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Hematologia

Linfomas – Manifestações
Orais e Maxilofaciais
Dr. Edson Virgílio Zen Filho1 • Dr. José Endrigo Tinôco-Araújo2
Prof. Dr. Paulo Sérgio da Silva Santos3 • Dr. Fábio Luiz Coracin4

O
s linfomas repre- Sternberg presentes em biópsias de indivíduos
Divulgação

sentam de 3% a 4% com linfoma de Hodgkin (LH).(1-6)


das doenças ma- Os linfomas não-Hodgkin (LNH) compre-
lignas em todo o mundo. endem um grupo heterogêneo de doenças
São neoplasias do sistema malignas linfoides. Destes, 60% têm origem em
linfático, classificadas dentro linfonodos e 40% iniciam em sítios extranodais
dos tumores dos tecidos he- constituídos de tecido linfoide não encapsulado.
matopoiéticos e linfoides, ca- O linfoma de Burkitt (LB) é um tipo de LNH de
racterizados por proliferação células B que acomete com frequência a região
de células linfoides ou seus bucal e maxilofacial. Através de microscopia
precursores em diferentes eletrônica de varredura, Epstein, Achong e Barr
estágios de diferenciação, em 1964 descobriram a presença de partículas
Dr. Edson V. Zen Filho (à esq.), resultando em um largo espectro de variações virais com aspectos semelhantes a vírus do gru-
Dr. José Endrigo Tinôco-Araújo morfológicas, imunológicas e clínicas, classifica- po herpes, denominando o vírus de Epstein-Barr
e Prof. Dr. Paulo Sérgio da dos em Hodgkin e não-Hodgkin. A primeira des- (EBV), sendo o primeiro vírus associado com
Silva Santos.
crição da doença foi feita por Thomas Hodgkin patogenia de tumores em humanos.(7,8)
em 1832 e aperfeiçoada por Samuel Wilks em Além dos sinais clínicos clássicos, incluindo
1865. Posteriormente, os médicos Carl Stern- linfadenomegalia assintomática persistente sem
berg (1898) e Dorothy Reed (1902) descreveram relação com processos inflamatórios ou infec-
as características microscópicas desta entidade ciosos, podem ocorrer, também, manifestações
patológica que apresenta as células de Reed- extranodais precoces podendo apresentar-se na
forma de lesões nodulares, eritematosas e as-
1 - Mestrando em Estomatologia da Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São sintomáticas, favorecendo ao cirurgião-dentista
Paulo. CRO-SP 85.272. a oportunidade do diagnóstico precoce quando
2 - Mestrando em Estomatologia da Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São
estas se apresentam na região bucal e maxilo-
Paulo. CRO-SP 97.028.
3 - Professor Doutor da Disciplina de Estomatologia da Faculdade de Odontologia de Bauru, facial, conforme a tabela 1.
Universidade de São Paulo; Membro do Comitê de Odontologia da Associação Brasileira de
Linfoma e Leucemia - ABRALE. CRO-SP 51.737. REVISÃO
4 - Cirurgião-Dentista do Serviço de Transplante de Medula Óssea do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; Professor Doutor da Disciplina de
Patologia Bucal da Faculdade de Odontologia da Universidade Nove de Julho - SP. As doenças malignas de células linfoides
CRO-SP 69.798. surgem de células do sistema imunológico em

