARÂMETROS AO NÍVEL DA ANÁLISE DO LÍQUIDO RUMINAL

PARÂMETROS DE DETERMINAÇÃO IMEDIATA:

• Cor, odor e consistência


• pH
• Redução do azul de metileno
• Sedimentação (matéria e protozoários) e flutuação
• Acidez titulável
• Concentração de cloretos

PARÂMETROS DE DETERMINAÇÃO LABORATORIAL:

• Fermentação da glucose (c/ produção de gás)


• Redução de nitritos
• Capacidade tampão
• Concentração de AGV e ácido lático
• Concentração de amónia
• Contagem microscópica de protozoários

COLHEITA:

• Aspiração por sonda – há possibilidade de contaminação por saliva, o que faz aumentar o valor de pH (face ao
pH ruminal real).
• Ruminocentese – o volume recolhido será menor, mas o pH correto (sem contaminação).

Quando devemos colher?


Cerca de 2 a 4h após ingestão de concentrado.
4 a 7h após o alimento (unifeed)
Logisticamente, isto é fácil de obter em animais estabulados; a campo não há esse controlo e faz-se no momento
em que se conseguir.

A que animais?
2 grupos (de 6 animais, se possível)
Vacas no peri-parto: máximo 20 dias de ração de lactação.
Vacas adaptadas à ração de lactação: 45 – 150 dias de lactação.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 60

NOTA: Vacas em peri-parto têm uma maior tendência a desenvolver acidoses já que, perto do pico da lactação, são
tipicamente alimentadas com alimento muito concentrado – é importante estarmos atentos às mais discretas
manifestações (que muitas vezes até são subclínicas) a nível metabólico, seja acidoses e/ou hipocalcemias.

01. COLHEITA DO FLUÍDO RUMINAL POR SONDA:


1. Entubação nasogástrica da vaca (necessário ouvi-la a deglutir o tubo).
2. Enviar ar pelo tubo (estimula mecanismo de bomba).
3. A vaca deverá estar com a cabeça baixa e, por gravidade, o líquido vai descer.

02. COLHEITA DO FLUÍDO RUMINAL POR RUMINOCENTESE:

Na imagem, local assinalado com um círculo pequeno com um ponto no centro.


Deteta-se o local por percussão – som submaciço (onde está a porção líquida no interior do rúmen).

ANÁLISE PROPRIAMENTE DITA DO FLUÍDO RUMINAL

01. pH DO FLUÍDO RUMINAL:

Através de uma tira de papel indicador (limites de 4,0 a 7,0), ou potenciómetro de pH, portátil.
Deve ser avaliado o mais rápido possível após a colheita.

• ≤ 5,5 – anormal, acidose


• 5,6 – 5,8 – marginal
• ≥ 5,9 – normal

Diagnóstico positivo de alteração → se pH ≤ 5,5 em 2 dos 6 animais.


Se o pH estiver anormal em 2 das 6 recolhas (1/3 dos animais) é necessário investigar o problema; indicará possível
disbiose.

02. PROVA DE REDUÇÃO DO AZUL DE METILENO (Potencial oxi-redutor):

1. Numa proveta ou tubo de ensaio, deitar 1 mL de solução de azul de metileno a 0,03% .


2. Adicionar 20 mL de fluido ruminal recém colhido.
3. Medir o tempo necessário à descoloração.

Há sempre uma parte do azul de metileno que não é reduzida – isto porque as bactérias são anaeróbias e essa porção
mais superficial encontra-se em contacto com o ar.
Semiologia Médica I – Bárbara Laranjo (2023/24) 61

O potencial redox é conferido pela fermentação microbiana e sistemas enzimáticos vegetais.

Tempo para a descoloração Alimento


3 min. Misto feno-concentrado
1 min. Concentrado +++
3-6 min. Feno
Inanição, alimentos com baixa digestibilidade, fibrosos ou
> 6 min. (15 +)
inatividade da flora ruminal.

03. EXAME DOS PROTOZOÁRIOS:

• Exame à vista desarmada – observação apenas de grandes protozoários (230 μm) vivos.
• Exame à lupa – protozoários pequenos, médios, grandes vivos.
• Exame ao microscópio (baixa ampliação) – observação de protozoários ciliados e flagelados, vivos ou mortos.

Vitalidade dos protozoários: os protozoários médios são os últimos a morrer; entre os pequenos e os grandes existe
alguma discordância a nível bibliográfico. De acordo com a apresentação: 1º pequenos, 2º grandes, 3º médios.

Se o pH por inferior a 5 haverá destruição completa da microfauna ruminal, não vamos ter protozoários visíveis neste
teste uma vez que estarão mortos devido à acidose.

ACIDOSE LÁTICA AGUDA:

O líquido ruminal caracterizar-se-á por uma cor cinzento-esbranquiçada, com cheiro doce e ácido (semelhante a leite
azedo, devido às fermentações que estão a ocorrer), consistência aquosa e muito fluída e sedimentação muito rápida.

Ao nível dos caracteres químicos, o fluido terá pH ácido, devido ao aumento do ácido láctico.

Microbiologia: predomínio de organismos Gram + (o fisiológico seria serem Gram -), sobretudo cocci, depois lactobacilli,
e ausência de protozoários.

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