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diferentes estágios de diferenciação, resul- Tabela 1. Características dos linfomas que acometem a região de cabeça e pescoço
tando em um largo espectro de variações Localização Principais características
morfológicas, imunológicas e clínicas. Nodal • Indolor
Representam de 3% a 4% das neoplasias • Consistência elástica
malignas em todo o mundo, ocorrendo • LH usualmente envolve nódulos mediastinais ou hilares
com maior frequência em homens e nos • LNH geralmente se dissemina por nódulos não contíguos e o envolvimento
abdominal é comum
países desenvolvidos.(3,10,11)
Tonsila palatina • O linfoma extranodal mais frequente da cabeça e pescoço
As lesões primárias dos linfomas na
• Aumento assintomático de uma tonsila é frequentemente observado
região bucal e maxilofacial são raras, mas Rinofaringe • Um nódulo no pescoço é o achado mais comum
podem ocorrer em até 5% dos casos de • Outros: obstrução nasal, perda auditiva
linfomas em geral. Quando as lesões ocor- Base da língua • Poucos casos relatados
rem nestas áreas afetam tecidos linfoides • Nódulo no pescoço é o primeiro sinal
secundários, estando associadas à idade Cavidade oral • Modo de apresentação: aumento volumétrico, dor e ulceração
e estádio avançado da doença. As lesões Glândulas salivares • Parótida é a mais acometida
bucais podem se apresentar com carac- • Associação com síndrome de Sjögren é frequente
Tireoide • Associada com Tireoidite de Hashimoto
terísticas clínicas de eritemas, aumento
• Ausência de degeneração cística
de volume assintomático e superfície
Laringe • Mais frequente acima da glote
ulcerada secundariamente a um trauma. • Usualmente submucosa
Estas lesões podem desenvolver compli- Cavidade nasal • Neoplasia positiva para EBV
cações infecciosas ou reativar infecções • Linfoma de células T/NK é o mais comum
latentes.(5,12-14) • Agressivo
As apresentações de linfomas na re- Seios paranasais • Sinusite é o achado mais comum
gião bucal e maxilofacial podem ocorrer • Frequentemente se estende para órbita
Pele • As patologias mais frequentes são linfoma de células do folículo central, cutâneo
em tecidos moles e duros (tabela 2). Em
de zona marginal e difuso de grandes células B
um levantamento realizado por Freeman Adaptado de Zapater.(9)
et al.(15) de 1.467 casos de LNH, 28% dos
linfomas eram localizados na região bucal e Tabela 2. Relação dos tipos de linfomas com as regiões
maxilofacial. Destes, 32% eram localizados bucomaxilofaciais e os respectivos sinais e sintomas
nas tonsilas, 16,5% nas glândulas saliva- Região cabeça e
Tipo de linfoma Quadro clínico
res, 9,5% na boca, 8,8% na nasofaringe, pescoço mais acometida
8,6% na tireoide e 7,9% no nariz. Outros Aumento volumétrico indolor dos
Maxila, mandíbula, palato,
estudos demonstram a importância do Linfoma difuso de grandes tecidos moles, áreas radiolúcidas
gengiva, glândulas salivares,
diagnóstico de linfomas na região bucal e células B irregulares que podem causar
seios paranasais e nasofaringe
maxilofacial, apontando incidência de LNH expansão das corticais ósseas
na região do anel de Waldeyer, gengiva, Massas tumorais, mobilidade dentária,
destruição óssea dos maxilares,
assoalho de boca e mucosa jugal e tam-
Linfoma de Burkitt Anel de Waldeyer e maxilares irregular e margens irregulares, e
bém envolvendo linfonodos cervicais, sub- esfoliação prematura dos dentes
mandibulares e submentonianos.(5,13,14,16,17) decíduos
Devido a uma grande variedade de Linfoma extranodal de zona Anexos orbitários, glândulas
Aumento volumétrico indolor não
apresentações clínicas e morfológicas marginal do tecido linfoide salivares, tireoide, palato duro e
ulcerado
dos linfomas, várias classificações foram associado a mucosa (MALT) mole e seio maxilar
propostas baseadas em características Linfoma de células do Anel de Waldeyer, pele, língua e
Aumento volumétrico difuso
citológicas específicas. A classificação da Manto palato
Organização Mundial da Saúde (OMS) de Ulceração persistente na mucosa naso/
orofaríngea, e linha média do palato.
2008 (tabela 3) para neoplasias do tecido Linfoma extranodal de Anel de Waldeyer, tecido
Obstrução nasal, epistaxe, aumento
linfoide foi concebida durante um consen- celulas NK/T tipo nasal nasossinusal mole e duro
volumétrico do palato, edema orbitário
so entre hematopatologistas e oncolo- nos estágios iniciais
gistas clínicos, levando em consideração Placas ou nódulos eritematosos
Micose fungoide Língua, palato e gengiva
características morfológicas, fenótipo dos endurecidos ulcerados

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linfócitos neoplásicos, clínicas, imunoló- Do ponto de vista genético, os linfo- LINFOMA DE HODGKIN
gicas e genéticas para definir os linfomas mas caracterizam-se por anormalidades
e outras neoplasias do tecido linfoide em genéticas que levam a expansão maligna O LH é responsável por 30% dos linfo-
entidades clínico-patológicas com relevân- de células B, T e NK, ativando oncogenes mas e pode ser dividido em LH clássico e
cia clínica e terapêutica.(4,16) A terminologia por translocação de cromossomos e ina- LH com predominância linfocitária nodular.
utilizada na tabela 2 foi traduzida no sen- tivando genes supressores de tumor pela Estimativas do INCA apontam 2.870 novos
tido literal da classificação dos Tumores deleção ou mutação de cromossomos. casos no Brasil no ano de 2009. Apresenta
de Tecidos Hematopoiéticos e Linfoides Em alguns tipos de linfoma, pode ocorrer um pico de acometimento entre os 15 e os
revisada pela OMS e publicada em 2008, inserção de genes exógenos por vírus 35 anos de idade e um segundo pico de
juntamente com a adequação de algumas oncogênicos. A translocação cromosso- acometimento após os 50 anos de idade.
nomenclaturas que permaneceram da mal é considerada o marco genético para Esta doença caracterizada microscopica-
classificação de 2001, pelo fato de não as doenças malignas linfoides, ainda que mente pela proliferação clonal de linfócitos
haver uma padronização da tradução para seus mecanismos não sejam conhecidos malignos, chamados de células de Reed-
a língua portuguesa das nomenclaturas com exatidão, mas sabe-se que o meca- Sternberg, mostrando-se como células
empregadas pela classificação publicada nismo de alteração genética dos linfomas grandes e multinucleadas constituindo de
em 2008. é diferente de outros tumores sólidos.(4,10) 1% a 5% da massa tumoral. O aspecto

Tabela 3. Classificação dos tumores dos tecidos hematopoiéticos e linfoides


Neoplasmas de células B Neoplasmas de células T e NK Linfoma de Hodgkin
- Leucemia linfocítica crônica/Linfoma de pequenos linfócitos ou células pequenas - Linfoma hydroa vacciniforme-like - Linfoma de Hodgkin com
- Linfoma de zona marginal esplênica - Linfoma/Leucemia de células T do adulto predominância linfocítica
- Linfoma/leucemia esplênica inclassificável* - Linfoma extranodal de células NK/T tipo nasal nodular
- Linfoma esplênico difuso de células B pequenas de polpa vermelha* - Linfoma de células T associado a enteropatia* - Linfoma de Hodgkin Clássico
- Leucemia variante de células pilosas - Linfoma de células T hepatoesplênico* - Linfoma de Hodgkin Clássico
- Linfoma linfoplasmático/Imunocitoma - Linfoma subcutâneo de células T paniculite- esclerose nodular
- Macroglobulinemia de Waldenström símile - Linfoma de Hodgkin Clássico
- Linfoma extranodal de zona marginal do tecido linfoide associado à mucosa - Micose fungoide/Síndrome de Sézary rico em linfócitos
(MALT) - Doenças linfoproliferativas cutâneas primárias - Linfoma de Hodgkin Clássico
- Linfoma zona marginal nodal de células T CD30 positivo celularidade mista
- Linfoma zona marginal nodal pediátrico* - Papulose linfomatoide - Linfoma de Hodgkin Clássico
- Linfoma folicular - Linfoma cutâneo primário de células grandes depleção linfocítica
- Linfoma folicular pediátrico * anaplásicas
- Linfoma cutâneo primário do centro folicular - Linfoma cutâneo de células T gama/delta
- Linfoma de células do manto - Linfoma primário de células T CD8+ citotóxicas
- Linfoma difuso de grandes células B sem especificidade epidermotrópico agressivo*
- Linfoma células T/histiocito rico em grandes células B - Linfoma cutâneo primário de pequenas/médias
- LDGCB primário do sistema nervoso central células T CD4+ positivo*
- LDGCB cutâneo primario, leg type - Linfoma cutâneo primário de células T
- LDGCB positivo para EBV do idoso* periféricas sem outra especificação
- LDGCB associado com inflamação crônica - Linfoma de células T angioimunoblástico
- Linfoma primário mediastínico (timico) de grandes células B - Linfoma de grandes células anaplásicas, ALK
- Linfoma intravascular de grandes células B positivo
- Linfoma ALK-positivo de grandes células B - Linfoma de grandes células anaplásicas, ALK
- Linfoma plasmablástico/plasmacitoma negativo*
- Linfoma de grandes células B desenvolvendo em Doença de Castleman
multicêntrica associado ao HHV8
- Linfoma primário de efusões
- Linfoma de Burkitt
- Linfoma de célula B, inclassificável com características intermediárias entre
linfoma difuso de grandes células B e linfoma de Burkitt
- Linfoma de célula B, inclassificável com característico intermediárias entre
linfoma difuso de grandes células B e Linfoma de Hodgkin clássico
* Estes tipos histológicos são entidades provisórias as quais o WHO Working Group observou não haver evidências suficientes para reconhecer como doenças distintas
até o momento da publicação. Adaptado de Swerdlow.(18)

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mais característico é uma célula binucleada à mucosa os mais comuns, chegando transformação de lesões pré-existentes.
com nucléolos grandes e eosinófilos, dando juntos a representar mais de 70% de todos A dor é o sintoma mais comum e o fêmur
o clássico aspecto em “olho de coruja”. O os linfomas.(11,25,28) é o osso mais acometido.(31-33) Uma varia-
citoplasma é abundante e eosinófilo. Pode Em 20% dos casos de LNH observa-se ção do linfoma de células B é o linfoma
haver exemplos tri ou polinucleados. So- linfadenopatia cervical persistente por mais plasmablástico, que apresenta as mesmas
mente as células de Reed-Sternberg são de duas semanas, tosse, febre de origem características de progressão rápida, po-
consideradas diagnósticas do linfoma de desconhecida, perda de peso, sudorese rém devido a seu grau de diferenciação
Hodgkin, ou seja, a sua presença é obriga- noturna, dores abdominais e mal-estar. citológica para uma célula precursora do
tória para fechar o diagnóstico. O linfoma de Também pode ocorrer linfadenopatia ab- plasmócito, este linfoma tende a ser clas-
Hodgkin apresenta crescimento ordenado dominal e pélvica e hepatoesplenomegalia. sificado como entidade distinta. O linfoma
pelos linfonodos centrais e axiais, raramente Os sinais clínicos que o cirurgião-dentista plasmablástico associado ao vírus herpes
com apresentação extranodal e, portanto, o pode observar com maior frequência são HSV-8, que ocorre na cavidade bucal de
envolvimento oral é incomum. Os sítios bu- aumento de volume difuso e indolor do pacientes HIV positivos e representa 2%
cais podem ser sítios primários da doença tecido com consistência flutuante ou es- dos LNH entre os portadores do HIV.(34,35)
ou indicar disseminação da doença sistê- ponjosa, com ou sem ulceração traumáti-
mica. As lesões orais se apresentam como ca, mobilidade dentária inexplicada, perda Linfoma extranodal da zona marginal
aumentos volumétricos discretos firmes de dentes e parestesia. Radiograficamente do tecido linfoide associado à mucosa
à palpação, frequentemente endurecidos pode-se encontrar destruição óssea difusa (MALT)
com bordas elevadas e ulcerações centrais e perda de lâmina dura em estruturas de O linfoma extranodal de zona marginal
com ou sem áreas de necrose.(19,20) Também contorno dos dentes. O prognóstico de- do tecido linfoide associado à mucosa
podem se apresentar como neoplasias pende do tipo histológico, estadiamento e (MALT) origina-se do acúmulo de tecido
exofíticas, eritematosas, assintomáticas, tratamento.(4,8,9,16,19-21,26,29) linfoide autorreativo formado por desor-
frequentemente com ulcerações superficiais Apesar de praticamente todos os dens inflamatórias crônicas ou doenças
secundárias ao trauma.(20) As regiões mais LNH apresentarem manifestações bucais, autoimunes como infecção estomacal por
acometidas são anel de Waldeyer, vestíbulo algumas entidades apresentam manifesta- Helicobacter pylori, tireoidite de Hashimoto
e rebordo alveolar, embora existam relatos ções com maior frequência sobre as quais ou sialadenite mioepitelial das glândulas
de acometimento de língua e manifestações melhor enfocaremos aqui: o linfoma difuso salivares (síndrome de Sjögren).(36) Estes
intraósseas.(6,8,11,12, 18-24) de células B, o linfoma extranodal da zona representam cerca de 7% a 8% de todos
marginal do tecido linfoide associado à mu- os LNH.(20,37) O trato gastrointestinal é a re-
LINFOMA NÃO-HODGKIN cosa (MALT), o linfoma folicular, o linfoma de gião envolvida em 60% a 70% dos casos.
Burkitt, micose fungoide, linfoma de células Quando isto não ocorre, há envolvimento
O LNH constitui um grupo de doenças do manto e linfoma de células NK/T nasal. da região de cabeça e pescoço em 11%
com diversas formas de apresentação; é dos casos. Outros tecidos podem ser
o terceiro câncer mais comum em crian- Linfoma difuso de células B acometidos, como conjuntiva, glândulas
ças,(20) é a segunda doença maligna mais O linfoma difuso de células B é o tipo salivares, órbita, rins, pulmões, laringe, rins,
comum da orofaringe, ficando apenas mais comum de LNH, podendo ocorrer na próstata, pele e dura-máter.(20,36,37)
abaixo do carcinoma espinocelular, repre- forma extranodal. Com maior frequência Na região de cabeça e pescoço, os
sentando 2,2% das doenças malignas de entre homens adultos, representa 2% dos anexos orbitários são sítios de envolvimento
cabeça e pescoço e 3,5% das doenças linfomas que acometem a região bucal primário em 54% dos casos, seguidos pe-
malignas intrabucais. Os locais mais aco- e maxilofacial, geralmente como lesões las glândulas salivares (29%) e tireoide. (36)
metidos são língua, palato duro e mole, nodulares no anel de Waldeyer ou lesões Em aproximadamente 89% dos casos a
gengivas e orofaringe, e os tipos mais intraósseas com extravasamento para te- doença apresenta-se solitária, com envol-
comuns são o linfoma de grandes células cidos moles, provocando dor e parestesia. vimento de somente um local.(36) O seio
e linfoma de pequenas células.(4,23,25-27) Os linfomas ósseos primários representam maxilar, palato duro e cavidade nasal tam-
Estima-se que até 85% de todos os menos de 1% de todos os LNH, 7% dos bém podem estar envolvidos. Quando estes
LNH tenham origem nas células B, (20) tumores ósseos malignos e 4% a 5% dos linfomas envolvem a cavidade bucal podem
sendo o linfoma difuso de grandes células linfomas extranodais. Estes são em sua se apresentar clinicamente como aumento
B, linfoma folicular e linfoma extranodal de maioria linfoma difuso de grandes célu- volumétrico associado a ulcerações adja-
zona marginal do tecido linfoide associado las B (LDGCB) que surgem sem haver a centes envolvendo o palato duro e mole.(38)

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Linfoma folicular De maneira geral, as lesões do LB forma de crescimento tumoral no palato,
O linfoma folicular é uma neoplasia das apresentam massas tumorais que podem nódulo lingual, estomatite ulcerativa ou
células B formando um padrão folicular. levar a uma assimetria facial e proptose. aumento de volume ulcerado envolvendo
Representa 20% a 30% dos LNH, sendo Pode ocorrer mobilidade dentária e es- palato e gengiva.(46)
o segundo tipo mais frequente de LNH. É foliação prematura dos dentes decíduos
o linfoma de baixo grau mais frequente, devido à destruição agressiva do osso Micose fungoide
caracterizando-se por um curso indo- alveolar, porém dor e parestesia não são A micose fungoide representa um linfo-
lente e remissões e recaídas recorrentes. achados frequentes.(30) Em uma revisão ma derivado de linfócitos T, particularmente
Até 85% dos linfomas foliculares têm um de 680 casos de LB, Mlhota & Naidoo(43) a celula T com expressão da molécula
rearranjo detectável do gene do linfoma constataram que a maxila foi a região mais CD4 na superfície da membrana, sendo
das células tipo 2 (BCL-2), uma marca acometida (13,7%), seguida da mandíbula esta a lesão cutânea mais frequente dos
desta doença.(23,39-41) (7,2%), mucosa jugal (5,7%), maxila e man- LNH de células T. Apresenta-se como uma
Afeta pacientes acima de 50 anos de díbula juntas (4,5%) e linfonodos cervicais dermatite caracterizada por três estágios,
idade e somente um terço dos pacien- (4,1%). Apenas 5% dos pacientes eram eczematoso, placa e tumor. Inicialmente
tes apresenta um padrão localizado da HIV positivos e acredita-se que a incidência apresenta-se como manchas eritemato-
doença, pois é frequente o envolvimento de LB esteja diminuindo devido ao melhor sas, que progridem para placas elevadas
de sítios nodais e da medula óssea em acesso aos serviços de saúde e maior que tendem a crescer e tornarem-se
50% dos casos. A maioria dos pacientes conhecimento da doença por médicos, pápulas ou tumores.(30,47,48)
apresenta linfadenopatia indolor envol- cirurgiões-dentistas e outros profissio- O envolvimento da cavidade oral é raro,
vendo as regiões cervical, axilar, inguinal nais de saúde para o reconhecimento e com uma prevalência de 1% de todos os
ou femoral. Doenças extranodais além o manejo adequado das manifestações casos de micose fungoide e 35 relatos na
daquelas que envolvem a medula óssea sistêmicas e bucais do LB.(20,30,43) literatura. Geralmente apresentam placas
são incomuns.(23) e nódulos eritematosos endurecidos e
Linfoma de células do manto ulcerados na língua, palato ou gengiva,
Linfoma de Burkitt (LB) O linfoma de células do manto é uma associadas a um quadro avançado da
O LB é um linfoma de células B agressi- neoplasia distinta de células B que acome- doença.(47-49)
vo, de crescimento e proliferação rápidos, te homens adultos de idade mais avança-
que ocorre de três formas. O LB endêmico, da.(44) Aproximadamente 75% dos casos Linfoma extranodal de células
frequente entre crianças africanas com apresentam inicialmente envolvimento de T/NK nasal
acometimento de maxila e mandíbula em linfonodos, enquanto 25% apresentam o O linfoma extranodal de células
50% a 70% dos casos. A incidência das envolvimento inicial de um sítio extranodal T/NK nasal é raro e suas características
lesões nos maxilares é inversa à idade. como o anel de Waldeyer, a medula óssea patológicas são pouco esclarecidas. Tem
Em crianças, as lesões nos maxilares e o trato gastrointestinal. Outras regiões in- comportamento clínico agressivo e está
ocorrem em 90% dos casos. E aos 15 comuns relatadas na literatura são anexos associado ao EBV, com quase 100% de
anos de idade, a incidência das lesões nos oculares, sistema nervoso central, pele, positividade em hibridização in situ.(20)
maxilares cai para 25%. O LB esporádico, língua e palato.(45) ‑Estas lesões apresentam um caráter
raro e que ocorre entre crianças e jovens agressivo e um prognóstico ruim, sendo
europeus e americanos afeta com maior Linfoma de células T tipicamente encontrados em adultos.(43)
frequência a região abdominal, mas há O linfoma de células T é uma doença O envolvimento oral é raro, mas pode se
relatos de envolvimento da região bucal e maligna agressiva associada com o proto- apresentar como úlceras palatinas, mas
maxilofacial. O LB associado à imunodefi- vírus HTLV-1 integrado ao DNA das células por causa do envolvimento em grandes
ciência representa de 30% a 40% dos LNH tumorais. Os pacientes podem apresentar áreas de necrose podem ter o diagnóstico
em pacientes HIV positivos, podendo ser linfadenomegalia, hepatoesplenomegalia prejudicado.(50)
uma manifestação da síndrome da imuno- e hipercalcemia. Lesões cutâneas como Ocasionalmente envolve seios parana-
deficiência adquirida (SIDA). Manifestações pápulas, nódulos, placas e eritema po- sais, órbita, glândulas salivares e espaços
bucais incluem odontalgia atípica e severa, dem ser encontradas em 50% a 70% dos fasciais.(51) Com a progressão da doença
mobilidade dentária, expansão óssea, pacientes. Entretanto, lesões bucais são pode ocorrer destruição das estruturas
massas de tecidos mole ou neuropatia raras, podendo ocorrer em apenas 2% da linha média do palato e fossa nasal e
craniofacial inexplicável.(20,28,30,42) dos pacientes com linfoma de células T na perfuração do septo nasal.(20,30,52)

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Hematologia

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Prática Hospitalar • Ano XIII • Nº 78 • Nov-Dez/2011 37

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